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Especialização em Psicologia da Educação

Especialização em
Psicologia da Educação
Desenvolvimento Infantil e a Dimensão Lúdica

Desenvolvimento Infantil e a Dmensão Lúdica


Iris Maria Ribeiro Porto

UNIVERSIDADE
ESTADUAL DO
MARANHÃO
iris Maria ribeiro porto

desenvolvimento Infantil
e a dimensão lúdica

são luís

2015
Governador do Estado do Maranhão Edição
Flávio Dino de Castro e Costa Universidade Estadual do Maranhão - Uema
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autorização desta instituição.

Porto, Ísis Maria Ribeiro.

Desenvolvimento infantil e a dimensão lúdica / Ísis Maria Ribeiro


Porto.– São Luis: UemaNet, 2015.

105 p.

1.Brincadeiras. 2.Jogos educativos. 3.Desenvolvimento infantil.


4.Aprendizagem. I.Título

CDU: 373.2.091.33-027.22:796
Ícones

orientação para estudo

Ao longo deste fascículo serão encontrados alguns ícones utilizados


para facilitar a comunicação com você.

Saiba o que cada um significa.

ATIVIDADES GLOSSÁRIO DICA DE SITE PENSE

SAIBA MAIS ATENÇÃO REFERÊNCIAS


palavra da professora-autora ....................................................... 7

Apresentação .................................................................................................. 9

UNIDADE 1 - Somos todos brincantes ............................................ 11

1 Introdução: brincar é parte de nós e com ele construímos


sonhos infantis .......................................................................................... 11
2 Brincar: fantástica aventura ............................................................. 12
2.1 Brinquedo: convite permanente ao prazer ............................... 17
2.1.1 Classificação dos brinquedos ...................................................... 21
2.2 Brincadeira: mundo de criatividade e energia ........................ 23
2.3 O fantástico mundo dos jogos ........................................................ 25
2.3.1 A concepção de Wallon ................................................................. 27
2.3.2 A concepção de Piaget ................................................................... 28
2.3.3 O jogo na concepção de Vygotsky .............................................. 30
Resumo ....................................................................................................... 30
Referências ................................................................................................ 33

UNIDADE 2 - Brincar, linguagem atemporal e universal 35

1 Introdução: Brinquedos, Brincadeiras e Jogos: reflexos da


história .......................................................................................................... 35
2 Brinquedo e dimensão lúdica na passagem do tempo ........ 38
3 O brinquedo na modernidade e a noção de criança .............. 45
Resumo ....................................................................................................... 49
Referência .................................................................................................. 51

UNIDADE 3 - O BRINCAR no desenvolvimento infantil ......... 53

1 Introdução ................................................................................................. 57
2 A s bases neurofisiológicas do brincar ........................................ 55
3 O brincar de faz de conta .................................................................... 58
4 Brincar, laboratório do espírito e do intelecto e suas
transformações ....................................................................................... 62
4.1 Mudanças no brincar e seus efeitos no desenvolvimento 63
Resumo ...................................................................................................... 67
Referências .............................................................................................. 69

UNIDADE 4 - O brincar e a aprendizagem no desenvol-


vimento infantil ........................................................................................... 71

1
Introdução ............................................................................................... 71
2
Visão pedagógica do brincar das sociedades antigas ....... 72
3 Visão pedagógica do brincar das sociedades medievais 75
4 Brinquedos, brincadeiras e jogos e sua inserção na escola 77
5 O brincar e a aprendizagem na escola ....................................... 89
Resumo ..................................................................................................... 92

Referências .............................................................................................. 96
ANEXO ........................................................................................................ 97

PALAVRA DA PROFESSORA-AUTORA

Caro estudante,

Este é um instrumento para sua leitura, estudo e reflexão sobre a


disciplina .Desenvolvimento Infantil e a Dimensão Lúdica. Certamente
será útil para seu conhecimento os conteúdos que compõem a ementa
da disciplina. Nosso objetivo é desenvolver um olhar para o ato de brincar
no desenvolvimento infantil e para as contribuições que o ato de brincar
traz neste contexto. Ao mesmo tempo, perceber nesta dimensão, o seu
direito na herança das experiências humanas, buscando compreender o
lugar central que este ocupa.

É um estudo interessante à medida que contemporaneamente a


ludicidade é reconhecida como um elemento de saúde, equilíbrio
psíquico e físico de prazer, relaxamento e de contato social para
crianças e adultos em geral. Nesse sentido, a dimensão lúdica tomou um
espaço universal preventivo e de manutenção de segurança, confiança,
aprendizagem e de saúde, notadamente para a criança se desenvolver
de forma saudável.

Nesse contexto, as palavras lúdico, ludicidade, brinquedo, brincadeira


e jogo são bastante utilizadas em nosso cotidiano, mas nem sempre
clarificadas pela diversidade e dinamicidade que as envolvem. Dai a
necessidade de conhecer e discutir no fascículo elementos básicos do
desenvolvimento humano e do brincar em interface com a cultura. É
um caminhar entre caminhos diversos com tons, cores, sons e sabores
de infância, liberdade e alegria.

Neste fascículo, trilhamos por caminhos amplos construídos a partir


de experiências com sabor de infância, de descobertas ao longo do
tempo sobre a temática. Desafiamos você a perceber e concluir que
para o desenvolvimento biopsicossocial infantil, o ato de brincar não
pode ser considerado apenas brincadeira livre, mas importante para
o desenvolvimento cognitivo, linguístico, social, emocional e físico
da criança.
Convidamos você a buscar um aprofundamento sobre o tema, a
percorrer essa caminhada rumo a descobertas sobre a dimensão lúdica,
confrontando-se com os aspectos socioculturais, social e histórico-
cultural que circundam e refletem a base psicológica para as habilidades
sociais que a criança precisa desenvolver agora e no futuro.Então, vamos
conhecer a disciplina.
Caro estudante,

Brincar é investigar, pesquisar, descobrir e construir.Quando brinca,


a criança se defronta com desafios e problemas e busca soluções. A
brincadeira auxilia a criança a criar uma imagem de respeito a si mesma,
manifestar gostos, desejos, dúvidas, mal-estar, críticas, aborrecimentos,
entre outros comportamentos em seu desenvolvimento.

No brincar está presente a construção de representações de si mesma,


do outro e do mundo, bem como a revelação e internalização de
comportamentos e hábitos. Por meio do brincar, a criança consegue
expressar sua necessidade de atividade, sua curiosidade, seu desejo de
criar, de ser aceita e protegida, de se unir e conviver com outros.

Esta disciplina, Desenvolvimento Infantil e a Dimensão Lúdica, foi


planejada seguindo os objetivos que norteiam nossas reflexões. Ela
foi estruturada pensando na importância da relação entre a dimensão
lúdica e suas características e o desenvolvimento da criança. Para isso
discute aspectos conceituais, teóricos e práticos sobre a temática que é
encantadora e nos convida a estudar para conhecer melhor.

O conteúdo está organizado e distribuído em quatro Unidades. Elas


foram organizadas para abordar conceitos de desenvolvimento
e ludicidade, os recortes epistemológicos dos brinquedos, das
brincadeiras, e dos jogos, os referenciais da relação entre o ato de
brincar e o desenvolvimento na concepção de estudiosos como
Wallon, Vygotsky e Piaget.

Estudaremos o marco referencial para brinquedos, brincadeiras e jogos


no desenvolvimento infantil com a assertiva de que por meio das
atividades lúdicas a criança adquire conhecimento e constrói saberes.
Além disso, com a compreensão de que brincando as crianças propagam
suas emoções, sensações e pensamentos sobre o mundo e também um
espaço de interação consigo e com os outros.

Cória-Sabini e Lucena (2004, p.78) esclarecem que “é através dos jogos


que as crianças aprendem a lidar com situações problemas que os levem
a pensar. A participação em jogos de grupo também representa uma
conquista cognitiva, emocional, moral e social”.
Somos seres brincantes

Objetivos

• Reconhecer o fato de que somos todos brincantes;


• Discutir as concepções de brinquedo, brincadeira e jogo;
• Compreender a importância do brincar para o desenvol-
vimento infantil;
• Identificar as principais formas de brincar.

1 Introdução: brincar é parte de nós e com ele


construímos sonhos infantis

Todos nós brincamos e temos lembranças das brincadeiras da nossa in-


fância. É próprio da criança brincar. Desde os povos primitivos ela trans-
forma objetos em representações. Suas mãos podem transformar obje-
tos como pedrinhas, bolinhas, papéis, madeira, embalagens, plásticos
em um brinquedo.

