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Caminhos a Percorrer
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ISSN: 1984 -3615
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIENCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE
I ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS SOBRE O MEDITERRÂNEO ANTIGO
&
VIII JORNADA DE HISTÓRIA ANTIGA
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escravidão.
Analisamos ainda, o judaísmo e seus grupos sociais, porque acreditamos ser uma
cultura de “transição” entre o Império egípcio e mesopotâmico para com o greco-romano,
assimilando muitos ritos e costumes, além da incorporação da própria instituição
escravidão.
Quando observamos o legado greco-romano no séc. I d.C. percebemos que, a
escravidão e as relações sociais entre dominadores e dominados se davam de múltiplas
formas. Traçamos, então uma linha mestra, com pontos que consideramos mais
importantes, tais como a análise do contexto da escravidão entre os gregos, a helenização
como mecanismo de dominação, passando pelo helenismo romano e pelo nascimento do
helenismo judeu-cristão, que desembocou no séc. I d.C. Por último, a escravidão no
próprio contexto romano, para fazermos as devidas comparações entre os tais contextos.
Precisávamos ainda, analisar as questões legais que envolviam o Império Romano e
suas colônias. Fizemos isso através da Pax Romana, tendo como fio condutor a História
Social. Pois queríamos verificar, quais foram as questões legais e administrativas que
estariam implicadas na análise do contexto à carta a Filemom., evento do neotestamentário
que surgiu na época do universalismo do Império Romano. 7
A partir disso, notamos que a escravidão na Mesopotâmia e no Egito seria uma
“tese”, por serem as primeiras. A escravidão no mundo greco-romano e no mundo do
judaísmo seria a “síntese”, pois Egito e Mesopotâmia experimentaram diversos modelos, e
os gregos, romanos e judeus sintetizaram e acentuaram a relação de exploração entre os
escravos e seus senhores. E por último, os cristãos seriam a “antítese”, pois pregavam, de
alguma forma, contra a escravidão através da prática do amor, da inclusão na comunidade
cristã, e se consideravam irmãos em Cristo. Tudo isso, mediante a pregação radical e a
aceitação do Evangelho de Jesus Cristo a partir do estudo de caso que é a carta a Filemom!
Caminhamos no sentido de apresentar a nossa hipótese, a partir da re-leitura da
carta a Filemom. Esta seria um escrito subversivo por diversos fatores. Primeiro, porque
tornava um escravo igual ao seu senhor, quando os considerava irmãos em Cristo.
Segundo, porque incluíam os escravos na comunidade, onde tal questão no contexto greco-
romano era uma afronta. Terceiro, porque, ao libertar o escravo cristão, o seu ex-senhor
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“Evangelho”(Fm 13), pois inclusive, é por causa da pregação do Evangelho, que Paulo
estava preso.
Mas, mesmo preso, não deixou de expor sua opinião em relação a uma questão tão
difícil e complexa, que era a escravidão, pois se igualou a um escravo, e pediu que o
libertasse, como demonstração da participação da pregação radical e do serviço na
comunidade, que experiencia o Evangelho do Senhor Jesus Cristo, onde todos são iguais
diante de Cristo.
Seria necessário discutir o contexto que envolvia a própria carta a Filemom como,
por exemplo, o local, a data, a quem se destinou, e se realmente foi Paulo quem a escreveu.
Ao aprofundarmos a discussão, trouxemos à tona, o argumento de que Arquippo
seria um patrono da “casa” de Ápfia, além de considerarmos Filemom, como dono do
escravo Onésimo e o elo entre essa casa-igreja(oikos) e o próprio Paulo. Além disso, os
“Collegias”11 romanos só poderiam funcionar tendo um patrono, este geralmente era
romano ou de cidadania romana. Essas Collegias eram compostas de pessoas do mesmo
tipo de trabalho.
A partir dessas observações, discutimos com mais afinco a relação da escravidão na
carta a Filemom e a possibilidade da libertação de Onésimo, e como isso foi absorvido pela
própria comunidade, ao qual eles estavam inseridos, diante de um contexto maior que era
regido pelas leis romanas.
