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MOTRICIDADE E CRIANÇA: O MOVIMENTO COMO PRÁTICA PEDAGÓGICA

PARA UMA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

Carlos Janerlândio da Silva Araújo


Graduado em Licenciatura em Educação Física pela Universidade Estadual do Rio Grande do
Norte – UERN
Discente do Curso de Especialização em Educação Inclusiva
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte – IFRN

Verônica Dantas de Araújo Albano


Especialista em Educação e Contemporaneidade pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Rio Grande do Norte – IFRN
Orientadora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte –
IFRN

Resumo: O presente estudo tem como objetivo discutir a motricidade/movimento enquanto


prática pedagógica para uma educação inclusiva. A metodologia teve uma abordagem
qualitativa do tipo bibliográfica. Para tanto, foi feito uma revisão bibliográfica sobre a
produção do conhecimento, para buscar subsídios teóricos para o trabalho. Assim, foram
realizadas pesquisas por meio de uma breve revisão de materiais bibliográficos tais como
artigos e livros, organizados de acordo com o assunto que demanda este trabalho Para
dialogar com o estudo realizado na pesquisa, utilizou-se autores como: Mantoan (2003), que
discute a respeito das questões da educação inclusiva; Freire (1991; 2009), que discorre sobre
motricidade e movimento; Le Bouch (1982) e Nista-Piccolo e Moreira (2012), que colaboram
com os estudos sobre a criança o movimento, dentre outros. Por meio da pesquisa realizada,
pôde-se perceber e inferir que a motricidade e suas diversas facetas práticas, exerce um papel
significativo na educação inclusiva de crianças, pois, diante das suas especificidades, permite
a esses sujeitos o reconhecimento de seus próprios limites e possibilidades corporais,
propiciando a fruição de atividades motoras que experienciam relações com outros sujeitos
singulares e com outras manifestações culturais.

Palavras-chave: Educação inclusiva. Motricidade. Movimento. Crianças.

1 INTRODUÇÃO

O movimento exerce função importante no processo de desenvolvimento das crianças.


