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à flor da pele

poesias Selecionadas

walter teixeira
à flor da pele
poesias selecionadas

walter alberto pantoja teixeira


Walter Alberto Pantoja Teixeira
à flor da pele - poesias selecionadas
Direitos Autorais Reservados
Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil
2008
___________________________________________

Edição: Walter Alberto Pantoja Teixeira

Design Gráfico: Walter Alberto Pantoja Teixeira

Fotos: Fernanda

Revisão: João Reguffe

Wteixeira
Dedicatória I

À Fernanda, que, mesmo nas adversidades,


nunca deixou faltar um suave sorriso em seu rosto...
e assim a gente vai sendo feliz devagarinho.
Dedicatória II

Aos meus pais, que, como mágica, descobriram


a arte de envelhecer juntos.
Como disse o poeta: “...e pela estrada afora, de mãos
dadas, vamos vivendo desse amor velhinho”.
Âmago

Tênue foi aquele olhar, aquele beijo


e aquelas palavras naquela tarde de inverno...
Faltou um olhar mais voraz, um beijo mais doce,
palavras mais silenciosas.
Eu queria um silêncio mais revelador,
um momento mais íntimo - mais próximo -
uma fragrância mais suave,
uma bebida mais amarga,
- um paradoxo -
e uma justificativa não tão óbvia...
que não deixasse rastros segmentados do nosso amor
na unanimidade do nosso silêncio resignado.

6
À flor da pele

Um brinde à insensatez! Sem ela


não existiriam essas paixões avassaladoras
que nos fazem navegar num oceano
de sonhos e de ilusões.
Eu só preciso de uma tarde para ser feliz...
nada além de uma tarde,
nada além de você...
mas eu preciso de uma noite inteira para sonhar
e deixar que a poesia invada a alma
e faça morada - eterna morada -
e me desperte com um beijo seu no amanhecer.

7
A tua espera
(ou eterna espera)

Eu não tenho vergonha em dizer que te amo...


e que às vezes fico triste por te amar...
e que esse amor é como um perfume que eu não toco,
que eu não vejo, mas que eu sinto espalhado pelo ar.

Não confundas a minha tristeza com essas tristezas frias


que andam por aí... cheias de lágrima e de dor.
Eu te confesso: não é assim!
Talvez melhor não tocar, não ver... apenas sentir!

Vou deixar o meu amor sentado no banco de uma praça,


a tua espera... afinal de contas, os amores mais sublimes
que eu conheço começaram no banco de uma praça.

E que a solidão, eterna companheira dos corações apaixonados,


fique velhinha junto com meu amor, eternamente sentada
no banco de uma praça.

8
Após o amor

Entre o sossego destas ruas vazias


desfolho as pétalas dos teus segredos,
e tudo é chuva que a tua alma decanta
gotejando na pele poesias adormecidas.

O tempo desdobra-se em instantes...


no ar, o teu perfume
e uma música triste vinda da harpa
de um anjo solitário.

No espelho do quarto os teus lábios refletidos,


a espera do beijo da despedida.
Fácil é trocar palavras...
difícil é compreender o silêncio.

9
Amanhã

Uma lágrima perdida


rola pela face da noite nua...
e nas ruas, folhas de outono caídas
e um vulto de mulher numa esquina fria.

As ruas se fazem estreitas,


vazias e solitárias...
e uma lacuna parece existir
entre o tempo e o espaço.

No cais, somente um barco solitário


esperando a hora de partir,
e o soprar de um vento triste
virando as páginas do livro... do livro da vida.

Hoje uma chuva fina lentamente cai


molhando as calçadas da velha cidade...
despertando as sementes adormecidas na terra,
deixando um aroma de saudades antecipadas de você amanhã.

10
Adormecer
(enquanto as tuas mãos adormecem...)

Removo agora da terra árida


as sementes que não germinaram...
enxugo as lágrimas da face
que ainda não caíram...
fecho as janelas pra não entrar o sol
e deixo as minhas manhãs
e as minhas noites
morrerem longe de ti.
E assim, enquanto as tuas mãos adormecem
começa uma outra história,
porque, quando alguma coisa acaba
outra deverá começar... e as minhas ilusões
também terão chegado ao fim.
E ainda assim, sem palavras,
volto novamente a amar.

