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OP. CIT.

O ESPECTRO DA FOME: SE METADE DA


HUMANIDADE NÃO DORME, É POR MEDO DA
OUTRA METADE QUE NÃO COME. 1

Ensaio sobre a obra: Geografia da fome - o dilema brasileiro: pão ou


aço, de Josué de Castro.

Luciano Rogério do Espírito Santo Abrão2


luciano.abrao@cesuc.br

Resumo: Este ensaio tem por objetivo a realização de uma concisa análise da obra,
Geografia da fome, o dilema brasileiro: pão ou aço que foi publicada em primeira edição no ano de
1946 logo após o mundo conhecer as desgraças da última grande guerra mundial. Livro
clássico do Professor Josué de Castro Nela o autor realiza uma análise do espectro da fome
investigando este fenômeno terrível nos quinze anos que precederam a sua publicação.
Castro retrata os reflexos da fome em um Brasil subdesenvolvido que apresentava à época
uma economia tipicamente colonial na qual se destacava o café e outros minguados
produtos primários para exportação, e, nesse sentido, afirmava que fome e
subdesenvolvimento são, na realidade, a mesma coisa.
Palavras-chave: Josué de Castro. Fome. Desigualdades sociais. Geografia humana.

Riassunto: Questo saggio si propone di fare un'analisi sintetica del lavoro, la geografia
della fame, il dilemma brasiliano: pane o acciaio che è stata pubblicata in prima edizione nel
1946 dopo che il mondo conosce i mali della ultima grande guerra mondiale. Classico libro
dal professor Josué de Castro In esso l'autore presenta un'analisi dello spettro della fame
indagare questo fenomeno terribile nei quindici anni prima della sua pubblicazione. Castro
racconta le conseguenze della fame in Brasile di un sottosviluppato nel momento in cui
aveva un tipo di economia coloniale, che ha evidenziato la scarsa caffè e altri prodotti per
l'esportazione, e in questo senso, egli ha sostenuto che la fame e sottosviluppo sono
effettivamente le stesse cosa.
Parole-chiave: Josué de Castro. Fame. Disuguaglianze sociali. Geografia Umana.

1
O título é uma alusão à frase original de Josué de Castro: “Enquanto metade da humanidade não come, a
outra metade não dorme, com medo da que não come.”
2
Mestrando em Geografia da Universidade Federal de Goiás - UFG/CAC; Especialista em Educação:
Docência Universitária pela Universidade Católica de Goiás - UCG; Bacharel em Direito pelo Centro de
Ensino Superior de Catalão - CESUC-GO; Advogado inscrito na OAB-GO; Professor de Direito
Constitucional do Curso de bacharelado em Direito do CESUC-GO.

Revista Pegada – vol. 10 n.1 179 Junho/2009


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Era inverno no Nordeste brasileiro, No entanto, sua obra e sua vida dedicada
dia 05 de setembro de 1908, e, na casa ao combate político e científico às
número um da Rua Joaquim Nabuco em injustiças sociais lhe renderam a ira da
Recife nascia Josué Apolônio de Castro, ditadura militar, que, após o golpe de 1964,
Professor, Geógrafo, Médico, Sociólogo e o destituiu do cargo de Embaixador,
Político. Um revolucionário que foi cassou seus direitos políticos e o impediu
indicado três vezes para o prêmio Nobel: de voltar ao Brasil.
concorreu para o Nobel de Medicina em Exilado na França, além de continuar
1954, e nos anos de 1963 e 1970, ao Nobel suas atividades intelectuais, fundou e
da Paz. dirigiu o Centro Internacional para o
Apesar de ter iniciado seus estudos em Desenvolvimento, e, exerceu o cargo de
Medicina na Bahia, graduou-se no Rio de Presidente da Associação Médica Internacional
Janeiro em 1929 retornando a Pernambuco para o Estudo das Condições de Vida e Saúde.
para clinicar e prestar serviços médicos em No entanto, longe do Brasil reclamava da
uma fábrica. Nela encontra parte dos vida depressiva em uma terra que não era a
subsídios para, em 1932, realizar o Inquérito sua, a ponto de afirmar que as pessoas não
sobre as condições de vida das classes operárias do morriam somente de doenças, morriam
Recife, primeiro do gênero no Brasil e, também de saudade. Josué de Castro não
ponto de partida para suas profícuas conseguiu voltar vivo ao Brasil, e, vitimado
investigações científicas sobre os efeitos por um dos maiores crimes cometidos pela ditadura
das desigualdades sociais no Brasil e no militar faleceu em Paris no dia 24 de
Mundo. Dentre as suas principais obras se setembro de 1973 quando aguardava o
encontram os clássicos: Geopolítica da fome e passaporte que o traria de volta.
Geografia da fome, este publicado em A obra em exame, Geografia da fome, o
primeira edição no ano de 1946. Alguns de dilema brasileiro: pão ou aço foi publicada em
seus livros foram publicados em 25 primeira edição no ano de 1946 logo após
idiomas. o mundo conhecer as desgraças da última
De 1952 a 1956 ocupou o cargo de grande guerra mundial. O dilema do pão
Presidente do Conselho Executivo da (uma opção de política econômica apoiada
Organização das Nações Unidas para Agricultura mais no desenvolvimento humano), ou o
e Alimentação FAO/ONU, e, em 1962 foi dilema do aço (uma economia ancorada
nomeado Embaixador do Brasil na mais no desenvolvimento industrial), se
Organização das Nações Unidas – ONU.

