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GT 20 – RELIGIÃO E SOCIEDADE

Título do Trabalho:

RELIGIÃO E IGREJA: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS


DOS AGENTES PASTORAIS

Autora: Maria Lúcia Bastos Alves*

Trabalho apresentado ao

XX Encontro Anual da ANPOCS

Caxambu, MG, 22 a 26 de outubro de 1996

*
Professora Assistente do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal da
Paraíba – UFPB
1

INTRODUÇÃO

Inúmeros são os estudos de teólogos e cientistas sociais preocupados


com a religião e, sobretudo, com a mudança da Igreja Católica após Medellín
(1968) e Puebla (1979), na América Latina.1 Contudo, acredita-se que grande
parte dessas análises têm priorizado a dimensão macro da instituição,
ressaltando a importância do contexto sócio-político e cultural, as mudanças
ocorridas durante o processo de renovação e sua contribuição na dinamização do
social.

Por outro lado, é raro encontrar estudos empenhados em explicar


ocorrências específicas que dizem respeito à dimensão micro das práticas
religiosas presentes na instituição eclesiástica. Diante dessa lacuna, este ensaio se
propõe a fazer uma reflexão inicial sobre o processo de construção e elaboração
das representações sociais dos agentes pastorais engajados no “novo modo de ser
Igreja”, tentando perceber a vivência das novas práticas religiosas em que os
discursos, permeados por símbolos2, crenças e valores, servirão de parâmetro para
a análise das representações sociais dos agentes pastorais em questão.

Nesse sentido, esta investigação interroga:

– Como se dá o processo de construção e elaboração das


representações sociais dos agentes pastorais e como tais representações são
articuladas com suas práticas?

1
Cf. Conferência Geral do Episcopado Latino Americano. A igreja na atual transformação da América à
luz do Concílio. Conclusões de Medellín. Petrópolis: Vozes, 1971; a Igreja passa a ver a realidade do
continente dentro de um novo quadro teórico, em que esta se apresenta como parte do espaço geográfico
e social que forma o terceiro mundo. As categorias subdesenvolvimento / desenvolvimento, dominação /
dependência integram o pensamento eclesial, no sentido de assumir um compromisso junto com o povo,
dando atenção preferencial aos pobres e oprimidos. Puebla (1979), retomando o “Evangelli Nuntiandi”,
destaca a urgência da evangelização da cultura, denunciando o descompasso entre a evangelização e
mundo contemporâneo.
2
O conceito de símbolo varia conforme sua apropriação pelas diversas correntes do pensamento. Geertz,
em A interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978, p. 105, considera como elementos
simbólicos todas as “ formulações tangíveis de noções, abstrações da experiência fixada em formas
perceptíveis, incorporações concretas de idéias, atitudes, julgamentos, saudade ou crenças.
2

– Quais os valores, normas e aspectos institucionais que permitem e


favorecem a construção dessa representação?.

– Diante das mudanças e tensões ocorridas na Igreja Católica, junto


ao processo histórico e social, que tipos de situações concretas correspondem e
podem ser correlacionadas ao processo de elaboração e construção das
representações dos agentes pastorais?

Não se pretende, no entanto, fazer uma investigação a partir da


dimensão teológica e filosófica da Religião e da Igreja, mas ressaltar os elementos
que dão significado às vivências religiosas. A preocupação com a religião dirige-
se dentro de uma perspectiva prática (enquanto função histórica) e ideológica
(enquanto visão de mundo). O enfoque dado à Igreja privilegiará os aspectos:
sócio-analíticos (Igreja como instituição social e histórica), de fé (como
manifestação da espiritualidade) e prático (ao nível da pastoral).

A partir daí, situa-se o campo da investigação nas ciências sociais,


tomando por objeto o estudo das Representações Sociais de Religião e Igreja dos
agentes pastorais engajados no “novo modo de ser Igreja” e articulação com suas
práticas, buscando compreender o significado das representações sociais como
manifestações e expressões das interrelações sociais que, vinculadas
historicamente a condicionamento cultural e social, adquirem significados
diversos.

Lembramos que, enquanto pesquisadora do catolicismo popular,


estudamos as manifestações religiosas tradicionais, presentes na dissertação de
mestrado intitulada: A conveniência na convivência: um estudo sobre a romaria
de Bom Jesus da Lapa-BA (1993). Surge neste momento, a oportunidade de
conhecer as representações sociais dos agentes pastorais no“novo modo de ser
Igreja”, dando ênfase a interpretação e representação da vivência da prática
religiosa.
3

Representações Sociais e os agentes pastorais

A possibilidade de refletir sobre as representações sociais — plano


da subjetividade — e as práticas dos agentes pastorais — plano da objetividade —
no âmbito das ciências sociais, levou-nos a perceber a riqueza e a diversidade
desse conceito que, aplicado num cenário interdisciplinar, mantém suas
especificidades3, de acordo com as necessidades teórico-metodológicas. Para
tanto, recorremos às contribuições de diversos autores no campo das ciências
sociais4, resgatando, fundamentalmente, a discussão que se refere à construção
simbólica da realidade social.

