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A Matemática e suas conexões com o Ensino
Fundamental e Médio
Ji-Paraná – RO, 26 a 28 de Outubro de 2021
ANAIS

XXI SEMANA DE MATEMÁTICA


A Matemática e suas conexões com o Ensino
Fundamental e Médio

Anais da XXI Semana de Matemática


ISBN 978-85-7764-034-8
https://www.youtube.com/channel/UCO-YG8QqvOR3J8e0l2wjq3Q/

26 a 28 de outubro de 2021
Ji-Paraná – RO – Brasil

Anais da XXI Semana de Matemática 1


ISBN 978-85-7764-034-8
A Matemática e suas conexões com o Ensino
Fundamental e Médio
Ji-Paraná – RO, 26 a 28 de Outubro de 2021
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Semana de matemática (21.: 2021: Ji-Paraná, RO)


S471a
Anais da 21ª semana de matemática, [recurso eletrônico], 26, 27,
28 outubro de 2021 / Organizadores: Emerson da Silva Ribeiro, Marlos
Gomes de Albuquerque, Jhonys Gonçalves Pinto. -- Ji-Paraná: UNIR,
2021.
146 p., il.
Disponível em: https://sematjp.unir.br
ISBN: 978-85-7794-034-8

1. Matemática. 2. Matemática – Estudo. 3. Matemática – Ensino. 4.


Educação. I. Ribeiro, Emerson da Silva. II. Albuquerque, Marlos Gomes
de. III. Pinto, Jhonys Gonçalves. IV. Título
CDU 51(05)

Bibliotecário: Bruno Crespo Soares CRB 4/2061

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COMISSÃO ORGANIZADORA DA XXI SEMAT

Atividade Responsável
Coordenação geral: Prof. Dr. Reginaldo Tudeia dos Santos
Vice coordenação: Prof. Dr. Ricardo José Souza da Silva
Comissão de Live: Juliana Valin Campos Téc Lab/Informática
Profa. Dra. Márcia Rosa Uliana
Comissão de inscrições no SIGAA:
Prof. Dr. Ricardo José Souza da Silva
Prof. Dr. Marlos Gomes de Albuquerque
Profa. Dra. Eliana Alves Pereira Leite
Coordenação Científica: Profa. Dra. Ana Fanny Benzi de Oliveira Bastos
Prof. Dr. Reginaldo Tudeia dos Santos
Profa. Dra. Lucia de Fatima de M. Brandao Dias
Prof. Dr. Enoque da Silva Reis
Ana Paula Leite Cardiliquio
Flavia de Andrade Correa
Coordenação de minicursos: Hemerson Milani Mendes
Luiz Carlos dos Reis
Fabiola Gomes de Souza
Danielly da Silva Francisco
Prof. Dr. Emerson da Silva Ribeiro
Prof. Dr. Lenilson Sérgio Candido
Salas de comunicação oral:
Prof. Ms. Carlos Alberto Almendras Montero
Profa. Dra. Marcia Rosa Uliana
Prof. Dr. Reginaldo Tudeia dos Santos
Comissão das atividades remotas Prof. Carlos Alberto Almendras Montero
(moderador e coordenação de chat): Prof. Dr. Lenilson Sérgio Candido
Juliana Valin Campos – Téc Lab/Informática
Prof. Dr. Emerson da Silva Ribeiro
Anais do evento: Prof. Dr. Marlos Gomes de Albuquerque
Prof. Jhonys Gonçalves Pinto – Egresso do curso
Prof. Dr. Lenilson Sérgio Candido
Camilla Silva de Gois – Técnica DAME
Juliana Valin Campos – Téc Lab/Informática
Equipe de divulgação: Prof. Dr. Nério Aparecido Cardoso
Prof. Dr. Ricardo José Souza da Silva
Discente Alice Vieira do Nascimento
Discente Quezia Alves Andrade
Prof. Carlos Alberto Almendras Montero
Coordenação gráfica/visual: Profa. Dra. Lucia de Fatima de M. Brandao Dias
Discente Ingryd Luana Wonczak de Paula

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COMISSÃO CIENTÍFICA – PARECERISTAS

NOME Título IES


Profa. Ana Paula Gestoso de Souza Dra. UFSCar
Prof. Angelo Alberti Dr. UFS
Profa. Dra. Carma Maria Martini Dra. UNIR/Ji-Paraná
Profa. Cristiane Talita Gromann de Gouveia Dra. UNIR/Vilhena
Profa. Érica Patrícia Navarro Dra. IFRO/Ji-Paraná
Prof. Dr. Ewerton R. Andrade Dr. UNIR/Porto Velho
Prof. Fábio dos Santos Dr. UFS/Aracajú
Profa. Fernanda Vital de Paula Dra. UFT
Prof. Flávio de Souza Pires Dr. UCA
Prof. Gilcimar Bermond Ruezzene Me. UNIVAG/Cuiabá
Prof. Gleison Guardia Me. IFRO/Ji-Paraná
Prof. Dr. Jackson Itikawa Dr. UNIR/Porto Velho
Profa. Jaquelyne Macedo Ortega Me. IFRO/Porto Velho
Prof. José Roberto Ribeiro Júnior Me. UNIR/Ji-Paraná
Prof. Dr. José Vilani de Farias Dr. IFRN
Prof. Me. Leonardo Mota de Andrade Me. IFRO/Ji-Paraná
Prof. Leonardo Rodrigues Santos Dr. IFMT
Profa. Lidiane Maria Ferraz Rosa Dra. UFV
Profa. Marcela Bonet Becher Schavaren Me. SEDUC/MT
Profa. Neidimar Vieira Lopes Gonzales Me. UNIR/Ji-Paraná
Prof. Dr. Paulo Sérgio Dutra Dr. UNIR/Ji-Paraná
Prof. Sérgio Candido de Gouveia Neto Dr. UNIR/Vilhena

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APRESENTAÇÃO

O Departamento Acadêmico de Matemática e Estatística (DAME), da Universidade Federal


de Rondônia (UNIR), Campus de Ji-Paraná, tem realizado anualmente, desde o ano de 2021, a
Semana de Matemática – SEMAT.
Este evento tem buscado promover o debate, a socialização e a divulgação para a comunidade
interessada dos trabalhos acadêmico-científicos e relatos de experiências desenvolvidos por
pesquisadores e professores da UNIR e de outras instituições educacionais nas áreas de
Educação Matemática e Matemática, contribuindo com a formação acadêmica e docente de
professores, licenciandos e pesquisadores do Estado de Rondônia, bem como com o próprio
desenvolvimento dessas áreas do conhecimento.
Em sua edição de número 21, a SEMAT deste ano de 2021, assim como ocorreu em 2020, foi
realizada totalmente de forma on-line/síncrona, em decorrência da pandemia pela Covid-19. E
o tema central do evento foi a “Matemática e suas conexões com o Ensino Fundamental e
Médio”, com o propósito de fomentar discussões e reflexões sobre a importância e o ensino
da Matemática na Educação Básica, mediadas por meio de palestras e mesas redondas com a
participação de professores e pesquisadores convidados, além da realização de minicursos e a
apresentação de comunicações orais de pesquisas e relatos de experiências
Fruto das comunicações orais e relatos de experiências submetidos à XXI SEMAT no
formato de trabalhos completos e resumos expandidos, apresenta-se estes Anais, composto
por 14 estudos, sendo 12 trabalhos completos e 02 resumos expandidos, tratando de temas da
Educação Matemática, Matemática e Estatística, de autores vinculados a diferentes
instituições locais e nacionais, a exemplo da UNIR, IFRO, PUC-RJ, UFS e SEDUC-RO.

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QUADRO GERAL DA PROGRAMAÇÃO DO EVENTO


Data ATIVIDADE/HORÁRIO RESPONSÁVEL
19h às 19h30m Abertura do evento
Palestrante: Anne Cristiny Borges, professora do ensino
Palestra 1 médio, Especialista em Educação Matemática
26 de outubro de 2021

19h30m Tema: Licenciatura em Matemática e suas aplicações no


Ensino Médio
Terça-feira,

Palestrante: Prof. Dr. André Sandmann – UFCG


Palestra 2
Tema: Matemática Acessível: a contextualização como
20h00m
ferramenta motivadora
Palestrante: Márcia Regina de Souza Silva, professora de
matemática da rede estadual de ensino, mestranda em
Palestra 3
Educação Matemática
20h30m
Tema: As interfaces da Formação Continuada e o ensino
de Matemática no Ensino Fundamental e Ensino Médio
27 de outubro de 2021

ATIVIDADE/HORÁRIO RESPONSÁVEL
Quarta-feira,

Palestrante: Prof. Dr. Fernando Guedes Cury-UFRN


Palestra 4 Tema: Matemática e suas funções no ensino fundamental
19h30m de médio.

ATIVIDADE/HORÁRIO

19h30m Mesa-redonda

Representantes de grupos de pesquisa do Departamento de Matemática e Estatística da


28 de outubro de 2021

Universidade Federal de Rondônia, Campus de Ji-Paraná:


Quinta-feira,

Grupo de Pesquisa em Modelos Estatísticos, Matemáticos e Fuzzy - MEMF,


Profª drª Vania Corrêa Mota;

Grupo de Estudo e Pesquisa em História da Educação Matemática Escolar (GEPHEME-


RO), Prof. dr. Enoque da Silva Reis.

Grupo de pesquisa Estudo e Pesquisa em Análises de Registros da Região Amazônica -


GEPARRA, Prof. dr. Nerio Aparecido Cardoso.

Grupo de pesquisa Grupo Rondoniense de Estudos e Pesquisas em Educação


Matemática - GROEPEM, Moab Marques da Silva.

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SUMÁRIO
RESUMOS EXPANDIDOS.................................................................................................................. 8

REGRESSÃO LINEAR MÚLTIPLA APLICADA EM DADOS SIMULADOS ............................ 9


AJUSTE DE MODELO DE PREDIÇÃO VIA REDES NEURAIS ARTIFICIAIS EM DADOS
SIMULADOS .................................................................................................................................. 15
TRABALHOS COMPLETOS ........................................................................................................... 21

A INSERÇÃO E EVOLUÇÃO DAS TECNOLOGIAS DIGITAIS NO ENSINO-


APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA ....................................................................................... 22
BREVE HISTÓRIA, SIGNIFICADOS E CARACTERÍSTICAS DA TENDÊNCIA RESOLUÇÃO
DE PROBLEMAS MATEMÁTICOS ............................................................................................. 30
CONTRIBUIÇÕES DA METODOLOGIA DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS
MATEMÁTICOS PARA O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM: POR MEIO DA
APLICAÇÃO DE UM PROJETO NO ENSINO MÉDIO............................................................... 43
ETNOMATEMÁTICA: HISTÓRIA E RELAÇÃO COM O ENSINO E APRENDIZAGEM DA
MATEMÁTICA............................................................................................................................... 55
ETNOMATEMÁTICA, DECOLONIALIDADE E INTERCULTURALIDADE CRÍTICA:
PRESSUPOSTOS CONVERGENTES PARA A EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA ............. 67
SOBRE O MODELO DOS CAMPOS SEMÂNTICOS E AS TESES ORIENTADAS POR
ROMULO CAMPOS LINS ............................................................................................................. 79
PALESTRA: A MULHER NEGRA E A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ..................................... 89
ASPECTOS HISTÓRICOS DA FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DEPROFESSORES
QUE ENSINAM MATEMÁTICA .................................................................................................. 96
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES
QUE ENSINAM MATEMÁTICA ................................................................................................ 107
O ENSINO DO CÁLCULO: ASPECTOS HISTÓRICOS E ATUAIS ......................................... 117
AS EQUAÇÕES DO MOVIMENTO DO PÊNDULO ESFÉRICO POR MEIO DA MECÂNICA
LAGRANGIANA .......................................................................................................................... 126
ESTUDO ANALÍTICO DO PROBLEMA RESTRITO DOS TRÊS CORPOS ........................... 135

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RESUMOS EXPANDIDOS

Anais da XXI Semana de Matemática 8


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REGRESSÃO LINEAR MÚLTIPLA APLICADA EM DADOS SIMULADOS

Rebeca Klamerick Lima Oliveira


Fundação Universidade Federal de Rondônia
rebecakla@gmail.com

Melquisadec de Souza Oliveira


Fundação Universidade Federal de Rondônia
melquisadec.oliveira@gmail.com

Laís Mayara Azevedo Barroso


Fundação Universidade Federal de Rondônia
lais.barroso@unir.br

Gabi Nunes Silva


Fundação Universidade Federal de Rondônia
gabi.silva@unir.br

Resumo:
Este trabalho teve como objetivo predizer a produção de café com base nas características morfológicas,
utilizando regressão linear múltipla (RLM), em dados simulados. A estimação dos parâmetros foi realizada
através do método dos mínimos quadrados. Os resultados demonstraram que 68,62% da variação da variável
produção é explicada pelas variáveis independentes. Além disso, ao realizar os métodos de seleção Forward,
Backward e Stepwise, o melhor modelo ajustado foi o modelo com todas as variáveis independentes utilizadas.
Entretanto, o modelo de RLM possui alguns pressupostos, os quais devem ser atendidos que são normalidade
dos resíduos, a autocorrelação dos resíduos, a multicolinearidade e a homocedasticidade. A normalidade diz
respeito sobre os dados seguirem uma distribuição normal e a homocedasticidade resulta nas variâncias dos
resíduos serem constantes. Neste estudo os dados não seguem uma distribuição normal e não possuem uma
variância constante sendo assim recomenda-se a utilização de outras metodologias como redes neurais artificiais
ou regressão quantílica.
Palavras-chave: Regressão linear múltipla; simulação; pressupostos do modelo; seleção de variáveis.

1. Introdução

A teoria da regressão teve início com Francis Galton em 1886. Ele resolveu estudar a
relação entre a altura dos pais e a altura dos filhos, ou seja, uma variável dependente (Yi) e
outra variável independente (Xi), querendo saber se a altura do pai influenciava a altura do
filho. Neste estudo, Galton percebeu que independentemente do pai ser alto ou baixo, a altura
do filho teria uma tendência a média. A relação entre uma variável dependente e uma ou mais
variáveis independentes dá-se o nome de regressão (MAROCO, 2003).

Através modelo de regressão linear é possível predizer um valor para a variável


dependente por meio de duas ou mais variáveis independentes. Esta predição é realizada por
meio da estimação dos parâmetros, tendo por base o modelo e os dados observados. Além
disso, através da seleção de variáveis pode-se trabalhar com modelos que apresentem
variáveis significativas.

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Um modelo de regressão muito utilizado é a regressão linear múltipla (RLM). A RLM


estuda a relação entre uma variável dependente e duas ou mais variáveis independentes
(HAIR et al., 2009), sendo aplicada em qualquer área que se deseja analisar esta relação.
Pallant (2007) afirma que RLM podem ser usadas para explorar a relação entre uma variável
dependente contínua e um número de variáveis independentes (PALLANT, 2007). Desta
forma, o modelo de regressão é utilizado como uma ferramenta estatística para resumir dados
e informação.

Haja visto o que é uma análise de regressão, e sendo possível aplicá-la em qualquer
área que se deseja estudar a relação entre uma variável dependente e duas ou mais variáveis
independentes, este trabalho teve por objetivo ajustar um modelo de regressão linear múltiplo
para a predição de parâmetros em dados simulados com base nas características do café.

2. Materiais e métodos

Como neste trabalho, o conjunto de dados estudado envolve mais de uma variável
independente, a metodologia utilizada foi a regressão linear múltipla. O modelo geral de uma
regressão linear múltipla com k variáveis independentes é dado por (CHARNET et al., 2008):

, i = 1, 2, ..., n

em que: é a variável dependente; são as variáveis independentes; é o erro


aleatório; são os parâmetros da regressão a serem estimados.

A estimação dos parâmetros foi realizada por meio do método dos mínimos quadrados.
Essa metodologia permite encontrar uma reta que minimiza a distância entre os pontos
observados e a reta ajustada. Quando se trata de k variáveis independentes como é o caso da
RLM se torna inviável ter uma única equação para estimar os parâmetros, porém utiliza-se a
álgebra linear para reescrever o modelo na forma matricial, sendo assim possível aplicar o
método dos mínimos quadrados (MAROCO, 2003). O modelo na forma matricial é dado por
Y = Xβ + ε, em que: Y é um vetor coluna das observações com dimensões n x 1, X é uma
matriz n × (k + 1) das variáveis independentes, β é um vetor coluna dos parâmetros que se
quer estimar com dimensões (k + 1) × 1 e ε é um vetor coluna dos resíduos com dimensões n
× 1. A equação de mínimos quadrados para estimar os parâmetros de um modelo de regressão
linear múltipla é .

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Depois de estimar os parâmetros e ajustar o modelo, pode-se realizar a análise de


variância (ANOVA). A ANOVA é uma forma de resumir as informações do modelo de
regressão linear múltipla, testar a significância dos estimadores obtidos e encontrar a
estimativa de . Para isso se faz necessário definir as somas de quadrados, tal como descrito
por Morais (2010).

A qualidade de ajuste do modelo foi verificada por meio dos valores do coeficiente de
determinação: e coeficiente de determinação ajustado, .

Draper e Smith (1998) definem o R2 como uma medida estatística de ajuste do modelo
estimado. O coeficiente de determinação ajustado, por sua vez, é um coeficiente que penaliza
a inclusão de variáveis poucas explicativas no modelo (MAROCO, 2003). Quanto maior for o
R2 melhor será o modelo estimado.

Para ajustar um modelo de regressão linear múltipla alguns pressupostos devem ser
atendidos. Dentre eles, destacam-se: a normalidade dos resíduos, a autocorrelação dos
resíduos, a multicolinearidade e a homocedasticidade (CORRAR et al., 2012). Caso estes
pressupostos não sejam atendidos, recomenda-se aplicar outra metodologia. Para avaliar a
normalidade dos resíduos, nesse estudo utilizou-se o teste de Shapiro-Wilk (MAROCO,
2003). A homoscedasticidade no modelo exige que a variância dos resíduos seja igual a σ2 ,
ou seja, que a variância seja constante. Esse pressuposto foi verificado através do teste de
Breusch-Pagan (GUJARATI; PORTER, 2011). Outro pressuposto que deve ser avaliado é a
multicolinearidade. Esta diz respeito sobre o quanto às variáveis do modelo estão
correlacionadas, sendo medida pelo teste do Fator de Variância Inflacionária (FVI) (BERK,
1977): , i = 1, 2, ..., k, em que: k é o número das variáveis independentes; éo

coeficiente de correlação múltipla. Se o FVI for igual a 1 indica ausência de


multicolinearidade e se FVI maior que 5 então há presença de multicolinearidade.

Para verificar a autocorrelação dos resíduos pode-se utilizar o teste de Durbin Watson
(CORRAR et al., 2012), pois ele verifica se as variáveis são independentes. Se o teste der
entre 1 e 3 então as variáveis são independentes e possuem autocorrelação, caso contrário, as
variáveis são dependentes e não há correlação.

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Em algumas situações, além do não atendimento aos pressupostos, nem todas as


variáveis independentes incluídas no modelo são significativas, ou seja, nem todas exercem
influência na variável resposta. Sendo assim, existem vários procedimentos e critérios
utilizados para a seleção de variáveis. Nesse estudo utilizou-se os modelos Backward,
Forward e Stepwise para seleção de variáveis em RLM.

2.1. Dados simulados e recursos computacionais

Os dados foram simulados com base em um delineamento em blocos casualizados


com 130 genótipos, 4 repetições e 6 variáveis, considerando os parâmetros estatísticos de
média e variância da cultura de café canéfora, segundo Spinelli et al. (2018). Para simulação
da população foi utilizado o software Genes (CRUZ, 2016) e para ajuste do modelo de RLM o
software R (R CORE TEAM, 2021).

3. Resultados e discussões

No modelo ajustado foi considerada como variável dependente a produção em sacas


beneficiadas por hectare e as outras cinco variáveis foram consideradas independentes. A
tabela 1 apresenta as estimativas dos coeficientes, seus respectivos erros padrões e o p-valor
para cada variável analisada. Observa-se que as variáveis V2 e V4 não foram significativas
considerando um nível de significância de 5%, sendo assim essas variáveis são iguais a zero
estatisticamente. O coeficiente R2 ajustado de 0,6862 demonstra a parcela total que é
explicada pela variável dependente na regressão, ou seja, em média 68,62% das variações da
variável dependente são explicadas pelas variáveis independentes.

Tabela 1. Regressão Linear Múltipla

Variáveis Coeficiente Std. Error t-Statistica Prob.


Intercepto -222,20 25,51 -8,71 0,00000
V1 0,43 0,10 4,48 0,00005
V2 21,30 11,37 1,87 0,06337
V3 2,09 0,54 3,89 0,00016
V4 4,80 3,31 1,45 0,14939
V5 4,01 0,60 6,63 0,00000
Fonte: Elaboração própria.

A equação que representa o modelo de regressão linear múltipla ajustada,


considerando as variáveis que foram significativas na Tabela 1, é dada por:

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Y= -222,20 + 0,43*V1 + 2,09*V3 + 4,01*V5

A variável de maior influência no modelo é a variável V5, pois a cada unidade que
aumenta na variável V5 aumenta, em média, 4,01 no modelo ajustado e variável com menor
influência é a variável V1, pois a cada unidade que aumenta na variável V1 aumenta, em
média, 0,43 no modelo estimado.

Após a estimativa do modelo, testou-se as pressuposições do modelo de regressão.

A multicolinearidade se trata de quando uma variável independe está altamente


correlacionada com outras variáveis independentes do modelo estimado, sendo assim difícil
estimar o quanto cada variável está explicando este modelo. A multicolinearidade foi testada
por meio do Fator de Variância Inflacionária (FVI) e os resultados seguem apresentados na
Tabela 2.

Tabela 2. Multicolinearidade
Variáveis Teste FVI
V1 1,93
V2 1,90
V3 1,97
V4 1,19
V5 1,40
Fonte: Elaboração própria.

O teste FVI mostrou que não há presença de multicolinearidade, pois os valores são
menores que 2, ou seja, as variáveis independentes do modelo não estão altamente
correlacionadas entre si.

O Teste de Durbin Watson foi aplicado e indicou independência e autocorrelação entre


as variáveis (DF=1,45) considerando o nível de significância igual a 5%.

A fim de verificar a normalidade e a homoscedasticidade, foram utilizados os testes de


Shapiro-Wilk e Breusch-Pagan, respectivamente. Os resultados obtidos nos testes indicaram,
considerando um nível de 5% de significância, que as variáveis independentes (V1 a V5) não
seguem uma distribuição normal e não são homoscedásticas, ou seja, não possuem variância
comum, evidenciando que o modelo RLM adotado não é o mais adequado para os dados
simulados neste estudo.

Aplicando os métodos de seleção de variáveis backward, forward e stepwise têm que


todas as variáveis independentes fazem parte do modelo. Logo o modelo segue abaixo:

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Y= -222,20 + 0,43*V1 + 21,30*V2 + 2,09*V3 + 4,80*V4 + 4,01*V5

4. Conclusão

O modelo foi ajustado por regressão linear múltipla que obteve um R2 ajustado bom,
porém o modelo não é indicado, pois não atendeu os pressupostos de normalidade e
homocedasticidade, sendo assim recomenda-se o uso de outras metodologias como redes
neurais artificiais ou regressão quantílica.

5. Referencias

BERK, K. N. Tolerance and condition in regression computations. Journal of the


American Statistical Association, v. 72, p. 863-866, 1977.

CHARNET, R.; FREIRE, C. A. L.; CHARNET, E. M. R.; BONVINO, H. Análise de


modelos de regressão linear: com aplicações. 2. ed. Campinas, São Paulo: Unicamp, 2008.

CORRAR, L. J.; PAULO, E.; DIAS FILHO, J. M. Análise multivariada para os cursos
de administração, ciências contábeis e economia.1. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

CRUZ, C.D. Genes Software – extended and integrated with the R, Matlab and Selegen. Acta
Scientiarum. v.38, n.4, p. 547-552, 2016.

DRAPER, N.R.; SMITH, H. Applied regression analysis. 3. ed. New York: John Wiley e
Sons, 1998.

GUJARATI, D. N.; PORTER, D. C. Econometria básica. 5. ed. Porto Alegre: AMGH, 2011.

HAIR Jr., J.; ANDERSON, R.; TATHAM, R.; BLACK, W. Multivariate data analysis. 17
ed. Prentice-Hall, 2009.

MAROCO, J. Análise Estatística: Com utilização do SPSS, 2. ed. Lisboa: Sílabo, 2003.

MORAIS, N. F. Análise de regressão linear com estudo de caso em acidentes de trânsito.


Monografia de TCC. Universidade Estadual da Paraíba: Campina Grande, 2010.

PALLANT, J. SPSS Survival Manual: A Step by Step Guideto Data Analysis using SPSS
for Windows. Open University Press: New York, 2007.

R CORE TEAM. R: A language and environment for statistical computing. Vienna: R


Foundation for Statistical Computing, 2021. Available at: ˂https://www.R-project.org/˃.

SPINELLI, V.M.; MORAES, M. S.; ALVES, D. S. B.; ROCHA, R. B.; RAMALHO, A. R.;
TEXEIRA, A. L. Contribution of agronomic traits to the coffee yield of Coffeacanéfora Pierre
ex A.Froehner In the western Amazon region. Coffee Science, Lavras, v.13, n.3, p.333-340,
Jul/Set.2018.

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AJUSTE DE MODELO DE PREDIÇÃO VIA REDES NEURAIS ARTIFICIAIS EM


DADOS SIMULADOS

Melquisadec de Souza Oliveira


Fundação Universidade Federal de Rondônia
melquisadec.oliveira@gmail.com

Rebeca Klamerick Lima


Fundação Universidade Federal de Rondônia
rebecakla@gmail.com

Gabi Nunes Silva


Fundação Universidade Federal de Rondônia
gabi.silva@unir.br

Laís Mayara Azevedo Barroso


Fundação Universidade Federal de Rondônia
lais.barroso@unir.br

Resumo:
O agronegócio é uma atividade de grande importância na economia brasileira e modelos de predição de
produção se tornaram essenciais para este seguimento. Neste estudo apresenta-se uma aplicação da metodologia
de inteligência computacional de Redes Neurais Artificias para fins de ajuste de modelo de predição. A Rede
Neural Artificial consiste em um modelo não linear que pode ser aplicado a diversas áreas de conhecimento,
incluindo estudos de predição, e seu grande diferencial quando comparada a outros modelo é a capacidade de
aprender e generalizar o conhecimento, além da não exigência de pressupostos. Foram simulados 130 genótipos
sob o delineamento de blocos casualizados com 4 repetições e 6 variáveis com base em parâmetros estatísticos
de média e variância da cultura de café canéfora. A Rede Neural Artificial ajustada foi a Perceptron de
multicamadas (MLP) com algoritmo de treinamento de retropropagação dos erros (Rprop+). A melhor rede
obtida apresentou um coeficiente de determinação (R2) de 94,85% na fase de treinamento e R2 de 83,47% na fase
de validação do modelo. A variável V5 exerce maior importância relativa sobre a variável dependente V1. Os
resultados demostraram o bom desempenho das redes MLP para ajuste de modelo de predição da variável
dependente considerando características das variáveis preditoras.
Palavras-chave: Inteligência computacional; Simulação; Modelos de predição; Agronegócio.

1. Introdução

O agronegócio brasileiro tem se destacado pelo seu crescimento nas últimas décadas. Segundo
Abrahan et. al, (2019), este seguimento correspondeu a 44,1% das exportações brasileiras. Com o
aumento da demanda de produtos agrícolas, há necessidade cada vez maior de estudos que
possibilitem previsões futuras, e neste sentido, a estatística é uma ciência que possui ferramentas
capazes de suprir esta necessidade (SILVA et al., 2019). Por meio da modelagem estatística, é possível
estimar a produção de cada cultura levando em consideração características morfológicas e a partir de
então selecionar quais destas características influenciam e auxiliam na maximização do potencial
produtivo de cada cultivar (MAMBRIN et al., 2015).

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O modelo de regressão linear é comumente utilizado para descrever a relação estatística entre
uma ou mais variáveis preditoras e a variável resposta (HOFFMANN, 2016). Na agricultura, esse
modelo é utilizado por exemplo para predizer o desenvolvimento de frutos com base em características
como altura, peso, diâmetro do fruto (SILVA et al., 2019). No entanto, o modelo de regressão linear
possui pressuposições como relação linear, normalidade, homoscedasticidade e independência
(HOFFMANN, 2016). Haja visto o não cumprimento das pressuposições do modelo uma solução
tangível é o uso de modelos alternativos não lineares.

Neste sentido, alguns autores têm proposto o uso de metodologias baseadas em Inteligência
Computacional como as Redes Neurais Artificiais (RNA) (CRUZ; NASCIMENTO, 2018). As RNAs
são modelos de inteligência computacional não lineares, capazes de aprender e generalizar o
conhecimento adquirido, sendo assim uma alternativa para ajuste de dados não lineares eficiente
(SOARES et al, 2015).

Diante do exposto supracitado, o objetivo deste trabalho é propor o ajuste de modelo de dados
simulados por meio da RNA, para fins de predição da variável resposta em função das variáveis
preditoras, como forma alternativa aos modelos convencionais.

2. Materiais e métodos

Redes Neurais Artificiais são modelos interativos capazes de aprender. Haykin (2001) define a
Rede Neural Artificial (RNA) como um processador massivo e paralelo constituído de pequenas
unidades denominadas neurônios, capazes de aprender e generalizar o conhecimento. A primeira RNA
proposta foi desenvolvida de forma análoga a rede biológica. As Redes biológicas, comumente
conhecidas como Sistema Nervoso, são compostas de aproximadamente 10 bilhões de neurônios. Cada
neurônio possui uma camada de entrada denominada dendrito, um núcleo celular, um axônio por onde
propaga o sentido do impulso nervoso e as sinapses que são responsáveis pelas comunicações dos
impulsos para outros neurônios (CRUZ; NASCIMENTO, 2018).

A RNA por sua vez, tem as camadas de entrada em analogia aos dendritos, os pesos
associados que representam as sinapses, um combinador linear e por fim uma função de ativação
associada para que uma saída seja produzida (CRUZ; NASCIMENTO, 2018).

Para o ajuste do modelo neural é preciso definir a arquitetura da rede, treinamento e validação
(HAYKIN, 2001). A arquitetura refere-se à quantidade de camadas e quantidade de neurônios por
camada que será utilizada na rede. Neste trabalho foram testados de um a duas camadas ocultas, com
um a cinco neurônios por camada.

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A segunda etapa consiste em treinar a RNA. Para esta fase, a literatura sugere que se destine
60% a 80% dos dados para treinamento (SILVA et al., 2010). A rede é então alimentada e o sinal se
propaga para frente (foward) até a saída. Nessa etapa, o algoritmo de aprendizagem relaciona o valor
calculado pela rede com uma saída desejada, de modo que se a diferença entre a saída calculada e a
desejada não estiver dentro do erro pré-estabelecido, o algoritmo realimenta a rede no sentido
contrário (backward) e retorna os valores reajustando os pesos sinápticos associados. Este processo
ocorre até que o erro seja o menor possível ou até que se complete o número de ciclos definido pelo
pesquisador, finalizando assim o treinamento da rede. Os algoritmos de treinamento testados neste
trabalho foram Rprop+, Rprop- (resilient backpropagation com e sem realimentação dos pesos,
respectivamente) e SLR (algoritmo de convergência global modificado). A terceira etapa consiste na
validação da rede. Este processo é realizado com os 40% ou 20% dos dados não utilizados na fase de
treinamento ou com os dados reais, caso o treinamento tenha sido realizado com outro conjunto de
dados. É na etapa de validação que a qualidade do ajuste é avaliada (HAYKIN, 2001).

Para este trabalho utilizou-se dados simulados. Foram simulados 130 genótipos sob o
delineamento de blocos ao acaso com 4 repetições e 6 variáveis com base em parâmetros estatísticos
de média e variância da cultura de café canéfora, segundo Spinelli et al. (2018). A variável V1
caracterizou a variável dependente e as demais (V2 a V6) foram consideradas variáveis independentes.
O conjunto de dados foi subdivido em duas partes, sendo 60% (78 observações) destinado para
treinamento da rede e 40% (52 observações) para validação.

Para o ajuste do modelo utilizou se o pacote neuralnet (FRITSCH et al., 2019) executado no
software R no modo integração com o software GENES (CRUZ, 2016; R Core Team, 2021).

3. Resultados e Discussões

Para a obtenção da melhor rede adotou-se taxa de erro quadrático médio de 0,01 e ciclo de
convergência de 10 mil épocas. A melhor configuração de rede obtida constituiu-se de uma camada
oculta com quatro neurônios. Utilizou-se o algoritmo de aprendizado Rprop+ e a função de ativação
adotada foi a função logistic. A figura 1 demostra a topologia da rede utilizada.

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Figura 1: Configuração da melhor RNA obtida. Valores em


preto indicam os pesos associados a cada neurônio das camadas
ocultas. Valores em azul indicam os interceptos.
Fonte: Próprio autor.

A melhor rede foi avaliada por meio dos valores obtidos para o coeficiente de determinação
(R ) e para a raiz do erro quadrático médio (REQM). O R2 é uma medida estatística utilizada para
2

verificar a qualidade do ajuste do modelo, o REQM por sua vez, indica o quanto o modelo ajustado é
capaz de predizer o valor esperado. Na Tabela 1 estão apresentados os resultados obtidos para a rede
neural ajustada.

Tabela 1- Valores de R2 obtidos pelo modelo de RNA adotado para as etapas de treinamento e validação
Modelo RNA R2 REQM
Treinamento 92,68% 0,429
Validação 85,63% 0,506
Fonte: Próprio autor.

Como apresentado na Tabela 1, no modelo de RNA proposto obteve-se um R2 = 92,68% para


a etapa de treinamento e R2 = 85,63% para a etapa de validação. Tais valores, considerando a
simulação baseada em dados de café, evidenciam a eficácia das redes neurais para ajuste de modelo de
dados simulados baseados em tal cultura. O mesmo se pode concluir ao se observar os baixos valores
de REQM (Tabela 1).

Os resultados obtidos corroboram com os resultados obtidos por outros autores. Mendonça et
al. (2018), estimaram a altura total de Ypê Felpudos utilizando o modelo de regressão e RNA. Os

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modelos obtiveram um R2 de 65% para o ajuste de regressão e 72% para o ajuste de RNA. O bom
desempenho das redes neurais artificiais também foi constatado por Lopes et al. (2020), que utilizaram
o modelo ajustado para estimar volume de madeira khaya ivorensis (mogno africano) e obtiveram um
R2 de 99% para a RNA.

O gráfico abaixo (Figura 2) mostra a importância relativa média (IR) que cada variável
independente simulada neste estudo exerce sobre a variável V1.

Figura 2: Importância relativa média IR(%) das variáveis


independentes V2 a V6 sobre a variável dependente V1.
Fonte: Próprio autor.

Pelo gráfico acima, verifica-se que pela RNA obtida neste estudo, a variável V5 é a variável
que exerge maior influência sobre V1, com IR(%) = 23,10, seguida pelas variáveis V6 e V2, com
IR(%) = 22,79 e IR(%) = 22,36 respectivamente.

4. Considerações finais

Os resultados obtidos demostram a viabilidade da utilização do modelo de redes neurais


artificiais para ajuste de modelos de predição de variáveis dependentes em função das variáveis
preditoras em dados simulados.
Recomenda-se também o uso deste modelo para trabalhos futuros em dados reais.

5. Referências

ABRAHAM, E, R.; et.al.; Estimativa da produção de soja brasileira utilizando redes neurais
artificiais. Revista Agrarian, São Paulo, v.12, n44, p261-271, maio.2019.

CRUZ, C.D. Genes Software – extended and integrated with the R, Matlab and Selegen. Acta
Scientiarum. v.38, n.4, p.547-552, 2016.

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CRUZ, C.D.; NASCIMENTO, M. Inteligência Computacional aplicada ao melhoramento


genético. 1 ed. Viçosa: UFV, 2018.

FRITSCH, S.; GUENTHER, F.; WRIGHT, M, N. Neuralnet: Training of Neural


Networks. R package version 1.44.2, 2019. Disponivel em < https://CRAN.R-
project.org/package=neuralnet> Acesso em: 24. Ago. 2021

HAYKIN, S. Redes neurais: princípios e prática. 2 ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.

HESS, F, A.; et al. Aplicação dos modelos lineares generalizado para estimativa do crescimento em
altura. Brazilian jornal of Forestry Research, colombo, v.35, n.84, p.427-433, out/Dez., 2015

HOFFMANN, R. Análise de regressão: uma introdução à econometria [recurso eletrônico]. 5. Ed.


Piracicaba: O Autor, 2016. 393 p.

LOPES, S.S.L.; et al. Uso de regressão e redes neurais artificiais na estimativa do volume de Khaya
ivorensis. Ciência da madeira. V.11, n.2, p74-84, Jul.2021.

MENDONÇA, A.R.; et al. Estimação da altura total de arvores de ipê felpudo utilizando modelos de
regressão e redes neurais artificiais. Revista Brasileira de Biometria. Lavras, v.36, n.1, p.128-139,
2018.

MAMBRIN, R, B.; et al. Seleção de linhagem de feijão (Phaseolus vulgaris L.) baseada em caracteres
morfológicos, fenológicos e de produção. Revista de Agricultura. v.90, n.2, p.141-155, Out.2015.

PALANDRI, A.G.; COGO, F.R. Redes neurais e sua confiabilidade e desempenho em períodos
instáveis –aplicação a ações ordinárias petr3. Journal of Exact Sciences – JES, Maringá, v.3, n.1,
p.09-16, Out/Dez.2014.

R CORE TEAM (2019). R: A language and environment for statistical computing. R Foundation for
Statistical Computing, Vienna, Austria. Disponível em:< https://www.R-project.org/.> último acesso:
25 de Agosto de 2021.

SPINELLI, V.M.; et.al. Contribution of agronomic traits to the coffee yield of Coffea canéfora Pierre
ex A. Froehner In the western Amazon region. Coffee Science, Lavras, v.13, n.3, p.333-340,
Jul/Set.2018

SILVA, I N.; SPATTI, D.H.; FLAUZINO, R. A. Redes neurais artificiais: para engenharia e
ciências aplicadas. 2.ed. São Paulo: Artliber, 2010.

