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A Voracidade do Tempo em uma Sociedade de Consumo: Análise

Semiológica do Filme Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme

Patricio Dugnani

Resumo
Pretende-se com esse artigo fazer uma análise semiológica do filme Wall Street, O Dinheiro Nunca Dorme,
filme lançado em 2010, com a direção de Oliver Stone. O filme apresenta uma forte relação com as
representações do tempo, com Saturno e com as formas cíclicas dos acontecimentos humanos. Essa análise
será feita utilizando-se o método desenvolvido por Roland Barthes. O método semiológico, de Roland
Barthes, parte da questão de que a imagem se organiza por uma relação entre signos denotados e signos
conotados. O sistema de signos denotados equivale ao sentido literal, pois se apresenta a partir do campo do
significante, que tem por imperativo apresentar-se ao testemunho do observador para, a partir de
associações convencionais, balizadas e constituídas nas relações sociais e culturais, se unir a um significado e
representar-se como um signo, que potencializa-se para instituir um sentido. Essa análise justifica-se pela
possibilidade de ampliar o entendimento da linguagem visual, utilizada com muita intensidade na pós-
modernidade, devido ao desenvolvimento tecnológico dos meios de comunicação digital, e as técnicas de
reprodução.
Palavras-Chave: Cinema, Imagem, Semiologia, Tempo

Abstract
This article aims to analyse the Semiologic movie Wall Street, money never sleeps, movie released in 2010,
with directed by Oliver Stone. The film features a strong relationship with the representations of time, with
Saturn and with the cyclic forms of human events. This analysis will be made using the method developed by
Roland Barthes. The semiological method, Roland Barthes, part of the point that the image is organized by a
relationship between signs denoted and battling signs. The system of signs denoted is equivalent to the literal
sense, because it presents from the significant field, which is imperative to the observer, from conventional
associations, buoyed and organized social and cultural relations, join a meaning and represent itself as a sign
that leverages to establish a sense. This analysis is justified by the possibility to broaden the understanding of
visual language, used with a lot of intensity in Postmodernity, due to the technological development of digital
media, and breeding techniques.
Keywords: Image, Semiology, Time