Enfatizando que os primeiros sistemas de representações que o


homem produziu do mundo e de si mesmo são de origem religiosa, Durkheim
(1989, p.11) conceitua as Representações Coletivas e as Representações Sociais
com tendo o mesmo significado5; portanto, percebidas “enquanto relativamente
autônomas e, simultaneamente, como constitutivas do tecido social”.

Para ele,

“As Representações Coletivas traduzem a maneira como o


grupo se pensa nas suas relações com os objetos que o
afetam. Para compreender como a sociedade se representa a
si própria e ao mundo que a rodeia, precisamos considerar a
natureza da sociedade e não a dos indivíduos. Os símbolos
com que ela se pensa mudam de acordo com sua natureza.”
(Durkheim, 1978, p.78)

3
Conforme as diferentes disciplinas que abordam o conceito de representações sociais tais como
sociologia, antropologia, semiótica, psicologia social entre outras.
4
Minayo, M.C. Souza, em O conceito de representações dentro da sociologia clássica. In Jovchelovitch
(1995), faz uma análise a respeito da questão das construções simbólicas que expressam a realidade a
partir de Durkheim e seus seguidores, Weber e a escola fenomenológica representada por Schutz, Marx e
os marxistas que trabalham o significado das relações sociais e as contribuições de Bourdieu e Bakthim.
(p.89)
5
Lembramos que o conceito de representações sociais ou coletivas, nasceu análogo às teorias da sociologia
do conhecimento e antropologia (Durkheim, Levi Bruhl, Mauss e Levi Strauss), servindo para a
elaboração da teoria e do pensamento mítico.
4

Em As Formas Elementares de Vida Religiosa, por exemplo,


Durkheim acentua a irredutibilidade do pensamento coletivo e dos processos que o
regem ao pensamento individual, ressaltando que,

“A sociedade é uma realidade sui generis; tem suas


características próprias que não são encontradas, ou que
não são encontradas sob a mesma forma, no resto do
universo. As representações que a exprimem têm, portanto,
um conteúdo completamente diferente das representações
puramente individuais (...).” (1989, p.45).

Com esta concepção dualista, o autor evidencia que

“as representações coletivas são o produto de uma imensa


cooperação que se estende não apenas no espaço, mas no
tempo; para produzi-las, uma multidão de espíritos diversos
associaram, misturaram, combinaram suas idéias e seus
sentimentos; longas séries de gerações acumularam aí sua
experiência e o seu saber”. (1989, p.45).

Moscovici (1978), por sua vez, parte deste princípio, e vai mais
além, ao perceber que Durkheim “não aborda frontalmente nem explica a
pluralidade de modos de organização do pensamento, mesmo que sejam todos
sociais, a noção de representação perde, nesse caso, boa parte de sua nitidez”.
(p.42).

Para Moscovici (1978), as representações coletivas durkheimianas


constituem um tipo geral de fenômenos psíquicos e sociais que abrangem a
ciência, o mito, a ideologia, atitudes etc.., adequando-se pois, para as análises das
formas de pensamento das sociedades tradicionais em que as mudanças se
processam lentamente. Opondo-se a essa noção, o autor considera o conceito de
Representações Sociais mais adequado à análise das sociedades modernas, que são
5

dinâmicas e fluidas caracterizando-o “como estruturas cognitivas específicas da


sociedade contemporânea que se constróem no bojo das interações sociais.”

Ao analisar criticamente a dicotomia entre o individual e o coletivo


assim como a divisão entre o psíquico e o social, Moscovici denunciou o caráter
redutor presente na psicologia social americana, propondo uma nova abordagem
da psicologia social a partir das reflexões de Durkheim sobre as representações
coletivas, partindo de uma postura cognitivista em que as representações são vistas
como um saber desenvolvido no cotidiano.

Serge Moscovici, em La psychanalyse: son image et son public


(1961), delineia o seu conceito de Representação Social, desenvolvendo uma
psicossociologia do conhecimento a partir de “uma modalidade específica de
conhecimentos que tem por função a elaboração de comportamentos e a
comunicação entre indivíduos” presentes no onde se desenvolve a vida
cotidiana.

Nessa obra, Moscovici preocupou-se, principalmente, com a relação


entre conhecimento científico e conhecimento do senso comum6 , que constitui a
essência das representações sociais e, ao rejeitar a dicotomia entre mundo
individual e mundo social, propõe a incorporação entre um e outro, uma vez que
“não existe sujeito sem sistema, nem sistema sem sujeito”. Tais dicotomias “se
tornaram lentes deformadoras que nos impedem de ver fenômenos reais, tais
como conflitos, as dissonâncias, etc., em toda sua amplitude e significado.”
(1995, p.14).

