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1.

Direito Administrativo e Direito Ambiental

O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é fruto da evolução dos direitos


e seu conteúdo o identifica como um direito fundamental da pessoa.

Essa normatividade que se forma e se desenvolve em torno do fenômeno ambiental já


tem merecido a atenção de doutrinadores que compreendem um trabalho de sua sistematização e
de busca de soluções possíveis para os diversos problemas que se apresentam, mas ainda não se
fez uma teoria do Direito Ambiental nem o faremos nós aqui. Talvez seja ainda cedo para se
discutir sobre sua autonomia, dada a natureza específica do seu objeto – ordenação da qualidade
do meio ambiente com vistas a uma boa qualidade de vida – que não se confunde nem mesmo
se assemelha com o objeto de outros ramos do Direito. Tem conotações íntimas com o Direito
Público, mas, para ser considerado tal, talvez lhe falte um elemento essencial: seu objeto não é
pertinente a uma entidade pública, ainda que seja de interesse coletivo. Quem sabe não seja ele
um dos mais característicos ramos do nascente conceito de Direito Coletivo, ou talvez seja um
novo ramo do Direito Social.1

O Direito Ambiental surgiu como ramo do Direito Administrativo, posto que, no


enfoque ambiental o Direito Administrativo atuou como regulador das atividades exercidas pelo
administrado, verificando sua legalidade, enquanto que o Direito Ambiental passa a dar ênfase
ao resultado dessa atividade. Diante da constante adaptação da regra de proteção e da escala de
importância do bem jurídico (meio ambiente), a matéria ambiental afastou-se assim, do Direito
Administrativo, compondo matéria própria.

Luiz Fernando Coelho definiu Direito Ambiental, como sendo: “Um sistema de normas
jurídicas que, estabelecendo limitações ao direito de propriedade e ao direito de exploração
econômica dos recursos da natureza, objetivam a preservação do meio ambiente com vistas à
melhor qualidade da vida humana.” 2

Para melhor fundamentar o assunto, apresentamos outra conceituação:

1
SILVA, J.A. da. Direito Ambiental Constitucional. 3.ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 41.

2
COELHO, L.F. Aspectos Jurídicos da Proteção Ambiental. Curitiba: Associação dos Diplomados da
Escola Superior de Guerra, Delegacia do Estado do Paraná, 1975. p.5.
2

O Direito Ambiental (no estágio atual de sua evolução no Brasil) é um conjunto de


normas e institutos jurídicos pertencentes a vários ramos do direito, reunidos por sua função
3
instrumental para a disciplina do comportamento humano em relação ao meio ambiente.

A ligação do Direito Ambiental e o Direito Administrativo, principalmente no que


concerne a proteção do meio ambiental, é explícita, pois o Direito Administrativo possui
relevância ímpar.

A CF-88, ao dispor sobre ao assunto, atribui ao Poder Público e à coletividade o dever


de defender o meio ambiente ecologicamente equilibrado. É a regra do art. 225, caput. O que se
desejou foi chamar a responsabilidade não só do Estado, como também dos cidadãos. Se é
verdade que o ideal é que a coletividade tenha noção de seu relevante papel em tal atividade,
verdade é também que nem todos possuem consciência da importância da questão. Disto resulta
que, na realidade, ao Poder Público é que cabe o papel principal na tutela do meio ambiente
sadio. De sua ação adequada e responsável deverá resultar, inclusive, efeito pedagógico ao atuar
no sentido do fortalecimento da consciência ecológica do povo. 4

Como base nesses ensinamentos de Vladimir Passos de Freitas, observa-se que, por
mais que esteja expresso na CF-88 de 1988, em seu art. 225, caput, o dever do Poder Público e
da coletividade em defender o meio ambiente, fica claro que, para que os cidadãos tomem
consciência de seu dever, é preciso que o Poder Público reúna esforço no sentido de defender o
meio ambiente sadio, para as presentes e futuras gerações, de forma que transpareça a
coletividade, não só a defesa em si, mas a necessidade de mantermos o meio ambiente sadio
para a conseqüente manutenção da própria vida, criando uma cultura de proteção que se
transmita as futuras gerações.