11
A poesia perdida
(os olhos daquela mulher)

Há uma poesia perdida nesta rua,


agonizando entre as pedras...
dançando no vento e na chuva,
no meio dessas mulheres solitárias
e batendo no cais.
E tudo é silêncio, e tudo é saudade,
que a noite recolhe em seus braços...
e nos olhos daquela mulher
apenas uma lágrima esquecida, perdida no tempo, refletida na alma...
é como uma amarra no cais
esperando a hora de recolher
e deixar o barco partir...
simplesmente partir.
Ninguém nunca entenderá
os olhos daquela mulher... os olhos daquela menina.

12
Ausência

Sobre a mesa...
um pensamento antigo,
uma folha de papel em branco,
um livro qualquer... poesias perdidas.
Uma xícara de café, um cigarro...
a tua mais íntima beleza na fotografia!
Sobre a mesa...
uma rosa, uma carta, um cartão... um adeus,
uma saudade, um passado, uma lembrança...
e essa busca, essa busca incessante da expressão
que se perdeu na mecânica lógica dos fatos.
Sobre a mesa...
a ausência, a mecânica,
a lógica... os fatos, mais nada.

13
Abandono

Volto com passos lentos e silenciosos


à rua dos nossos dias...
Nenhuma luz e nenhuma música encontro agora
na velha casa abandonada.
Apenas migalhas dos bons momentos
resplandecem naquele sombrio silêncio.
Eis o que restou da felicidade: o silêncio,
a rua, as migalhas... e uma velha casa abandonada,
povoada de saudade.

14
Bri

Absorvo o teu olhar de criança


refletido na luz de um dia solitário...
e parece que guardas contigo
a beleza de alguma estrela perdida
numa noite que não tem mais fim.
E quando te sentes sozinha
tu procuras meus braços
- tu conheces meus passos -
deixando uma luz de esperança
para o dia que vem.
E eu parto sozinho
procurando a paz que um dia perdi.

15
Caminhos

E agora caminhas sozinha numa estrada que eu não conheço...


Parece que buscas um sonho que estava escondido
no fundo da alma, alguma estrela perdida,
algum anjo solitário pra te fazer companhia.

Às vezes te recolhes no silêncio do teu quarto


e ficas a navegar num oceano de sonhos e recordações,
como um barco perdido à procura de um cais.

Trazes contigo um olhar de quem já sofreu


e a certeza de que a dor desse amor
não acabará com a ternura da alma.

E assim eu te deixo livre para seguires algum caminho...


Se voltares, é porque algum dia eu te conquistei...
Se não voltares, é porque o nosso amor foi como uma poesia
que ficou esquecida na página de algum livro qualquer.

16
Denúncia

Denuncio este amor!...

que fragiliza as minhas defesas,

despe o meu sono

e me faz navegar no teu mar...

Feito um navegante errante me sinto

que traz tatuadas no braço

as iniciais do teu nome...

17
É tempo de solidão...

Agora que os olhos se despedem,


as mãos não se tocam,
os lábios não se encontram
e os caminhos não se cruzam...
fica apenas a saudade,
a lembrança e a certeza
de que nada mais será como antes.
A chuva que cai agora
é como uma ilustração da solidão
vagando nas ruas da cidade...
Deixemos que os ventos carreguem as mágoas
que um dia ficaram perdidas na alma,
e despertemos, então, para um novo amanhecer...

18
E a gente só queria ser feliz

Fala: onde anda o sonho de criança?


Tão bom te ver aqui, beleza rara
a vida num instante nos separa
e a gente só queria ser feliz.

Quero caminhar de novo de mãos dadas


dormir e acordar com a tua risada
viver a vida sem pensar em nada
a luz do nosso quarto se apagou.

Quero viver só com você uns vinte anos


eu sei que é um sonho, um desengano
meus passos se perderam nessa estrada
que você me ensinou a caminhar.

Sabe, a noite sem você não tem mais graça


o amor é mesmo assim e tudo passa
somente a solidão é que não passa
não quero mais brincar de ser feliz.

Quero tomar mais um café contigo eu quero


beijar a tua boca é o que mais quero
tocar tua pele clara que eu venero...
preciso de você comigo aqui.

19
Entardecer

Breve momento de inspiração


após longas horas de ausência,
que vão formando assim
o resto dos meus dias.