6
Ressalte-se que o senso comum, proposto nas representações sociais por Moscovici, é diferente do senso
comum gramsciniano. Conforme Alonso de Andrade (1995, p.40) “o senso comum em Moscovici
corresponde ao processo de representação e consiste numa forma de conhecimento de caráter
primordial que tem finalidade prática: conhecer e agir sobre o mundo, atendendo às necessidades
cotidianas. Não é privativo de nenhuma camada social. Seus mecanismo (objetivação e ancoragem) são
comuns a todos os seres humanos.” Em contrapartida, para Gramsci (1987, p.35), o senso comum
identifica-se “a causa exata, simples e imediata não se deixando desviar por fantasmagorias e
obscuridades metafísicas pseudo-profundas, pseudo-científicas, etc.” o que corresponde a um certo
grau de assimilação da ideologia dominante pelos estratos subalternos.
6

Na mesma linha de pensamento, Spink (1993, p.89) expressa a falsa


dicotomia entre o individual e o coletivo. Para ele, não basta apenas enfocar o
fenômeno no nível intra-individual (como o sujeito processa a informação) ou
social (as ideologias, mitos e crenças que circulam em uma determinada
sociedade); é necessário entender, também, como o pensamento individual se
enraíza no social (remetendo, portanto, às condições de sua produção) e como um
e outro se modificam mutuamente. Por isso, é preciso conceber a representação
social “tanto na medida em que ela possui uma contextura psicológica autônoma
como na medida em que é própria de nossa sociedade e de nossa cultura”
(Moscovici, 1978).

De acordo com Moscovici,

“as representações sociais são entidades quase que


tangíveis. Elas circulam, cruzam-se e se cristalizam
incessantemente através de uma fala, um gesto, um encontro
em nosso universo cotidiano.(...) correspondem, por um lado,
à substância simbólica que entra na elaboração e, por outro,
à prática que produz a dita substância, tal como a ciência e
os mitos correspondem a uma prática científica e mítica.”
(1978, p41).

Entretanto, diversas são as razões que dificultam a apreensão do


conceito de representação social em Moscovici, uma vez que a sua posição
“mista” se encontra na encruzilhada de uma série de conceitos sociológicos e de
uma série de conceitos psicológicos.

A fim de esclarecer a polêmica em torno da aplicabilidade do


conceito de representação social, Spink (1993, p.9) adverte que

“Não se trata, portanto, de ausência ou presença de


conceitos específicos, pois as representações são valorativas
antes de serem conceituais; e respondem a ordens morais
locais, ficando, como tal, prenhes de afeto; sendo
conhecimentos práticos, estão orientados para o mundo
social, fazendo e dando sentido às práticas sociais.”
7

A propósito, ainda, da discussão sobre representação social, Jodelet


(1989) é quem consegue obter um amplo consenso entre os estudiosos, quando
define representações sociais como: “uma forma de conhecimento, socialmente
elaborada e partilhada, tendo uma visão prática e concorrendo para a construção
de uma realidade comum a um conjunto social.” (p.36).

Na verdade, a diversidade de elementos presentes no conceito de


representação social, torna-o dinâmico e explicativo da realidade social, e que
possui uma dimensão histórica e transformadora, na medida em que reúne
aspectos culturais, cognitivos e valorativos, ou seja, ideológicos. “Está presente
nos meios e nas mentes, isto é, ele se constitui numa realidade presente nos
objetos e nos sujeitos. É conceito sempre relacional, e por isso mesmo social.”
(Guaresch, 1995, p.202).

Nessa direção, Alonso de Andrade (1995), ao estabelecer uma


relação entre representações sociais e ideologia, aponta as divergências e as
lacunas existentes na teoria das Representações Sociais elaborada por Moscovici.7
Seguindo por este caminho, acredita-se que essa reflexão não pode ignorar os
elementos ideológicos advindos das bases concretas de nossa sociedade, os quais
articulados a outros elementos, estruturaram as representações dos agentes
pastorais.

Considera-se, então, que os conceitos de ideologia8 e representação


presentes na ciências sociais, e que dizem respeito à ordem do simbólico, partem
das relações sociais as quais possibilitam compreender como e porquê os agentes
pastorais em questão pensam e agem de determinada maneira.

7
Outros autores que discutem a obra de Moscovici, a exemplo de Doise (1985) e Jahoda (1988) também
fazem críticas a esta lacuna , afirmando o abandono do conceito de ideologia ou a sobreposição entre
ideologia e representações sociais.
8
Convém lembrar que em Gramsci (1987, p.16) a concepção de ideologia é bastante extensa. Para ele a
ideologia é definida como “uma concepção de mundo que se manifesta implicitamente na arte, no
direito, na atividade econômica, em todas as manifestações da vida individual e coletiva.”
8

Nesse contexto, ratifica-se o conceito de Representações Sociais


como “uma forma de conhecimento primordial socialmente elaborada e
partilhada, que tem finalidade prática: conhecer e agir sobre o mundo atendendo
às necessidades cotidianas.” (Alonso de Andrade, 1995:)

Ao retomar a análise de representação social abordada nos estudos


de Moscovici e seus colaboradores, o estudo das representações sociais dos
agentes pastorais parte das representações que eles fazem do mundo e de si
mesmo, evidenciando-se assim, que as representações sociais e práticas religiosas,
ao fazerem referência ao sobrenatural, se constróem dentro das condições
concretas e históricas dos atores sociais.

