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Porto Velho, 18 de março de 2011

Uma crítica ao caos urbano


As enchentes e alagações estão na ordem do dia no estado de Rondônia e, particularmente,
em Porto Velho. Tais ocorrências podem ser interpretadas como consequência dos ditos
“desastres naturais”. Todavia, não é difícil perceber que ano a ano estes eventos estão se
tornando cada vez mais freqüentes e, suas consequências, mais graves em decorrência da ação
humana sobre o ambiente. Nesse caso, evidencia-se a forma com que o homem transforma o
espaço e, muitas vezes, o tornando-se vulnerável aos fenômenos naturais. Eventos naturais
somente se convertem em desastres no momento em que resultam em prejuízos aos seres
humanos; ou seja, a presença de fatores que provocam riscos ambientais também faz parte da
sociedade, porém os danos ambientais são potencializados pela ação humana. Em suma, a
ocorrência de enchentes e alagações em nossa cidade e estado, propalados como desastres
naturais, não são tão naturais.

Desde o início deste ano, quase que semanalmente estamos vivenciando situações de
enchentes e alagamentos em Porto Velho. Esta situação pode ser tratada como um problema
comum em um município em franco e desordenado crescimento. E, adicionado a este fato e
com gravidade e magnitude semelhantes, a região enfrenta problemas no sistema
habitacional, de transportes, de saúde, de educação e de segurança pública. E selando toda
essa problemática, temos como pano de fundo, a grave desordem do uso e ocupação do solo.

Para amenizar estes problemas em benefício da população, seria necessário que os diversos
atores e setores responsáveis pela gestão pública Estadual e Municipal planejassem suas ações
e investimentos aplicando-os de forma articulada e priorizando a ordenação e o
gerenciamento do processo de desenvolvimento da região.

Hoje, as secretarias de governos Estadual e Municipal estão de maneira segmentadas que é


difícil saber qual é a responsável por determinada ação pública. Principalmente quando
estamos falando de obras de infra-estrutura financiadas pelo Governo Federal e também pelas
medidas compensatórias das Usinas Hidrelétricas do Madeira. Num momento vemos equipes
trabalhando para pavimentar ruas e, após o término dos serviços, vem outra equipe rasgando
o asfalto para passar a tubulação de água. Em seguida, após o término deste, outra equipe
instalando a rede de esgoto. E, neste contexto, não existe nenhuma equipe pensando se os
igarapés urbanos têm condições de receber toda água das chuvas ou se a rua tem caimento
suficiente para não alagar com frequência. Mas, quando questionados a respeito, a resposta é
a mesma. São diferentes secretarias envolvidas, tanto do governo Estadual quanto Municipal,
responsáveis pelos serviços e, como detectado, que não mantêm diálogo.

Pode-se, inclusive, citar que, com o advento dos investimentos atuais, combinados com os
futuros royalties dos grandes empreendimentos da região, é de se esperar a melhoria de
qualidade de vida da população. Contudo, como até o presente momento não se observa o
gasto planejado destes investimentos, paira um grande risco de não resultar em melhorias
para a população. Vide exemplos de diversas experiências no Brasil que embora exista
correlação entre, por exemplo, royaltes e investimentos em educação e saúde (devido
principalmente vinculação de receita), não traduzem crescimento sobre o Índice de
Desenvolvimento Humano – IDH - dos municípios (a exemplo de Macaé, Campos, Paulínia). O
qual foi recentemente confirmado pelo economista carioca Daniel Bregman, em sua
dissertação de mestrado, tendo como objeto, os efeitos dos royalties sobre os IDHs dos
municípios.

Muito embora seja salutar reivindicar justas compensações financeiras, “planejar”


investimentos setorizados e deslumbrar-se com o aporte financeiro derramado na região, é de
vital importância priorizar a integração das políticas públicas com vistas ao desenvolvimento
regional e que presume responsabilidades em todas as esferas de governo.

As ações pontuais devem ser integradas, mesmo que não sejam executadas no mesmo período
de tempo. A integração da política urbana se dá no território, no local onde estas políticas
setoriais se concretizam. Isso requer que os municípios assumam a responsabilidade pelo
planejamento e coordenação das intervenções no seu território, bem como assumam a
iniciativa de planejar “a cidade que queremos”.

Assim, as ações a serem ou já realizadas devem estar em concordância com a Política de


Desenvolvimento Urbano. E, que Política de Desenvolvimento Urbano nós temos? A expansão
e o adensamento das áreas urbanas de Porto Velho estão orientados pela capacidade da infra-
estrutura instalada, projetada e dos recursos naturais?

Urge então, a atenção redobrada de efetivar a implantação, constante avaliação e o


cumprimento das diretrizes apontadas por Planos Diretores, Planos Municipais de
Saneamento, Planos Integrado de Gestão de Águas Urbanas (cabe aqui, o estudo e realização
de macrodrenagem), entre outros instrumentos, previstos no Estatuto da Cidade (Lei 10.257,
de 10 de julho de 2001).

Trata-se de tarefa árdua, mas necessária e urgente, pois ao contrário de um grande número de
cidades das regiões sul e sudestes, tem-se em mãos a oportunidade de aprender com os erros
cometidos e, de fato, implantar um novo modelo de desenvolvimento, sustentável e de justiça
social.

A cidade é apenas o reflexo de quem nela vive. Mudando a maneira como nos comportamos e
agimos, conseguiremos um lugar mais justo e confortável para vivermos.

Marcelo Melo Barroso Tatiane Checchia


Dr. em Hidráulica e Saneamento Ms. em Engenharia Ambiental
Professor do Departamento de Eng.Civil Professora do Departamento de Eng.Civil
Universidade Federal de Rondônia Universidade Federal de Rondônia

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