Revista Pegada – vol. 10 n.1 180 Junho/2009


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apresentam como fio condutor desta rica alimentação do nosso povo – alargando a
pesquisa científica. negras manchas de miséria de nossa
Nela o autor realiza uma análise do geografia da fome” (p. 49). Outro objetivo
espectro da fome investigando este do autor era o de, com uma revisão mais
fenômeno terrível nos quinze anos que profunda da obra, contribuir “[...] na
precederam a sua publicação. Castro retrata reformulação de nossa política econômica
os reflexos da fome em um Brasil ainda bem incipiente em seus métodos de
subdesenvolvido que apresentava à época ação” (p. 49).
uma economia tipicamente colonial na qual Na introdução, o autor alerta para o
se destacava o café e outros minguados fato de as pessoas à época relacionarem o
produtos primários para exportação, e, flagelo da fome somente aos horrores das
nesse sentido, afirmava que fome e guerras e às imagens de pessoas esquálidas
subdesenvolvimento são, na realidade, a e famintas vindas principalmente do
mesma coisa. continente asiático com
A tese foi sofrendo Castro apresenta a fome coletiva sua superpopulação, suas
como um fenômeno social
pequenas atualizações massas de miseráveis.
generalizado, geograficamente
em suas sucessivas universal, distribuído por todos os Afirmava que as imagens
edições. Entretanto nos continentes do planeta, atingindo do noticiário dos jornais
inclusive o nosso que já fora
anos 1960 no sentido de induzia as pessoas leigas
chamado de a terra da
adequá-la à realidade abundância para onde milhões de a um conhecimento
econômica do Brasil de europeus imigraram para fugir da superficial da fome como
então, o autor, pobreza. um calamitoso fenômeno
reconhecendo que o país estava mudando social ao reduzirem-no a duas grandes
o eixo de sua economia e, se regiões geográficas: “o Oriente exótico e a
industrializando em um ritmo acelerado, Europa devastada pela Grande Guerra”.
realizou alterações na estrutura da tese para Castro apresenta a fome coletiva como
que esta não perdesse a essência um fenômeno social generalizado,
interpretativa da realidade econômico- geograficamente universal, distribuído por
social do Brasil. todos os continentes do planeta, atingindo
Nessa direção, Castro pretendia por inclusive o nosso que já fora chamado de a
intermédio de seu profícuo estudo terra da abundância para onde milhões de
demonstrar “[...] até que ponto o progresso europeus imigraram para fugir da pobreza.
econômico realizado tem sido favorável e Nesse sentido, apesar de a obra
até que ponto tem ele fracassado no abordar os reflexos da fome no Brasil, o
sentido de melhorar as condições de autor deixa claro que o objeto de sua