Sobre a interação do Direito Administrativo com o Direito Ambiental, na defesa do


meio ambiente, Vladimir Passos de Freitas escreve:

Ora, para alcançar tal desiderato o Estado vale-se das normas


constitucionais e infraconstitucionais. Quanto às ultimas, estabelece,
através da lei e de regras que a completam, a conduta dos que se
relacionam com o meio ambiente. Aos infratores, independente das
sanções civis e penais, impõe punições administrativas. Esta relação
jurídica que se estabelece entre o Estado e o cidadão é regrada pelo

3
MUKAI, T. Direito Ambiental Sistematizado. 3.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p.5.

4
FREITAS, V.P. de. Direito Administrativo e Meio Ambiente. 3.ed. Curitiba: Juruá, 2001, p.19.
3

Direito Administrativo que se reveste da maior parcela de


importância, tantas são as situações por ele reguladas. 5

Mais uma vez ressaltasse a importância do Direito Administrativo na defesa do meio


ambiente. Cabendo atentarmos para os instrumentos do Poder Público na defesa do meio
ambiente, tanto na esfera penal, civil e administrativa, tendo este, grande ênfase através do
Processo Administrativo Ambiental.

2. O processo de descentralização e desconcentração na adminstração ambiental


no Brasil

O processo de descentralização e desconcentração são necessários p/ a política ambiental, ou


seja;
um conjunto de atividades e procedimentos com os diferentes níveis
de competências e organizações, supranacionais, do Estado
(Administração Central, Autônoma e Local), e as empresas e
organizações não-governamentais, que pretendem alcançar
determinados fins de proteção do meio ambiente e conservação da
natureza.6

Mesmo antes da promulgação da Constituição Brasileira de 1988, a Lei nº 6.938/81, que


instituiu a Política Nacional de Meio Ambiente – PNMA, já previa um sistema descentralizado
de gestão ambiental no Brasil, por meio de um Sistema Nacional de Meio Ambiente –
SISNAMA, constituído por um órgão superior, um órgão consultivo deliberativo, um órgão
central, um órgão executor, órgãos seccionais e órgãos locais.

A discussão das questões referentes à centralização versus descentralização da política


ambiental brasileira – entendida como a transferência de poder à instância mais próxima do
usuário – é fruto de intenso processo de desenvolvimento da sociedade brasileira, que atingiu
um amadurecimento refletido em uma Constituição avançada sob o ponto de vista de meio
ambiente, porém com grandes desafios para sua implementação.

Por isso as ações de políticas públicas podem ser desempenhadas de diferentes maneiras tais
como as extremamente centralizadoras a serem feitas em parceria com outras instituições e
esferas de governo, ou com organizações da sociedade civil organizada, serem terceirizadas, ou
desconcentradas, participativas, publicizadas, ou ainda, descentralizada para outras esferas de
governo ou para a sociedade civil.

5
FREITAS, V.P. de. Direito Administrativo e Meio Ambiente. 3.ed. Curitiba: Juruá, 2001, p.19.

6
Cf. FERNANDEZ-VÍTORA, 1997.
4

A centralização é a alta concentração do poder (medida por critérios


de força, âmbito e extensão) nas mãos de uns poucos, num grupo
social organizado. Este termo passou a ser usado com frequência no
começo do século XIX, particularmente na França, para indicar o
processo de aumento do poder governamental, principalmente sobre
áreas locais7

Por outro lado: “A descentralização é a transferência da autoridade e do poder decisório de


instâncias agregadas para unidades espacialmente menores, entre as quais os municípios e as
comunidades, conferindo capacidade de decisão e autonomia de gestão para as unidades
territoriais de menor amplitude e escala”. 8

O consenso acerca da implementação da descentralização na gestão ambiental (assim como em


outras áreas) residiria no fato de que dessa forma haveria uma maior democracia nessa forma de
gestão e de que tal processo seria uma forma de prestação de serviços públicos mais eficaz que
geraria um maior contento social. Nota-se nesses casos um sistema menos burocrático que
acaba por conceder respostas mais rápidas às necessidades sociais.

A atividade administrativa pode ser prestada de duas formas, uma é a centralizada, pela qual o
serviço é prestado pela Administração Direta, e a outra é a descentralizada, em que o a
prestação é deslocada para outras Pessoas Jurídicas.

Assim, descentralização consiste na Administração Direta deslocar, distribuir ou transferir a


prestação do serviço para a Administração a Indireta ou para o particular. Note-se que, a nova
Pessoa Jurídica não ficará subordinada à Administração Direta, pois não há relação de
hierarquia, mas esta manterá o controle e fiscalização sobre o serviço descentralizado.