SILVA, R.B.Z.; et al. Previsões da soja no estado de Matogrosso a partir de modelos Baseados em
series temporais. Brazilian Journal of Production Engineering, São Mateus, p.67-81, Jan/Fev.2019.

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TRABALHOS COMPLETOS

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A INSERÇÃO E EVOLUÇÃO DAS TECNOLOGIAS DIGITAIS NO ENSINO-


APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA

Danielly da Silva Francisco


Fundação Universidade Federal de Rondônia
silvadanielly13@gmail.com

Maycon Santos de Souza


Fundação Universidade Federal de Rondônia
mayconjp87@gmail.com

Enoque da Silva Reis


Fundação Universidade Federal de Rondônia
enoque.reis@unir.br

Rudson Carlos da Silva Jovano


Fundação Universidade Federal de Rondônia
carlosrudson@hotmail.com

Resumo:
Esse artigo apresenta a importância das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) no processo
de ensino-aprendizado da matemática. Ainda a pesquisa explicita as quatro fases das Tecnologias Digitais (TD)
organizada por Borba, Silva, Gadanidis (2020). Essas fases ou momentos são divididos de acordo com as
mudanças das TD e seu uso no ensino da matemática. Também apresentamos como a Secretaria de Educação do
Estado de Rondônia (SEDUC/RO) tem se organizado com projetos para o incentivo do uso das tecnologias por
professores. Este trabalho tem como objetivo apontar as fases das TD, na educação matemática, e sua história
cronológica junto a matemática, argumentando com a história das TD no Brasil desde 1980 até os dias atuais.
Para fundamentar o artigo foram usadas citações de Miguel, Miorim (2011); Borba, Penteado (2017), Kenski
(2012); Moran (2012); Bacich, Moran (2018); Bacich, Tanzi Neto, Trevissani (2015); Levy (1993); Borba,
Malheiros, Amaral (2011), entre outros. Com a discussão realizada é possível afirmar a importância das TD nos
processos formativos do ensino-aprendizagem da matemática, na qual os softwares matemáticos e “não-
matemáticos” possibilitam a compreensão da matemática, possibilidades essas que são apontadas por vários
autores em suas obras, incitando os professores a usarem em suas aulas, como está sendo incentivado pela
SEDUC/RO. Além disso, o assunto abordado permite a realização de novas pesquisas, partindo de novas
interrogações, mostrando assim a relevância do tema e compreensão dele no nosso contexto pandêmico.
Palavras-chave: Educação Matemática; Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC);
Tecnologias Digitais (TD).

1. Introdução

No cenário atual, as instituições de ensino, principalmente as de educação básica, têm


passado por diversos desafios. A Covid-19 não apenas mudou a forma como exercemos a
nossa função de professores, mas as nossas relações sociais como um todo. Tivemos que nos
adaptar a essa nova realidade, aumentando, dessa maneira, o uso das tecnologias digitais,
alterando as rotinas escolares.

Porém, é importante ressaltar que as Tecnologias Digitais de Informação e


Comunicação (TDIC) já estavam presentes na escola antes da pandemia. Elas já eram

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pesquisadas como ferramentas de ensino pela Educação Matemática no processo de ensino e


aprendizagem (GARNICA; SOUZA, 2012).

Podemos observar que na história da Educação Matemática no Brasil temos as


Tendências em Educação Matemática e as tecnologias compõem um papel importante. Sobre
isso, Borba, Silva e Gadanidis (2020) dividem as tecnologias digitais (TD) criadas ou não
para o ensino da matemática em quatro fases, ou momentos. Estas fases são organizadas
segundo as modificações das TDIC como: os avanços da internet, a velocidade da navegação
e as melhorias das interfaces dos softwares. Essas fases serão melhor discutidas na
fundamentação teórica.

Na prática, as fases aliadas à história e aos conhecimentos matemáticos podem levar


os alunos a compreender a matemática como criação humana; fazer conexões com outras
áreas; compreender as necessidades humanas; a curiosidade pelo desconhecido; mudanças nas
percepções e pensamento matemático (MIGUEL; MIORIM, 2011). Em síntese, as TDIC e seu
desenvolvimento ao longo do tempo traz relevância para o conhecimento histórico-
matemático para o ensino e aprendizagem.

Os órgãos governamentais têm se preocupado com o uso das tecnologias em sala de


aula, tanto que a BNCC (BRASIL, 2018) destaca a importância do uso de software para o
desenvolvimento da autonomia do aluno, favorecendo assim o pensamento e reflexões nas
resoluçãos de problemas, atividades, raciocínio lógico, concentração, entre outras ações. As
TDIC são maneiras de desenvolver a cognição no aluno.

Com a estima das TDIC nas influências do cotidiano, buscamos explicitar as quatro
fases e apontar projetos desenvolvidos na Secretaria de Educação de Rondônia, nas
possibilidades do uso no processo de ensino-aprendizagem da matemática.

2. As Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação e a Educação Matemática

Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC), termo utilizado para


referir ao conjunto de aplicações tecnológicas e seus equipamentos que tem interface digital.
As TDIC englobam a tecnologia digital (TD), baseada em dados e aplicações de números
binários 0 e 1 (BORBA; PENTEADO, 2017). Eles são usados para a criação de aplicativos,
sistemas, sites, entre outros, sendo “possível informar, comunicar, interagir e aprender”
(KENSKI, 2012, p. 31).

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As tecnologias nos trazem mobilidade, seja para realizar atividades do cotidiano, seja
para nos comunicarmos, realizar entretenimento, entre outras. De modo geral, as TD estão
presentes na realidade das pessoas e são combinadas à história da Educação Matemática e no
processo da criação de tecnologias voltadas para o ensino de matemática.

Com o avanço das tecnologias para o ensino da matemática, educadores têm


compreendido a relevância da TDIC na educação. Moran (2012, p. 90) articula que, “as
tecnologias são meio e apoio, mas com o avanço das redes, da comunicação em tempo real e
dos portais de pesquisa, transformaram-se em instrumentos fundamentais para a mudança na
educação”. Essas tecnologias permitem que os conteúdos sejam ensinados de modos
diferentes; possibilitam a mudança de compreensão e o desenvolvimento do pensamento
crítico, além de proporcionarem um maior protagonismo e participação do aluno; integram
diferentes áreas do conhecimento; fomentam mudanças inovadoras nas aulas, como
flexibilidade e novos modelos de aula, como o ensino híbrido, entre outras modificações
(MORAN, 2012; BACICH, MORAN, 2018; BACICH, TANZI NETO, TREVISANI, 2015).

Mas as tecnologias, de modo geral, não são apenas a internet ou os aparelhos digitais.
Conforme nos aponta Levy (1993), o lápis-e-papel também é considerado como uma
ferramenta da tecnologia que está presente na memória e na oralidade das pessoas,
principalmente quando falamos da educação escolar e do ambiente acadêmico. Ao longo da
carreira profissional, os professores têm se apropriado das TDIC, ao passo que elas também
vão se transformando. Por isso a importância de estarmos atualizados com essas mudanças.

Outra questão muito importante, conforme aponta Borba e Penteado (2017), é que o
conhecimento está associado ao coletivo formado por seres-humanos-com-tecnologias, sendo
uma interação do humano com as tecnologias. Em outras palavras, o professor deve perceber
o impacto das TDIC em sua prática de ensino e estar atento sobre [...] “como a matemática se
constitui quando novos atores se fazem presentes em sua investigação” (BORBA;
PENTEADO, 2017, p. 49).

Observando o nosso contexto atual, Bacich e Moran (2018, p. 11) afirmam que

As tecnologias em rede e móvel e as competências digitais são componentes


fundamentais de uma educação plena. Um aluno não conectado e sem domínio
digital perde importantes chances de se informar, de acessar materiais muito ricos
disponíveis, de se comunicar, de se tornar visível para os demais, de publicar suas
ideias e de aumentar sua empregabilidade futura.

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Se tratando das tecnologias como propostas pedagógicas, os alunos têm a


oportunidade de compreender a aplicabilidade da matemática, sendo que a matemática passa
de abstrata para concreta, com o uso das TDIC. Sobre o “acesso à informática em geral e à
internet, em particular, tem se tornado algo tão importante quanto garantir lápis, papel e livros
para todas as crianças” (BORBA; MALHEIROS; AMARAL, 2011, p. 19).

3. As Quatro Fases das Tecnologias Digitais no Ensino-Aprendizagem da Matemática.

Borba, Silva e Gadanidis (2020) trazem uma divisão das TD e apresentam quatro fases
usadas para o ensino de matemática no Brasil. Essas fases são divididas de acordo com a
evolução das TD e seu uso no ensino da matemática.

A primeira fase ocorreu a partir dos anos de 1980. É caracterizada pelo uso da
calculadora simples, do termo “tecnologias informáticas” e do software LOGO com a
perspectiva teórica construtivista. Ainda na primeira fase temos a implantação do projeto do
MEC chamado Projeto EDUCOM, que visava o uso do “computador como recurso
pedagógico” (ALMEIDA, 2004 apud BORBA; DA SILVA; GADANIDIS, 2020, p. 29).

O uso pedagógico do LOGO, enfatiza as “relações entre linguagem de programação e


pensamento matemático” (BORBA; SILVA; GADANIDIS, 2020, p. 26), pois o software tem
como característica a programação de comandos para movimentar a tartaruga virtual. Os
movimentos da tartaruga permitem a construção de uma figura geométrica.

Em relação a natureza investigativa do LOGO, ela diz “respeito à construção de


sequências de comandos (um algoritmo) que determina um conjunto ordenado, ou sequencial,
de ações que constituam uma figura geométrica” (Ibid., p. 27).

A segunda fase ocorreu na metade dos anos de 1990, pela acessibilidade maior do
computador pessoal. Nessa fase é destacada pelo software de geometria dinâmica como Cabri
Géomètre, Geometricks e para os softwares voltados às construções de funções: o Winplot,
Fun, Graphmatica.

Nesta fase cresceu a criação de softwares educacionais e a procura dos professores


para cursos de formação continuada em TI. Borba e Zulato (2010), citado por Borba, Silva,
Gadanidis (2020), argumenta que nesse momento os professores são desafiados a saírem da

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zona de conforto e desbravar o desconhecido, com objetivo de vivenciar a introdução das


tecnologias informáticas no ambiente educacional.

Já a terceira fase teve início aproximadamente no ano de 1999 com a internet e cursos
à distância por meio de fóruns, chats, e-mail, entre outros. Com a internet foi possível a
comunicação entre professores e estudantes e obtenção de informações. É nesta fase que surge
o termo TIC, “tecnologias da informação e comunicação”.

Neste mesmo momento é destacado a relação entre computador e usuário, as interfaces


interativas que “moldam a natureza da comunicação e interação com o usuário”, possibilitam
a transformação da terceira fase e a novas possibilidades para quarta fase (Ibid., p. 40).

E por fim a quarta fase, com início em meados de 2004, é caracterizada pelo uso da
internet rápida; uso de tecnologias digitais; GeoGebra; multimodalida; comunicadores online;
tecnologias móveis e portáteis; performance e a publicação de material digital na rede
(BORBA; SILVA; GADANIDIS, 2020).

O termo de TD, “tecnologias digitais” se torna conhecido, sendo caracterizado por


vários aspectos que muitos já foram desenvolvidos, como os citados acima, e muitos outros
que estão sendo integrados à educação.

Os autores apontam a importância de aplicativos e softwares para o ensino da


matemática como, por exemplo, o LOGO, GeoGebra, You Tube, Facebook, GeoGebra Tube,
MOOCs, Winplot, Fun, Graphmatica, Cabri Géomètri, Geometricks, Maple e as
multimodalidades da internet e ambientes visuais de interatividade (BORBA; SILVA;
GADANIDIS, 2020). Todas estas TD partem do pressuposto do uso qualificado dos recursos
digitais empregados no ensino da matemática, sendo que cabe ao professor propor em suas
práticas pedagógicas, despertando assim o interesse pela matemática (PAIS, 2010).

4. Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação em Rondônia.

A Secretaria de Educação de Rondônia (SEDUC/RO) tem investido em vários


programas atualmente que visam à formação dos professores e alunos em relação às TD.
Programas e projetos como: Programa de Educação Tecnológica na Área de Robótica
Educacional (2014); Projeto Ensino Médio com Mediação Tecnológica (2016); Formação de
Professores da Zona da Mata para o uso das Tecnologias Digitais na Educação (2020). Mas há

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também programas e projetos locais que foram introduzidos nas escolas públicas de Rondônia
que ficaram na memória que professores, cujas histórias ainda não foram registradas.

Cabe destacar ainda que o Projeto LOGOS II foi uma iniciativa do MEC no ano de
1971, que tinha como objetivo habilitar professores leigos, ou seja, os professores que
estavam atuando em sala de aula sem habilitação. Com o Projeto LOGOS II foi possível
também o acesso a diferentes tecnologias, assim como aponta Gouveia (2016). O projeto
contou como modelo o sistema tecnológico taylorista e fordista. O projeto foi implantado em
Rondônia, quando ainda era Território Federal.

Mesmo que no passado haja poucos registos de programas ofertados pelas intuições
públicas escolares de Rondônia, as TDIC estão presentes na escola. O seu uso hoje é uma
forma de manter contato entre os alunos, as aulas e os professores. Com isso, em tempos de
pandemia, um capítulo peculiar está sendo escrito para a História da Educação Matemática
(MERLI; NOGUEIRA; POWELL, 2020).

De modo geral, cabe ressaltar que ainda há vários “desafios da era da informática na
educação [...], à aprendizagem, além de envolver uma preparação para o domínio dessa
tecnologia, caberá um espaço mais exigente em termos de criatividade, iniciativa e resolução
de problemas” (PAIS, 2010, p. 99). Levando em consideração a importância das TDIC, os
órgãos governamentais têm se movimentado para implantar a chegada e o uso das TDIC nas
escolas. É possível notar, por meio da história, a relevância do uso dessas tecnologias no
ensino-aprendizagem da matemática (BORBA; PENTEADO, 2017).

5. Considerações finais

O presente trabalho destaca a importância das TDIC na educação matemática e como


elas são divididas em fases ou momentos cronológicos, para melhor descrever e entender os
momentos das TD quando empregadas no ensino da matemática.

Descrevemos as quatro fases apresentadas por Borba, Silva, e Gadanidis (2020), no


processo de introdução das TD até o período que estamos vivendo. Podendo assim destacar
que, o uso de tecnologias na educação matemática é uma ferramenta que contribui
significativamente o processo de ensino-aprendizagem, e que trazem muitos benefícios para o
conhecimento e transformação da educação.

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A Matemática e suas conexões com o Ensino
Fundamental e Médio
Ji-Paraná – RO, 26 a 28 de Outubro de 2021
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As discussões sobre as TD na educação não são recentes, porém o uso dela ainda é um
assunto muito discutido. Os softwares matemáticos e “não-matemáticos”, como YouTube,
Facebook, tem contribuído com a educação matemática, mas ainda existe muito mais a fazer,
como aproveitar mais os recursos disponíveis, explorar novas possibilidades tanto na escola
como nos alunos. Desta forma é possível empregar os valores e expectativas da sociedade
para a educação.

Por meio desta pesquisa surgem novas interrogações: Será que este momento que
estamos vivendo de pandemia e o uso das TDIC é o início de uma nova fase? Todas as
escolas de Rondônia estão na quarta fase das TD? As TDIC são usadas no ensino da
matemática em Rondônia?

Com a pesquisa realizada, sobre as fases das TD no processo de ensino e


aprendizagem da matemática, foi possível a compreensão do desenvolvimento das TD ao
longo do tempo e as modificações das práticas no contexto de sala de aula. Diante deste tema,
as TDIC podem ser considerada como um grande incentivo para a melhora do contexto
escolar, assim como nas aulas de matemática de uma maneira geral, no que se refere na
prática do processo de ensino-aprendizagem da matemática.

6. Referências

BACICH, L.; MORAN, J. Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma
abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Editora Penso, 2018.

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de Educação Matemática (X ENEM). v. 1. Salvador: SBEM, 2010. p. 1-11.

BORBA, M. C.; MALHEIROS, A. P. S.; AMARAL, R. B. Educação a Distância online. 3.


ed. Belo Horizonte: Editora Gutenberg, 2011.

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Horizonte: Editora Autêntica, 2017.

BORBA, M. C.; SILVA, R. S. R.; GADANIDIS, G. Fases das tecnologias digitais em


Educação Matemática: Sala de aula e internet em movimento. 3. ed. Belo Horizonte: Editora
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GARNICA, A. V. M; SOUZA, L. A; Elementos de História da Educação Matemática. São


Paulo: Editora Cultura Acadêmica, 2012.

GOUVEIA, C. T. G. O Projeto Logos II em Rondônia: a implantação do projeto-piloto e as


mudanças em sua organização político-pedagógica. 2016. Dissertação (Mestrado em
Educação) – Instituto de Biociências de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro,
2016.

KENSKI, V. M. Educação e Tecnologia: o novo ritmo da informática. 8. ed. Campinas, SP:


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LEVY, P. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Rio


de Janeiro: Editora 34, 1993.

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Matemática por conta do COVID-19.In. Congresso Internacional de Educação e
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EnPED:2020.), São Carlos, 2020. Disponível em:
https://cietenped.ufscar.br/submissao/index.php/2020/article/view/1000. Acesso em: 02 maio
2021.

MIGUEL, A.; MIORIM, M. A. História na educação matemática: propostas de desafios.


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BREVE HISTÓRIA, SIGNIFICADOS E CARACTERÍSTICAS DA TENDÊNCIA


RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS MATEMÁTICOS

Priscila Miranda Engelhardt


Fundação Universidade Federal de Rondônia
mirandapri28@gmail.com

Emerson da Silva Ribeiro


Fundação Universidade Federal de Rondônia
emerson@unir.br

Resumo:
Este trabalho é decorrente de uma atividade realizada na disciplina de Tendências da Educação Matemática do
Mestrado em Educação Matemática da UNIR, Campus de Ji-Paraná, e tem por objetivo elucidar alguns aspectos
sobre a história, significados e características da tendência de Resolução de Problemas Matemáticos. Para isso
foi realizado uma pesquisa bibliográfica quanto aos princípios teóricos dessa tendência da Educação Matemática
a fim de trazer os aspectos mais relevantes e os elementos essenciais para a sua melhor compreensão. Portanto,
são discutidos neste trabalho temas relativos sobre a história, a pesquisa, os significados, as características, e as
abordagens pedagógicas da Resolução de Problemas Matemáticos. Assim, espera-se que este trabalho possa
trazer esclarecimentos e contribuições importantes para o entendimento desta tendência, pois, segundo Polya
(1985), a Resolução de Problemas destaca-se como a espinha dorsal do ensino da Matemática, assumindo um
papel central para a aprendizagem matemática, possibilitando experiências que proporcionam a investigação
matemática.
Palavras-chave: Resolução de Problemas Matemáticos; Educação Matemática; Tendência.

1. Introdução

O interesse pela realização dessa pesquisa surgiu na disciplina de Tendências da


Educação Matemática do Mestrado em Educação Matemática da UNIR, Campus de Ji-Paraná.
As discussões realizadas nessa disciplina mostraram a relevância de se compreender mais
profundamente as tendências existentes na Educação Matemática, sabendo como elas se
originaram e para que são utilizadas. Nessa perspectiva, esse trabalho será focado na
Resolução de Problemas Matemáticos que é umas dessas tendências.

A resolução de problemas surge desde os primórdios dos tempos, estando ligada em


um primeiro momento à solução dos conflitos diários das diversas sociedades históricas e
com o avanço da matemática, os conhecimentos que foram adquiridos por meio da resolução
de problemas trouxeram benefícios e inovações para outras áreas do conhecimento.

Com a ascensão da Resolução de Problemas como uma maneira de ensinar e aprender


matemática, ela ganhou notoriedade e a contribuição de diversos teóricos, entre eles destaca-
se como fundamental para o seu desenvolvimento o matemático húngaro George Polya, sendo
o grande precursor dos estudos e pesquisas referentes à Resolução de Problemas Matemáticos.

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Ao se falar na pesquisa em Resolução de Problemas Matemáticos, dentre as


contribuições mais relevantes se sobressai o papel do Conselho Nacional de Professores de
Matemática dos Estados Unidos (NCTM), de 1980, que dedicou uma publicação anual a essa
tendência e isso fez com que o conhecimento sobre ela chegasse a outros países.

Dentro dos princípios teóricos da Resolução de Problemas Matemáticos é de suma


importância conhecer seus significados e características. Dessa forma, aponta-se como
fundamental compreender o significado da palavra “problema”, o significado da expressão
“situação-problema”, o sentido e significado do processo de resolução de problemas, bem
como, saber diferenciar um exercício de uma situação-problema.

Nesse sentido, para suprir determinados tópicos importantes relativos à compreensão


desta tendência da Educação Matemática, este trabalho tem por objetivo elucidar alguns
aspectos sobre a história, significados e características da tendência de Resolução de
Problemas Matemáticos.

2. Breve histórico sobre a Resolução de Problemas Matemáticos

Em sua gênese a resolução de problemas surgiu diretamente ligada à solução dos


conflitos diários e problemas de natureza prática advindos de diversas sociedades históricas,
sendo que grandes feitos foram realizados a partir de problemas que estavam sem solução.
Desse modo, os problemas com suas respectivas resoluções foram responsáveis por trazerem
novas descobertas e inovações para a humanidade.

A história da Matemática acompanha os fenômenos ocorridos nesta área de uma


forma mais explicita, desde os último 6 mil anos. Ela destaca como uma das
características centrais, tanto da humanidade quanto da matemática, a necessidade
de resolver problemas. Foi para resolver o problema da caça que nos primórdios da
humanidade os homens desenvolveram os primeiros instrumentos destinados a esse
fim, e, com esses aparelhos, surgiram os primeiros rudimentos da ideia de simetria.
Certamente, a primeira ponta de lança não foi a melhor e seu aprimoramento levou à
construção de dispositivos mais eficientes (grifo nosso) (CAVALCANTE; 2013, p.
37).

Segundo Cavalcante (2013), um dos documentos mais antigos que retratam a


importância da resolução de problemas é o Papiro de Ahmes (1650 a.C.) ou Papiro de Rhind,
como também foi denominado, ao que esse documento é composto por 85 problemas de
natureza prática, ou seja, os problemas cotidianos enfrentados pela sociedade egípcia dessa
época.

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O papiro Rhind é uma fonte primária rica sobre a matemática egípcia antiga;
descreve os métodos de multiplicação e divisão dos egípcios, o uso que faziam das
frações unitárias, seu emprego da regra de falsa posição, sua solução para o
problema da determinação da área de um círculo e muitas aplicações da matemática
a problemas práticos (EVES, 2011, p.70).

Para Morais; Onuchic; Leal Junior (2017), outro acontecimento que contribuiu para o
desenvolvimento da Resolução de Problemas Matemáticos foi o término da Guerra Civil
Americana, que ficou conhecida também como a Guerra de Secessão, esse marco histórico
ocorreu no século XIX entre os anos de 1861 e 1865. Com o fim dessa guerra os Estados
Unidos começaram a se firmar se tornando uma grande potência econômica e industrial.
Dessa maneira, em uma sociedade em pleno desenvolvimento era necessário aos
trabalhadores dessa época saber matemática para lidar com as demandas diárias de suas
profissões, pois a mão de obra dos trabalhadores precisava ser cada vez mais qualificada.
Sendo assim, começou-se a pensar em maneiras de se ensinar e aprender matemática.

Ao passar de uma sociedade rural, onde “poucos precisavam conhecer matemática”,


para uma sociedade industrial onde mais gente “precisava aprender matemática” em
razão da necessidade de técnicos especializados, daí para uma sociedade de
informação onde a maioria das pessoas “precisa saber matemática” e, agora,
caminhando para uma sociedade do conhecimento que exige de todos “saber muita
matemática”, é natural que o homem se tenha interessado em promover mudanças na
forma de como se ensina e como se aprende matemática (ONUCHIC, 1999, p. 200).

O grande avanço na Resolução de Problemas1 como uma maneira de ensinar e


aprender matemática aconteceu a partir do século XX, onde a Resolução de Problemas
começou a ganhar visibilidade, vindo a se transformar em uma metodologia de ensino. Dentro
desse contexto, o psicólogo norte-americano Edward Lee Thorndike (1874-1949), em seus
estudos, apontava a resolução de problemas como um meio para desenvolver o cognitivo
humano, e outra hipótese de seus trabalhos era de que o ensino da matemática através de
problemas tornava os alunos mais capazes para lidar com a realidade.

Na primeira metade desse século, Edward Lee Thorndike falou sobre o papel que os
problemas de matemática poderiam desempenhar na formação do estudante
colocando ênfase nos tipos de problemas que deveriam ser trabalhados. Para esse
pesquisador, mais do que falar da importância de voltar a atenção para à resolução
de problemas era preciso considerar os tipos de problemas. E, nessa direção,
desejando colocar em questão teorias psicológicas vigentes, a Teoria da Disciplina
Mental (TDM), por exemplo, esse pesquisador afirmava que como a nova economia
mundial, com a passagem da sociedade agrária para a sociedade industrial, mais
pessoas deveriam saber matemática, aquela usada para a vida (MORAIS;
ONUCHIC; LEAL JUNIOR, 2017, p. 410).

1
Tomando como base Onuchic e Allevatto (2011), neste trabalho é adotada a grafia Resolução de Problemas
com “R e P” maiúsculos quando se tratar da metodologia ou tendência, e resolução de problemas com “r e p”
minúsculos quando se tratar do ato de resolver problemas.

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Após Thorndike, outros pesquisadores estudaram a Resolução de Problemas, no


entanto, o mais notável entre eles foi o professor húngaro George Polya (1887-1985), que nos
anos de 1940, em suas pesquisas buscou formas de melhorar o processo de resolução de
problemas, e com isso acabou se tornando o grande precursor dos estudos a respeito da
Resolução de Problemas Matemáticos.

A pesquisa sobre Resolução de Problemas e as iniciativas de considerá-la como uma


forma de ensinar Matemática receberam atenção a partir de Polya (1944),
considerado o pai da Resolução de Problemas. Em seu trabalho, Polya preocupou-se
em descobrir como resolver problemas e como ensinar estratégias que levassem a
enxergar caminhos para resolver problemas (ONUCHIC; ALLEVATO, 2011, p.
77).

Segundo Onuchic; Allevato (2011), com o Movimento da Matemática Moderna


(MMM) entre os anos de 1960 a 1970, o ritmo das pesquisas e estudos sobre Resolução de
Problemas Matemáticos diminuiu, ficando estagnado durante esse tempo, onde a matemática
a ser trabalhada em sala de aula era excessivamente abstrata e baseada em estruturas lógicas,
algébrica, topológica, que colocava em ênfase a teoria dos conjuntos, e esse tratamento muito
abstrato da matemática junto com o despreparo dos professores e a falta da participação da
família na escola levou esse movimento ao fracasso. Somente com o fim desse movimento,
por volta dos anos de 1980, começou-se a pensar novamente nas ideias da Resolução de
Problemas e os seus benefícios para o processo de ensino-aprendizagem da Matemática.

Nos EUA, houve uma tentativa de retornar às práticas anteriores à Matemática


Moderna, na fase que foi intitulada Volta às bases. Porém, não teve grandes efeitos e
tampouco conseguiu adeptos em outros países. Assim, durante a década de 1980,
educadores matemáticos que não desistiram de ideais preconizados anteriormente,
que acreditavam no potencial da resolução de problemas e visavam a um ensino e
aprendizagem com compreensão e significado, continuaram trabalhando nessa busca
(ONUCHIC; ALLEVATO, 2011, p. 78).

Em 1980, o Conselho Nacional de Professores de Matemática dos Estados Unidos


(NCTM2) dedicou a sua publicação anual à Resolução de Problemas Matemáticos, então
baseadas nas ideias de George Polya sobre a Resolução de Problemas. Dessa forma, nota-se
que a Resolução de Problemas como uma tendência da Educação Matemática surge nos
Estados Unidos, e a partir do NCTM, na década de 1980, os conhecimentos dessa tendência
chegam a diversos países.

O impulso para a reforma em educação matemática começou no início da década de


1980. Os educadores estavam respondendo a um movimento de “retorno aos
fundamentos”. Como resultado, a resolução de problemas se tornou uma tendência
importante no currículo de matemática (VAN de WALLE, 2009, p. 20).

2
National Council of Teachers of Mathematics.

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Portanto, Cavalcante (2013) afirma que como consequência dessa evolução da


Resolução de Problemas Matemáticos como uma maneira de ensinar e aprender matemática,
ela passou a ser alvo central de muitas pesquisas e estudos no âmbito da Educação
Matemática nos anos de 1990, e essas pesquisas e estudos apontavam muitos benefícios de
aprender e aplicar matemática a partir de problemas e a importância de se ter abordagens de
ensino para facilitar o aprendizado por meio de problemas. E assim, a Resolução de
Problemas passou a ser discutida em vários países, chegando de forma mais efetiva no Brasil
na década de 1990, ocupando lugar em vários documentos da educação brasileira, sendo até
hoje debatida em diversos estudos, pesquisas, Programas de Pós-Graduação e grupos de
pesquisas.

3. Significados e Características da Resolução de Problemas Matemáticos

Os princípios teóricos da Resolução de Problemas Matemáticos pautados em autores


como: Polya (1997, 2006); Dante (2002); Proença (2017); entre outros, apontam que é de
suma importância compreender o significado da palavra “problema”, o significado da
expressão “situação-problema”, saber diferenciar uma situação-problema de um exercício e
entender o sentido e significado do processo de resolução de problemas.

Para Polya (1997, p. 1), “resolver um problema é encontrar os meios desconhecidos


para um fim nitidamente imaginado. Se o fim por si só não sugere de imediato os meios, se
por isso temos de procurá-los refletindo conscientemente sobre como alcançar o fim, temos de
resolver um problema”, ou seja, um problema é toda a situação em que desconhecemos os
meios para solucioná-lo e temos de pensar em caminhos que possam facilitar sua resolução.

Na visão de Boavida et al. (2008, p.15), uma situação se torna um problema “[...]
quando se está perante uma situação que não pode resolver-se utilizando processos
conhecidos e estandardizados; quando é necessário encontrar um caminho para chegar à
solução e esta procura envolve a utilização do que se designa por estratégias”.

De acordo com Dante (2002, p. 9), o problema “[...] é qualquer situação que exija o
pensar do indivíduo para solucioná-la”. As autoras Smole e Diniz (2016, p. 11), afirmam que
“[...] problema é toda situação que não possui solução evidente e que exige que o resolvedor
combine seus conhecimentos e se decida pela forma de usá-los em busca da solução”.

Com base na visão dos autores citados acima, temos que um problema ganha um

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sentido amplo, estando relacionado aos problemas enfrentados diariamente pela sociedade e
em várias ciências.

Já um problema de matemática é toda a situação em que são utilizados procedimentos


matemáticos para a sua resolução. Afirmando isso, Proença (2018, p. 17) diz que “[...] uma
situação de Matemática se torna um problema quando a pessoa precisa mobilizar conceitos,
princípios e procedimentos matemáticos aprendidos anteriormente para chegar a uma
resposta”. Nessa perspectiva, alguns autores da Resolução de Problemas Matemáticos como:
Dante (2002) e Proença (2017), costumam denominar a expressão “situação-problema” para
se referir a um problema de matemática. Assim, para Smole e Diniz (2007), o enfrentamento,
ou seja, resolver uma situação-problema se torna um processo de investigação científica.

[...] enfrentar e resolver uma situação-problema não significa apenas a compreensão


do que é exigido, a aplicação das técnicas ou fórmulas adequadas e a obtenção da
resposta correta, mas além disso, uma atitude de “investigação científica” em relação
àquilo que está pronto (SMOLE; DINIZ, 2007, p. 92).

Uma situação-problema, segundo Serrazina (2017, p. 60), deve possuir as seguintes


características:

[...] (i) ser desafiante e interessante a partir de uma perspectiva matemática; (ii) ser
adequado, permitindo relacionar o conhecimento que os alunos já têm de modo que
o novo conhecimento e as capacidades de cada aluno possam ser adaptados e
aplicados para completar as tarefas; (iii) ser problemático, a partir de algo que faz
sentido e onde o caminho para a solução não está completamente visível.

Uma das coisas mais importantes para a resolução de uma situação-problema é que o
resolvedor se ampare primeiramente em seus conhecimentos prévios aprendidos em situações
anteriores. Baseando-se no entendimento de Silva e Siqueira Filho (2011, p. 31):

Provavelmente, ante uma situação-problema, as facilidades, dificuldades ou


limitações, com relação a certos conceitos matemáticos nela envolvidos, darão aos
resolvedores subsídios para que eles pensem e raciocinem matematicamente e
percebam o que ainda precisam apropriar ou clarificar em sua aprendizagem,
sobretudo, lapidar a busca por decisões que se convertam em instrumentalização
suficiente para solucionar o problema.

Outro fato importante nos princípios teóricos da Resolução de Problemas Matemáticos


é saber diferenciar uma situação-problema de um exercício. De acordo com Dante (2002, p.
43), “[...] exercício, como o próprio nome diz, serve para exercitar, para praticar um
determinado algoritmo ou processo. O aluno lê o exercício e extrai as informações necessárias
para praticar uma ou mais habilidades algorítmicas”. Corroborando, Proença (2018, p. 18)
destaca que “[...] a função de um exercício no ensino, é justamente que o aluno aplique

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fórmulas, regras, algoritmos, que siga modelos”.

Então, a partir da contribuição dos autores citados, compreende-se que o problema tem
um sentido amplo e que está relacionado aos problemas diários dos cidadãos e problemas da
comunidade científica, sendo que os problemas de matemática podem ser chamados também
de situações-problemas e necessariamente precisam de um contexto matemático determinado,
podendo envolver situações cotidianas, interdisciplinares ou não. Já um exercício serve
apenas para fixar conteúdos e memorizar regras e fórmulas matemáticas.

Ao resolver uma situação-problema é imprescindível o uso de estratégias e


procedimentos matemáticos, e esse uso é denominado dentro da Resolução de Problemas
Matemáticos como “processo de resolução de problemas”. Com base nisso, Boavida et al.
(2008, p.14) afirmam que “[...] a resolução de problemas é o processo de aplicar o
conhecimento previamente adquirido a situações novas e que pode envolver exploração de
questões, aplicação de estratégias e formulação, teste e prova de conjecturas”. Então, o
processo de resolução de problemas abrange:

[...] a compreensão de uma situação que exige resolução, a identificação de seus


dados, a mobilização de conhecimentos, a construção de uma estratégia ou um
conjunto de procedimentos, a organização e a perseverança na busca da resolução, a
análise constante do processo de resolução e da validade da resposta e, se for o caso,
a formulação de outras situações-problema (SMOLE; DINIZ, 2007, p. 11).

Dessa forma, é necessário conhecer os objetivos que a Resolução de Problemas


Matemáticos pode proporcionar para o processo de ensino-aprendizagem de matemática.
Assim, Dante (2002, p. 11-15) assegura que são: 1) Fazer o aluno pensar produtivamente; 2)
Desenvolver o raciocínio do aluno; 3) Ensinar o aluno a enfrentar situações novas; 4) Dar ao
aluno a oportunidade de se envolver com as aplicações da Matemática; 5) Tornar as aulas de
Matemática mais interessantes e desafiadoras; 6) Equipar o aluno com estratégias para
resolver problemas; e, 7) Dar uma boa base matemática às pessoas.

Esses objetivos retratam a importância de se ter um processo de ensino-aprendizagem


da matemática voltado para esses itens e como uma alternativa viável temos a metodologia de
Resolução de Problemas, considerada por Polya (1985) como a espinha dorsal do ensino da
matemática, assumindo um papel central para a aprendizagem em matemática. Com base em
todos esses argumentos, entende-se que o processo de resolução de problemas implica no uso
de estratégias e procedimentos matemáticos que tem o objetivo de ajudar a resolver problemas
e de facilitar os caminhos para encontrar a resolução, sendo necessário partir de

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conhecimentos prévios aprendidos pelos alunos em situações anteriores em busca de um novo


conhecimento.

4. As abordagens da Resolução de Problemas matemáticos

No intuito de organizar as pesquisas e estudos sobre a Resolução de Problemas


Matemáticos ela foi dividida por Schroeder; Lester (1989) em três abordagens: Ensinar para
resolução de problemas; Ensinar sobre resolução de problemas, e Ensinar via/através da
resolução de problemas.

O ensinar para resolução de problemas reflete em um trabalho mais tradicional onde o


professor utiliza problemas somente depois da explicação de um conteúdo, por isso chama-se
ensinar para a resolução de problemas, pois antes de resolver os problemas é necessário
aprender o conteúdo matemático necessário. Dessa forma, o ensinar para resolução de
problemas é,

[...] considerada a abordagem mais tradicional e, possivelmente, a mais utilizada em


cursos de formação de professores. Seria a situação onde os professores ensinam,
primeiramente, os conteúdos matemáticos e, em seguida trabalham com problemas
como/de aplicação. Problemas esses, em geral, fechados e que requerem o uso de
conceitos e procedimentos anteriormente aprendidos (JUSTULIN; NOGUTI, 2017,
p. 23-24).

O ensinar sobre resolução de problemas repercute na análise das heurísticas, que são
as estratégias e as formas de pensar e raciocinar diante de uma situação-problema. O método
mais utilizado nessa perspectiva é o de Polya (2006), onde o seu foco está em transformar os
alunos em bons resolvedores de problemas e o professor tem o papel de ser o mediador do
ensino, sendo o grande incentivador dos alunos apresentado situações-problemas que façam
sentido para a realidade deles. Nessa abordagem, a Resolução de Problemas é entendida como
se fosse um novo conteúdo de matemática, no qual as heurísticas são o principal elemento a
ser ensinado nesse conteúdo.