O deslocamento de parte ou de todo o corpo está presente em todas as ações praticadas pelo
ser humano, desde as mais básicas como, por exemplo, as voltadas à alimentação e à
comunicação (FREIRE, 1991). Dessa forma, compreende-se que, nos primeiros anos de
escolarização, sobretudo na Educação Infantil (pré-escola) e nos anos iniciais do Ensino
Fundamental, a atividade motora é essencial para o estabelecimento de relações entre o ser
humano em desenvolvimento e o ambiente que o cerca.
O desenvolvimento da motricidade contribui para uma aprendizagem cheia de
significados, produzindo sentidos para a criança, que aprende com o uso do seu próprio corpo.
Entende-se, nesse sentido, que o movimento tem uma grande importância para o
desenvolvimento e para a aprendizagem das crianças, tanto no âmbito social, quanto no
cognitivo e motor. Percebe-se que o movimento perpassa muito mais do que simples
expressões corporais, ele, na verdade, está presente em todas as etapas da vida, e o seu
desenvolvimento adequado na infância influencia as ações e reações dos indivíduos na fase
adulta, tendo em vista que, no ser humano, os aspectos intelectuais estão ligados às dimensões
motoras (COLELLO, 1993).
Segundo Freire (1991), a motricidade tem seu papel destacado e dada sua importância
como expressão concreta do movimento nas suas mais diversas formas, seja por meio do tato,
da visão, da locomoção ou de outros sentidos e manifestações que esse fenômeno
proporciona. Ela, nesse sentido, para o autor, constitui os seres no ambiente, no mundo que
estão envolvidos e, por mais que estes apresentem deficiências, limitações ou empecilhos,
lhes são possibilitados a inclusão no meio social.
Nesse sentido, a educação pela motricidade no contexto escolar pode desenvolver, nas
crianças, uma maneira mais adequada e apropriada quanto à aprendizagem, bem como ao seu
desenvolvimento integral. Segundo Colello (1993), várias das habilidades motoras a serem
desenvolvidas adequadamente nos alunos como, por exemplo, a coordenação motora geral, a
lateralidade, a coordenação motora fina, a noção temporal, a noção espacial, a autopercepção
corporal, entre outras, podem auxiliar a criança a começar a ler, escrever e ter seu
desenvolvimento integral de uma forma mais interessante, além de facilitar o processo de
aprendizagem desta.
Diante disso, a motricidade, ou seja, o movimento e suas dimensões afetiva, social,
motor, cognitiva, bem como sua abordagem e aplicação pedagógica, certamente, quando tem
efetiva ação, contribui, de forma significativa, para o processo de inclusão de crianças no
ambiente escolar, isto é, para o processo da educação inclusiva.
Sobre a educação inclusiva, Mantoan (2003) diz que ela é um processo que prevê não
somente o acesso ao ambiente escolar por meio da obrigatoriedade das matrículas, mas
também a devida permanência e, certamente como principal aspecto, o desenvolvimento dos
alunos de acordo com suas especificidades e potencialidades. Ressalta-se que a inclusão
escolar é um mecanismo que pressupõe o atendimento a todos, independente da situação
física, mental ou social.
Prieto (2006) pontua que as atividades que tenham o objetivo da inclusão escolar não
podem, e não devem, fazer negação ao diferente, pelo contrário, é necessário, e fundamental,
a total compreensão e respeito pela diversidade. A valorização dessa condição, nesse sentido,
é um elemento que contribui para a educação escolar e, consequentemente, para o
desenvolvimento de quem participa. Entretanto, muitas das atividades que são desenvolvidas
fazendo uso do movimento não ocorrem da maneira adequada devido a inúmeros fatores, tais
como a falta de locais, espaços e materiais que venham contribuir para o acontecimento da
prática de maneira adequada, com recursos apropriados, em um local específico e com
professores devidamente qualificados para abordarem essas atividades.
Dessa forma, as motivações para o desenvolvimento do presente estudo se deram
mediante a rotina do trabalho docente no interior de escolas públicas do sujeito-pesquidor
desta investigação, o qual, em sua prática, utiliza o movimento como ferramenta pedagógica
e, de forma pontual e significativa, perante uma ótica frente ao entendimento do movimento,
nas suas diversas dimensões, como uma abordagem prática que possibilita a efetivação de
uma educação inclusiva.
Portanto, mediante as inquietações mencionadas e as questões que permeiam a
motricidade e sua participação na educação inclusiva, o presente trabalho tem por objetivo
discutir a motricidade enquanto prática pedagógica para uma educação inclusiva. Para tanto,
realizou-se uma pesquisa de natureza bibliográfica, no intuito de possibilitar o encontro com a
literatura disposta e, por meio de leituras e análises de artigos e livros, atender às demandas
do estudo.