Com efeito, Weber (1991, p.328), propondo estudar uma


determinada maneira de religião, escreve: “Em geral, não tratamos da essência
da religião, mas sim das condições e efeitos de um certo tipo de ação
comunitária...”. Assim, ele chama atenção para a necessidade de se pesquisar
qualquer tipo de religião como parte da realidade social, a fim de compreender a
que instâncias do social determinado fato deve sua dependência.

Por outro lado, Clodovis Boff (1996) quando discute o significado


da Igreja num determinado momento histórico, alerta para a dimensão teológica
uma vez que a ação da Igreja não se dá apenas ao nível da visibilidade — como
instituição social e histórica — mas, também, da invisibilidade: o evangelho, os
sacramentos, o povo convocado. transcende o seu lado empírico e organizacional.
Portanto, “ há de se guardar sempre esse horizonte de fundo, para não reduzir a
Igreja à sua função empírica, social ou pastoral.” (p.125).

Desse modo, as representações sociais visualizam-se no espaço do


simbólico na medida em que, nesse espaço, o sujeito cria o real em que atribui
significados aos objetos, ou seja, “a atividade representativa faz com que os
objetos passem a fazer parte do seu mundo”. (Alonso de Andrade, 1995, p. ).
9

Ressalte-se, ainda, que Bourdieu trata a religião como um sistema simbólico pelo
qual se opera a ordenação lógica do mundo natural e social. A religião faz “a
alquimia ideológica pela qual se opera a transfiguração das relações sociais em
relações sobrenaturais, inscritas na natureza das coisas e, portanto, justificadas.”
(Bourdieu, 1987, p.33).

É com essa perspectiva que a eficácia simbólica da religião

“contribui para a imposição (dissimulada) dos princípios de


estruturação da percepção e do pensamento do mundo, e em
particular do mundo social, na medida em que impõe um
sistema de práticas e de representações cuja estrutura
objetivamente fundada em um princípio de divisão política
apresenta-se como a estrutura natural-sobrenatural do
cosmos.” (Bourdieu, 1987, p.33-34).

Por isso, podemos dizer que as Representações Sociais, a nível das


práticas religiosas, são construídas e correspondem às situações reais
manifestadas por diversas maneiras: palavras, sentimentos, condutas, que ao
institucionalizarem-se tornam-se passíveis de serem analisadas e compreendidas a
partir das estruturas e dos comportamentos sociais.

Nesse sentido, o estudo das representações sociais revela a íntima


relação entre o que os agentes pastorais pensam de uma determinada situação e as
práticas desenvolvidas nos grupos; uma vez que possibilita olhar para um sujeito
que tanto constrói o mundo como a si próprio, estabelecendo uma síntese teórica
entre à dimensão cognitiva, afetiva, e social, pois, é quando as pessoas se
encontram para falar, argumentar, discutir o cotidiano, que as representações
sociais são formadas.

Assim, as representações sociais dos agentes pastorais, ao se


objetivarem nos grupos sociais, entre os quais podem estabelecer clivagens em
10

função de suas representações, são parte das atividades contínuas de interpretação


e reinterpretação da realidade na qual emergem do processo de construção das
representações no espaço da interação social, pois as práticas difundidas nos
grupos em que atuam, se realizam num processo “dialógico” e dialético onde os
agentes comprometidos, não só com a prática religiosa mas também com a
situação sócio-econômica-cultural do grupo, imprimem sua identidade. O
processo representativo emerge, então, como “uma construção social da
realidade, ao nível do simbólico, em que o sujeito deixa as marcas de sua
identidade naquilo que representa.” (Alonso de Andrade, 1995, p.38).9

Pensar o processo de construção das representações sociais que os


agentes pastorais têm a partir da nova concepção de “ser igreja” e as práticas que
assumem no trabalho de base, de reflexão sobre questões sociais tais como:
trabalho, desemprego, mulheres, modelo de desenvolvimento do país, etc.,
pressupõe entender o exercício do trabalho coletivo que impulsiona as ações
pastorais, como elemento constitutivo de uma identidade. Nesse processo
identitário, as representações emergem como algo que é transformado e
transforma as ações do grupo, uma vez que, o processo de interação com o
grupo, desempenha função importante na formação das representações dos
agentes, possibilitando as reproduções das relações sociais.

De acordo com Moscovici (1978, p.63), representar um objeto é

“ao mesmo tempo conferir-lhe o status de um signo, é


conhecê-lo, tornando-o significante. De um modo particular
dominamo-lo, interiorizamo-lo, fazemo-lo nosso. É,
verdadeiramente, um modo particular porque culmina em
que todas as coisas são representadas de alguma coisa”.

