Você está na página 1de 16

EPILEPSIA

Lívia Leite Góes Gitaí

1. INTRODUÇÃO

A epilepsia é uma das doenças neurológicas crônicas mais comuns, atualmente

com cerca de 50 a 60 milhões de pessoas afetadas no mundo,1 sendo 80% vivendo em países

em desenvolvimento ou subdesenvolvidos. A alta prevalência e o impacto das manifestações

clínicas contribuem para que a epilepsia seja uma condição frequente nos atendimentos

ambulatoriais e nos serviços de urgência, de forma que se configura um tema fundamental em um

currículo médico orientado segundo as necessidades de saúde da população.

2. EPIDEMIOLOGIA

A prevalência de epilepsia ativa é de 0,5 a 0,8% nos países desenvolvidos e 1%

nos países em desenvolvimento,1 onde as desigualdades sociais ficam mais evidentes nas

diferenças entre as taxas de prevalência nas regiões urbanas (0,6%) e rurais (1,3%).(x) Uma

meta-análise publicada em 2011 mostrou incidência de 45 casos para cada 100.000 habitantes

nos países desenvolvidos e 82 casos para cada 100.000 habitantes nos países em

desenvolvimento.1 Essas diferenças provavelmente resultam de variações em fatores de risco

para epilepsia como infecções, traumas e cuidados inadequados à saúde materno-infantil.1

3. DEFINIÇÃO

A epilepsia é definida conceitualmente como uma doença caracterizada pela

predisposição persistente do cérebro a gerar crises epilépticas, com consequências

neurobiológicas, cognitivas, psicológicas e sociais. A definição requer a ocorrência de pelo menos

uma crise epiléptica. Do ponto de vista biológico, essa definição enfatiza dois conceitos

essenciais: o de crises epilépticas e o de “predisposição persistente”.

1
Crise epiléptica é definida pela International League Against Epilepsy (ILAE)

como a ocorrência transitória de sinais e/ou sintomas devido a uma atividade neuronal excessiva

ou síncrona no cérebro. Esses sinais ou sintomas acontecem de forma súbita, breve e

estereotipada e podem incluir fenômenos como alterações da consciência, eventos motores,

autonômicos, sensitivo/sensoriais, cognitivos ou emocionais.

O conceito de predisposição persistente estabelece que, na epilepsia, o cérebro

está configurado de forma a gerar crises epilépticas espontâneas ou “não-provocadas”, ou seja,

crises epilépticas que ocorrem fora do contexto da vigência de um insulto agudo. As crises

epilépticas “provocadas”, ou crises sintomáticas agudas, são crises causadas por condições

agudas que reduzem temporariamente o limiar neuronal para crises, tais como alterações

sistêmicas (por exemplo, hipoglicemia) ou neurológicas como, por exemplo, traumatismo crânio-

encefálico (TCE), acidente vascular cerebral (AVC) ou meningoencefalite. Uma vez que a

ocorrência de crises apenas nesse contexto de insulto agudo não implica em predisposição

persistente do cérebro, a ocorrência de crises sintomáticas agudas não qualifica para o

diagnóstico de epilepsia. É importante, nesse sentido, considerar o intervalo de tempo entre o

insulto agudo e a ocorrência das crises, por exemplo, até sete dias após TCE ou AVC.

Do ponto de vista prático, a forma mais comum de determinar que há

predisposição persistente do cérebro a gerar crises epilépticas, ou seja, que há epilepsia é

ocorrência de pelo menos duas crises não-provocadas ocorrendo em um intervalo superior a 24

horas (crises epilépticas que ocorrem separadas por menos de 24 horas são consideradas uma

crise única). Por outro lado, diante de uma pessoa que apresentou apenas uma crise epiléptica

não-provocada, como caracterizar a existência de epilepsia? Para equacionar esse dilema, em

2014 a ILAE propôs uma definição para aplicação na prática clínica em que a epilepsia é

caracterizada por uma das seguintes condições:

• Pelo menos duas crises não-provocadas (ou duas crises reflexas) ocorrendo em um

intervalo superior a 24 horas;

2
• Uma crise não provocada (ou uma crise reflexa) e probabilidade de recorrência estimada

em pelo menos 60% (mesmo risco de recorrência após duas crises);

• Diagnóstico de uma síndrome epiléptica.

Para uma explicação mais detalhada sobre essas definições, assista ao vídeo

“Crises epilépticas e Epilepsia” disponível no Google Classroom.