Revista Pegada – vol. 10 n.1 181 Junho/2009


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pesquisa é bem mais amplo: “Pretendemos humanos refletindo, em muitas de suas


realizar o estudo das diferentes áreas de características, tanto somáticas como
fome no mundo, iniciando-o com o estudo psíquicas, tanto biológicas como culturais,
da fome no Brasil, nosso campo de a influência marcante de seus tipos de
experiência direta” (p. 58). dieta” (p. 58 – 59).
Para tanto, assevera que os inquéritos Nessa direção, divide o mapa da fome
sociais têm demonstrado que a alimentação do Brasil em duas áreas. Área de fome: na
do brasileiro além de precária em qual o estado de nutrição de pelo menos
qualidades nutritivas apresenta, “[...] nas metade da população é manifestamente
diferentes regiões do país, padrões carente, e, que por sua vez se subdivide em
dietéticos mais ou menos incompletos e Áreas de fome endêmica, quando sua
desarmônicos” (p. 58). Alega que o manifestação é permanente (Área
problema se apresenta de forma mais grave Amazônica e Área do Nordeste
em certas regiões que vivem em estado de Açucareiro) e; Áreas de epidemia de fome,
fome crônica, do que em outras, onde a quando sua manifestação é transitória
população é subnutrida. (Área do Sertão Nordestino).
No entanto, conclui que as causas O restante do Brasil ele classifica
dessa alimentação defeituosa se devem como Área de Subnutrição (Área do Centro-
mais a fatores socioculturais do que aos de Oeste e Área do Extremo Sul), sob a
natureza geográfica, pois em um país de alegação de que nestas Regiões, “[...]
extensão continental “[...] e com sua embora os hábitos alimentares estejam
infinita variedade de quadros climato- longe de ser perfeitos, não se apresentam,
botânicos, seria possível produzir alimentos contudo, deficiências alimentares tão
suficientes para nutrir racionalmente uma pronunciadas, a ponto de arrastarem a
população várias vezes igual ao seu atual maioria da coletividade aos estados de
efetivo humano” (p. 58). fome” (p. 60).
O autor enfatiza as diferenças de solo, Castro, numa visão à época
clima e de culturas há séculos espalhadas predominante, ao discorrer sobre as Áreas
pelo território brasileiro como fatores de fome endêmica afirma que, até certo ponto,
impeditivos à constituição de apenas uma a fome na região Amazônica seria
área geográfica alimentar, e, nesse sentido, justificada, “[...] pela luta desigual entre o
afirma que o país possuía cinco áreas homem desarmado e as forças
alimentares distintas, com dieta própria extremamente agressivas do meio
baseada em produtos regionais, com geográfico pobre em recursos alimentares”,
recursos típicos “[...] e com seus efetivos e, nesse sentido, afirma que em tal região a

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fome “[...] decorre principalmente da Reconhece que, apesar de as duas


pobreza natural da floresta equatorial em culturas apresentarem diferenças em seu
alimentos” (p. 114). mecanismo de estruturação, guardam cruéis
Quanto ao Nordeste (Açucareiro) a semelhanças no que diz respeito à
manifestação do fenômeno da fome seria manutenção das condições de fome e das
para ele algo chocante por não poder ser desigualdades sociais na região:
explicado por razões naturais, pois nesta
região “As condições tanto do solo quanto A área do cacau é sociologicamente, uma
área de açúcar despida daqueles arranjos
do clima regionais, sempre foram as mais acomodativos que o patriarcalismo criou
propícias ao cultivo certo e rendoso de no Nordeste, daquele sossego aparente da
doce vida dos engenhos, deixando-se
uma infinidade de produtos alimentares” arrastar, no ímpeto dos seus desenfreados
interesses mercantilistas, aos graves
(p. 114). extremos da miséria física e moral. É mais
Nessa direção, o autor aponta o uma zona de fome, alimentada pela fictícia
riqueza do cacau (p. 173).
plantio da cana de açúcar como uma
maneira de esgotar a fertilidade do solo e Nessa correlação
denuncia: “Contudo mais destrutiva do que monocultura/miséria/fome, o autor
esta ação direta da cana sobre o solo é a sua destaca que houve resistência, e, nesse
ação indireta, através do sistema de sentido aponta a oposição do negro à
exploração da terra que a economia monocultura como mais produtiva que a
açucareira impõe: exploração monocultora do índio, pois este povo de origem
e latifundiária” (p. 116). Afirma ainda que a africana, apesar de ter sido brutalmente
monocultura da cana destruiu florestas, seqüestrado não perdeu o amor à terra, e,
escravizou os homens e a terra, e, ao lado trouxe consigo a tradição da agricultura de
dos lucros dos senhores de engenho foi um subsistência.
dos principais fatores promotores da fome
na região. Desobedecendo às ordens do senhor e
plantando às escondidas seu roçadinho de
No entanto, ressalta a monocultura e o mandioca, de batata doce, de feijão e de
latifúndio como fatores de insegurança milho. Sujando aqui, acolá, o verde
monótono dos canaviais com manchas
alimentar, e, não a cana de açúcar em si. deferentes de outras culturas. Benditas
Lembra da miséria física e moral imposta manchas salvadoras da monotonia
alimentar da região (p.133).
pelos coronéis nas áreas de plantio do
cacau. “Este regime agrícola monocultor e Apesar de vencidas por um inimigo
latifundiário arrasta as populações locais a poderoso, que nos dias atuais ainda exibe
um nível de vida terrivelmente baixo” (p. sua força devastadora por meio do agro-
172). negócio, outras pessoas resistiram ao poder