O método de Polya é composto por quatro fases que ajudam a organizar o processo de
resolução de problemas, sendo um meio de desenvolver habilidades de análise e interpretação,
ajudando criar estratégias que possibilitem levar a justificações das soluções encontradas.
Assim, as quatro fases de Polya são: Compreensão do problema; Estabelecimento de um
plano; Execução do plano; e Retrospecto.

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Primeiro, temos de compreender o problema, temos de perceber claramente o que é


necessário. Segundo, temos de ver como os diversos itens estão inter-relacionados,
como a incógnita está ligada aos dados, para termos a ideia da resolução, para
estabelecermos um plano. Terceiro, executamos o nosso plano. Quarto, fazemos um
retrospecto da resolução completa, revendo-a e discutindo-a (POLYA, 2006, p. 4-5).

No ensinar via/através da resolução de problemas, o trabalho com a Resolução de


Problemas, segundo Andrade; Onuchic (2017), acontece numa atmosfera de investigação
através de experiências em resolução de problemas, onde os problemas são utilizados ao
longo do processo de ensino-aprendizagem, portanto, todo conhecimento matemático, ou seja,
o conteúdo a ser ensinado, é aplicado a partir da proposição de problemas. Dessa forma, todas
a habilidades, estratégias e conhecimentos de matemática são aprendidos enquanto o aluno
resolve problemas.

Isso significa dizer que, quando o professor adota essa metodologia, os alunos
podem aprender tanto sobre resolução de problemas, quanto aprendem Matemática
para resolver novos problemas, enquanto aprendem Matemática através da resolução
de problemas. (ALLEVATO, 2005, p. 61).

Dentro dessa perspectiva teórica, um método de destaque foi criado pela professora
Onuchic, a partir de seu trabalho no Grupo de Trabalho e Estudos em Resolução de
Problemas (GTERP) que também foi criado por ela em 1992 e com o passar dos anos recebeu
a influência de diversos pesquisadores desse grupo de pesquisa. Esse método é composto por
10 etapas e recebeu o nome de Metodologia de Ensino-Aprendizagem-Avaliação de
Matemática através da Resolução de Problemas. Nesse método,

[...] o ensino e a aprendizagem devem ocorrer simultaneamente durante a construção


do conhecimento, tendo o professor como guia e os alunos como coconstrutores
desse conhecimento. Além disso, essa metodologia integra uma concepção mais
atual de avaliação. Ela, a avaliação, é construída durante a resolução do problema,
integrando-se ao ensino com vistas a acompanhar o crescimento dos alunos,
aumentando sua aprendizagem e reorientando as práticas em salas de aula quando
for necessário (ANDRADE; ONUCHIC, 2017, p. 438-439).

Segundo Onuchic; Allevato (2011), as 10 etapas da Metodologia de Ensino-


Aprendizagem-Avaliação de Matemática através da Resolução de Problemas são: 1°-
proposição do problema; 2°- leitura individual; 3°- leitura em conjunto; 4°- resolução do
problema; 5°- observar e incentivar; 6°- registro das resoluções na lousa; 7°- plenária; 8°-
busca do consenso; 9°- formalização do conteúdo; e 10º- proposição e resolução de novos
problemas. Portanto, nessa metodologia os problemas são utilizados a todo momento e com
vários propósitos, seja de iniciar, praticar, ou avaliar conteúdos matemáticos. A partir de seus
conhecimentos prévios os alunos tentam resolver o problema gerador que proporcionará a
aquisição de um novo conhecimento. Essa metodologia exige professores capacitados,

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prontos para lidar com todos a suas atribuições.

Tal metodologia demanda professores bem preparados para o seu uso, pois precisam
selecionar cuidadosamente os problemas; observar os alunos na busca de soluções
para esses problemas, incentivá-los e ouvi-los, mantendo-os confiantes na própria
capacidade para resolvê-los. Nas salas de aula onde essa metodologia foi adotada, os
alunos se sentiram aptos a dar sentido à matemática que constroem. Professor e
alunos, depois dessa experiência, não querem voltar a trabalhar com o método de
ensino tradicional (ONUCHIC, 2013, p. 103).

Dessa forma, de acordo com Cavalcante (2013), a abordagem de ensinar via/através da


Resolução de Problemas requer um rigor metodológico que é algo que vai além de
simplesmente selecionar um problema e pedir para que os alunos resolvam, ela necessita que
o professor seja o mediador entre o conhecimento e o aluno, estando sempre atento à evolução
do aluno, por esse motivo a abordagem ensinar via/através da Resolução de Problemas
necessita de uma avaliação frequente, por parte do professor.

5. Considerações finais

A resolução de problemas, em sua gênese, sempre esteve ligada à solução dos


conflitos diários das diversas sociedades históricas, existindo documentos históricos que
retratam a história da resolução de problemas, como o Papiro de Rhind composto por
problemas cotidianos enfrentados pelos egípcios antigos; e com a evolução da Matemática
como uma ciência, os conhecimentos que foram adquiridos por meio da Resolução de
Problemas trouxeram inovações para diversas áreas do conhecimento.

Vários acontecimentos históricos marcam a origem dessa metodologia de ensino,


como a importante contribuição do psicólogo Edward Lee Thorndike, sendo um dos primeiros
estudiosos a apontar os benefícios da Resolução de Problemas Matemáticos para o
desenvolvimento do cognitivo humano. Destaca-se também o papel do matemático húngaro
George Polya considerado o pai da Resolução de Problemas. Podemos afirmar também que
Resolução de Problemas Matemáticos como uma tendência da Educação Matemática surge
nos Estados Unidos, a partir do NCTM de 1980, que considerou a Resolução de Problemas
como o centro do ensino e das pesquisas para a década de 1980.

Na perspectiva dos princípios teóricos dessa tendência, um problema é considerado


algo amplo relacionado às diversas situações cotidianas da sociedade e da comunidade
científica, ao passo que um problema de matemática pode ser chamado também de situação-
problema e possui um contexto matemático específico, podendo estar relacionado a situações

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cotidianas ou não, e um exercício serve apenas para fixar conteúdos e memorizar fórmulas e
regras. Já o processo de resolução de problemas é a utilização de estratégias e procedimentos
matemáticos usados para resolver problemas.

Para organizar a Resolução de Problemas Matemáticos, ela foi dividida em três


abordagens: o ensinar para resolução de problemas, que é a abordagem mais tradicional onde
resolve-se problemas apenas depois da explicação de um conteúdo; o ensinar sobre resolução
de problemas que é a abordagem que se baseia no método de Polya; e o ensinar via/através da
resolução de problemas, que é a abordagem onde os problemas são utilizados com vários
propósitos, seja de iniciar, treinar ou avaliar um conteúdo de matemática, ao que o método
mais empregado nessa abordagem para a resolução dos problemas é o método de Onuchic
criado no GTERP.

O trabalho com Resolução de Problemas Matemáticos demanda professores bem


qualificados, pois são responsáveis por organizar e planejar todo o processo de ensino-
aprendizagem da Matemática pautado nessa metodologia, selecionando cuidadosamente os
problemas que serão trabalhados em sala de aula. No caso o professor é o mediador do ensino
e deve ser o grande incentivador dos alunos, buscando despertar neles o gosto de aprender
matemática, apresentando situações-problemas que façam sentido para a realidade dos alunos,
mostrando que a matemática é algo útil para a vida em sociedade, onde esses alunos irão se
deparar com esta ciência tanto no cotidiano quanto na vida escolar.

6. Referências

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Problemas Fechados: Análise de uma experiência, 2005. 350 f. Tese (Doutorado em
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CONTRIBUIÇÕES DA METODOLOGIA DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS


MATEMÁTICOS PARA O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM: POR MEIO
DA APLICAÇÃO DE UM PROJETO NO ENSINO MÉDIO

Aline Walter Reculiano Fagundes


Fundação Universidade Federal de Rondônia
alinewalterfagundes@gmail.com

Priscila Miranda Engelhardt


Fundação Universidade Federal de Rondônia
mirandapri28@gmail.com

Claudemir Miranda Barboza


Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia
claudemir.barboza@ifro.edu.br

Resumo:
Esta pesquisa trata do desenvolvimento de um projeto em que foi utilizada a metodologia de Resolução de
Problemas Matemáticos, defendida pelo matemático George Polya (1887-1985), com o objetivo de aumentar o
desempenho de interpretação de problemas matemáticos, promover a participação ativa dos alunos, estimular o
raciocínio lógico, melhorar a concentração e o interesse pelas aulas vivenciadas, ressaltando-se a importância de
relacionar os conteúdos matemáticos às atividades diárias dos alunos, proporcionando, assim, um ambiente de
interação e socialização em sala de aula. Para isso, foi implantado o Projeto intitulado de Resolução de
Problemas – Desvendando os Mistérios da Matemática, que foi realizado com cinco turmas do Ensino Médio do
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia (IFRO), Campus Cacoal. As aulas do projeto
ocorreram de modo presencial e também pelo Ambiente Virtual de Aprendizagem - AVA. A avaliação do
projeto ocorreu através de um questionário, onde foi utilizado o método misto que combina técnicas
quantitativas e qualitativas para análise dos dados. Notou-se que os alunos se tornaram construtores do seu
próprio conhecimento, compreendendo a matemática de forma dinâmica e instigante através da metodologia de
Resolução de Problemas Matemáticos.
Palavras-chave: Resolução de problemas; Matemática; Metodologia.

1. Introdução

A Matemática, ao longo de sua história, tem se mostrado importante tanto para a


sociedade quanto para a vida acadêmica, estando presente em todos os momentos do
cotidiano e mostrando que somos capazes de criar, desenvolver, buscar soluções e respostas
para o que acontece ao nosso redor.

A disciplina de matemática é parte fundamental no desenvolvimento do estudante, e


da pessoa como ser social, ela contribui para um raciocínio lógico, investigativo e
crítico não só dos conceitos referentes à matemática, mas também sobre situações
problemas na vida cotidiana (PEREIRA, 2018, p. 17).

As aulas de matemática devem ser planejadas e realizadas com o intuito de despertar


no aluno curiosidades, fazendo com que tenha interesse em buscar técnicas e observar os
fundamentos matemáticos no cotidiano das pessoas e no desenvolvimento da sociedade.

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Sendo a matemática uma área do conhecimento voltada para o raciocínio lógico e da


direta relação com a vida cotidiana das pessoas (usamos matemática quando
fazemos compras, quando administramos nossa renda familiar, quando atravessamos
ruas e avenidas, quando localizamos um prédio etc), sua metodologia de ensino deve
valorizar os pensamentos e questionamentos dos alunos por meio da expressão de
suas ideias (DANTE, 2009, p. 18).

Faz-se relevante apresentar, então, a Resolução de Problemas Matemáticos como uma


perspectiva metodológica que envolva todo o processo de ensino-aprendizagem, uma vez que
essa abordagem pode contribuir para as aulas de matemática, auxiliando os professores a
ajudar os alunos a desenvolverem seu raciocínio lógico.

Por meio da metodologia de Resolução de Problemas, o professor viabilizará a


apropriação de alguns significados, sobretudo positivos, que as experiências
matemáticas propiciam ao indivíduo durante o longo período de tempo que a
matemática o acompanha. Espera-se que haja por parte dos alunos, um (re)encontro
com o prazer em aprender matemática, além da perspectiva de se melhorar a
concepção edificada pela interação entre professor e aluno (SILVA; SIQUEIRA
FILHO, 2011, p. 28).

Nessa perspectiva, foi implantado no ano de 2019, o Projeto de Resolução de


Problemas – Desvendando os Mistérios da Matemática, aplicado no IFRO-Campus Cacoal,
em cinco turmas do Ensino Médio, com o total de 85 alunos participantes. As aulas tinham o
intuito de promover o ensino da matemática de forma interdisciplinar a partir do uso de
problemas contextualizados, aplicados em sala de aula e também através do Ambiente Virtual
de Aprendizagem – AVA. Para a análise dos dados, utilizou-se o método misto, a partir da
aplicação de um questionário misto com questões abertas e fechadas, tendo a finalidade de
compreender se a metodologia de Resolução de Problemas contribui para melhorar o processo
de ensino-aprendizagem de matemática e promove aulas mais atrativas e dinâmicas.

2. A metodologia de Resolução de Problemas Matemáticos

Quando o professor recorre a um método para ensinar e compartilhar conhecimentos,


ele está utilizando uma metodologia de ensino com o objetivo de melhorar o processo de
ensino-aprendizagem dos alunos ou adequar as aulas em uma prática docente mais coerente.
Dessa forma, “[...] a etimologia da palavra método, encontra-se no latim methodus, que, por
sua vez, se origina do grego meta, que significa meta, objetivo, e thodos, que significa o
caminho, percurso, o trajeto, os meios para alcançá-lo” (RANGEL, 2013, p. 9).

Neste sentido, a metodologia de Resolução de Problemas em sala de aula surge como


uma excelente alternativa para as aulas de matemática, deixando-as mais atrativas e

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investigativas, além de trazer situações reais do cotidiano, abrir portas para a imaginação e
propiciar a descoberta de novos conhecimentos, possibilitando o desenvolvimento de
capacidades intelectuais.

Não somente em Matemática, mas até particularmente nessa disciplina, a resolução


de problemas é uma importante estratégia de ensino. Os alunos, confrontados com
situações-problema novas, mas compatíveis com os instrumentos que já possuem ou
que possam adquirir no processo, aprendem a desenvolver estratégias de
enfrentamento, planejando etapas, estabelecendo relações, verificando regularidades,
fazendo uso dos seus próprios erros cometidos para buscar as novas alternativas;
adquirem espírito de pesquisa, aprendendo a consultar, a experimentar, a organizar
dados (BRASIL, 2002, p. 52).

Para que ocorra esse desenvolvimento de capacidades intelectuais é importante que o


professor saiba orientar o trabalho com a Resolução de Problemas em sala de aula. Com isso,
o professor deve encorajar o trabalho em equipe, fazendo com que os alunos se tornem mais
ativos e colaborativos dentro da sala de aula. É importante, ainda, escolher bem os problemas
que serão trabalhados com esta metodologia, para que eles sejam adequados a cada nível de
aprendizagem dos alunos.

Com isso, a escolha de situações-problema para o ensino deve estar relacionada com
os problemas estratégicos, desviando-se daqueles exercícios que só servem para memorização
e repetição do conteúdo, uma vez que, ao fazer isso, os alunos aprendem a decorar e não são
realmente incentivados a desenvolverem o raciocínio lógico. De acordo com Santos (2018), a
diferença entre um exercício e um problema pode ser apontada como:

A resolução de exercícios baseia-se no uso de habilidades já aprendidas e


exercitadas, as quais podem levar o aluno a transformá-la em rotinas automatizadas
e sem sentido, ocasionando muitas vezes a dificuldade de compreender a lógica de
um problema. Enquanto que os problemas, na medida em que se constituem como
situações novas, mais diversificadas e abertas, a sua resolução representará para o
aluno uma demanda cognitiva e motivacional muito maior do que a execução de
exercícios (SANTOS, 2018, p.42).

A partir de pesquisas bibliográficas, da vasta literatura que aborda a Resolução de


Problemas e da vivência acadêmica, optou-se por trabalhar com o método de George Polya
(1887-1985), uma vez que a metodologia de ensino defendida por ele traz ricas contribuições
para o ensino da matemática, ajudando a melhorar o processo ensino-aprendizagem de
matemática, aumentando a criatividade dos alunos e oferecendo aos professores um espaço
dinâmico na sala de aula.

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No método de Polya (1995), a Resolução de Problemas Matemáticos segue quatro


fases: 1ª) Entender o problema; 2ª) Estabelecer um plano; 3ª) Executar o plano estabelecido;
e, 4ª) Verificar o resultado obtido, fazendo uma reflexão sobre o problema.

1ª) Entender o problema: significa ler e interpretar: Muitas vezes, os alunos não
conseguem resolver um problema porque não compreenderam ou não interpretaram o que se
pede no enunciado. Então, alguns questionamentos podem ser feitos, como: o que se procura
ou o que se quer resolver no problema.

2ª) Estabelecer um plano: é estabelecer uma ação através da coleta de dados que o
enunciado nos oferece. Desta forma, podemos desenhar, construir gráficos a partir dos dados
e até mesmo resolver o problema por partes.

3ª) Executar o plano estabelecido: nesta fase, devemos pôr em prática o que foi
planejado, devendo-se ter muita paciência e cuidado para resolver o problema para que
possamos alcançar o resultado correto.

4ª) Verificar e interpretar, fazendo uma reflexão sobre o problema: após fazer os
passos anteriores, os alunos devem analisar o resultado obtido na resolução, sendo que, muitas
vezes, o erro acontece neste momento, ou seja, o aluno não faz uma verificação para ter a
certeza do valor encontrado no problema. Desse modo, caso haja falhas, pode-se fazer o
cancelamento do resultado e realizar os cálculos novamente, obtendo o resultado correto.

3. Procedimentos metodológicos

O projeto desenvolvido recebeu o nome de Resolução de Problemas – Desvendando os


Mistérios da Matemática, foi realizado no segundo semestre do ano letivo de 2019, com os
alunos do Ensino Médio do Instituto Federal de Rondônia (IFRO), Campus Cacoal. No total,
85 alunos participaram do projeto, os quais eram das seguintes turmas: 1º Agroecologia, 1º A
de Informática, 1º B de Agropecuária, 2º A de Agropecuária e 2º B de Agropecuária. As aulas
ocorreram de maneira presencial e virtual, sendo aplicados problemas contextualizados que
instigavam o raciocínio lógico dos alunos.

Para as aulas presenciais foram utilizados os seguintes recursos: projetor, notebook,


lousa, pincéis para quadro branco, folhas de sulfite A4 para impressão e materiais
manipuláveis. Os materiais manipuláveis foram construídos pelos docentes e levados prontos

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para a sala de aula, para sua construção foram utilizados: cartolina, E.V.A, cola, régua,
tesoura, fita adesiva, papel contact e impressões em folha de sulfite A4.

As atividades online foram disponibilizadas através do Ambiente Virtual de


Aprendizagem (AVA), por meio da plataforma Moodle. No planejamento das aulas foram
utilizados notebook, livros didáticos e banco de questões em sites da internet. Alguns dos
problemas utilizados nas aulas foram retirados do site do Portal da OBMEP e da Secretaria de
Estado da Educação do Paraná (SEED-PR).

E, por último, foi aplicado um questionário para avaliar o projeto, que consistia em
saber a opinião dos alunos participantes do projeto, buscando entender se a metodologia de
resolução de problemas contribuiu para melhorar o aprendiza do na disciplina de matemática.
Segundo Mirian Goldenberg, a aplicação de questionário proporciona alguns ganhos como:

4. Pode ser aplicado a um grande número de pessoas ao mesmo tempo; 5. As frases


padronizadas garantem maior uniformidade para a mensuração; 6. Os pesquisados se
sentem mais livres para expressar opiniões que temem ser desaprovadas ou que
poderiam colocá-las em dificuldades; 7. Menor pressão para uma resposta imediata,
o pesquisado pode pensar com calma (GOLDENBERG, 2004, p.87).

A análise dos dados da pesquisa teve uma abordagem mista, ou seja, envolvendo a
coleta de dados quantitativos e qualitativos.

Os métodos mistos envolvem a combinação ou integração da pesquisa qualitativa e


quantitativa e seus respectivos dados em um estudo. Os dados qualitativos tendem a
ser abertos, sem respostas predeterminadas, enquanto os dados quantitativos
costumam incluir respostas fechadas, como as encontradas em questionários ou
instrumentos psicológicos (CRESWELL, 2021, p. 11).

A escolha por essa abordagem mista, deve-se ao fato de que a interação entre a
pesquisa qualitativa e a pesquisa quantitativa, possibilita melhores resultados para a análise de
dados, sendo assim ambos os métodos de coleta teve a sua contribuição para a pesquisa.

3.1 Apresentação das atividades realizadas em sala de aula

O projeto teve quatro encontros presenciais em cada uma das turmas participantes,
sendo que cada aula teve a duração de 1 hora. Na primeira aula, foi explicada a história do
matemático George Polya e suas contribuições para a Resolução de Problemas, apresentando
os quatro passos desta metodologia: compreender o problema, estabelecer um plano, executar
o plano e o retrospecto; houve a resolução de um problema de raciocínio lógico juntamente
com os alunos, para que os mesmos entendessem como ocorreriam as próximas aulas do

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projeto. Por último, foi entregue aos alunos uma caixa de sugestões, críticas e elogios, com a
finalidade de analisar os comentários e melhorar ainda mais as aulas do projeto.

Na segunda e terceira aulas, os alunos foram divididos em grupos de quatro a cinco


integrantes, desse modo, poderiam interpretar, traçar planos, executar e socializar as respostas
com os outros grupos, promovendo a interação entre todos na sala. Buscou-se trazer apenas
dois problemas por aula, para que os alunos tivessem tempo suficiente para traçar estratégias e
encontrar a solução, posteriormente compartilhando com os outros grupos.

Na quarta aula o projeto foi finalizado. Esse momento foi marcado pela aplicação de
um questionário com questões mistas, buscando entender se com a metodologia de Resolução
de Problemas Matemáticos seria possível promover mais benefícios à aprendizagem dos
alunos. Foram realizadas várias atividades com esta metodologia durante a realização do
projeto, a seguir mostraremos uma atividade realizada em sala de aula e uma atividade
realizada no Ambiente Virtual de Aprendizagem.

Problema 1 – Feitiço do dragão

A bruxa Brunilda deu à sua coruja Sabichuda uma colher de poção mágica achando
que era xarope para a tosse. O resultado foi este:

Figura 1: Feitiço do dragão


Fonte: Portal da OBMEP (2019).

Sabichuda se transformou em um dragão de três cabeças e três caudas! Para desfazer


esse feitiço, Brunilda precisará cortar todas as cabeças e todas as caudas do dragão com sua
espada mágica. Mas, atenção, com sua espada a bruxa só pode cortar uma etapa de cada vez:
ou uma cabeça, ou duas cabeças, ou uma cauda ou duas caudas. E, além disso:

• Se cortar uma cabeça, nasce outra cabeça;

• Se cortar duas cabeças, nada nasce;

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• Se cortar uma cauda, nascem outras duas caudas; e,

• Se cortar duas caudas, nasce uma cabeça.

Como Brunilda pode desfazer o feitiço?

Solução: após o feitiço, o dragão ficou com três cabeças e três caudas. Então, deve-se
analisar as regras do jogo para montar uma estratégia; logo, percebemos que cortar uma só
cabeça fará nascer outra cabeça, portanto, não muda nada. Se cortar as caudas nascem caudas
ou cabeça, então a estratégia mais certa é cortar duas cabeças. O primeiro passo é cortar duas
cabeças, assim o dragão ficará com uma cabeça e três caudas O segundo passo é cortar uma
ou duas caudas: se cortamos duas caudas, o dragão ficará com duas cabeças e uma cauda. O
terceiro passo é cortar as duas cabeças do dragão, assim não terá mais cabeça e terá uma só
cauda. O quarto passo é cortamos sua cauda e o dragão ficará com duas caudas. Temos, aí,
duas opções: ou cortamos uma cauda ou cortamos as duas caudas. Se cortarmos as duas
caudas, o dragão terá uma cabeça e nenhuma cauda, e nunca poderemos desfazer o feitiço. O
quinto passo é cortar somente uma cauda, assim o dragão ficará com três caudas. O sexto
passo é cortar duas caudas e o dragão passará a ter uma cauda e uma cabeça. O sétimo passo
será cortar a cauda e o dragão terá duas caudas e uma cabeça. O oitavo passo será cortar as
duas caudas, e nasce uma cabeça, e assim o dragão terá duas cabeças. O nono passo é cortar
as duas cabeças, assim o feitiço é desfeito.

Esse problema causou grande entusiasmo nos alunos na busca pela sua solução. Para
facilitar, foi entregue material manuseável, neste caso: o corpo do dragão, as cabeças e as
caudas para que os alunos pudessem manipular as jogadas. Inicialmente, houve uma
competição entre os grupos; porém, no decorrer das aulas esse comportamento foi sendo
deixado para trás e os alunos começaram a interagir mais pela busca da resposta.

3.2 Apresentação das atividades realizadas na Plataforma Moodle pelo Ambiente


Virtual de aprendizagem

A utilização de tecnologias como recurso pedagógico permitiu trabalhar com a


Resolução de Problemas de forma mais investigativa. A utilização do AVA nas aulas do
projeto fez a junção dos problemas com a tecnologia, sendo uma ótima maneira de tornar as

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aulas de matemática mais atrativas e significativas, uma vez que os alunos já estavam
familiarizados com a utilização da informática.

Foi criado um ambiente virtual para o Projeto de Resolução de Problemas –


Desvendando os Mistérios da Matemática e, então, foi possível aos alunos se inscreverem no
projeto e realizarem as atividades virtuais. Os problemas foram escolhidos e postados no
ambiente virtual, assim os alunos participantes tinham o prazo de uma semana para postar as
soluções dos mesmos, que, nesse caso, eram resolvidos de forma individual, sendo possível
ver o relatório de cada aluno e observar sua participação na realização do projeto.

Problema 2 – Árvore Genealógica

A família Oliveira tem uma história curiosa: 1) As crianças recebem os nomes dos tios
paternos; 2) Todo irmão tem filhos com os nomes de todos os irmãos; 3) Ninguém recebe os
nomes dos pais; 4) Não há irmãos com nomes repetidos.

A regra foi criada por Abelardo e começou a valer a partir dos seus netos. Hoje o Sr.
Abelardo tem filhos, netos e bisnetos, todos homens. E o mais curioso é que hoje o número
total de descendentes é igual a idade do patriarca. Quantos anos tem o Sr. Abelardo?

Solução:

Figura 2: Problema resolvido por um aluno no AVA


Fonte: Arquivo dos autores.

4. Análise dos dados

A avaliação do projeto ocorreu por meio de um questionário com sete perguntas


mistas, não teve como sentido distinguir os alunos estabelecendo a quantidade de erros e

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acertos, mas de compreender a maneira como cada aluno é capaz de aprender. Com o projeto,
notou-se que cada aluno tem seu próprio conhecimento e diversas maneiras de se pensar.

A primeira pergunta do questionário era: o que você achou do Projeto Resolução de


Problemas – Desvendando os Mistérios da Matemática? Dos 85 alunos que participaram do
questionário, 2 alunos acharam ruim, 15 bom, 41 ótimo e 27 excelente. O resultado foi
considerado significante, pois a maior parte dos alunos gostou do projeto.

A segunda questão buscava saber se os alunos conseguiram resolver todos os


problemas, tanto nas aulas presenciais como no AVA, chegando ao seguinte resultado: 44
alunos disseram que conseguiram resolver todos os problemas e 41 alunos disseram que não
conseguiram resolver todos os problemas.

Na terceira questão foi perguntado aos alunos se o Projeto de Resolução de Problemas


– Desvendando os Mistérios da Matemática tornou as aulas mais dinâmicas e prazerosas. Dos
85 alunos participantes, 72 disseram que as aulas contribuíram para o aprendizado e que
foram dinâmicas, sendo que somente 13 disseram que o projeto não as tornou dinâmicas. O
resultado foi satisfatório por que mostra que o projeto tornou as aulas mais participativas e
estimulou a vontade de aprender matemática.

Na quarta questão, os alunos deveriam avaliar como foi a explicação dos problemas.
Dos 85 alunos participantes do projeto, 2 disseram regular, 25 disseram que foram boas, 32
disseram que foram ótimas e 26 disseram que foram excelentes.

A quinta questão perguntava se algo precisaria ser mudado nas aulas do projeto.

Figura 3: Resposta da questão 5 do questionário avaliativo do projeto


Fonte: Arquivo dos autores.

Um aluno sugeriu gravar videoaulas com as soluções dos problemas e utilizar o fórum
de discussões, uma vez que, assim, os alunos poderiam debater sobre o assunto, caso
existissem dúvidas nas resoluções. Ainda, 72 alunos disseram que não deveria haver

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mudanças e apenas 13 disseram que deveria haver algumas mudanças no projeto relacionadas
ao AVA.

A sexta questão buscava saber quais foram as vantagens e desvantagens de utilizar o


Ambiente Virtual de Aprendizagem para resolver os problemas. Em várias respostas da
questão 6, notou-se que os alunos preferiam as aulas presenciais, pois existiam mais
interações entre as professoras e os alunos isso porque, no Ambiente Virtual de
Aprendizagem – AVA, não existia o acompanhamento, de perto, do desenvolvimento do
raciocínio lógico do aluno.

A sétima questão pedia que os alunos descrevessem a experiência deles com o Projeto
de Resolução de Problemas – Desvendando os Mistérios da Matemática.

Figura 4: Resposta da questão 7 do questionário avaliativo do projeto


Fonte: Arquivo dos autores.

Muitos alunos relataram que os problemas foram bastante significativos para o


processo de aprendizado e que as situações problemas que tinham materiais manipuláveis
eram mais interessantes pelo fato de os alunos conseguirem manusear as peças, o que
facilitava a compreensão para encontrar a solução do problema. No decorrer das aulas,
percebemos que os alunos começaram a discutir métodos para a resolução dos problemas e
solicitavam auxilio das professoras caso não compreendessem o problema, após todos os
grupos responderem os problemas, era feito a socialização das respostas.

Percebe-se que a metodologia de Resolução de Problemas é uma excelente ferramenta


de ensino para auxiliar nas aulas de matemática. Isso porque, os problemas escolhidos são
bem elaborados e se tornam desafios para os alunos, sendo que a assimilação por parte dos
alunos ocorre de maneira mais rápida, uma vez que os alunos se tornam construtores críticos
do seu conhecimento, buscam sanar todas as dúvidas e tornam-se mais participativos em sala
de aula.

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5. Considerações finais

O Projeto de Resolução de Problemas – Desvendando os Mistérios da Matemática


possibilitou a chance de os alunos serem construtores do seu conhecimento, visto que os
mesmos se empenharam ao máximo na realização de todas as atividades, fazendo com que as
aulas ocorressem de modo interativo e participativo.

Durante todo o período desta experiência, observou-se que as atividades em sala de


aula foram as que mais tiveram a participação e o interesse dos alunos, pois existiam mais
interações e socializações entre os mesmos, sendo mais fácil tirarem dúvidas sobre os
problemas. Dessa forma, os alunos sentiram mais dificuldades nas resoluções dos problemas
postados no AVA, por não terem tanta socialização e compartilhamento de dúvidas e
sugestões na resolução dos problemas.

Com a execução do questionário, foi possível compreender a opinião dos alunos


referente a aplicação do Projeto, e entender que a metodologia de Resolução de Problemas é
uma excelente ferramenta de ensino, uma vez que promove uma aula mais dinâmica,
participativa e investigativa, despertando no aluno a vontade de aprender matemática.
Portanto, essa metodologia é uma peça fundamental na construção de futuros cidadãos
conscientes de que a matemática é muito importante para o cotidiano e o processo de ensino-
aprendizagem.

Espera-se que a metodologia utilizada neste projeto possa contribuir com professores
de matemática da Educação Básica que pretendem usar a Resolução de Problemas
Matemáticos como aliada no processo de ensino-aprendizagem, motivando-os a utilizar, em
suas práticas docentes, esta estratégia didática que pode promover vários benefícios para a
melhoria da aprendizagem dos alunos.

6. Referências

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Ciências da Natureza, Matemática e suas


Tecnologias. Ensino Médio. Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros
Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEMT, 2002. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/conaes-comissao-nacional-de-avaliacao-da-educacao-superior/195-
secretarias-112877938/seb-educacao-basica-2007048997/12598-publicacoes-sp-265002211.
Acesso em: 25 jun. 2021.

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CRESWELL, J. W.; CRESWELL, J. D. Projeto de pesquisa : métodos qualitativo,


quantitativo e misto. 5 ed. Porto Alegre : Penso, 2021.

DANTE, L. R. Formulação e resolução de problemas de matemática: teoria e prática. 1.


ed. São Paulo: Ática, 2009.

GOLDENBERG, M. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa. 8. ed. Rio de Janeiro:


Record, 2004.

OBMEP. Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas. Feitiço do dragão.


Quebra-cabeças da matemática. 2019. Disponível em:
https://portaldaobmep.impa.br/index.php/modulo/ver?modulo=160. Acesso em: 14 jul. 2021.

PEREIRA, M. M. Aritmética e olimpíada de matemática: teoria e prática. Curitiba: CRV,


2018.

POLYA, G. A arte de resolver problemas: um novo aspecto do método matemático. Rio de


Janeiro: Interciência, 1995.

RANGEL, M. Métodos de ensino para a aprendizagem e a dinamização das aulas. 6. ed.


São Paulo: Papirus, 2013.

SANTOS, J. A. Desenvolvimento do pensamento matemático: resolução de problemas de


raciocínio lógico – matemático no ensino fundamental. 2018. 124 f. Dissertação (Mestrado
Profissional em Matemática em Rede Nacional) – Instituto de Matemática, Programa de Pós-
Graduação em Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional, Universidade
Federal de Alagoas, Maceió, 2018. Disponível em:
<http://www.repositorio.ufal.br/handle/riufal/3390>. Acesso em: 29 jun. 2021.

SEED-PR. Secretaria de Estado da Educação do Paraná. Genealógica. Problema publicado


em setembro de 2010. Disponível em:
<http://www.matematica.seed.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=116> .
Acesso em: 11 jul. 2021.

SILVA, C. M. S.; SIQUEIRA FILHO, M.G. Matemática: resolução de problemas. Brasília:


Liber Livro, 2011.

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ETNOMATEMÁTICA: HISTÓRIA E RELAÇÃO COM O ENSINO E


APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA

Luiz Carlos dos Reis


Fundação Universidade Federal de Rondônia
rheully.reis@gmail.com

Resumo: Este artigo é resultado de um recorte da pesquisa de mestrado – em andamento – intitulada


Etnomatemática e decolonialidade a partir de pesquisas de estudantes indígenas do Curso de Licenciatura em
Educação Básica Intercultural da Universidade Federal de Rondônia (2015-2018), desenvolvida junto ao
Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Matemática – PPGEM, da Universidade Federal de
Rondônia (UNIR). Tem por objetivo apresentar uma síntese da Tendência Etnomatemática, destacando aspectos
da sua história à sua relação com o ensino e a aprendizagem da matemática. Metodologicamente é de abordagem
qualitativa, com procedimento técnico bibliográfico e com objetivo exploratório. Para fundamentar a pesquisa, o
aporte teórico é representado por autores, como: Ubiratan D’Ambrósio, Milton Rosa, Daniel Orey, Caroline
Mendes dos Passos, Marcelo de Carvalho Borba e Olenêva Sanches Sousa. Como resultado, verificou-se o
crescimento de grupos, organizações e eventos sobre etnomatemática, e que apesar de sua forte implicação
pedagógica, a utilização de suas concepções nos currículos escolares ainda sofre, especialmente no campo da
prática, “resistências”, ao compararmos algumas propostas de mudanças conceituais nos componentes básicos do
currículo, propostos por D’Ambrósio, e a utilização prática desses conceitos atualmente.
Palavras-chave: Etnomatemática; Tendência da Educação Matemática; Programa Etnomatemática.

1. Introdução

O movimento conhecido como etnomatemática, surgiu no Brasil na década de 1970 e


trouxe críticas sobre a forma tradicional de como a matemática era abordada tanto no contexto
social quanto no educacional. Ainda na década de 1970, nasceu o Programa Etnomatemática,
que apesar de ter surgido, segundo D’Ambrósio (1932-2021), “da análise de práticas
matemáticas em diversos ambientes culturais, foi ampliada para analisar diversas formas de
conhecimento, não apenas as teorias e práticas matemáticas.” (2005, p.102).

Devido sua amplitude, tornou-se uma proposta de teoria do conhecimento, tendo como
essência as distintas formas de conhecer. Assim, a tendência etnomatemática no campo de
pesquisa e proposta educacional busca respeito e diálogo entre epistemologias distintas para
construções de novos conhecimentos, sem hierarquização e imposições dos conhecimentos
por parte da cultura dominante.

A origem deste trabalho está associada à proposta da disciplina de Tendências da


Educação Matemática, uma das disciplinas do curso de Mestrado em Educação Matemática
da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), e que teve seu texto ampliado para ser um dos
capítulos da dissertação, em andamento, intitulada Etnomatemática e decolonialidade a partir

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de pesquisas de estudantes indígenas do Curso de Licenciatura em Educação Básica


Intercultural da Universidade Federal de Rondônia (2015-2018).

O objetivo deste artigo é apresentar uma síntese da tendência etnomatemática,


destacando aspectos de sua história à sua relação com o ensino e aprendizagem da
matemática. São “curtas” abordagens sobre a tendência etnomatemática, longe de ser
completa, reconhecendo a impossibilidade de findar qualquer um dos tópicos abordados:
história, definição, objetos, autores, aspectos metodológicos e práticas de ensino-
aprendizagem. Contudo, as abordagens, ainda que “curtas”, têm neste trabalho uma fonte
diversificada de informações que podem servir de complemento ou suplemento para
pesquisadores neste campo de pesquisa denominado etnomatemática.

2. Breve história da etnomatemática

Historicamente, a partir das grandes navegações do século XV, as relações entre os


europeus e os povos do Novo Mundo, foram pautadas em inferiorizações entre os povos, na
invisibilidade e negação dos saberes dos colonizados, em um massacre cultural,
transformando fortemente a economia e a sociedade capitalista europeia, que ao longo da
história internacionalizou a matemática ocidental, consolidando a racionalidade científica da
Europa através do aumento das atividades científicas e tecnológicas.

Com a internacionalização da matemática ocidental, em 1928, um grupo de jovens


matemáticos franceses, que adotou um personagem fictício, Bourbaki, em 1928, sintetizaram
toda a matemática conhecida em uma obra com cerca de 100 volumes e ainda incompleta.
Para D’Ambrósio esta obra matemática foi a mais importante de meados do século XX
(D’AMBROSIO, 1997). Ela teve grande repercussão na educação temática de todo o mundo e
estruturou ideias para o surgimento do Movimento da Matemática Moderna (MMM), com
grande relevância no Brasil na década de 1960.