9
Cf Alonso de Andrade, na perspectiva da Escola Francesa de Sociologia, a construção da identidade é
um processo representativo. A identidade é construída socialmente, de forma dinâmica e dialética, em
que o indivíduo se reveste de múltiplas identidades (identidades fracionárias) mutantes e contraditórias
entre si, mas que mantém uma certa organização, coerência e estabilidade.
11

Portanto, é no momento em que os agentes pastorais reúnem os


integrantes do grupo, seja para reflexão do evangelho ou para discutir os
problemas sociais emergentes, que as representações sociais configuram-se,
expressas não só nos rituais e símbolos, mas, sobretudo na comunicação
(linguagem falada) e conduta que, tomadas como formas de conhecimento e
interação social, adquirem significados diversos correspondente às situações
reais.

Certos de que o campo das representações sociais está


inextricavelmente entrelaçado com as práticas pastorais, qualquer tentativa de
atribuir prioridade a uma ou outra será descartada, uma vez que impossibilita
perceber esta relação como totalidade indissociável. Por isso, acredita-se que
fundamentada num estudo empírico, possamos lançar mão da análise do discurso
como metodologia mais adequada à compreensão do estudo que ora se inicia.

Por fim, a centralidade do estudo das Representações Sociais se


evidencia por ser um instrumento imprescindível para acessar o objeto em
questão, acreditando que tal discussão possa trazer elementos importantes para a
compreensão das questões que norteiam a investigação, posto que a complexidade
e amplitude do conceito de Representação Social permitem a compreensão da
diversidade que permeiam as interrelações sociais presentes nas práticas pastorais.
12

O agente pastoral

Os agentes pastorais em questão, são vistos como sujeitos que vão se


gestando após Vaticano II e que a partir de Medellín (1968) muda a sua praxis10
dentro da situação de opressão do sistema capitalista periférico, dependente, tardio
e selvagem11, da teoria da dependência, da pedagogia de Paulo Freire12 de outros
movimentos culturais de cunho transformador.

De acordo com Novaes (1993), o agente pastoral é “a denominação


dada a padres, religiosos ou leigos que se engajam regionalmente neste projeto —
devem ser apenas um veículo, um ‘instrumento para dar voz a quem não tem
voz’.” (p.92).

Localizados geograficamente em região específica e, inseridos em


uma determinada comunidade católica, redemocratizam as relações internas da
igreja que, com liderança e relativa autonomia, coordenam as práticas pastorais
veiculadas por um saber religioso difundido historicamente e socialmente.

Conhecer o processo de construção das representações sociais


desses sujeitos, implica perceber a articulação entre práticas pastorais que
promovem e a afinidade com a formação cultural, política e religiosa que a
reproduz, reconhecendo-o como produto e produtor da ação, uma vez que a
representação social implica numa relação específica entre o sujeito e o objeto de
conhecimento, ou seja: o sujeito se auto representa na representação que faz do
objeto. Nesse sentido, representar um objeto significa criá-lo simbolicamente,

10
Entende-se por praxis “o conjunto das ações organicamente orientadas para a realização de um projeto
histórico, em relação a uma percepção global do sentido da vida humana na sociedade”. D. Aloísio
Lorcheider em A respeito da comunicação sobre teologia; CNBB, Comunicado mensal, 1983, abril n.
366.
11
H. Salem (coord). A Igreja dos oprimidos, São Paulo, Brasil Debates, 1981; L. E. Wanderley. Educar
para transformar: educação popular, Igreja Católica e política no Movimento de Educação de Base,
Petrópolis: Vozes, 1984.
12
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975.
13

fazer com que ele tenha um sentido para quem o representa, passando assim a
fazer parte do seu mundo. (Alonso de Andrade, 1995, p.45).

Pensar sobre a representação social dos agentes pastorais inseridos


no “novo modo de ser igreja”, nos remete necessariamente a retomar, ainda que de
forma breve, traços significativos que marcaram a história da Igreja pós-Concílio
Vaticano II, considerado marco de maior envergadura eclesial dos últimos séculos.

O “novo modo de ser Igreja” e os agentes pastorais

Para compreender o debate sobre as representações sociais dos


agentes pastorais engajados no “novo modo de ser Igreja”, é necessário ressaltar
as diferentes formas de atuação e interpretação das práticas religiosas vivenciada
por esta Igreja em relação à Igreja Tradicional.

A Igreja Tradicional ou conservadora é “uma igreja autoritária,


dogmática, fechada a toda mudança social, política e religiosa” (Richard, 1982,
p.206). Com uma rígida hierarquia eclesiástica (Papa, bispos, padres, leigos) não
abre espaço para participação comunitária, ocasionando uma certa passividade nos
fiéis. Tal modelo de Igreja-hierárquica marcadamente autoritário, centra suas
virtudes na submissão, na obediência e na humildade dos fiéis, dando ênfase aos
sacramentos — missas, batizados, casamentos, comunhão — como meios de
salvação individual. O trabalho do clero é eminentemente de cunho espiritual,
excluindo toda e qualquer possibilidade de ligação com a realidade social,
privilegiando a oração em detrimento da ação.