Brincando a criança dá vida a figuras imaginárias inteligíveis muitas vezes


Unidade
somente em seu mundo de subjetividades. Para ela é um meio de sair do
mundo real para descobrir outros, para se projetar num universo inexis-
tente, mas real para ela. Para Huizinga (1999), ela vive em estado de jogo:

A criança vive em estado de jogo. O homo ludens tem


sua melhor expressão e mais plena vigência na idade
infantil. A criança forma-se num processo de jogos, de
interação lúdica com as outras pessoas, com os objetos,
com os animais, com os fatos. Até, antes de serem a dura
realidade, são as maleáveis matérias de seu brinquedo
(HUIZINGA, 1999, p. 3).
Sobre esse viver em estado de jogo da criança, podemos refletir com Santos
(2001) quando assegura que no estudo do mapeamento do cérebro, Roger
Sperry e Ned Herman provaram cientificamente que o brincar está localiza-
do no quadrante superior do hemisfério direito do cérebro que se caracteri-
za pelo experimentar, intuir, explorar, vivenciar, descobrir e inovar (Figura 1).

figura 1 – O Brincar e o cérebro


fonte: www.bemfamília.com.br

Essas atividades são típicas da criança e revela essa relação de estado


Brincar é o laboratório
do espírito e do intelecto constante da necessidade de brincar, pois o cérebro e quase sempre
onde ocorrem as neces-
sárias experiências que o seu corpo fica estimulado e ativo, criando uma atitude de alegria em
correspondem àquelas
que hão de vir. Chateau relação à vida e, é uma forma de expressão. Pois:
(MIRANDA, 2001).

Lúdico é uma categoria


A criança se expressa pelo ato lúdico e é através desse
geral de todas as ativida- ato que a infância carrega consigo as brincadeiras. Elas
des que têm característi- perpetuam e renovam a cultura infantil, desenvolvendo
cas de jogos, brinquedos formas de convivência social, modificando-se e recebendo
e brincadeiras. Miranda novos conteúdos, a fim de se renovar a cada nova geração
(2001, p. 30)
(dORNELLES, 2001 p. 103).

2 brincar: fantástica aventura

O brincar da criança é efetivado manipulando um objeto, o brinquedo,


ou seguindo regras de um jogo ou de uma brincadeira. Embora haja vá-
rias formas de brincar, evidenciam-se de modo geral essas três: brinque-
dos, brincadeiras e jogos que, embora com identidade própria, estão
profundamente imbricados.

12 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Muitas questões que envolvem o brincar têm surgido, na tentativa de expli-
car porque a criança brinca, independente de idade, sexo, etnia, classe social,
época ou cultura. Há mais de um século intensificaram-se as pesquisas nessa
temática e muito já foi produzido. Conforme Smith (apud MOYLES, 2002, p. 18),
“[...] é importante definir o que é brincar [...]. Isso não significa que uma defini-
ção simples ou totalmente inclusiva seja fácil, atingível ou mesmo desejável”.

O brincar e suas concepções segundo Santos (2001, p. 113-11):

• Filosófico - o brincar é tratado como um mecanismo para con-


trapor à racionalidade, pelos seus aspectos de subjetividade,
afetividade, valores e sentimentos, pois a criança dá vazão a sua
fantasia, a seus sonhos;
• Sociológico - o brincar é a forma como a criança se insere na
sociedade, através do qual ela é apresentada ao grupo e a va-
lores, crenças, hábitos, ética, sistemas de linguagens e modo de
produção. Brincar é a primeira forma de cultura;
• Psicológico - o brincar está presente no desenvolvimento da
criança nas diferentes formas de modificação de seu compor-
tamento. É uma linguagem, fonte de descoberta e um prazer. A
formação da personalidade, as motivações, emoções, os valo-
res, as interações da criança com a sociedade e com a família se
associam aos efeitos do brincar;
• Pedagógico - o brincar representa um fenômeno essencial na
construção de conhecimentos, no desenvolvimento da inteli-
gência, na evolução do pensamento e de todas as funções men-
tais superiores que permitem o desenvolvimento em seu leque
de possibilidades educativas;
• Psicoterapêutico - o brincar por si só é uma terapia e tem a Nessa busca para en-
tender esse fenômeno
função de compreender a criança e suas reações, de remover natural que ocorre na
bloqueios do desenvolvimento manifestos, que tornam impor- vida da criança reforça-
do pela cultura, encon-
tantes serem tratados. É uma forma de comunicação para que tramos bases teóricas na
o crescimento ocorra de forma menos traumática, quando ela Filosofia, Sociologia, Psi-
cologia, Pedagogia, Psi-
exterioriza seus medos, angústias e problemas internos. coterapia, entre outros.

Brincar representa também exercitar o raciocínio, a descoberta, a per-


sistência, a perseverança, o aprender a se relacionar, a perder, a ganhar,
a escolher, a assumir, a participar, a negociar, a escutar, a delegar e a

Somos seres brincantes | UNIDADE 1 13


postergar. Quando a criança brinca livremente favorece e fortalece sua
autonomia e afirmação como pessoa ao explorar o mundo. De igual
modo desenvolve a criatividade e o espírito artístico, conforme Macha-
do (1993, p. 27):

[...] brincar com espontaneidade, sem regras rígidas e sem


precisar seguir estritamente os folhetos de instruções
dos brinquedos, é explorar o mundo por intermédio dos
objetos. Enquanto usa, manipula, pesquisa e descobre
um objeto, a criança chega às próprias conclusões sobre
o mundo em que vive.

Compreendendo o que é brinquedo, brincadeira e jogo

Existem diversos autores e concepções sobre a ludicidade e várias ver-


tentes de interpretação. Uma delas é a que corresponde ao objeto cul-
tural, segundo Jaulin (apud KISHIMOTO, 2000). Nessa concepção, o brin-
quedo não pode ser isolado da sociedade que o criou e reveste-se de
elementos culturais do contexto histórico.

Essa vertente entende que o brinquedo reflete o mundo com suas ca-
racterísticas locais, regionais, nacionais e mundiais e o pensar da socie-
dade. Ao mesmo tempo ele projeta e constrói imagens que se perpe-
tuam, invadem mundos diferentes de crianças e têm a possibilidade de
influenciar gerações (Figura 2).

Figura 2 – Brinquedo Cultural


Fonte: www20.caixa.gov.br

14 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Outra vertente que estuda os brinquedos, as brincadeiras e os jogos
provêm da vertente histórica, no interesse de se conhecer sua origem
e evolução. Eles só podem ser pesquisados em estreita relação com a
criança em diferentes culturas. Essa vertente traça a trajetória dos brin-
quedos, das brincadeiras e dos jogos na história, revisitando suas me-
mórias de forma a contextualizar na contemporaneidade.

Desse modo Vygotsky (1984) diz que é Zona de Desenvolvimento Pro-


ximal todo o comportamento que a criança apresenta no brincar, mas
que dificilmente transparece no dia a dia dela. Esses comportamentos
constituem-se a base da construção dos valores éticos, morais, afetivos
e cognitivos que, posteriormente, irão compor sua possibilidade de sub-
jetivação diante do contexto social e cultural em que vive (Figura 3).

Figura 3 – Brinquedo
Fonte: pousoalegre.net

Quanto à definição de Brinquedo, Beart (apud KISHIMOTO, 2000) diz que


ele é o suporte da brincadeira, quer seja concreto ou ideológico, conce-
bido ou simplesmente utilizado como tal, ou mesmo puramente fortuito:

Quando puxa, empilha, amassa, desamassa e dá nova


forma, a criança transforma, brincando e criando ao
mesmo tempo. Poder transformar, dar novas formas a
materiais como quiser, propicia à criança instrumentos
para o crescimento mais saudável, que estimula a explorar
o mundo de dentro e o mundo de fora dando a eles nova
forma, no presente e no futuro, a partir de sua vivência
(Machado, 1993, p. 27).

Somos seres brincantes | unidade 1 15


Para entender Brincadeira apoiamo-nos nas ideias de Brougère (2000),
quando a caracteriza como algo que escapa a qualquer função preci-
sa, podendo ser relacionada a gratuidade, liberdade, objeto livre, sendo
portanto difícil definir e delimitar. Diferente dos brinquedos, seu valor
simbólico não é sua função (Figura 4).

figura 4 - Brincadeira
fonte: disneybabble.uol.com.br

Quanto aos jogos podem ser entendidos como uma categoria com
propriedades amplas, estudadas por diversas áreas do conhecimento
(Figura 5).

São estudiosos de brin-


quedos: historiadores
(Huizinha, Callois, Ariès,
Margolin e Jolibert); filó-
sofos (Aristóteles, Platão,
Schiller e Dewey); linguis-
tas (Cadzen, Vygotsky e
Weir); antropólogos (Ba-
tisor, Schwartz, Sutton-
-Smith, Henriot e Brou-
gère); psicólogos (Bruner,
Jolly e Sylva, Freire, Freud
e Piaget) e educadores
(Chateau, Vial e Alain), os
quais assinalam a impor-
tância dos jogos como
recurso para educar e
desenvolver a criança.

figura 5 - Jogos
fonte: site.sanepar.com.br

16 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Atenção!!! Compreendendo as diferenças

Jogo é o suporte quando atende além da imaginação a uma prática


lúdica que possui um sistema de regras que ordenam as ações.

Brinquedo é o suporte da brincadeira quando serve a uma atividade


espontânea, sem intencionalidade inicial, que se desenvolve de
acordo com a imaginação da criança.

Brincadeira é uma atividade espontânea da criança, sozinha ou em


grupo. A brincadeira na infância leva a criança a solucionar conflitos
por meio da imitação, ampliando suas possibilidades linguísticas,
psicomotoras, afetivas, sociais e cognitivas.

