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Artigo 25

Ética e sociedade tecnológica segundo


a filosofia de Ortega y Gasset

Ethics and technological society according to


philosophy of Ortega y Gasset

Prof. Dr. Arlindo Ferreira GONÇALVES JR.


Faculdade de Filosofia – PUC-Campinas
Resumo

Trata de explorar a filosofia de Ortega y Gasset, em particular nos escritos em que expõe suas considerações sobre a noção da
técnica, e sua crítica à sociedade de massas. Parte-se da idéia de homem como programa vital e da técnica como sua realização
ética. O ponto central para compreendermos o processo de desmoralização que a cultura sofre com as transformações
tecnológicas se baseia na idéia de “crise dos desejos”.
Palavras-chaves
Palavras-chaves: técnica, ética, Ortega y Gasset, raciovitalismo.

Abstract

It treats to explore the philosophy of Ortega y Gasset, in particular in the writings where it displays its considerations on the
notion of the technique, and its critical one to the society of masses. It has been broken of the idea of man as vital program
and of the technique as its ethical accomplishment. The central point to understand the demoralization process that the culture
suffers with the technological transformations if bases on the idea of “crisis of the desires”.
Keywords
Keywords: technique, ethics, Ortega y Gasset, raciovitalism.
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Introdução que expõe suas considerações acerca da técnica,


e demonstrar como tal reflexão, radicada no plano
Pretendemos abordar o tema da técnica e ontológico da vida humana, assinala para a neces-
tecnologia na obra do filósofo espanhol Ortega y sidade de um humanismo ético como fundamento
Gasset, identificando suas implicações éticas para para a sociedade tecnológica. A noção de
a sociedade contemporânea. Suas considerações à humanismo tecnológico emerge na identificação do
cultura tecnológica o faz figurar como um dos au- homem com a técnica, ou seja, da vida humana
tores que se destacam no plano da crítica, seja como fabricação de si mesma. É neste sentido que
pela abordagem, seja pela atualidade. Neste sen- a técnica, segundo a interpretação orteguiana, está
tido objetiva-se recuperar e analisar os argumentos associada à existência humana e, portanto, ao
de Ortega y Gasset, em particular nas obras em “si-mesmo”. O homem moderno – entendido aqui

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como ocidental – não tem claro seu “si-mesmo” e doras da matéria, visando atender de forma siste-
falta-lhe imaginação para inventar o argumento ori- mática a um determinado fim. Não obstante
ginário de sua própria existência. Este niilismo dra- corresponder aos conceitos de método e de arte
mático evidencia uma crise na qual este conjunto (ars) - como já assinalava Aristóteles ao contrapor
de atos específicos humanos chamados “técnica”, os saberes teorético e o prático ao da poiésis, e
perde seu caráter de meio de realização assumin- indicar que este último refere-se a produção artifi-
do um fim em si mesmo, se sobrepondo ao próprio cial - a especificidade da técnica decorre desta
programa vital. Pode-se dizer que a descaracteri- ser uma “atividade prática enquanto utiliza uma
zação ou o distanciamento que se impõe entre o ou mais leis naturais, de modo que a verificação
homem/sociedade e a técnica/tecnologia produzi- destas valha como resultado da própria ativida-
da, recai precisamente na perda de auto-compre- de” (VITA, 1963, p. XVI). Corresponde por
ensão. Suas análises seguem tendo vigência, sobre- conseguinte à uma dimensão humana em forma de
tudo nas considerações acerca da “sobrenatureza” atributo procedimental de realização sobre a pró-
e das necessidades artificiais – categorias que inte- pria natureza não de forma desinteressada como a
gram a atual sociedade da informação. Bem como, epistême e tão pouco da mera experiência volitiva.
seu exame suscita uma discussão entre a transforma- A expressão “ars mechanica” tomou lugar
ção tecnológica da própria cultura ocasionada pelo já na idade média substituindo o sentido grego do
que denominou de “crise dos desejos”. Deste modo termo, o que instaurou um significado particular
buscaremos demonstrar que as “meditações” em referente à “técnica”. Porém, os primórdios da
torno ao tema da técnica são pertinentes para a reflexão da técnica estão na idade moderna com a
compreensão das problemáticas geradas pela Encyclopédie francesa (MORA, 2001, p 2821),
“desumanização” da sociedade tecnológica con- pois foi o momento em que se aliou a noção de
temporânea. técnica mecânica à ciência originando o que seria
considerado posteriormente de tecnologia em sen-
Na primeira parte faremos uma breve apro- tido amplo. O advento e evolução técnica como
ximação ao tema da técnica/tecnologia especifi- meio de realização e princípio da ciência, trouxe
cando suas implicações éticas, bem como sua rela- à luz uma questão que se mostrou fundamental na
ção com a sociedade. Na segunda parte apresen- sua constituição como produto das realizações
taremos a noção da técnica à luz do pensamento humanas: a alienação. Neste sentido acentuam-se
de Ortega y Gasset, seus argumentos e pressupos- as relações de dependência e subordinação, to-
tos, expostos na obra “Meditación de la técni- mando-lhe o lugar autêntico de sujeito criador, e
ca”. Na terceira parte será analisada a concepção impondo uma nova noção de desenvolvimento que
de ciência, esta compreendida como forma avan- prevalece para o homem moderno.
çada da técnica moderna, e seu reflexo na socie- Associada a própria formação direta do
dade contemporânea. Abordaremos de modo sis- processo civilizatório, o “mito” da técnica é for-
temático as seguintes obras de Ortega y Gasset: mulado como a própria emancipação do homem
“Rebelión de las masas”; “En torno a Galileu”. em relação à natureza, possibilitando o advento
antropológico do homo sapiens, e o desenvolvi-
1. Aproximação preliminar do concei- mento da racionalidade. No que se refere à sua
to de técnica: compreensão e análise, pode-se associar o concei-
A.F. GONÇALVES JR.

to de técnica a diferentes áreas tais como as pró-


O termo grego te chné corresponde ao “sa-
techné prias ciências sociais e econômicas.
ber fazer” ou “ofício” que envolve um conjunto de Se a técnica para o homem contemporâneo
habilidades, de atividades criadoras e manipula- está associada intrinsecamente à ciência, como re-