2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

O direito social à educação é garantido por mecanismos de Leis e Decretos. A


Constituição Federal de 1988, no seu artigo 205, diz que a educação é um direito de todos e
dever do Estado e da família, ressaltando, posteriormente, em seu Artigo 208, que o Ensino
Fundamental, obrigatório e gratuito, deve ser afirmado igualmente para os que não tiveram
ingresso na devida idade certa (BRASIL, 1988). Esses direitos também são afirmados na Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 9394, de 1996. Esta, por sua vez,
sustenta que a Educação Básica é um direito do cidadão e que é responsabilidade do Estado
ofertá-la com qualidade (BRASIL, 1996).
Nas sociedades democráticas, a educação simboliza um direito de toda a população,
sendo esse direto concedido por meio de leis, inclusive, para as pessoas com deficiência. Isso
significa dizer, portanto, que o sistema escolar deve receber qualquer clientela, ou seja, todos
os estudantes, independentemente de características físicas, bem como cognitivas,
comportamentais e psicossociais (MAGALHÃES; CARDOSO, 2011).
Segundo Oliveira e Araújo (2014, p. 169), “[...] o direito a educação inscrito em lei, é
condição para as políticas educacionais: seus limites, assim como sua abrangência deverão
estar previstos no sistema legal do país”. Assim, entende-se que esse direito é uma das
condições para que as políticas sejam concretizadas com qualidade para todos.
Vale salientar, todavia, que o devido direito de assegurar educação para todos,
independentemente das condições, é tangenciado pelos processos subjacentes da educação
inclusiva, ou seja, é importante que alguns elementos sejam assegurados, desde políticas
públicas educacionais, passando por estruturas físicas, até a devida formação dos profissionais
da educação.
A educação escolar, por si só, pode, e deve, ser um processo de inclusão e,
necessariamente, passa por uma escola única para todos, o que não significa dizer o mesmo
serviço educacional sendo oferecido para todos de forma homogeneizada. Sendo assim,
conforme Brasil (2008), reconhecemos que as dificuldades vivenciadas, nos sistemas
educacionais, demonstram a necessidade de enfrentar as práticas de exclusão e discriminação,
assim como elaborar alternativas para suplantá-las. Dessa forma, entende-se que a educação
inclusiva admite espaço central nas discussões a respeito da sociedade contemporânea e sobre
o papel da escola no vencimento da perspectiva da exclusão.
As escolas, como ambientes que visam proporcionar a efetiva promoção do processo
de ensino e aprendizagem a todos os alunos, não deve padronizar as condições de ensino
oferecidas, pelo contrário, ela “[...] devem acolher todas as crianças, independentemente de
suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras,” portanto,
pensar e construir a estrutura curricular da escolar de forma a propiciar aos alunos condições
apropriadas e não de modo que o aluno tenha que se adequar à realidade da escola.
(DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, p. 17)
A educação inclusiva, segundo Mantoan (2003), implica em não deixar ninguém no
exterior da escola. Nesse sentido, ela não se trata de somente integrar, pois é incompatível
com a integração, mas de, obrigatoriamente, atender a todos os alunos, deficientes ou não,
propiciando a estes o direito de frequentar à escola e de ter êxito no seu desenvolvimento
escolar.
Ainda sobre educação inclusiva, Mantoan (2006, p. 16), ressalta:

A inclusão total e irrestrita é uma oportunidade que temos para reverter a


situação da maioria de nossas escolas, as quais atribuem aos alunos as
deficiências que são do próprio ensino ministrado por elas – sempre se avalia
o que o aluno aprendeu, o que ele não sabe, mas raramente se analisa “o
que” e “como” a escola ensina, de modo que os alunos não sejam
penalizados pela repetência, evasão, discriminação, exclusão, enfim.

Perante o contexto, a Declaração de Salamanca (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA,