Tento sugar em tão breve instante


a seiva prodigiosa e pura
que ainda parece me restar dentro d'alma...
mas as minhas mãos vazias
rendem-se à marcha cruel das horas
- que vão passando -
no inexorável relógio da vida.

Faz frio em meu peito - eu sinto -


apavora esse entardecer que me despe...
que te despe!...
iludo-me com o teu retorno - eu sei! -
saudade?... certamente existe.

20
Eu e você

Eu já sabia que tudo terminaria assim:


uma carta, um adeus... um olhar,
duas lágrimas perdidas
e uma silenciosa saudade vagando dentro d'alma.
E aqueles mais íntimos e reveladores momentos
se perderiam - certamente - na fugacidade dos dias,
para ocupar o seu devido lugar no passado.
Eu já sabia!... você também sabia!...
mas, mesmo assim, um dia,
quando o envolvente e misterioso verde dos teus olhos
fingiu-se perdido e foi ao encontro dos meus,
e as minhas mãos - carentes -
buscaram o afago das suas...
os lábios ardentes
ousaram correr o risco de pronunciar:
eu amo você!

Eu quis correr o risco de te amar


mesmo sabendo que um dia eu ia te perder...

21
Estranhos

Ontem as delícias dos teus beijos,

o afago dos teus braços,

o brilho do teu olhar...

As cartas de amor e os cartões...

- os pactos - as promessas, a cumplicidade

e toda a tua beleza.

Hoje somente mais dois estranhos

perdidos na multidão...

boa noite!

22
Encantamento

De repente, eu te vejo surgir


dentro da invisibilidade do meu chakra...
e pela chama das velas
e pela fumaça do incenso egípcio do amor,
tu me vens nua... límpida como os cristais,
- despida de tudo e de todos -
assim como a lua, como a lua crescente.

E nessa divinização
você se faz carne, você se faz vinho em meu cálice...
você me perfuma... você me ilumina!...
...você se faz fogo, você se faz sal,
você se faz símbolo...
- você purifica -
você já é luz...
e eu a ostento em meu pentáculo.

Brindemos!... Cantemos!... Bebamos!


Toquem-se os sinos,
preparem-se as ervas sagradas
e tomemos o chá, para então purificar...

Saudemos, saudemos, saudemos... saudemos a Deusa!...


que antes do nascimento do sol
tu deverás partir com todo o encantamento...
desfazendo-se o círculo.
Brindemos!... Cantemos!... Bebamos!
Saudemos!

De repente, eu te vejo partir


dentro da invisibilidade do meu chakra...
e pela chama das velas
e pela fumaça do incenso egípcio do amor,
tu partes nua... límpida como os cristais
- despida de tudo e de todos -
assim como a lua, como a lua crescente.

Toquem-se os sinos!...
toquem-se três vezes os sinos!
três vezes...
Assim seja.

23
Exaltação

No cair desta tarde,

no nascer desta noite...

eu cantarei você na minha canção.

Para que a chuva não pare,

a poesia desperte,

a lareira se acenda...

e o vinho derrame

na brancura do tapete da sala.

Você está linda!

24
Face nua

No fim da noite caiu a máscara que cobria a tua face


deixando-a nua diante do espelho solidário,
que absorve a imagem mais íntima
e reflete uma face desconhecida.

Os teus olhos contemplativos fingiram-se perdidos


na imagem revelada... sem máscara, sem nada!...
e ficaram solitários na face
que já não era mais sua.

E partes sozinha!... deixando refletido no espelho


apenas um vulto de uma face ainda nua - ainda crua -
e uma lágrima cristalizada na voragem do tempo e do caminho...

25
Fim

As portas se fecharam, apagaram-se as velas,


os deuses dormiram...
cessaram os ventos,
os anjos partiram... o ritual terminou.
Resta apenas uma lágrima no vazio da distância...
Tenho saudades da língua, do beijo,
do cheiro, do corpo molhado... do olhar!
Agora procuro rastros que você não deixou.
Um brinde à solidão!

26
Fragmentos de duas vidas

Aqui outra vez te espero...


minha pobre menina adulterada,
sem sonhos, sem ideais... sem nada,
no vazio da distância abandonada.

Sou quem sabe a face da tua noite escura...


sou quem sabe a noite que se mostra nua...
sou quem sabe o brilho do teu olhar calado...
sou quem sabe areia, que em tuas mãos escorre.