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sultado de um processo que se desenvolveu desde É por meio da abordagem filosófica que a
o século XVII somando o racionalismo, o método identificamos como o uso apropriado da projeção
científico, e as determinações econômicas da pro- intelectiva a fim de sublevar-se frente à espontanei-
dução capitalista, cabe ressaltar as problemáticas dade, ou seja, enquanto um caractere humano que
provenientes dessa conjugação. Sobre essa gênese exterioriza intenções valorativas. O escopo dos
Edgar Morin ressalta a relação entre a técnica de atos técnico visa a realização autêntica do homem,
manipulação e o desenvolvimento das ciências que deve ser, neste sentido, ético. A concepção
experimentais que se estabelecem em um único da técnica na tradição moderna como simples meio
processo: “o método experimental é um método de realização resultou na insubsistente descaracte-
de manipulação, que necessita cada vez mais de rização e dissolução desta como detentora de
técnicas, que permitem cada vez mais manipula- moralidade, e a alijou da constituição humana. E
ções”. (2001, p. 56) este é o problema que se apresenta efetivo na filo-
São particularmente duas as áreas da filoso- sofia contemporânea, a saber, a conciliação da téc-
fia que se ocupam com as consequências trazidas nica e da ciência como expressão humanista.
ao homem e à natureza do que pode-se chamar de
tecnociência ou simplesmente tecnologia: a ética
e a epistemologia. Dentre os questionamentos po- 2. A ontologia da técnica segundo
dem-se assinalar aqueles que buscam a compreen- Ortega
são da dinâmica própria da ação científica para
conciliá-la com a ética: a ação científica é etica- Porque tivesse pressentido a problemati-
mente neutra? Ao se basear em fatos, tem a ciên- zação que viria a ser recorrente iniciada na segun-
cia de comprometer-se com valores? O juízo mo- da metade do século XX, e com propriedade cres-
ral pode ter uma justificação científica? Dentre es- cente nos tempos atuais, Ortega y Gasset nos ofe-
tes se destacam os que assinalam para a relação rece uma reflexão original sobre o conceito da téc-
entre evolução científica e progresso moral, uma nica, sobretudo quando a fundamenta a partir da
vez que expressam cada vez mais na história con- realidade radical da vida humana. Anteviu em
temporânea uma tensão dialética porém necessá- particular a necessidade de redefinir-se, posto seu
ria, como indica Dominique Janicaud1: distanciamento promovido pela inserção desmesu-
Cada novo progresso técnico, pensan- rada da ciência, tornando-a artificial a ponto de
do bem, é inelutável, é também porta- não oferecer ao homem a possibilidade de reco-
dor de resistências humanas, e o papel nhecer-se naqueles que se fazem os meios para que
a cultura, se ela tem um sentido, é dar coexista com as circunstâncias e suas necessidades.
voz a esse protesto, sem se deter forço- A técnica, imbricada com a noção de desenvolvi-
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samente no que ela tem de mais regressi- mento, postulada como tecnologia no Ocidente
vo, mas permitindo aos homens expres- contemporâneo se sobrepõe como fim em si mes-
sar esses problemas que, com muita fre- ma, sobre-humana. Em torno das vicissitudes da
qüência, não dominam nem entendem. técnica é que a obra orteguiana contribui com gran-
Não se pode e não se deve imaginar de mérito e atualidade, enquanto crítica à socie-
uma humanidade [...] que seja adapta- dade tecnológica.
da a todo instante a todo progresso téc- Intitulada “Meditação da Técnica”, base-
nico. (In: SCHEPS, 1996, p. 211) ada em um curso apresentado no ano de 1933
(1)
Professor na Universidade de Nice e diretor do Centre de Recherche d´Histoire des Idées, é autor de importantes obras que destacam as críticas
filosóficas das tecnociências, como: La puissance du rationnel (1985); Les pouvoirs de la science (1987); Des techniques à la technoscience
(1991).

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na Universidade de Verão de Santander2, por oca- do “sentir frio” como ameaça de aniquilamento.
sião de sua inauguração, é a obra onde encontra- O que determina o conjunto de ações que resul-
mos o tema da técnica mais amplamente trabalha- tem no fato de se evitar o “sentir frio”, é, em últi-
do à luz do pressuposto ontológico raciovitalista, ma instância, a própria necessidade de viver. A
e que passamos agora a apresentar. explicação recorrente para esta necessidade de
O que é a técnica? Com a problemática afirmação do ser está na noção de instinto de so-
definida, sugere Ortega y Gasset o método de brevivência, que é contraposta dada sua insufi-
sucessivas aproximações para sua compreensão, ciência. A noção de instinto, segundo Ortega, além
sendo que a primeira delas parte de um plano de ser imprecisa, não pode ser aplicada à homem
ontológico e pretende estabelecer sua relação es- de forma integral, já que este é governado por
trutural com as noções de necessidade e natureza. outras dimensões. Assim, ao criticar o argumento
Busca caracteriza-la como um modo peculiar do do determinismo instintivo – de apelo mecanicista
repertório humano assinalando-a como um conjun- e biologista – Ortega reitera a postura raciovitalista,
to de quefazeres específicos. e assinala a necessidade de conduzir a discussão
para a especificidade humana, donde a noção de
O tema da necessidade constitui para instinto perde seu posto na medida em que o ho-
Ortega y Gasset a primeira via para compreensão mem dispõe de sua natureza, mesmo que factível,
stricto sensu da idéia de técnica. Em seu sentido e não o contrário. Definido o campo de reflexão,
vital, a necessidade se apresenta como impulso cabe fixar à priori a idéia de que o homem se em-
primordial que mobiliza a vontade na sua orienta- penha em viver, ou seja, a opção em estar vivo
ção objetal. Este truísmo migratório se dirige à cir- estaria já implícita.
cunstância e exige um procedimento específico na
sua interpelação, que se origina em um plano refle- Uma necessidade conduz à outra no per-
xivo e se executa de forma transformadora sobre a curso de sua satisfação, o que define um conjunto
de necessidades que exige, por sua vez, um reper-
natureza. A natureza é concebida em termos
tório de atividades com as quais o homem deve
orteguianos como circunstância, ou seja, o não eu,
dispor. As necessidades e satisfações humanas de-
que se impõe como a realidade para a qual con-
vem ser compreendidas na sua relação de condi-
verge minha necessidade. A técnica, ao transfor-
ção natural para aquele viver. Sobre esta condição
mar a natureza, ou seja, a circunstância, também
natural, explica Ortega: “o homem reconhece esta
transforma o homem, posto sua constituição de
necessidade material ou objetiva e porque a reco-
coexistência mútua: “eu sou eu e minha circunstân-
nhece a sente subjetivamente como necessidade.
cia”. Quando se demonstra como “circunstância Mas note-se que esta sua necessidade é puramen-
negativa, ou seja, enquanto fonte que afeta a ple- te condicional” (1977, p. 8-9). Nesta perspec-
nitude da condição vital, exige do sujeito sua afir- tiva o autor indica um substrato anterior às necessi-
mação sobre tal realidade. O que determina a dades, e pelo qual deve ser um fim último, guiado
necessidade de intervenção à esta circunstância? por um ato de vontade, que é o próprio viver,
Por que existe a não indiferença à necessidade que como conclui: “este viver é, pois a necessidade
se apresenta? Ortega y Gasset exemplifica esta originária de que todas as demais são meras conse-
disposição da realidade, enquanto hostil, no evento qüências [...] A vida – necessidade das necessi-
A.F. GONÇALVES JR.