1994) foi um marco para a instituição e conscientização internacional da educação inclusiva,
dando, inclusive, popularidade e ênfase ao termo. Tal declaração trata-se de um documento
internacional que referenda e tem como finalidade primordial resguardar os princípios e
aplicações da educação inclusiva, ou seja, estipulando que a escola seja um ambiente para
todos, sem distinção dos alunos por suas características físicas, mentais, sociais ou culturais.
Diante disso, compreende-se que é dever da escola, independentemente da condição
física, mental ou social da criança, oportunizar vivências que potencializem o
desenvolvimento pleno de todos os alunos de forma equilibrada em todos os campos: motor,
afetivo, social e cognitivo.
Nesse contexto, Chiviacowsky, Schild e Pinho (2006) apontam que esse movimento
surge como um auxiliar no processo de educação e inclusão e que a Educação Física no
espaço escolar e surge como um fator motivador para o reconhecimento das potencialidades
do movimento, sob a forma de instigar com confiança suas capacidades, a apreender e
executar movimentos e compreender os fundamentos do movimento, a tornarem-se ecléticos
na prática dos movimentos e a identificar e reconhecer hábitos benéficos à saúde e atividades
saudáveis para todos que vivenciam esse fenômeno.
Piaget (1994, p. 97) mostra que a consciência corporal “é algo que se desenvolve
naturalmente na infância, se esta tiver permissão de conhecer seu corpo, o que implica
experimentar os movimentos, utilizá-los com desenvoltura e ter a sensação de domínio deste
corpo”. Nesse sentido, realça-se a necessidade de a criança ver seu próprio corpo como um
recurso que ela pode usar no processo de ensino-aprendizagem e do conhecimento corporal
como um instrumento para a alfabetização motora por meio do movimento, já que este
contribui para o desenvolvimento integral das crianças.
Segundo Le Boulch (1982, p. 72), “a criança tem um grande potencial para se
desenvolver enquanto ser social, porém é de fundamental relevância a presença do adulto
neste processo de aprendizagem”, pois o meio influencia as ações que a criança irá descobrir,
se descobrir nestas, aprender e recriar a partir do que vivencia. Dessa forma, a postura que o
corpo adquire na fase do desenvolvimento infantil irá acarretar consequências no
desenvolvimento das ações da idade adulta.
De acordo com Le Boulch (1982, p. 142), “naturalmente, a criança brinca,
expressando por mímica, cenas da vida cotidiana […]. Ao mesmo tempo, ela expressa sua
afetividade e exercita sua inteligência”. Assim, o desenvolvimento psicomotor da criança tem
grande influência, tanto no processo de aprendizagem desta, quanto no desenvolvimento de
movimentos físicos, sendo necessário ter concentração e coordenação para aprender. Quando
a criança pratica esse tipo de atividade, ela pode desenvolver habilidades corporais variadas.
Para Wallon (1968), o movimento e as crianças possuem significativas dimensões e
significados como, por exemplo, o deslocamento corporal cenestésico, ou seja, a ativação
muscular para o movimento propriamente dito ou a posição postural do corpo a partir uma
regulação da tensão muscular, fatores pertinentes à biologia e à anatomia do corpo humano.
Esses movimentos servem, principalmente, para se relacionarem diretamente com o meio,
sobre o espaço, gestos utilizados principalmente no primeiro ano de vida como forma de
expressão. A partir do início do segundo ano de vida, movimentos como de pegar, puxar e
empurrar se intensificam como forma de explorar o meio em sua volta. Com essa dinâmica, o
corpo da criança cria um diálogo com as outras dimensões do seu próprio corpo, como a
afetiva, a emocional e a expressiva.
Essa perspectiva da extensão cognitiva e intelectual do movimento, sem a separação
das outras dimensões, vai possibilitando, portanto, à criança, criar autonomia para interferir
sobre o ambiente exterior, diminuindo gradativamente a dependência de um indivíduo
intermediário (WALLON, 1968).
A motricidade, portanto, enquanto manifestação do ser humano que extrapola os
limites do simples movimento, o puro deslocamento do corpo no espaço, concretiza-se
enquanto possibilidade de vivências inclusivas que permitam a fruição do movimento para
todas as crianças, de forma a entender suas próprias características e potencialidades.
Freire (1991), de forma poética e profunda, reforça o pensamento da motricidade e do
corpo como indissociáveis, de relação reciproca e necessária:

[...] A corporeidade integra tudo o que o homem é e pode manifestar neste


mundo: espírito, alma, sangue, ossos, nervos, cérebro, etc. A corporeidade é
mais do que um homem só: é cada um e todos os outros. A motricidade é
manifestação viva dessa corporeidade é o discurso da cultura humana.
Enfim, o desenvolvimento da motricidade cumpre um desígnio fundamental:
viver. Quem dera morrer de tanto viver! (FREIRE, 1991, p. 63).
Por meio da fala de Freire, pode-se compreender o que é ser e como é ser uma criança,
além dos comportamentos que caracterizam a fase da infância, pois, logo se imagina algumas
características que quase instantaneamente vem à nossa mente, tais como as estripulias, o
brincar sem parar, pular, o correr, o lutar, o fantasiar situações, a sinceridade e a fala
espontânea, bem como mais uma finidade de comportamentos que as (pré)definem. Seja
como for, a principal singularidade da criança, a que deixa marcas, é a intensidade de
movimentos e de imaginação, a capacidade de fantasiar os momentos por meio das suas
atividades motoras (FREIRE, 2009).
Portanto, Nista-Piccolo e Moreira (2012) enfatizam que a motricidade manifesta as
competências motoras da criança, de executar suas atividades rotineiras, relaciona-se com o
meio e com os outros indivíduos que as cercam, pela qual é possibilitada a partir das
experiências vivenciadas nos diversos momentos da infância. A relevância da motricidade
como elemento efetivo de e do movimento se revela pelas inúmeras possibilidades de
movimentos concretos e abstratos que, de forma sistemática e significativa, colaboram para
situar a criança no mundo em que está inserida.
A criança é movimento, ela chora, sorrir, provoca, incomoda, dá amor, corre, brinca,
ou seja, da maneira como é e existe, expressa sua motricidade, pois, oportuniza experiências
de liberdade para que possam se expressar da forma mais genuína, de ir de encontro ao seu eu
e ao outro, além de possibilitar a sua própria construção e reconstrução com criações e
descobertas. (NISTA-PICCOLO; MOREIRA, 2012).
Nesse sentido, entende-se, com base em Franco (2016, p. 542), que: “as práticas
pedagógicas são aquelas que se organizam para concretizar determinadas expectativas
educacionais. São práticas carregadas de intencionalidade uma vez que o próprio sentido de
práxis se configura por meio do estabelecimento de uma intencionalidade [...]”, a qual conduz
e dá sentido à ação, solicitando uma intervenção, que deve ser planejada, bem como
científica, sobre o objeto, visando à transformação da realidade social dos sujeitos, conforme
o autor.
Com isso, é preciso destacar o papel do professor na efetividade da educação
inclusiva. Pensando na inclusão escolar, ou seja, na necessidade de garantir que os alunos
usufruam de todos os recursos e toda a riqueza que o ambiente escolar traz, surge a figura do
docente como um dos elementos mais importante, valioso e determinante para que a inclusão
escolar seja, de fato, efetivada. Todavia, ressalta-se que não é justo colocar somente na figura
do professor a responsabilidade da concretização da inclusão escolar, pois, para que de fato
ela aconteça, é necessário um conjunto de elementos trabalhando em sincronia e de forma
objetiva.
Assim, as possibilidades da Educação Física, na visão da estimulação e nas vivências
proporcionadas, assumem uma função primordial ao passo que elas podem, de forma
sistematizada e estruturada, dispor de ambiente propício e oferecer vivências de movimento,
além de estimular o desenvolvimento humano para todas as crianças.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) reforça o papel da Educação Física na
escola, apresentando as colaborações das práticas corporais que, agregadas com as demais
áreas de conhecimentos e objetos culturais no ambiente escolar, estimulam aprendizagens que
ultrapassam o simples fazer e o ato de movimentar-se sem nenhum sentido, incorporando os
demais aspectos do desenvolvimento humano às vivências e experiências corporais (BRASIL,
2017).
Destaca-se o papel da Educação Física dentro da escola na execução de atividades com
movimento, uma vez que esta é a sua função na instituição escolar, por meio da execução,
genuinamente, de atividades corporais. Vale salientar, todavia, que nenhuma atividade se
restringe a uma única área, pelo contrário, como bem pontua a BNCC (BRASIL, 2017), é
imprescindível as interlocuções, a interdisciplinaridade que a escola, potencialmente, pode, e
deve, oferecer para as crianças e, assim, dar e efetivar o sentido e seu desenvolvimento,
independente da sua condição.

3 METODOLOGIA

O presente estudo teve uma abordagem qualitativa do tipo bibliográfica. Para tanto, foi
feito uma revisão bibliográfica sobre a produção do conhecimento, para buscar subsídios
teóricos para o trabalho. Assim, foram realizadas pesquisas por meio de uma breve revisão de
materiais bibliográficos tais como artigos e livros, organizados de acordo com o assunto que
demanda este trabalho.
Dessa forma, compreende-se que a revisão bibliográfica do objeto tem o intuito de
colocar o pesquisador em contato direto com a literatura já produzida: dissertações, teses,
artigos e debates, procurando compreender as discussões acerca da pesquisa a que se propõe
no estudo (MARCONI; LAKATOS, 2007).
Nessa mesma linha de raciocínio, Gil (2008, p. 50) ressalta que a pesquisa
bibliográfica é realizada “[...] a partir de material já elaborado, constituído principalmente de
livros e artigos científicos. Embora em quase todos os estudos seja exigido algum tipo de
trabalho desta natureza, há pesquisas desenvolvidas exclusivamente a partir de fontes
bibliográficas”. Desse modo, a utilização desse tipo de pesquisa tem significativo proveito
pelo fato de permitir ao pesquisador uma cobertura de fenômenos de forma mais vasta em
detrimento do que, porventura, poderia encontrar pontualmente no ambiente de pesquisa de
campo, caso o ele encontrasse percalços neste espaço.
Para dialogar com o estudo realizado na pesquisa, utilizou-se autores como: Mantoan
(2003), que discute a respeito das questões da educação inclusiva; Freire (1991; 2009), que
discorre sobre motricidade e movimento; Le Bouch (1982) e Nista-Piccolo e Moreira (2012),
que colaboram com os estudos sobre a criança o movimento, dentre outros. Portanto, destaca-
se que a revisão bibliográfica foi de suma relevância para estudar termos/assuntos relevantes
para esta pesquisa.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