Introdução
Saturno, o pai tempo, o devorador de seus filhos, retratado, tradicionalmente, como um homem
velho, de barbas, e asas brancas, segurando uma foice. Saturno faminto e insaciável, o tempo
faminto e insaciável. Saturno é a metáfora do tempo. Saturno, que seria fonte de inspiração para a
representação da morte na Idade Média. O ceifador. Saturno também, em algumas representações
do século XVII e XVIII, era representado como um homem com uma perna da pau, ou seja um pirata.
Nesse momento, também, sendo conhecido como o patrono dos ladrões. Ou seja, Saturno, o
tempo, seria o maior dos ladrões: aquele que rouba o tempo, ceifa a vida.
Mas qual a relação entre Saturno e o filme Wall Street, O Dinheiro Nunca Dorme (2010)?
Diria: o tempo, a fome insaciável, a voracidade. Essa é uma relação curiosa que o diretor Oliver
Stone e sua equipe, encontraram para a escolha das imagens, e o texto, para representar as ideias
do filme.
Durante o filme, imagens que representam o tempo e Saturno são muito recorrentes: relógios,
relação pai e filha, mestre e discípulo, ou até mesmo, o quadro de Francisco Goya representando
Saturno, que é apresentado em algumas cenas.
Pretende-se com esse artigo, a partir dessa reflexão, fazer uma análise semiológica do filme Wall
Street, O Dinheiro Nunca Dorme, filme lançado em 2010, com a direção de Oliver Stone. O filme
apresenta uma forte relação com as representações do tempo, com Saturno e com as formas
cíclicas dos acontecimentos humanos. Essa análise será feita utilizando-se o método desenvolvido
por Roland Barthes. O método semiológico, de Roland Barthes, parte da questão de que a imagem
se organiza por uma relação entre signos denotados e signos conotados. O sistema de signos
denotados equivale ao sentido literal, pois se apresenta a partir do campo do significante, que tem
por imperativo apresentar-se ao testemunho do observador para, a partir de associações
convencionais, balizadas e constituídas nas relações sociais e culturais, se unir a um significado e
representar-se como um signo, que potencializa-se para instituir um sentido. Essa análise justifica-
se pela possibilidade de ampliar o entendimento da linguagem visual, utilizada com muita
intensidade na pós-modernidade, devido ao desenvolvimento tecnológico dos meios de
comunicação digital, e as técnicas de reprodução.
Método Semiológico De Análise De Imagem
A escolha da semiologia para a análise do filme se deu pelo fato de que, ao se analisar os signos e
sua organização, deve-se partir, segundo Barthes, de um campo mais concreto e objetivo para um
campo mais abstrato e representativo. Ou seja, para Barthes, a análise deve seguir do “óbvio” para
o “obtuso” – da denotação para a conotação: “(...) a imagem literal é denotada e a imagem
simbólica é conotada” (BARTHES: 1990, p. 31).
Os sistemas de signos se dão à percepção, ao sensorial, primeiramente, pelo campo de sua
materialidade, pelo campo de sua expressão. A parte material dos signos se apresenta a partir do
significante que, segundo Ferdinand Saussure:
[...] não é a coisa puramente física, mas a impressão (empreite) psíquica [...] desse som), a
representação que dele nos dá testemunho de nossos sentidos; tal imagem é sensorial e, se
chegamos a chamá-la “material”, é somente neste sentido, e por oposição ao outro termo da
associação, o conceito, geralmente mais abstrato. (SAUSSURE: 1995, p. 80)
A imagem se organiza por uma relação entre signos denotados e signos conotados. O sistema de
signos denotados equivale ao sentido literal, pois se apresenta a partir do campo do significante,
da imagem acústica, que tem por imperativo apresentar-se ao testemunho do observador para, a
partir de associações convencionais, balizadas e constituídas nas relações sociais e culturais, se unir
a um significado e representar-se como um signo, que potencializa-se para instituir um sentido.
O laço que une o significante ao significado é arbitrário ou então, visto que entendemos por
signo total resultante da associação de um significante com um significado, podemos dizer mais
simplesmente: o signo linguístico é arbitrário. (SAUSSURE: 1995, p. 81)
Por outro lado, a imagem, como sistema de signos conotados, se institui a partir do campo do
significado. Os signos conotados se apresentam a partir da outra parte que compõe o signo, a parte
imaterial, o campo “mais abstrato”, cuja possibilidade de compor um sentido de uma mensagem
depende, por um lado, do significante, de sua expressão, de sua materialização, do sensorial, e, por
outro, das relações simbólicas, alicerçadas na linguagem em relação à constituição cultural formada