(2)
Posteriormente a estes escritos somaram-se artigos no periódico La Nación de Buenos Aires, de abril a outubro de 1935. Segundo Molinuevo,
obteve-se finalmente um livro em 1939 “ante lalbor pirata de los editores de Chile, que recortaban esos artículos dándolos en forma de libro.
Paulino Garagorri antepuso la Introducción al Curso para la edición de El Arquero (7ª Ed., 1977) que no aparece en las Obras Completas .
Tenemos un original manuscrito de las lecciones, los artículos en La Nación, y la edición de Ortega de 1939 en genérico Ensimismamiento y
alteración, que añade un cierre final del escrito” (2000, p. 06).

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dades – é necessária apenas num sentido subjetivo mem da capacidade de transcender à circunstân-
simplesmente porque o homem decide autocrati- cia em que está submerso, pelo seu ensimesma-
camente viver” (1977, p. 9). mento, em um plano em que novos repertórios de
Certos repertórios de necessidades e de quefazeres são projetados sobre a natureza para
atividades do homem se assemelham a dos ani- remodela-la em função das necessidades. Os men-
mais – aqueles que se orientem pelo uso de recur- cionados repertórios que preenchem estas finalida-
sos já presentes e estão em função de satisfações des compõem-se dos chamados “atos técnicos”, e
diretas. Não obstante, o homem é o único capa seu conjunto é que define a própria técnica, que
de inventar condições quando estas não se encon- pode ser compreendida, conforme Ortega:
tram como possibilidades, e para isso produz fa- como a reforma que o homem impõe à
zeres específicos com o escopo de transformação natureza em vista da satisfação de suas
do dado circunstancial. O animal dispõe unica- necessidades. Estas, vimos, eram impo-
mente de um repertório primitivo de fazeres que o sições da natureza ao homem. O ho-
limita frente às imposições da natureza e que o mem responde impondo por sua vez uma
encerra nas necessidades biológicas. A existência mudança à natureza. É, pois a técnica,
do animal, segundo o autor, “não é mais que o a reação enérgica contra a natureza ou
sistema dessas necessidades elementares que cha- circunstância que leva a criar entre esta
mamos orgânicas ou biológicas e o sistema de atos e o homem uma nova natureza posta sobre
que as satisfazem” (1977, p. 11). As conside- aquela, uma sobrenatureza. (1977, p.
rações que nos põe em contato com a compreen- 14)
são do universo dos recursos de satisfação do ani- Salienta-se a identificação da técnica como
mal, são aqui de fundamental importância por ser reforma ou reinvenção, e neste sentido não pode
o ponto de partida da reflexão que constitui a ser esgotada como meio de satisfação direta das
criatividade humana principalmente no que tange necessidades; ou seja, a técnica não se refere a
a dois pressupostos: a noção imperativa da vida e adaptação do homem ao ambiente que provoca
a determinação da natureza. O primeiro demarca suas necessidades, mas a imposição ao meio de
o horizonte estritamente fisiológico do conceito da converter-se ao sujeito. É, antes de tudo, um modo
vida, e cabe lembrar que tal concepção permeia de ser do homem condicionado pela circunstân-
os fundamentos das teorias materialistas cia.
mecanicistas, e é precisamente destas posições que
Ortega quer se distanciar quando propõe o A técnica humana associa-se a outra espé-
constructo teórico da vida humana – posicionando- cie de necessidades, fora àquelas que são exigidas
para o viver biológico. É o caso das necessidades
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-se, assim, notoriamente contra os reducionismos


supérfluas, em que a natureza é adaptada em fun-
que caracterizam as primeiras décadas do séc. XX.
ção da necessidade fundamental do homem que
Quanto ao segundo pressuposto, o autor indica
se suplanta ao mero estar aí, mas necessita “estar-
que é precisamente na relação com a natureza (ou
bem”. Ortega utiliza o exemplo do estado da
circunstância), no dado que pré existe e com a
embriaguez e as diversas manifestações artísticas para
qual minha vida se encontra, que aquilo que é
mostrar como, através da técnica, o homem bus-
estritamente humano se revela, ou seja, a capaci- cou atender à uma necessidade sobretudo prazerosa
dade de recria-la. e não utilitária. É supérfluo estar bem, mas para o
A vida humana, portanto não se esgota nas homem é a sua necessidade fundamental, é a “ne-
suas condições objetivas e conseqüentemente das cessidade das necessidades” (1977, p. 20). Isso
necessidades que delas emergem. Dispõe o ho- é demonstrado no empenho do homem em não

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apenas sobreviver, mas viver possibilitado pela pro- sempre para o bem. Posto que muitas
dução do supérfluo pela técnica. Portanto, somente modalidades de sobrenatureza formam
neste sentido, pode-se estabelecer a relação da parte de nossa circunstância, o homem
técnica como via de realização de necessidades, contemporâneo se sente mais dominado
quando estas sejam objetivamente supérfluas e que pela tecnologia que pela natureza.
estejam em função do bem estar. (ECHEVERRÍA, 2000, p. 20)
Com esta análise, encontra Ortega uma Se a técnica, como vimos, exige esta refor-
abordagem original ao tema que até então não fora ma na natureza, cabe precisar ainda mais a finali-
estabelecido, ou seja, o vínculo entre as noções dade de sua ação. Segundo Ortega y Gasset, em
de homem, técnica e necessidade, sendo esta com- última instância, “a técnica é, assim o esforço para
preendida segundo os termos supracitados. A partir poupar esforço ou, em outras palavras é o que fa-
dessas considerações é que podemos identificar o zemos para evitar por completo, ou em parte, as
objeto à qual se orienta a técnica como algo dinâ- canceiras que a circunstância primeiramente nos
mico e histórico, o que a torna algo dinâmico e impõe” (1977, p. 31). A complexidade da
variável, conforme o perfil daquilo que pretende afirmação de que a técnica é um esforço para “pou-
realizar. par esforço”, que a princípio nos parece parado-
xal, está em demonstrar qual o fim que se espera
As criações de necessidades que acomete
com aquilo que fica disponível, ou seja, o que foi
o homem, a fim de produzir objetos artificiais, bem
poupado. É dado problemático por se tratar de
como técnicas para sua satisfação, são mobilizadas
uma condição sine qua non do homem a constante
conforme o próprio desenvolvimento das civiliza-
ocupação do viver. Este seria o momento da
ções, de acordo com suas “narrativas biográficas”.
transcendência da vida orgânica, como conclui
Na sociedade contemporânea estas necessidades
Ortega y Gasset:
adquirem seu horizonte específico, relacionando
-se às novas tecnologias da informação e co- No vão que a superação de sua vida
municação, que constituiriam uma nova circunstân- animal deixa, dedica-se o homem a uma
cia, conforme discute Javier Echeverría, em seu ar- série de tarefas não biológicas que lhe
tigo “Sobrenaturaleza de la información: la são impostas pela natureza, que ele in-
Meditación de la técnica a finales del siglo XX”3. venta para si mesmo. E precisamente a
Neste o autor utiliza-se de conceitos raciovitalistas essa vida inventada, inventada como se
para interpretar a sociedade informatizada, trazendo inventa um romance ou uma peça de
à luz a atualidade da obra orteguiana. No mundo teatro, é ao que o homem chama de vida
contemporâneo, segundo o autor: humana, bem-estar” (1977, p. 33).
nos circundam diversas modalidades de Uma discussão antecede a questão da téc-
sobrenatureza que suscitam em nós ne- nica caso se queira um incursão radical na sua de-
cessidades cada vez mais artificiais [...] finição. Segundo o próprio Ortega y Gasset toda
o problema atual consiste em dominar, a problematização quanto à noção de técnica será
ou ao menos controlar, as sobrenaturezas superficial se não a compreendermos a partir da
geradas pelas ações tecnológicas [...] a perspectiva humana, e neste sentido o ponto ini-
novidade principal do século XX con- cial deva ser precisamente o esclarecimento quan-
A.F. GONÇALVES JR.

