Este documento resume os principais pontos sobre o Transtorno do Espectro do Autismo discutidos em uma tese de doutorado. Aborda a definição atual do autismo como um espectro, as dificuldades na teoria da mente, funções executivas e reconhecimento de emoções em pessoas com autismo e como esses déficits afetam as interações sociais. Também discute a heterogeneidade dos sintomas e perfis neuropsicológicos entre indivíduos com autismo.
Este documento resume os principais pontos sobre o Transtorno do Espectro do Autismo discutidos em uma tese de doutorado. Aborda a definição atual do autismo como um espectro, as dificuldades na teoria da mente, funções executivas e reconhecimento de emoções em pessoas com autismo e como esses déficits afetam as interações sociais. Também discute a heterogeneidade dos sintomas e perfis neuropsicológicos entre indivíduos com autismo.
Este documento resume os principais pontos sobre o Transtorno do Espectro do Autismo discutidos em uma tese de doutorado. Aborda a definição atual do autismo como um espectro, as dificuldades na teoria da mente, funções executivas e reconhecimento de emoções em pessoas com autismo e como esses déficits afetam as interações sociais. Também discute a heterogeneidade dos sintomas e perfis neuropsicológicos entre indivíduos com autismo.
Referência: MARANHÃO, Samantha Santos de Albuquerque. Transtorno do
Espectro do Autismo: da avaliação à intervenção neuropsicológica histórico- cultural. 2018. 157 f. Tese (Doutorado) - Curso de Psicologia, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2018.
Fichamento
Diante das altas taxas de prevalência, a ciência, a mídia, a justiça, a saúde e a
educação estudam e discutem o que é ter o Autismo, buscando desvendar as nuances do quadro clínico e, assim, avançar em termos de diagnóstico, intervenção e proposição de políticas públicas. (p. 52) (...) Para o psiquiatra, esses pacientes frequentemente tinham o perfil de se recolher do mundo exterior para se refugiar em si mesmo (p. 52) (...) “Autistic Disturbances of Affective Contact” [Distúrbio autista do contato afetivo], no qual há o relato clínico de onze crianças, cujo distúrbio patognomônico seria “a incapacidade de se relacionar de maneira normal com pessoas e situações, desde o princípio de suas vidas” (p. 52) (...) o autismo foi incluído no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) como um conceito diagnóstico específico, caracterizado por prejuízos na interação social, comunicação e comportamento (p. 53) Na atual definição diagnóstica (DSM-5) o autismo é considerado um espectro, no qual há um contínuo de frequência e intensidade de características clínicas, constituindo-se como uma entidade plural, cada qual com uma impressão de experiência subjetiva própria. Embora esta concepção diagnóstica revele o autismo como espectro amplo, intensifica-se a problemática identificada no âmbito clínico e científico, qual seja, a heterogeneidade sintomática e, por conseguinte, as dissonâncias no estabelecimento de características clínicas e neuropsicológicas do espectro (p. 53) Uma larga gama de estudos recentes proporciona a compreensão do perfil neuropsicológico do espectro do autismo. (...) já destacava isolamento social, interação passiva, interação ativa, porém estranha e; interação hiporformal, como sendo padrões típicos de indivíduos do TEA. (...) fracassos duradouros em interações sociais de indivíduos do espectro do autismo normalmente estão atrelados a comportamentos autênticos e falhas na empatia. (...) falhas na teoria da mente comprometem a memória autobiográfica de adolescentes com autismo. Todas essas habilidades são imprescindíveis para estabelecimento de relações sociais e construção da identidade. (p. 54) (...) déficits qualitativos na cognição social de pessoas com TEA, (...) reconhecimento de emoções. (...)dificuldades semelhantes nos relacionamentos sociais e no cotidiano escolar (...) de modo interdependente, falhas na teoria da mente, nas funções executivas e nas habilidades linguísticas emergem como principais fragilidades neuropsicológicas do TEA e, por conseguinte, influenciam a trajetória de vida dessas pessoas. (p. 54) (...)os estudos neuropsicológicos atuais são marcados por uma linha tênue entre desconcerto e fascinação em torno do termo variabilidade. Há variabilidade na seleção criteriosa das amostras, variabilidade