nas relações sociais e em seus arbítrios.
Diremos, pois, que um sistema conotado é um sistema cujo plano de expressão é, ele próprio,
constituído por um sistema de significação; os casos correntes de conotação serão
evidentemente constituídos por sistemas complexos, cuja linguagem articulada forma o
primeiro sistema. (BARTHES: 1992, p. 95)
Logo, para Barthes, são três mensagens constituídas a partir das imagens e esta será a ordem que
esta pesquisa seguirá para analisar o discurso visual. A imagem se revela à percepção
imediatamente como uma primeira mensagem, como “uma série de signos descontínuos”
(BARTHES: 1990, p. 28). Contudo, este conceito é meramente operacional, pois a imagem revelada
à consciência de um observador já é, imediatamente, alicerçada e contextualizada, tornando-se,
inicialmente, uma mensagem literal. Ao reconhecer os objetos de uma imagem, ou, mesmo, ao se
lançar uma hipótese sobre o que a imagem se assemelha, já se perde a inocência da imagem,
relacionando-a a algum contexto. Neste sentido, a primeira e a segunda mensagens estão
relacionadas desde a percepção da imagem à sua ancoragem em algum reconhecimento, alguma
similaridade. A percepção e a busca de uma associação por similaridade da imagem, com um
fenômeno, tornam-se atos intrinsecamente relacionados e simultâneos. Este é o momento da
denotação, da relação literal entre signo e fenômeno na imagem. Desta forma, estando as duas
primeiras mensagens entrelaçadas, resta a terceira mensagem: a dos signos conotados.
A mensagem conotada, simbólica e cultural, em sua superfície se constitui em uma dificuldade em
se estruturar a análise, pois, segundo Barthes, “(...) a originalidade desse sistema é que as
possibilidades de leitura de uma mesma lexia (uma imagem) é variável segundo indivíduos (...)”
(BARTHES: 1990, p. 38). Ou seja, este sistema, observado em sua superfície, parece sempre indicar
inúmeras, quase infinitas relações, onde a convenção necessária para que o sistema se torne
compreensível (codificável e decodificável) pareça impossível de se constituir. Contudo, ao se
analisar estas relações em sua verticalidade, alicerçando as relações simbólicas, o campo da
conotação, nas relações literais, no campo da denotação, é possível constituir uma leitura, pois,
numa análise profunda, os signos se tornam mais raros e mais relacionados, por isso, mais
classificáveis.
A imagem em sua conotação, seria, assim, constituída por uma arquitetura de signos provindos
de uma profundidade variável de léxicos (de idioletos), cada léxico, por mais “profundo” que
seja, sendo codificado, se, como se pensa atualmente, a própria psichê é articulada como uma
linguagem: quanto mais se “desce” à profundidade psíquica de um indivíduo, mais raros são os
signos e mais classificáveis (...). (BARTHES: 1990, p. 39)
Para realizar a análise semiológica da imagem, primeiramente percebem-se e associam-se, por
semelhança, os signos apresentados; desta forma, atinge-se o nível literal (denotação) da leitura
destes discursos visuais que são as imagens. Depois, busca-se analisar em profundidade, no sentido
vertical, as relações simbólicas (conotação) dos significados que compõem os signos da imagem,
entendendo-se as estratégias das relações socialmente arbitrárias que compõem esta mensagem,
em busca da compreensão de qual sentido, dentro de um contexto cultural, se constitui a partir das
relações sígnicas compostas neste discurso. Desta forma, pretende-se revelar a “retórica da
imagem”, suas estratégias, suas artimanhas.
Barthes, por exemplo, distingue três tipos de mensagens na publicidade ilustrada. Apenas duas
delas são codificadas. A primeira é a mensagem verbal, que depende do código da língua. Ela
consiste no nome da marca e no comentário verbal das qualidades do produto. As duas outras
mensagens são inseridas na imagem visual: uma é a mensagem icônica não codificada, da qual
a imagem fotográfica denota analogamente os objetos “reais” de maneira que o significante e
o significado são quase “tautológicos”, e a outra é uma mensagem icônica codificada (ou
simbólica). De acordo com Barthes, a última inclui as conotações do quadro em que se forma a
imagem específica do produto que deve ser transmitida aos consumidores. (NÖTH &
SANTAELLA: 2011, p. 81)
Equipando-se desta metodologia, baseada na semiologia de Ferdinand Saussure e nas reflexões
sobre a imagem de Roland Barthes, pretende-se desenvolver a análise dos signos do filme nessa
pesquisa. Partindo-se dos aspectos concretos, formais, denotados e das qualidades puras da