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do latifúndio no Brasil, e, Castro não necessária a “[...] luta contra o


deixou de registrar: “No Brasil, a subdesenvolvimento em todo o seu
resistência dos índios abstencionistas e dos complexo regional, expressão da
negros rebeldes dos quilombos, e mesmo monocultura e do latifúndio, do feudalismo
dos colonos brancos e mestiços mais agrário e da subcapitalização na exploração
pobres desprovidos de terras, não deu para dos recursos naturais da região” (p. 261), e
vencer a força opressiva do nessa direção, responsabiliza a arcaica
latifundiarismo” (p. 135). estrutura agrária da região, para ele,
Quando aborda as epidemias de fome no responsável pelo sistema de fatores
Sertão Nordestino, descreve um fenômeno negativos que impedem o desenvolvimento
inteiramente diferente de sua manifestação das forças produtivas.
endêmica na Amazônia e no Nordeste Para o autor, na luta contra a fome no
Açucareiro. “Não mais a fome atuando de Nordeste “Todas as medidas e iniciativas
maneira permanente, condicionada pelos não passarão de paliativos [...], enquanto
hábitos da vida cotidiana, não se proceder a uma
mas apresentando-se Antes de Castro, o pensamento reforma agrária racional
episodicamente em
generalizado era o de que a fome que liberte as suas
do sertanejo era fruto de sua
surtos epidêmicos” (p. inadaptabilidade ao meio, populações da servidão
175). contudo após a publicação de seus da terra, pondo a terra a
Nesse sentido, relata estudos fica evidente o caráter serviço de suas
político do fenômeno.
epidemias agudas de necessidades” (p. 261).
fome relacionadas aos períodos de seca Nesse sentido, explicita uma verdade
(intercaladas por épocas de fartura) em um ainda hoje incômoda aos detentores do
quadro calamitoso que atinge Poder (político e econômico) na Região:
indistintamente a todas as pessoas da “Muito mais do que a seca, o que acarreta a
região. “São epidemias de fome global fome no Nordeste é o pauperismo
quantitativa e qualitativa, alcançando com generalizado, a proletarização progressiva
incrível violência os limites extremos da de suas populações [...] Tudo é pobreza, é
desnutrição e da inanição aguda [...]” (p. magreza, é miséria relativa ou absoluta,
175). segundo chova ou não chova no sertão” (p.
Apesar disso, Castro, fazendo 260).
referência a Aloísio Campos, alerta para ao Antes de Castro, o pensamento
fato de o combate à seca e seus efeitos não generalizado era o de que a fome do
resolver, por si só, o problema da fome no sertanejo era fruto de sua inadaptabilidade
Nordeste, pois considera realmente ao meio, contudo após a publicação de