Sou quem sabe um porto, onde ficaram ancorados


todos os teus desejos...
sou quem sabe um navio perdido
no silêncio do teu mar solitário...

Sou mera abstração dos teus planos...


sou nevoeiro, sou claridade!...
sou silêncio, sou perguntas... sou respostas,
sou saudades, sou passado... sou espera.

27
Hiato

As horas caminham a passos lentos...


Enquanto anjos perdidos exibem uma dança estranha no céu,
tu pulverizas a minha noite
com o brilho do teu olhar solitário.

Não deixes que eu te esqueça


na distância de algum caminho...
de algum caminho que não seja o teu,
de algum caminho que não tenha volta.

Que saibamos interpretar o silêncio das nossas noites


e deixemos que as nossas mãos cálidas
penetrem na essência de nossas almas...

E assim, quando não restar mais nada a dizer,


que os olhos - ainda que amargurados -
pronunciem o adeus já esperado.

28
Horas íntimas

O vinho derramado
O brilho no olhar
O corpo molhado
No espelho embaçado...

O olhar derramado
O brilho do vinho
O corpo embaçado
No espelho molhado...

A taça quebrada
As roupas jogadas
A chuva de inverno
Na janela da sala...

Um beijo suave, depois... se puder!...

29
Inspiração

Inevitável solidão que se aproxima,


feito um pássaro negro de longas asas
que pousa na alma fragmentada,
enquanto a velha cidade dorme.

O papel absorve lentamente as palavras,


ainda soltas e silenciosas.
Uma chuva fina a bater na vidraça
parece ninar as crianças e despertar os amantes.

As horas caminham a passos lentos...


o momento faz-se íntimo, faz-se raro...
e a velha cidade ainda dorme.

O dia amanhece e a cidade se espreguiça...


os amantes dormem e as crianças despertam,
- a poesia nasce - a chuva pára...

30
Inquietude

Agora,
quando essa chuva fina
insiste em bater na vidraça...
e a saudade
invade o meu coração,
sinto a poesia
gritando dentro da alma.

Teu vulto,
teu semblante... tuas palavras,
me vêm à mente.
Teu cheiro, meu incenso favorito,
parece então invadir o quarto...
e o teu gosto
mistura-se na xícara de café.

Risco, rabisco.
Rabisco e risco...
- AMASSO -
Coloco fora a folha de papel!...
e agoniza dentro de mim
o que a caneta não quis mais te escrever.

31
Insignificância

Pequenas palavras

Pequenos instantes

Pequenas promessas

Pequenos beijos

Pequenas tardes

Pequenos carinhos

Pequenas poesias...

Como foi pequeno o nosso amor!

32
Liberdade

Agora não precisas mais das asas


que um dia te deram...
podes alçar teus próprios vôos,
procurar a tua própria liberdade,
seguir novos caminhos... quem sabe
até ser feliz.
Mas ainda carregas nos olhos
gotas cristalinas de indecisão,
e ficas diante do abismo
sem saber se deves, sem saber se podes... voar, voar... voar.
E te jogas mesmo assim
- indecisa -
no teu próprio sonho,
com as tuas próprias asas,
na eterna busca da felicidade...

33
Miragem

Nada além do que essa tristeza no olhar,


do que essas ruas vazias,
do que essa música antiga.

Tudo era falso! Teu olhar era falso!!


Teus olhos mentiram como as miragens do deserto...
e uma pálida ilusão - nada mais -
fica agora vagando dentro da alma.

Tudo era falso! Teu beijo também era falso!!


Teus lábios mentiram como as miragens do deserto...
e uma lágrima fria rola pela minha face nua
morrendo em meus lábios ainda queimados dos teus.

Agora que as luzes se apagaram


e as ruas se fazem solitárias,
preciso reconstruir caminhos - organizar as coisas -
rasgar as cartas... e, quem sabe, ainda ser feliz.

34
Marina

Solitários foram seus dias...


e a poesia dormia esquecida na página de um livro.
Uma estrela solitária brilhava no céu pálido
e na estreita rua erma, apenas um vulto de mulher
numa janela entreaberta.

Marina foi dessas mulheres que cresceu crescida,


não tinha sonhos... não tinha nome.
Guardava no peito a ferocidade das noites
e a ambigüidade dos dias...
Seria Marina o seu nome?