e complexidade de perfis neuropsicológico (...) (p. 54) (...) a narrativa dos estudos neuropsicológicos sobre o autismo traz contornos entrelaçados e complexos que dificultam observar como características específicas da teoria da mente, reconhecimento de emoções e funções executivas coconstroem dialeticamente as dimensões da comunicação, interação social e comportamento destes sujeitos. (p. 55) (...) pessoas com autismo têm dificuldades significativas com a teoria da mente, ou seja, falham em constatar que os outros possuem estados mentais diferentes dos deles. (...) a falha na teoria da mente interferia na experiência dessas pessoas de sentir empatia (p. 55) Por meio da mobilização da Teoria da Mente o ser humano consegue negociar, enganar, ensinar, demonstrar, reconhecer emoções complexas e manipular pensamentos, o que conjuntamente permite a previsão comportamental baseada no mecanismo de inferência de emoções e crenças com consideráveis probabilidades de acerto. (p. 55) Nitrini (2002) advoga que o processamento da Teoria da Mente (ToM) contempla uma teoria porque os estados mentais não são diretamente observáveis e, por conseguinte, torna-se necessário fazer inferências (teorizações) sobre o comportamento dos outros. Por outro lado, Tonelli (2011) afirma que há uma habilidade mental automática para se atribuir estados mentais a si mesmo e a outros indivíduos, com a finalidade principal de compreensão e predição de seus comportamentos. (p. 56) Tonelli (2011) sugere a utilização da denominação ToM implícita (ToMi) para a habilidade de inferência de estados mentais,(...) e a denominação de ToM explícita (ToMe) para a capacidade de aprender as regras do jogo social, de forma a otimizar o convívio com outros seres humanos. (p. 56) A Teoria da Mente pode ser compreendida como a resultante de um novo emprego de habilidades cognitivas pré-existentes. (p. 56) Psicologia do Desenvolvimento (...) considera aspectos da origem desta habilidade nas crianças (em que idade ela surgiria) e de seu percurso de desenvolvimento nas mesmas. (p. 57) Os autores verificaram estágios iniciais atrelados à atenção compartilhada, seguido do estágio da “crença”, onde a criança torna-se apta a diferenciar o real do faz-de- conta(...) Dos três aos seis anos de idade, aproximadamente, verificaram o desenvolvimento da segunda ordem da teoria da mente, "crença sobre crença", onde as crianças são capazes de atribuir estados mentais a outras pessoas (o outro também pensa ou tem "crença") e adquirem a habilidade de inferir sobre os estados mentais do outro. (...) os pesquisadores também verificaram o surgimento da terceira ordem de estados mentais, "crença sobre crença sobre crença", na qual crianças conseguem estabelecer a crença do outro sobre minha crença. Neste estágio torna- se possível a auto percepção de sentimentos e características pessoais, bem como o aprimoramento da empatia. (p. 57) Baron-Cohen (1996) cunhou o termo “cegueira mental” para descrever os déficits apresentados por indivíduos com autismo no processamento ToM, isto é, na capacidade de inferir ou atribuir estados mentais a terceiros, comprometendo sua capacidade de interagir socialmente. (p. 58) (...)Falhas na cognição social parecem impactar diretamente sobre a qualidade das habilidades sociais de pessoas com TEA. Estas frequentemente demonstram dificuldade em se engajar em interações sociais(...) (p. 58) As Funções Executivas (FE) são processos cognitivos complexos necessários para a organização e adaptação do comportamento a um ambiente em constante mudança. Incluem habilidades como inibição, planejamento, flexibilidade mental, fluência verbal e memória operacional (Barros et al., 2016). O controle inibitório é uma habilidade que permite ao indivíduo inibir respostas preponderantes, respostas a estímulos distratores ou ainda interromper respostas que estejam em curso (Barkley, 2001). (p. 59) A flexibilidade cognitiva ou mental é a habilidade de alternar diferentes pensamentos ou ações, de acordo com as mudanças do ambiente ou do contexto (...) A memória operacional é um sistema de armazenamento de informações temporário que permite ao indivíduo manipular um delimitado volume de informações necessárias para a execução de ações (p. 59) (...)os resultados de pesquisas têm sido consistentes em apontar comprometimento no funcionamento executivo em