Com o fracasso do MMM na década de 1970, surgiram novos movimentos, inclusive o


movimento de etnomatemática, cujos pesquisadores participantes reagiam contra a
matemática universal e lutavam pelo reconhecimento da matemática em ambientes
extraescolares. A exemplo desse movimento, em 1976, aconteceu o 3º Congresso
Internacional de Educação Matemática (ICME3), realizado em Karlsruhe, na Alemanha, em
que o matemático e pesquisador Ubiratan D`Ambrósio expôs as principais ideias do Programa

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Etnomatemática, apesar de não ter utilizado esse termo, com enfoque na crítica sociocultural
da Matemática Ocidental (D’AMBROSIO, 1997).

Segundo a pesquisadora Gelsa Knijnik (1996), nesse Congresso iniciou-se um


processo de “abertura”, possibilitando que a Educação Matemática, que vinha sendo
produzida em outros países que não os europeus e na América do Norte, ganhasse certa
visibilidade. A partir de então, alguns pesquisadores tomaram conhecimento dessa nova linha
de pesquisa que, em breve, se tornaria presente em diversos países do mundo. Tanto que em
1984, quando foi realizado o 5º Congresso Internacional de Educação Matemática (ICME 5),
ocorrido em Adelaide, na Austrália, (KNIJNIK, 1996), se efetivou o reconhecimento da
Etnomatemática no cenário internacional.

Em 1986, foi criado o Grupo Internacional de Estudo em Etnomatemática (IGSEm),


agregando pesquisadores educacionais de todo o mundo que estavam envolvidos nessa nova
área de conhecimento e na forma de como utilizá-la no contexto escolar (SEBASTIANI
FERREIRA, 1997). Com ampla participação internacional, o IGSEm passou a encorajar,
reconhecer e divulgar pesquisas em etnomatemática com a publicação periódica de um
boletim - IGSEm Newsletter - contendo resenhas de trabalhos e livros, relatórios de pesquisa,
notícias de eventos, sugestões metodológicas e tudo que se faz necessário para possibilitar
uma maior integração na área (D’AMBROSIO, 2001).

Rosa e Orey (2018) apresentam outras organizações e grupos de estudos, por exemplo,
o Grupo de Trabalho sobre o papel da etnomatemática na Educação Matemática (TSG35), o
Congresso Internacional de Educação Matemática (ICME), a Red Latinoamericana de
Etnomatemática e o Grupo de Estudos e Pesquisas em Etnomatemática (GEPEm), da
Faculdade da Educação, da Universidade de São Paulo.

Conforme Borba e Sousa (2021, p. 92-93):

No Brasil, vários grupos de investigação registradas no Conselho Nacional de


Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), têm a Etnomatemática como
objeto de estudo explícito. Por exemplo, o Grupo de Estudo e Pesquisa em
Etnomatemática da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (GEPEm-
FEUSP), desde 1999, o Grupo de Estudo e Pesquisa em Etnomatemática (GEPEtno)
da UNESP, em 2004, São Paulo, cuja criação Ubiratan foi participante, entre outros
grupos criados posteriormente e ativos em vários estados do país, como Bahia, Mato
Grosso, Minas Gerais, Pará, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul. Ademais, no
Brasil existe uma Coordenação Nacional da RedINET e uma comunidade virtual,
EtnoMatemaTicas Brasis, que mantem um canal sobre Etnomatemática no YouTube
e que já publicou recentemente o Almanaque EtnoMatemaTicas Brasis.

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Atualmente, há vários Grupos de Estudo/Trabalho que envolve a etnomatemática em


diversas universidades brasileiras. Todas essas organizações e grupos servem de fonte para
pesquisadores e educadores que buscam uma compreensão da etnomatemática.

Desde 1984 seis Conferências Internacionais em Etnomatemática (ICEm) foram


realizadas: Espanha (1998), Brasil (2002), Nova Zelândia (2006), Estados Unidos (2010),
Moçambique (2014) e Colômbia (2018), devendo a sétima Conferência acontecer em Papua-
Nova Guiné, em 2022. Tais Conferências Internacionais “têm atraído etnomatemáticos,
pesquisadores e educadores de, aproximadamente, 50 países, ilustrando o crescimento
internacional de investigações e estudos em Etnomatemática” (ROSA; OREY, 2018, p. 545).

No Brasil, desde o ano 2000, acontece o Congresso Brasileiro de Etnomatemática


(CBEm), sendo o primeiro (CBEm1) no ano 2000, realizado em São Paulo, na Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo (USP). O segundo (CBEm2) em 2004, na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em Natal. O terceiro Congresso
Brasileiro de Etnomatemática (CBEm3) foi realizado em 2008, na Faculdade de Educação da
Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói. O quarto (CBEm4) aconteceu na
Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, em 2012. O quinto Congresso Brasileiro de
Etnomatemática (CBEm5) foi realizado em 2016, na Universidade Federal de Goiás (UFG),
em Goiânia “É importante ressaltar que as cinco edições do Congresso Brasileiro de
Etnomatemática (CBEm) confirmam e consolidam o desenvolvimento das relações entre os
investigadores e educadores etnomatemáticos no âmbito nacional e internacional” (ROSA;
OREY, 2018, p. 547). O sexto Congresso Brasileiro de Etnomatemática (CBEm6), 2020, em
Araguaína, na Universidade Federal de Tocantins, no Estado de (TO), foi adiado por motivo
da Covid-19

A criação de vários grupos, organizações e eventos nacional e internacional são frutos


do reconhecimento das obras de D´Ambrósio para a etnomatemática.

O reconhecimento dos estudos de Ubiratan D’Ambrósio justificou a criação do


Grupo Internacional de Estudos sobre Etnomatemática (International Study Group
on Ethnomatematics – ISGEm) em 1985 e da Red Internacional de Etnomatemática
(REDINET), iniciada na Colômbia em 2003, assim como, a organização de diversos
eventos, que continuam se realizando até hoje, como: a Conferência Internacional
de Etnomatemática (International Conference on Ethnomatematics – ICEM), o
Encontro Latinoamericano de Etnomatemática (ELEm), em 2016, na Guatemala, e o
Congresso Brasileiro de Etnomatemática (CBEM) desde 2000 (BORBA; SOUSA,
2021, p. 92).

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Em 21 de maio de 2021, aos 88 anos, faleceu Ubiratan D’Ambrósio, deixando, não


apenas para a comunidade científica e educacional, mas para a humanidade, o que chamou de
Programa Etnomatemática.

3. Definições de etnomatemática

A etnomatemática é um campo de pesquisa da Educação Matemática, ampla, holística,


transdisciplinar e que D’Ambrósio (2005, p. 102) definiu como:

[...] uma estratégia desenvolvida pela espécie humana ao longo de sua história para
explicar, para entender, para manejar e conviver com a realidade sensível e
perceptível, e com o seu imaginário, naturalmente dentro de um contexto natural e
cultural. Isso se dá também com as técnicas, as artes, as religiões e as ciências em
geral. Trata-se essencialmente da construção de corpos de conhecimento em total
simbiose, dentro de um contexto temporal e espacial, que obviamente tem variado
de acordo com a geografia e a história dos indivíduos e dos vários grupos culturais a
que eles pertencem famílias, tribos, sociedades, civilizações. A finalidade maior
desses corpos de conhecimento tem sido à vontade, que é efetivamente uma
necessidade, desses grupos culturais de sobreviver no seu ambiente e de transcender,
espacial e temporalmente, esse ambiente.

Contudo, devido sua amplitude, pesquisadores dessa área, como Gelsa Knijnik e
Sebastiani Ferreira, compartilham da opinião de que há uma impossibilidade de se dar uma
definição que se encerre o significado de etnomatemática. Entretanto, entre a comunidade de
etnomatemáticos (pelo menos na comunidade brasileira) é reconhecida sua definição
etimológica:

Metodologicamente, esse programa reconhece que na sua aventura enquanto espécie


planetária, o homem [...] tem seu comportamento alimentado pela aquisição de
conhecimento, de fazer(es) e de saber(es) que lhes permitem sobreviver e
transcender através de maneiras, de modos, de técnicas, ou mesmo de artes [techné
ou tica] de explicar, de conhecer, de entender, de lidar com, de conviver com
[matema] a realidade natural e sociocultural [etno] na qual ele, homem está inserido.
Ao utilizar, num verdadeiro abuso etimológico, as raízes matema e etno, dei origem
à minha conceituação de etnomatemática (D’AMBRÓSIO, 2004, p. 46).

Assim, as maneiras de conhecer e lidar com a realidade natural e sociocultural de cada


grupo cultural específico passou a ser objeto de estudo da etnomatemática. Portanto, ao se
definir o objeto de estudo dessa forma, temos um enfoque abrangente, permitindo que sejam
consideradas como forma de etnomatemática a matemática praticada por categorias
profissionais específicas, a escolar, aquelas presentes em brincadeiras de crianças e a
praticada para atender as necessidades de sobrevivência.

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D´Ambrósio (2008) considerou mais adequado a consideração de um Programa


Etnomatemática, do que simplesmente etnomatemática, pela forma em que se desenvolveu,
pelas suas dimensões, seu objetivo, preocupações e seu campo de pesquisa.

O Programa Etnomatemática desenvolveu-se seguinte várias vertentes. Tem suas


dimensões histórica, sócio-política, filosófica, cognitiva, pedagógica. Assim, parece-
me mais adequado não falar simplesmente etnomatemática, mas considerar um
Programa Etnomatemática, cujo objetivo maior é analisar as raízes socioculturais do
conhecimento matemático (D’AMBRÓSIO, 2001). O Programa Etnomatemática
revela uma grande preocupação com a dimensão política ao estudar história e
filosofia da matemática e suas implicações pedagógicas. As pesquisas consistem
essencialmente numa investigação holística da geração (cognição), organização
intelectual (epistemologia) e social (história) e difusão (educação) do conhecimento
matemático, particularmente em culturas consideradas marginais. (D’AMBRÒSIO,
2008, p. 14-15).

Vale lembrar que as práticas matemáticas, não escolares ou extraescolares, presentes


nos saberes e fazeres dos diversos grupos culturais distintos, já passaram por
conceitualizações diversas para designar esse tipo de matemática, antes, durante e depois das
ideias etnomatemáticas de D’Ambrósio. Segundo Passos (2014, p. 25), alguns termos são
apresentados por Sebastiani Ferreira (1997, p. 13-14), sendo: Sociomatemática (Zaslawsky,
1973), por tentar examinar práticas matemáticas nascidas da necessidade da sociedade;
Matemática Espontânea (D’Ambrósio, 1982), como sendo os métodos matemáticos
desenvolvidos por povos na luta de sobrevivência; Matemática Informal (Posner, 1982), pois
transmite aquela que se aprende fora do sistema de educação formal; Matemática Oprimida
(Gerdes, 1982), desenvolvida em países subdesenvolvidos onde pressupunha a existência do
elemento opressor – sistema de governo, pobreza, etc.; Matemática Não Estandardizada
(Caraher, 1982), (Gerdes, 1985), (Harris, 1987) para diferenciar da “standart” ou acadêmica.
Matemática Escondida ou Congelada (Gerdes, 1982; 1985) presente no estudo das cestarias e
dos desenhos em areias de moçambicanos. Matemática Popular (Mellin / Olsen, 1986), que
se desenvolve no dia-a-dia e que pode ser ponto de partida para o ensino da Matemática
acadêmica. Matemática Codificada no Saber Fazer (Sebastiani Ferreira, 1987).

Para Passos (2004, p. 26), segundo os autores estudados em sua pesquisa, “alguns
desses termos foram criados antes das ideias de D’Ambrósio, e, depois foram feitas relações
com a etnomatemática” d’ambrosiana.

Ainda, encontramos em Esquincalha (2004, p. 6) outros três termos: Matemática Oral


(Caraher, 1982; Kane, 1987); Matemática Materna (Sebastiani Ferreira, 1993); e Matemática
Antropológica (D’Ambrósio, 1998).

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A busca por definições e conceitualizações sobre a matemática praticada, aprendida e


ensinada em diferentes grupos culturais e que não são resultados de um processo de ensino-
aprendizagem da matemática nas escolas e universidades, acabaram por se relacionarem,
algumas, com as ideias e estudos de Ubiratan D’Ambrósio sobre etnomatemática, reforçando
a etnomatemática como tendência.

Como tendência em desenvolvimento, a etnomatemática foi alvo de críticas, Paul


Dowling, citado por Sebastiani Ferreira (1993), argumenta que o discurso etnomatemático é
apenas uma manifestação ideológica. James Taylor, citado por Knijnik (1996), afirma que
existe uma profunda ambiguidade no discurso etnomatemático, principalmente pelo fato de
consistir em uma abordagem política e pedagógica, e de não se preocupar em atentar para a
questão epistemológica que, segundo o crítico, deve ser considerada a mais central. E, Wendy
Millroy, também citada por Knijnik (1996), se refere a um “paradoxo” da etnomatemática, ou
seja, fica impossível uma pessoa que, pertencente a um grupo cultural específico, reconheça e
descreva qualquer objeto sem que use seus próprios referenciais.

Contudo, as críticas foram superadas e atualmente a etnomatemática é considerada


como Programa Etnomatemática, um programa de pesquisa, muito amplo, em história e
filosofia da matemática com fortes implicações pedagógicas.

4. Autores nacionais e internacionais da etnomatemática

Apesar de algumas críticas, o Programa Etnomatemática tem se desenvolvido


internacionalmente e consta com renomados pesquisadores, dentre os brasileiros: Ubiratan
D’Ambrósio, Maria do Carmo Santos Domite, Eduardo Sebastiani Ferreira, Gelsa Knijnik,
Milton Rosa, Daniel Orey, Sônia Maria Clareto, Marcelo Carvalho Borba, Caroline Mendes
dos Passos, Maria Cecília Fantinato, Roseli de Alvarenga Corrêa, Cristiane Coppe de
Oliveira, Alexandrina Monteiro, e muitos outros.

Já dentre os pesquisadores estrangeiros: Bill Barton (Nova Zelândia), Paulus Gerdes


(Holanda), Teresa Vergani (Portugal), Marcia e Robert Ascher (EUA), Paul Dowling (Inglês),
Ron Eglash (EUA), James Taylor (EUA), Wendy Millroy (EUA), Arthur Power (EUA),
Marlyn Frankenstein (EUA), e muitos outros.

5. Aspectos metodológicos da etnomatemática

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A etnomatemática como campo de pesquisa da Educação Matemática, tem apontado


como principais abordagens de pesquisa nessa área, segundo Benício e Stal (2016), a pesquisa
de abordagem qualitativa; e os tipos de pesquisa como a bibliográfica, de campo, etnográfica,
entre outras. E, dentre as temáticas abordadas: práticas e conhecimentos socioculturais,
formação docente e prática pedagógica.

Já na análise dos trabalhos publicados nos anais dos cinco anos do CBEM (2000 –
2016), realizada por Rosa e Orey (2018), nos aponta que as pesquisas em etnomatemática tem
acontecido mais na dimensão educacional (38,5) que nas demais dimensões: epistemológica
(17,9%), cognitiva (18,1%), conceitual (14,7%), histórica (5,8%) e política (5,0%).

Além disso, baseado nas leituras sobre etnomatemática para elaboração deste trabalho,
foi possível perceber abordagens analíticas mais frequentes em análise documental e análise
discursiva, tendo como sujeitos alunos e professores, e ambientes escolares como textos da
pesquisa (urbana, rural e indígena), além do uso de técnicas de coleta de dados como
entrevistas, questionários e gravações (áudio e/ou imagem) e observação participante. Sendo
estas as mais frequentes entre um universo bem diversificado de abordagens.

6. Relações da etnomatemática com o ensino e a aprendizagem

As implicações pedagógicas do Programa Etnomatemática e seus reflexos nas práticas


de ensino e aprendizagem da matemática levam em consideração que a geração de
conhecimento se dá através da ideia de ciclo da vida, que envolve: realidade – indivíduo –
ação (D’Ambrósio, 2005, p. 108), onde o indivíduo na necessidade de sobreviver e
transcender seu ambiente, promoverá ações que modificarão a realidade, surgindo uma nova
realidade que voltará a receber novas ações e assim sucessivamente vai se criando corpos de
conhecimentos que possibilitará aos grupos culturais sobreviverem e transcenderem, espacial
e temporalmente, em seus ambientes. Assim, em abordagens etnomatemáticas, o
conhecimento matemático “brota” do contexto cultural onde o aluno está inserido.

Como proposta pedagógica, D’Ambrósio (2008, p. 80) elucida que:

A proposta pedagógica da etnomatemática é fazer da matemática algo vivo, lidando


com situações reais no tempo [agora] e no espaço [aqui]. E por meio da crítica,
questionar o aqui e agora. Ao fazer isso, mergulhamos nas raízes culturais e
praticamos dinâmica cultural.

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Algo vivo implica em contextualizações, reconhecimento da matemática do dia-a-dia


do aluno, fruto de sua raiz cultural, que ao se deparar com a matemática escolar, passará por
uma dinâmica cultural, onde em um processo de ensino-aprendizagem de respeito e
valoração, ambos os conhecimentos irão interagir e provocar novos conhecimentos.

Assim, a etnomatemática não renega a matemática acadêmica ou escolar, apenas luta


pela não negação e desprestígio dos fazeres e saberes dos diversos grupos culturais distintos
(indígenas, quilombolas, pedreiros, marceneiros, brincadeiras de crianças, das cozinheiras,
entre outros), propondo a união entre ambas (preservando suas características), onde nenhum
dos conhecimentos é mais importante ou superior que não precise do outro.

Muitos são os pesquisadores que expressam suas visões sobre as ideias


etnomatemáticas no contexto escolar. Para Lopes e Borba (1994, pp. 53, 55), o Programa
Etnomatemática,

[...] tem como ponto de partida a cultura local, ou seja, cada grupo cultural tem sua
identidade própria ao pensar e no agir, logo, terá seu próprio modo de desenvolver o
conhecimento matemático [...]. Portanto, a busca da matemática na cultura do
estudante, no seu dia-a-dia, presente na etnomatemática, pode ser um importante
aliado do professor, não só como elemento motivador, mas também como
metodologia de ensino.

Assim, a contextualização entre os conteúdos matemáticos escolares e os


conhecimentos matemáticos advindos da cultura do aluno devem ser de interesse do
professor, que ao conceber a importância de ambos, cuida em utilizá-los de forma motivadora
para o estudante, uma vez que ele passa a ver sentido nos conteúdos com a sua realidade.

Sobre a inclusão da escola no contexto cultural do aluno, Sebastiani Ferreira (1997, p.


28, apud PASSOS, 2004, p. 54) argumenta que professores e diretores devam conhecer os
anseios e representações culturais importantes para a comunidade na qual a escola se insere,
de tal forma que os alunos deixem de “considerar a escola e seu discurso como totalmente
fora de sua realidade”

Portanto, a escola não pode ser um espaço separado, isolado, que não se relaciona com
a comunidade a qual está inserida, tendo discursos “estranhos” aos seus alunos. A concepção
etnomatemática de dinâmica cultural, onde conhecimentos diferentes geram novas
aprendizagem, exigem uma escola “aberta” e acolhedora aos anseios e representações
culturais importantes da sua comunidade, e um processo de ensino-aprendizagem baseado em

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mediações entre os conhecimentos distintos de forma a tornar mais motivador a aprendizagem


de seus alunos.

Segundo, Rosa e Orey (2004, p. 68-69):

A concepção etnomatemática do professor no ensino-aprendizagem em matemática


é a de mediador da aprendizagem, sendo, portanto, uma tarefa muito mais ampla do
que um simples ‘doador’ do saber. A concepção etnomatemática do aluno nesta
abordagem é o de colaborador ativo do processo de aprendizagem, tarefa muito mais
estimulante do que um simples ‘receptor’ do saber.

Tal concepção etnomatemática lança o professor para além daquele que se coloca
como o detentor único do conhecimento abordado, que não leva em consideração os
conhecimentos empíricos das vivências culturais dos seus alunos, e por isso, assume um papel
de “doador” do saber e tem em seus alunos apenas ouvintes passivos e receptores de seus
saberes. Nesse sentido, é importante estarem presentes nos currículos as concepções
etnomatemáticas.

A esse respeito, Corrêa (1992, p. 17-18) faz uma análise de algumas mudanças
conceituais nos componentes básicos do currículo propostos por D’Ambrósio:

- O Psico-Emocional, com a finalidade de derrubar o “terrorismo intelectual”


ocasionado pelo ensino da Matemática, proporcionando “auto-confiança” positiva.
O sujeito tem que ser feliz na escola.
- O Social-Cultural, que se coloca no sentido de repensar a história “com mais
honestidade. A contribuição de todas as culturas aparece na Matemática”. Torna-se
necessário quebrar resistências.
- O Político, refletindo na construção da cidadania. Para manutenção do processo
democrático faz-se necessário um eleitorado bem informado, que tenha condições de
interpretar dados, “ler” criticamente artigos de jornais e outros veículos (p. 18).
Aos métodos, novos enfoques nos fazem refletir sobre:
- Teorias de aprendizagem superadas, pobreza do conceito ensino-aprendizagem,
linearidade cumulativa nos programas;
- Computadores de inteligência artificial;
- Criatividade e inteligências múltiplas;
- Planta física das escolas;
- Relacionamento escola/casa;
- Avaliação: totalmente inútil e negativa do ponto de vista educacional.

Chamo a atenção para o ano da análise realizada por Corrêa (1992), e que nos parece
bem atual, questões como, por exemplo, o “terrorismo intelectual” ou “medo” da matemática,
a “quebra de resistências”, a construção da cidadania para manutenção do processo
democrático, a insistência de uso de teorias de aprendizagem já superadas, o relacionamento
da escola com a comunidade em que está inserida e o sistema de avaliação, são questões ainda
presentes nas discussões da educação do século XXI.

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7. Considerações finais

Neste trabalho, buscou-se apresentar uma síntese da tendência etnomatemática,


abordando tópicos, como: história, definição, objeto, autores, aspectos metodológicos e
práticas de ensino-aprendizagem.

Percebeu-se com a realização deste trabalho o avanço significativo da tendência


etnomatemática, tanto nacionalmente como internacionalmente, através de grupos,
organizações e eventos, e, consequentemente, o crescimento do quantitativo de
autores/pesquisadores neste campo de pesquisa, com abordagens de investigações nas
diversas dimensões da etnomatemática, como: epistemológica, conceitual, histórica,
cognitiva, política e educacional.

Além disso, é possível afirmar, mesmo que baseado em experiência profissional, que
apesar de a tendência etnomatemática ter forte implicações pedagógicas, ainda, atualmente,
encontra “resistências”, não apenas em constar nos currículos (teoria), mas ser uma realidade
de práticas pedagógicas nas escolas brasileiras.

Assim, as abordagens sobre a tendência etnomatemática, mesmo que “curtas”, têm


neste trabalho uma fonte diversificada de informações que podem servir de complemento ou
suplemento para pesquisadores neste campo de pesquisa denominado etnomatemática.

8. Referências

BENÍCIO, M. A; STAL, J. Ç. O estado da arte da etnomatemática nos trabalhos apresentados


no Encontro Nacional de Educação Matemática. In: ENCONTRO NACIONAL DE
EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, Anais do XII ENEM, São Paulo, 13 a 16 de julho, 2016.

BORBA, M. de C.; SOUSA, O. S. Em memoria del pensador y educador matemático


brasileño Ubiratan D’Ambrósio: creador del Programa Etnomatemática. Mônica E. Villarreal
(Traducción). Revista de Educación Matemática. v. 36, n. 2, 2021.

D´AMBRÓSIO, U. O Programa Etnomatemática: uma síntese. Acta Scientiae, v. 10, n. 1,


jan. /jun. 2008.

D´AMBROSIO, U. Sociedade, cultura, matemática e seu ensino. Educação e Pesquisa, USP,


v. 31, n. 1, p. 99-120, 2005.

ESQUINCALHA, A. da Conceição. Etnomatemática: Um estudo da evolução das ideias. In:


ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO MATEMÁTICA, Anais do VIII ENEM.
Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2004.

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FLEMMING, D. M; LUZ, E. F; MELLO, A. C. C.. Tendências em Educação Matemática.


2. ed. Palhoça: Unisul Virtual, 2005.

GROENWALD, C. L. O; SILVA, C.;K. da; MORA, C. D. Perspectivas em Educação


Matemática. Actas Cientiae. Canoas/RS, v.6, n.1, jan./jun., 2004.

LOPES, A. R. L. V; BORBA, M. de C. Tendências em Educação Matemática. Roteiro,


Revista da UNOESC/SC, v. XVI, n. 32, jul./dez., 1994.

PASSOS, C. M. dos. O Programa Etnomatemática em uma perspectiva pedagógica.


Monografia (especialização em Educação Matemática), Universidade Federal de Ouro Preto.
Ouro Preto/MG, 2004.

ROSA, M.; OREY, D. C. Tendências atuais da etnomatemática como um programa: Rumo à


ação pedagógica. Zetetiké. UNICAMP, v. 13, n 23, jan./jun. 2005.

ROSA, M; OREY, D. C. Estado da arte da produção científica dos Congressos Brasileiros em


Etnomatemática. Ensino Em Re-vista, Uberlândia/MG, v. 25, n. 3, set./dez., 2018.

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ETNOMATEMÁTICA, DECOLONIALIDADE E INTERCULTURALIDADE


CRÍTICA: PRESSUPOSTOS CONVERGENTES PARA A EDUCAÇÃO ESCOLAR
INDÍGENA

Luiz Carlos dos Reis


Universidade Federal de Rondônia
rheully.reis@gmail.com

Kécio Gonçalves Leite


Universidade Federal de Rondônia
kecioleite@unir.br

Resumo:
O presente artigo é um recorte da fundamentação teórica de uma pesquisa em andamento no curso de Mestrado
em Educação Matemática, do Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática – PPGEM, ofertado pela
Universidade Federal de Rondônia no Campus de Ji-Paraná. Tem por objetivo analisar os pressupostos da
etnomatemática, da decolonialidade e da interculturalidade crítica e suas possíveis convergências no âmbito da
educação escolar indígena. Para fundamentar a pesquisa, o aporte teórico sobre etnomatemática é representado
pelo autor Ubiratan D’Ambrosio; sobre decolonialidade a fundamentação se baseia nos autores Anibal Quijano,
Walter Mignolo e Boaventura de Sousa Santos; por sua vez, a interculturalidade crítica é analisada na
perspectiva da autora Catherine Walsh. A abordagem metodológica é qualitativa, com pesquisa bibliográfica.
Como resultado, verificou-se que entre os três temas abordados há convergências entre seus pressupostos e que
tais pressupostos podem ser utilizados, isolados ou juntos, nas construções de novas pedagogias, novas práticas
de ensino e aprendizagem no âmbito da educação escolar indígena.
Palavras-chave: Etnomatemática; Educação Escolar Indígena; Decolonialidade; Interculturalidade Crítica.

1. Introdução

Este artigo é um recorte da revisão teórica realizada em uma pesquisa de mestrado em


andamento, no Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática – PPGEM, ofertado
pela Universidade Federal de Rondônia. Dedica-se à análise de três temas importantes quando
se trata da busca por novas pedagogias, que possam transformar o modelo de educação atual e
alcançar mudanças significativas que melhorem a vida das pessoas, a partir do respeito,
conhecimento e reconhecimento de suas epistemologias, saberes e fazeres, colocando-os
como sujeitos e não como objetos, cidadãos conscientes e ativos capazes de conservar,
preservar e dividir seus conhecimentos na busca de novas formas de produzi-los, que não a
baseada unicamente em técnicas e metodologias de origem europeia. Os temas são
etnomatemática, decolonialidade3 e interculturalidade crítica, contextualizados no âmbito
específico da Educação Escolar Indígena.

3 Neste trabalho aparecem, ou podem aparecer, tanto o termo decolonialidade e decolonial como o termo
descolonialidade e descolonial. Foi Catherine Wash quem optou por excluir o “s” na procura de fazer uma
distinção com o significado em Castelhano “des” que pode ser entendido como um simples desarmar, desfazer
ou reverter o colonial. Ou seja, passar de um momento colonial a um não colonial, como se fosse possível que
seus padrões e traços deixassem de existir. Com este jogo linguístico, Walsh, tenta mostrar que não existe um
estado nulo de colonialidade, mas posições, horizontes e projetos a resistir, transgredir, intervir, emergir, criar e

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2. A Etnomatemática: Valorizando o diálogo e combatendo a discriminação

O movimento que deu origem à etnomatemática surgiu no Brasil na década de 1970 e


trouxe críticas sobre a forma tradicional de como a matemática é abordada, tanto no contexto
social quanto no educacional. Foi nesse período que uma parte da comunidade educacional
brasileira passou a considerar a proposta de que a matemática é fruto de um produto cultural.
Ubiratan D’Ambrosio define etnomatemática como

[...] uma estratégia desenvolvida pela espécie humana ao longo de sua história para
explicar, para entender, para manejar e conviver com a realidade sensível e
perceptível, e com o seu imaginário, naturalmente dentro de um contexto natural e
cultural. Isso se dá também com as técnicas, as artes, as religiões e as ciências em
geral. Trata-se essencialmente da construção de corpos de conhecimento em total
simbiose, dentro de um contexto temporal e espacial, que obviamente tem variado
de acordo com a geografia e a história dos indivíduos e dos vários grupos culturais a
que eles pertecem famílias, tribos, sociedades, civilizações. A finalidade maior
desses corpos de conhecimento tem sido à vontade, que é efetivamente uma
necessidade, desses grupos culturais de sobreviver no seu ambiente e de transcender,
espacial e temporalmente, esse ambiente (D’AMBROSIO, 2005, p. 102).

Assim, a etnomatemática procura compreender os conhecimentos gerados ao longo da


história da humanidade, reconhecendo que o conhecimento se dá de maneiras diferentes, em
culturas diferentes, em épocas diferentes e que isso acontece de forma harmônica
intraculturalmente nos diversos grupos culturais, como uma necessidade de sobrevivência e
transcendência de seu ambiente.

Devido a sua amplitude, tentar definir “o que é etnomatemática” parece não fazer mais
sentido entre pesquisadores desta área, pois compreendem não ser possível elaborar uma
definição que comporte/encerre todo o seu significado. Entretanto, é amplamente
reconhecida/aceita pela comunidade de etnomatemáticos (pelo menos na comunidade
brasileira) a seguinte definição etimológica de etnomatemática:

Metodologicamente, esse programa reconhece que na sua aventura enquanto espécie


planetária, o homem [...] tem seu comportamento alimentado pela aquisição de
conhecimento, de fazer(es) e de saber(es) que lhes permitem sobreviver e
transcender através de maneiras, de modos, de técnicas, ou mesmo de artes [techné
ou tica] de explicar, de conhecer, de entender, de lidar com, de conviver com
[matema] a realidade natural e sociocultural [etno] na qual ele, homem está inserido.
Ao utilizar, num verdadeiro abuso etimológico, as raízes matema e etno, dei origem
à minha conceituação de etnomatemática (D’AMBROSIO, 2004, p. 46).

Ainda em meados da década de 1970, começa a tomar corpo um programa


educacional denominado Programa Etnomatemática, e Ubiratan D´Ambrosio, principal

influenciar (WALSH, 2009). Portanto, ambos os termos devem ter o mesmo significado quando está se tratando
da colonialidade do poder.

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idealizador da etnomatemática, conceitua, em essência, o que é esse Programa nos seguintes


termos:

Embora este nome [Etnomatemática] sugira ênfase na matemática, ele é um estudo


da evolução cultural da humanidade no seu sentido amplo, a partir da dinâmica
cultural que se nota nas manifestações matemáticas. Mas que não se confunda com a
matemática no sentido acadêmico, estruturada como uma disciplina (...) em
essência, o Programa Etnomatemática é uma proposta de teoria do conhecimento
(D´AMBROSIO, 2005, p. 102).

Nesse caso, o Programa Etnomatemática diz respeito a mais que uma matemática
acadêmica imposta de maneira universal, é mais ampla, holística, uma teoria do conhecimento
que abarca várias áreas. Entre os campos de pesquisas da Educação Matemática, a
Etnomatemática transcende do plano da interdisciplinaridade para o plano da
transdiciplinaridade, investigando sobre os saberes e fazeres matemáticos, não apenas em
escolas ou salas de aula, mas nos mais diversos ambientes e grupos culturais distintos. Para
D´Ambrosio (2009, p. 79-80), a transdisciplinaridade favorece uma

[...] postura de reconhecimento de que não há espaço nem tempo culturais


privilegiados que permitam julgar e hierarquizar como mais corretos os mais
diversos complexos de explicações e de convivência com a realidade. A
transdisciplinaridade repousa sobre uma atitude mais aberta, de respeito mútuo e
mesmo humildade em relação a mitos, religiões, sistemas de explicação e de
conhecimentos, rejeitando qualquer tipo de arrogância ou prepotência.

Portanto, o Programa Etnomatemática, em sua transdisciplinaridade, ultrapassa as


limitações existentes nas diversas disciplinas acadêmicas, inclusive a de uma matemática
universal imposta a partir da Europa através de hierarquizações, como as epistêmicas e
linguísticas, transcendendo para a análise das diversas formas de conhecimento e não apenas
as teorias e práticas matemáticas em variados grupos culturais distintos, deixando de ser
apenas um estudo da matemática étnica.

Segundo Ferreira (2005), é importante a percepção de que o Programa de


Etnomatemática não é o estudo da matemática étnica, pois

A percepção deste fato possibilita às pesquisas de perfil etnomatemático adentrar o


fazer, o pensar, o lidar, o imaginar, o explicar e o aprender, comuns a outras
culturas, sem, no entanto, estarem condicionadas ou presas ao construto particular
denominado matemática (FERREIRA, 2005, p. 119).

Para os pesquisadores em etnomatemática, adentrar o saber e o fazer de grupos


culturais distintos sem estar condicionado ou preso a matemática acadêmica é uma importante
forma de se respeitar e preservar culturas específicas, pois um grande desafio da pesquisa de
perfil etnomatemático é como reproduzir um conhecimento matemático acadêmico,

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universalizado, de uma cultura dominante, sem destruir culturas de grupos e povos


subalternizados. Nesse caso, apresenta-se a etnomatemática como uma contra-conduta das
ideias e práticas da cultura dominante em favor de práticas legítimas de outras culturas.

Para Bello (2000), os trabalhos em etnomatemática evidenciam uma resistência dos


grupos dominados:

Os trabalhos em etnomatemática ao associar as práticas cotidianas de grupos hoje


subordinados, com as práticas matemáticas surgidas também de confrontos e
disputas, evidenciam essa resistência, isto é, a maneira como vem sendo o caminho
percorrido e alcançado pelos grupos dominados no processo de apropriação das
práticas matemáticas legítimas impostas após um processo de conquista e
colonização (BELLO, 2000, p. 197-198).

Coaduna com Bello o pensamento de Monteiro e Mendes (2015), ao compreenderem a


etnomatemática como uma formação discursiva que representa um movimento de contra-
conduta, como uma forma de resistência aos modos de governamento impostos pelo campo da
matemática:

Desse modo, nós entendemos, neste trabalho, que essa outra formação discursiva
que emerge desse campo apresenta-se como uma resistência aos modos de
governamento (im) posto pelo campo da matemática formal, uma resistência que
não nega a matemática, tão pouco pretende instituir uma revolução nesse campo do
saber, mas busca novas formas de pensar esse saber, novas condutas e normas de
constituição desse saber, por isso estamos aqui entendendo como um movimento de
contra-conduta (MONTEIRO, MENDES, 2015, p. 05).

Vale ressaltar que, na busca por novas formas de pensar os saberes, a etnomatemática
dialoga com vários campos – história, filosofia, sociologia, antropologia e educação, entre
outros, que a conduzem para um espaço transdisciplinar de múltiplas possibilidades. Segundo
Ribeiro e Ferreira, a etnomatemática,

ao buscar compreender o que advém de uma outra realidade, se aproxima da


educação escolar, da antropologia, da hermenêutica, da psicologia e de vários outros
campos que a conduzem para um espaço transdisciplinar de múltiplas
possibilidades. A abertura que traz junto a si, valoriza o diálogo, o saber ouvir, a
crítica, a ética, a autonomia, a esperança. Nela não há espaço para visões
discriminatórias. Deste modo, promove outras histórias para a realidade dos
excluídos. Histórias que os posicionam enquanto sujeitos, diferentemente do que
tem constantemente ocorrido (RIBEIRO, FERREIRA, 2006, p. 159).

Assim, entende-se que a etnomatemática, como campo de pesquisa e proposta


educacional, busca pela valorização do diálogo entre os diferentes saberes e o combate à
discriminação dos grupos que foram e são excluídos, marginalizados e oprimidos devido à
colonialidade do poder, do saber, do ser e cosmogônico imposta pelo pensamento moderno
eurocêntrico.

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Nesse caso, do ponto de vista educacional, a etnomatemática contribui para que as


escolas indígenas possam se apresentar como um espaço de resistência, de defesa e
preservação de seus conhecimentos e epistemologias, na prática de uma ecologia de saberes
na busca de “caminhos pluriversais” (MIGNOLO, 2004).

Sendo assim, as práticas pedagógicas pautadas no viés da etnomatemática podem


contribuir para o conhecimento e reconhecimento de saberes, ora considerados “saberes
subalternos” (MIGNOLO, 2004), combatendo o desperdício de experiências, o
“epistemicídio” (SANTOS, 2007a), valorizando epistemologias outras e ajudando no
processo de decolonizar a educação escolar indígena. Sendo possível afirmar que a
etnomatemática e a decolonialidade caminham de mãos dadas, ou, pelo menos, convergem em
muitos de seus pressupostos no que se refere a luta contra a colonialidade.

3. Decolonialidade: É preciso decolonizar!

O processo de colonização das Américas e posteriormente do continente africano e


asiático, formou colônias que serviram para o enriquecimento de países europeus, através da
exploração e subalternação dos povos colonizados. A Europa se colocou como o centro do
mundo, a detentora do conhecimento, onde a racionalidade científica europeia passou a ser a
referência e a validadora de qualquer outra forma de se produzir conhecimento.