Verificamos que Paulo exagerou no seu pedido, transformando “um
escravo”(grego: “doulos” - latim: “res” - coisa) em ser humano(grego: “sarki” – pessoa)12!
Esta atitude, assemelhava-se a dos filósofos Estóicos, que difundia a idéia de que o escravo
também era ser humano, merecendo tratamento digno. Por isso, encontramos um convite à
fraternidade na carta a Filemom, ou seja, a situação que o contexto apresentava incidia
sobre uma sociedade, na qual a escravidão era tida como algo natural e um dado adquirido.
Todavia, alguns proprietários de escravos se fizeram cristãos e co-existiam nas igrejas
domésticas(oikos), causando alguns conflitos dentro da própria comunidade cristã.
A atitude expressa por Paulo na carta a Filemom moldou as atitudes cristãs dos
quatro primeiros séculos em relação à escravidão, pois essa carta modificaria a maneira
como os cristãos viveriam na sociedade, da qual faziam parte. Significou que a prática do
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diária e no modo de pensar e de viver das comunidades cristãs, ou seja, cooptando alguns
cristãos ao discurso romano.
As comunidades tendiam ao conformismo ou ao “normal” da vida do momento,
não questionavam, porque seriam consideradas diferentes, acarretando em perseguições,
difamações e incompreensões. Ficaram em silêncio, conformaram-se para continuarem a
ser respeitados pela sociedade. As mulheres e escravos tiveram que se conformarem,
submetendo-se e subordinando-se, para que a comunidade não fosse mal vista ou até
perseguida.
Então, novos senhores ocuparam o lugar do Senhor(Jesus), que representava as
autoridades civis e religiosas, patrões e maridos. Mas eles não podiam dizer que o Kurios
Caeses(o Deus César) era superior ao Kurios Cristo(o Deus Cristo).
Os problemas de identidade e conflito com o Império Romano, já aconteciam desde
os antecessores de Nero (54-68 d.C.). Mas foi Domiciano(81-96 d.C.)13, o primeiro, que
realmente forçou e exigiu dos seus súditos, que o chamassem de “senhor e deus”. 14
Ao analisarmos o contexto do culto ao imperador na Ásia Menor, percebemos que
está diretamente ligado ao contexto da carta a Filemom.
Havia várias razões pelas quais o cristianismo se consolidaria na ilegalidade, pois
aspirava tornar-se universal; era uma religião exclusivista; eram acusados de toda sorte de
iniqüidades; além de se negarem a ir a guerra e sua grande maioria provinha da classe
pobre. Por estes e outros motivos, que o cristianismo entrou em conflito com os interesses
temporais de muitos romanos, judeus e líderes locais gregos.
As condições do Império Romano propiciaram tanto a divulgação, quanto à
perseguição do cristianismo. Além do mais, por causa dessa relação de amor e ódio com o
cristianismo, o Império sucumbiu aos seus encantos, chegando ao ponto de se tornar a
religião oficial do Império, a partir do séc. IV d.C.
O cristianismo, para poder existir como uma organização social precisava ter
limites, precisava manter estabilidade estrutural, bem como flexibilidade e precisava criar
cultura única. Encontrou tudo isso, no Império Romano. Assim sendo, ao se tornar à
religião oficial, o cristianismo deixou de lado muitos temas de solidariedade, para incluir
outros tantos, que se afastavam da irmandade característica do cristianismo inicial.
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Referências Bibliográficas
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Leopoldo: Vozes/Sinodal, 1997/3. p. 99-102.
HALE, Broadus David. Introdução ao estudo do Novo Testamento. 3 ed. RJ: JUERP, 1989.
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LÉGASSE, Simon. A epístola aos Filipenses e a epístola a Filemon. SP: Paulinas, 1984.
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LOHSE, Eduard. Introdução ao Novo Testamento. 4.ed. São Leopoldo/RS: Sinodal, 1985.
PIXLEY, Jorge. A história de Israel a partir dos pobres. 8.ed. Petrópolis/RJ: Vozes, 2002.
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STAMBAUGH, John E.; BALCH, David L. O Novo Testamento em seu ambiente social.
SP: PAULUS, 1996.