indivíduos com TEA. Considerando-se que o TEA é uma condição significativamente heterogênea, dadas as diferenças sintomatológicas e de desenvolvimento, a variabilidade de desempenho em termos de funcionamento executivo pode contribuir para caracterizar essa população clínica (p. 60) A heterogeneidade metodológica das investigações parece constituir fator limitante para o maior esclarecimento das relações entre as FE e o TEA(...) a existência de múltiplas definições das FE e, consequentemente, múltiplas formas de avaliação(...) (p. 60) (...)condições socioeconômicas familiares precários resultariam em ambientes familiares menos estimulantes e em desempenhos mais baixos das crianças em tarefas de funções executivas. (p. 60) (...)prejuízo executivo parece não ser primário ou causal no autismo e que tais déficits aumentam com a progressão da idade nesta população (p. 61) De forma similar, Maranhão e Pires (2017) encontraram dificuldades na flexibilidade cognitiva em diferentes níveis de severidade do TEA. Observou-se padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades em todas as crianças participantes. Em todos os casos clínicos, há relato dos pais sugestivo de necessidade de rotina e de previsibilidade do(a) filho(a), sem perder de vista o quanto eles ficam aparentemente irritados quando há alterações ou variações. Embora seja identificada similaridade nos relatos no tocante à dificuldade na flexibilidade mental, no grupo TEA Grave, o comprometimento parece mais evidente em termos funcionais. (p. 63) (...)teóricos têm sugerido uma distinção entre os aspectos cognitivos “frios”, (...) e os aspectos afetivos "quentes" (...) As avaliações das FE em crianças têm se concentrado quase exclusivamente nas FE “frias”, mas estudos recentes apontam diferenças de padrões entre as medidas de FE “quentes” e “frias”, sugerindo que, de fato, são constructos distintos que precisam de compreensão refinada. Sabe-se que as FE “quentes” influenciam a regulação emocional (p. 64) (...) um modelo integrativo do desenvolvimento emocional e cognitivo permitiria uma melhor compreensão sobre a relação entre teoria da mente, funções executivas e emoções (p. 64) É praticamente unânime a compreensão de que a capacidade de expressar emoções é inata, ou seja, a expressão de emoções básicas (alegria, tristeza, medo, raiva) costuma ser idêntica em todas as etnias (...) sugere o comprometimento na cognição social, em detrimento da percepção social em pessoas com TEA. (p. 64) (...)o Instituto Suíço de Tecnologia em Lausanne publicou estudo que aponta a hipersensibilidade emocional à experiência como componente importante dos prejuízos sociais no TEA. O estudo de Markram e Markram (2010) já corroborava com Overskeid (2016) ao sugerir que pessoas com TEA sentem as emoções exatamente como pessoas com desenvolvimento típico, no entanto, a expressão emocional elicia mais rápido do que o normal e os indivíduos não conseguem ter a regulação emocional necessária. (p. 65) (...)a teoria da mente parece repercutir nos padrões de comunicação e interação social, enquanto as FE parecem repercutir nos padrões comportamentais repetitivos e estereotipados (p. 66) (...) c) o delineamento aprimorado dos tipos de comorbidade compatíveis com o TEA, sem perder de vista o modo pelo qual a comorbidade afeta o desenvolvimento humano; d) pesquisas que identifiquem os padrões atuais da vida social, comunicativa e de padrões restritivos e repetitivos em adultos com TEA. Tais pesquisas ajudarão no delineamento do diagnóstico tardio em adultos, isentos de histórico clínico confiável. (p. 66) A NEPSY-II é dividida em seis domínios: atenção/funções executivas, linguagem, processamento visoespacial, sensório-motor, memória e aprendizagem, percepção social. (p. 69) Domínio Atenção e Funções Executivas: Atenção Auditiva (AA)(...) Inibindo Respostas (IR)(...) Fluência em Desenhos (FD)(...) Domínio Percepção Social(...)