siste em que a tecnologia transforma a to a relação estrutural entre o humano e a natureza.


sociedade, não só a natureza, e nem Nesta relação encontraremos revelado o fenômeno
(3)
ECHEVERRÍA, Javier. Sobrenaturaleza y sociedad de la información. Revista de Occidente , Madrid, n. 228, mayo 2000, p. 19-32.

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da técnica como fazer necessariamente humano. O como se sabe, numa mera pretensão de ser, num
homem se encontra no mundo, e esta é sua condi- projeto de vida” (1977, p. 38). Pode-se iden-
ção inevitável que nos leva a três possibilidades tificar aquela extranaturalidade com o conceito
de interpretação em função das facilidades ou di- atual de “virtual” como mostra Molinuevo:
ficuldades que emergem dessa relação: na primeira o mundo da possibilidade, que vai além
o homem disporia apenas de facilidades da natu- da realidade e das formas tradicionais
reza, sendo assim não encontraria obstáculos para de ocupar-se com ela, é o do virtual [...]
sua satisfação, o homem seria uma extensão do é o mundo da metáfora. Como é sabi-
mundo; na segunda interpretação, de forma con- do, a metáfora é para Ortega um modo
trária a anterior, a natureza não ofereceria senão de conhecimento que sobrepõe os limi-
impedimentos à realização do homem, portanto tes do conhecimento científico e é tam-
uma relação adversa e conflituosa; na terceira pos- bém um modo de ser,esse mundo do vir-
sibilidade de interpretação haveria a presença das tual como mundo em que tudo é possí-
duas anteriores, e definiria o contato do homem vel, e finalmente é um modo de existir,
com o mundo de forma complexa e dramática. o da existência metafórica. (2000, p.
Nesta “terceira via”, encontra Ortega y Gasset, a 17)
própria definição para o humano: “este fenômeno
fundamental, talvez o mais fundamental de to- Aportamos, assim, na ontologia antropoló-
dos – isto é, que nosso existir consiste em estar gica orteguiana que define o atributo essencial do
rodeado tanto de facilidades como de dificulda- homem, ou seja, aquele que está a vir-a-ser, em
des – dá seu especial caráter ontológico à realida- contrapartida daquilo que é natural e que não está
de que chamamos vida humana, ao ser do homem” projetado para o futuro, pois já o é; e que se con-
(1977, p. 37). figura como um conjunto de imposições que ora
facilitam, ora dificultam a realização do programa
Este sistema de facilidade/dificuldade que vital quando interpretadas à luz da pretensão hu-
alicerça a relação com a natureza não define a pró- mana.
pria existência, mas seus indicativos à priori. Se o
homem é forçado a relacionar-se com a natureza Tem o homem a necessidade radical de atuar
ou circunstância, o faz a partir de suas possibilida- sobre a circunstância, o que significa dizer que su-
des abstratas e não de realidades prévias. Estas põe que irá produzir-se a si mesmo, ou então,
serão produzidas e conquistadas no momento do “autofabricar-se”, num esforço continuado de vir a
encontro e confronto com o mundo, instante em ser aquilo inventado. Na dimensão humana deste
que o homem executa o seu projeto vital e faz a si fazer/fabricar-se é que é definida a relação profun-
próprio. Esta condição primeira que estipula a vi- da do homem com a técnica: “o homem, na pró-
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gência do existir humano o diferencia da natureza pria raiz de sua essência, encontra-se, antes que
a qual está submerso, e ao mesmo tempo guarda em qualquer outra, na situação do técnico”
sua possibilidade de transcendência. Deste modo (1977, p. 44), diz Ortega y Gasset, que ou-
tem o homem conferida sua dupla condição, por torga à noção desta o próprio fundamento do agir
um lado é parte da natureza, por outro, é extra humano.
natureza. Nestes termos é que Ortega y Gasset
define o homem como sendo um “centauro A técnica refere-se a autofabricação do
ontológico”, e explica: “o que tem de natural se próprio homem, cumpre esta exigência primária
realiza por si mesmo/: não lhe é problema [...] deste imperativo em suas especificações vitais de
Ao contrário, sua porção extranatural não é, evi- constante quefazer, e neste sentido sua atuação
dentemente e sem mais, realizada, já que consiste, exige um plano prospectivo. Sob esta condição