Por outro lado, a desconcentração é a distribuição do serviço dentro da mesma Pessoa Jurídica,
no mesmo núcleo, razão pela qual será uma transferência com hierarquia. A doutrina aponta
duas formas mediante as quais o Estado pode efetivar a chamada descentralização
administrativa: outorga e delegação.

A desconcentração é simples técnica administrativa, e é utilizada, tanto na Administração


Direta, quando na Indireta. Ocorre a chamada desconcentração quando a entidade da
Administração, encarregada de executar um ou mais serviços, distribui competências, no âmbito
de sua própria estrutura, a fim de tornar mais ágil e eficiente a prestação dos serviços.

7
DICIONÁRIO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, 1986, p.166.
8
BUARQUE, 1999, p. 16
5

A desconcentração pressupõe, obrigatoriamente, a existência de uma só pessoa jurídica. Em


outras palavras, a desconcentração sempre se opera no âmbito interno de uma mesma pessoa
jurídica, constituindo uma simples distribuição interna de competências dessa pessoa.

No Brasil o processo de implementação do regime federalista acabou por implementar a


descentralização na qual os dois principais instrumentos com que os municípios passam a
contar, como forma de ordenamento territorial e disciplinamento de suas atividades, são a Lei
Orgânica e o Plano Diretor, ambos presentes na CF de 1988. Nosso sistema de gestão ambiental
é caracterizado pelo uso de instrumentos de comando e controle (por meio de licenças, normas,
zoneamentos, padrões, fiscalização e monitoramento previstos na PNMA.

Quadro 1. Instrumentos de políticas ambientais, de acordo com HERRERO


(1996).
Tipos Aplicações

Instrumentos econômicos baseados no Incentivos diretos (impostos de


mercado e em instrumentos econômicos contaminação);
específicos. Incentivos indiretos (impostos de produtos
e
subsídios a substitutos limpos);
Criação de mercados ambientais
(mercados da
água, permissão de emissões
comerciáveis).

Instrumentos de regulação e normatização Normas diretas sobre a qualidade


(comando e controle). ambiental ou emissões contaminantes;
Regulação de processos, produtos,
equipamentos e insumos.

Instrumentos de auto-regulação Acordos voluntários do setor industrial;


voluntários Normas e exigências internas de controle
dos setores produtivos. ambiental.

Planejamento e investimento público. Mecanismos de vigilância e coação direta;


Intervenção direta com projetos, Procedimentos administrativos (AIA);
programas e planos de limpeza, depuração Fomento do desenvolvimento tecnológico
e eliminação de resíduos; e pesquisa.

Persuasão moral e co-responsabilidade Conscientização social, educação


social. ambiental e consumo racional;
Exortação ao consumo ecológico,
publicidade.
6

Acordos de gestão global. Convênios mundiais (Cúpula da Terra);


Acordos internacionais específicos

Medidas econômicas e estruturais. Ajustes estruturais;


Tipos de câmbio;
Política monetária;
Normas de trocas estrangeiras.
Reforma dos direitos de propriedade Propriedade de terras;
Contratos de arrendamentos;
Reformas setoriais.

Fonte: Adaptado de HERRERO (1996).

3. A tripartição de poderes e a distribuição de competências na


administração ambiental.

O art. 225 da Constituição impõe ao Poder Público o dever de defender e preservar o


meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Poder Público aqui pode ser
entendido da seguinte forma: é a expressão genérica que se refere a todas as entidades
territoriais públicas, para que cada qual o exerça nos limites das competências que lhe
forem outorgadas pela constituição (arts. 21 a 24).

À União cabe legislar sobre a proteção ambiental, no tocante à política geral do meio
ambiente, materializada na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente; elaborar e
executar planos nacionais e regionais de ordenamento territorial, materializado nos
instrumentos normativos referentes ao Zoneamento Ecológico-Econômico (Decreto nº
99.540/90 e Decreto nº 707/92); legislar sobre águas e energia (art. 22, IV),
materializada na Lei de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Lei nº 9.433/97), embora
tenham sido incluídas entre os bens dos Estados as águas superficiais ou subterrâneas,
fluentes, emergentes e em depósito, e elaborar e propor a política florestal,
materializada no Código Florestal (Lei n° 4.771/65).