TENNEY, Merril C. O novo Testamento: sua origem e análise. 2 ed. SP: Vida Nova, 1972.
Bibliografia Complementar
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Elsevier, 1997. p. 45-59.
CAZELLES, Henri. História política de Israel: desde as origens até Alexandre Magno.
SP: Paulinas, 1986.
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GLOTZ, Gustave. A cidade Grega. SP/RJ: Difel, difusão editorial S.A., 1980.
GOMES, Francisco José Silva. “As comunidades cristãs da época apostólica”. IN.:
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PUGLIESI, Márcio. Mitologia greco-romana: arquétipos dos deuses e heróis. SP: Madras,
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ROCHA PINTO, Paulo Gabriel Hilu da. “Transformações no paganismo Romano”. IN.:
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SUMMERS, Ray. A mensagem do Apocalipse: digno é o cordeiro. 5 ed. RJ: JUERP, 1986.
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WEGNER, Uwe. “Os evangelhos, Jesus, os escravos”. IN.: Estudos Bíblicos. n.º 18.
Petrópolis/RJ: Vozes, 1988. p. 53-72.
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1 HOORNAERT(1994, p.128, 129) alega que o mar Mediterrâneo era chamado de “mare nostrum”(nosso
mar) pelos romanos, porque era através dele que se estabeleciam os contratos tanto militares quanto
comerciais e culturais entre grandes distâncias e entre as cidades metropolitanas de Roma, Alexandria e
Antioquia. Além de sugerir que Paulo pregou aos grupos urbanos entorno do Mediterrâneo.
2 Possivelmente a causa do pagamento de Paulo a Filemom(Fm 18-19), decorreria desse fato da lei romana, e
não de uma fuga de Onésimo, por causa de um roubo, como alegado por muitos comentaristas. Inclusive, o
texto não apresenta nenhuma palavra que poderíamos associar a roubo ou fuga!
3 GILISSEN(1995, p. 751) e CORREIA; SCIASCIA(196?, p. 65-68).
4 GILISSEN(1995, p. 751)
5 Poderia ser o caso de Paulo devolver Onésimo a Filemom, pois implicaria na garantia pessoal de Paulo em
pagar o tempo em que Onésimo lhe servil(Fm 18-19).
6 GILISSEN(1995, p. 754, 756)
7 As literaturas mais antigas do cristianismo são as cartas paulinas, que são escritas às congregações e às
pessoas, tendo como exemplo a carta a Filemom, onde respondiam às questões específicas, como problemas
locais de cada comunidade e/ou pessoas. As cartas paulinas foram escritas durante a época da “Pax Romana”.
Todas elas foram escritas no período de Cláudio(41-54 d.C.) e de Nero(54-68 d.C.). Seria o que os romanos
chamavam de “libri epistolarum”, isto é, o uso de cartas como meio de se tratar vários assuntos pelo Império
Romano; era a maneira mais fácil de se comunicar à distância, por isso sua importante cf. em HALE(1989, p.
194); MEEKS(1992, p.120); STAMBAUGH; BALCH(1996, p.33) e CAIRNS(1995, p.52-53).
8 RICHTER REIMER(1997, p.81) argumenta que a decisão de Filemom em libertar Onésimo foi muito
difícil, porque Filemom deveria abdicar de seu domínio sobre o escravo e teria que repensar sua ideologia em
relação aos sistemas de dominação, como o da escravidão.
9 Discordamos do argumento de CULLMANN(1990, p.71), onde diz que Filemom seria um homem rico.
Concordamos com STAMBAUGH; BALCH(1996, p.106, 107) cujo argumento sobre o fato de que pequenos
comerciantes independentes contratavam os serviços de familiares e de alguns aprendizes entre os próprios
escravos e suas lojas ficavam em suas “casas oficinas”. Isso caracteriza, que muitas vezes os lojistas e a
família, incluindo os aprendizes e os escravos, comiam e dormiam no local, nos fundos ou num elevado da
“casa loja”. Contudo, MATOS(1997, Vol. 1. p.53, 54) argumenta que o cristianismo era composto por sua
grande maioria de pessoas pobres e escravos. Mas, acrescenta que, por ser uma religião urbana(entre os sécs.