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que o agir autêntico encontrará o solo para sua da realização do ser. Contrapõe-se, deste modo,
construção, absorvendo e transformando a nature- à perspectiva de compreensão da técnica como
za, incluindo-a neste encontro como ente junto à fim em si mesma, e a situa como um “procedimen-
vida humana. Através deste encontro necessário to” utilizada pelo homem, que é seu inventor e
do homem com a natureza, aquele exalta sobre seu objetivo. Cabe mencionar que esta invenção in-
esta um desígnio extranatural pela técnica, como clui com ingrediente que a determina a própria reali-
bem assinala Ortega y Gasset: dade histórica, daí ser reconfigurada em cada época.
O fato absoluto, puro fenômeno do uni- Se a técnica, com visto, é entendida aqui
verso que é a técnica, somente pode dar- como instrumento que o homem se utiliza para re-
-se nessa estranha, patética, dramática alizar suas necessidades – inventadas no plano
combinação metafísica de que dois en- imaginário ou associadas a um núcleo primário de
tes heterogêneos – o homem e o mun- satisfações diretas – é mister a reflexão em torno a
do – sejam obrigados a unificar-se, de relação estabelecida com o desejo. Em outras pa-
modo que um deles, o homem, consiga lavras, o problema passa a gravitar sobre a seguinte
inserir seu ser extramundano no outro, que questão: Qual o desejo fundamental e autêntico a
é precisamente o mundo. Esse proble- qual a técnica servirá como via de atualização?
ma, quase de engenharia, á a existência Para esta análise o autor propõe um método
humana” (1977, p. 46-47). hermenêutico, e buscará o significado profundo do
próprio ato de desejar associado, como se encon-
A teoria orteguiana nos remete à uma con- tra, ao seu objeto.
cepção de homem fundada na idéia de obra, e
para isso se utiliza de expressões como: “constru- Os desejos estão associados ao ser inaliená-
ção”; “engenharia”; “fabricação”. A vida huma- vel do homem, estão intimamente relacionados
na, neste sentido, é projeto arquitetônico, e seu àquilo projetado pelo homem, logo são dinâmi-
telos é a escultura de si – objeto de arte, da techné, cos, variáveis, e se dão em função do si-mesmo.
imbricada com um conjunto de intenções imaginá- Este si-mesmo a realizar, é por excelência o objeto
rias, poéticas4. No horizonte de realização da vida do desejo. Em última análise, o desejo é para efe-
humana surge a técnica na instância da execução. tivar o si-mesmo, para realiza-lo, e “quando al-
Se ela se define como o recurso para a atualização guém é incapaz de desejar-se a si mesmo, porque
do programa vital, é portanto, posterior a este, não tem claro um si-mesmo que realizar, é evidente
como nos lembra Ortega y Gasset: “Ela [a técni- que não tem senão pseudo-desejos, espectros de
ca] por si não define o programa; quero dizer que apetites sem sinceridade nem vigor” (1977, p. 48).
a técnica lhe é prefixada a finalidade que ela deve Neste ponto Ortega y Gasset consagra sua argu-
conseguir. O programa vital é pré-técnico” mentação e fundamenta sua crítica à sociedade
(1977, p. 47). tecnocrática, identificando na raiz do auto conhe-
cimento, na identidade mesma do homem, a pro-
Á luz da argumentação exposta, podemos
blemática que se torna manifesta pela desorienta-
conceber a exata noção de como Ortega conduz
ção de finalidade que lastreia o agir técnico, como
a temática a um plano humanístico. Observando a
demonstra na seguinte passagem:
sociedade de seu tempo, em que o progresso é
definido como sintoma da evolução da técnica e Talvez a doença básica de nosso tempo
A.F. GONÇALVES JR.

sobreposição à natureza, o autor redimensiona a seja uma crise dos desejos e por isso toda
realidade e posiciona a vida humana ponto fulcral a fabulosa potencialidade de nossa téc-
(4)
Sobre este aspecto fundamental que caracteriza a vida humana como atividade “artística”, soube explorar perfeitamente uma de suas continuadoras
da Escola de Madrid, María Zambrano.

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Artigo 33

nica parece como se não nos servisse de de onde a inteligência funciona a serviço
nada [...] o homem atual não sabe o de uma imaginação, não técnica, mas cria-
que ser, falta-lhe imaginação para inven- dora de projetos vitais, pode constituir-se
tar o argumento de sua própria vida” a capacidade técnica (1977, p. 69).
(1977, p. 48-49). Não há uma técnica exclusiva e paradigmá-
A técnica se entrelaça no modo de ser do tica, que carregue um sentido ideal de eficácia, no
homem, está a seu serviço. Modo de ser variável sentido em que esta deverá estar subordinada
na sua essência e criado por cada qual, cujas insta- àquilo que a precede. Não obstante, existem téc-
lações o determinam vetorialmente no espaço e nicas que têm possibilidades de corresponder ou
tempo. Um tipo concreto e paradigmático, apre- não ao sentido último de realização posto por di-
sentado como exemplo daquele que se projeta de ferentes orientações. Ao tecer esta conclusão,
forma extranatural para atender ao apelo de seu Ortega tem o objetivo expresso de evidenciar sua
modo de ser é o gentleman. Ortega y Gasset o vê crítica à adesão massificada ao modelo de técnica
como produto histórico, a partir do desdobramen- “euro-norte-americana”, vigente e hegemônico,
to da aristocracia, e detentor da capacidade de contra o qual defende a relativização de seus pro-
exercer múltiplas formas práticas de conquista de cedimentos e objetivos em função do projeto hu-
vida. Tais formas práticas se referem às atividades mano específico.
lúdicas e desportivas, que se desvinculam da rela- Para uma compreensão mais integral do de-
ção de satisfação imediata que a natureza pode senvolvimento da técnica e seu significado na
oferecer.
genealogia humana, Ortega nos oferece um
Aquele é um exemplo concreto da capaci- mapeamento “antropológico”, dividindo-a histo-
dade técnica “nominal”, ou seja, orientada e deli- ricamente em estádios de evolução, a saber: a téc-
berada por um plano criador e pessoal, no qual nica do acaso; a técnica do artesão; a técnica do
utiliza-se a inteligência para sua realização. Cabe técnico, os quais passamos a descreve-los.
notar que a noção de inteligência está vinculada à
idéia de técnica, sobretudo quando associamos A técnica do acaso é pertencente aos gru-
esta como recurso inventado para satisfação de pos primitivos. Não é percebida como ação téc-
necessidades - nesta perspectiva a inteligência hu- nica propriamente dita, ou seja, possuidora de
mana se faria comum ante as dos animais, que no- capacidade de transformação a partir de um obje-
toriamente não participam desta mesma categoria. tivo prévio, mas por outro lado, é assumida como
A inteligência não traz em si o fim de um procedi- um evento natural. O conjunto de atos técnicos é
mento técnico, mas é via de operação que está em aceito como pertencente ao repertório das ações
naturais fixas neste estádio da técnica. Além dis-
ÉTICA E SOCIEDADE TECNOLÓGICA SEGUNDO A...

função daquilo que a precede, ou seja, um proje-


to delineador vital inventivo, como nos mostra so, é exercida de maneira coletiva, não havendo
assim a relação de peculiaridade da figura do es-
Ortega y Gasset:
pecialista - salvo a divisão das atividades em gê-
a inteligência, por mais vigorosa que seja, nero, nas quais mulheres ou homens têm sua
não pode tirar de si mesma sua própria especificidade. Porém o que mais caracteriza este
direção; não pode, portanto, chegar a estádio é a incapacidade do homem sentir-se in-
verdadeiros descobrimentos técnicos. Ela, ventor, homo faber. Significa dizer que ao homem
por si, não sabe quais, entre as infinitas primitivo lhe escapa a noção de prospecção, e
possibilidades que se pode “inventar”, sua técnica/acaso adquire uma relação estreita com
convêm preferir, e se perde em suas infini- a magia, pois surge à revelia de suas intenções para
tas possibilidades. Somente numa entida- depois se estabelecer como hábito.