Não é nossa pretensão traçar um panorama da Teologia no Brasil,


nem tão pouco recuperar a história da Igreja Católica13, mas rever brevemente
13
Cf. trabalhos de Eduardo HOORNAERT, em ( Formação do catolicismo brasileiro; O cristianismo
moreno do Brasil, Vozes; A evangelização do Brasil durante a primeira época colonial. In História da
Igreja no Brasil, Tomos II/1, II/2 e III/3, Vozes: Petrópolis: 1979 entre outros .
14

fatos que marcaram o desenvolvimento e cristalização do “novo modo de ser


Igreja”.

A complexidade e dificuldade em estabelecer limites da chamada


“nova igreja”, fizeram com que teólogos, a exemplo de Richard (1982),
estabelecessem certas características do progressismo católico a partir de três
tendências: “Igreja Reformista ou Renovadora; Igreja Populista e Igreja
Politicamente Engajada”, esta, representada pela “nova Igreja “ foco de nossas
reflexões.

J. Libânio (1994, p.12-9), ao analisar a história da Teologia da


Libertação, divide-a em cinco momentos: 1º) gestação (1962-1968), quando a
Conferência Episcopal Latino-Americana de Medellín atualiza e contextualiza as
instituições à luz do Vaticano 2º); a gênese (1969-1971) configurada na obra de
Gustavo Gutiérrez (1975), que discute a compreensão dialética da relação Fé e
realidade.); 3º) o crescimento (1972-1979) marcado pela tomada de consciência
das contradições cada vez mais agudas do sistema social latino-americano e
inadequação das medidas políticas e econômicas propostas. Período em que
intensificam-se o trabalho pastoral com — pobres, negros, índios, camponeses
sem-terra, mulheres etc. —, aumentando a inserção de cristãos nos movimentos
sociais com o objetivo de transformar a realidade social); 4º) período de
consolidação (1979-1987) quando a Igreja ganha uma nova visibilidade social
através da opinião pública. “Em termos teológicos, a partir de Puebla, entram em
cena outros temas para aprofundamento: visão e discernimento pastoral da
realidade, missão evangelizadora e libertadora da Igreja, restruturação da Igreja
e da sociedade na perspectiva libertadora e opção pelos pobres); e 5º) o período
da revisão (1989-1986), em que destaca-se dois importantes acontecimentos:
externos, a exemplo “da derrota do Sandinismo na Nicarágua e a questão do
Socialismo no Leste europeu” e internos com o crescente fechamento da Igreja
Católica nos últimos anos, e o enrijecimento de algumas categorias usada por
15

“teólogos da libertação”, tais como classes sociais em detrimento de categorias


mais flexíveis, como cultura, cotidiano etc.)

Numa rápida retrospectiva do processo de construção do “novo


modo de ser Igreja”, ressalta-se que os anos de 1960 a 1962 refletem o período de
renovação da Igreja, proveniente do Pontificado de João XXIII (fase de
preparação do Concílio Vaticano II - 1962-65), em que a liberdade de expressão
política da época favorece a manifestação de novas forças sociais geradas pelo
processo desenvolvimentista do pós-guerra.

É importante ressaltar, ainda, que, durante esse período, surgem os


primeiros sinais de novas condutas emancipadas dos modelos importados14 dentre
as quais destacam-se: o Movimento por um Mundo Melhor, inspiração para o
Plano de Emergência (1962) e do Plano de Conjunto; a constituição das Regionais
da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos); o chamado Movimento de Natal; a
Frente Nacional do Trabalho em São Paulo; o MEB (Movimento de Educação de
Base); a evolução da JUC (Juventude Universitária Católica) e da JEC (Juventude
Estudantil Católica) na atuação pública, simultaneamente a diversos movimentos
que eclodem em vários pontos do território. Estes movimentos vão aprofundar os
compromissos sociais, passando a defender a necessidade de uma atuação política
conforme os princípios da fé.

Em 1973, a Igreja, através de bispos e superiores do Nordeste,


procede à publicação do documento “eu ouvi os clamores do meu povo”, numa
manifestação de defesa dos direitos dos pobres, assumindo a “voz daqueles a
quem foi tirado o direito à voz”. Crescem as Comunidades Eclesiais de Base ou
CEBs15, que como prática alternativa dos propósitos anti-autoritários, reúnem os
14
Lembramos que no sec. XIX, com a Proclamação da República (1889) e a separação da Igreja e Estado,
há todo um esforço para unificar as diferentes expressões religiosas através do processo de romanização
da Igreja. Comblim (1966: 595) adverte que tal processo, realizou-se por uma importação de uma
estrutura européia pré-fabricada, produzindo no catolicismo um fenômeno semelhante ao da classe
intelectual que, assimilando o iluminismo, distanciou-se do catolicismo popular.
15
Maiores informações sobre as CEBs consultar; Faustino L. C. TEIXEIRA, Comunidades eclesiais de
bases teológicas. Petrópolis: Vozes, 1984; Faustino L.C. TEIXEIRA .( et. al. ) CEBs, cidadania e
16

cristãos em torno da leitura e reflexão bíblica, celebração do culto dominical e de


movimentos sociais em defesa da cidadania; emergindo uma Igreja mais aberta à
participação popular e criadora de serviços que venham responder às necessidades
atuais do homem. Podendo-se dizer como sinais de um “novo modo de ser Igreja”
que as CEBs são um fenômeno orgânico dentro da Igreja e por isso possuem uma
significação histórica.