Jogo pressupõe uma


regra, o brinquedo é o
2.1 brinquedo: convite permanente ao prazer objeto concreto ou idea-
lizado e a brincadeira é
o ato de brincar (com o
jogo ou com o brinque-
do). Assim, entende-se
que, apesar de terem
O brinquedo é o veículo do crescimento. Construído em um determina- conceitos etimológicos
diferentes, brinquedos,
do tempo, ele é fruto de valores que refletem o ideário do que é criança brincadeiras e jogos es-
e do que é brincar. Sua significação possibilita o desenvolvimento de tão profundamente re-
lacionados.
processos psíquicos, sendo ele instrumento para explorar e conhecer o
mundo físico e seus usos sociais e entender o comportamento humano
de forma prazerosa.

Por meio dos brinquedos, a criança desenvolve a imaginação, a


autoestima, o autocontrole e a cooperação. O modo como ela brinca
revela o seu mundo interior possibilita-lhe relacionar-se com o exterior,
desenvolver seus aspectos cognitivos, motores e afetivos “o brinquedo é
assim, um fornecedor de representações manipuláveis de imagens com
volume.” (BROUGÉRE, 2000, p. 14).

A grande maioria dos brinquedos são testemunhas das brincadeiras da


Antiguidade, registradas nas pinturas e gravuras desse período, como
bonecas, bolas, bilboquês, cordas de pular, pião, cavalo de pau e pipa,
tão conhecidos que se perpetuaram pela oralidade (Figura 6).

Somos seres brincantes | UNIDADE 1 17


Figura 6 – Brinquedo antigo
Fonte: www.pinterest.com / Fonte: rs.olx.com.br

O brinquedo estimula a brincadeira ao abrir possibilidades de ações


coerentes com a representação. Quanto mais cheia de brincadeiras e
de investigação for a relação da criança com o brinquedo, tanto maior
a intimidade, a memória afetiva dos parceiros, e maior a facilidade de
construir novas histórias “há uma lei fundamental que, antes de todas as
regras e leis particulares, rege a totalidade do mundo dos brinquedos: a
lei da repetição.” (BENJAMIN, 2002, p. 53).

Para Benjamin (2002), torna-se importante a criança ver o que está por
trás do brinquedo, ao desmontá-lo, apropriar-se dele, estabelecer com
ele uma relação de descoberta, de conversa e de novas invenções. En-
quanto o desconstrói, ela constrói com bases em significados próprios,
revalorizando em seus jogos imaginativos (Figura 7).

Figura 7 - Interpretando papéis


Fonte: www.agendasorocaba.com.br

Vygotsky (1996) entende o brinquedo como fator muito importante no


desenvolvimento da criança, pois, através dele, ela projeta-se nas ativi-
dades adultas de sua cultura, ensaia seus futuros papéis e valores, o que

18 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


gera oportunidades para o seu desenvolvimento intelectual; com ele a
criança começa a adquirir motivações, habilidades e as atitudes neces-
sárias à sua participação social, que os companheiros mais velhos e os
adultos ajudarão a completar.Para ele, o brinquedo é uma importante
fonte de promoção do desenvolvimento.

Brougère (2000) diz que o brinquedo encerra uma representação da


criança, num objeto escolhido por adultos. As cores e as formas cons-
troem um universo no qual predomina o animismo, o antropomorfismo,
a magia, a alegria, a imagem risonha e a nostalgia, no discurso cultural
que brinquedos, contos e desenhos animados propiciam.

Ele possibilita experiências variadas a partir da forma, do desenho, da


cor, do aspecto tátil, do cheiro, dos sons e do material de que é feito, seja
madeira, espuma, ferro, pano, vinil ou material regional. Apesar de ser
representações do mundo masculino e feminino, de regionalidade, de
temporalidade, de representações do espaço, caberá à criança dar-lhe o
significado que lhe aprouver.

A riqueza de um brinquedo não está na sua forma de produção, nem no


material de que é feito, ela é produzida por aquilo que o brinquedo é ca-
paz de possibilitar à criança. Além disso, como defende Benjamim (apud
OLIVEIRA, 2000), não são os adultos que executam a correção mais efi-
caz dos brinquedos, mas sim as próprias crianças, no curso de encaixar,
empilhar e construir (Figura 8).

Figura 08 – Brinquedo de materiais diferentes


Fonte: www.sobrematernidade.com.br

Somos seres brincantes | unidade 1 19


Suas ações frente ao brinquedo ao experimentar, imaginar, expressar,
compreender, confrontar, compõe-se numa relação interativa entre
brincar e aprender sobre si e sobre o outro comandado por ela. Assim
vai construindo autonomia, identidade cultural, social, histórica, subje-
tividade e cidadania, aprendizagens importantes na leitura de mundo.

Ariès (1981, p. 86) diz que, em torno dos divertimentos mais naturais
como utilização de brinquedos, bonecas, soldadinhos, armas, rodas que
apareciam e desapareciam, no decorrer das épocas, representava-se o
tipo de valores e concepções que se desejava passar e incutir nas crian-
ças e adolescentes (Figura 9).

A representação e a ex- figura 9 - Brinquedos antigos


pressão de imagens são fonte: www.google.aleggro.com.br
estimuladas pelo brin-
quedo, pois este evoca
aspectos da realidade,
do que existe no coti- O brinquedo é importante para auxiliar a criança a compreender a di-
diano, na natureza e nas nâmica das relações sociais em diversas realidades socioculturais, no
construções humanas,
reproduzindo uma to- desenvolvimento de princípios e valores tais como a aceitação das dife-
talidade social, aspecto
muito interessante a ser renças étnicas, de gênero, de classe social e religião.
observado, pois os brin-
quedos são sempre uma Quando a criança dá vida a qualquer objeto fazendo dele um brinquedo
representação do que a
criança observa. em seu faz de conta, naturalmente é o que está em seu entorno que será
representado, fazendo com que acabe evocando um momento históri-
co, conforme é comentado sobre os brinquedos contemporâneos por
Kishimoto (2000, p. 18):

20 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Hoje os brinquedos reproduzem o mundo técnico
e científico e o modo de vida atual, com aparelhos
eletrodomésticos, naves espaciais, bonecos e robôs.
A imagem representada não é uma cópia idêntica
da realidade existente, uma vez que os brinquedos
incorporam características como tamanho, formas
delicadas e simples, estilizados ou antropomórficas,
relacionadas à idade e gênero do público ao qual é
destinado.

Expressar os dramas e construir consciência da realidade é outra possi-


bilidade do brinquedo. Por meio dos jogos, dos brinquedos e das brin-
cadeiras que a criança compreende sua sociedade e sua cultura, pois
estes são portadores de seus valores (BROUGÈRE, 1998). (Figura 10).

Figura 10 – Brinquedo de gênero


Fonte: www.artesanatoereciclagem.com.br

Dentro de uma só cultura, crianças brincam com temas comuns: edu-


cação, relações familiares e vários papéis que representam as pessoas
integrantes dessa cultura. Os temas, em geral, representam o ambiente
das crianças e aparecem no contexto da vida diária. Quando o contexto
muda, mudam também o brincar.

2.1.1 Classificação dos brinquedos

O brinquedo possui classificação de acordo com suas características e


relação com a criança. Elas organizam o brinquedo em interação com a

Somos seres brincantes | unidade 1 21


criança e sua ação sobre ela e da criança com as diversas significações que
atribui enquanto brinca. De acordo com a International Council Children
Play, os brinquedos classificam-se com os seguintes valores (CONSELHO
INTERNACIONAL DE BRINCADEIRAS INFANTIS: DIVULGAÇÃO ABRINC):

• valor Funcional avalia as qualidades intrínsecas do brinquedo: tama-


nho, cor, peso, adequação às necessidades da criança;
• valor experimental analisa as formas de experimentar o brinquedo:
encaixar, construir, medir:
• valor de estruturação avaliaa reação da criança em contato com o
brinquedo; que permita a projeção, transferência e imitação;
• valor de relação analisa a relação dos brinquedos com o real.

Para essa instituição existem outras categorias eleitas para os brinque-


dos que não são vistas de forma isoladas: atividades sensório-motoras, fí-
sicas, intelectuais, criativas, desenvolvimento afetivo e relações sociais.Um
mesmo brinquedo pode conter várias delas.

Essa classificação leva em conta as famílias de brinquedos que abran-


gem cento e dezesseis tipos de brinquedos diferentes e o valor psicoló-
gico que ele tem, considerando cento e vinte e seis pontos dentro dos
valores de desenvolvimento nos quais novas rubricas poderão ser acres-
centadas (Figura 11).

Figura 11 – Brinquedos variados


Fonte: www.pontolegal.com

22 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Outras classificações existem tais como a de faixa etária, limitando-se à
idade da criança e aos riscos que o brinquedo pode oferecer.

Atenção!!

1. Estabeleça a relação entre Brinquedo, Brincadeira, Jogo e de-


senvolvimento infantil. Faça isso pensando: Qual a importân-
cia? Deve ser estimulado? Por quê? Tem mais vantagem quem
é estimulado?