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No segundo estádio de evolução encon- quina, ao contrário, passa o instrumento para o


tra-se a técnica como artesanato. Situada na anti- primeiro plano e não é ele quem ajuda ao homem,
ga Grécia, Roma pré-imperial, e no período me- mas ao contrário: o homem é quem simplesmente
dieval, tem como característica a tomada de cons- ajuda e suplementa a máquina” (1977, p. 82).
ciência da especificidade das ações técnicas, po- A marca radical deste estádio, vigente na
rém identificando-as com o próprio homem que a primeira parte do século XX na Europa, é a noção
efetua, ou seja, o artesão. Nesta sobreposição da intrínseca de “ilimitação” da técnica. Neste senti-
técnica e de seu artífice, aquela se encontra como do, a crença se deposita na idéia de que a técni-
que fixada na natureza mesma deste. Ademais, ca não é mais um recurso dado que se confunde
ainda não dispõe da consciência da técnica na com a própria natureza - como no caso entre os
sua função de invenção projetiva, pelo fato de se primitivos - e, tampouco, que ela se identifica com
prender na tradição e na reprodução daquilo que o próprio executor, apresentado na figura do arte-
já está consolidado, como pauta para suas realiza- são, mas via de criação ilimitada. O que se, de
ções técnicas. O bom artesão é o que melhor man- pronto pareceria algo emancipador, mostrou-se
têm intactos esses preceitos de reprodução, e o paradoxalmente como um problema, no qual o
faz através de instrumentos que não atuam por si homem passou a ter dificuldade de definir-se, como
mesmo, como é o caso das máquinas que viriam salienta Ortega: “[...] o homem está hoje, em seu
caracterizar o próximo estádio. O artesão também âmago, atordoado precisamente pela consciência
se caracteriza pelo fato de concentrar de forma de sua principal ilimitação. E talvez isso contribui
unívoca os papéis de inventor e executor, sendo que para que já não se saiba quem é - porque ao achar-
nesta divisão encerra-se a ação técnica apenas na pri- -se, em princípio, capaz de ser tudo o que é
meira instância, enquanto a segunda seria designada imaginável, já não sabe que é o que efetivamente
pelo “operário”. Esta dissociação, bem como o é” (1977, p. 82). Aqui começa o niilismo, na
advento da máquina é um dos fatores que possibili- medida em que o homem aliena-se na crença
tam a projeção para o estádio da técnica do técni- infindável no que a técnica pode lhe proporcio-
co. nar, como conclui:
O estádio da técnica do técnico é marca- [...] a técnica, ao aparecer por um lado
do sobretudo pela consciência que este assume como capacidade, em princípio ilimita-
frente àquela, ou seja, que é um conjunto de recur- da, faz que ao homem, posto a viver de
so não fixo e que está em função de um projeto, e fé na técnica e somente nela, fique com
que se mostra ilimitada. Cabe mencionar que esta sua vida vazia. Porque ser técnico e so-
consciência está atrelada à própria imagem do
mente técnico é poder ser tudo e, con-
homem liberal moderno, e da perspectiva histórica
seqüentemente, não ser nada determina-
em que se encontra travestida da noção de pro-
do.[...] Por isso estes anos em que vi-
gresso material e racional. O advento da máqui-
vemos, os mais intensamente técnicos que
na - séc. XIX com o tear de Robert -, como menci-
houve na história humana, são dos mais
onado, redireciona a posição do homem como pro-
vazios. (1977, p. 85)
tagonista da técnica, ao mesmo tempo em que lhe
possibilita a consciência de seus limites, demar- O estádio do homem contemporâneo, con-
cando assim a transição do estádio da técnica como diz a um modo de ser que, quando relacionado
A.F. GONÇALVES JR.

techné, como nos assinala Ortega: “No artesanato com a natureza suplantada pela técnica, o incapa-
o utensílio ou ferramenta é somente suplemento do cita de discernir aquilo que é resultado de trans-
homem. Este, portanto o homem com seus atos ‘na- formação. O invólucro da natureza se prende em
turais’, continua sendo o ator principal. Na má- seu tecido e o homem não a percebe, a sobrena-

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tureza se torna natureza. O conceito de Deste modo esta forma de tecnicismo nasce junta-
sobrenatureza implica em uma reflexão cujo objeto mente com a ciência moderna, seu parentesco é
incide precisamente nas conseqüências do uso da estreito e se dá no confronto com a matéria. Inter-
técnica. A circunstância em forma de objetos cria- pelação pragmática, e que se alicerça na produti-
dos pela técnica, que já não provoca admiração, vidade e quantificação. Contra essa tendência,
mostra-se como “uma primeira paisagem artificial sugere Ortega o seguinte: “[...] a vida humana
tão espessa que oculta a natureza primária atrás não é somente luta com a matéria, é também lua
dele, [e o homem] tenderá a acreditar que, como do homem com sua alma. Que quadro pode a
esta, tudo aquilo está aí por si mesmo”(1977, p. Euramérica [sic] opor a esse como repertório de
88). O resultado, assinala Ortega, é a possibili- técnicas da alma? [...]” (1977, p. 100).
dade de perda da consciência desta realidade As discussões trazidas pelas “meditações”
como algo modificado pela técnica - uma aproxi- orteguianas relacionadas à técnica teriam vigência
mação comprometedora com a própria perspecti- em uma sociedade tecnológica informatizada como
va do homem primitivo sobre a natureza. É o para- assinala José Luis Molinuevo, em seu artigo
doxo em que a técnica promove, a liberdade so- intitulado “Ortega y la posibilidad de un
bre a necessidade desencadeando a negação da humanismo tecnológico”. Neste o autor sustenta
consciência. No encontro desta sublevação do que o principal ponto de convergência da teoria
técnico em detrimento do humano, dá-se ainda o orteguiana com a problemática atual relacionada à
fenômeno da máquina como atributo em si mesma, tecnologia, reside na concepção da própria reali-
como afirma: “a máquina abandona em última ins- dade, quando esta é definida em termos
tância o homem, artesão. Não é já o utensílio que prospectivos, conforme assinala: “esta inserção que
auxilia ao homem, mas ao contrário: o homem fica faz Ortega da técnica em um projeto vital pre-
reduzido a auxiliar a máquina”(1977, p. 89). técnico, o da vida como possibilidade, significa
No processo de “modernização” dos está- situarmos na que é a categoria central das novas
dios, a técnica submete-se à condição da inven- tecnologias: a realidade como possibilidade”
ção. Para se inventar há de se dispor da técnica a (MOLINUEVO, 2000, p. 08). Decorrem des-
priori, e isso conduz ao tecnicismo, ou seja “o te pressuposto algumas conseqüências que tornam
método intelectual que opera na criação técnica” a abordagem orteguiana atual na leitura da socie-
(1977, p. 90). Ao analisar a expressão tecnicis- dade tecnológica: a idéia de que a circunstância
mo, em particular em sua versão moderna diferente artificializada assume um caráter de sobrenatureza,
de suas formas anteriores, Ortega considera sua ou seja, um simulacro, e com este mundo recriado -
aparição radicada na mesma matriz em que surgiu virtual - é que o homem coexiste; a relação da técni-
ÉTICA E SOCIEDADE TECNOLÓGICA SEGUNDO A...

