Você está na página 1de 2

COMENTÁRIOS SOBRE O TEXTO

O MODELO TRIPARTITE DE SEMIOLOGIA MUSICAL – Jean-Jacques Nattiez

Na primeira das oito partes que compõem o texto, Nattiez esclarece as razões de seu subtítulo “A
semiologia não existe” ao explicar que “o signo está por toda parte” (p.8). Tal situação resultará
inevitavelmente em muitos e diversificados horizontes epistemológicos, sendo utópica a busca por
uma ciência universal. Desta forma, como afirma Nattiez (p.10), as teorias semiológicas ora se
completam, se contradizem, ou se ignoram, restando ao pesquisador a tarefa de criar pontes entre as
diferentes teorias por ele utilizadas. O próprio Nattiez, em sua proposta de semiologia aplicada à
música, exemplifica tal tarefa ao adotar a concepção tripartite de Jean Molino, ancorando-a à noção
de signo de Charles Sanders Pierce.

Entretanto, segundo o autor (p.10), é objeto comum da semiologia (mesmo neste contexto
“babilônico”) a noção de Forma Simbólica, por ser toda produção humana manifesta sob uma Forma
carregada de significações, sendo, portanto, Simbólica. Estas significações se produzem não só
naqueles que deixaram para trás estes vestígios formais, mas também em todos os que perceberam
tais vestígios. Por essa capacidade remissiva, as Formas Simbólicas se caracterizam como signos. Sob
esta perspectiva, o autor argumenta sua concepção pierceana, de signo que remete ao seu objeto por
uma cadeia infinita de significantes, em detrimento da concepção linguística, de Ferdinand de
Sassaure, que propõe uma união entre um significado a um significante. Por tal universalidade do
fenômeno de significação, além da noção de tal noção de signo, vêm, ao mesmo tempo, fundadas
tanto a semiologia quanto a hermenêutica (diferenciando-as, a grosso modo, a natureza mais
formalmente delimitada e sistemática da primeira). Nesse sentido, emissor e receptor não estão
atados a um mesmo grupo de significações (intencionais ou não para o primeiro), revelando, assim, a
sua opção pela concepção tripartite de Molino que apresenta três dimensões paradigmáticas da forma
simbólica: sua dimensão poética, focada nas significações do emissor; estésica, em busca das várias
significações por parte dos receptores; e uma última dimensão que diz respeito a forma (ou, melhor,
seus vestígios materiais) em si, em decorrência da observação de suas características imanentes. É o
chamado nível neutro. Enquanto esta última dimensão se preocupa em descrever tais vestígios em
suas formas e estruturas, as dimensões estésica e poiética se preocupam em interpretar os processos
de percepção e produção, respectivamente. Ao estudar de tal forma o funcionamento das formas
simbólicas, a semiologia, mais uma vez, difere da linguística por não ser uma ciência da comunicação.

Estas formam as considerações do autor nas duas outras partes que se seguiram. Em seguida, na
quarta, quinta e sexta partes do texto, Nattiez, ao se voltar definitivamente para o campo da música,
apresenta aquilo que ele mesmo chama de “as seis grandes situações da análise musical”. Ao aplicar
o modelo tripartite da semiologia como ferramenta de análise musical, o autor observa a obra em
suas remissões de cunho poiético indutivo, ao tentar revelar as intenções do composicionais do
criador-emissor, e estésico, e também, indutivo, que busca elaborar hipóteses sobre como a obra é
percebida; fica a cargo da análise estésica externa a observação da percepção dos ouvintes, enquanto
a análise poiética externa se valerá dos documentos deixados pelo criador que poderão, por sua vez,
fundamentar os resultados da análise poiética indutiva; a análise do nível neutro, configurando outra
dentre estas seis situações de análise, nível este que muitas vezes embasará as outras situações de
análise, se preocupará com a matéria em si, as características imanentes da obra longe de suas demais
significações; a última, ainda um tanto enigmática, corresponderá “a comunicação musical
propriamente dita” (p.20). Nattiez ressalta a natureza metalinguística da análise ao ressaltar a posição
do analista, em seu discurso que se dirige aos três diferentes níveis, que se encontra em posição
inevitavelmente estésica em relação à obra estudada. O autor também comenta o importante papel
desempenhado pela partitura no contexto da tradição ocidental que, segundo Nattiez, seria ela a
maior responsável pela apresentação das ideias do compositor, comentário um tanto quanto
complicado frente ao estado tecnológico atual. Na sequência do artigo, em seus dois últimos
subtítulos, Nattiez propõe a aplicação de um modelo de análise que abarque estas seis situações,
analisando La Cathédrale Engloutie de Claude Debussy.

Você também pode gostar