2.2 Brincadeira: mundo de criatividade e energia

A brincadeira constitui-se em um sistema que integra a vida social das


crianças, segundo Friedmann (1996). Caracteriza-se por ser transmitida
de forma expressiva de uma geração a outra ou aprendida nos grupos
infantis, na rua, nos parques, escolas e festas. Ela é incorporada pelas
crianças de forma espontânea, variando as regras de uma cultura a ou-
tra, ou entre grupos. É uma ação que a criança desenvolve ao cumprir as
regras dos jogos e do brincar (Figura 12).

figura 12 - Brincadeira
fonte: www.saudebeleza.org

Somos seres brincantes | UNIDADE 1 23


É um meio privilegiado de inserção na realidade da vida. Ao mesmo
tempo ela expressa a forma como a criança reflete, ordena, destrói, e re-
constrói o mundo de sua maneira e como utiliza suas fantasias, desejos,
medos, sentimentos e os conhecimentos a partir da experiência de vida.
Para Freud (1987, p. 132): “Cada criança em suas brincadeiras cria o seu
mundo próprio, ou dizendo melhor, transpõe os elementos formado-
res do seu mundo para uma nova ordem, mais agradável e conveniente
para ela.” (Figura 12).

Para a vertente histórico-cultural, as brincadeiras possuem três caracte-


rísticas: a imaginação, a imitação e a regra, que estão presentes em todos
os tipos de brincadeiras infantis, sejam elas tradicionais, faz de conta ou
de regras. Vygotsky (1996) diz que na brincadeira, a criança se comporta
além do habitual como uma atividade social na qual adquire elementos
imprescindíveis para a construção de sua personalidade e para com-
preender a realidade da qual faz parte.

[...] é na brincadeira que a criança se comporta além


do comportamento habitual de sua idade, além do
de seu comportamento diário. A criança vivencia uma
experiência dos brinquedos como se ela fosse maior do
que é na realidade. [...] o brinquedo fornece estrutura
básica para mudanças das necessidades e da consciência
da criança (VYGOTSKY, 1996, p. 17).

Do seu ponto de vista, o desenvolvimento das estruturas mentais espe-


cificamente humanas só vão se desenvolver pelo relacionamento com
o outro (a importância da brincadeira com os pares) e pela linguagem,
que é a maneira através da qual a criança reconstrói, individualmente,
aquilo que internalizou.

A brincadeira pode ser um espaço privilegiado de interação e confronto


de diferentes crianças e pontos de vista. Segundo Wajskop (1997, p. 33-
34), a brincadeira infantil pode constituir-se em uma atividade em que
as crianças, sozinhas ou em grupo, procuram compreender o mundo e
as ações humanas nas quais se inserem cotidianamente.

24 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Buhler (apud TELES, 1999, p. 17), considera sete tipos de brinca-
deiras que a criança desenvolve, de acordo com sua faixa etária e
quanto ao aspecto social, aprofundando a compreensão da realida-
de e ao mesmo tempo estimulando a imaginação. Na faixa etária,
ele considera 3 tipos:

• Funcional - que domina o primeiro ano de vida;


• Imaginativa - quando a criança incute significações às ações;
• Construtiva - quando consegue construir sozinha.
Quanto ao aspecto social no desenvolvimento ela pode ser de
4 tipos:
• Solitária - quando a criança brinca sozinha;
• Observativa - quando apenas observa o brincar de outras crianças;
• Paralela - quando ela brinca ao lado de outra que está brincando;
• Associativa - quando ela coopera com outra para realizar algo.

Podemos dizer, então, que o ambiente é a condição para a brincadeira e,


por conseguinte, ele a condiciona constituindo-se assim numa parte da
cultura posta ao alcance da criança e seu parceiro na brincadeira, con-
forme Gabarino (apud BOMTEMPO, 2000).

2.3 O fantástico mundo dos jogos

Jogo é uma atividade livre, espontânea, fon-


te de alegria e diversão. Muitos teóricos têm
estudado o jogo, suas características e pos-
sibilidades. Assim, para Freud, M. Klein e S.
Hall, os jogos são de origem biológica; para
Winnicott e Vygotsky, de origem social. Para
Garvey, o jogo é ao mesmo tempo produto e
marca da herançabiológica do homem e de
figura 13 - Jogo
sua capacidade criadora de cultura. Todos os fonte: www.jogosinfantisedu-
teóricos concordam que a criança nos jogos cativos.com.br

Somos seres brincantes | UNIDADE 1 25


cria uma situação imaginária e é esta a característica definitiva dos jogos
em geral (Figura 13).

Vygotsky coloca um elemento que os jogos produzem: o desprazer


que o caracteriza com os esforços na busca do objetivo – ganhar - e no
resultado que não é favorável a todos, havendo sempre o perdedor,
que se constitui em uma boa aprendizagem para a vida. Christie (apud
KISMOTO, 2000, p. 5) elabora critérios para identificar os traços que
distinguem o jogo.

critérios que identificam o jogo:

1. A não-lateralidade – as situações de jogo caracterizam-se por um


quadro no qual a realidade interna predomina sobre a externa. O
sentido habitual é ignorado por um novo;
2. Efeito positivo – o jogo é normalmente caracterizado pelos signos
do prazer ou da alegria. Entre os sinais que exteriorizam a presença
dos jogos estão os sorrisos;
3. Flexibilidade – as crianças estão mais dispostas a ensaiar novas
combinações de ideias e de comportamentos em situações de jo-
gos que em outras atividades não recreativas;
4. Prioridade do processo de brincar – enquanto a criança brinca, sua
atenção está concentrada na atividade em si e não em seus resulta-
dos ou efeitos. Só é jogo quando a criança pensa apenas em brincar;
5. Livre-escolha – o jogo só pode ser jogo quando selecionado livre e
espontaneamente pela criança. Caso contrário, é trabalho ou ensino;
6. Controle interno – no jogo, são os próprios jogadores que deter-
minam o desenvolvimento dos acontecimentos. Quando o profes-
sor utiliza um jogo educativo de modo coercitivo, não permitindo
liberdade ao aluno, não há controle interno.

Os jogos que envolvem contato com a terra, trazem a relação com a


natureza.O pião, bolinha de gude, boliche, tiro ao alvo e argola, unem
cálculos finos e a força muscular. Pular corda, andar sobre latas, gangor-
ra, balanço e perna de pau exigem da criança força, equilíbrio dos múscu-
los e tendões firmes. Os que incluem ritmo, melodia, o canto, a simbologia

26 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


da letra, também são enriquecedores para o sistema acústico e da fala
da criança. Brougère (2000, p. 53) e Henriot (1994, p. 35) apresentam três
níveis de diferenciação para que se entenda e defina o termo jogo:

1. o resultado de um sistema linguístico funcionando dentro de um


sistema social, afirma que cada contexto cria sua concepção de jogos,
veiculado pela língua enquanto instrumento de cultura da socieda-
de. Dependendo do lugar e da época, os jogos assumem significa-
ções distintas;

2. um sistema de regras: permite identificar nos jogos, uma estrutura


sequencial que especifica sua modalidade, dando-lhe identidade
própria. Cada jogo é jogado com regras próprias, distintas dos de-
mais jogos;

3. um objeto: representa o concreto, o material que se joga, o tabu-


leiro para o xadrez, as cartas para o baralho, a bola para o futebol,
basquete, vôlei.

Todos esses estudiosos buscaram compreender melhor como se carac-


terizam esses jogos, qual a participação da criança neles e a condição
que eles oferecem para o desenvolvimento infantil, de acordo com suas
especificidades. Destacamos a seguir em Wallon, Piaget e Vygotsky a
fundamentação teórica para compreendermos como a criança constrói
conhecimento por meio dos brinquedos, das brincadeiras e dos jogos.

2.3.1 A concepção de Wallon

Wallon (1989, p. 25) considera a atividade lúdica como uma forma de


exploração da situação presente. Na origem da conduta infantil o social
está presente no processo interativo da criança com o adulto que de-
sencadeia a emoção responsável pelo aparecimento do ato de explora-
ção do mundo. Ele classifica os jogos infantis da seguinte forma:

a - jogos Funcionais: os que permitem o exercício gratuito de funções


psicológicas emergentes, sejam predominantemente físicas, sensoriais
ou relacionadas à tonicidade;

b - jogos de Ficção ou de imitação: os que dizem respeito à utilização


pura e simples de capacidade imaginativa da criança, como brincar de
papai e mamãe, de casinha etc;

Somos seres brincantes | unidade 1 27


c - jogos de Aquisição: os que se efetivam quando a criança observa, es-
cuta questiona. É o caso das gravuras, paisagens e coleções;

d - jogos de Fabricação: envolvem combinar, construir, modelar,como


jardinagem, bordado, costura e desenho (Figura 14).

Figura 14 – Jogo de fabricação


Fonte: www.prosaber.org.br

Para Wallon (1989, p. 15), a atividade lúdica é uma forma de exploração,


de infração da situação presente. Ele se aproxima de Vigotsky (1988)
quando analisa o psiquismo infantil como resultado de processos so-
ciais. Na origem da conduta infantil o social está presente no processo
interativo da criança com o adulto que desencadeia a emoção responsá-
vel pelo aparecimento do ato de exploração do mundo.