O eurocentrismo foi colocado como perspectiva hegemônica, exercendo poder sobre


diversas populações, negando as diferenças históricas, culturais, linguísticas e espirituais, e
colocando em descrédito ou no plano da inexistência qualquer conhecimento que não
estivesse de acordo com a racionalidade científica europeia, excluindo os colonizados
daqueles que fazem parte “da modernidade, da razão e das faculdades cognitivas” (WALSH,
2009, p.15).

Assim, a modernidade eurocêntrica imposta ao mundo criou uma concepção de


humanidade dualista, onde os europeus são os superiores, racionais, civilizados e modernos.
Colocando os povos não europeus como sujeitos inferiores, irracionais, primitivos e
tradicionais. Também, incultos, iletrados, pagãos e bárbaros, o que justificaria o direito
natural a dominação colonial e todos os “massacres” que a colonização impôs. Conforme o
pensamento filosófico moderno do século XVI, “é justo, conveniente e conforme à lei natural

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que os varões probos, inteligentes, virtuosos e humanos dominem sobre todos os que não
possuem estas qualidades” (SEPÚLVEDA, apud DUSSEL, 2010, p. 355).

Ao final do colonialismo no mundo, restou a colonialidade, enraizada nas


subjetividades, na cultura dos povos ora colonizados, em suas crenças, religiosidades, em seus
saberes e fazeres do dia-a-dia e em suas epistemologias. A colonialidade é um conceito que
foi introduzido pelo sociólogo peruano Anibal Quijano, no final dos anos 1980 e início dos
anos de 1990. Quijano (2009, p. 73) revela que

a colonialidade é um dos elementos constitutivos e específicos do padrão mundial do


poder capitalista. Sustenta-se na imposição de uma classificação racial/étnica da
população do mundo como pedra angular do referido padrão de poder e opera em
cada um dos planos, meios e dimensões, materiais e subjetivos, da existência social
quotidiana e da escala societal. Origina-se e mundializa-se a partir da América.

A matriz quadridimensional da colonialidade – do poder, do saber, do ser e


cosmogônico - é elemento constitutivo da modernidade, é um instrumento de desumanização,
de negação de saberes e fazeres de grupos culturais distintos, de classificações racial/étnica e
de poder. Para Mignolo (2017), a colonialidade é o lado mais escuro da modernidade, que
surgiu com as invasões europeias pelo mundo, e, portanto, a modernidade não pode sê-lo sem
a colonialidade, pois são um único projeto.

“O lado mais escuro da modernidade”, (MIGNOLO, 2017), é justamente o lado que


foi ocultado, colocado no escuro, invisibilizado, escondido devido sua perversidade e
desumanização com os povos que foram marginalizados, desacreditados e que tiveram seus
saberes, fazeres, suas epistemologias e conhecimentos também ocultos e negados. A
colonialidade com sua perversidade e desumanização não foi “posta à mesa” para o mundo,
apenas, ao mundo, foi lhes dado a conhecer a “gloriosa” modernidade europeia a que todos os
povos um dia poderiam alcançar.

Segundo Oliveira e Candau (2010), existe uma “geopolítica do conhecimento” que se


dá na “estratégia da modernidade europeia que afirmou suas teorias, seus conhecimentos e
seus paradigmas como verdades universais e invisibilizou e silenciou os sujeitos que
produzem conhecimentos outros. Dessa forma, um totalitarismo epistêmico negou ao resto da
humanidade a capacidade de pensar, de produzir conhecimentos e ao contrário do
conhecimento e reconhecimento de suas epistemologias, tiveram seus conhecimentos tratados
como subalternos.

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Santos diz que o pensamento abissal eurocêntrico criou uma linha divisória entre as
realidades sociais, onde um dos lados (norte) detêm o poder, enquanto o outro inexiste (sul).

A característica fundamental do pensamento abissal é a impossibilidade da co-


presença dos dois lados da linha. Este lado da linha só prevalece na medida em que
esgota o campo da realidade relevante. Para além dela há apenas inexistência,
invisibilidade e ausência não-dialética (SANTOS, 2009, p. 24).

O autor sugere uma epistemologia do sul (epistemologias de grupos culturais que


tiveram seus conhecimentos negados ao longo da história, o “sul” representa lugares e povos
marginalizados, excluídos e oprimidos) e uma ecologia de saberes (diálogos horizontais, sem
hierarquização entre os diversos saberes distintos) para o conhecimento e reconhecimento de
epistemologias “outras” que promovam a emancipação do sujeito subalternizado, elevando-o
da categoria de “objeto” para a categoria de “sujeito”. Ainda, fala em “epistemicídio”, ou seja,
nos desperdícios de experiências, e uma “sociologia das ausências” como forma de dar
visibilidade a muitos e variados conhecimentos e epistemologias, invisíveis para a
racionalidade moderna ocidental.

Portanto, é preciso decolonizar. A decolonialidade implica, segundo Oliveira e Candau


(2010, p. 20),

[...] partir da desumanização e considerar as lutas dos povos historicamente


subalternizados pela existência, para a construção de outros modos de viver, de
poder e de saber. Portanto, decolonialidade é visibilizar as lutas contra a
colonialidade a partir das pessoas, das suas práticas sociais, epistêmicas e políticas.

Logo, o pensamento decolonial exige, também, um reconhecimento de que, em muitos


aspectos, continuamos sendo povos colonizados, dada a permanência de uma colonização
social e cultural e, portanto, a importância de conhecer e reconhecer epistemologias que
valorizam os conhecimentos que, com muita luta, resistiram e resistem ao processo de
ocultamento e supressão de saberes e fazeres promovidos pelo pensamento hegemônico
europeu. Portanto, desde o surgimento da colonialidade, surgiu também a descolonialidade,
não apenas como forma de resistir, mas de sustentar e (re)construir.

Para Síveres e Santos (2013), a ideia não é desconsiderar tudo que é conhecimento
ocidental, mas apenas a defesa do direito de emergir conhecimentos não ocidentais,
dialogando mais, pensando muito mais, acolhendo muito mais conhecimentos que ao longo da
história vêm sendo excluídos, e questionar a negação de todo conhecimento que não seja do
pensamento moderno ocidental. É a defesa de que é preciso abrir mão de toda epistemologia
geral, de qualquer caminho universal.

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Afinal, quando há apenas um caminho como opção, não é uma opção. Nesse sentido, o
descolonizar na educação escolar indígena seria/será uma prática de construção de novas
pedagogias além da hegemônica, uma práxis, articulando etnomatemática e pedagogias
decoloniais.

4. A interculturalidade crítica: Contribuições na luta, resistência e preservação de


conhecimentos e epistemologias indígenas e outras

No Brasil, os grupos culturais indígenas vêm sofrendo a invisibilidade de seus


conhecimentos ao longo da história. Contudo, a Constituição Federal de 1988 ofereceu meios
legais que influenciaram positivamente nas políticas voltadas para a educação escolar
indígena. Um exemplo foi a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394, de
1996, que evidenciou que o ensino nas escolas indígenas deveria ser bilíngue e intercultural,
reconhecendo seus processos próprios de aprendizado, ou seja, de uma perspectiva da
interculturalidade.

Neste trabalho, utilizaremos o conceito de interculturalidade tratado por Walsh (2019).


Para a autora, tal conceito vai além do que a simples ideia de inter-relação (ou comunicação,
como geralmente se entende no Canadá, Europa e estados Unidos). E é um conceito

[...] formulado e carregado de sentido principalmente pelo movimento indígena


equatoriano, conceito ao qual este movimento se refere até 1990 como “um
princípio ideológico”. Como tal, essa configuração conceitual é, por si mesma,
“outra”. Em primeiro lugar, porque provém de um movimento étnico-social mais do
que de uma instituição acadêmica; depois, porque reflete um pensamento que não se
baseia nos legados coloniais eurocêntricos e nem nas perspectivas da modernidade;
e, finalmente, porque não se origina nos centros geopolíticos de produção do
conhecimento acadêmico, ou seja, no norte global (WALSH, 2019, p. 9)

Nesse caso, a incorporação da perspectiva da interculturalidade no Brasil, ao mesmo


tempo que surge como avanço, também mostra outra face, a da ainda presença da
colonialidade, uma vez que esta incorporação se dá ainda sob os domínios daqueles que estão
comprometidos com o neoliberalismo e a globalização hegemônica.

Neste contexto, Candau e Russo (2010, p. 163) afirmam:

Nesse sentido, as diferentes reformas na área de educação incorporam a perspectiva


intercultural, seja como um dos eixos articuladores dos currículos escolares, seja
introduzindo questões relativas às diferenças culturais como temas transversais. No
entanto, se este alargamento do conceito e de seu impacto sobre as políticas públicas
pode ser visto como um significativo progresso, não deixa de estar permeado por
fortes ambiguidades, pois esta incorporação se dá no contexto de governos que estão

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comprometidos com a implementação de políticas de caráter neoliberal, que


assumem a lógica da globalização hegemônica e a agenda dos principais organismos
internacionais.

Assim, a interculturalidade também se faz funcional para o poder, que, segundo Walsh
(2016), cooptaram o termo, tornando-o um adjetivo de políticas e legislações, sempre com
enfoque étnico e por uma questão de reconhecimento e inclusão. Neste sentido, a perspectiva
intercultural (funcional) na educação escolar indígena representa mais um mecanismo de
controle, pois, ao mesmo tempo em que reconhece a diversidade cultural e a importância da
reciprocidade entre seus saberes e fazeres, “não questiona as regras do jogo e é perfeitamente
compatível com a lógica do modelo neoliberal existente” (WALSH, 2009, p. 21).

Uma educação intercultural deverá criar subjetividades rebeldes e não conformistas,


passando de uma interculturalidade funcional – a qual não questiona as regras do jogo – para
uma interculturalidade crítica, para de fato ajudar na promoção de uma escola indígena com
perspectiva de uma ecologia de saberes, onde os conhecimentos próprios dos indígenas e dos
não indígenas são considerados e utilizados no processo de ensino, sem a hierarquização entre
os saberes e em caminhos de conhecimento e reconhecimento entre as práticas culturais e
epistemologias outras, de forma a fazer emergir conhecimentos que ao longo da história vem
sendo escondidos e negados.

A interculturalidade crítica nasceu nas discussões políticas promovidas pelos


movimentos sociais e, como prática política, se difere da interculturalidade funcional,
preocupando-se também, segundo Walsh (2009), com a exclusão e subalternação ontológica e
epistêmico-cognitivo de grupos e sujeitos racializados, com práticas de desumanização e
subordinação do conhecimento, com a naturalização da diferença e ocultamento das
desigualdades, com os seres e conhecimento de resistência, insurgência e oposição – aqueles
que persistem apesar da desumanização e subordinação.

Dessa forma, a interculturalidade crítica não é funcional, pois é questionadora do


modelo de sociedade atual. Enquanto a interculturalidade funcional responde e parte dos
interesses das instituições sociais, a interculturalidade crítica é uma construção de e para as
pessoas que sofreram/sofrem uma história de subjugação e subalternação, ou seja, não se parte
do problema da diversidade ou da diferença em si, mas do problema estrutural-colonial-racial.

A interculturalidade como projeto político, social, epistêmico e ético busca uma


sociedade melhor para se viver que a atual. Nesse caso, é preciso ações em cada instância

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social, política e, especialmente, educacional, pois é o espaço de construção e reprodução de


valores, atitudes e identidades e do poder histórico-hegemônico do Estado. Por isso, a
importância da interculturalidade crítica como ferramenta pedagógica.

A interculturalidade crítica como ferramenta pedagógica, proposta por Walsh (2009, p.


9),

[...] questiona continuamente a racialização, subalternização, inferiorização e seus


padrões de poder, torna visível diferentes modos de ser, viver e conhecer, e busca o
desenvolvimento e a criação de entendimentos e condições que não só articulem e
dialoguem as diferenças em um marco de legitimidade, dignidade, igualdade,
equidade e respeito, mas também - e ao mesmo tempo - incentivar a criação de
“outras” formas de pensar, ser, ser, aprender, ensinar, sonhar e viver que ultrapassam
fronteiras.

Ainda conforme a autora supracitada, a interculturalidade crítica e a descolonialidade,


neste sentido, são projetos, processos e lutas que se entrelaçam conceitual e pedagogicamente,
e fornecem base para o que ela chama de pedagogia descolonial. Sendo assim, a
interculturalidade crítica e o pensamento decolonial têm pressupostos importantes para a
educação escolar indígena, podendo transformá-la em espaços de luta, resistência e
preservação de conhecimentos e epistemologias indígenas.

Por fim, uma educação intercultural crítica e decolonial tem que ser desejada como um
direito de todos os povos do “sul” (lugares e povos marginalizados, excluídos e oprimidos) e
alcançar todas as instâncias sociais, políticas, culturais, econômicas, educacionais e
epistêmicas na busca de um sistema-mundo diferente do atual, melhor, mais justo e mais
humanitário.

5. Considerações finais

A etnomatemática, a decolonialidade e a interculturalidade crítica convergem em seus


pressupostos, os quais combatem a hierarquização entre os saberes, rejeitando qualquer tipo
de arrogância e prepotência, em defesa dos conhecimentos pluriversais e não universais, e do
emergir de vozes historicamente caladas.

Os pressupostos presentes em cada uma delas podem ser utilizados de forma isolada
ou juntos, ou seja, há possibilidades de se utilizar pressupostos dos três temas abordados na
construção de novas pedagogias, novas formas de ensinar e aprender. É claro que as três
teorias são amplas e todas elas não têm em suas origens a finalidade de tornarem-se
disciplinas acadêmicas, ao contrário, devem estar presentes em âmbitos diversos da

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sociedade, na política, na ciência, na economia, na cultura, na educação e até nos saberes e


fazeres do dia-a-dia. Contudo, verifica-se a possibilidade dos usos de seus pressupostos como
ferramenta pedagógica para decolonizar a educação, inclusive, a educação escolar indígena.

6. Referências

ALMEIDA, E. M. M. Educação Escolar Indígena: um estudo do diálogo entre os saberes


indígenas e o conhecimento escolar no currículo em ação nas escolas indígenas. 2019. Tese
(Doutorado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. SP. Disponível em:
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Acesso em: 01/01/21.

D´AMBROSIO, U. Sociedade, Cultura, matemática e seu ensino. Educação e Pesquisa, São


Paulo, v. 31, n. 1, p. 99-120, jan./abril. 2005. Disponível em:
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MIGNOLO, W. D. Colonialidade: O lado mais escuro da modernidade. Tradução de Marco


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PASSOS, C. M. Condições de produção e legitimação da etnomatemática. 2017. Tese


(Doutorado). Universidade Federal de São Carlos. SP. Disponível em:
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QUIJANO, A. Colonialidade do Poder e Classificação Social. In: SANTOS, B. de S.;


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SÍVERES, L; SANTOS, J. R. de S. O conhecimento como princípio da colonialidade e da


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WALSH, C. Interculturalidad crítica y educación intercultural. Instituto Internacional de


Integración del Convenio Andrés Bello, La Paz, 2010. Disponível em:
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WALSH, C. Interculturalidad crítica y pedagogia de-colonial: apuestas (des) de el in-surgir,


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SOBRE O MODELO DOS CAMPOS SEMÂNTICOS E AS TESES ORIENTADAS


POR ROMULO CAMPOS LINS

Luis Enrique Fernandes da Silva


Fundação Universidade Federal de Rondônia
luis.fernandes@educacao.mt.gov.br

Debora Cristina Gerola da Cruz


Fundação Universidade Federal de Rondônia
deboragerola@hotmail.com

Lenilson Sergio Candido


Fundação Universidade Federal de Rondônia
lenilson@unir.br

Resumo:
O presente trabalho é um recorte de uma investigação biobibliográfica desenvolvidas na área de Educação
Matemática que utilizou como fundamentação teórica o Modelo dos Campos Semânticos. Iremos destacar
algumas considerações que o MCS (Modelo dos Campos Semânticos) faz e mostrar a análise das pesquisas
desenvolvidas no Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da Unesp (Universidade Estadual
“Júlio de Mesquita Filho”). O período de referência é de 1998 a 2017, do qual selecionamos as pesquisas sob a
orientação do Professor Dr. Romulo Campos Lins, professor Livre Docente da Unesp Rio Claro. A partir da
análise a respeito das pesquisas realizadas e tomando como referencial teórico-metodológico o Modelo dos
Campos Semânticos (Lins, 1999), construímos considerações e esboço a respeito da investigação. De acordo
com as leituras realizadas até o momento, observamos que o Modelo dos Campos Semânticos é um potente
referencial teórico-metodológico para pesquisas na área da educação matemática e formação de professores.
Com isso consideramos que o MCS pode dar uma importante contribuição a pesquisas futuras.
Palavras-chave: Modelo dos Campos Semânticos; Educação matemática; Teses.

1. Introdução

Este trabalho é direcionado aos leitores que objetivam conhecer e/ou trabalhar no viés
do Modelo dos Campos Semânticos (MCS), mobilizados pelo esforço de compreender o
conceito do Modelo dos Campos Semânticos apontados por Lins (1993, 1994, 1999, 1997,
2004, 2012), conceito principal desta pesquisa.

Como parte da pesquisa, examinaremos as produções de teses de doutorado orientadas


pelo Professor Dr. Romulo Campos Lins, visando a análise das pesquisas que envolvem o
Modelo dos Campos Semânticos (MCS).

O fator motivacional para esta pesquisa se dá no momento enquanto nós, estudantes de


pós-graduação, tentamos entender os caminhos percorridos por pesquisadores de Educação
Matemática atrelados ao MCS. Por este motivo, defendemos nesse artigo a contribuição e

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incentivo de Lins para a Educação Matemática. Embora tenhamos recente contato com o
MCS, já é o suficiente para compreendermos que essa teorização sinaliza uma aliança muito
forte com a Educação Matemática.

Por fim, as análises realizadas, nos deram suporte para perceber que essas pesquisas
que analisam produção de significados sobre sujeitos diretamente ligados a Educação
Matemática são importantes para o campo da pesquisa acadêmica. Portanto, a seguir, a partir
das leituras realizadas, pretendemos apresentar brevemente o que é o MCS, e, também, como
se dá a sua aplicação nas pesquisas acadêmicas.

2. Noções do Modelo dos Campos Semânticos

O Modelo dos Campos Semânticos, no princípio, mostra-se enigmático e de difícil


entendimento e compreensão. Criado pelo Professor Dr. Romulo Campos Lins, em 1992, na
sua tese de doutorado na Inglaterra, este modelo epistemológico se torna uma ferramenta
poderosa adotada por muitos pesquisadores em Educação Matemática. Lins é autor de muitas
obras publicadas, que inspirou inúmeras pesquisas e também o líder do grupo de pesquisa
Sigma-t (Rede de Pesquisa e Desenvolvimento em Educação Matemática que reúne
professores de matemática e interessados no Modelo dos Campos Semânticos - MCS), de
mestres e doutores que foram orientados por ele e ainda continuam sua história e obra.

O Modelo dos Campos Semânticos (MCS) se constitui, entre outras coisas, como uma
possibilidade de leituras de processos de produção de significados na escola, nas salas de aula,
nas salas de aula de matemática, como também na rua, em práticas e contextos do dia a dia.
Trata-se de um quadro teórico, uma teorização sempre contingente e emergente (LINS, 2012).
Para o professor de matemática, esse movimento de teorização, como preferimos caracterizar,
oferece estratégias político-pedagógicas para ler o que acontece em sala de aula em tentativas
de se afastar da caracterização dos alunos pela falta (nos aprofundaremos neste tema mais
adiante) e, com isso, tomar decisões, interagir e intervir em processos de produção de
significados de seus alunos, a partir do que estes produzem.

Alunos em sala de aula produzem significados, constituindo objetos em uma certa


direção. Falam, escrevem, gesticulam, desenham, se movimentam a partir e com demandas
que são colocadas a eles. Se afetam, afetando os colegas e o professor: eles sobrevivem
cognitivamente (e também materialmente) em seus processos de produção de significados.

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Para Lins (1999, p. 86), “o aspecto central de toda aprendizagem - em verdade o


aspecto central de toda a cognição humana - é a produção de significados”. Assim, segundo
Lins (2012, p. 28) “/.../ Significado de um objeto é aquilo que efetivamente se diz a respeito
de um objeto, no interior de uma atividade. Objeto é aquilo para que se produz significado”.
Segundo Lins, a noção de objeto é que estes são constituídos enquanto tal, precisamente pela
produção de significados. Não se trata de: ali estão os objetos e aqui estou eu, para a partir daí
eu descobrir seus significados; ao contrário, eu me constituo enquanto ser cognitivo através da
produção de significados que realizo, ao mesmo tempo em que constituo objetos através
destas enunciações (LINS, 1999, p. 86).

Quando produzimos significados constituindo objetos, nos movimentamos em uma


certa direção. Operamos de certa maneira por acreditarmos que o que fazemos é legítimo.
Essa direção se caracteriza com a noção de interlocutor. Lins (2012, p. 30) afirma que
“Interlocutor não deve ser entendido como “aquele com quem se conversa” ou “aquele que
participa (conosco) de um diálogo” (no sentido comum)”. Interlocutor é uma direção. Quando
um professor de matemática se coloca em um movimento de produzir significados e constituir
objetos em sua sala de aula, mesmo que ele acredite que ali estão presentes, fisicamente, seus
alunos, ele não fala para os seus alunos (sujeitos biológicos). O professor fala em uma
direção; ele produz significados para um (ou uns) suposto(s) aluno(s) aos quais ele constitui;
um (ou uns) aluno(s) que ele supõe que aceitaria(m) aquilo que fala, produz.

Figura 1: Mapa Mental do Modelo dos Campos Semânticos


Fonte: Elaborado pelos autores (2021)

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Em salas de aulas, coisas acontecem, e elas simplesmente acontecem (nos perdoem a


redundância, porém ela se faz necessária) muitas vezes a despeito de nossas expectativas. Um
ponto chave para o professor, talvez um aspecto que tenha uma centralidade em sua prática
político-pedagógica, é como ler seus alunos e, a partir dessas leituras, que decisões tomar. É
muito comum, praticar uma leitura pela falta, na qual o professor indica aquilo que os alunos
não sabem, não dizem, não fazem. Muitas vezes o professor diz: “falta você compreender tal
conteúdo”; “falta você se dedicar mais”; “falta a você mais base”, “falta matemática básica”.
A falta, muitas vezes, é apenas o que se inventa em sala de aula e tem como suporte apenas as
percepções e/ou suposições do professor.

Entretanto, outra possibilidade para o professor, é lidar com o que acontece em sala de
aula, com aquilo que os alunos falam e produzem. Nessa direção, em meio a uma estratégia
político-pedagógica, o professor pode por em marcha um processo de leituras plausíveis com
os alunos, a partir do que eles produzem. Segundo Lins (1999, p.93), “/.../ Toda tentativa de
se entender um autor deve passar pelo esforço de olhar o mundo com os olhos do autor, de
usar os termos que ele usa de uma forma que torne o todo de seu texto plausível”. Ou seja, ao
realizar uma leitura do outro, desejando lê-lo e produzir com, o professor precisa olhar, em
detalhes, com atenção para os significados e objetos constituídos por seus alunos. Este
processo é complexo, pois passa pelo esforço de tentar se desvencilhar de amarras profundas
em nossos modos de interagir com os outros, de se deslocar do nosso modo de compreender
um determinado conteúdo e, muitas vezes, nossa maneira de ler e constituir mundos.

O que queremos ressaltar é que noções como significados, objeto, interlocutor e leitura
plausível oferecem uma possibilidade para ler e produzir em salas de aula com nossos alunos.
Oferece uma possibilidade de pensar salas de aula de matemática como espaço de produções
com demandas, problemas e realizações que lá acontecem.

Nem sempre é fácil, nem mesmo possível. Muitas vezes o que nos resta é o silêncio
em relação a uma fala ou um gesto de um aluno. Muitas vezes para o professor trabalhar, ler
seu aluno pela falta é a única possibilidade. Nossas considerações, com isso, não são na
direção de doutrinar um modo correto do que deve acontecer em salas de aula, mas sim,
oferecer outras possibilidades. Ler e produzir o que acontece em sala de aula, em termos de
processos de produção de significados, pode se constituir como um projeto político-
pedagógico de professores de matemática, um projeto que pode ser partilhado com os alunos e
colocado em marcha aos poucos.

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Ler e produzir com alunos a partir do que produzem em detrimento ao que a eles
faltam se constitui como uma prática de lutar contra os processos classificatórios e de
exclusão que estão na escola. Lutar contra desigualdades sociais, econômicas e culturais que
já instituem alunos fracassados antes mesmo destes terem alguma possibilidade de sobreviver
em meio ao nosso sistema capitalista contemporâneo.

3. Teses analisadas

As pesquisas escolhidas para análise do nosso estudo levam em consideração o MCS


orientados por Romulo Campos Lins, portanto julgamos necessário usar as pesquisas com
maior relevância para a investigação. Nesse olhar, decidimos que esta pesquisa seria realizada
a partir de teses de doutorado orientadas por ele.

O Professor Dr. Romulo Campos Lins, foi professor Livre Docente da Unesp - Rio
Claro, onde atuou por 25 anos juntos aos programas de mestrado e doutorado (Espaço
Romulo Lins, SIGMA-t, 2021). Autor do Modelo dos Campos Semânticos orientou diversas
pesquisas na área da Educação Matemática nesses 25 anos de dedicação e empenho, sendo
elas 15 teses de doutorado. A seguir, elencamos a relação das teses mais detalhadamente,
encontradas no catálogo de teses e dissertações da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior) e no repositório virtual institucional da Unesp.

Tabela 1 - Pesquisas de doutorado orientadas por Romulo Campos Lins


Orientando Titulo da Pesquisa Ano da Pesquisa
Lígia Arantes Sad Cálculo Diferencial e Integral: uma abordagem 1998
epistemológica de alguns aspectos

Amarildo Melchiades Sobre a dinâmica da produção de significados para a 2003


da Silva Matemática

Rodolfo Chaves Por que anarquizar o ensino de Matemática intervindo em 2004


questões socioambientais?

João Carlos Gilli Sobre revoluções científicas na Matemática 2005


Martins

Patricia Rosana Rastros da formação matemática na prática profissional do 2006


Linardi professor de Matemática

Adelino Candido A produção e a construção de Vídeo-Caso em Hipertexto 2009


Pimenta (VCH) na Educação Matemática

Carlos Alberto Uma leitura da prática profissional do professor de 2009


Francisco Matemática

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Marco Aurélio Sobre a produção de significados e a tomada de decisão de 2011


Kistemann Júnior indivíduos consumidores

Viviane Cristina Uma leitura sobre formação continuada de professores de 2011


Almada De Oliveira Matemática fundamentada em uma categoria da vida
cotidiana

Claudia Laus Angelo Uma leitura das falas de alunos do Ensino Fundamental 2012
sobre a aula de Matemática

Edson Pereira Leituras sobre processo de implantação de uma licenciatura 2012


Barbosa em Ciências Naturais e Matemática por área do
conhecimento

João Ricardo Viola Legitimidades possíveis para a formação matemática de 2012


dos Santos professores de matemática (Ou: Assim falaram Zaratustras:
uma tese para todos e para ninguém)

Lenilson Sergio Uma construção histórica do curso de Licenciatura em 2015


Candido Matemática da Universidade Federal de Rondônia Campus
de Ji-Paraná

Sérgio Carrazedo Design, implementação e estudo de uma rede sócio 2016


Dantas profissional online de professores de Matemática

Valéria Ostete Uma possível produção de significados para as séries no 2017


Jannis Luchetta livro Elementos de Álgebra de Leonhard Euler
Fonte: Elaborada pelos autores (2021)

Levando em consideração o volume de pesquisas, mas especificamente teses de


doutorado, decidimos trazer a análise de somente de uma delas, a do Professor Dr. Lenilson
Sergio Candido, professor da UNIR e membro do grupo de pesquisa Sigma-t.

4. Análise das Teses

4.1 CANDIDO, Lenilson Sergio. Uma construção histórica do curso de licenciatura em


matemática da Universidade Federal de Rondônia Campus Ji-Paraná. Tese (Doutorado em
Educação Matemática) - Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual
Paulista, Rio Claro-SP, 2015.

O trabalho investigativo do Prof. Dr. Lenilson Sérgio Candido nos faz compreender
como se dá a utilização do Modelo dos Campos Semânticos e, simultaneamente,
compreendermos a história do curso de Licenciatura em Matemática no campus da UNIR em
Ji-Paraná.

O processo investigativo de Lenilson Sergio Candido, no âmbito do programa de


mestrado em Educação Matemática da UNESP - Rio Claro/SP teve como objetivo apresentar

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Fundamental e Médio
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uma construção histórica do curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal de


Rondônia no Campus de Ji-Paraná (CANDIDO, 2015, p. 11).

A pesquisa desenvolvida está relacionada às inquietações pessoais e profissionais do


autor e o Programa de doutorado foi desenvolvido junto ao grupo de pesquisa Sigma-T, que
tinha como coordenador o professor Dr. Romulo Campos Lins.

Assim, entendemos que este trabalho se inseriu no ambiente de discussão do grupo


Sigma-T por contribuir para uma concepção de práticas com a intenção de criar e
substanciar um novo paradigma para a formação e o desenvolvimento profissional
do professor de Matemática. Mais especificamente, com relação ao ensino de
álgebra por se propor a investigar e discutir o estabelecimento de uma proposta de
ensino, a partir da fala de professores e da análise de documentos do Curso de
Licenciatura e Matemática da UNIR/Campus de Ji-Paraná (CANDIDO, 2015, p.
12).

O processo investigativo e a coleta de dados foram embasados em leituras de


entrevistas produzidas relacionadas ao estudo de dificuldades no ensino de álgebra no curso
de Licenciatura em Matemática da UNIR/campus Ji-Paraná, Candido fez o uso do Modelo
dos Campos Semânticos como referencial teórico-metodológico, onde se buscou estabelecer e
entender coerências que sustentariam as investigações da pesquisa através de uma leitura
plausível.

Segundo Lins (2012), leitura plausível consiste em:

As noções de leitura plausível/leitura positiva têm sido, por vezes, usadas como
equivalentes, mas eu prefiro fazer uma distinção. A leitura plausível se aplica de
modo geral aos processos de produção de conhecimento e significado; ela indica um
processo no qual o todo do que eu acredito que foi dito faz sentido. Outra maneira
de dizer que faz sentido em seu todo, é dizer que o todo é coerente (LINS, 2012,
p.23).

Tentar realizar uma leitura plausível do que o outro produz como enunciação, como
conhecimento, colocando-o como interlocutor, exige a busca por uma interação produtiva. Se
desejo ter uma interação produtiva com o outro, ou simplesmente entendê-lo, necessito me
esforçar para realizar uma leitura plausível. Este processo reforça a necessidade de que meu
interlocutor promova uma justificação do que está produzindo, fazendo sentido estas idas e
vindas com indagações pontuais a partir do que o meu interlocutor diz.

Diante dos acontecimentos e como professor das disciplinas de Álgebra no curso a


partir de 2000, vejo um problema que faz jus a uma investigação: o ensino de
Álgebra. A pergunta é, será que este problema está relacionado as tomadas de
decisão no curso? Como isso acontece? História contada em forma de documentário.
Linguagem simples e direta que tem o objetivo de prender o leitor aos
acontecimentos. Caminhamos por dois fios condutores. Referentes às decisões

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administrativas e as decisões pedagógicas, tomadas no decorrer dos acontecimentos


(CANDIDO, 2015, p. 12).

Candido (2015) prossegue tratando em localizar o leitor, relacionando-o com o


desenvolvimento da pesquisa, as decisões que foram tomadas, os anseios e os caminhos
percorridos e os procedimentos para a construção da história do curso de Licenciatura em
Matemática da Unir/campus Ji-Paraná, que é a motivação central do autor, para tal.

A pesquisa foi escrita em forma de documentário, ideia que surgiu da observação que
Lins fez ao assistir ao programa Globo Repórter. A partir de então, Candido (2015) em sua
tese, explica todo o cenário da pesquisa, os caminhos escolhidos e se apresenta como fonte
junto com os demais colegas de trabalho, dentre eles, o professor Eudes Barroso, professora
Maria das Graças de Souza Viana Diogo, professor Marlos Gomes de Albuquerque, professor
Ariveltom Cosme da Silva, professora Aparecida Augusta da Silva, professor Fernando Luiz
Cardoso e o professor Osmar Siena. Os dois primeiros, iniciaram as discussões narrando o
período da década de oitenta e noventa sobre a criação do curso de Licenciatura em
Matemática na UNIR campus Ji-Paraná.

A seguir, apresentamos um trecho do depoimento de um dos entrevistados:

Sou o professor Marlos Gomes de Albuquerque, licenciado em Matemática pela Universidade de Pernambuco.
Eu fiz a licenciatura no período de 1984 até 1988. No ano de 91, fui convidado para trabalhar na UNIR como
professor colaborador. Eu conciliava meu trabalho do Estado e da Universidade em Cacoal. Em 92, surgiu o
concurso de Matemática para a cidade de Ji Paraná. Fiz o concurso, fui aprovado, o primeiro professor efetivo da
área de Matemática. Tomei posse em 27 de outubro de 1992. Fiz a especialização já sendo professor da UNIR,
no ano de 96, pela Universidade Federal de Pernambuco em Matemática Pura. Foi aí que eu vi que, não era bem
a linha que eu queria seguir. No ano de 99 a 2000, eu fiz o mestrado pela Universidade Federal de Santa
Catarina. Foi um MINTER que houve aqui em Rondônia O doutorado, estou fazendo agora, 10 anos depois do
mestrado, no caso, no curso da REAMEC, a Rede Amazônica de Educação e Ensino de Ciências e Matemática.
Quadro 1: Depoimento do Professor Dr. Marlos Gomes de Albuquerque
Fonte: Candido (2015, p. 18)

Após as realizações das entrevistas, o autor partiu para os procedimentos das análises,
primeiro ele transcreveu as entrevistas, na fase seguinte realizou a conferência junto aos
depoentes, em seguida realizou o exercício de leitura plausível, proposta por Lins (1999) e
apoiado na teoria do Modelo dos Campos Semânticos de Lins (2012), “Produzimos um
documentário escrito, sob os seguintes fios: as decisões pedagógicas e as decisões
administrativas” (CANDIDO, 2015, p. 30).

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Compreendemos que o Modelo dos Campos Semânticos foi usado como base teórico-
metodológico para analisar as entrevistas e os documentos. Sendo assim, Candido (2015)
salientou que a experiência de tratar da apresentação do seu estudo na forma de documentário,
foi uma grande empreitada e animou-o para continuar investindo na questão de encontrar
meios relevantes de compartilhar experiências com os profissionais da comunidade e
pesquisadores da Educação Matemática.

5. Considerações finais

Por intermédio deste trabalho e a partir das leituras que realizamos percebemos que o
Modelo dos Campos Semânticos esta presente na tese analisada, é um robusto referencial
teórico para pesquisas que discutem sobre educação matemática.

Esta pesquisa aponta, para a importância do papel de realizar levantamento de


referencial teórico sobre o MCS, muitas pesquisas vêm sendo realizadas usando este modelo,
nossa proposta de catalogar teses de programas de Doutorado, com intuito de analisar de
modo detalhado deste modelo e como foram aplicados em pesquisas orientadas pelo Romulo.

Os resultados ainda são parciais para esta pesquisa, que visa futuramente analisar
todas as teses e na perspectiva de apresentar uma primeira leitura e posteriormente uma leitura
mais consistente da pesquisa completa.

6. Referências

CANDIDO, L. S. Uma construção histórica do curso de licenciatura em matemática da


Universidade Federal de Rondônia Campus Ji-Paraná. Tese (Doutorado em Educação
Matemática) - Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio
Claro-SP, 2015.

LINS, R. C. Epistemologia, História e Educação Matemática: Tornando mais Sólidas


as Bases da Pesquisa. Revista de Educação Matemática SBEM - São Paulo, v. 1, p. 76–
91, 1993.
__________. O Modelo Teórico dos Campos Semânticos: Uma análise epistemológica
da álgebra e do pensamento algébrico. Revista Técnico Cientifica Universidade
Regional de Blumenal, v. 2, n. 01040405, p. 29–39, 1994.
__________; GIMENEZ, J. Perspectivas em aritmética e álgebra para o século XXI.
Campinas, SP: Papirus, 1997 - (Coleção Perspectivas em Educação Matemática).

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__________. Por que discutir Teoria do Conhecimento é relevante para a Educação


Matemática. In: BICUDO, M. A. V. (Org.). Pesquisa em Educação Matemática: Concepções
e Perspectivas. Rio Claro: UNESP, 1999. p. 75-94.
__________. Matemática, monstros, significados e educação matemática. In: Bicudo, M.
A.V., Borba, M. C. (org.). Educação Matemática: pesquisa em movimento. São Paulo:
Cortez, 2004. p. 92-120.
__________. O Modelo dos Campos Semânticos: estabelecimentos e notas de teorizações.
In: LAUS, C. et al. (Orgs.). Modelo dos Campos Semânticos e Educação Matemática: 20 anos
de história. São Paulo: Midiograf, 2012. p. 11-30.

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PALESTRA: A MULHER NEGRA E A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

Letícia Brito de Souza


Instituto Federal de Rondônia
leticia.b@estudante.ifro.edu.br

Jeiciane de Paula Oliveira


Instituto Federal de Rondônia
jeiciane.oliveira@ifro.edu.br

Resumo:
Apresenta-se aqui uma discussão a respeito do distanciamento da mulher negra da educação matemática, devido
às relações de gênero e raça presentes na sociedade brasileira. Trata-se da educação matemática não somente
como uma matéria do currículo escolar, mas como um instrumento de poder e status que durante séculos foi
negado a determinados grupos.

1. Introdução

É indiscutível o prestígio intelectual voltado para as áreas de exatas, em especial a


matemática, que além de ser uma das disciplinas fundamentais do currículo escolar, tem
grande relevância para o desenvolvimento cognitivo da criança e do adolescente. A realidade
do sistema educativo evidencia a matemática como um dos conhecimentos mais inacessíveis
para muitos dos alunos (SANTOS e CARDOSO, 2012). É importante questionarmos porque
esse conhecimento é tão inalcançável.