a física, e no renascimento adquire perfil definiti- ca com o desejo, que manifesta a determinação emo-
vo. Trata-se, antes de tudo, de um comportamen- cional na produção racional; a relação da técnica
to em que o homem esgota-se na dimensão do com o plano estético, no sentido em que o telos
ofício. Cabe lembrar do apogeu das Escolas de do bem-estar ocupa a prioridade sobre a realida-
Ofício no século XV, e de sua valorização como de. Também se pode identificar na análise sobre a
modo de credenciamento social, para aqueles - so- “técnica do técnico”(como já mencionado, o es-
bretudo filhos da alta burguesia - distantes da educa- tádio do homem moderno), elementos que expõem
ção das “letras”. O chamado “homem de oficina” a crise humanista contemporânea frente as novas
é, sobre vários aspectos aquele inventor que opera tecnologias, como bem mostra Molinuevo:
sobre a natureza como seu artífice, posto crer ser O ponto de partida é o estádio da “téc-
conhecedor de sua estrutura - mecânica - última. nica do técnico”, em que o mundo, a

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natureza ou a circunstância não têm um é para Ortega aquele que se contrapõe à vida
caráter físico, mas que são campos prag- nobre – no sentido moral -, e se apresenta sob três
máticos, um conjunto de possibilidades faces: o homem-satisfeito; o jovem mimado, e o
ou de dificuldades, em que as coisas não bárbaro especialista . Todos como manifestações
são res, mas pragmata, ou seja, coisas não resultantes da combinação da técnica moderna com
feitas mas sendo, fazendo-se, por fazer. Esta a democracia liberal, assim como, expressão da
dialética entre possibilidade e realidade crise histórica. Para nosso propósito nos deteremos
é o suporte das novas tecnologias. na figura do bárbaro especialista para buscar iden-
(2000, p. 16) tifica-lo com o técnico anti-humanista esboçado
no item anterior.
3. A ciência e a crise histórica: os O homem-massa é resultado da civilização
do século XIX, e a forma como fora produzido é
“bárbaros especialistas”
tema do capítulo XII da Rebelião das massas ,
intitulado: “A barbárie do ‘especialismo’”. Neste
A preocupação com a temática da ciência
tópico encontram-se importantes considerações
é recorrente no pensamento de Ortega desde a
sobre o tema da técnica, enfatizando a científica,
sua primeira estadia na Alemanha, período em que
e sua relação com a ocorrência do homem-massa.
estudara com Wundt, em Leipzig, e demonstrou
interesse por fisiologia e matemática, bem como, De acordo com Ortega y Gasset “a técnica
posteriormente em Marburgo, no ambiente contemporânea nasce da copulação entre o capi-
neokantista. As principais obras que abordam a talismo e a ciência experimental” (1957, p.
ciência a partir do enfoque histórico-sistemático 163). Está se referindo à técnica científica,
fazem parte da segunda navegação, e datam da estabelecida em solo europeu, associada à idéia
década de quarenta, particularmente Em torno a de progresso ilimitado e de constante evolução.
Galileu (1940) e A Idéia de princípio em Em função desta modalidade técnica juntamente
Leibniz (1946). Porém o problema aparece abor- com a democracia liberal do século XIX, pôde a
dado já em 1929, à luz de elementos da razão população européia crescer quantitativamente como
histórica, na obra Rebelião das massas, em espe- nunca em sua história e deflagrar o fenômeno do
cial na reflexão sobre o advento do homem da homem-massa. Porém o conceito não se limita ao
ciência chamado de bárbaro especialista – protó- aspecto quantitativo, ou sobre determinada classe
tipo daquele que posteriormente será explorado social, mas antes a uma disposição do homem pe-
como o tecnocrata -, e os desdobramentos de sua rante a vida. Um determinado homem de ciência
intervenção no contexto social e político. se destaca neste panorama como protagonista de
O conteúdo de Rebelião das massas, já um “poder legítimo”. Ortega y Gasset nos põe
havia sido traçado em obras como Espanha claro, por meio de indagações sucessivas e paten-
invertebrada, O homem na defensiva, e em A tes, a origem do sujeito desse poder:
desumanização da arte. Textos em que podemos Quem exerce hoje o poder social?
encontrar traços de sua crítica ao homem moderno Quem impõe a estrutura de seu espírito
emergente que se caracteriza por uma peculiar re- na época? Sem dúvida, a burguesia.
lação com o paradigma de inautenticidade e re- Quem dentro dessa burguesia, é consi-
A.F. GONÇALVES JR.

presenta o “invasor bárbaro”. A obra tem o fito de derado como o grupo superior, como a
explorar as conseqüências na Europa ocidental aristocracia do presente? Sem dúvida,
ocorridas com o predomínio do homem-massa. o técnico: engenheiro, médico, financis-
Conceito de muita controvérsia, o homem-massa, ta, professor, etc., etc., Quem dentro

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do grupo técnico, o representa com rar seu conhecimento específico do todo; a tercei-
maior altitude e pureza? Sem dúvida, o ra geração, na última década, terá enfim o homem
homem de ciência. (1957, p. 164) especialista. Esse “tipo de científico”, e que per-
O homem de ciência configura-se como o tence à classe de poder, é aquele que esgotará seu
modelo mais exato do homem-massa, e isso ocorre conhecimento a uma pequena parcela da realida-
automaticamente em função da própria estrutura e de, defendo que o contrário, ou seja, o saber inte-
dinâmica da ciência ocidental, que “faz dele um gral, está descompassado com a sua “verdadeira”
primitivo, um bárbaro moderno” (ORTEGA Y função, criando assim uma hierarquia valorativa que
GASSET, 1957, p. 165). consagra a imagem do especialista. Este é o pano-
rama e a consolidação histórica a que chegamos
Em um breve escorço histórico sobre a ciên- por definitivo no início do século XX. Esse pro-
cia experimental, o autor nos lembra que sua ori- cesso foi e é possível segundo o autor pelo seguin-
gem se deu precisamente com Galileu, sua consti- te:
tuição com Newton, e seu desenvolvimento em
meados do século XVIII, e insiste na distinção en- A ciência experimental progrediu em
tre a constituição e o seu desenvolvimento. Aque- boa parte à mercê do trabalho de ho-
la é caracterizada por integrar e unificar saberes e mens fabulosamente medíocres, e ainda
técnicas, enquanto este, o desenvolvimento, tem menos que medíocres. Isto é, que a ci-
de peculiar a necessidade de especialização da- ência moderna, raiz e símbolo da civili-
queles que produzem e operam a ciência. Note- zação atual, dá acolhida dentro de si
se que Ortega y Gasset distingue a ciência de ao homem intelectualmente médio e lhe
seus agentes e salienta que o progresso dessa não permite operar com bom êxito. A razão
inclui a sua fragmentação em campos intelectuais disso está no que é, igualmente, vanta-
mais exíguos: “Para progredir, a ciência necessita- gem maior e perigo máximo da ciência
va que os homens de ciência se especializassem. nova e de toda a civilização que esta
dirige e representa: a mecanização. [...]
Os homens de ciência, não ela mesma. A ciência
a firmeza e exatidão dos métodos per-
não é especialista. Ipso facto deixaria de ser ver-
mitem esta transitória e prática desarti-
dadeira. [...] Mas o trabalho nela sim tem - irre-
culação do saber. Trabalha-se com um
mediavelmente - que ser especializado” (ORTEGA
desses métodos como uma máquina, e
Y GASSET, 1957, p. 165-166). Essa distin- nem sequer é forçoso para obter abun-
ção se faz importante para a compreensão da ori- dantes resultados possuir idéias rigoro-
gem e modus operandi dos atos técnicos da ciên- sas sobre o sentido e fundamento deles.
cia, e de como seu processo de desenvolvimento
ÉTICA E SOCIEDADE TECNOLÓGICA SEGUNDO A...