Na década de 80, a presença explícita da Igreja Católica ao lado das


lutas populares assume nitidez política. A “igreja progressista” busca reinterpretar
a doutrina social da Igreja, em que a fé cristã é interpretada num sentido de
contestação à ordem estabelecida, visando fundamentar um ideal histórico de
transformação social e política. Esse processo de renovação da Igreja após o
Concílio Vaticano II, abre espaço para a participação dos leigos nas decisões
eclesiásticas, notadamente, através das CEBs e das pastorais populares, principais
agentes renovadores da Igreja.

Nessa linha de ação, cada vez mais a Igreja aparece no cenário


público como defensora dos direitos humanos e das causas populares.

A esse respeito, Pedro Ribeiro de Oliveira (1992, p.46-54), em


estudos sobre “As Estruturas de Igreja e Conflitos Religiosos”, analisa a diferença
entre a “esquerda católica” dos anos 60 que era uma dissidência política no
interior da própria instituição, porém, não acarretava uma dissidência religiosa e a
“Igreja da Libertação” de nossos dias, que, com base nas CEBs e nas Pastorais,
define-se como grupos religiosos de contestação que separa a mensagem
evangélica da vida comunitária. Tal Igreja, além do ecumenismo — que se
contrapõe ao exclusivismo da “ Igreja de salvação individual” —, também “realiza
um trabalho propriamente religioso produzindo e reproduzindo significados

modernidade: uma análise crítica. Perspectivas pastorais n.4 , São Paulo: Paulinas, 1993 ; Lígia de M
.P. NÓBREGA, CEBs e educação popular, Petrópolis: Vozes, 1988; C. BOFF, Eclesiogênese: as
comunidades eclesiais de base reinventam à terra prometida. R.J.: Codecri, 1980, Cf. ainda C. BOFF,
Comunidade eclesial, comunidade política: ensaio de eclesiologia política. Petrópolis: Vozes, 1986.
17

sagrados que dêem sentido à vida social”, o que pode ser visto nas diferentes
manifestações da espiritualidade (interpretação da Bíblia de acordo com a
narrativa da libertação dos oprimidos) e na liturgia (produção de novas formas de
rezar)

Dessa forma, a Igreja Católica, em seu conjunto, passa por um


processo de revisão e reforma de sua liturgia, sua doutrina social, sua organização
interna com a incorporação dos leigos nas atividades da Igreja. Contudo, não se
pode perder de vista que o clero continua exercendo o monopólio dos bens
simbólicos de salvação, sendo a Igreja o locus privilegiado de produção e
reprodução desses bens. A esse respeito, convém lembrar Weber (1991) que
coloca a Igreja como uma espécie de “empresa da salvação das almas” em que o
monopólio ideológico da religião assegura a legitimação da ordem social.

Nessa perspectiva, Bourdieu acentua a autonomia do campo


religioso que se

“fazem acompanhar por um processo de sistematização e de


moralização das práticas e das representações religiosas que
vai do mito (..) à ideologia religiosa como (quase) sistema
expressamente sistematizado e, (..)do Deus primitivo,
arbitrário e imprevisível, ao Deus justo e bom, guardião e
protetor da ordem da natureza e da sociedade”. (Bourdieu,
1991:37).

Com efeito, C. Boff (1988), ao analisar as atuais tensões internas da


Igreja Católica, evidencia dois projetos em tensão dialética: o projeto
centralizador, claramente hegemônico é representado pelo Vaticano, com o Papa e
a Cúria Romana apresenta dupla face: conservador por dentro e libertário por
fora. Tanto numa face como noutra, trata-se de uma Igreja “autoritária” ou de
“poder”; e o projeto de participação, onde o eixo é a própria comunidade dos fiéis
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em sua vida e missão . “Para dentro, trata-se de uma Igreja de diálogo e para
fora de uma Igreja socialmente fermentadora e profética.”

Estes dois projetos, em constante tensão dialética, são enraizados na


mesma estrutura dogmática da Igreja: fé, sacramentos e pastores. “Por isso, há
entre eles contraposições e ao mesmo tempo composições. Por exemplo, a “opção
pelos pobres” pertence a ambas as tendências, embora entendida e vivida de
modo distinto”.