2.3.2 A concepção de Piaget

Piaget (1971) se dedicou a elaborar uma classificação dos jogos utilizan-


do os seguintes procedimentos:

1. observação e registro dos jogos praticados pelas crianças em casa, na


escola e na rua, tentando relacionar o maior número possível de jogos
infantis;

2. análise das classificações já existentes e aplicação dessas classifica-


ções conhecidas à relação de jogos coletados.

28 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


A partir dessas observações, ele adotou como critério classificatório o
grau de complexidade mental. Piaget admitiu existirem, basicamente,
três tipos de estrutura que caracterizam os jogos, o exercício, o símbolo e
a regra. Distribuiu os jogos em três grandes categorias, cada uma delas
correspondendo a um tipo de estrutura mental:

1. jogos de Exercício Sensório-motor, que aparecem durante os primei-


ros dezoito meses de vida, consistem na repetição de gestos e movi-
mentos simples com um valor exploratório: manipular objeto, deslo-
car, superpor, montar, desmontar, característico do primeiros anos de
vida, mas que permanecerá pela vida toda;

2. jogos Simbólicos (de ficção ou imaginação e de imitação) pró-


prios do segundo ano de vida, inicialmente uma atividade solitária
usando símbolos. Coletivamente, acontece no terceiro ano de vida.
Incluem-se as metamorfoses que a criança consegue fazer a partir
de um objeto;

3. jogos de Regras, começando a se manifestar por volta dos cinco


anos, desenvolvendo-se mais fortemente dos sete aos doze anos,
continua durante toda a vida do homem. São jogos de combinação
sensório-motoras, como corridas, jogos com objetos, ou intelec-
tuais, em que há competição entre os indivíduos e regulamentados
por códigos transmitidos de geração ou fruto de acordos momen-
tâneos (Figura 15).

Figura 15 – Jogo de Regras


Fonte: tofeekds.com.br

Somos seres brincantes | unidade 1 29


2.3.3 O jogo na concepção de Vygotsky

Embora Vygotsky (1996) não tenha feito uma classificação de jogos, para
ele não existe brinquedo sem regras, portanto a situação imaginária de
qualquer forma de brinquedos, já contém regras de comportamento.
Ele analisa o jogo, dedicando-se mais especificamente aos jogos de pa-
péis ou brincadeiras de faz de conta.

Para ele o ato lúdico propriamente dito se inicia por volta dos três anos
de idade com os jogos de papéis. Nesses jogos a criança cria uma situa-
ção imaginária e incorpora os elementos do contexto cultural por meio
da interação e da comunicação porque ele permite a ação intencional
(afetividade), a construção de representação mental (cognição), a mani-
pulação dos objetos e o desempenho de ações sensório-motoras (físico)
e as trocas nas interações (social).

Wallon (1989), Piaget (1976) e Vygotsky (1988) colocam a imita-


ção como a origem de toda representação mental e a base para o
aparecimento dos jogos infantis. Essa reflexão sobre o brinquedo,
a brincadeira e o jogo remete-nos ao pensamento que a dialética
entre passado e presente, tradicional e contemporâneo, artesanal e
industrial, criança e adulto, educação e brinquedos são elementos
profundamente relacionados e importantes para o desenvolvimen-
to humano. É importante também que os adultos resgatem sua
capacidade de brincar, tornando-se, assim, mais disponíveis para
as crianças enquanto parceiros e incentivadores de brincadeiras.

resumo

Nesta Unidade, estudamos que o brincar é próprio da criança em suas


três formas principais, o brinquedo, brincadeira e o jogo. Estudamos
também, que existe sobre o ato de brincar diversos autores, concepções
e vertentes, como a vertente objeto cultural, em que o brinquedo

30 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


reveste-se de elementos culturais do contexto histórico e a histórica,
com interesse de conhecer a origem e evolução do brincar.

Concluímos que Brinquedo se define como o suporte da brincadeira,


quer seja concreto ou ideológico, concebido ou simplesmente utilizado
como tal; que ele é importante para auxiliar a criança a compreender a
dinâmica das relações sociais, princípios e valores tais como a aceitação
das diferenças étnicas, de gênero, de classe social e religião. Estudamos
ainda, que o Brinquedo possui classificação de acordo com suas caracte-
rísticas, como, por exemplo os seguintes valores: Funcional; Experimen-
tal; Estruturação; Relação.

Vimos que a Brincadeira pode ser definida como algo que não tem uma
função precisa, que pode ser relacionada à gratuidade e liberdade, sen-
do, portanto difícil definir e delimitar; que para a vertente histórico-cul-
tural, ela possui três características: a imaginação, a imitação e a regra,
que estão presentes sempre, seja tradicional, faz de conta ou de regras.
Vários autores consideram outros aspectos como a faixa etária ou o as-
pecto social.

Sobre o Jogo destacamos, que é uma atividade livre, espontânea, uma


categoria com propriedades amplas. Vimos que os critérios que iden-
tificam o jogo são a Não-lateralidade, Efeito positivo, Flexibilidade, Prio-
ridade do processo de brincar, Livre-escolha e Controle interno. Muitos
teóricos têm estudado suas características e possibilidades. Destaca-
mos Wallon, Piaget e Vygotsky. Wallon classifica os jogos infantis como
Funcionais, de Ficção, de Aquisição e de Fabricação. Piaget considera três
tipos de estrutura que caracterizam os jogos, o exercício, o símbolo e a re-
gra distribuídos em três grandes categorias: de Exercício Sensório-motor,
Simbólico e Regras. Vygotsky dedicou-se mais especificamente aos pa-
péis ou brincadeiras de faz de conta em que a criança cria uma situação
imaginária e incorpora os elementos do contexto cultural por meio da
ação intencional, da construção de representação mental e da manipula-
ção dos objetos e o desempenho de ações sensório-motoras e as trocas
nas interações.

Somos seres brincantes | unidade 1 31


Observe o quadro a seguir:

Jean pIaget lev vIgotsKY


Privilegia a maturação biológica Privilegia o ambiente social
Acredita que os conhecimentos são Discorda de que a construção do co-
elaborados espontaneamente pela nhecimento procede do individual
criança, de acordo com o estágio de para o social
desenvolvimento em que esta se en-
contra.
A aprendizagem subordina-se ao de- A construção do real é, então, media-
senvolvimento e tem pouco impacto da pelo interpessoal antes de ser in-
sobre ele. ternalizada pela criança.
O pensamento aparece antes da lin- Postula que desenvolvimento e
guagem, que apenas é uma de suas aprendizagem são processos que
formas de expressão. A formação do se influenciam reciprocamente, de
pensamento depende basicamente modo que, quanto mais aprendiza-
da coordenação dos esquemas sen- gem, mais desenvolvimento.
soriomotores e não da linguagem
Pensamento e linguagem são proces-
sos interdependentes, desde o início
da vida. A aquisição da linguagem pela
criança modifica suas funções mentais
superiores.

Construa um texto em que a reflexão sobre o brinquedo, a brin-


cadeira e o jogo para o desenvolvimento infantil evidenciando o
que foi exposto no quadro e no capítulo, seja evidenciado:

Piaget, Vygotsky e Wallon - www.youtube.com/watch?v=euUHn4ySfx8

Desenvolvimento Segundo Wallon - www.youtube.com/watch?v=O6v


zWpQn2AU

Piaget, Vygotsky e Wallon – Tripé teórico da Educação ...

walkiriaroque.com/.../piaget-vygotsky-e-wallon-tripe-teorico-da-educaca

32 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


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34 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


BRINCAR, LINGUAGEM
ATEMPORAL E UNIVERSAL

Objetivos
.
• Reconhecer a trajetória do brincar na histórica;
• Identificar a dimensão lúdica do brinquedo e
dimensão lúdica na passagem do tempo;
• Compreender as características do brinquedo na
modernidade, estabelecendo a relação com a noção
de criança que a sociedade tem dela.

1 Introdução: Brinquedos, Brincadeiras e Jogos:


reflexos da história

O ato de brincar revela cultura, organização de espaços, conceitos, e uma


série de representações historicamente construídas. Muitas canções das
brincadeiras infantis são originárias da tradição folclórica de povos que
contam sua história e seus valores. No Brasil, muitas brincadeiras, brin-
quedos e jogos, são frutos da história de europeus, asiáticos, ameríndios
e africanos que, em sua miscigenação, originaram o nosso povo e cuja
heterogeneidade resultou em cores e tons diferentes os quais vieram
compor esse jeito nosso de ser (Figura 1).
de
Uni
da

Figura 1 – Brinquedo tradicional


Fonte: www.logicaeducativos.com.br
Assim contos, jogos, brinquedos, as cantigas de roda, as histórias, len-
das, adivinhações, parlendas e festas, revelam valores contidos nas falas
dos povos, passando a fazer parte da sua cultura popular e do dia a dia
da sociedade, mesclando-se de tal forma que se torna difícil definir com
precisão a origem específica das brincadeiras e do folclore transmitido
através da oralidade, conforme nos lembra Kishimoto (2000, p. 38):

[...] a brincadeira tradicional infantil, filiada ao folclore,


incorpora a mentalidade popular, expressando-se,
sobretudo, pela oralidade. Considerada como parte da
cultura popular, essa modalidade de brincadeiras guarda
a produção espiritual de um povo em certo período. A
cultura não oficial, desenvolvida especialmente de modo
oral, não fica cristalizada. Por ser um elemento folclórico,
a brincadeira tradicional infantil assume características
de anonimato, tradicionalidade, transmissão oral,
conservação, mudança e universalidade. Não se conhece
a origem da amarelinha, do pião, das parlendas, das
fórmulas de seleção. Seus criadores são anônimos.