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seus estudos fica evidente o caráter político humanos, sempre em luta e quase nunca
do fenômeno, pois “Sem reservas em harmonia com os quadros naturais” (p.
alimentares e sem poder aquisitivo para 280). Assevera que o Estado não foi apto
adquirir os alimentos nas épocas de para mediar os interesses privados e os
carestia, o sertanejo não tem defesa e cai interesses coletivos. “Ou mesmo pior,
irremediavelmente nas garras da fome” (p. entre os interesses nacionais e os dos
260). monopólios estrangeiros interessados em
As outras regiões do Brasil (Centro- nossa exploração de tipo colonial” (p. 281).
Oeste e Extremo Sul) são por ele Recorda que a agricultura no Brasil
consideradas Áreas de Subnutrição: “[...] não expandiu-se dirigida em primeiro instante
são áreas de fome, no sentido rigoroso da pelos colonizadores europeus e depois pelo
palavra, mas áreas de subnutrição, de grande capital estrangeiro no sentido de
desequilíbrio e de carências parciais, produzir para exportação, não sendo
restritas a determinados grupos ou classes adotada “[...] a agricultura intensiva de
sociais” (p. 265). Considerando que um subsistência, capaz de matar a fome do
estudo detalhado da situação alimentar nosso povo” (p. 281).
destas regiões ultrapassaria os objetivos da Ressaltando o fato de que cada sistema
investigação e, por uma questão de econômico deve estar intimamente ligado
conjunto, realiza apenas uma análise geral às características das diferentes áreas geo-
de seus aspectos nutricionais. econômicas, critica a homogeneização
No último capítulo da obra: Estudo do promovida pelo capitalismo: “Daí a
conjunto brasileiro deixa clara a sua opção por impossibilidade de importar-se modelos
uma pesquisa qualitativa ao privilegiar o pré-fabricados de desenvolvimento para
estudo das condições de vida real das aplicar-se in loco como transposição válida
pessoas, não se prendendo à frieza dos da experiência de outros povos" (p. 290).
dados estatísticos sobre o problema. “Não Apontando “[...] os pontos fracos de
vamos, para completar o quadro do nossa estrutura por onde o problema deve
conjunto brasileiro, enfileirar aqui dados ser atacado”, e, formulando dez conclusões
estatísticos comprovantes dessa miséria gerais sobre o tema, “conclui” a obra
alimentar” (p. 279). afirmando: “A vitória contra a fome
Reafirma que, apesar do progresso constitui um desafio à atual geração –
econômico obtido em diversas áreas, a como um símbolo e como um signo da
fome no Brasil perdura. O que, para ele, vitória integral contra o
“[...] é conseqüência, antes de tudo, de seu subdesenvolvimento” (p. 305).
passado histórico, com seus grupos

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A obra Geografia da fome, assim como sistemas econômico e político, de governos


seu autor, é revolucionária, pois, pela e de grupos econômicos sobre o fenômeno
primeira vez contradiz a tese de que as e seus reflexos. Fora o fato de a fome, à
causas da fome no Brasil (principalmente época da pesquisa (e ainda hoje), ser um
na região Nordeste) têm origens naturais. tabu, assunto veladamente proibido, sendo
O autor descreve a fome política, fruto do muitas vezes negada: “não há fome no
subdesenvolvimento econômico, da ação Brasil”, diziam uns por preconceitos
predatória dos colonizadores, do capital morais, outros por interesses econômicos.
internacional, da monocultura, do Programas governamentais como o
latifúndio, da ingerência política, ou seja, de Fome Zero que, apesar de não realizarem um
uma estrutura civilizatória fundada na combate profundo aos efeitos da fome, se
exploração do homem e da natureza, ou constituem como marcos iniciais dessa
como diz o autor: “na escravidão do batalha, só são possíveis na atualidade
homem e da terra”. graças às pesquisas e às efetivas ações
Obra essencial da Ciência Geográfica, políticas desenvolvidas no passado por um
o livro demonstra a clara filiação de Josué grande ser humano. É nesse contexto que
de Castro à Corrente possibilista, pois nega se tornam imprescindíveis, não só a
a passividade determinista dos que Geografia da fome, mas toda a obra e o
consideravam a fome como fenômeno exemplo de vida solidária do Professor
essencialmente natural, e, nesse sentido, Josué de Castro.
eximiam qualquer responsabilidade dos

REFERÊNCIA:

CASTRO, Josué de. Geografia da fome: o dilema brasileiro: pão ou aço. 10. ed. Rio de
Janeiro: Antares, 1983. 361p. (Clássicos das Ciências Sociais no Brasil).

Informações bibliográficas:

Revista Pegada – vol. 10 n.1 186 Junho/2009


OP. CIT.

Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este


texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:

ABRÃO, Luciano Rogério do Espírito Santo. O ESPECTRO DA FOME: SE METADE


DA HUMANIDADE NÃO DORME, É POR MEDO DA OUTRA METADE QUE
NÃO COME. Revista Pegada Eletrônica, Presidente Prudente, vol. 10, n. 1,
30/junho/2009. Disponível em:
<http://www.fct.unesp.br/ceget/pegada101/12luciano.pdf>. Acesso em: __.__. 20__.

Revista Pegada – vol. 10 n.1 187 Junho/2009

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