A inclusão é “uma oportunidade”, afirma Mantoan (2003, p. 18), pois possibilita a


reversão das circunstâncias da maior parte das escolas, as quais apresentam dificuldades e
deficiências, que são marcas da própria dinâmica do sistema de ensino, recorrente avalições
que quantificam e caracterizam os alunos e que por outro lado não realizam uma auto
avaliação refletindo sobre seus próprios fazeres pedagógicos de forma a identificar se há
justiça nas avaliações, penalizações e se não há exclusão dos alunos (MANTOAN, 2003).
Ainda em relação aos processos que desencadeiam a educação inclusiva, Mantoan (2003,
p. 18), ainda pontua, de forma enfática e crítica

Estou convicta de que todos nós, professores, sabemos que é preciso expulsar a
exclusão de nossas escolas e mesmo fora delas e que os desafios são necessários, a
fim de que possamos avança, progredir, evoluir no nosso empreendimento. É fácil
receber os “alunos que aprendem apesar da escola” e é mais fácil ainda encaminhar
para classes e escolas especiais, os que têm dificuldade de aprendizagem e, sendo ou
não deficientes, para os programas de reforço e aceleração [...].

Portanto, a efetivação da inclusão na educação tange posturas singulares e plurais, de


forma a entender às diferenças como elemento de construção comum, e não como fator de
empecilho e de casos que necessitem de atendimento que segreguem. O pleno
desenvolvimento ocorre por meio das diversas manifestações e relações sociais e isso passa
justamente pelo acolhimento e atenção aos direitos educacionais de todos, sem distinção e, em
especial para crianças, a necessidade de vivencias múltiplas e plurais tornam-se ainda mais
fundamentais.
Dessa forma, a motricidade, na infância, compõe uma base das aprendizagens, visto
que, pelos gestos produzidos, dá significados às aprendizagens, ou seja, materializa aquilo que
pôde experimentar e usufruir por meio dos movimentos, ficando claro, assim, que a
construção e reconstrução do seu pensamento acontece, primariamente, perante seu ato motor.
Diante disso, Freire (2009) destaca que alguns apontamentos acerca do
desenvolvimento das crianças na infância estão atribuídos aos movimentos do pegar, correr,
pular e arrastar, manifestações características de quase todas as crianças e o que se têm como
expectativas é que esses movimentos sejam apresentados e exercidos, de forma satisfatória, de
acordo com cada fase da vida da criança.

[...] É claro que é desejável que todos tenham habilidades bem desenvolvidas, mas o
risco que se corre é o de estreitar a visão para o problema, destacando o motor como
alguma coisa que ocorre unilateralmente. Ora, um simples ato de pegar só existirá
no momento em que a mão, que pode fazê-lo, interagir com o objeto a ser pego. A
mão que pega possui muitos recursos, mas o que se tem de ser pego está fora dela,
daí o sujeito precisar sempre completar-se no mundo, que possui a parte que lhe
falta (FREIRE, 2009, p. 20).