Pensando na organização social na qual vivemos, observamos que desde muito tempo
nossa sociedade se constitui de privilégios, a educação é um deles. A história nos mostra
períodos em que a educação de ricos e pobres, homens e mulheres, negros e brancos, se dava
de uma forma diferente, em que cada “classe” aprendia aquilo que lhe era considerado
adequado. A população negra sempre esteve à margem dos processos educacionais. Por ser
“entregue a própria sorte”, não tinham oportunidade de se escolarizar, seja no acesso ao
ensino das primeiras letras e ou na continuação dos estudos (MIRANDA, 2010).

A matemática, sendo um conhecimento imprescindível para a manipulação do


dinheiro, administração de negócios, entre outras tarefas de notoriedade, era vista como um
conhecimento desnecessário aos pobres, mulheres e negros já que esses jamais poderiam ser
administradores de alguma posse.

Portanto, alguns grupos eram mantidos longe do aprendizado no geral e


consequentemente de posições de maior prestígio que exigiam conhecimento como por

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exemplo o magistério, em 1920, por conta da preferência pelas mulheres brancas nos espaços
escolares, uma série de procedimentos foi criada a fim de dificultar o acesso de mulheres
negras a esse cargo (FONSECA, 2007), de formas semelhantes ocorria em outras posições, ao
constar como exigência “boa aparência” por exemplo. A mulher negra é pertencente a dois
grupos que historicamente foram isolados da camada privilegiada: as mulheres e os negros.
As discriminações e estereótipos impostos a esses grupos atingem a mulher negra
simultaneamente, o que a manteve distante da educação no geral, e mais especificamente da
matemática por muito tempo.

Para compreender de que forma esse distanciamento ocorre veremos qual a relevância
de ser pertencente a determinado gênero e raça para a educação matemática. À priori
discutiremos a respeito das relações entre gênero e educação matemática, sendo esta a
primeira esfera a qual nosso foco de estudo pertence. Posteriormente trataremos das questões
raciais as quais a mulher negra também se encontra condicionada.

2. Gênero e educação matemática

Para melhor compreensão da relação entre gênero e matemática, definamos a palavra


gênero. O que é gênero? Esse conceito não pode ser definido apenas em uma perspectiva
biológica como sinônimo de sexo, trata-se de uma construção social do que se considera
“masculino ou feminino”, o gênero é, portanto, produzido nas relações que se estabelecem
entre mulheres e homens, vale ressaltar que tais relações são em sua maioria desiguais
(SOUZA et al, 2009).

Estão imbricadas no imaginário social, ideais a respeito do que é ser uma mulher ou
um homem, estruturados a partir de relações de poder entre os sexos, “os gêneros se
produzem, portanto, nas e pelas relações de poder” (LOURO,1997). Compreendida a
definição de gênero, introduziremos agora essa discussão no ambiente educacional.
Comecemos pontuando que ao longo da história foram levantadas teorias e pesquisas para
“provar” distinções psíquicas e comportamentais de cada gênero e diferenciar suas
habilidades e aptidões, a fim de definir e justificar seus lugares próprios na organização social
(LOURO, 1997).

Durante o século XIX a “natureza humana” se tornou objeto de estudo da ciência, com
fundamentos profundamente patriarcais. Foram feitas diversas afirmações a respeito da mente

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feminina a fim de “comprovar” sua inferioridade intelectual de alguma forma. Era portanto,
muito comum excluir mulheres dos ambientes acadêmicos com a justificativa de que essas se
deixavam levar facilmente pelas emoções e não eram capazes de realizar julgamentos
completamente racionais.

A mulher como objeto da ciência do século XIX era delicada, não profunda; a
detentora da ordem moral via maternidade. Típicas eram as fracas e desfalecentes mulheres
vitorianas da classe média, cujas mentes, como borboletas, eram incapazes de se concentrar,
movimentando-se de um pequeno bordado a um pequeno isso, um pequeno aquilo; delicado,
completo, mas superficial. (WALKERDINE, 2006. p. 14)

Esse pensamento nos leva ao senso comum atual, que qualifica mulheres como
irracionais ou frágeis devido às suas emoções e logo, inaptas para as ciências exatas, bem
como para outras ciências que exigem tal racionalidade. Naturalizou-se com o tempo a que os
homens teriam mais êxito nessas funções. Segundo Walkerdine (2007, p. 06) “O sucesso na
Matemática é tomado como uma indicação do sucesso em raciocinar. A Matemática é vista
como o desenvolvimento da mente lógica e racional.”

Podemos - ainda segundo Walkerdine- observar dois tipos de aprendizagem da


matemática: aquela que se dá por meio de mera memorização e repetição de fórmulas, e a
compreensão técnica que possibilita o uso da matemática como instrumento transformador. A
grosso modo podemos dizer que se trata de “saber que” e “saber como”. Em consequência
desses dois tipos de aprendizagem começa-se a observar as relações de gênero dentro da
matemática, pois é atribuído ao sucesso feminino nessa área a simples memorização ou
seguimento das regras.

Meninas são raramente consideradas alunas brilhantes ou geniais e sim esforçadas ou


estudiosas apenas, enquanto que um menino ter um rendimento inferior, justifica-se por ele
ser muito agitado, não prestar a devida atenção. A capacidade intelectual masculina nunca é
posta a prova, pois para os meninos seria comum “quebrar as regras”, entretanto, o mesmo
comportamento vindo de uma menina é inadmissível. Dentro dos ambientes escolares é claro
como os comportamentos não são julgados da mesma forma.

Uma das afirmações usadas para “comprovar” que mulheres não têm a mesma aptidão
para as exatas é de que estas não são capazes de quebrar as regras, de inovar, de serem de fato
geniais e autônomas. Mas na verdade, as que demonstram possuir essas características são

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reprimidas e taxadas como inadequadas ou nada femininas. Às mulheres é reservado o


estereótipo de passivas, que as qualifica para as funções de provedoras de cuidado, de certa
forma relacionadas a maternidade.

Outra afirmação feita constantemente a respeito de alunos do sexo masculino e nunca


do sexo feminino é de que eles possuem “potencial”. Supõe-se que aquilo que está visível a
respeito do aluno não é tudo que esse pode oferecer, ou seja, meninos são portadores de uma
causa oculta, uma forma diferente de aprender e realizar suas atividades. Porém, quando se
trata de garotas a visão é muito mais superficial, de forma que não permite que se enxergue
nelas esse potencial. (WALKERDINE, 1995).

[...] esta explicação tem sido infligida às mulheres (assim como a designação de
"esforçada" foi infligida a mim) e acabamos aceitando isso, acreditando que nós podemos ser
boas operárias, boas secretárias, assistentes de pesquisa, mas nunca grandes pensadoras ou
gênios. (WALKERDINE, 1995. p.215)

A pensadora ainda chama atenção para a ideia de que “a mulher raciocinante é um


monstro” (1995 p. 213), pois a capacidade da mulher de raciocinar tal qual o sexo oposto não
a coloca mais no lugar de “outro” - como foi considerada durante o século XIX o Outro da
razão - mas a eleva a condição de igual, o que representa uma ameaça à masculinidade
raciocinante. Fato que levou até mesmo a crença de que inserir a mulher nos meios
acadêmicos prejudicaria sua fertilidade e a afastaria de seu papel de gênero na sociedade: a
maternidade. Sendo assim, a mulher carrega o fardo de ser julgada por não raciocinar e
igualmente julgada por fazê-lo, o que historicamente a afasta do conhecimento matemático.

3. Raça e educação matemática

A educação - como já citado anteriormente- pode ser considerada um privilégio que


foi negado à população negra. Rosenberg (1995) utilizou dados das PNADs de 1982, 1985 e
1986 para evidenciar que os recursos educacionais disponíveis para crianças negras são os de
pior qualidade e chamou a atenção para a forte presença de crianças negras que ainda estavam
na pré escola na faixa etária de 7-9 anos. É evidente o atraso desse grupo nos processos
educacionais desde a pré escola. Segundo uma pesquisa feita pelo IBGE, em 2018, mais de 10
milhões de jovens com idade entre 14 e 29 anos não concluíram o Ensino Médio, desse total,
70% eram negros.

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Entre as mulheres de faixa etária entre 14 e 29 anos o abandono escolar é realidade


para 33% das jovens. A entrada no mercado de trabalho muito cedo dificulta os estudos de
jovens negros e negras, porém entre as mulheres a gravidez na adolescência também é um
fator pertinente para o aumento dos índices de evasão, principalmente quando essa situação
vem acompanhada pelo abandono do parceiro e da família. No ano de 2016 tivemos no país
501.385 adolescentes mães (10 a 19 anos) e 69,7% eram negras (UNFPA, 2016).

Um fator importante a ser observado é que crianças negras (mesmo as meninas)


precisam desde cedo se dedicar ao trabalho para colaborar na renda familiar que na maioria
das vezes é muito baixa. Conciliar os estudos com o trabalho têm sido um desafio cada vez
mais difícil de ser superado pela população negra. Ricardo Henriques, superintendente-
executivo do Instituto Unibanco, foi questionado durante uma entrevista feita para o portal de
notícias Terra, a respeito do porque a evasão escolar atinge mais os jovens negros e afirmou
que:

[...] A vulnerabilidade socioeconômica da família pressiona para que os mais jovens


saiam da escola e vão trabalhar. Isso afeta desproporcionalmente os jovens negros
do que brancos, porque proporcionalmente os negros estão em famílias mais
vulneráveis. Há fatores econômicos associadas à evasão e o Brasil se organizou de
forma que naturalizou o padrão de desigualdade. Isso rebate em suas estruturas e a
mais nítida é a educação como um todo. (AMORIM e HONORATO, 2020)

Em relação à educação matemática, aspectos do racismo estrutural objetificam


mulheres negras e as reduzem ao que a escritora Lélia Gonzalez nomeia como “profissão de
mulata” (2018, p.110). Consiste na extrema sexualização da mulher negra e
consequentemente a desvalorização de suas capacidades intelectuais e lógico-matemáticas.
Historicamente a ciência nunca foi pensada para as mulheres negras, sempre existiram fatores
que as afastaram da educação pois, se esse privilégio já era negado às mulheres brancas como
já foi anteriormente citado, que dirá a mulheres negras que além de lidarem com as opressões
ocasionadas pelo seu gênero lidam simultaneamente com as opressões ocasionadas pela sua
raça.

Outro fator decisivo para o afastamento de mulheres negras da educação matemática


são os estereótipos a respeito desse grupo étnico-racial. Devido a discursos como o da
“meritocracia” cria-se no imaginário social que os indivíduos pertencentes a esse grupo são
“preguiçosos” ou “acomodados” e, portanto, não seriam aptos para o aprendizado das ciências
exatas. Há ainda o pensamento racista de que mulheres e homens negros estão condenados ao
trabalho braçal por serem biologicamente mais fortes ou resistentes.

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4. Considerações finais

Diante de tudo que foi aqui apresentado, observamos que a educação matemática
enquanto fonte de prestígio social e símbolo de capacidade cognitiva, foi afastada das
mulheres negras por ocasião de seu gênero e raça, os quais historicamente se tenta de diversas
formas inferiorizar e desmerecer. Contudo, a mulher negra tem resistido e ocupado espaços
que nunca foram pensados ou destinados a ela, se tornando prova de que qualquer um que
queira pôr em prova sua capacidade racional, não será bem sucedido.

Apesar de toda a dificuldade que é imposta a mulher negra pela sociedade, temos
contado com grandes cientistas, líderes e pensadoras que vêm fazendo história e inspirando
outras mulheres a lutar por esse espaço que durante tanto tempo nos foi negado. É importante
que se reconheça os abismos criados para afastar a educação matemática desse grupo para que
eles possam ser superados. Pois só assim teremos cada vez mais mulheres negras ocupando
essas posições e construindo uma sociedade mais justa e igualitária.

5. Referências

AMORIM, D. e HONORATO, L. Mais de 10 mi de jovens de 14 a 29 anos não concluíram


ensino médio; 70% deles são pretos ou pardos. Terra: 2020. Disponível em:
<https://www.terra.com.br/noticias/educacao/mais-de-10-mi-de-jovens-de-14-a-29-anos-nao-
concluiram-ensino-medio-70-deles-sao-pretos-ou-
pardos,89a2cfacc324b56c37c6bafe56b03bf254umuofm.html> Acesso em: 25 nov. 2020.

FONSECA, M. V. Pretos, pardos, crioulos e cabras nas escolas mineiras do século XIX.
Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007.

GONZALEZ, L. Lélia Gonzalez: primavera para as rosas negras. São Paulo: UCPA Editora,
2018.

IBGE. PNAD Educação 2019: Mais da metade das pessoas de 25 anos ou mais não
completaram o ensino médio. Estatísticas sociais: 2020. Disponível
em:<genciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-
noticias/releases/28285-pnad-educacao-2019-mais-da-metade-das-pessoas-de-25-anos-ou-
mais-nao-completaram-o-ensino-medi0> Acesso em: 25 nov. 2020.

LOURO, G. L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista.


Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

MIRANDA, M. D. da S. Crianças negras na Instrução Pública em Cuiabá/MT (1870-


1890), 2010. 81f. Dissertação (Mestrado em Educação) IE – Instituto de Educação da UFMT
– Universidade Federal de Mato Grosso, Cuiabá, 2010.

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SANTOS, J. dos; CARDOSO, L. de R. Relações de Gênero na educação matemática dos anos


iniciais do ensino fundamental. VI Colóquio Internacional: “Educação e
Contemporaneidade”, 2012.

SOUZA, R. F. de et al. Conceito de Gênero e Educação Matemática. Boletim de Educação


Matemática , vol. 22. 32, pp.29-45. Rio Claro: Universidade Estadual Paulista, 2009.
disponível em: <https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=291221889003> acesso em: 19 nov,
2020.

UNFPA. Gravidez na adolescência. 2016. Disponivel em: <https://brazil.unfpa.org/pt-


br/gravidez-na-adolesc%C3%AAncia> Acesso em 25 nov. 2020.

WALKERDINE, V. O raciocínio em tempos pós-modernos. Educação e Realidade, Porto


Alegre, n.20, v.2, p. 207-26, jul. dez. 1995.

WALKERDINE, V. Ciência, razão e a mente feminina. Educação & realidade, v. 32, n. 1, p.


7-24, 2006.

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ASPECTOS HISTÓRICOS DA FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA DE


PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA

Daiane Gomes da Silva


Fundação Universidade Federal de Rondônia
daianegomes_jip@hotmail.com

Fabiola Gomes de Souza


Fundação Universidade Federal de Rondônia
09fabiola@gmail.com

Flavia de Andrade Correa


Fundação Universidade Federal de Rondônia
facorreafac@gmail.com

Marcelo Orlando Sales Pessim


Fundação Universidade Federal de Rondônia
pessim_opo@hotmail.com

Resumo:
O presente trabalho foi desenvolvido a partir de discussões sobre Formação de professores que atuam no ensino
de matemática, vivenciadas por acadêmicos do curso de Mestrado em Educação Matemática, da Fundação
Universidade Federal de Rondônia – UNIR, Campus de Ji-Paraná. Este trabalho tem como objetivo retratar
alguns aspectos históricos relativos ao campo da Formação de Professores que ensinam matemática nas
dimensões da formação inicial e continuada. Desse modo, adotou-se uma abordagem qualitativa, de cunho
bibliográfico. Com base em autores como Ferreira (2003), Fiorentini et al,. (2003) e Gatti (2009) que discutem a
formação de professores, e também a formação de professores que ensinam matemática. Ao refletir sobre a
temática evidenciou-se diversos aspectos históricos que contribuíram para a consolidação desse campo de
pesquisa como a ampliação dos temas investigados, mudanças que ocorreram na formação de professores em
diversos países que possibilitaram grandes reformas educacionais e propiciaram novas reflexões sobre o que se
entende por formação de professores. Logo, espera-se que este trabalho possa contribuir para a compreensão
acerca dos aspectos históricos no âmbito da formação inicial e continuada do professor e do futuro professor que
ensina matemática.
Palavras-chave: Aspectos históricos; Formação inicial; Formação continuada.

1. Introdução

Este trabalho foi desenvolvido a partir de discussões sobre Formação de Professores


que Ensinam Matemática, vivenciadas por acadêmicos do curso de Mestrado em Educação
Matemática, da Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR, Campus de Ji-Paraná.

Ao considerar a relevância desse assunto, optou-se por pesquisar informações acerca


da evolução histórica dessa temática no cenário internacional e nacional. Dessa forma, o

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objetivo deste trabalho é retratar alguns aspectos históricos relativos ao campo da formação de
professores que ensinam matemática nas dimensões da formação inicial e continuada.

Nesse sentido, adotou-se uma abordagem qualitativa que “apesar de ter sido
regularmente utilizada pelos antropólogos e sociólogos, só nos últimos trinta anos começou a
ganhar um espaço reconhecido em outras áreas, como a psicologia, a educação e a
administração de empresas”(GODOY, 1995, p.58), de cunho bibliográfico fundamentado em
autores como Ferreira (2003), Gatti (2009) para discutir a formação de professores, e também
a formação de professores que ensinam matemática, e também Fiorentini et al,. (2003).

Dario Fiorentini é um autor com bastante destaque no assunto. A partir da década de


1990, junto com seus colaboradores, desenvolveu várias pesquisas e, desde então, tem sido
referência com publicações acerca da temática. Um dos trabalhos mais atuais foi o
mapeamento da pesquisa acadêmica brasileira no período de 2001 a 2012, relacionada a
temática “professor que ensina matemática”, apresentando importantes considerações sobre a
formação de professores como tema recorrentes de pesquisa no pais em nível regional.

Sabe-se que a formação de professores que ensinam matemática é um dos principais


temas de estudo da área da Educação Matemática. Investigar como acontece a formação do
profissional docente que atua especificamente no contexto do ensino da matemática em seu
processo de formação inicial ou continuada, propicia importantes contribuições para a
Educação Matemática.

Além disso, são os professores que exercem um papel de renovação diária no contexto
da sua realidade escolar. Desse modo, suas crenças, conhecimentos, valores, identidade e
demais situações também são aspectos importantes e que devem ser considerados no universo
de sua formação.

No intuito de organizar o presente trabalho optou-se por abordar o tema em estudo


estruturado em dois tópicos sendo que no primeiro tópico foi denominado “Reflexões
históricas de pesquisas sobre a formação inicial de professores que ensinam matemática no
contexto internacional e nacional” buscou- se refletir sobre alguns aspectos evidenciados na
trajetória da consolidação do campo de pesquisa da formação de professores, restringindo-se
aos aspectos dessa temática no contexto da formação inicial. E o segundo tópico intitulado
“Considerações sobre a história da formação continuada de professores que ensinam
matemática no contexto internacional e nacional” propiciou discussões ainda sobre a

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formação de professores para o ensino da matemática, porém, com foco na formação


continuada e posteriormente tecemos algumas considerações que emergiram no percurso do
desenvolvimento do trabalho.

2 Reflexões históricas de pesquisas sobre a formação inicial de professores que ensinam


matemática no contexto internacional e nacional

Os estudos sobre a formação inicial de professores e os cursos que dedicam-se a


formação inicial de professores para o ensino da matemática na Educação Básica tem
acompanhado historicamente a evolução das concepções acerca do papel do professor que
ensina matemática no contexto educacional de cada época.

No cenário internacional, verifica-se uma escassez de pesquisas relacionadas a


formação inicial de professores até o final da década de 60. Nas duas décadas seguintes, ou
seja, na década de 70 e 80 utilizou-se também dos programas emergenciais para a
formação de professores, simultaneamente aos cursos de licenciatura. No final dos anos 70 a
abordagem metodológica predominante era composta por estudos experimentais quantitativos,
fundamentados em teorias da Psicologia Educacional. A maioria dos estudos tinha como
questão de pesquisa: “O que é um ensino eficiente?”, logo suas investigações caracterizavam-
se pela busca em compreender o comportamento do professor, a metodologia adotada para o
ensino, características especificas das turmas trabalhadas, entre outras (FERREIRA, 2003).

Ainda segundo Ferreira (2003), na década de 80 as questões de pesquisa ampliaram-


se, possibilitando novos temas de pesquisas e metodologias. Nesse período a metodologia
predominante era naturalista ou interpretativa assim como as influências do curso de
formação de professores no desenvolvimento cognitivo e moral dos professores em formação
inicial.

No final desse período (década de 80), ocorreram muitas mudanças na formação de


professores em diversos países, que possibilitaram grandes reformas educacionais com o
intuito de elevar os padrões educacionais. Segundo Gaertner; Oechsler (2009, p.76), as
“mudanças no currículo dos cursos de formação de professores em diferentes épocas
evidenciam a tentativa de possibilitar uma formação inicial de qualidade ao futuro
profissional da educação”.

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Nesse sentido, a partir dessa época as pesquisas sobre o pensamento do professor


começaram a ser desenvolvidas. Ao descrever sobre os aspectos relacionados ao processo de
desenvolvimento das pesquisas que investigam a formação de professores, Marcelo (1998,
p.51) afirma que:

A pesquisa sobre formação de professores tem crescido quantitativa e


qualitativamente nos últimos quinze anos. Pouco a pouco, tem-se constatado um
incremento na preocupação de conhecer mais e melhor a maneira como se
desenvolve o processo de aprender a ensinar. As perspectivas e enfoques que se
foram utilizando para abordar essa problemática também foram evoluindo [...]. Se
há um tema que surgiu com vigor nos últimos anos, obrigando a reformular os
estudos sobre formação de professores, referimo-nos certamente às pesquisas que se
têm desenvolvido em torno do amplo descritor “aprender a ensinar”. Enraizadas no
que se denominou o paradigma do “pensamento do professor”, a pesquisa sobre
aprender a ensinar evoluiu na direção da indagação sobre os processos pelos quais os
professores geram conhecimento, além de sobre quais tipos de conhecimentos
adquirem.

Deste modo, a partir da década de 90, destacam-se pesquisas abordando não somente o
processo de ensino-aprendizagem como também, as crenças, concepções e valores dos
professores como objetos de pesquisas em um âmbito mais global. Nessa perspectiva o
professor, de objeto passivo de estudo e formação passou a ser considerado como sujeito do
estudo com participação ativa e colaborativa em muitos casos (FERREIRA, 2003).

No que refere-se a formação inicial de professores no cenário brasileiro, “até meados


da década de 1980, pouco se havia escrito e pesquisado sobre formação de professores e
menos ainda sobre a formação de professores de matemática no Brasil” (SILVA, 1998, apud
FERREIRA, 2003, p.25). A partir dessa época começa a ser mais evidente as pesquisas nesta
área de estudo no Brasil.

Para Fiorentini et al., (2002) as pesquisas nesse período relacionadas a formação


inicial de professores, preocupavam-se em abordar temas pertinentes a licenciatura plena em
matemática, licenciatura curta em ciências, a magistério, pedagogia, estágio supervisionado e
prática de ensino. Ao produzir uma pesquisa que investigou 112 trabalhos (dissertações e
teses) no contexto da formação de professores no âmbito formação inicial e continuada os
autores apontaram 59 estudos que trataram a formação inicial de professores.

Esses estudos foram organizados de acordo com o tema abordado, sendo constatado
vinte e quatro pesquisas sobre cursos e programas de formação de professores, entre elas
destacam-se os trabalhos de Araújo (1979); Melo (1982); Oliveira (1983); Araújo (1990);
Gonçalves (1992); Zaida (1993); Passos (1995); Faria (1996); Costa (1999); Pinotti (1999);

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Viel (1999); Bezerra (2000); Freitas (2001). Doze dessas pesquisas abordam aspectos do
estágio supervisionado e da prática de ensino, entre os autores estão: Araújo (1979); Ferreira
(1980); Tavares (1982); Cunha (1999); Freitas (2000); Castro (2002). Seis pesquisas versaram
sobre o estudo de outros conhecimentos, entre o quais menciona-se Santos (1993) e Darsie
(1998). Cinco investigações tratam das atividades extras curriculares e experiências, sendo
apontados autores como Silva (1982); Azevedo (1998) e Barbosa (2001). A prática dos
formadores de professores, o pensamento e a formação específica desse profissional são
abordados nos trabalhos de Garnica (1995); Gonçalves (2000); Brasil (2001); Silva (2001).
Outros autores como Cyrino (1997); Miotto (1997); Gomes (1999) e Ribeiro (1999)
enfatizam outros aspectos da formação inicial de professores (FIORENTINI et al., 2002).

Nas últimas décadas diversos autores evidenciam a predominância da abordagem


qualitativa no contexto das investigações relacionadas a formação inicial de professores que
ensinam matemática, sabendo-se que nessa abordagem os pesquisadores têm como objetivo
compreender o fenômeno formação de professores, isto é, como tem-se efetivado todo esse
processo de formação.

Quanto aos procedimentos metodológicos de pesquisa destaca-se a utilização de


técnicas das pesquisas exploratória, diagnóstica, explicativa e também descritiva. Entre os
instrumentos utilizados para o registro das informações, estão o questionário, entrevista, testes
exercícios de alunos e documentos (FERREIRA, 2003).

Atualmente, os pesquisadores têm procurado compreender essa área de pesquisa a


partir de algumas temáticas como crenças, concepções professores e licenciandos no âmbito
da formação inicial, metodologias de ensino, o uso da tecnologia, lacunas na composição
curricular dos cursos de formação inicial de professores que ensinam matemática, trabalho
colaborativo e a relação entre teoria e prática.

3 Considerações sobre a história da formação continuada de professores que ensinam


matemática no contexto internacional e nacional

O professor está sempre em um processo de aprendizado (novos alunos, novas


demandas), atualiza e reatualiza. Esse processo exige do professor reflexões e inovações
metodológicas para que o aprendizado dos alunos seja efetivado com um melhor ensino.
Logo, faz-se necessário investimentos por parte dos governantes em formação continuada
para profissionais que atuam no contexto educacional. É imprescindível também conhecer os

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aspectos históricos da temática formação continuada de professores que retrata a necessidade


da constante formação do profissional docente.

Sabe-se que a formação continuada que assim como em outros aspectos da formação
profissional docente passou por várias transformações, seja nas suas dimensões ou
nomenclaturas.

Sobre isso Zanon (2011, p. 52) destaca alguns termos que foram utilizados para
representar essa temática “[...] reciclagem, treinamento, aperfeiçoamento, atualização,
educação permanente, educação continuada e, mais recentemente, formação
continuada/formação contínua”. Mas cada termo apresentava objetivos distintos, por
exemplo, a reciclagem era algo mais amplo que poderia até mudar a área de formação, sendo
que o treinamento era algo voltado para cursos de atualização profissional. Essas
terminologias tinham o formato de atender os interesses de cada época.

Zanon escreve que “A formação continuada de professores que ensinam matemática


tem sido discutida nas últimas décadas em decurso das mudanças culturais, econômicas e
sociais”. (2011, p. 52). Dessa forma, é possível perceber que as concepções sobre formação
continuada de professores, que foram apresentadas em determinados períodos, embora não
mais usuais, foram importantes para aquele período. Ainda nesse sentido, em uma pesquisa
sobre a história da formação de professores no cenário internacional Fiorentini et al.,
apresentam que,

Os programas de formação de professores, bem como os estudos sobre o ensino e


suas aplicações em cursos de educação inicial e continuada, têm acompanhado
historicamente as concepções teóricas e sociopolíticas (acerca das funções da
educação, do ensino da matemática, do papel do professor dessa disciplina etc.) de
cada época (2003, p. 20).

Nesse sentido, a formação continuada de professores tem ganhado várias dimensões


seja no formato de cursos (externa a instituição), ou aquelas dimensões que acontece dentro
da escola (no dia a dia) ou até mesmo como sendo pessoal, reflexiva, em que o professor
avalia o próprio trabalho.

Mas de acordo Fiorentini et al,. (2003) no campo internacional, antes de se pensar


nesses formatos, até o final da década de 60 a formação de professores não tinha destaque e
era concebida de forma emergencial, por meio de programas da própria licenciatura ou
programas de treinamento. Não se têm muitos relatos da maneira como acontecia à formação

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de professores nesse período. Nisso fica difícil perceber como era pensada a formação
continuada, porém, por volta da década de 70 a maioria das pesquisas apontam para a
concepção de formação continuada como treinamento, em que buscava-se compreender o
comportamento do professor.

Até meados da década de 80 essa visão de treinamento perdurou, ela só começou a ser
superada nos anos finais desse período, quando as concepções dos professores passaram a ser
o foco de pesquisas. A formação continuada passava por uma reconfiguração e na década de
90 o professor adquire mais espaço e questões como crenças e valores também são situações
de discussão. A partir daí a formação continuada direciona o olhar para o professor e o torna
como principal nesse espaço (FIORENTINI et. al., 2003).

Outro ponto que merece destaque é que a formação de professores, sendo no formato
inicial ou continuado foi uma das primeiras temáticas de estudo no Campo da Educação
Matemática. No primeiro Congresso Internacional de Educação Matemática (ICME) de 1969
na França, já havia discussões a respeito dessa temática.

Diante disso, tem-se o seguinte questionamento: Como era a formação continuada de


professores nesse período no Brasil? Ao buscar subsídios na literatura no intuito de
compreender essa indagação, evidencia-se inicialmente que as pesquisas apontam bastante
similaridade com o que estava acontecendo no cenário internacional.

Entre as décadas de 60 a 80 o Brasil vivia o período da Ditadura Militar e a formação


continuada era vista no formato de aperfeiçoamento, de adequação ao que era exigido
politicamente. Sendo que até meados da década de 80 a formação continuada também era
pensada como treinamento.

Paulino e Pereira (2006) apresentam que nesse contexto o foco das formações
continuadas era direcionado para a formação tecnicista imposta pelos militares. Percebe-se
um formato parecido com aquele vivenciado pelos professores no âmbito internacional, eles
não ocupavam espaço de importância e eram apenas executores.

Porém, Fiorentini et al,. (2003, p. 33) apresenta que mesmo nesse período a formação
continuada passou por mudanças significativas, em que “a formação continuada de
professores de matemática sofre grandes transformações ao longo das décadas de 1970, 1980

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e 1990”. Para os autores, a formação continuada vai desde a concepção de treinamento até aos
projetos de parceria entre formadores de professores.

Outro aspecto a ser destacado é com relação aos primeiros trabalhos acadêmicos sobre
formação de professores de matemática. Fiorentini, em 1994, fez um inventário do que se
tinha produzido no contexto acadêmico no período de 1960 até início da década de 1990 na
área da Educação Matemática. Ele identificou que as primeiras pesquisas sobre formação de
professores de matemática surgiram a partir da segunda metade da década de 70. E um dos
temas abordado consistia na eficácia da formação continuada para o treinamento dos
professores.

Nota-se que nesse período o professor continuava como mero executor de conteúdos,
sem participação ativa, sem se perceber nessa formação que é inerente a ele. De acordo com
Fiorentini et al., (2003, p. 28) “praticamente nenhuma pesquisa dessa época parece evidenciar
qualquer preocupação sobre o que o professor teria a dizer sobre o processo de ensino-
aprendizagem de matemática ou ainda sobre suas crenças, suas concepções e seus valores. ”
Situação semelhante era vivenciada por professores em outros países.

Na década de 80 surgem às primeiras mudanças nas temáticas de pesquisa sobre


formação de professores. Embora o tecnicismo ainda muito forte nas pesquisas desse período,
abre-se espaço para discussões sobre outros contextos de formativos de professores.
(ALFERES; MAINARDES, 2011)

Um marco relevante que contribuiu para as mudanças nesse período foi a consolidação
do primeiro mestrado em Educação Matemática no Brasil. Criado pelo Instituto de
Matemática da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), espaço esse que é um
exemplo de formação continuada e propiciou a ampliação das discussões referente a temática.

Nessa perspectiva de mudanças, na década de 90, ainda de forma tímida, começa-se


uma reconfiguração da participação dos professores nos cursos de formação continuada “Mais
que uma “peça” útil ao sistema, ele começa a ser visto como um elemento importante no
processo de ensino-aprendizagem”. Inicia-se um diálogo com o professor, pois é ele que
conhece a sua sala de aula e as necessidades que ela demanda (FIORENTINI et al., 2003, p.
29).

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As discussões, voltaram-se também para a ideia de educação permanente e a formação


continuada passa a ser vista como necessária. Gatti (2009) aborda que a formação continuada,
principalmente em países desenvolvidos, a partir da década de 90, tornou-se um requisito para
o trabalho.

Outra situação de destaque nesse período foi à promulgação da Lei de Diretrizes e


Bases da Educação (LDB), em 1996, que em seu artigo 62 § 2° e artigo 62–A § único enfatiza
a formação continuada como um direito do professor podendo acontecer no local de trabalho,
em Instituições de Educação Básica e Superior ou de forma remota.

Diante disso, é possível perceber as transformações na trajetória desse campo. Em que


antes era discutido apenas no formato de cursos e treinamentos e nos dias atuais é algo que faz
parte do cotidiano do professor, influenciado por diversos fatores entre eles os contextos
culturais, políticos e sociais.

4 Considerações finais

A formação inicial e continuada de professores que ensinam matemática está inserida


no mesmo processo que é o da formação de professores. Embora a formação inicial seja uma
das mais importantes nesse contexto, ela por si só não é suficiente e não preenche todas as
lacunas da profissionalização docente.

Nesse sentido, tem-se o entendimento de que o professor está em constante formação,


ou seja, necessita-se da formação contínua e continuada para sua atuação enquanto
profissional docente.

Cabe destacar-se que essas temáticas vêm passando por transformações ao longo dos
anos. Tanto na formação inicial quanto na formação continuada, ocorreram diversas
mudanças como: alterações de nomenclatura, compreensão de outras dimensões além
daquelas no formato de cursos, preocupações com as concepções dos professores, tem
também ganhado espaço nas pesquisas o entendimento de que a formação do professor se
efetiva de maneira contínua e continuada.

Ao refletir sobre a temática evidenciou-se diversos aspectos históricos que


contribuíram para a consolidação do campo de pesquisa que investiga a formação de

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professores especialmente os aspectos relacionados a formação inicial e continuada de


professores que ensinam matemática.

Espera-se que este trabalho possa contribuir para reflexões acerca dos aspectos
históricos que possibilitaram o desenvolvimento desse campo de pesquisa, no intuito de
compreender o âmbito da formação inicial e continuada do professor e também do futuro
professor que ensina matemática.

5 Referências

ALFERES, M. A.; MAINARDES, J. A formação continuada de professores no Brasil. In:


SEMINÁRIO DE PESQUISA DO PPE, 2011, Maringá. Disponível em:<
http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2011/pdf/1/001.pdf>. Acesso em:
25/08/2021.

BRASIL. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, n°.


9.394, de 20 de dez. 1996. Disponível em: <http://www.portal.mec.gov.br>. Acesso em:
25/08/2021.

FERREIRA, A. C. Um olhar retrospectivo sobre a pesquisa brasileira em formação de


professores de matemática. In: FIORENTINI, D. (org.). Formação de professores de
matemática: explorando novos caminhos com outros olhares. Campinas-SP: Mercado de
letras, 2003, p. 19-50.

FIORENTINI, D. Rumos da pesquisa brasileira em educação matemática: o caso da


produção científica em cursos de pós-graduação. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade
de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 1994, p. 425.

FIORENTINI, D. et al,. Formação de professores que ensinam matemática: um balanço de 25


anos da pesquisa brasileira. Educação em Revista, Belo Horizonte, n. 36, p. 137-160, dez.
2002.

FIORENTINI, D. Formação de Professores de matemática: explorando novos caminhos


com outros olhares. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2003.

FIORENTINI, D. et al,. O professor que ensina matemática como campo de estudo:


concepção do projeto de pesquisa. In: FIORENTINI, D.; PASSOS, C. L. B.; LIMA, R. C. R.
(Org.). Mapeamento da pesquisa acadêmica brasileira sobre o professor que ensina
matemática: período 2001 - 2012. Campinas, SP: FE/UNICAMP, 2016. p. 17 - 42. E-Book.
ISBN 978-85-7713-198-3.

GATTI, B. A.; BARRETO, E. S. S.. Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília:


UNESCO, 2009. p. 294.

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GAERTNER, R; OECHSLER, V. Prática de ensino e estágio supervisionado na formação do


professor de matemática. In: Revista Eletrônica de Educação Matemática, v 4.6, 2009,
p.67-77.

GODOY, A. S. Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades, Revista de


Administração de Empresas, São Paulo, v. 35, n. 2, p. 57-63 mar./abr. 1995. Disponível em:
< https://www.scielo.br/j/rae/a/wf9CgwXVjpLFVgpwNkCgnnC/?format=pdf&lang=pt>.Acesso em:
02/09/2021.

MARCELO, C. Pesquisas sobre a formação de professores: O conhecimento sobre aprender a


ensinar. Revista Brasileira de Educação, n.9. 1988, p.51-75.

PAULINO, A. F. B. P.; PEREIRA, W.. A educação no estado militar (1964-1985).


Disponível em: < http://www2.faced.ufu.br/colubhe06/anais/arquivos/176AnaBorgesPauli_>.
Acesso em: 30/08/2021.

6 Agradecimentos

O presente trabalho tem o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível


Superior - Brasil (CAPES).

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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE FORMAÇÃO CONTINUADA DE


PROFESSORES QUE ENSINAM MATEMÁTICA

Daiane Gomes da Silva


Fundação Universidade Federal de Rondônia
daianegomes_jip@hotmail.com

Emerson da Silva Ribeiro


Fundação Universidade Federal de Rondônia
emerson@unir.br

Resumo:
Este trabalho apresenta algumas informações históricas e conceituais da tendência da Educação Matemática
conhecida por formação de professores que ensinam Matemática, em especial por uma de suas dimensões que é
a formação continuada. Nesse sentido, tem como objetivo fomentar algumas considerações gerais sobre a
formação continuada de professores que ensinam Matemática, de forma a abordar um breve histórico sobre essa
tendência, seus principais teóricos (internacional/nacional) e objetos de estudo. Para isso, optou-se por um estudo
de cunho bibliográfico, com apoio em autores que discutem sobre formação docente e formação de professores
que ensinam matemática. Fez-se uma síntese da evolução histórica da tendência formação de professores que
ensinam Matemática, tendo como base situações que ocorreram entre a década de 1960 até os anos 2000.
Discute-se também sobre aspectos conceituais e como foi sendo abordada a formação continuada de professores
que ensinam Matemática nesse período. Alguns autores recebem destaque nessas temáticas como Antônio
Sampaio Nóvoa (contexto internacional) e Dario Fiorentini (contexto nacional). Essa temática foi uma das
primeiras tendências a ser consolidada no cenário da Educação Matemática e até então continua sendo uma das
mais estudadas, porém tendo passado por várias renovações.
Palavras-chave: Formação Docente; Tendência da Educação Matemática; Formação Continuada de Professores
que Ensinam Matemática.