(p. 69) Nesta tarefa, a criança precisa imaginar um amigo e atribuir uma crença sobre a compreensão/atitude do mesmo. Caso acerte, pode-se sugerir que ela atingiu o primeiro estágio do desenvolvimento da teoria da mente (crença), tornando-se apta a diferenciar o real do faz- de-conta. (p. 72) (...)foram inclusas na amostra apenas crianças com Transtorno do Espectro do Autismo e crianças com desenvolvimento típico com perfil socioeconômico e de idade semelhante ao grupo clínico.. (p. 74) (...) análises descritivas e inferenciais apenas com o grupo clínico (intragrupo) foram realizadas, com o objetivo de explorar os resultados encontrados e verificar os contrastes entre os desempenhos dos subgrupos estruturados a partir da variável nível de gravidade, considerando para tanto as dimensões da comunicação, interação e comportamento (p. 77) Os dados apresentados indicam que a maioria das crianças classificadas no Nível Grave, para os subgrupos Comunicação, Interação e Comportamento, não conseguiu responder as atividades selecionadas para avaliação das funções executivas e percepção social. (p. 80) Os resultados obtidos demonstram associação entre as variáveis comunicação e desempenho nos testes de funções executivas e percepção social (...) em todos os testes, exceto no de Atenção Auditiva. O teste Fluência em Desenhos apresentou desempenhos significativos nas áreas de comunicação (...) e interação social (...), mas não sofre influência significativa do domínio do comportamento(...) Ademais, a análise das relações entre as variáveis comunicação, interação e comportamento e os níveis de gravidade (...) aponta que a habilidade de Reconhecimento de Emoções desponta como aquela mais impactada pelo TEA. (p. 84) A análise dos resultados apresentados sugere diferenças no perfil executivo, na habilidade de reconhecimento de emoções e no desenvolvimento da teoria da mente em função do nível de gravidade do TEA, considerando-se os domínios de comunicação, interação e comportamento. Dentre os domínios que caracterizam a criança autista, o nível de comunicação apresentou uma maior associação com prejuízos significativos(...) (p. 85) (...) estudos neuropsicológicos que ressaltam a linguagem como preditora do nível de severidade do TEA. Muitos estudos associam as dificuldades de linguagem como variável etiológica significativa do próprio transtorno. (p. 86) Tal habilidade exige ir além do significado literal do que é veiculado, a fim de compreender a intenção do falante em um determinado contexto e, por conseguinte, decidir se a sentença significa o que é dito ou se vai além, como no caso do pedido indireto. (p. 86) Geurts et al. (2009) não encontraram nenhuma evidência consistente de déficits de flexibilidade cognitiva na população clínica com TEA, mas admitem existir descrições clínicas de comportamentos cotidianos inflexíveis diretamente relacionados à falha no constructo investigado. (p. 87) De forma geral, os domínios de interação social e comportamento parecem não interferir significativamente nos desempenhos dos testes selecionados para avaliação das funções executivas, reconhecimento de emoções e teoria da mente.(...) revelou ausência de diferença significativa no domínio da interação social. (p. 87) os resultados sugerem que a habilidade de Reconhecimento de Emoções é aquela que mais sofre a interferência das características cognitivas e comportamentais do TEA. (p. 88) cabe refletir sobre o percurso desenvolvimental da habilidade de conhecimento emocional no TEA (p. 88) O presente estudo se contrapõe em relação aos achados de Joseph e Flusberg (2004) quanto à correlação positiva entre funções executivas e teoria da mente como preditores da severidade de sintomas do TEA, mas, por outro lado, reforça o dado da correlação positiva entre teoria da mente e nível de desenvolvimento da linguagem. (p. 89) A atual concepção nosológica do Autismo como Transtorno do Espectro do Autismo centra-se na substituição de uma análise diagnóstica categorial por uma abordagem dimensional. (p. 91) (...) dicotomia existente entre significante e significado traz a plausível compreensão sobre o processamento de informações enquanto atividade que vai além do cognitivo, envolvendo emoções e atribuições de sentidos singulares aos significados compartilhados culturalmente. (p. 92) o nível de gravidade da linguagem no TEA (...) estimulou a busca de outros caminhos, conduzindo à reflexão sobre a urgência de criar processos compensatórios de avaliação e intervenção clínica para estas crianças. (p. 92) No entanto, em um momento histórico no qual as atitudes culturais para com o Autismo e a deficiência caminham para a defesa da neurodiversidade, é preciso, também, estudar e discutir como é ser uma pessoa com diagnóstico de autismo, com suas particularidades e diferenças. (p. 93)