Tanto os brinquedos tradicionais como pião, papagaio, peteca, carrinho


de puxar de duas rodas (“cavalo”), bambolê, com os quais as crianças
brincam desde dois séculos antes de Cristo na Ásia e na África e hoje
em todo o mundo, quanto os brinquedos populares, como o chucho, o
carro de lata (de pneus e de calha), as pernas de pau, os pés de lata, os
jogos de pedrinhas dos meninos e meninas maranhenses muitos feitos
por eles mesmos, contêm ensinamentos. Rodrigues (2000) estabelece
uma relação interessante sobre isso:

[...] as crianças do Oriente ou do Ocidente brincam os


mesmos brinquedos: a pipa, as rodas cantadas, o cabo
de guerra, as sapatas ou amarelinhas. Existem algumas
brincadeiras mais regionais pelas características do clima,
relevo e cultura (RODRIGUES, 2000, p. 24).

Esse aspecto regional dos brinquedos, das brincadeiras e dos jogos é


muito interessante na medida em que retrata e exemplifica uma realida-
de social e econômica da distribuição do espaço. Brincar é um aprendi-
zado de vida que leva as crianças para esse ou aquele caminho.

Em muitos lugares, a criança constrói o seu próprio brinquedo e o modo


de brincar, a partir do que dispõe como principal produto natural da
dinâmica de seu espaço geográfico, resultado da materialidade das re-
lações que aí ocorrem (Figura 2).

36 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


figura 2 – Brinquedo regional paraense
fonte: www.agenciapara.com.br

Assim, vamos encontrar a transferência do que é observado pela criança


no espaço vivenciado para a imagem de um brinquedo ou numa forma
de brincar.

O espaço maranhense quando é representado em um brinquedo


regional, são feitos de materiais como cascas de coco, talo de
bananeira, sabugo de milho, madeira, papel seda e bambu. Assim
existem barcos, carros, bonecas de sabugo ou bonecas de pano. Os
papagaios, ou pipa, bode, sura ou curica, são elaborados com folhas de
papel ou lenço, estendidas sobre
uma cruz de canos e cortados
em figura oval, comum rabo na
parte fina para que sejam soltos
ao ar, seguros por um cordel
ou barbante. Os colonizadores
portugueses do país trouxeram o
papagaio do Oriente, do Japão e
China, onde é popular, segundo
figura 3 – Brinquedo maranhense
Câmara Cascudo (1972) (Figura 3). fonte: www.georgezarur.com.br

Brincar, Linguagem Atemporal e Universal | UNIDADE 2 37


Brincar com esses brinquedos regionais e de brincadeiras como a ama-
relinha (cancão) pular corda, quatro cantos pegar bandeira esconde-es-
conde, é interagir com uma série de elementos cheios de significados
e conceitos, constituindo-se, dessa forma em farto material a explorar,
na construção de conhecimentos, além de introduzir a criança de forma
prazerosa e eficiente no universo sócio-histórico e cultural de sua reali-
dade local, conforme retrata a Figura 3.

Segundo Áries (1981, p. 90) e Benjamin (2002, p. 91), os brinquedos con-


temporâneos assumiram significados diferentes dos das sociedades An-
tiga, Medieval e Moderna, tanto é que na realidade atual, a forma como
a sociedade percebe a infância difere, consideravelmente, da visão do
passado.

Diante do exposto, você considera que para o desenvolvimento


da criança há diferença entre o brincar tradicional e o contempo-
râneo? Por quê? Comente sua opinião argumentando.

Amarelinha ou Cancão
- Brincadeira desenha-
da no chão, com repre-
2 brinquedo e dimensão lúdica na passagem
sentações geométricas. do tempo
Regionalmente conhe-
cida também como sa-
pata e academia.
Quatro Cantos - Brin-
As informações obtidas através das escavações e da iconografia dão
cadeiras em que as conta do fato de que na sociedade clássica antiga, desde cedo, a crian-
crianças dispostas em
quatro cantos e uma ao ça fazia parte do mundo dos adultos, depreendendo-se que não havia
centro, a um sinal com-
binado entre elas, tro- brinquedos específicos para a criança, pois todos brincavam, especial-
cam de lugar, enquan-
to a do centro tenta mente através de jogos e trabalhos. Naquele momento não parecia ha-
assumir um dos quatro
cantos.
ver separação entre trabalho e lazer, assim como entre criança e adulto,
Pegar bandeira/Barra aquela seria miniatura deste.
Bandeira - Brincadeiras
de rua em que dois ti-
mes disputam o roubo Essa realidade permanece até o século XII, numa visão de infância bas-
da bandeira adversária
posicionada ao centro
tante peculiar e importante para o entendimento dos brinquedos da
protegida pelos joga- época, pois não é fácil, nas pesquisas, diferenciar alguns brinquedos de
dores.
objetos que faziam parte da cultura, do seu modo de viver. Kishimoto
(1993, p.7) chama a atenção para o fato da seguinte forma:

38 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


[...] os colecionadores de bonecas e de brinquedos-
miniaturas sempre tiveram muita dificuldade em
distinguir a boneca, brinquedos de criança, de todas
as outras imagens e estatuetas que as escavações nos
restituem em quantidades semi-industrias e que quase
sempre tinham uma significação religiosa: objetos de
culto doméstico ou funerário, ex-votos dos devotos de
uma peregrinação etc. Quantas vezes nos apresentam
como brinquedos as reduções de objetos familiares
depositados nos túmulos? Não pretendo concluir que
as crianças pequenas de outrora não brincavam com
bonecas ou réplicas dos adultos. Mas elas não eram as
únicas a se servir dessas réplicas. Aquilo que na Idade
Moderna se tornaria seu monopólio ainda era partilhado
na Antiguidade, ao menos com os mortos.

É importante fazer essa incursão pelo significado cultural do que


é considerado lúdico para determinada sociedade, pois a história
mostra que, se para a criança europeia a boneca significa um
brinquedo, assim como para a sociedade americana que herdou
seus valores. No entanto, para certas populações indígenas aquela
tem o sentido de símbolo religioso. Na
Idade Média, a boneca era um objeto
com duplas significações culturais,
pois, tanto era brinquedo, como era
também o perigoso instrumento do
feiticeiro e do bruxo (KISHIMOTO,
Fonte: www.geekcouple.com.br
1993; ARIÈS, 1981)

Ariès (1981, p. 90) revela que na Idade Média o brinquedo era um produ-
to que nascia nas mãos profissionais dos artesãos de madeira, dos pro-
dutores de vela, dos caldeireiros e outros artesãos. Ele representava de
forma reduzida os objetos e pessoas. Era ainda objeto de culto domés-
tico dos devotos e de peregrinos, ou até de rituais funerários em que
objetos eram reduzidos e colocados nos túmulos. A ideia de brinquedos
objeto de criança, como uma visão de mediação entre esta e o mundo,
foi cultivada com o advento do Renascimento1.
______________________________
1 Movimento artístico e científico dos séculos XV e XVI que pretendia ser um retorno a Antiguidade
Clássica. (HOLANDA, 1999, p. 1741).

Brincar, Linguagem Atemporal e Universal | UNIDADE 2 39


[...] havia o gosto de representar de forma reduzida as
coisas e as pessoas da vida quotidiana, o que resultou
numa arte e num artesanato popular destinado tanto à
satisfação dos adultos como à distração das crianças. Os
museus, sobretudo alemães e suíços, possuem conjunto
complicados de casas, interiores e imobiliários que
reproduzem em escala reduzida todos os detalhes dos
objetos familiares.

Após a Idade Média, os brinquedos começaram a ser comercializados


principalmente na França, onde os mascates vendiam os brinquedos
nos grandes entrepostos existentes na época. No final do século XIX,
surgiram pequenas fábricas em que a comercialização dos brinquedos
teve maior avanço, culminando com sua industrialização (Figura 4).

Figura 4 – Boneca da Idade Média


Fonte: www.portaldascuriosidades.com

Assim, eles vão mudando, são substituídos os materiais como madeira e


tecido por borracha, celuloide, metal, já numa tentativa de diminuir cus-
tos, otimizando a produção, demonstrando um viés mais econômico.