4. CLASSIFICAÇÃO

Os tipos de crises epilépticas e as causas e tipos de epilepsia são muito variados

e o conhecimento científico sobre o tema vem evoluindo bastante desde o início da epileptologia

no século 19. A primeira estrutura classificatória moderna foi proposta por Gastaut em 1969 e, a

partir da década de 80, as propostas de classificação são coordenadas pela ILAE com a

colaboração dos principais estudiosos da área. Dessa forma, foi publicada a classificação de

crises epilépticas do ano de 1981 e a classificação das síndromes epilépticas de 1989, que são

amplamente conhecidas e permaneceram em uso clínico até os dias atuais. Entretanto, os

importantes avanços do conhecimento científico observados nas últimas décadas forçaram a

necessidade de otimização da classificação dos diferentes tipos de crises epilépticas e de

epilepsias. Desde 2001, a comunidade médica tem assistido a uma sucessão de novas propostas

que refletem todo o esforço da ILAE para atender essa demanda. Um dos grandes desafios

desse processo é conciliar os avanços no conhecimento com a necessidade de um formato de

fácil compreensão para não-epileptologistas, ou seja, para comunidade médica geral. Finalmente,

em 2017, foi publicada a nova classificação das crises epilépticas e dos tipos de epilepsia.

Por esses motivos, o ensino da epilepsia na graduação em medicina tem exigido

o compartilhamento de uma visão particularmente crítica e consciente da necessidade de

atualização permanente. Tendo isso em vista, abordaremos os principais conceitos das propostas

mais recentes de classificação.

3
5. CLASSIFICAÇÃO DAS CRISES EPILÉPTICAS (ILAE, 2017)

As crises epilépticas são classificadas basicamente em crises de início focal,

crises de início generalizado e crises de origem desconhecida. As crises focais são as que se

originam em redes neuronais limitadas a um hemisfério cerebral e devem ser consideradas

quando há sinais ou sintomas focais mesmo se a pessoa apresentar manifestações motoras

bilaterais.

As crises focais podem ser descritas de acordo com uma ou mais das seguintes

manifestações:

• Comprometimento da consciência presente ou ausente chamadas de, respectivamente,

crises disperceptivas ou crises perceptivas;

• Motoras (tônicas, atônicas, mioclônicas, clônicas, espasmos epilépticos e hipermotoras),

• Não-motoras (sensoriais, cognitivas, emocionais e autonômicas);

• Evolução para crise tônico-clônica bilateral.

As crises generalizadas são as que se originam em redes neuronais distribuídas

bilateralmente que são rapidamente engajadas, sem focalidade específica, e podem envolver

estruturas corticais e subcorticais, mas não necessariamente o córtex inteiro.

As crises generalizadas podem ser do tipo:

• Motoras (tônico-clônica, clônicas, tônicas, atônicas, mioclônicas, mioclônico-atônicas,

clônico-tônico-clônicas, espasmos epilépticos);

• Não-motoras - Ausência (típicas, atípicas, mioclônicas e mioclonias palpebrais)

A categoria de crises de início desconhecido não chega a refletir verdadeiramente

um tipo específico de crise mas engloba situações em que a identificação do início ainda não foi

possível. Isso pode ocorrer em situações como crises durante o sono ou sem testemunhas.

Podem ser descritas como motoras ou não-motoras.

4
Figura 1. Classificação das crises epilépticas 2017– esquema simplificado.

Figura 2. Classificação das crises epilépticas 2017– esquema expandido.


5
6. CLASSIFICAÇÃO DOS TIPOS DE EPILEPSIAS (ILAE, 2017)

Ver o item 9.2 – “abordagem diagnóstica”

7. ETIOLOGIA

No modelo proposto em 2010, as categorias de causas da epilepsia descritas em

1989 como idiopática, sintomática e criptogênica foram substituídas, respectivamente, por:

• Genética – a epilepsia é resultado direto de um defeito genético conhecido ou presumido,

no qual as crises são o principal sintoma, podendo haver modificação da expressão da

doença por fatores ambientais. Os genes de causa ou suscetibilidade são herdados

(padrão de herança mendeliano, mitocondrial ou complexo) ou resultam de mutações de

novo que podem ser ou não geneticamente transmissíveis.