(ORTEGA Y GASSET, 1957, p.


torna cada vez mais afastado o universo de conhe- 167)
cimento especializado da própria cultura em sen-
tido amplo. O especialista, portanto, categoria ímpar
na história, é integrante de uma classe de homens
A Europa do século XIX é o palco do de- que concentra o dualismo do saber qualificado,
senvolvimento da noção de especialização. Ortega específico, porém, desenraizado e desconectado
y Gasset, dividindo este período em três gerações, do todo, o que resulta em radical ignorância e
sintetiza da seguinte maneira seu decurso: seu iní- primitivismo. O que é mais danoso, e que irá de
cio se dá quando o homem civilizado é identifica- fato torná-lo homem-massa, não é a especialização
do à figura do enciclopédico; na segunda geração em si, mas antes, a satisfação e valorização desta
aquele sujeito detentor de saberes começa a sepa- limitação; bem como, o comportamento “legiti-

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mado” pelo status de sua condição, para emitir da à luz da ontologia da técnica, indicaria sobre-
juízos sobre questões que verdadeiramente igno- tudo o ideal de eticidade, como nos mostra: “O
ram, sem a consciência de sua efetiva incompetên- gentleman é o exemplar no que se engendra a
cia, posta sua indisposição à submissão. Neste virtuosidade do técnico como jogo limpo, isto é,
contexto, os especialistas, como adverte Ortega y como apoderamento do supérfluo conduzido pelo
Gasset: “simbolizam e em grande parte constitu- imperativo de não mentir. Este ethos da sincerida-
em, o império atual das massas, e sua barbárie é a de reduz as leis a um minimum dado o nível de
causa mais imediata da desmoralização européia” autoexigência imposto” (2001, p. 220). Mes-
(1957, p. 169). mo que Ortega não tenha esgotado na idéia do
A relação entre ética e técnica, predomi- homem nobre o exemplo de moralidade, a não ser
nante em Meditação da técnica e Rebelião das como contraponto ao homem-massa, o que se des-
massas, se converge na noção de crise do desejo, taca é o seu pessimismo quanto ao fetichismo da
conforme o exame de Pedro Luis Moro Esteban5. técnica e o anulamento da vida. Mediante essa
Esse tema encontra lugar central nestas duas obras crise, que em última instância é da própria defini-
ao expressar a impossibilidade paradoxal do ho- ção de homem, o autor aponta para um humanismo
mem contemporâneo de desejar autenticamente. estético, concluindo que:
O desejo nihilista, irresoluto e atônito do homem Se fosse possível um novo humanismo
que se situa nas primeiras décadas do século XX chamado a preencher esses vazios have-
em uma Europa despersonalizada, com figuras que ria de acontecer por imprimir a ilusão no
representam cada mais o naufrágio perante o seu desejo, de modo que o possibilismo
quefazer vital. Segundo Moro Esteban nas duas [sic] característico de nossa atual circuns-
obras orteguianas supracitadas, pode-se perceber tância possa ser dirimido através de uma
a tese de que: racionalidade cordial. Isto é, através de
o homem médio procedeu a naturalizar uma razão na que o desejo se nutra da
aquilo que por contrário é produto da imaginação e fantasia, a partir de uma
técnica; ou seja, de sua sobrenatureza e sensibilidade que permita levar as coi-
de sua perícia como construtor de sas a sua plenitude [...] a atitude esté-
tecnologia. Portanto, esse mesmo homem tica precisa de uma atitude técnica ca-
indócil à imaginação que o humaniza e paz de lavar até sua realização aquele
à razão histórica que conserva critica- desejo de plenitude originário. (2001,
mente o legado da memória, se vê inse- p. 221).
rido a uma pseudo-estética: a de consu-
midor passivo [...]. (2001, p. 218) Considerações finais
Ainda conforme Moro Esteban em Medi-
tação da técnica, Ortega teria consagrado o tipo Ortega y Gasset nos traz á luz um trata-
humano que desenhara em 1929, e que teria ca- mento atual sobre a temática da técnica para o
racterísticas da vida nobre, por ora indicada como mundo contemporâneo quando assinala para a
a atitude do gentleman, isto é, o reverso do ho- desumanização da cultura tecnológica. Por meio
mem-massa. Segundo o autor essa tipologia da de uma reflexão genealógica, buscando compre-
A.F. GONÇALVES JR.

nobreza do espírito jovial, marcada pela discipli- ender a técnica como um elemento que compõe a
na e reconhecimento dos deveres, quando refleti- própria dimensão humana na via de realização do
(5)
La crisis de las masas a la luz de meditación de la técnica. Revista de Estudios Orteguianos , Madrid, n. 02, 2001, p. 215-222.

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programa vital, o autor recupera o seu sentido éti- técnica. Revista de Estudios Orteguianos. Madrid, n.
co. Nos toca em particular o aspecto da concep- 02, p. 215-222, mayo de 2001.
ção de homem como ser “inventivo” e dramático, ORTEGA Y GASSET, José. Meditación de la técnica:
e nesta condição, a própria idéia de realização y otros ensayos. 7. ed. Madrid: Revista de Occidente,
reorienta o significado de realidade. Suas análises 1977.
que levam à tona a crise dos desejos resultam em
. Meditação da técnica: vicisitudes das
uma sóbria e pessimista caracterização do homem
ciencias, cacofonia na física. Trad. e prólogo de Luis
moderno, e adverte para a ausência de humanismo,
Washington Vita. RJ: Ibero Americano, 1963.
um humanismo vital e histórico.
. Meditações do Quixote. São Paulo:
Livro Ibero-Americano, 1967.
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Madrid, n. 228, p. 33-52, mayo de 2000. Ibero-Americano, 1961.

MOLINUEVO, José Luis. Ortega y la posibilidad de QUINTANILLA, Miguel A. La tecnología como


un humanismo tecnológico. Revista de Occidente . paradigma de acción racional. Revista de Occidente.
Madrid, n. 228, p. 5-18, mayo de 2000. Madrid, n. 228, p. 53-74, mayo de 2000.
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ÉTICA E SOCIEDADE TECNOLÓGICA SEGUNDO A...

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