[...] cada tempo histórico possui uma hierarquia de valores


que refletem nas concepções de criança e seu brincar.
Comportamentos considerados lúdicos apresentam
significados distintos em cada cultura. Se para a criança
europeia a boneca significa um brinquedo, um objeto,
suporte de brincadeiras, para certas populações indígenas
tem o sentido de símbolo religioso.

Isso revela que a difusão dos brinquedos é também uma demonstração


de diversidade de infâncias, de meios socioculturais diferentes e uma
forma de globalização tão discutida hoje como “coisa do nosso tempo”.

40 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Ela traça e busca caminhos, mapeando diversas situações nesse contex-
to, à proporção que crescem as pesquisas, o conhecimento de outras
culturas e a evolução das sociedades, tão bem representadas através do
brinquedo.

Quem nunca brincou de roda, cantou cantigas na infância, ou foi emba-


lado ouvindo a mãe cantarolar canções de ninar? As cantigas de roda são
canções utilizadas em brincadeiras realizadas como forma de recreação
para crianças e figura entre as mais difundidas nas diversas gerações em
todo mundo. Além dessas, existem muitos outros tipos de brincadeiras,
jogos e brinquedos que as crianças usaram ou usam, conforme já discu-
tido na Unidade 1.

A formação em círculo pode ser a primeira experiência coletiva de per-


cepção e exploração dos espaços internos e externos da criança. Os limi-
tes da roda funcionam como fronteiras ou alicerces das noções básicas
que desenvolvem a partir da distinção de dentro e fora, pertencer ou
não pertencer, ser ou não ser (Figura 5).

Figura 5 – Brincadeira de roda


Fonte: portaldoprofessor.mec.gov.br

Com o corpo em movimento, a criança situa-se, avança, volta, aproxima-


-se, afasta-se, comprime-se, liberta-se e vai aprendendo também os fun-
damentos das relações que precisa estabelecer em seu desenvolvimen-
to. Ávila e Silva (2003, p. 78), expressam assim:

Brincar, Linguagem Atemporal e Universal | Unidade 2 41


[...] as brincadeiras de roda assumem grande importância
por levar à formação do círculo, situação em que o
grupo pode se comunicar frente à frente. dando-se as
mãos, as crianças formam um todo. cantam, dançam
ou tocam juntas; criam e seguem regras, exercitam
textos e movimentos de forma coletiva, desenvolvendo
a socialização e praticando a democracia com valores
de respeito mútuo, cooperação e unidade de grupo.
Por meio do movimento rítmico-musical, o controle da
motricidade acontece de forma natural e precisa. O ritmo
leva à ordenação do pensamento, e suas características
de organização do tempo exigem das funções cerebrais
maiores agilidades e maior presteza.

Enquanto a criança canta e gira, organiza seus movimentos no espaço


e promove o desenvolvimento de estruturas temporais. A coordenação
espaço-temporal presente nessa coreografia representa a aquisição
cognitiva de vários elementos, além de permitir construção de conheci-
mentos geográficos específicos com na letra da música.
Em cada uma das con-
cepções que produzi-
ram saberes, os brin-
quedos, as brincadeiras
e os jogos revelavam e
foram registradas em
cantigas de roda e em
brinquedos produzidos
para diversos fins. Todas [...] Se o brinquedo é um objeto menor, do ponto de vista das ciên-
as correntes epistemo-
lógicas desenham para cias sociais é um objeto de profunda riqueza. À sua sombra, a so-
um perfil de construção
de conhecimentos que ciedade se mostra duplamente: naquilo que é, mas sobretudo na-
se inicia na Educação
Infantil, sendo conse- quilo que se dá a conhecer às suas crianças. Assim sendo, mostra
quentemente, o brin- a imagem que faz de infância. O brinquedo é um dos reveladores
quedo, a brincadeira, os
jogos e todas as ativida- de nossa cultura. Obedece à lógica de uma época, objeto de con-
des lúdicas importantes
nessa construção, pois sumo, meio de descobrir o mundo da técnica, expressão cultural
seguem sempre numa
busca do conhecimen- relacionada com imagens e saberes. O brinquedo incorpora nossos
to das relações que se
fazem entre o homem e conhecimentos sobre a criança ou, ao menos as representações lar-
o meio. gamente definidas, que circulam, as imagens que nossa sociedade
é capaz de segregar.

O brincar é carregado de significações, desde a confecção do brinque-


do, o material utilizado, a forma, o local onde foi concebido, as histó-
rias de sua concepção, os ensinamentos que produzem nas represen-
tações do espaço, entendendo-se que nada se encontra construído de
forma definitiva e estática na face da terra, sobretudo no campo do
saber e das pesquisas.

42 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Brougère (1998, p. 17) considera a perspectiva da função dos brinquedos
como possibilidade para a criança interpretar o mundo que para ele tem
uma dimensão simbólica.

O brinquedo, nessa manifestação cultural nos faz refletir acerca do pas-


sado, do presente e do futuro, uma vez que conta a história da humani-
dade. Essa forma de vê-lo numa cultura distinta de outra ou, em tempos
históricos, de forma contraditória, é o mesmo caminho que também
tem percorrido a noção da infância.

pião

Pinhão, brinquedo de madeira, periforme, com uma ponta de ferro,


por onde gira pelo impulso do cordão enrolado na outra extremidade
e puxado com violência e destreza. Os trombos dos gregos e o turbo
dos romanos consistem no mesmo jogo do pião das crianças de
hoje. No Brasil, a maioria das condições para o jogo é semelhante à
registrada em Portugal. Também denominado de finca.

amarelinha

O jogo da Amarelinha é também chamado Academia ou Cademia.


Jogo ginástico infantil, muito antigo e muito espalhado por todo
o Brasil. Em outras regiões da América Latina denomina-se La
Pelegrina, e é idêntico ao Jogo das Odres, dos romanos e às Ascólias,
dos antigos gregos.

Câmara Cascudo (1972, p. 712-713).

Esse é um aspecto importante para analisar:

• A forma como as ações do homem são distintas e, ao mesmo tempo,


próximas;
• Como as fronteiras e limites geográficos interferem ou não na so-
ciedade; como vão ocorrendo mudanças físicas e sociais de caráter
local, regional, nacional e mundial;
• Como se alteram os perfis nas diversas gerações e, especialmente,
como a criança está inserida nesse contexto.

Brincar, Linguagem Atemporal e Universal | UNIDADE 2 43


Essas mudanças refletem também em relação ao brinquedo. Na atua-
lidade a criança abandona os brinquedos artesanais, substituindo-os
pelos industriais. Os confeccionados pela própria criança, aos quais nos
referimos anteriormente no início deste capítulo são concebidos dentro
de uma concepção infantil de brincar que, em sua simplicidade, que re-
produz as formas a partir de sua percepção, e é ao mesmo tempo pro-
duto da expressão artesanal, conforme Figura 6.

O mesmo acontece com os brinquedos tradicionais que são reprodu-


zidos através das gerações e fazem parte do acervo de cultura popular.

figura 6 – Brinquedo artesanal


fonte: es.olx.com.br

As crianças da área urbana não têm a oportunidade muito fácil de criar


brinquedos com os mesmos materiais das que vivem nas áreas rurais,
pois estas podem construir brinquedo com elementos da natureza, com
produtos do seu dia a dia em maior contato com paisagens naturais
onde brincam com produtos da economia local.

Interagem com esses elementos, ao mesmo tempo em que utilizam


“baladeira”, usam gaiolas para prender passarinhos, e outras práticas
comuns no interior. O brincar rural também vai mudando e sofrendo
influências, assim como as brincadeiras e jogos das crianças das áreas
metropolitanas, já bastante limitadas à eletrônica.

Você observa diferença entre o brincar da criança moderna em relação


à criança de algumas gerações passadas? A que atribui essa alteração?

44 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


3 O brinquedo na modernidade e a noção de criança

Assim, como foi referido anteriormente, o brinquedo mudou. Mudou


também junto com o tempo. A partir do século passado, com a Revo-
lução Industrial, ocorreu a grande ruptura; o brinquedo deixou de ser
aquela peça artesanal, minuciosa e passou a ser produzida em escala
para atender à demanda cada vez maior dos centros urbanos em ex-
pansão. Multiplicou-se e disseminou-se rapidamente, virou mercadoria
dentro do nosso universo.

Nessa sociedade industrial moderna o brinquedo tomou uma difusão


comercial, pois a indústria estimulou o consumo pela criança revelan-
do formas de brinquedos bem distintas, considerando a história dos
brinquedos em sua totalidade. O formato passou a ter uma importância
muito maior do que poderíamos supor inicialmente.

Com efeito, na segunda metade do século XIX os brinquedos tomaram


maiores dimensões, perderam aos poucos o elemento discreto e mi-
núsculo, até chegar à sociedade atual, na qual convivem, lado a lado,
passado, presente e futuro em que observamos crianças, brincando
com brinquedos artesanais ao lado de outros semi-industrializados e ou
eletrônicos altamente sofisticados, compreendendo-se nas palavras de
Miranda (2001, p. 59):

[...] com o aumento da complexidade em todos os


setores da vida, novos padrões de comportamentos,
noção de coletivo muito menor do que o individualismo,
com novas visões de criança, sociedade com novas
significações, fortes elementos que trouxeram consigo
a construção de novos elementos para o mundo dos
brinquedos.