• Estruturais/metabólicas – lesão estrutural visível na neuroimagem e concordante com os

dados eletroclínicos, sugerindo uma relação direta entre a epilepsia e a lesão. Podem ser

adquiridas (isquemias, traumas, infecções e outros) ou de causas genéticas em que um

fator se interpõe entre a causa genética e a epilepsia (por exemplo, lesões da esclerose

tuberosa e de muitas malformações do desenvolvimento cortical). Na causa metabólica há

um defeito metabólico com sintomas sistêmicos que levam também ao desenvolvimento de

epilepsia. Geralmente há uma causa genética de base, podendo-se aplicar o nome

metabólico-genético (por exemplo, aminoacidopatias)

• Desconhecida

Na revisão de 2013, foram separadas as categorias estruturais das metabólicas e

adicionadas as seguintes:

• Imunológica – há evidência de um processo autoimune ocasionando inflamação do

sistema nervoso central (por exemplo, encefalite anti-receptor NMDA);

6
• Infecciosa – desencadeada por um processo infeccioso como neurocisticercose,

toxoplasmose e HIV. Não seriam consideradas as crises na vigência de infecção aguda

como meningite ou encefalite.

8. FISIOPATOLOGIA

Uma crise epiléptica resulta de uma sincronização anormal transitória de

neurônios cerebrais que perturba os padrões normais de comunicação neuronal e resulta em

descargas elétricas no eletrencefalograma (crises eletrográficas). Essa perturbação pode

provocar vários sintomas e sinais que dependem no local de origem da crise (zona

epileptogênica) e suas conexões.

Dentro da zona epileptogênica, as crises são geralmente decorrentes do aumento

da excitação ou redução da inibição elétrica celular e é cada vez mais reconhecida a importância

das suas conexões. Redes neuronais diferentes podem estar envolvidas no inicio, propagação e

término das crises e deve ser considerado que essas redes sofrem alterações plásticas durante o

desenvolvimento de formas região-especificas, gênero-especificas e idade-especificas.

Fatores epigenéticos (como o estresse, as próprias crises, inflamação e drogas)

podem alterar ainda mais a dinâmica das redes interferindo tanto nas vias de sinalização como no

desenvolvimento cerebral.

9. DIAGNÓSTICO

9.1 INTRUMENTOS PARA O DIAGNÓSTICO

Na abordagem diagnóstica, o principal instrumento é a entrevista clínica

detalhada com o paciente e pelo menos uma testemunha dos episódios. Os dados informados

pelo paciente são fundamentais para identificar as manifestações clínicas que ocorrem sob a

forma de sintomas, como as sensitivas e sensoriais. Os dados informados pelo acompanhante

7
que tenha testemunhado os episódios, por outro lado, são importantes para identificar os

fenômenos ocorridos quando o paciente tem comprometimento da consciência.

Entre os exames complementares, destaca-se o papel do eletroencefalograma

(EEG) que, além de promover suporte ao diagnóstico, também pode contribuir para a

classificação dos tipos de crises e de epilepsia. O EEG possibilita o registro da atividade elétrica

cerebral mapeada de acordo com a posição dos eletrodos de superfície. Na maioria dos casos

essa monitorização eletrográfica ocorre em situação ambulatorial com registro de duração de

cerca de 30 minutos e, portanto, raramente consegue flagrar a ocorrência de crise epiléptica.

Nessa situação de registro interictal, a presença e o padrão de paroxismos epileptiformes (PE)

são os achados de maior utilidade clínica.

De uma forma geral, a especificidade dos PE interictais para o diagnóstico de

epilepsia é alta em adultos, podendo chegar a mais de 90%, mas é influenciada pela experiência

do médico que analisa o exame, pelo padrão dos PE e pelas características do paciente como

idade, história familiar e condições comórbidas.

Um EEG de rotina isolado apresenta baixa sensibilidade para detecção de PE

interictais (20 a 50%) em pacientes com epilepsia. A sensibilidade pode ser aumentada por

realização de estudos repetidos e de estudos realizados nas primeiras 24 horas após uma crise

epiléptica, pelo uso de eletrodos especiais, registro em sono e com outros métodos de ativação e

por registro prolongados. Ainda assim, um EEG persistentemente normal não exclui a

possibilidade de epilepsia.

Em situações específicas, como epilepsia refratária com indicação cirúrgica, há

indicação de monitorização por vídeo-EEG para adequada caracterização do tipo de crise e

identificação da zona epileptogênica. Nesses casos, o paciente é submetido a monitorização

contínua por vídeo e EEG objetivando o registro das crises epilépticas.

