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Reza o senso comum que toda e qualquer (es) história deve conter um início, o
desenvolvimento, o clímax e o desfecho. Assim sendo, nenhum texto – pelo bem da
compreensão dos futuros leitores – deve escapar à esta regra - que também é
perfeitamente aplicável em muitas outras construções redacionais, como este
despretensioso ensaio sobre as mal-aventuranças do evangelho lucano. Entretanto, a
rigidez da norma cede espaço à criatividade quando a personagem abordada é de tal
modo apaixonante e imbricada com a história dos demais seres humanos que chega a
tocar incondicionalmente – individualmente e universalmente – a epopéia secular.
Alguém, por acaso, é capaz de redigir uma biografia sobre Napoleão Bonaparte isenta
de implicações pessoais? E sobre Hitler, ou qualquer outra figura histórica?
O mesmo fenômeno ocorre com Jesus de Nazaré. Diante de sua figura é
impossível a imparcialidade ( Lc 12, 51-53), ou alguma biografia desinteressada,
tamanha é a sua identificação com a nossa condição humana, embora revelasse-se o
próprio Deus (Fil 2, 6-7). Tampouco é possível descontextualizar algum instante
particular de toda a sua curta, mas frutuosa existência. Mais: provavelmente, traçar um
suceder cronológico de sua vida seja uma tarefa deveras exigente – ou potencialmente
impossível – por tratar-se de uma figura pincelada em diversas camadas – em
molduras igualmente múltiplas – às quais denominamos Evangelhos. Por isso, analisar
um episódio descrito no Evangelho implica num dinâmico movimento – que inclui idas e
vindas literárias – até desvendar-se o sentido correto do próprio.
Os leitores devem estar perguntando-se, qual é o porquê de todo este
interminável balé de palavras que preenchem quase esta folha inteira de papel e
praticamente nada dizem? A resposta é evidente (para esta besta que vos escreve): o
trecho bíblico que será estudado nas páginas seguintes – para ser apreendido –
exigirá, inicialmente, um retroceder de páginas até o instante em que um certo Jesus
de Nazaré, retornou a sua terra natal e... Calma! Ainda não é o momento...Por ora,
focalizemos nossa atenção neste trecho:
E, descendo com eles, parou numa planura onde se encontravam
muitos discípulos seus e grande multidão do povo, de toda a Judéia, de
Jerusalém e do litoral de Tiro e de Sidom, que vieram para o ouvirem e
serem curados de suas enfermidades; também os atormentados por
espíritos imundos eram curados. E todos da multidão procuravam tocá-
lo, porque dele saía poder; e curava todos. Então, olhando ele para os
seus discípulos, disse-lhes: Bem-aventurados vós, os pobres, porque
vosso é o Reino de Deus. Bem-aventurados vós, os que agora tendes
fome, porque sereis fartos. Bem-aventurados vós, os que agora chorais,
porque haveis de rir. Bem-aventurados sois quando os homens vos
odiarem e quando vos expulsarem da sua companhia, vos injuriarem e
rejeitarem o vosso nome como indigno, por causa do Filho do Homem.
Regozijai-vos naquele dia e exultai, porque grande é o vosso galardão
no céu; pois dessa forma procederam seus pais com os profetas. Mas ai
de vós, os ricos! Porque tendes a vossa consolação”Ai de vós, os que
estais agora fartos! Porque vireis a ter fome. Ai de vós, os que agora
rides! Porque haveis de lamentar e chorar. Ai de vós, quando todos vos
louvarem! Porque assim procederam seus pais com os falsos profetas.
(Lucas 6, 17-26)
Artigo I
Fica decretado que agora vale a verdade. para sempre desfraldada na alma do povo.
agora vale a vida,
e de mãos dadas, Artigo VIII
marcharemos todos pela vida verdadeira. Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
Artigo II não poder dar-se amor a quem se ama
Fica decretado que todos os dias da semana, e saber que é a água
inclusive as terças-feiras mais cinzentas, que dá à planta o milagre da flor.
têm direito a converter-se em manhãs de
domingo. Artigo IX
Fica permitido que o pão de cada dia
Artigo III tenha no homem o sinal de seu suor.
Fica decretado que, a partir deste instante, Mas que sobretudo tenha
haverá girassóis em todas as janelas, sempre o quente sabor da ternura.
que os girassóis terão direito Artigo X
a abrir-se dentro da sombra; Fica permitido a qualquer pessoa,
e que as janelas devem permanecer, o dia qualquer hora da vida,
inteiro, uso do traje branco.
abertas para o verde onde cresce a esperança.
Artigo XI
Artigo IV Fica decretado, por definição,
Fica decretado que o homem que o homem é um animal que ama
não precisará nunca mais e que por isso é belo,
duvidar do homem. muito mais belo que a estrela da manhã.
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento, Artigo XII
como o vento confia no ar, Decreta-se que nada será obrigado
como o ar confia no campo azul do céu. nem proibido,
tudo será permitido,
Parágrafo único: inclusive brincar com os rinocerontes
O homem, confiará no homem e caminhar pelas tardes
como um menino confia em outro menino. com uma imensa begônia na lapela.
As Mal- Aventuranças
Belo Horizonte
Abril/2006
__________________________________________________Introdução.