imagem, pode-se chegar à compreensão das relações entre os signos que constituem o campo da
representação, do conteúdo, da conotação.
Análise do filme
Sinopse
O filme dirigido por Oliver Stone, é uma continuação de Wall Street, Dinheiro e Cobiça, de 1987, e
conta a história de Gordon Genko, interpretado por Michael Douglas, que foi no primeiro filme
preso por golpes na bolsa de valores. Genko, no início do filme está saindo da prisão e passa a fazer
palestras sobre o livro que escreveu na cadeia. Ele é procurado por Jacob Moore, interpretado por
Shia LaBeouf, que namora a filha de Genko Winnie, interpretada por Carey Muligan, a qual odeia o
pai, e não pretende reatar essa relação. Moore procura Genko, e os dois tem um inimigo comum,
Bretton James, interpretado por Josh Brolin, o qual teve interferência na derrocada de Genko, e na
falência do mentor de Moore, Lewis Zabel, interpretada por Frank Langella, o qual se suicidou por
causa da crise de seu banco de investimentos, a Keller Zabel.
A questão do tempo
“Se ao menos tivessemos mais tempo”, aos 2 min e 30 segundos do filme, a personagem Lewis
Zabel, interpretada por Frank Langella, parece estar apresentando seu epitáfio, pois após um
problema com as bolsas de valores, a empresa Keller Zabel, capitaneada pela personagem parece
ruir. Essa angústia contra apassagem do tempo, Zabel também apresenta aos 11 minutos e 39
segundos, quando ele afirma: “Envelhecer não é para os fracos”. Contudo, essa opinião não é
exclusiva de Lewis Zabel, Gordon Genko, uma das personagens principais do filme, também, aos 39
minutos e 0 segundo, sentencia: “O dinheiro não é a coisa mais importante da vida, o tempo é”.
Muitas citações ao tempo, através de objetos e falas podem se fazer perceber, entre elas, citações
ao movimento do tempo, à sua circularidade, ao seu aspecto cíclico, esse tema nota-se através de
relógios, anéis e bolhas, que constantemente são destacadas nas cenas do filme.
O relógio que marca a hora no início, 4 minutos e 04 segundos, se agiganta atrás de Jacob Moore,
aos 10 minutos e 49 segundos. Retorna quando apresentado e destacado no pulso, aos 25 minutos
e 44 segundos, além de ser visto durante todo o filme, inclusive no final em torno de 1hora 58
minutos e 31 segundos.
Além do relógio, a persistência das bolhas, e seu formato circular e etéreo, também fazem alusão
ao tempo. No filme o debate constante, que aparece logo no início, e volta ao final, da mãe de todas
as bolhas, é reforçado aos minutos e 2 segundos do filme quando Genko afirma que os “…
relacionamentos são como bolhas frágeis” fazendo uma alusão ao lado etéreo do tempo. Essas
bolhas também sao vistas quando as crianças brincam com bolhas de sabão no parque, aos 19 e 20
minutos do filme, no mesmo momento em que Lewis Zabel, o mestre, e Jacob Moore, o discípulo,
discutem sobre a vida e o tempo, pouco antes da morte do mestre.
Ou seja, tanto na escolha das imagens e dos objetos a serem destacados no filme, quanto ao texto,
Oliver Stone e sua equipe, parece desenvolver - para além da narrativa das relações humanas, da
ganância, da sociedade de consumo – um debate sobre o tempo, e os efeitos dele no ser humano,
e quanto desse tempo, é perdido, quanto desse tempo é roubado, ou disperdiçado, sendo
consumido como mercadoria. E se tudo tem de virar mercadoria, em uma sociedade de consumo,
como afirma Zygmunt Bauman (2008), o tempo, pelo menos como o observamos, também deveria
virar produto. Contudo, com o tempo é diferente, pois quem brinca com o pai tempo, com Saturno,
com o patrono dos ladrões, acaba roubado.
O tempo roubado de Genko, quando estava na prisão, parece cobrá-lo a todo momento, contudo
Saturno, o pai tempo, parece incorporar diversas personagens, pois o próprio Genko, é acusado de
agir como Saturno, por sua filha Winnie, por ser responsável pela morte de seu irmão Rudy. Ou
seja, Genko, de certa forma, consumiu o próprio filho, assim como na mitologia faria o Pai tempo
em relação à sua prole. Tudo em nome do poder, do dinheiro. O consumo voraz, a fome insaciável
parece ser a tônica do filme, tanto quanto de nossa sociedade de consumo. Esse sentimento é
tanto, pois como em uma metáfora à mitologia greco romana, Oliver Stone, trás essa tragédia para
os dias atuais, e Gordon genko apresenta suas garras, sua paranóia, à maneira de Saturno, e
sentencia à 1 hora, 08 minutos e 2 segundos do filme: “Os pais são os ossos com que os filhos
afiam os dentes”.
As citações mitológicas não se limitam exclusivamente ao deus Saturno, mas se irradiam por todo
o enredo. Pode-se perceber na morte de Lewis Zabel, uma citação ao rio Lete, o rio do