I a III d.C. - na Ásia Menor), poderia ser composto também por pessoas ricas, comerciantes e artesãos, talvez
até altos funcionários, como relatado nos textos paulinos: 1 Co 1:11, 16; 16:15; Rm 16:1, 23; At 16:14; 18:2-
3 estas pessoas colocavam suas casas à disposição da comunidade cristã: Rm 16:1, 5, 23; 1 Co 16:19; Cl
4:15; Fm 2; At 16:15.
10 Lembremos que Onésimo fazia parte do Collegia da igreja que se encontra na casa de Ápfia e
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possivelmente tinham a mesma profissão de Filemom, cujo trabalho manual é abominado pela cultura greco-
romana(sobre o desprezo pelo trabalho manual cf. Cícero apud CROSSAN(1994, p.88)). Provavelmente,
Onésimo seria um escravo doméstico – artesão ou administrador de bens – por isso, causaria prejuízo a
Filemom e à igreja cf. em MEEKS(1992, p.39) e STAMBAUGH; BALCH(1996, p.58).
11 Sabemos que para funcionar uma reunião em Roma ou em suas colônias, esta reunião se fazia em
casas(oikos), conforme uma assembléia(ekklesia). Isto significa que o culto funcionava como o “Collegia”.
Cf. STAMBAUGH; BALCH(1996, p.114ss), ou seja, teria que ter um patrono romano que sustentasse o
clube(collegia), mesmo funcionando nas colônias da Ásia Menor. ARENS(1997, p. 147) lista 3 características
dessas associações(collegias): o caráter social, o religioso e o profissional.
12 Onésimo como irmão convertido, confirmaria o argumento de Fm 13, ou seja, que ele seria útil ao
evangelho. Assim sendo, Filemom teria perdido um escravo, momentaneamente e, teria ganhado um irmão,
em Cristo, eternamente(Fm 15). Isso possibilitou que Onésimo passasse de “res”(coisa) para “sarki”(ser
humano) e assim poderia estabelecer uma relação entre “adelfos”(irmão), ou seja, passaria de uma “coisa”
para uma “pessoa”(Fm 16), que poderia fazer parte da família cristã da “oikos ekklesia”(igreja da casa)! Cf.
em PATZIA(199?, p.113) e RICHTER REIMER(1997, p.81). ARENS(1997, p.72) lembra-nos que uma vez
liberto, o escravo nem sempre ficaria legalmente livre de todas as obrigações para com seu ex-senhor.
13 Sabemos que Domiciano exigiu para si o título de “Dominus et Deus”, ao qual os cristãos consideraram
inaceitável e idolátrico em SUETÔNIO. Vida de Domiciano apud KEE(1983, p.121)
14 Cf. em TENNEY(1972, p. 343). LOHSE(2000, p. 209) acrescenta que o culto ao imperador servia para
fins políticos, por isso a veneração ao soberano era um sinal de submissão política expressa em formas
cultuais. Como os judeus eram um povo antigo e Roma dava certa autonomia a algumas religiões, não se
exigia dos judeus a participação no culto ao soberano. Em seu lugar, oferecia-se diariamente, no Templo, um
sacrifício pelo imperador, até o início da guerra judaica – destruição do Templo acontece em 70 d.C. Mas
mesmo após a guerra judaica, foram mantidos os direitos concedidos anteriormente aos judeus.
15 Cf. em HENDRIKSEN(1993, p.270). BARBAGLIO(1989, p. 419, 420) argumenta sobre a questão da
escravidão na igreja de Corinto e Gálatas. Na igreja de Corinto apresenta o texto (1 Co 7:17-24), onde Paulo
relativiza a libertação do escravo, enfatizando a mudança existencial. Enquanto que, na comunidade de
Gálatas, Paulo confirmaria sua orientação, ou seja, que “em Cristo” todos somos iguais(Gl 3:28). Assim, em
Filemom, Paulo visaria a transformação radical das relações pessoais, que não restaria dúvida sobre uma
plena fraternidade, que supera o paternalismo. Cf. Tb. SCHNELLE(1999, p.39) e cp. com LÉGASSE(1984,
p.68).
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