Freire (2009) discorda da crença de que os movimentos das crianças podem e, por
vezes, devem ser padronizados. Para ele, tal fenômeno deve, sim, ser considerado, porém,
ressalta as expressões de esquemas motores, ou seja, a ordenação de movimentos produzidos
pelo ser em dadas circunstâncias, produção de movimentos que é dependente de diversos
fatores, tais como os biológicos, sociais e ambientais.
Nesse sentido, Freire (2009) frisa que, nas questões relacionadas à aprendizagem do e
pelo movimento, validada pelo próprio autor, é preciso prover uma “educação de corpo inteiro
[...] um corpo em relação com os outros corpos e objetos, no espaço. Educar corporalmente
uma pessoa não significa provê-la de movimentos qualitativamente melhores, apenas [...]”.
(FREIRE, 2009, p. 77, grifos do autor). Portanto, é necessária a promoção de uma educação
que permita, também, fruir das experiências de imobilidade, do fazer e do não fazer.
À vista disso, os movimentos que a criança desenvolve gradualmente vão
organizando-se e categorizando-se. Com o passar do tempo, esses movimentos assumem
sentidos que terão forte interferência no seu comportamento. Sendo assim, a infância torna-se
um período de necessária fruição de movimentos básicos para a devida sustentação dos anos
posteriores, correndo o risco de, caso não tenha atendido à demanda e às necessidades do
período infantil, ter problemas não somente motores, mas sociais, cognitivos, afetivos e
psicológicos. Assim, “[...] podemos citar a estreita relação da dimensão motora com os
aspectos cognitivos, que requerem capacidade de entender e pensar. Por meio de soluções de
tarefas motoras, a criança aprimora seu raciocínio e estimula sua criatividade [...]” (NISTA-
PICCOLO; MOREIRA, 2012, p. 44).
O curso de desenvolvimento dos movimentos na infância é o mesmo para todas as
crianças, porém, é preciso destacar que há crianças que podem ter um desenvolvimento
acelerado e outras que poderão ter uma certa lentidão nos seus anos de desenvolvimento, os
motivos disso podem ser os mais diversos, pois é um fenômeno que é condicionado aos
aspectos biológicos e experienciais, assim, quanto mais oportunidades de estímulos motores,
de vivências de movimentos na infância, mais vasta suas habilitares motoras (FREIRE, 2009).
Destarte, a motricidade tem o poder de auxiliar na inclusão e no desenvolvimento das
crianças, seja por meio da sua percepção corporal no mundo e no ambiente que as cercam ou
seja por meio das possibilidades de evolução mediante aa fruição e reflexão dos movimentos
executados.
Nesse sentido, inúmeras possibilidades são destacadas para que a criança, na plenitude
da sua infância, possa fruir, construir e reconstruir sua vida por meio da motricidade em
diversos contextos e tempos. Jogos, brincadeiras, danças e músicas são alternativas que,
dentro de cada contexto cultural e inclusivo, podem, e devem, proporcionar as mais
significativas experiências motoras às crianças, as quais não simplesmente aprendem aquela
ou esta habilidade motora, mas, de fato, têm seu desenvolvimento pleno e de direito,
independente da sua condição física, mental, social ou cultural, conforme os pensamentos de
Nista-Piccolo e Moreira (2012) e Freire (2009).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para que educação se torne, essencialmente, inclusiva é necessário, e fundamental, o


reconhecimento das alternativas e possibilidades que levam a este patamar. Para tanto, é
primordial a disponibilização de mecanismos e elementos que garantam o pleno direito a uma
educação que permita não tão somente ao acesso, mas também a permanência nesta e seu
desenvolvimento integral.
Portanto, diante da finalização do presente trabalho, infere-se que a motricidade e suas
diversas facetas práticas exercem um papel significativo na educação inclusiva de crianças,
pois, diante das suas especificidades, permitem a esses sujeitos o reconhecimento de seus
próprios limites e possibilidades corporais, além de propiciarem a fruição de atividades
motoras que experienciam relações com sujeitos alheios a seu meio, características e com
outras manifestações culturais.
Diante do exposto, os desafios e as barreiras só serão superados, seguramente, a partir
da mudança da compreensão e da abordagem reducionista da inclusão, além da possibilidade
de atividades motoras que a motricidade no campo teórico e, necessariamente, no campo
prático, podem proporcionar. Estudos como este servem e são, essencialmente, fundamentais
para reflexões e contínuas discussões, por isso, não há caminhos conclusivos, mas passos que
permitem suprir dúvidas e lacunas pontuais, pois o caminho da busca pelo conhecimento é
permanente.

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