Um vento frio soprava anunciando o instante da partida


e apagando as velas de todos os altares...
- O tempo é efêmero! -
- A vida é utópica! -
Seria mesmo Marina o seu nome?...

35
Máscaras caídas
(ou faces perdidas)

Enfim, acho que tudo terminou...


e me resta tão pouco agora
que não sei mais por onde recomeçar.
Onde anda você agora,
meu pequeno anjo azul?...
O sonho de ser feliz acabou?...
Era tão pouco o que se queria, tão pouco...
e eu ainda procuro a tua face
no espelho quebrado da casa,
ficam apenas cinzas perdidas de um incenso
que um dia a gente acendeu.

As folhas foram levadas pelo vento...


mas a árvore continua lá, fazendo companhia
para a janela que você deixou abandonada.

36
Mural dos dias

Um beijo de chegada
um beijo de partida...
Uma lágrima de tristeza
uma lágrima de alegria...
Uma luz que acende
uma luz que apaga...
A vida que chega, a vida que vai!
Um barco no cais
poesias perdidas...
Verdades, mentiras... amor, paixão, solidão!
Um sonho, uma realidade...
Um cheiro de noite
um vento distante...
Um rosto, um olhar... uma mão amiga!
Uma cadeira vazia no canto da sala...
uma lembrança, uma saudade!
Um lugar distante
um lugar próximo...
Uma casa cheia
uma casa vazia...
Um encontro, um desencontro... uma despedida!
Uma mistura de cores, uma mistura de dias...
e assim, bem devagarinho, são feitos os dias.

37
Navegante

Agora só me resta
navegar nessa imensidão de mar...
e buscar algum porto, algum cais,
a luz de um farol...
e nalguma taberna vulgar
sorver goles de vinho barato,
para esquecer teu corpo, teu porto,
teus beijos, teu nome... tua rua.
Talvez eu venha a tatuar teu nome em meu braço
e cantar tua canção preferida
em meio de bêbados, ladrões, mercenários...
vagabundas...
e nesses momentos fugitivos,
fingir, então, que esqueci teu corpo, teu mar...
tuas palavras, tua tarde... e toda a tua magia,
assim como se levanta a âncora para partir
e nunca mais voltar...
duma viagem sem fim.
Mas a força do nosso amor
- a eterna força do nosso amor -
faz do encontro um tempo sem fim, sem fim...
sem fim.

Prefiro o mar turbulento da tua presença


do que o porto seguro da tua ausência.

38
Os olhos disseram adeus...

Os lábios não se tocaram


no momento da despedida...
apenas um olhar - um triste olhar -
parecia querer dizer adeus...

Foram tantos momentos felizes,


tantas palavras - tantos gestos -
tantos beijos... quanta cumplicidade!...
mas somente um olhar - um solitário olhar -
parecia querer dizer adeus.

O ambiente fez-se triste,


fez-se frágil... revestindo-se de um manto negro
e a efígie de um anjo triste
pairou no ar - entre os amantes -
foi quando os olhos disseram adeus
à luz de uma lâmpada sombria e abandonada.

39
O próximo cais

Invento um cais dentro de mim


e tudo é saudade, e tudo é amor
e tudo é paixão que a minha alma decanta...
escondo-me de ti dentro de mim.

Antes que anoiteça e os lampiões se acendam,


eu jogo as minhas palavras ao mar
para se transformarem em poesias
e fazerem companhia para algum pescador de estrelas solitário.

Minha alma é como um barco no cais


perdida no silêncio do tempo, do teu tempo...
que espera um próximo cais,
lá, onde repousa a última esperança.

40
Palavras perdidas
(mural dos dias)

chegada, partida
tristeza, alegria
acende, apaga
vida que vai
barco no cais
perdidas
solidão
realidade
noite
vento distante
amiga
sala
saudade
distante
próximo
cheia
vazia
despedida
mistura de dias...
dias!

41
Palavras jogadas ao mar
(o próximo cais)

invento tudo
eu AMOR
e tudo é CAIS
de tudo minha mim
ANOITEÇA paixão SAUDADE
jogo última
LAMPIÕES transformarem-se
antes palavras solitário
acendam MAR em companhia
ALMA silêncio
barco no TEMPO
estrelas escondo-me onde
repousa ESPERA perdida
cais próximo
ESPERANÇA
poesias...