Referindo-se a dupla vertente — externa e interna — da Igreja


católica, nos dois projetos mencionados, o autor afirma “que a questão mais
crítica da Igreja católica de hoje não é a libertação (social), mas a participação
(eclesial em primeiro lugar e depois também social)”. A lacuna existente, hoje,
na Igreja é “mais uma questão de processo que de projeto, de método que de
meta.”

Diante desse dilema e tensão entre os dois projetos, o autor coloca


algumas propostas de ação para os agentes pastorais como:

“(1) insistir na idéia de uma Igreja participativa; (2)


prosseguir na missão de profetismo social da Igreja,
tomando o destinatário como sujeito e não como objeto; (3)
avançar na construção de uma Igreja inculturada em sua
liturgia, linguagem e organização; (4) recuperar as raízes
espirituais e místicas do cristianismo. (C. BOFF, 1996:148-
149).

Assim, o “novo modo de ser igreja “, em que os agentes pastorais


atuam, renuncia à imagem de uma sociedade uniforme e de uma Igreja Tradicional
com rígida hierarquia, ênfase nos sacramentos, individualista e centralizadora,
para confrontar uma nova tarefa: a de inventar sua própria figura onde o “eixo” de
tudo é o elemento agregador e participativo, que reúne a comunidade e faz
comunidade.
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Este breve resgate histórico, nos leva a pensar sobre a construção


das representações sociais dos agentes pastorais e a articulação com suas práticas,
face às significativas mudanças e tensões ocorridas no âmbito da Igreja, em que
emergem e configuram-se novos movimentos religiosos que, de maneiras
distintas, congregam à comunidade católica.

Observa-se pois, que, a partir do processo de renovação da Igreja, o


eixo da concepção das práticas pastorais sofre mudanças, não só na instituição
eclesiástica como no contexto social no qual o agente pastoral está inserido,
levando-o a redefinir e representar suas práticas de acordo com o universo
religioso atual.

Notadamente, as ações desencadeadas pelos agentes nos diversos


grupos pastorais — Pastoral da Juventude, Pastoral Operária, Círculo Bíblico,
CEBs, etc. — têm se constituído numa prática social participativa, no sentido de
possibilitar a criação de um novo sujeito, em oposição à Igreja Tradicional que
com uma rígida hierarquia, dava ênfase aos sacramentos devendo os fiéis somente
“assistir” às missas.

A difusão das práticas pastorais está no fato de partir de realidades


concretas, refletidas dentro de um processo coletivo no qual são consideradas: as
idéias, crenças e valores dos sujeitos envolvidos, possibilitando reconhecimento
dos agentes pastorais e, conseqüentemente, a exigência de uma transformação
objetiva da situação em que se encontram. Daí poder afirmar que não se pode
pensar numa transformação da realidade objetiva, sem antes passar pelo processo
de elaboração e reelaboração da subjetividade, uma vez que objetividade e
subjetividade não podem ser dicotomizadas, mas se encontram em permanente
dialeticidade.

O agente pastoral só é identificado como membro do grupo quando


não só assume uma postura crítica, mas representa os anseios e frustrações da
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comunidade. As suas ações deixam de ter caráter individual, para ser um ato
coletivo, que promove o surgimento de uma nova percepção e o desenvolvimento
de um novo conhecimento que se prolonga, sistematicamente, através de ações
recíprocas.

É inegável, que tanto do ponto de vista empírico como analítico, a


existência de milhares de comunidades cristãs — constituídas por trabalhadores,
mulheres, crianças, jovens — realizam o “novo modo de ser Igreja”, no qual as
relações estabelecidas nos grupos permitem uma redefinição das práticas
pastorais que deixam de ser predominantemente burocrática (centrada no eixo
clerical — padres e bispos) para adquirirem novos significados.

Neste “novo modo de ser Igreja”, os agentes pastorais vivenciam a


fé a partir da sua inserção e compromisso com a comunidade expressa nos gestos e
ações de solidariedade com outro, em que a palavra do Evangelho se concretiza na
ação. Dessa forma, suas representações, diferem daquelas da Igreja Tradicional,
em que os agentes pastorais limitados a orações, silenciando e omitindo o caráter
social e político do sistema capitalista vigente, permanecem ao lado das classes
dominantes. O “novo modo de ser Igreja” situa os fiéis como seres políticos e a
Igreja como comunidade de cidadãos com direitos a serem resgatados via religião.

De acordo com Novais (1993, p.92), tal modelo de Igreja que


pretende ligar Fé e Vida “visa uma teoria que nasça da ‘prática’, da ‘vivência’,
da ‘experiência’, da caminhada do povo.”

Acreditamos que esta reflexão, possa contribuir com o debate atual


sobre as representações sociais dos agentes pastorais e o “o novo modo de ser
Igreja”, no sentido compreender as relações de mediação existentes entre
representações sociais e comportamento dos agentes pastorais em sua praxis
religiosa, posto que estas se encontram muitas vezes, em posição ambígua,
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sancionando e justificando a estrutura existente (a ordem do real) e, ao mesmo


tempo, criticando e pondo em questão este mesma estrutura (ordem do ideal).
22

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