esquecimento, e a Caronte, o barqueiro que leva às almas para o submundo. Zabel desse ao
submundo, ou ao Subway, ou seja ao metrô, e se joga no fluxo dos trilhos, como se mergulhasse no
esquecimento, no Rio Lete.
Além dessa citação, outra que trás a idéia da possibilidade da imortalidade, ou no mínimo, ao ciclo
da vida, é a da empresa de petróleo, que está nas investigações de Moore, sobre as açoes de Josh:
a Hydra Offshore. A hydra biológicamente, é um animal (um celenterado, se não me falha a
memória), que é capaz de se reconstituir, mesmo se for triturada. Na mitologia, a hidra é o dragão
de nove cabeças, do mito de Hércules e seus doze trabalhos, que se tiver uma delas estirpada, é
capaz de reconstituí-la. Ou seja, a Hidra é capaz de vencer o tempo, tendendo a imortalidade, e
Saturno, travetido de Gordon Genko, com o auxílio de Jacob Moore, não pode deixá-la viva,
principalmente porque ela está sobre o controle de Bretton James. O tempo é implacável, em sua
foracidade, embora, Brettons James, equivocadamente, aos 49 minutos e 04 segundos, se
apresenta como o detentor do tempo, o dono de Saturno, pois apresenta a James Moore, um
estudo do quadro de Francisco Goya, Saturno devorando o filho (1819 – 1823), como símbolo do
seu poder, porém, ninguém está isento dos poderes do tempo.
Nessa batalha de titãs, Breton James é derrotado, e se vinga de Saturno, rasgando o quadro de
Francisco Goya, que estava na parede de sua casa, uma alusão ao tempo invencível, como todos, o
tempo o derrotou, e ele atirou sua fúria contra Saturno.
Observando atentamente o filme, fazendo o levantamento de seus signos, analisando as suas
combinações, foi possível perceber a relação entre os signos verbais e visuais do filme, e
compreender a ligação entre o discurso do filme e as representações mitológicas resgatadas, que
nos levam a entender o filme, Wall Street, O Dinheiro Nunca Dorme, para além de uma história
sobre personagens, mas como uma busca do entendimento do tempo, em uma sociedade
capitalista, que valoriza acima de tudo, acima mesmo da própria vida, e do tempo, o dibheiro.
Considerações Finais
Por fim, o maior vitorioso, simbolicamente, no final do filme, é o tempo. Ele acaba por ensinar
Gordon Genko, ao observar um ultrassom, à 1 hora 52 minutos e 20 segundos, que a vida continua
e se transforma. Pois no ultrassom, está seu neto, que faz com que ele reflita - após ter devorado,
ou melhor traído sua filha, e seu genro - como tinha afirmado antes, que o tempo é o bem mais
valioso, e sentencia resumidamente: “… bem mais valioso”. Essa consciência faz com que ele
regurgite simbolicamente sua filha e seu genro, ou melhor os ideais deles de investir em energia
limpa, , e salva a empresa que pesquisava a fusão a sol, que Jacob Moore tenta financiar o filme
inteiro. Ou seja, Saturno, como na Mitologia não devora Jupiter, pois é enganado por sua esposa, e
Jupiter retorna para desbancar o pai, Jupiter o raio, a luz. Contudo, Saturno, como Gordon Genko,
nesse caso, acaba por alimentar a luz, o sol.
Enfim, a partir da análise das constantes de signos, que se repetem e se distribuem, combinando-
se a outras sequências no filme, foi possível analisar a representação do filme, a constituicão de
significados, que utilizaram de representações mitológicas, como metáforas do efeito do tempo, e
da voracidade desse tempo, que nos consome, aparentemente, cada vez mais rápido, na dinâmica
da sociedade de consumo. Consumimos, os objetos, consumimos o tempo como mercadoria, e ele,
o imortal Saturno, não se deixe enganar com isso, nos consome, como os filhos que ainda devorará
pela eternidade.
Referências
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____________. Roland Barthes por Roland Barthes. São Paulo: Estação Liberdade, 2003.
____________. O Prazer do Texto. São Paulo: Iluminuras, 2002.
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____________. O Óbvio e o Obtuso. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1990.
____________. A Aula. São Paulo: Cultrix, 1979.
BAUMAN, Z. Vida para Consumo. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
DUGNANI, P. A Herança Simbólica na Azulejaria Barroca: Os Painéis do Claustro da Igreja de São
Francisco da Bahia:. São Paulo: Editora Mackenzie, 2012.
SANTAELLA, L., e NOTH, W. Estratégias Semióticas da Publicidade. São Paulo: Cengage Learning,
2010.
__________________________. Imagem. São Paulo: Iluminuras, 1999.
SANTAELLA, L. Por que as Comunicações e as Artes estão Convergindo. São Paulo: Paulus Editora,
2005.
SAUSSURE, F. Curso de Lingüística Geral. São Paulo: Cultrix, 1995.