Exames de imagem (tomografia computadorizada ou preferencialmente

ressonância magnética de crânio) geralmente são necessários para o diagnóstico etiológico,

principalmente em adultos e idosos, podendo ser dispensáveis apenas em síndromes epilépticas

8
genéticas muito bem caracterizadas como ausência infantil, epilepsia mioclônica juvenil ou

epilepsia da infância com pontas centrotemporais. Exames laboratoriais, exame de líquor e outros

testes são indicados apenas em situações especiais.

9.2 ABORDAGEM DIAGNÓSTICA

Como roteiro de abordagem diagnóstica, foi desenvolvida uma estrutura de

classificação das epilepsias que permite o diagnóstico em múltiplos níveis, dependendo das

informações e recursos disponíveis, como EEG, vídeo-EEG e ressonância magnética, entre

outros. A fase preliminar é identificar o(s) eventos(s) paroxístico(s) como crise(s) epiléptica(s) e a

condição do paciente como epilepsia, pois há diagnósticos diferenciais importantes como síncope

convulsiva, eventos psicogênicos, migrânea com aura, ataque isquêmico transitório, transtornos

do movimento, entre outros. A partir daí, segue-se a evolução do diagnóstico até o nível máximo

possível:

• Nível 1 - Tipo de crise epiléptica

• Nível 2 – Tipo de epilepsia: de acordo com os tipos de crises, a epilepsia pode ser

classificada como focal, generalizada, generalizada e focal e desconhecida.

• Nível 3 – Síndrome epiléptica: se padrão clínico-eletrográfico claro conforme descrito

na proposta de classificação

• O diagnóstico da etiologia da epilepsia perpassa todos os níveis.

Com a classificação em múltiplos níveis, o clínico busca atingir o nível máximo de

precisão diagnóstica de acordo com os recursos de investigação disponíveis, entretanto, a

condição mais elementar para esse processo é o conhecimento sobre diagnóstico diferencial das

crises epilépticas, características dos tipos de crises e das síndromes epilépticas e de outras

formas de epilepsia. Nesse sentido, recursos de formação e atualização devem ser amplamente

divulgados, como, por exemplo, os cursos presenciais ou online e o site epilepsydiagnosis.org da

ILAE.

9
Figura 3. Esquema diagnóstico para a classificação das epilepsias. Os tipos de crises * denotam o início das
crises epilépticas.

10. COMORBIDADES

Há associação comum com transtornos psiquiátricos, o que prediz pior resposta

ao tratamento inicial com drogas antiepilépticas (DAE) e associa-se a um maior risco de morte.

Em estudo populacional, quase 1/3 das pessoas com epilepsia apresentaram diagnóstico de

transtorno depressivo ou ansioso, o dobro da prevalência da população geral. Também há

frequentes comorbidades somáticas que podem ser a causa da epilepsia (exemplo: doença

cerebrovascular), resultantes da epilepsia ou do tratamento om drogas antiepilépticas (exemplo:

depressão ou obesidade) ou podem dividir a mesma causa (exemplo: erros inatos do

metabolismo).

10
11. TRATAMENTO

11.1 TRATAMENTO AGUDO - Abordagem do paciente durante a crise epiléptica

Durante uma crise tônico-clônica, as principais recomendações são manter a

calma, proteger o paciente de ameaças ambientais e, após a redução dos movimentos mais

vigorosos, colocar o paciente em decúbito lateral para reduzir a chance de aspiração, e aguardar

a fase de recuperação pós-ictal. Se o indivíduo estiver sozinho, poderá ser útil procurar alguma

forma de identificação com número de contato de emergência. Lembrar que a duração total da

fase ictal tem cerca de 1 minuto e, em caso de crise prolongada ou crises reentrantes, o paciente

deve ser encaminhado imediatamente a serviço de emergência pela possibilidade de estado de

mal epiléptico.