No âmbito das competências comuns, o art. 23 dispõe sobre a competência material


comum entre os poderes. Essa competência diz respeito à prestação dos serviços
referentes àquelas matérias, à tomada de providências para sua realização, ou seja, é
uma competência mais voltada para a execução das diretrizes, políticas e preceitos
relativos à proteção ambiental.
7

A competência legislativa concorrente é a competência da União em estabelecer normas


gerais. No âmbito da competência dos estados, ele tem competência específica em
matéria de meio ambiente, tendo competência comum com a União, nos termos do art.
23, III, IV, VI e VII, e competência suplementar de normas gerais estabelecidas pelo
governo federal, nos termos do art. 24, VI, VII e VIII e seu § 2º.

No âmbito dos municípios, a competência para a proteção ambiental é reconhecida no


art. 23, III, IV, VI e VII, em comum com a União e os Estados; nesse dispositivo o que
se outorga é a competência para ações materiais, isto é, a execução de leis protetoras do
que propriamente legislar sobre o assunto. Nesse caso, cabe ao município legislar
supletivamente na matéria, na ausência de norma federal e estadual.

A discussão acerca da necessidade ou não de haver um instrumento legal, repassando ou


não as atribuições da União para os Estados e destes, para os municípios, no tocante às
questões ambientais, é simplesmente uma forma de o poder público jogar a
responsabilidade para os demais entes federados para escapar das críticas da má gestão
ambiental. Isto porque todos os entes federados, independentemente de haver ou não
uma lei complementar delegando ou estabelecendo competências, são co-responsáveis
pela questão ambiental, como estabelecido no artigo 225 da CF.

4. O SISNAMA (Sistema Nacional do Meio Ambiente)

Instituído pelo artigo 6º da PNMA e constituído por órgãos e entidades da União, dos
Estados, do Distrito Federal, dos territórios e dos municípios, além das Fundações
instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade
ambiental, e foi assim estruturado:
8

CONSELHO DE GOVERNO: ÓRGÃO SUPERIOR

CONAMA
CONAMA :: ÓRGÃO
ÓRGÃO CONSULTIVO
CONSULTIVO EE DELIBERATIVO
DELIBERATIVO

Secretaria
Secretaria do Meio Ambiente
do Meio da Presidência
Ambiente da Presidência da
da República
República
(ÓRGÃO CENTRAL)
(ÓRGÃO CENTRAL)

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos


Recursos Naturais Renováveis-IBAMA
Recursos Naturais Renováveis-IBAMA
(ÓRGÃO EXECUTOR)

Órgãos ou entidades da
administração pública
federal direta ou indireta
(Órgãos
(Órgãos Seccionais)
Seccionais)

1. Órgão superior: o Conselho de Governo, com a função de assessorar o Presidente da


República na formulação da política nacional e nas diretrizes governamentais para o meio
ambiente e os recursos ambientais.
2. Órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente
(CONAMA), com a finalidade de assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo,
diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e deliberar,
no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões compatíveis com o meio ambiente
ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida.
3. Órgão central: a Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República, com a
finalidade de planejar, coordenar, supervisionar e controlar, como órgão federal, a política
nacional e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente.
A Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República foi criada pela Lei n° 8.028, de
12/04/90 sendo transformada por meio da Lei n° 8.490, de 19/12/92, em Ministério do Meio
Ambiente. Em 1993, é transformado em Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal
pela Lei n° 8.746, de 09/12/93 e, em 1998, muda novamente de denominação, sendo
transformado em Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal
pela Lei n° 9.649, de 27/05/98. Recentemente, foi transformado em Ministério do Meio
9

Ambiente – MMA, pela MP n° 2.216-37, de 31/08/2001, convalidada pelo Decreto n° 4.118, de


07.02.2002.
4. Órgão executor: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis, com a finalidade de executar e fazer executar, como órgão federal, a política e
diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente.
5. Órgãos Seccionais: os órgãos ou entidades da administração pública federal direta ou
indireta, as fundações instituídas pelo poder público cujas atividades estejam associadas às de
proteção da qualidade ambiental ou àquelas de disciplinamento do uso dos recursos ambientais,
bem assim os órgãos e entidades estaduais responsáveis pela execução de programas, projetos e
pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental.
6. Órgãos Locais: os órgãos ou entidades municipais, responsáveis pelo controle e
fiscalização dessas atividades, nas suas respectivas jurisdições.

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