1. Introdução

A elaboração deste trabalho é decorrente da disciplina de Tendências da Educação


Matemática, do curso de Mestrado em Educação Matemática, da Fundação Universidade
Federal de Rondônia – (UNIR), Campus de Ji-Paraná, na ocasião em que foram feitas
discussões, na forma de seminários, sobre alguns aspectos que norteiam o cenário das
tendências temáticas nessa área.

Os debates propiciaram a compreensão de que há uma diversidade de tendências da


Educação Matemática e isso pode ser justificado pela sua ampla região de pesquisa e pela
influência de novas demandas sociais, estudos na área, preocupação de educadores e
professores, dentre outros.

Assim, diante das principais tendências da Educação Matemática, enfoca-se neste


trabalho a tendência de formação de professores que ensinam Matemática, em específico,
tratando-se da formação continuada, que foi apresentada e discutida no seminário da referida
disciplina.

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Deste modo, o presente trabalho se apresenta com o objetivo de fomentar algumas


considerações gerais sobre a formação continuada de professores que ensinam Matemática, de
forma a abordar um breve histórico sobre essa tendência, seus principais teóricos
(internacional/nacional) e objetos de estudo.

Para isso, o trabalho se qualifica como um estudo bibliográfico, com suporte em


autores como Fiorentini et al. (2003), Melo (2006) e Cecco, Bernardi e Delizoicov (2017) os
quais pesquisam e discutem sobre formação docente e formação de professores que ensinam
Matemática.

Desta forma, em linhas gerais, e sem a pretensão de esgotar o assunto, este trabalho se
propõe como uma tentativa de servir de suporte a outras pesquisas, pois há inúmeras situações
a serem estudadas sobre a formação de professores no cenário da Educação Matemática, bem
como, de poder contribuir com professores e pesquisadores que desejam conhecer alguns
aspectos da tendência formação (continuada) de professores que ensinam Matemática.

2. Aspectos históricos sobre a formação de professores de/que ensinam Matemática

A formação de professores de Matemática é uma das primeiras tendências


consolidadas na área da Educação Matemática enquanto campo profissional e de pesquisa.
Essa temática estuda como acontece a formação de professores de Matemática, seja na
modalidade inicial ou continuada, e suas implicações no contexto da sala de aula.

Assim como as demais tendências da Educação Matemática, essa tem como alguns de
seus pressupostos não só contribuir com a formação do professor, mas com o ensino e a
aprendizagem da Matemática, além de ampliar a concepção de que essa área é uma prática
social e que está a serviço da educação.

A tendência formação de professores de Matemática possui uma ampla área de estudo


e tem sido objeto de transformações nos últimos anos. De acordo com Fiorentini et al. (2003,
p. 20), os programas de formação de professores “têm acompanhado historicamente as
concepções teóricas e sociopolíticas (acerca das funções da educação, do ensino da
Matemática, do papel do professor dessa disciplina etc.) de cada época”. Além disso, é uma
das tendências da Educação Matemática que possui um dos maiores números de
pesquisadores no Brasil, a exemplo de Grupo de Trabalho 07 (GT07) – Formação de

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Professores que Ensinam Matemática, da Sociedade Brasileira de Educação Matemática


(SBEM), contando com mais de 80 membros4.

Segundo Fiorentini e colaboradores (2003), antes de se consolidar como tendência, no


cenário internacional, até o final dos anos de 1960 não havia muitas pesquisas nessa temática,
o que dificulta definir como acontecia a formação de professores no período. Já até o fim da
década de 1970, algumas pesquisas, principalmente nos Estados Unidos, serviram de base
para a compreensão de que a formação de professores não era valorizada politicamente e que
era estudado os métodos de treinamento dos professores em questões específicas.

Na primeira metade da década de 1980 se observa a ampliação do uso de diversas


metodologias de pesquisa, com ênfase nos métodos interpretativos e naturalistas, entretanto,
ainda sim a formação do professor era voltada para o treinamento. Apenas na segunda metade
dessa década é que se verifica uma mudança mais significativa, influenciada pelo movimento
que acontecia em vários países que tinha como objetivo à proposição de melhorias na
qualidade de ensino, e com isso a formação de professores é assumida sob dois enfoques:
formação como treinamento e formação como educação. Outro ponto importante é que a
opinião dos professores sobre o processo de sua formação começa a ser considerada
(FIORENTINI et al., 2003).

Nesse sentido, algumas pesquisas desenvolvidas em 1990 apontam o foco no professor


como elemento principal no contexto educacional. Assim, outros fatores passam a ser
valorizados, como suas vivencias, valores e crença (FIORENTINI et al., 2003).

Outro indício de mudança quanto à importância atribuída à formação docente, que


pode ser captado no site do ICME5, especialmente no campo da Educação Matemática, ocorre
no 1° Congresso Internacional de Educação Matemática (ICME), realizado em 1969, na
França, ao que esse evento teve como um de seus objetos de discussão a temática da formação
de professores, expressa no título: “Alguns problemas relativos à formação de mestres em
Matemática”.

Segundo a professora Raquel Milani (2021), em um vídeo sobre metodologias para a


pesquisa em Educação Matemática, promovido pela Universidade Virtual do Estado de São
4
Conforme informações disponibilizadas em: http://www.sbembrasil.org.br/sbembrasil/index.php/grupo-de-
trabalho/gt/gt-07.
5
Disponível em: https://www.mathunion.org/icmi/publications/icme-proceedings-and-
publications

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Paulo (UNIVESP), é no ICME 5 que os grupos de pesquisas, voltados para áreas específicas,
começam a se compor. E nesse cenário, do ICME 1 (final da década de 1960) até o ICME 5
(década de 1980), é possível perceber algumas das primeiras tendências da Educação
Matemática: Formação de professores; ensino e aprendizagem em todas as etapas escolares;
modelagem matemática e resolução de problemas.

No Brasil, os estudos na temática formação de professores de Matemática apresentam


similaridades com os que estavam acontecendo no âmbito internacional, isso desde o período
em que as pesquisas começam a tratar do assunto, como era vista a temática, até a sua
consolidação como tendência da Educação Matemática.

Entre os períodos das décadas de 1960 a 1990, autores e autoras como Fiorentini
(1994), Fiorentini et al. (2003), Paulino e Pereira (2006), Araújo e Silva (2009) e Alferes e
Mainardes (2011), descrevem que até meados da década de 1980 os estudos que havia sobre
formação de professores de Matemática eram poucos e estavam voltados para as estratégias
de treinamento. Também não se notava qualquer preocupação em inserir o professor como
agente principal do processo de formação.

Na década de 1990 essa perspectiva começa a mudar e não faz mais sentido pensar em
formação de professores sem que os próprios docentes pudessem participar ativamente na
elaboração das propostas de formação. Assim, concepções sobre suas vivencias no processo
de ensino-aprendizagem, seus valores e crenças, não poderiam mais passar despercebidas.
Nesse período há a consolidação dessa temática como tendência da Educação Matemática
(FIORENTINI et al., 2003).

Portanto, a partir dos anos de 1990, a formação de professores de Matemática passa a


ser uma das principais tendências discutidas no âmbito da Educação Matemática no Brasil.
Sendo debatido e formulado conhecimentos sobre a formação de professores em diferentes
contextos, saberes necessários para a prática docente, como acontece a formação inicial e
continuada, ao que esses assuntos são exemplos de discussões em torno dessa tendência.

Outra situação observada, decorrente de estudos sobre essa tendência, trata-se de sua
nomenclatura “formação de professores de Matemática”, pois esses estudos não estavam mais
voltados apenas para os professores de Matemática, ou seja, com graduação em Matemática,
mas contemplavam os professores que ensinam Matemática, incluindo as formações que
preparavam seus docentes para atuar no ensino de Matemática, a exemplo dos cursos de

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Pedagogia. E com isso acontece a evolução do termo para a nomenclatura atualmente


conhecida por: “formação de professores que ensinam Matemática” (MELO, 2006).

Nesse sentido, a formação de professores que ensinam Matemática passou a reunir,

[...] não somente pesquisas voltadas à formação inicial e continuada de professores,


mas também pesquisas que envolvem estudos sobre outros contextos e aspectos
(práticas profissionais, saberes ou conhecimentos docentes, identidade profissional,
trajetória de professores, crenças e concepções de professores) que estão nitidamente
relacionados à vida, à formação e ao desenvolvimento profissional do PEM
(FIORENTINI et al., 2016, p. 22).

Com a ampliação do foco de estudo, pesquisas que revelam informações a cerca do


professor, como suas vivências e identidade, passam a ser inseridas nos estudos dessa
temática. Isso acontece também porque a partir dessa evolução histórica o professor é
reconfigurado nesse processo.

Fiorentini et al. (2016, p. 24) escrevem que “a literatura geral do campo de estudo do
professor já apontava que as pesquisas, a partir do ano 2000, passaram a deslocar seu foco de
estudo, da formação do professor, para a pessoa do professor”. O que faz todo sentido, pois é
o professor que conhece as necessidades de seus alunos, da sua sala de aula. Ele tem papel
fundamental na formação dos sujeitos.

Mas o que vem sendo entendido por formação de professores? Segundo André (2002,
p. 308), a concepção de formação de professores adotada pelos pesquisadores “identifica-se,
cada vez mais, com o processo de desenvolvimento contínuo do professor, acentuando-se a
unidade desse processo na diversidade de suas fases: formação pré-serviço (inicial) e
formação em serviço (continuada)”. A autora acrescenta que a formação inicial e a formação
continuada fazem parte de um mesmo processo de desenvolvimento profissional.

Assim, a formação continuada de professores que ensinam Matemática, tema de


discussão deste trabalho, constitui-se como parte da tendência formação de professores que
ensinam Matemática.

3. A formação continuada de professores que ensinam Matemática: breve histórico e


conceitos

Diante da trajetória apresentada em relação à tendência formação de professores que


ensinam Matemática, observa-se que os estudos que foram acontecendo ao longo de sua

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história evidenciam várias mudanças no que atualmente tem sido compreendido como
formação continuada de professores que ensinam Matemática.

Sobre esse aspecto, Fiorentini et al. (2003, p. 33) destacam que:

A formação continuada de professores de Matemática sofre grandes transformações


ao longo das décadas de 1970, 1980 e 1990. Inicialmente se desenvolvendo por
meio de projetos de treinamento, reciclagem, atualização ou mesmo adestramento,
posteriormente passa a projetos de parceria entre formadores de professores
(geralmente professores universitários) e professores.

Por se tratar de uma espécie de subcampo da tendência formação de professores que


ensinam Matemática, os processos de aprimoramento dessa tendência em relação à formação
continuada aconteceram em períodos muito parecidos. Assim, de início, entre a década de
1960 a meados da década de 1980, as discussões sobre formação continuada também não
tinham como foco o professor, ao que ele não era o protagonista, mas apenas mero
participante dos cursos ofertados.

Na época havia uma preocupação em suprir as demandas do sistema tecnicista que


predominava no Brasil no período da ditadura militar. Dessa forma, os eventos de formação
continuada tinham como base desenvolver habilidades voltadas para a computação, dentre
outras. E, embora fosse tratada por nomes como reciclagem, treinamento, adestramento, cada
nome se dedicava a uma situação. Por exemplo, ao que o treinamento seria uma atualização,
um curso específico; a reciclagem era ampla e lidava com a área de atuação do professor
(ZANON, 2011).

Com os avanços nas pesquisas educacionais, essas concepções foram ficando


ultrapassadas e entre as décadas de 1980 e 1990 várias mudanças aconteceram sobre o que se
entendia por formação continuada a partir do modo como o professor era visto nesse processo,
e assim, outras considerações começaram a tomar corpo (FIORENTINI et al., 2003).

Cecco, Bernardi e Delizoicov (2017, p. 1104) fazem uma breve comparação acerca
dos estudos desenvolvidos por Fiorentini (1994) e Melo (2006) e constatam algumas
transformações em relação a essa tendência. Dentre elas:

[...] a mudança na formação continuada, antes concebida a partir de cursos de


treinamento e de projetos de atualização desenvolvidos na escola, como salientado
por Fiorentini (1994), enquanto que Melo (2006) já nos apresenta a discussão da
prática e formação docente em contextos socioculturais e as pesquisas sobre
percepções dos professores, além do termo formação contínua.

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Neste contexto, há a superação de que a formação continuada se restringisse a ideias


de cursos, os quais muitas vezes eram ofertados fora do ambiente escolar e sem vínculo com a
realidade dessas instituições. As produções de pesquisa começam a tratar o professor como
representante principal desse cenário e a concepção de formação contínua emerge de que o
professor está em constante formação, no seu dia a dia, na sua prática docente.

Diante de tais mudanças, Candau (2003 p. 57) faz apontamentos sobre isso e escreve
que a escola passa a ser o local da formação continuada, pois “nesse cotidiano, ele/a aprende,
desaprende, reestrutura o aprendido, faz descobertas e, portanto, é nesse lócus que muitas
vezes vai aprimorando a sua formação”. Isso implica reconhecer que a formação continuada
vai acontecendo ao longo da prática docente e a escola é o local central nesse quesito.

Ainda sobre o assunto, e partir da análise de estudos realizados durante a década de


1990, André (2002, p. 172) apresenta que “de modo geral, os autores dos diferentes artigos
tendem a recusar o conceito de formação continuada significando treinamento, cursos,
seminários, palestras, etc., assumindo a concepção de formação continuada como processo”.

Outro ponto importante quanto às transformações em torno da compreensão de


formação continuada após os anos de 1990 é sobre a representação dos professores nessa
temática de estudos. A participação do professor foi ressignificada e ele deixou de ser o
sujeito passivo, com um interesse maior em conhecer sobre suas concepções, se entendendo
que o que fosse proposto em termos de formação continuada deveria passar pela análise e
atendimento dessas concepções para ser mais eficaz o processo de ensino-aprendizagem.

Como consequência dos estudos sobre formação de professores que ensinam


Matemática, ainda foi possível compreender, nos dias atuais, que para que a formação
continuada tenha sentido, essa deve propiciar aos participantes não só o conhecimento
técnico, como também possibilidades de resolver situações-problemas existentes na realidade
em que estão inseridos; e para que possa ser entendida como aquela que acontece no dia a dia
requer que o professor reflita e opine sobre sua prática.

4. Principais teóricos e objetos de estudo da formação continuada de professores que


ensinam Matemática

O campo da formação continuada de professores que ensinam Matemática é bastante

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extenso. Por meio de pesquisas em sites como os da SBEM, ICME, trabalhos de


mapeamentos (cita-se o de Dário Fiorentini: Mapeamento da pesquisa acadêmica brasileira
sobre o professor que ensina matemática: período 2001 – 2012), dentre outros; é possível
notar a presença de autores com vários estudos nesse sentido. Nessa perspectiva, pode-se
apontar, no cenário internacional, autores como Antônio Sampaio Nóvoa, que escreve sobre a
formação continuada de professores no seu aspecto mais geral; William Heard Kilpatrick, que
por pesquisar sobre Educação Matemática também tece considerações a respeito da formação
continuada no contexto desse campo profissional e de pesquisa; e João Pedro da Ponte, que
tem prestado importantes contribuições no campo da Educação Matemática, dentre elas sobre
formação de professores.

Já no Brasil, um dos nomes que se destacam em relação à formação de professores que


ensinam Matemática, incluindo a formação continuada, é o de Dario Fiorentini, com estudos
desenvolvidos com grupos de pesquisa e orientandos.

Além disso, pode-se citar: Bernadete Angelina Gatti; Cármen Lúcia Brancaglion; Vera
Maria Ferrão Candau; Marcia Aparecida Alferes; José Carlos Libâneo; Marli Eliza Dalmazo
Afonso de André. Esses autores têm fomentado relevantes discussões sobre a formação
continuada de professores no geral e em específico quanto aos conhecimentos matemáticos.

No que diz respeito aos temas de interesse e objetos de estudo e pesquisa dentro da
formação continuada de professores que ensinam Matemática pode-se destacar: o interesse em
saber como acontece a aprendizagem do professor e o seu desenvolvimento profissional; o
que suas atitudes, crenças, concepções e representações influenciam no profissional que ele
está sendo ou nas suas práticas docentes; quais os saberes e competências necessárias à
formação docente; sua identidade e profissionalidade docente; e como é feita a avaliação deste
profissional (FIORENTINI et al., 2016).

Neste caso, se observa que dentre os pontos de estudo, o professor que ensina
Matemática é o que fundamenta todas as discussões, sendo que ele passa a ser objeto central
de discussões nessa tendência, ao contrário do que acontecia até os anos de 1990, em que o
professor não era reconhecido como agente principal do processo formativo.

5. Algumas considerações

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Com este trabalho foi possível ampliar a compreensão no que diz respeito à tendência
da formação de professores que ensinam Matemática, especialmente sobre suas principais
abordagens na sua evolução histórica, principais teóricos e seus objetos de estudo.

A formação continuada de professores que ensinam Matemática é um campo que está


em constante modificação e é uma das primeiras tendências a ser consolidada no campo da
Educação Matemática, se constituindo como essencial para o contexto escolar, pois, por meio
dela, o professor pode ter um espaço de reflexão, diálogo e de aprimoramento, e assim
contribuir ainda mais com formação dos alunos.

6. Referências

ALFERES, M. A.; MAINARDES, J. A formação continuada de professores no Brasil. In:


SEMINÁRIO DE PESQUISA DO PPE, 2011, Maringá. Anais... Disponível em:
<http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2011/pdf/1/001.pdf>. Acesso em: jul.
2021.

ANDRÉ, M. E. D. A. Formação de professores no Brasil (1990-1998). Brasília:


MEC/Inep/Comped, 2002. (Série Estado do Conhecimento).

ARAÚJO, C. M.; SILVA, E. M. Formação continuada de professores: tendências emergentes


na década de 1990. Educação, Porto Alegre, v. 32, n. 3, p. 326-330, set./dez. 2009.
Disponível em: <http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/view/4694>.
Acesso em: jul. 2021.

CANDAU, V. M. Formação continuada de professores: tendências atuais. In: ______.


Magistério: construção cotidiana. Rio de Janeiro: Vozes, 2003.

CECCO, B. L.; BERNARDI, L. T. M. S.; DELIZOICOV, N. C. Formação de professores que


ensinam Matemática: um olhar sobre as redes sociais e intelectuais do BOLEMA. Bolema,
Rio Claro (SP), v. 31, n. 59, p. 1101-1122, dez. 2017.

FIORENTINI, D. Rumos da pesquisa brasileira em educação matemática: o caso da


produção científica em cursos de pós-graduação. 1994. 425f. Tese (Doutorado em Educação)
– Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1994.

FIORENTINI, D. et al. Formação de professores de matemática: explorando novos


caminhos com outros olhares. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2003.

FIORENTINI, D. et al. O professor que ensina matemática como campo de estudo: concepção
do projeto de pesquisa. In: FIORENTINI, D.; PASSOS, C. L. B.; LIMA, R. C. R. (Org.).
Mapeamento da pesquisa acadêmica brasileira sobre o professor que ensina
matemática: período 2001 - 2012. Campinas, SP: FE/UNICAMP, 2016. p. 17-42. Disponível
em: <https://www.fe.unicamp.br/pf-fe/pagina_basica/58/e-book-mapeamento-pesquisa-
pem.pdf>. Acesso em: jul. 2020.

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MILANI, R. Metodologias para a Pesquisa em Educação Matemática - Formação de


Professores de Matemática. UNIVESP. Youtube. 03 de março de 2021. 18 min 20s.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Ny-P1P_mw6Y>. Acesso em:
setembro/2021.

MELO, M. Três décadas em educação matemática na Unicamp: um estudo histórico a


partir de teses e dissertações. 2006. 273f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade
de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2006. Disponível em:<
http://repositorio.unicamp.br/bitstream/REPOSIP/253783/1/Melo_MarisolVieira_M.pdf>.
Acesso em: jul.2021.

PAULINO, A. F. B. P.; PEREIRA, W. A educação no estado militar (1964-1985).


Disponível em:
<http://www2.faced.ufu.br/colubhe06/anais/arquivos/176AnaBorgesPaulino_e_WanderPereir
a.pdf>. Acesso em: jul. 2021.

ZANON, T. X. D. Formação continuada de professores que ensinam matemática : o que


pensam e sentem sobre ensino, aprendizagem e avaliação. 2011. 300 f. Disponível em:
<https://repositorio.ufes.br/bitstream/10/2278/1/tese_5183_THIARLA%20XAVIER%20DAL
-CIN%20ZANON.pdf>. Acesso em: jul.2021.

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O ENSINO DO CÁLCULO: ASPECTOS HISTÓRICOS E ATUAIS

Hailton César Alves dos Reis


Fundação Universidade Federal de Rondônia
notliah@unir.br

Ewerton Rodrigues Andrade


Fundação Universidade Federal de Rondônia
ewerton.andrade@unir.br

Liliane da Silva Coelho Jacon


Fundação Universidade Federal de Rondônia
liliane@unir.br

Resumo
Este artigo procura resgatar a história do Cálculo Diferencial e Integral conteúdo considerado de difícil
compreensão entre os alunos de cursos superiores. Esta reconstrução histórica pretende auxiliar a tornar mais
clara a sua relevância na formação acadêmica. É apresentado o contexto atual do ensino-aprendizado do Cálculo
com foco nas Tecnologias Digitais, Informação e Comunicação – TDICs - em específico na utilização do
software Maple como instrumento de ensino-aprendizagem. Para tanto, é empregado como exemplo histórico o
Método da Exaustão utilizado por Arquimedes para estimar o valor de π preenchendo o círculo com polígonos de
um número cada vez maior de lados.
Palavras-chave: Educação Matemática; História da Matemática; Cálculo Diferencial e Integral.

1. Introdução

Para Munhoz (2011) a importância da utilização da história da matemática como


recurso metodológico proporciona a contextualização dos conteúdos possibilitando
compreender que a matemática é fruto de uma construção histórica. Já D’Ambrósio (1996)
pondera que a transmissão do conhecimento sobre a disciplina que se ministra quando
perpassada pelo conhecimento que a originou e quais as razões de sua presença nos currículos
de matemática torna-se mais significativo, sendo este um dos objetivos da História da
Matemática. Este autor enfatiza que na ausência da História da Matemática nos cursos de
formação inicial de professores, este conteúdo poderá ser trabalhado na formação continuada
em serviço e que os professores podem procurar esse conhecimento de forma independente:

Não é necessário desenvolver um currículo, linear e organizado de História da


Matemática. Basta colocar aqui e ali, algumas reflexões. Isto pode gerar muito
interesse nas aulas de matemática. Claro, o bom seria que o professor tivesse uma
noção da História da Matemática e pudesse fazer um estudo mais sistemático e por
isso recomenda-se aos professores em serviço que procurem essa formação.
(D´AMBRÓSIO, 1996, p. 13).

Este artigo está dividido em 6 seções, a seção 2 apresenta os Elementos históricos do


Cálculo, a seção 3 apresenta aspectos do ensino de Cálculo no Brasil, a seção 4 apresenta uma

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reflexão sobre os recursos utilizados no ensino de Cálculo, na seção 5 são apresentadas as


considerações finais, ao final do texto apresentam-se as referências utilizadas para elaboração
deste artigo.

2. Elementos históricos do Cálculo

A história que envolve a construção do Cálculo é permeada de conflitos, no entanto, é


consenso que houve inúmeras contribuições de diversas personalidades ao que chamamos
hoje de Cálculo Diferencial e Integral ou Cálculo Infinitesimal.

Considera-se que o Cálculo tenha seu desenvolvimento inicial a partir das pesquisas de
Isaac Newton e Gottfried Leibniz. No entanto, diversos matemáticos contribuíram para a sua
estruturação, pesquisadores como: Euler, D´Alembert, L´Hôpital, Cavalieri, Borrow, Fermat e
Kepler utilizavam conceitos de Cálculo para resolução de problemas. Contudo, suas raízes
históricas são mais antigas, segundo Domingues (2013), um dos primeiros estudos com
registros é de Antifon. A manifestação atribuída a Antifon, um contemporâneo de Sócrates,
propunha sucessivas duplicações do número de lados de um polígono regular inscrito num
círculo a diferença entre a área do círculo e a dos polígonos seria “ao fim” exaurida, e como
sempre é possível construir um quadrado equivalente a qualquer polígono, a quadratura do
círculo seria possível.

De acordo com Domingues (2013), a argumentação de Antifon dialoga com Eudoxo,


século IV a.C., o qual propôs o Método da Exaustão, que busca encontrar a área de uma figura
inscrevendo-se dentro dela uma sequência de polígonos cuja soma das áreas converge para a
área da figura desejada. Este método possui os conceitos básicos de infinitésimos e possui
como base a seguinte proposição:

Se de uma grandeza subtrai-se uma parte não menor que sua metade, do restante
outra parte não menor que sua metade, e assim por diante, numa determinada etapa
do processo chega-se a uma grandeza menor que qualquer outra da mesma espécie
fixada a priori (Domingues. 2013. p. 52).

Arquimedes (287 a. C – 212 a. C) utilizou o Método da Exaustão em um polígono


regular inscrito e outro circunscrito a um mesmo círculo para calcular o valor de π (Pi), de
forma que, aumentando-se o número de lados do polígono regular verifica-se uma
aproximação da área do círculo. Quando os polígonos possuíam 96 lados cada um, ele
calculou os comprimentos de seus lados e demonstrou que o valor de π está entre 3 e 3 . Ele

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também inferiu que a área de um círculo é igual a π multiplicado pelo quadrado do raio do
círculo. Esta aplicação atualmente é representada na figura 1.

Figura 1: Polígonos com n lados


Fonte: Martins (2016)

Boyer (1974) assevera outras fontes históricas como o Papiro Egípcio de Moscou e o
Papiro de Rhind ambos dedicados a solucionar problemas práticos como a estimativa da área
de superfície de uma curva e volume de uma pirâmide, estes importantes documentos
históricos são datados de aproximadamente 2000 a.C.

O termo “Cálculo Integral” foi cunhado por Johann Bernoulli (Torres e Giraffa. 2009)
seu conteúdo caracteriza-se basicamente como o conhecimento avançado de Álgebra e
Geometria utilizados na resolução de ´problemas de diversos campos de estudo como: a
Economia, as Engenharias, Química, Física, Astronomia, etc.

3. Ensino do Cálculo no Brasil

Segundo Miorin (1998) os procedimentos modernos do Cálculo Diferencial e Integral


possibilitaram a introdução da modernização do estudo da Matemática no Brasil no século
XX.

Para Lima (2012) o estudo de referência do Cálculo nas universidades brasileiras pode
ser dividido em cinco momentos principais:

a. O ensino do Cálculo nas Escolas Militares e Politécnicas entre o final do século


XIX e o início do século XX;

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b. A fundação da USP e a introdução da Análise Matemática no país;

c. A introdução de uma disciplina de Cálculo precedendo a de Análise;

d. Tentativas de promover uma compreensão efetiva, por parte do aluno, de uma


abordagem do Cálculo feita com alto nível de rigor simbólico-formal; e

e. O predomínio das técnicas e/ou conflitos pedagógicos entre o que se faz e o que se
pede.

Cabe destacar, que o desenvolvimento histórico do Cálculo se observado hoje como é


organizado nos livros textos e ensinado nas instituições, seguiu uma ordem contrária à sua
construção histórica, ou seja, os livros textos hoje são organizados primeiro com conceitos do
Cálculo Diferencial e em seguida do Cálculo Integral. No entanto, por meio da história pode-
se observar que em primeiro lugar vieram os conceitos de Cálculo Integral e só depois os de
Cálculo Diferencial (Reis. 2019).

Para Alvarenga et al. (2017) o Cálculo Diferencial e Integral possui seu conteúdo
sistematizado nas universidades da seguinte forma:

1. Funções reais. Limites de funções. Limites laterais e Continuidade de funções.


Teorema do Valor Intermediário. Reta tangente, derivada, regras básicas de
derivação. Derivadas de funções transcendentes;

2. Derivadas de composições e inversas de funções. Derivação implícita e taxas


relacionadas. Otimização. Teorema do Valor Médio. Esboço de gráficos. Regra de
L’Hôpital;

3. Integral definida e propriedades. Teorema Fundamental do Cálculo. Integral


indefinida. Técnicas de integração: substituição, partes, frações parciais,
substituição inversa, produtos de funções trigonométricas. Aplicações da integral
ao cálculo de áreas planas, comprimento de curvas, volumes de sólidos.

Devido a importância do Cálculo e suas implicações nos diversos campos de estudo


pesquisas como de Júnior et al. (2015) observam que os índices de reprovações são elevados
chegando a mais de 70% em diversas turmas pesquisadas. Esta situação implica em uma
acentuada e progressiva insatisfação entre os professores e alunos. Este cenário é apresentado
por Reis et al. (2020) no estudo sobre a evolução das aprovações em Cálculo Diferencial e
Integral nos cursos de licenciatura e bacharelado da Fundação Universidade Federal de
Rondônia no campus de Ji-Paraná (RO) no período de 2010.1 à 2019.2.

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4. Recursos didáticos no ensino-aprendizagem do Cálculo

Os recursos didáticos normalmente utilizados em aulas das disciplinas de Cálculo são:


livro-texto, listas de exercícios, quadro, giz ou pincel. No entanto, atualmente existe a
inserção contínua de ferramentas tecnológicas como: computadores, tablets, celulares,
notebooks, Datashows e slides. De forma que, estes recursos associados aos já existentes
constituem parte da educação proposta ao século XXI a qual exige do professor recursos
metodológicos que sejam capazes de promover a criticidade, autonomia e criatividade dos
alunos. Assim, o professor deverá compreender sobre o uso das ferramentas tecnológicas
(também denominadas de Tecnologias Digitais, de Informação e Comunicação – TDICs)
fazendo o emprego de tais recursos em sala de aula. Visto que na pedagogia Freiriana o
processo de aprender é parte do processo de ensinar e o processo de ensinar é parte do
processo de aprender, devendo existir sempre uma cumplicidade entre o educador e o
educando, pois, sem cumplicidade não há educação (Freire, 1994). Ou seja, professores e
alunos aprendem ao ensinarem e ensinam (cada vez melhor) depois de aprenderem uns com
os outros, sem autoritarismo no ensino sendo o professor um mediador, aquele que estabelece
relações dialógicas de ensino-aprendizagem e colabora para que o discente alcance seus
objetivos.

O uso de softwares é indispensável atualmente estão presentes nas relações sociais, no


trabalho e em ambientes educacionais. A formação para o século XXI existe o imperativo de
inserir diferentes metodologias de ensino-aprendizagem com o advento da popularização da
internet livros-texto de diferentes autores estão disponíveis, além desta possibilidade,
plataformas digitais, manuais e tutoriais são facilmente acessíveis e disponibilizados,
tornando a informação disponível sempre que for necessária.

No ensino-aprendizagem da Matemática existe uma gama de oportunidades de


utilização de softwares conforme Ragoni et al. (2017), esta diversidade de opções de
softwares é outro ponto a ser explorado por professores, uma vez que o emprego do
computador por si só pode não ser somente complemento das aulas, devendo as TDICs
auxiliar na elaboração de espaços dinâmicos e interativos para o ensino-aprendizagem.

Nesse contexto, o emprego de softwares constitui alternativa para a superação dos


índices de reprovação. No entanto, é relevante a importância da formação permanente e
continuada dos professores, sobretudo para a utilização de novas tecnologias, considerando

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como afirma Imbernón (2010, p. 94) “[...] somente quando o professor consegue resolver sua
situação problemática, produz mudança na prática educacional. [...]”.

O emprego de softwares no ensino-aprendizagem de Cálculo, e dentre eles o software


Maple6, busca auxiliar o processo de ensino-aprendizagem através da visualização, a qual é
associada à habilidade de interpretar e entender informações para melhor compreensão teórica
conforme descrição a seguir:

Na matemática a visualização está associada à habilidade de interpretar e entender


informações figurais [...] A visualização é considerada como um processo de
formação de imagens (mentalmente, com papel e lápis ou com outras tecnologias),
usada com intuito de obter melhor entendimento matemático e estimular o processo
de descoberta matemática (BORBA, MALHEIROS e AMARAL, 2021, p. 73).

O Maple abrange uma variedade de assuntos relacionados ao aprendizado e ao uso de


recursos Matemáticos, este software constitui um ambiente de informática denominado
computação de expressões algébrica ou simbólicas o qual oferece o desenho e/ou esboço de
gráficos em duas ou três dimensões. Inicialmente foi desenvolvido em 1981 pelo Grupo de
Computação Simbólica da Waterloo University Insc. em Waterloo no Canadá. A partir de
1988 o Maple tem sido desenvolvido e comercializado pela Maplesoft (MAPLESOFT, 2010).

O Método da Exaustão utilizado por Arquimedes para calcular o π quando submetido


ao Maple pode ser visualizado na figura seguinte.

6 Maple é um sistema algébrico computacional comercial de uso genérico. É composto por um ambiente
informático para computação de expressões algébricas, simbólicas, permitindo o desenho de gráficos a duas ou
três dimensões. Possui quatro aspectos gerais: Algébricos, Numéricos, Gráficos e Programação (Portugal, 2002.
p. 3). Estas características são integradas para formar um único sistema integrado formando uma linguagem de
programação simbólica. É desenvolvido e comercializado pela empresa canadense Maplesoft

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Figura 2: Polígonos com n lados no Maple


Fonte: Autor

Neste exemplo foi utilizado o Maple versão 11.0, o pacote Geometry que define e
manipula pontos, retas, triângulos e círculos em duas dimensões. Os comandos: eval, evalf,
circle e polygons. A constante π é representada pela palavra Pi com inicial maiúscula.

5. Considerações finais

O objetivo do ensino-aprendizagem do Cálculo deixou de ser somente a busca pela


resolução de listas de exercícios e esboços de gráficos utilizando papel, caneta, lápis e
borracha. A compreensão das operações e a análise dos gráficos possibilita uma visão mais
abrangente dos princípios matemáticos utilizados no Cálculo, levando os alunos a tornar-se
um descobridor e não um receptor passivo do conhecimento. Este artigo não busca
descredibilizar recursos importantes como o caderno ou livros-texto reflete sobre a utilização
de softwares matemáticos como apoio ao ensino-aprendizado, aliado ao contexto histórico
pelo qual o Cálculo foi criado.

Abordamos o Método da Exaustão por sua relevância histórica, atribuindo uma


resolução através do software Maple. Acredita-se que este desenvolvimento torna mais fácil a
compreensão e visualização do método e que pode ser aproveitado em sala de aula para
apresentar aos alunos como motivação nas disciplinas de Cálculo.

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6. Referências

ALVARENGA, K. B; DORR, R. C; VIEIRA, V. D. O Ensino e a aprendizagem de Cálculo


Diferencial e Integral:. Passo Fundo: Revista Brasileira de Ensino Superior, v. 2, n. 4, mar.
2017. Disponível em: https://seer.imed.edu.br/index.php/REBES/article/view/1518. Acesso
em: 29 jun. 2021.

BORBA, M. de C; MALHEIROS, A. P. dos S; AMARAL, R. B; Educação a distância


online. 5ª.ed. Belo Horizonte: Autentica, 2021.

BOYER, C. B. História da Matemática. tradução Elza F. Gomide. São Paulo, Edgard


Blücher, Editora da Universidade de São Paulo, 1974.

D´AMBRÓSIO, U. História da Matemática e Educação. in Caderno CEDES. História e


Educação Matemática. Campinas: Papirus, n. 40, 1996.

DOMINGUES, H. H. in: IEZZI, G. Fundamentos da Matemática Elementar, vol. 8ª e 9ᵃ


edição, São Paulo: Atual Editora, 2013.

FREIRE, P. Ensinar, aprendendo. Publicação da Escola Comunitária de Campinas.


1994. Disponível em: http://acervo.paulofreire.org:8080/xmlui/handle/7891/3010. Acesso em:
25 jul. 2021.

IMBERNÓN, F. Formação continuada de professores. Porto Alegre: Artmed, 2010.

JÚNIOR, J. F. G; BESSA, V. R. de; CEZANA, M. J. Um Estudo sobre o baixo índice de


aprovações nas disciplinas de Cálculo da Universidade Federal de Viçosa – campus Rio
Paranaíba. Viçosa: Revista Iluminart, n. 13, Ano VII nº 13 ISSN 1984-8625. 2015.

LIMA, G. L. A Disciplina de Cálculo I do Curso de Matemática da Universidade de São


Paulo: um Estudo de seu Desenvolvimento, de 1934 a 1994. 2012. 445f. Tese (Doutorado em
Educação Matemática) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

MAPLESOFT. Site oficial: de representação do software Maple. Disponível em


<http://www.maplesoft.com/products/Maple/index.aspx>. 2010. Data de acesso: 10 de jun.
2021.

MIORIN, M. A. Introdução à História da Educação Matemática. São Paulo: Atual. 1998.

MUNHOZ, M. O. Propostas metodológicas para o ensino de Matemática. Série


Metodologias, Curitiba: IBPEX, 2011.

PORTUGAL, Homepage Renato Portugal. Disponível em: https://www.lncc.br/~portugal/.


2002. Acesso em: 26 de jul. 2021.

RAGONI, V. F; SALMASIO, J. L; FIGUEIREDO, T. D. O uso de ferramentas digitais na


formação inicial de professores de matemática. Anais 10 Encontro Internacional de
formação de professores. 11 fórum permanente internacional de inovação educacional.
Educação, Base nacional comum curricular e formação de professores. ISSN: 2179-0663.
2017.

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REIS E. da S. Raízes históricas do ensino de cálculo diferencial e integral na escola


politécnica do Rio de Janeiro nas últimas décadas do século XIX. 188f. Tese (Doutorado
em Educação Matemática) - Universidade Federal de Mato Grosso do Silva, Campo Grande -
MS. 2019.