11.2 TRATAMENTO CRÔNICO

11.2.1 PROFILAXIA DE CRISES

Estudos recentes têm demonstrado que cerca de 70% dos adultos e crianças com

epilepsia podem ter as crises completamente controladas com DAE e, após 2 a 5 anos de

tratamento bem-sucedido com o paciente livre de crises, as medicações podem ser retiradas de

forma gradual em cerca de 70% das crianças e em 60% dos adultos sem recorrência

subsequente. As taxas de resposta variam de acordo com a síndrome epiléptica, a causa

subjacente e outros fatores mas, independente de fatores prognósticos, a maioria dos pacientes

que fica livre de crises responde à primeira medicação prescrita. Apesar da maioria dos casos de

epilepsia poder ser adequadamente diagnosticados e tratados em nível de atenção primário, nos

países menos desenvolvidos cerca de ¾ dos pacientes não recebem o tratamento adequado

devido a uma combinação de fatores como a falta de acesso a profissionais médicos

adequadamente treinados e às DAE

A decisão sobre iniciar o tratamento farmacológico deve ser baseada em

avaliação cuidadosa de acordo com o risco-benefício e as preferências do paciente ou da família.

Na maioria dos casos, a ocorrência de pelo menos duas crises em intervalo superior a 24 horas

11
justifica o início do tratamento, mas também pode ser indicado após crise única em pacientes

com alto risco de recorrência.

A escolha da DAE deve levar em consideração vários fatores como: eficácia para

o tipo de crise e tipo de síndrome epiléptica, idade, sexo, perfil de efeitos colaterais, potencial de

interação medicamentosa, contraindicações, comorbidades, posologia, custo e atitudes do

paciente.

Historicamente, as DAE podem ser classificadas em três gerações. A primeira

geração (início da comercialização entre 1857 e 1958) inclui fármacos como o fenobarbital, a

fenitoína, a primidona e a etossuximida. Integram a segunda geração (início entre 1960 e 1975)

fármacos como a carbamazepina, o valproato e os benzodiazepínicos. A terceira geração (após

1980) compreende fármacos como a gabapentina, oxcarbazepina, vigabatrina, lamotrigina e

topiramato. Fármacos já estabelecidos como a carbamazepina e o ácido valpróico continuam

como opções de primeira linha e algumas novas DAE são crescentemente utilizadas como

tratamento inicial pelo bom perfil de tolerabilidade e baixo potencial de interações

medicamentosas.

Espectro de eficácia das principais DAE disponíveis no Brasil de acordo com os

tipos de crises:

1. Efetivas contra crises focais e a maioria das crises generalizadas: ácido

valpróico, benzodiazepínicos (ocasionalmente exacerbam crises tônicas, principalmente se uso

endovendoso em pacientes com síndrome de Lennox-Gastaut), fenobarbital e primidona (exceto

crises de ausência), lamotrigina (pode agravar crises mioclônicas), levetiracetam (sem eficácia

comprovada para tônicas e atônicas, melhor para crises focais, tcg primárias ou secundárias e

mioclônicas), topiramato (melhor para focal e TCG primaria e secundaria e drop attacks; sem

eficácia documentada contra ausência)

2. Efetivos contra crises focais com ou sem generalização secundária:

carbamazepina, fenitoína, oxcarbazepina, lacosamida, gabapentina e pregabalina (essas últimas

podem precipitar ou agravar crises mioclônicas), vigabatrina (espasmos epilépticos).

12
Além da escolha adequada da DAE, são princípios relevantes do tratamento

medicamentoso: identificar e corrigir fatores precipitantes (como privação de sono); investir na

monoterapia; usar a menor dose necessária para controlar as crises com reavaliações regulares e

ajustes de acordo com a ocorrência de crises ou efeitos adversos; informar o paciente e/ou

cuidador sobre a importância da adesão ao tratamento e fazer todo o esforço para usar regime

posológico conveniente.

Quando não há controle das crises epilépticas deve-se avaliar cuidadosamente a

possibilidade de não adesão, reavaliar o diagnóstico (se é epilepsia e quais os tipos de crises e o

tipo de síndrome) e considerar mudança gradual para outra monoterapia. Pacientes com crises

de difícil controle podem precisar de politerapia precoce e, nesses casos, devem ser

considerados os tratamentos alternativos como cirurgia.

Em pacientes controlados de crises pode-se considerar a descontinuação da DAE

após pelo menos dois anos de controle, mas essa decisão precisa ser individualizada levando em

consideração a visão do paciente ou familiares, efeitos colaterais da DAE em uso, fatores

prognósticos de recorrência de crises, aspectos relacionadas à direção de veículos e a outras

atividades da vida diária que podem sofrer interferência.