42
Queixa

é muito pouco

esse VINHO
essas CARTAS
essa TARDE

esses BEIJOS
esse MAR
essa NOITE
essa ESTRELA

(esse amor!)

AMOR
ESTRELA
NOITE
MAR
BEIJOS
TARDE
CARTAS
VINHO

(é tudo muito pouco...)

quando só eu bebo o vinho


quando só eu escrevo as cartas
quando só eu tenho a tarde....................é tudo muito pouco

quando só eu....................beijos
quando só....................mar
quando....................noite
....................estrela

(é tudo muito pouco!)

- amor -

43
Solitude

Das poucas brandas vezes que me lembro de ti


tu me vens pálida...
às vezes sorrindo, às vezes chorando!...
e por toda a noite
tu ficas velando
o meu sono tardio.
E daquele amor inefável e misterioso
restaram somente rastros...
restaram somente ruas, somente sonhos...
somente marcas
- somente cartas -
e a ilusão e a magia
da eternidade do primeiro amor,
que se perdeu na solidão efêmera do caminho
na busca errante da felicidade.

44
Segredos da alma

O tempo vai tecendo uma teia de saudade em minha alma


e alguma coisa ainda agoniza, ainda sangra e desespera...
Uma fúlgida ilusão parece estar despida dentro de mim,
e deixa expostos os meus sentimentos.

Propícia fica a noite para um beijo agora!


Como um perfume envolvente que ficou no ar,
você também ficou em mim... sem saber se podia,
sem saber se era certo... sem saber se eu queria...

Resta apenas abrir as janelas para o jorro do tempo


e esperar que as sementes germinem, que os olhos se encontrem,
que os lábios se toquem... e que a magia do amor aconteça.

45
Saudade

E hoje...
revirando as cinzas do passado,
volto a te buscar,
como inseto na teia, náufrago nas águas
e barco na areia.
Me debato!... vou morrendo aos poucos nas redes,
nas malhas desta saudade que agoniza,
feito uma criança pedindo para nascer.
E tudo aquilo...
que ontem era felicidade,
hoje não passa de saudade...
revirando a minha noite, o meu sono,
sangrando as minhas mãos,
ferindo os meus pés...
e caindo no mais profundo vazio
dessas minhas loucuras inspiradas.
Por favor!...
ilumina a minha noite
com a tua luz de mulher.
Espanta os fantasmas, as bruxas...
prepara o teu ritual.
Coloca uma roupa de festa,
perfuma... ilumina o teu corpo
e faze do amor
a magia de um novo dia amanhecendo.

46
Simplesmente... viver

Não faça planos muito longos, pois poderá não ter tempo
para concretizá-los; afinal, a vida é um grande ponto de interrogação.

Invista mais no presente, não esquecendo do futuro.


Mas não faça do futuro a sua única mola propulsora
e não deixe para ser feliz amanhã.

Saia mais com seus amigos, dê boas risadas com eles


e lembre-se que esses momentos são únicos, são raros...
e que outros iguais não acontecerão, portanto viva-os intensamente.

Tenha o seu próprio conceito de Felicidade, não finja afeição


e sobretudo seja você mesmo, sem se importar
com essas felicidades prontas que andam por aí.

Leia um livro, escreva uma poesia, caminhe na praia


com quem você ama...
são coisas simples, eu sei!... mas a felicidade às vezes
se esconde nos pequenos gestos e nas pequenas coisas da vida.

Não tenha medo de arriscar e vá em busca dos seus sonhos...


a vida sem sonhos é como um pássaro sem asas.

Sorria... mesmo nas adversidades.


Um sorriso pode fazer toda a diferença...
e lembre que a tristeza e a alegria são como as estações do ano:
vão e vem.

Recomece quantas vezes for preciso!


O que importa não é quantas vezes caímos,
mas sim, quantas vezes levantamos e continuamos.

Não julgue nada nem ninguém por fragmentos,


pense sempre na totalidade!...
não podemos definir um livro por uma única página.

Não leve a vida tão a sério, mas também não seja irresponsável.
Busque sempre o meio-termo das coisas...

Enfim, seja o escritor, o diretor e o personagem principal


da história da sua vida!... cada dia é uma página a ser escrita
e cada ano um capítulo que foi vivido.