REIS, H. C. A. dos; ANDRADE, E. R; JACON, L. da S. C. Evolução das aprovações em


cálculo diferencial e integral: estudo de caso das licenciaturas e dos bacharelados na UNIR
em Ji-Paraná (RO). Anais da XX Semana da Matemática. ISBN 978-85-7764-034-8. 2020.

TORRES, I. M; GIRAFFA, L. M. M. O Ensino do Cálculo numa perspectiva histórica: Da


régua de calcular ao MOODLE. REVEMAT - Revista Eletrônica de Educação
Matemática. V4.1, p.18-25, UFSC: 2009.

MARTINS, R. O Método da Exaustão e o Surgimento da Constante Pi (π). 2016.


Disponível em: https://atitudereflexiva.wordpress.com/2016/12/01/o-metodo-da-exaustao-e-o-
surgimento-da-constante-pi-%CF%80/. Acesso em: 23 set. 2021.

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AS EQUAÇÕES DO MOVIMENTO DO PÊNDULO ESFÉRICO POR MEIO DA


MECÂNICA LAGRANGIANA

Ortenilton dos Santos Filho


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
orteniltonfilho@mat.puc-rio.br

Clesio Carlos de Souza Nascimento


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
clesiocarlos.ufs@gmail.com

Gerson Cruz Araujo


Universidade Federal de Sergipe
gerson@mat.ufs.br

Ellen Santos Sodré


Universidade Federal de Sergipe
ellensodrees@academico.ufs.br

Resumo:
A mecânica newtoniana, formulada por Isaac Newton, era, até meados do século XVIII, a melhor ferramenta que
se tinha para estudar problemas da dinâmica. No entanto, esta exigia mais coordenadas para se trabalhar do que
o necessário. O estudo feito por Lagrange, ao final do século XVIII, tinha como objetivo tornar mais simples e
elegante o método de se obter as equações de movimento dos fenômenos naturais estabelecidos do âmbito social
e científico. Isso foi feito através do Princípio de d’Alembert e da introdução das coordenadas generalizadas na
mecânica analítica. Ao contrário da mecânica newtoniana, a mecânica lagrangiana elimina qualquer referência
às forças de vínculo, o que estabelece grande vantagem, pois na maioria dos casos não sabemos de imediato as
expressões que definem as forças de vínculo. O objetivo deste texto é apresentar, de maneira simples e concisa, a
mecânica lagrangiana e exibir as equações do movimento do pêndulo esférico.
Palavras-chave: Mecânica lagrangiana; Equações do movimento; Pêndulo esférico.

1. Introdução

Os modelos mecânicos nos quais refinaram em certos aspectos a mecânica de Newton,


trazendo todo embasamento matemático, e são pilares da mecânica analítica, foram a mecânica
lagrangiana e a mecânica hamiltoniana. Estas, são consistentes como a mecânica newtoniana,
ambas se constituindo em formulações mais abstratas desta última. Os formalismos lagrangiano
e hamiltoniano partem de proposições energéticas, envolvendo a energia cinética e a energia po-
tencial de sistemas newtonianos, das quais se pode derivar, por métodos variacionais, diversas
variáveis mecânicas para tais sistemas. Do ponto de vista teórico, elas permitem uma com-
preensão mais profunda da mecânica de Newton; do ponto de vista heurístico, elas permitem,

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para alguns sistemas, soluções mais simples e imediatas do que aquelas conseguidas com o
formalismo usual da mecânica newtoniana.

Realcemos, de maneira sutil, os princípios elementares da Mecânica Analítica. O pi-


oneirismo da mecânica lagrangiana, notoriamente dar-se ao matemático italiano Joseph Louis
Lagrange (1736-1813), cujo formalismo considera uma função escalar L := L(q, q̇,t) chamada
Lagrangiana, que caracteriza o sistema que modela o evento estudado. Assim, um sistema pode
ser descrito pelas equações de Lagrange, que são n (graus de liberdade) equações diferenciais
de segunda ordem e invariantes sob uma transformação de coordenadas. Algumas das vanta-
gens sobre a formulação newtoniana é que, além da forma invariante das equações, as forças
são literalmente derivadas da função Lagrangiana.

2. A mecânica lagrangiana

O âmago desta seção é expor, de maneira suscinta, a formulação da mecânica desenvol-


vida pelo matemático italiano Joseph Louis Lagrange (1735-1813). Antes de dar início à teoria,
permita-nos informar que o texto aqui exposto tem como base as referências Júnior (2018), Le-
mos (2007), Neto (2004), Soldovieri (2013) e Villar (2015). A seguir, exibiremos deifinições e
resultados relevantes à teoria da mecânica lagrangiana.

Definição 1. (Vínculo). Um vínculo é a condição que as coordenadas que descrevem o sistema


podem estar sujeitas.

Devemos destacar que tais restrições, isto é, os vínculos, devem ser levadas em conta,
antes mesmo da formulação das equações do movimento do sistema.

Definição 2. (Graus de liberdade). Chamamos de graus de liberdade o número de grandezas


independentes que determinam, de modo único, a posição de um sistema.

Para um sistema mecânico constituído por m corpos, posto em um espaço de dimensão


k e contendo p vínculos, a quantidade de graus de liberdade é dada por

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n = km − p.

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Definição 3. (Coordenadas generalizadas). Chamamos de coordenadas generalizadas o con-


junto mínimo de coordenadas q1 , q2 , . . . , qn , capazes de caracterizar completamente a posição
de um sistema.

O número de graus de liberdade é igual a quatidade de coordenadas generalizadas. Logo,


é possível introduzir n coordenadas generalizadas q1 , q2 , . . . , qn tais que o vetor posição da
i-ésima partícula se escreve como sendo

ri = ri (q1 , q2 , . . . , qn ,t), i = 1, 2, . . . , m,

e as equações de vínculos são identicamente satisfeitas.

Chamamos de espaço de configuração do sistema o espaço cartesiano que tem como


eixos coordenados as coordenadas generalizadas.

Definição 4. (Função de Lagrange ou lagrangiana). A função de Lagrange ou lagrangiana de


um sistema mecânico é definida por

L : Rn × Rn × R −→ R
(q, q̇,t) 7−→ L(q, q̇,t) = T −V,

onde q = (q1 , q2 , . . . , qn ) é o vetor coordenada generalizada, q̇ = (q̇1 , q̇2 , . . . , q̇n ) o vetor veloci-
dade generalizada, T e V são as energias cinética e potencial, respectivamente.

Definida a função de Lagrange, podemos obter as equações do movimento de um sis-


tema mecânico. Vejamos então como obter tais equações, fazendo uso de um importante resul-
tado do Cálculo Variacional chamado Princípio da Mínima Ação ou Princípio de Hamilton.

Definição 5. (Princípio da mínima ação ou Princípio de Hamilton). Dado um sistema mecânico


descrito pela lagrangiana L(q, q̇,t), seu movimento do instante t1 ao instante t2 é tal que a ação

Z t2
S= L(q, q̇,t)dt
t1

é mínima (mais geralmente, estacionária) para a trajetória real, mantidos fixos os pontos inicial
e final da trajetória no espaço de configuração.

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Nosso objetivo agora é responder à seguinte pergunta: Qual a condição que devemos ter
para que a ação S seja mínima?

Pois bem, consideremos as variações

qi = qi (t) + δqi (t), com i = 1, . . . , n,

onde os δq’s são independentes entre si e arbitrários, satisfazendo a condição δqi (t1 ) = δqi (t2 ) =
0, para todos i = 1, . . . , n. A variação da ação S é dada por

n Z t2  
∂L ∂L
δS = ∑ δqi + δq̇i dt (1)
i=1 t1 ∂qi ∂q̇i

Impondo δS = 0 e fazendo algumas manipulações algébricas, concluímos que (1) é equivalente


a  
d ∂L ∂L
− = 0, onde i = 1, . . . , n. (2)
dt ∂q̇i ∂qi
Estas últimas equações são chamadas de equação de Euler-Lagrange.

Observação 1. As equações de Euler-Lagrange são as equações de movimento do sistema e


constituem um sistema de n EDO’s de 2ª ordem.

Para determinar a dinâmica de um sistema, segundo a teoria lagrangiana, devemos seguir


os seguintes passos:

1) Escolha as coordenadas generalizadas q1 , . . . , qn ;

2) Calcule as energias cinéticas e potenciais T e V , respectivamente, para determinar a la-


grangiana L = T −V . Estas devem ser expressas em função dos q’s e q̇’s, apenas;
 
∂L ∂L d ∂L
3) Calcule as derivadas parciais , , e substitua tais expressões em (2).
∂qk ∂q̇k dt ∂q̇k

A seguir, usaremos a teoria exposta nesta seção para encontrar as equações do movi-
mento do pêndulo esférico.

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3. As equações do movimento do pêndulo esférico

Nesta seção faremos a formulação do problema e obteremos as equações do movimento


do problema proposto, por meio da mecânica lagrangiana. O leitor interessado pode encontrar
em Barbosa e Moraes (2011) a obtenção das equações do movimento do pêndulo esférico por
meio da mecânica newtoniana para comparar os resultados obtidos.

Considere uma haste de massa desprezível, de comprimento l e com uma das suas ex-
tremidades presa à origem do espaço euclidiano R3 . Suponha uma massa m presa à extremi-
dade livre da haste, realizando um movimento esférico no espaço, conforme ilustrado na figura
abaixo.

Figura 1: Pêndulo esférico


Fonte: Elaborada pelo autor.

Note que este problema possui um vínculo, que é justamente o comprimento l da haste
do pêndulo. Desta maneira, a quantidade de graus de liberdade e, consequentemente, de coor-
denadas generalizadas do sistema é

n = 3 · 1 − 1 = 2.

Como a massa realiza um movimento esférico, é conveniente usarmos coordenadas esféricas


para descrever sua dinâmica. Escolhemos então, como coordenadas generalizadas, os ângulos

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q1 = ϕ e q2 = θ, conforme ilustrados na Figura 1. Assim, a posição da massa m é dada por






x = l sen(θ) cos(ϕ)


y = l sen(θ) sen(ϕ) (3)




z = −l cos(θ).

Derivando (3) temporalmente, obtemos



ẋ = l cos(θ) cos(ϕ)θ̇ − l sen(θ) sen(ϕ)ϕ̇






ẏ = l cos(θ) sen(ϕ)θ̇ − l sen(θ) cos(ϕ)ϕ̇



ż = l sen(θ)θ̇.

Calculemos as energias cinética e potencial, a fim de obter função lagrangiana associada


ao problema. Pois bem, a energia cinética é

1
m ẋ2 + ẏ2 + ż2

T =
2
1
= m[(l cos(θ) cos(ϕ)θ̇ − l sen(θ) sen(ϕ)ϕ̇)2
2
+(l cos(θ) sen(ϕ)θ̇ + l sen(θ) cos(ϕ)ϕ̇)2 + (l sen(θ)θ̇)2 ]
1 2 2 2 2 2
= m[l θ̇ + l ϕ̇ sen (θ)].
2

Já a energia potencial é dada pela fórmula

V = mgz,

onde z é a altura da massa m em relação à origem do espaço euclidiano (Figura 1) e g a acele-


ração gravitacional. Substituindo o valor de z na fórmula acima, temos que a energia potencial
do sistema é:
V = −mgl cos(θ).

Portanto, a lagrangiana do pêndulo esférico escreve-se

1
L(ϕ, θ,t) = T −V = m[l 2 θ̇2 + l 2 ϕ̇2 sen2 (θ)] + mgl cos(θ). (4)
2

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Como temos duas coordenadas generalizadas, teremos então duas equações de Lagrange.
Calculemos primeiro a equação de Lagrange referente a θ. Calculando as respectivas derivadas,
encontramos
∂L 1 2
= ml 2θ̇ = ml 2 θ̇,
∂θ̇ 2
enquanto que  
d ∂L d
ml 2 θ̇ = ml 2 θ̈.

= (5)
dt ∂θ̇ dt
Por fim,
∂L 1 2 2
= ml ϕ̇ 2 sen(θ) cos(θ) − mgl sen(θ)
∂θ 2 (6)
= ml 2 ϕ̇2 sen(θ) cos(θ) − mgl sen(θ).

Dessa maneira, por (5) e (6), a equação de Lagrange em θ fica


 
d ∂L ∂L
0= − = ml 2 θ̈ − ml 2 ϕ̇2 sen(θ) cos(θ) + mgl sen(θ)
dt ∂θ̇ ∂θ (7)
= ml 2 (θ̈ − ϕ̇2 sen(θ) cos(θ)) + mgl sen(θ),

ou equivalentemente,
g 
θ̈ + − ϕ̇2 cos(θ) sen(θ) = 0. (8)
l
Agora, encontremos a equação de Lagrange referente a ϕ. Note que

∂L
= 0, (9)
∂ϕ

pois a lagrangiana não depende de ϕ. Calculando as respectivas derivadas em ϕ̇, temos

∂L 1 2
= ml 2ϕ̇ sen2 (θ) = ml 2 ϕ̇ sen2 (θ). (10)
∂ϕ̇ 2

Derivando (10) em relação ao tempo, temos que


 
d ∂L
= ml 2 ϕ̈ sen2 (θ). (11)
dt ∂ϕ̇

Veja que em (11) não derivamos o seno, pois neste caso o ângulo θ é constante. Logo, por (9) e
(11), a equação de Lagrange referente a ϕ é
 
d ∂L ∂L
0= − = ml 2 ϕ̈ sen2 (θ). (12)
dt ∂ϕ̇ ∂ϕ
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Portanto, as equações de movimento do pêndulo esférico são:


g 
θ̈ + − ϕ̇2 cos(θ) sen(θ) = 0
l (13)
ml 2 ϕ̈ sen2 (θ) = 0.

4. Considerações finais

Para obtermos êxito na pesquisa, foram desenvolvidos estudos direcionados à mecânica


analítica, mais especificamente a mecânica lagrangiana. Nestes estudos, conseguimos compre-
ender o objetivo do matemático Lagrange ao desenvolver esta rica teoria, que foi tornar mais
simples o estudo da dinâmica de um sistema mecânico, referente ao que propôs Isaac Newton.

De posse da teoria necessária, pudemos formular o problema do pêndulo esférico e obter


suas equações de movimento, onde encontramos duas equações. Tais dependem explicitamente
dos ângulos que determinam as posições da massa m. Objetivamos, posteriormente fazer um
estudo acerca da estabilidade do sistema estudado.

Devemos também esclarecer que, apesar de ter uma importância significativa à mecânica
clássica, a mecânica lagrangiana possui também limitações e dificuldades. Por exemplo, as
equações obtidas na formulação lagrangiana são equações diferenciais de segunda ordem, que
são mais difíceis de obter suas soluções. Para suprir essa deficiência, no século XIX surge a
mecânica hamiltoniana, onde as equações obtidas são de primeira ordem e mais simples de
resolver.

5. Referências

BARBOSA, V. C., MORAES, P. C. G. Uma descrição newtoniana do movimento de um


pêndulo esférico. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 32, n. 3, 3307, fev. 2011.
Disponível em <https://www.scielo.br/j/rbef/a/v5rCXxmjhmpy7Dn36XM5rmy/>. Acesso em
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JÚNIOR, L. A. D. Cálculo variacional em mecânica analítica e teorema de liouville. 2018.


111 p. Dissertação (Mestrado Profissional) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro
de Ciências Físicas e Matemáticas, Programa de Pós-Graduação em Matemática Pura e
Aplicada, Florianópolis, 2018.
Anais da XXI Semana de Matemática 133
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ANAIS

LEMOS, N. Mecânica analítica. 2.e.d. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2007.

NETO, J. B. Mecânica newtoniana, lagrangiana e hamiltoniana. 1.ed. São Paulo: Editora


Livraria da Física, 2004.

SOLDOVIERI, C. T. Introducción a la Mecánica de Lagrange y Hamilton. 1era ed.


(preprint). República Bolivariana de Venezuela: La Universidad del Zulia, 2013.

VILLAR, A. S. Notas de Aula de Mecânica Clássica. Recife: Universidade Federal de


Pernambuco, Departamento de Física, 2014/2015. Disponível em:
http://fep.if.usp.br/ villar/2015mecanica1/mecclassica.pdf. Acesso em: 19 de julho de 2021.

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A Matemática e suas conexões com o Ensino
Fundamental e Médio
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ESTUDO ANALÍTICO DO PROBLEMA RESTRITO DOS TRÊS CORPOS

Clésio Carlos Souza Nascimento


Universidade Federal de Sergipe
Clesiocarlos.ufs@gmail.com

Prof. Dr. Gerson Cruz Araújo


Universidade Federal de Sergipe
crumusic@yahoo.com.br

Ortenilton dos Santos Filho


Universidade Federal de Sergipe
orteniltonfilho@gmail.com

Resumo:
O presente artigo acadêmico têm por objetivo estudar uma das configurações existentes para o Problema Restrito
de Três Corpos(PRTC). O problema Restrito dos Três Corpos consiste em descrever o movimento de um corpo de
massa infinitesimal, sujeito apenas a força gravitacional Newtoniana de outros dois corpos maciços. Na configu-
ração que estudaremos, os corpos maciços estão orbitando circularmente o centro de massa do sistema e o corpo
de massa infinitesimal está no mesmo plano orbital dos outros dois corpos. Esta configuração ainda estabelece que
os corpos maçiços estão com mesma velocidade angular ao orbitar o corpo de massa infinitesimal. Este problema
está relacionado à área de sistemas dinâmicos, mais precisamente está vinculado a mecânica celeste e a sistemas
hamiltonianos. Este problema é uma configuração de uma das restrições do problema de n corpos. Neste artigo
formularemos o PRTC, encontraremos as equações do movimento do corpo de massa infinitesimal, seus respecti-
vos pontos de equilíbrio e encontraremos também o sistema hamiltoniano relacionado as equações do movimento.
Palavras-chave: Problema Restrito dos Três Corpos; Pontos de Equilíbrio; Sistemas Hamiltonianos.

1 Introdução

A Mecânica Celeste é uma das mais antigas áreas da matemática, e também uma das
mais relevantes. Por seu aspecto genuíno e sua teoria sofisticada que pode ser aplicada su-
mariamente em fenômenos naturais, a Mecânica Celeste sempre foi alvo de muito estudo por
matemáticos. Hoje o estudo nesta área é tão amplo que abrange praticamente todos os ramos
da matemática, aceitando quaisquer dos enfoques matemáticos tanto em matemática pura como
em matemática aplicada. Alguns problemas específicos da Mecânica Celeste, por proporciona-
rem aos estudiosos do tema uma fartura teórica considerável, se eternizaram na área e recebem
o nome de problemas clássicos. Por exemplo, o problema de N corpos e suas restrições, mesmo
sendo um problema antigo, ainda hoje é objeto de muitos estudos.

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Até o início do século XX, as equações diferenciais ordinárias que apareciam nos pro-
blemas da Mecânica Celeste eram tratadas de forma quantitativa. Foi somente no início do
século XX com a publicação do livro Mèthodes Nouvelle dela Mécanique Céleste de Poincaré,
que foram introduzidos métodos qualitativos com o objetivo de descrever as órbitas no plano de
fase do problema. Após este ensaio, começou-se a estudar mais a fundo o problema, focando-se
mais no estudo de existência, estabilidade e bifurcação para soluções periódicas do problema
(Grande parte dos sistemas que se desejam estudar, são periódicos, como por exemplo órbitas
de planetas).

O Problema Restrito de Três Corpos, é um caso particular simplicado do Problema de


Três corpos. A restrição básica que dá nome ao problema, é que neste, um dos corpos têm massa
desprezível, perante outros dois corpos. Este problema é de grande relevância, pois tem muitas
aplicações, por exemplo o estudo do movimento de um satélite, sob influência gravitacional da
terra e da lua. Estudaremos nesse trabalho uma das inúmeras configurações existentes para o
problema.

O estudo do problema será feito tendo como base a teoria das equações diferenciais or-
dinárias, e nosso objetivo será formular todo o problema, e estudar principalmente os pontos de
equilíbrio das equações do movimento em sua forma reduzida. Através do sistema equações do
movimento, estudaremos um caso particular de sistemas de EDO’s, que é o sistema hamiltoni-
ano do problema, mais precisamente estudaremos o sistema correspondente linearizado.

2 Formulação do Problema

O problema de 3 corpos é um caso particular do problema de n-corpos, claro, quando


n = 3. Este problema não possui soluções explícitas para as equações do movimento dos corpos.
Podemos ver mais detalhado o problema de n corpos e sobre o problema de três corpos, nas
referências [1], [5] e [6]. Para tentar compreender o problema melhor, é estudado este problema
colocando algumas restrições sobre os corpos. O primeiro a fazer uma reformulação deste
problema e colocar algumas restrições foi Euller. Tempos depois, Henry Poincaré nomeou este
novo problema, gerado pelas restrições colocadas nos corpos, como Problema Restrito dos três
corpos(PRTC). Este problema consiste em 3 corpos m1 , m2 e m3 nos pontos materiais P1 , P2

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e P3 respectivamente, onde a única força atuante sobre os três corpos é a força gravitacional
Newtoniana que os corpos exercem entre si. As restrições que dão o nome ao problema são:

I A massa do terceiro corpo é considerada nula para o problema. Mas em suma tomamos
que m3 ≪ m1 e m3 ≪ m2 .

II As órbitas de m1 e m2 são círculos ao redor do centro de gravidade do sistema.

III O terceiro corpo se move no plano orbital dos corpos m1 e m2 .

Uma consequência imediata da restrição (III) é que o problema se torna planar, ou seja, saímos
de R3 para R2 . Uma consequência da restrição (I) é que o corpo m3 não exerce nenhuma força
gravitacional sobre os corpos m1 e m2 , uma vez que sua massa é muito pequena comparada
aos dois, logo o corpo não tem força para que sua gravidade exerça força aos outros corpos,
alterando assim os seus movimentos. A consequência que a restrição (II) nos oferece é que,
como as órbitas são circulares, teremos que a velocidade angular dos corpos é constante, pelo
fato do raio ser constante e a massa também.

Figura 1: Representação do problema de três corpos, tomando os corpos como sendo o sol, terra
e um asteróide
Fonte: Ilustração retirada de [4]

Sendo ri (t) a posição do corpo mi no instante e considerando as restrições que impomos


no problema, segue que as equações do movimento são

d 2 r1 (r1 − r2 )
2
= −K 2 m2 (1)
dt |r1 − r2 |3
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d 2 r2 (r2 − r1 )
2
= −K 2 m1 (2)
dt |r2 − r1 |3

d 2 r3 (r3 − r1 ) (r3 − r2 )
2
= −K 2 m1 3
− K 2 m2 . (3)
dt |r3 − r1 | |r3 − r1 |3

3 Descrevendo o problema matematicamente

Agora vamos fazer a formulação matemática do problema, para que possamos encontrar
as soluções do problema. Suponha que os raios das órbitas circulares dos corpos de massa
m1 e m2 são respectivmente α1 e α2 , e que a origem do sitema fique no centro de gravidade
do problema. O sistema atual é chamado sistema inercial, pois nele os eixos estão parados.
Estamos nomeando o sistema, pois logo mais consideraremos um sistema referencial sinoidal,
onde os eixos giram junto com os corpos m1 e m2 . Ainda no referencial inercial considere
r1 = (X1 ,Y1 ), r2 = (X2 ,Y2 ) e r3 = (X,Y ) as coordenadas dos corpos m1 , m2 e m3 , no sistema
inercial, definindo os pontos materiais P1 , P2 e P3 respectivamente.

Seja ω a velocidade angular dos corpos de massa m1 e m2 . As coordenadas dos corpos


maciços admitem a parametrização da circunferência, e daí as equações do movimento do corpo
m3 , tornam-se


 d2X 2 X − α1 cos(ωt) 2 m X + α2 cos(ωt)
 2 = −K m1 − K


3 2 3
dt r13 r23
2
d Y Y − α1 sen(ωt) Y + α2 sen(ωt)
2 − K 2 m2
 dt 2 = −K m1 ,


3 3

r13 r23

onde r13 = ||r1 − r3 || e r23 = ||r2 − r3 || são as distâncias de m3 aos corpos m1 e m2 respectiva-
mente.

A partir de agora vamos introduzir o sistema sinoidal. Neste sistema faremos com que
os eixos cartesianos girem com mesma velocidade angular que os corpos m1 e m2 . Para isso
basta fazer uma rotação continuada nos eixos e este método é feito colocando os elementos da
matriz de rotação dependendo do tempo também. Seja (→ −
q ,→
−r ) as coordenadas do corpo m no
3

sistema sinoidal. A relação entre as coordenadas do referencial inercial com as coordenadas do


sistema sinoidal é dada por

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X = qcos(ωt) − rsen(ωt)

(4)
Y = qsen(ωt) + rcos(ωt).

Como existe um isomorfismo entre os espaços vetoriais R2 e C, denote



Z = X + iY

z = q + ir

Com isto, as equações do movimento do corpo de massa infinitesimal tornam-se



 d2q 2 q − α1 2 q + α2 dr 2
 2 = −K m1 3 − K m2 3 + 2ω + qω


dt r13 r23 dt
2r (5)
d 2 r 2 r dq 2
 dt 2 = −K m1 r3 − K m2 r3 − 2ω dt + qω



13 23

O sistema de equações acima se refere as equações do movimento em coordenadas si-


noidais. O primeiro e segundo termos das igualdades se referem as forças gravitacionais, o
terceiro elemento das igualdades se refere a força centrífuga, e o quarto termo encontrado, se
refere a força de Coriolles. É possível encontrar mais detalhadamente a que se referem estas
forças em [1].

Por convenção assuma q = x e r = y, e admita a seguinte mudança de variáveis:

1. m = m1 + m2 = 1.

2. µ = µ2 = K 2 m2 e K 2 m1 = µ1 = 1 − µ.

3. A velocidade angular passa a ser tω = 1. Donde segue também que t = ω1 ; ω ̸= 0

Daí nossas equações do movimento ficam sendo



ẍ − 2ẏ = φx

(6)
ÿ + 2ẋ = φy

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no qual
x2 + y2 1 − µ µ
φ(x, y) = + + . (7)
2 r13 r23

4 Pontos de Equilíbrio

A partir de agora vamos trazer as soluções de equilíbrio das equações do movimento.


Para encontar estas soluções de equlíbrio, basta que encontremos os pontos críticos da função
φ(x, y). Neste problema, um ponto ser de equilíbrio significa que no referencial sinódico este
ponto estará estacionário, o que corresponde a este ponto está em trajetória circular no referen-
cial inercial.

O problema restrito de três corpos têm 5 pontos de equilíbrio no referencial sinódico L1


L2 , L3 , L4 e L5 , onde L1 , L2 e L3 são conhecidos como pontos de equilíbrio de Euller e L4 e L5
pontos de Lagrange. Estes pontos são

1. L1 (µ1 − ρ1 , 0), onde ρ1 é a raíz do polinômio


5 − (3 − µ )r 4 + (3 − 2µ )r 3 − µ r 2 + 2µ r − µ ;
P(r23 ) = r23 2 23 2 23 2 23 2 23 2

2. L2 (µ1 + ρ2 , 0), onde ρ2 é a raíz do polinômio


5 + (3 − µ )r 4 + (3 − 2µ )r 3 − µ r 2 − 2µ r − µ ;
P(r23 ) = r23 2 23 2 23 2 23 2 23 2

3. L3 (µ1 − ρ1 , 0), onde ρ1 é a raíz do polinômio


5 − (3 − µ )r 4 + (3 − 2µ )r 3 (µ − 2)r 2 + 2µ r − µ ;
P(r23 ) = r23 2 23 2 23 2 23 2 23 2
 √ 
1 3
4. L4 2 − µ2 , 2 ;
 √ 
5. L5 1
2 − µ2 , − 2 3 .

Prova:

Perante as condições 



µ1 + µ2 = 1,


2 = (x + µ )2 + y2 ,
r13
 2


 2
r = (x − µ1 )2 + y2 ,

23

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2 + µ r 2 = µ (x + µ )2 + µ y2 + µ (x − µ )2 + µ y2 . A menos de simetria aditiva


segue que µ1 r13 2 23 1 2 1 2 1 2

e rearranjo, temos
x2 + y2 = µ1 r13
2 2
+ µ2 r23 − µ1 µ2 . (8)

Substituindo (8) no valor da função φ em (7), temos

1 2 2
 µ1 µ2
φ(x, y) = µ1 r13 + µ2 r23 − µ1 µ2 + 2 + . (9)
2 r13 r23

Vamos substituir o novo valor de φ no sistema que tínhamos, ou seja, basta que encon-
tremos φx e φy para φ(x, y) descrita em (9) . Nosso propósito agora será encontrar os pares de
pontos (x, y) tais que:

    
−1 −1
µ1 2 + r13 r13 + µ2 2 + r23 x−µ
x+µ2 1
r23 = 0





 r13 r 23


    

 −1 y −1 y
µ1 2 + r13 r13 + µ2 2 + r23 r23 = 0.


r13 r23
   
−1 −1
Note que se tivermos 2
+ r13 = 2
+ r13 = 0 as equações serão satisfeitas. Por sua
r13 r13
vez,
 
−1  
+ r = 0

13 (x + µ2 )2 + y2 = 1
  

 r 2 
r13 = 1 

13

 
 

  
⇔ ⇔

   
 


 −1 
 
(x − µ1 )2 + y2 = 1.

+ r = 0 r = 1
  

 2 23  23
r23

Subtraindo no sistema de equações, a primeira da segunda equação, ficamos com (x +


µ2 )2 − (x − µ1 )2 = 0, donde segue de maneira imediata que x = 12 − µ2 . Substituindo o valor de

x encontrado em qualquer uma das equações que tinhamos, chegaremos que y = ±2 3 . Logo
 √ 
temos dois pontos (x, y) = 12 − µ2 , ±2 3 . Estes pontos são chamados de pontos de equilíbrio
triangulares de Lagrange, pois formam com o corpo P3 um triangulo equilátero e este triângulo
é mantido no referencial inercial, só que em um movimento giratório.

Por sua vez, podemos encontrar outros pontos tomando y = 0. Neste caso teremos que:

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−1 ∂r13 −1 ∂r23
µ1 2
+ r13 + µ2 2 + r23 =0 (10)
r13 ∂x r23 ∂x
∂r13 ∂r23 x+µ2 x−µ1
Como y = 0, então ∂x = ±1 e ∂x = ±1, equivalentemente, |x+µ2 | = ±1 e |x−µ1 | = ±1. Su-
pondo −µ2 < x < µ1 , então r13 = x + µ2 e r23 = µ1 − x. Destas igualdades tira-se que r13 + r23 =
1. Isolando r13 nesta igualdade e substituindo em 10, ficamos com o seguinte polinômio:

5 4 3 2
P(r23 ) = r23 − (3 − µ2 )r23 + (3 − 2µ2 )r23 − µ2 r23 + 2µ2 r23 − µ2 .

Como este polinômio é estritamente crescente e P(0)P(1) < 0 (nos diz que um dos dois é menor
que 0 e o outro maior que 0), então existe uma única raíz tal que P(r23 ) = 0 em (0, 1). Logo
esta raiz será ponto de equilíbrio.

Um segundo caso é fazer x > −µ2 e x > µ1 . Deste fato, da mesma forma que no primeiro
caso, encontraremos que r13 − r23 = 1. Isolando r13 e substituindo em (10), chegaremos no
seguinte polinômio

5 4 3 2
P(r23 ) = r23 + (3 − µ2 )r23 + (3 − 2µ2 )r23 − µ2 r23 − 2µ2 r23 − µ2 ,

onde temos que P(0) < 0 e P(+∞) > 0 (basta fazer o limite). Deste modo temos que o polinô-
mio adimite uma única raíz no intervalo (0, +∞).

Os demais casos são feitos analogamente.

O ponto de equlíbrio L1 é um ponto colinear de Euler. Este ponto é muito usado em


missões espaciais, por exemplo, o satélite de observação solar SOHO, está neste ponto desde
1995. O ponto de equilíbrio L2 é um ótimo lugar par a observação do universo, e por isto nele
está localizado hoje o observatório PLANCK (ESA). O ponto L3 , por estar distante da terra,
nunca foi muito usado. Os pontos L4 e L5 são os únicos pontos ditos estáveis, e neles orbitam
cerca de 2 milhões de asteróides, cujos diâmetros podem chegar a 1 quilômetro. A definição e
várias informações sobre estabilidade, pode ser encontradas em [4].

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Figura 2: Ilustração da posição dos pontos de equilíbrio. Ilustração retirada de [1]

5 Sistema Hamiltoniano

Nesta seção encontraremos o sistema Hamiltoniano, ele é de fundamental importância,


para um futuro estudo da natureza das soluções de equilíbrio, assim como também da estabili-
dade do sistema. Tínhamos que 
ẍ − 2ẏ = φx

(11)
ÿ + 2ẋ = φy

Admita a mudança de variáveis ẋ = u e ẏ = v. Ficaremos então com o seguinte sistema





ẋ = u



ẏ = v

u̇ = φx + 2v







v̇ = φ − 2u.

y

Note que o que fizemos faz parte da formulação hamiltoniana. Transformamos um sistema
com duas EDO’s de segunda ordem, em um sistema com quatro EDO’s de primeira ordem. O

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sistema pode ser reescrito da seguinte forma


    
ẋ 0 0 1 0 −φx − 2v
    
0 1   −φy + 2u
    
 ẏ   0 0 
 =   = J∇H(x, y, u, v), (12)
 u̇   −1 0
    
0 0  u 
    
v̇ 0 −1 0 0 v

J é conhecida como matriz canônica simplética e ∇H é o gradiente de H. Como temos


o gradiente de H, vamos então encontrar a função Hamiltoniana H. Temos que




Hx = −φx − 2v



Hy = −φy + 2u

(13)
H =u


 u





H = v.
v

Para encontrar H, integremos a primeira equação de (13) em relação à variável x, e obtemos

H(x, y, u, v) = −φ(x, y) − 2vx + G(y, u, v). (14)

Derivando o que encontramos (14) em relação à variável y e igualando ao que tínhamos na


segunda equação de (13), encontramos o valor de G(y, u, v) = 2uy + K(u, v). Substituindo em
(14), temos
H(x, y, u, v) = −φ(x, y) − 2vx + 2uy + K(u, v). (15)

Derivando o que encontramos (15) em relação à variável u e igualando ao que tínhamos na


2
terceira equação de (13), encontramos o valor de K(u, v) = −2uy + u2 + F(v). Substituindo em
(15), temos
u2
H(x, y, u, v) = −φ(x, y) − 2vx + + F(v). (16)
2
Fazendo o mesmo processo feito nas duas últimas etapas, agora com a variável v, encontraremos
2
F(v) = 2vx + v2 . Desta forma, o hamiltoniano em coordenadas sinoidais será:

u2 v2
H(x, y, u, v) = −φ(x, y) + + . (17)
2 2

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Este é o Sistema Hamiltoniano não-linear. Agora linearizaremos H em torno do ponto


de equilíbrio. Para tal considere a expansão

H = H(Li ) + ∇H(Li )(Z − Li ) + D2 H(Li )(Z − Li )2 + ...

Assim, temos que H = D2 H(Li )(Z − Li )2 + O((Z − Li )3 ) é a parte linearizada do sistema


Hamiltoniano e este pode ser escrito na forma

Ż = JD2 HZ

onde D2 H(Li ) é uma matriz simétrica e J é a matriz canônica simplética e ainda temos que

1
H = Z T D2 HZ
2

é a função hamiltoniana linear.

A função hamiltoniana linearizada é importante para um possível estudo da natureza


dos pontos de equilíbrio, este estudo está ligado ao plano de fase das soluções do problema.
Este estudo é importante também para a descrição da estabilidade de cada um dos pontos de
equilíbrio, pois esta, é feita a partir dos autovalores da matriz Hamiltoniana linearizada, que no
caso é a matriz Hessiana.

6 Considerações finais

O foco principal deste trabalho foi descrever o problema restrito dos três corpos de
forma simplificada, trazendo resultados principais e curiosidades sobre o tema. Os resultados
encontrados, principalmente os pontos de equilíbrio, são de grande valia no nosso dia a dia,
pois como citamos, colocar satélites em órbita, que hoje é essencial para o desenvolvimento da
humanidade, requer muitas vezes este estudo dos pontos de equilíbrio.

O proceder do trabalho foi feito usando a teoria qualitativa das equações diferenciais
ordinárias, juntamente com resultados de álgebra linear e variáveis complexas. No trabalho,

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fizemos uma rotação contínua dos eixos, que passaram a girar junto com as massas pontuais,
e isto foi de grande importância. Temos que entender então que os pontos de equilíbrio que
encontramos, estão fixos com respeito ao sistema sinoidal, porém para o sistema original, os
pontos de equilíbrio estão girando, ou seja, orbitando o centro de massa.

É importante salientar que os resultados foram obtidos em termos de variáveis comple-


xas. Porém note que, podemos simplismente voltar para o problema original, pois como R2
é isomorfo a C, exite uma função bijetiva que relaciona os dois espaços, ou seja, existe uma
função invertível que leva cada ponto de C para R2 .

Referências

[1] PINTO, D. M. C Estabilidade do Problema de Três Corpos Restrito. Dissertação de


mestrado- Universidade do Minho. Gualtar. 2006.

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no Estudo do Movimento dos Astros do Sistema Solar.

[3] VIDAL,C. Curso de Equações Diferenciais ordinárias, 2004. (Notas de aula).

[4] CABRAL, H. E. Notas de aula: Complemento ao livro do Markeev.

[5] CABRAL, H. E. and DIAS BRANDÃO, L. F. M. Normal Forms for Hamiltonian


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[6] MARKEEV, A. P Pontos de equilíbrio em mecânica celeste e cosmodinâmica. Tradu-


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[7] ARNOLD, A. I. Small divisor problems in classical and celestial mecanics. Russ.
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[8] MARANHÃO, D. L Estudi del flux d’un problema restringit de quatre cossos. Tese de
Doutorado- Universitat Autònoma de Barcelona. Barcelona. 1995.

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