Critérios de resolução:

Alguém que teve diagnóstico de epilepsia sempre terá mais chances de ter crises

epilépticas do que as pessoas da população geral. Assim, seria inadequado definir “epilepsia

curada” e a nova definição da ILAE propõe o termo “epilepsia resolvida”. A epilepsia é

considerada resolvida naqueles indivíduos que tiveram uma síndrome epiléptica idade

relacionada e que já ultrapassaram a faixa etária de risco ou naqueles livres de crises há mais de

10 anos e sem uso medicações antiepilépticas há pelo menos 5 anos.

11.2.2 ABORDAGEM GLOBAL

Deve-se atentar para o contexto de vida do paciente em seus vários aspectos:

familiar, afetivo, acadêmico, profissional, econômica, de autonomia, etc. Além das consequências

13
diretas e indiretas da recorrência das crises epilépticas, a epilepsia ainda é uma condição

envolvida em considerável estigma. Considerar ações mais específicas de prevenção, diagnóstico

e tratamento das comorbidades já descritas.

12. CONCLUSÃO

A epilepsia é uma condição frequente com boas possibilidades terapêuticas na

maioria dos casos, mas potencialmente grave e com consequências biopsicossociais. A

relevância clínica e epidemiológica da epilepsia evidencia a importância do seu ensino na

graduação.

14
REFERÊNCIAS

1. Moshé SL, Perucca E, Ryvlin P, Tomson T. Epilepsy: new advances. Lancet neurology 2015; 385:

884–98

1 Thurman DJ, Beghi E, Begley CE, et al, and the ILAE Commission on Epidemiology. Standards for

epidemiologic studies and surveillance of epilepsy. Epilepsia 2011; 52 (suppl 7): 2–26.

7 Fisher RS, van Emde Boas W, Blume W, et al. Epileptic seizures and epilepsy: definitions proposed by

the International League Against Epilepsy (ILAE) and the International Bureau for Epilepsy (IBE). Epilepsia

2005; 46: 470–72.

8 Fisher R, Acevedo C, Arzimanoglou A, et al. A practical clinical defi nition of epilepsy. Epilepsia 2014; 55:

475–82.

9 Beghi E, Carpio A, Forsgren L, et al. Recommendation for a defi nition of acute symptomatic seizure.

Epilepsia 2010; 51: 671–75.

12 Berg AT, Berkovic SF, Brodie MJ, et al. Revised terminology and concepts for organization of seizures

and epilepsies: report of the ILAE Commission on Classifi cation and Terminology, 2005–2009. Epilepsia

2010; 51: 676–85

13 Hirtz D, Thurman DJ, Gwinn-Hardy K, Mohamed M, Chaudhuri AR, Zalutsky R. How common are the

“common” neurologic disorders? Neurology 2007; 68: 326–37.

14.Scheff er IE, Berkovic SF, Capovilla G, et al. The organization of the epilepsies: report of the ILAE

Commission on Classifi cation and Terminology. Available online at

http://www.ilae.org/Visitors/Centre/Documents/OrganizationEpilepsy.pdf (accessed Feb 5, 2014

15 Ngugi AK, Bottomley C, Kleinschmidt I, Sander JW, Newton CR. Estimation of the burden of active and

life-time epilepsy: a meta-analytic approach. Epilepsia 2010; 51: 883–90.

16 Newton CR, Garcia HH. Epilepsy in poor regions of the world. Lancet 2012; 380: 1193–201.

17 Ngugi AK, Kariuki SM, Bottomley C, Kleinschmidt I, Sander JW, Newton CR. Incidence of epilepsy: a

systematic review and meta-analysis. Neurology 2011; 77: 1005–12.

18 Rai D, Kerr MP, McManus S, Jordanova V, Lewis G, Brugha TS. Epilepsy and psychiatric comorbidity: a

nationally representative population-based study. Epilepsia 2012; 53: 1095–103.

19 Gaitatzis A, Sisodiya SM, Sander JW. The somatic comorbidity of epilepsy: a weighty but often

unrecognized burden. Epilepsia 2012; 53: 1282–93.

15
20. Livro tratamento medicamentoso das epilepsies da elza Marcia

21.Capitulo de eeg do uptodate

22. Documentos recentes da ILAE

23.VEpilepsydiagnosis.org

24. Scheffer IE et al. ILAE classification of the epilepsies: Position paper of the ILAE Commission for

Classification and Terminology. Epilepsia, 58(4):512–521, 2017

16

Você também pode gostar