Cinemarginália: o cinema marginal de Júlio Bressane e seu diálogo com a


Tropicália

Ana Beatriz Buoso Marcelino 63

Resumo
Este estudo pretende investigar as imersões da Tropicália na construção dos primeiros longas-metragens do
cineasta brasileiro Júlio Bressane, cujos filmes foram concebidos dentro de uma estética considerada áspera,
rudimentar, híbrida, alegórica e antropofágica que viriam a dialogar com as características engajadas do
movimento citado. Dessa forma, propomos tal apreciação sob um ponto de vista voltado à suspeita de uma
postura híbrida e reinterpretativa do cineasta a qual deflagraria o surgimento de um suposto pós-
tropicalismo. Em meio a esse universo marginal e paralelo, tal cenário explosivo aparentou lançar seus
estilhaços sobre várias áreas culturais, deflagrando uma conturbada fase de mutação do cinema nacional.
Seguido do Cinema Novo, o Cinema Marginal apareceria como uma nova vertente do cinema brasileiro
moderno, com a proposição de uma inovadora vanguarda ou “antivanguarda”, na recusa pelos moldes da
narrativa convencional, equacionando a experimentação como forma maior de expressão e conciliando a
invenção estética ao debate político. Tal concepção, por sua vez, seria marcada tanto por sua autonomia
experimental quanto por um viés ideológico voltado ao sentimentalismo nacionalista, assim como, do resgate
à concepção oswaldiana de modernismo, com a característica de questionar e elevar a produção cultural
brasileira em anteparo às forças dominantes da hegemonia sobre o cinema. Tal ousadia, todavia, geraria um
rompimento radical com o público, acostumado ao contato direto com o espetáculo, com o exclusivo objetivo
de provocar e inquietar o espectador. Partindo dessas ideias este trabalho pretende problematizar tais
pressupostos contando com uma fundamentação atrelada à exemplificação por meio da análise de recortes
de alguns filmes do escopo do cineasta: Cara a cara (1967), Matou a família e foi ao cinema (1969), O anjo
nasceu (1969), Barão Olavo, o horrível (1970) e A família do barulho (1970), muitas vezes marcados por
efeitos como a disjunção e a teleologia fragmentada, além da obsessão pelo abjeto, os quais produtores de
um efeito aparentemente caótico e repulsivo ao olhar do espectador. Sendo assim, apontaremos as ideias de
Xavier (2012), Favaretto (2007), Ramos (1987) e Dunn (2009), dentre outros teóricos que colaboram para

63
(UNESP) – abbuoso@bol.com.br

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