47
Tuas voltas

Voltas trazendo um perfume diferente,


trazendo vícios diferentes,
palavras diferentes... livros diferentes,
anéis diferentes, chaves que eu não conheço.

Chaves
Anéis
Livros
Palavras
Vícios
Perfume... tudo tão diferente.

Não entendo essas tuas idas e vindas,


simplesmente voltas e eu te aceito!...
como sempre: bem-vinda.

48
Ternura

Quando derramas o teu olhar solitário


no ventre da noite,
quando encontras a poesia perdida
numa gota de orvalho,
quando abres as tuas asas de anjo
e ficas voando no silêncio da alma...
é nesses momentos que te encontras contigo mesma
e libertas de vez a suavidade adolescente que existe dentro de ti...
e te fazes criança num mundo adulto,
misturando as cores da noite
com as cores do dia...
tecendo um bordado de sonhos
na estrada da vida.

49
Um certo mês de agosto
(ou história de dois)

Há nestas noites perdidas


a lembrança cruel do teu rosto
e do teu sorriso que mais parecia uma canção,
refletindo os acordes
mais profundos da alma...
Teus olhos, meu lampião,
a luz que iluminava o meu caminho
e que me deixava ver através da escuridão.
Há nestas noites perdidas
a lembrança cruel do teu corpo,
que ficará para sempre dentro de mim,
refletida em meu olhar solitário.
Eu ainda freqüento os mesmos lugares,
ando pelas mesmas ruas,
bebo a mesma bebida
e às vezes escuto a nossa canção.
Por anos eu te procurava,
mas tão envolvido estava em meu pequeno sonho dourado
que não percebi que a minha busca havia terminado,
e te deixei partir... nas asas de um anjo triste
e levando contigo a minha felicidade.

50
Vazio

E amanhã, quando a noite chegar,


não restará mais nada a dizer...
apenas os olhos
pronunciarão o adeus já esperado...
e uma lágrima fria
ficará eternamente cristalizada, lá no céu,
fazendo companhia para aquela estrela abandonada.

51
Sumário

6 Âmago
7 À flor da pele
8 A tua espera (ou eterna espera)
9 Após o amor
10 Amanhã
11 Adormecer (enquanto as tuas mãos adormecem...)
12 A poesia perdida (os olhos daquela mulher)
13 Ausência
14 Abandono
15 Bri
16 Caminhos
17 Denúncia
18 É tempo de solidão...
19 E a gente só queria ser feliz
20 Entardecer
21 Eu e você
22 Estranhos
23 Encantamento
24 Exaltação
25 Face nua
26 Fim
27 Fragmentos de duas vidas
28 Hiato
29 Horas íntimas
30 Inspiração
31 Inquietude
32 Insignificância
33 Liberdade
34 Miragem
35 Marina
36 Máscaras caídas (ou faces perdidas)
37 Mural dos dias
38 Navegante
39 Os olhos disseram adeus...
40 O próximo cais
41 Palavras perdidas (mural dos dias)
42 Palavras jogadas ao mar (o próximo cais)
43 Queixa
44 Solitude
45 Segredos da alma
46 Saudade
47 Simplesmente... viver
48 Tuas voltas
49 Ternura

52
50 Um certo mês de agosto (ou história de dois)
51 Vazio

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Contato com o autor

e-mail: aflordapelepoesias@yahoo.com.br
blog: www.uniblog.com.br/muraldosdias

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Rio Grande, Rio Grande do Sul, Brasil


2008

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Resta apenas abrir as janelas para o jorro do tempo
e esperar que as sementes germinem, que os olhos se encontrem,
que os lábios se toquem... e que a magia do amor aconteça.

Segredos da alma

Que saibamos interpretar o silêncio das nossas noites


e deixemos que as nossas mãos cálidas
penetrem na essência de nossas almas...

Hiato

Sou mera abstração dos teus planos...


sou nevoeiro, sou claridade!...
sou silêncio, sou perguntas... sou respostas,
sou saudades, sou passado... sou espera.

Fragmentos de duas vidas

E assim, enquanto as tuas mãos adormecem


começa uma outra história,
porque, quando alguma coisa acaba
outra deverá começar... e as minhas ilusões
também terão chegado ao fim.
E ainda assim, sem palavras,
volto novamente a amar.

Adormecer

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