Benjamin (2002, p. 250) comenta o fato de que as mudanças que se


efetuam modificam algumas estruturas, porém “o mundo está sem-
pre marcado pelos traços da geração anterior e se confronta com
eles”. Com o da criança isso acontece de forma muito acentuada, e
em suas brincadeiras isso fica muito claro, pois é impossível situá-las
num mundo de fantasia, na “terra feérica da infância pura ou da arte
pura” (Figura 7).

Brincar, Linguagem Atemporal e Universal | Unidade 2 45


figura 7 – Brinquedos tradicionais e modernos
fonte: www.elo7.com.br / fonte: g1.com.br

Mesmo quando não imita os utensílios do adulto, o brinquedo é uma


confrontação - não tanto da criança com o adulto, como deste com a
criança - pois é este que lhe oferece os brinquedos. Mesmo que as crian-
ças rejeitem brincar com alguns brinquedos, a permanência deles já é
prova de perpetuação de hábitos ou costumes de gerações anteriores.

Piaget (1971) diz que “quando brinca, a criança assimila o mundo à


sua maneira, sem compromisso com a realidade, pois a sua interação
com o objeto não depende da natureza do objeto, mas da função
que a criança lhe atribui.” Assim, percebe-se que a partir do brincar
a criança expande a sua imaginação, cria fantasias imaginativas e ao
mesmo tempo desenvolve os aspectos cognitivo, afetivo, social, e
motor. Constrói confiança e supera obstáculos da vida real. Através
dos seus brinquedos e brincadeiras a criança desenvolve um canal
de comunicação, uma abertura para o diálogo com o mundo dos
adultos. A escola um papel fundamental neste sentido, pois deve
trabalhar na criação de formas variadas para que a criança se manifeste
corporalmente através do brinquedo, das brincadeiras de faz de conta
e de jogos emocionais, entre outros aspectos que o brincar envolve.

Assim, não foram as necessidades infantis que produziram os brinque-


dos prontos com que brincam. “O chocalho do recém nascido não pode
ser explicado com a afirmação de que via de regra a audição é o primei-
ro sentido a ser exercitado. Desde os tempos remotos ele estava presen-
te entre os bebês para espantar maus espíritos”. Não seria esse fato uma
indicação da influência da cultura?

46 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


É importante lembrar que cada tempo histórico desenvolve uma con-
cepção de valores que refletem o ideário do que é criança e do seu brin-
car. Na sociedade atual, adulto e crianças não se misturam, suas histórias
são escritas separadamente. Enquanto no passado toda reunião, traba-
lho ou jogos juntava crianças e adultos e sua educação realizava-se di-
retamente na vida, a sociedade atual confinou a educação ao ambiente
escolar que, na concepção de alguns “prendeu” as crianças, tirando-lhes
a liberdade de construir conhecimentos livremente.

Na contemporaneidade a criança convive com babá eletrônica, substituin-


do a brincadeira, a ausência dos pais e o brincar com eles; agenda lotada;
erotização precoce; e violências que lhe roubam o curto tempo de infância
que diminui a cada geração e torna o seu brincar cada vez mais diferente.
Sua relação maior passou a ser com o brinquedo industrializado.

Os brinquedos industrializados vêm gerando discussões importantes


sobre o seu uso como mercadoria, como objeto produzido pela socie-
dade capitalista, revelando relações sociais simultâneas ocultas e reais,
em que essa venda e consumo são regidos por relações econômicas e
sociais inseridas na economia de mercado. Preocupa o fato de serem
projetados pelo adulto para a criança, conforme a concepção daquele e
não participação desta.

Existe uma particularidade que não pode ser esquecida: o consumidor


a quem se destina encontra-se em formação sendo exposto a estímulos
publicitários, com fortes apelos ao poder, à potência, à aventura, à cobi-
ça da propriedade, arriscando a formação de uma geração desvirtuada
de valores centrados na simplicidade do brincar (Figura 8).

Figura 8 – Brinquedo tradicional industrializado


Fonte: pt.ikpedia.org

Brincar, Linguagem Atemporal e Universal | Unidade 2 47


A indústria dos brinquedos absorveu as funções importantes que o brin-
quedo estimula, como o pensamento criativo, o desenvolvimento social
e emocional e produziu uma grande variedade de brinquedos dos mais
diferentes tipos e funções, sempre numa perspectiva de representar as
funções da sociedade.

Predomina hoje nas lojas a oferta de brinquedos de pequenos ban-


cários, médicos, enfermeiros, engenheiros, comerciantes etc. Assim, a
criança, pela ideologia desses brinquedos só tem a opção de assumir o
papel do proprietário e nunca do criador, “ele não inventa o mundo: os
adultos preparam-lhe gestos sem aventura, sem espanto, sem alegria”
Bathes, (apud WEISS, 1997) (Figura 9).

Figura 9 – Brinquedo moderno


Fonte: ibrinquedos.com

O brinquedo tem sido usado como um estímulo à aprendizagem na


educação com diversas concepções diferentes, desde a Antiguidade de
acordo com a concepção de infância e de criança de cada época. Cons-
truiu grande espaço na modernidade, avançando as pesquisas nos anos
posteriores. Assim, os brinquedos artesanais, os industrializados e os
virtuais, numa variedade de tipos e objetivos para sua utilização, atual-
mente convivem juntos, algumas vezes na perspectiva de serem instru-
mentos na escola para a aprendizagem e outras vezes para extravasar,
acalmar, censurar ou ocupar o tempo da criança, dependendo da visão
do professor, conforme Oliveira (2000, p. 20):

Da concepção que a educadora tem do brincar nascem


suas atitudes suas atitudes frente à brincadeiras das crianças:
intervir, ensinar, treinar, censurar, extravasar, aprender,
observar? Do seu jeito de ver os brinquedos: objeto que
ensina, que acalma, que permite o desabafo, que permite
criações, que pode ser quebrado, que deve ser preservado,
que educa; daí nasce o uso que elas fazem desse material.

48 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Diante do que vimos sobre o brincar, seja tradicional ou moderno,
infere-se que ele possibilita descobertas que promovem o
aprendizado. A observação e a interpretação da atividade de brincar
permite entender a oportunidades de mesclar as informações,
ampliando os conhecimentos e as habilidades motoras, cognitivas
ou linguísticas da criança. É através do brincar que a criança se
cerca do encanto da fantasia, do faz de conta, do sonhar e do
descobrir, entre outras atividades. Nesse sentido, ela irá se conhecer
e se constituir socialmente. Ela poderá expressar as diferentes
impressões vivenciadas a partir da espontaneidade do brincar que
se desenvolve na família, nas relações de comunicação e de prazer
e na construção de um universo de vida cotidiana.

resumo

Nesta Unidade, estudamos que o ato de brincar revela cultura, organiza-


ção de espaços, conceitos, e uma série de representações historicamen-
te construídas. Contos, jogos, brinquedos, cantigas de roda, histórias,
lendas, adivinhações, parlendas e festas revelam valores contidos nas
falas dos povos.

Vimos que tanto os brinquedos tradicionais como pião, papagaio, pete-


ca, bambolê, com os quais as crianças brincam desde dois séculos antes
de Cristo na Ásia e na África e hoje em todo o mundo, quanto os brin-
quedos populares, como o chucho, o carro de lata, as pernas de pau, os
pés de lata, os jogos de pedrinhas contêm ensinamentos que traduzem
a cultura.

Estudamos que os brinquedos contemporâneos assumiram significados


diferentes dos das sociedades Antiga, Medieval e Moderna; que na rea-
lidade atual, a forma como a sociedade percebe a infância difere, consi-
deravelmente, da visão do passado. As informações obtidas através das
escavações e da iconografia mostram que na sociedade clássica antiga,
desde cedo, a criança fazia parte do mundo dos adultos. Não havia brin-
quedos específicos para a criança, pois todos brincavam sem separação
entre trabalho e lazer, assim como entre criança e adulto, aquela seria
miniatura deste.

Brincar, Linguagem Atemporal e Universal | UNIDADE 2 49


Vimos que após a Idade Média, os brinquedos começaram a ser
comercializados principalmente na França, onde os mascates vendiam
os brinquedos nos grandes entrepostos existentes na época. No final do
século XIX, surgiram pequenas fábricas em que a comercialização dos
brinquedos teve maior avanço, culminando com sua industrialização.

Concluímos que o brinquedo mudou junto com o tempo. A partir do


século passado, com a Revolução Industrial, ocorreu a grande ruptura;
o brinquedo deixou de ser aquela peça artesanal, minuciosa e passou
a ser produzida em escala para atender à demanda cada vez maior dos
centros urbanos em expansão. Multiplicou-se e disseminou-se rapida-
mente, virou mercadoria dentro do nosso universo.

Nessa sociedade industrial moderna, o brinquedo tomou uma difusão


comercial, pois a indústria estimulou o consumo pela criança revelando
formas de brinquedos bem distintas, considerando a história dos brin-
quedos em sua totalidade.

Com efeito, na segunda metade do século XIX os brinquedos tomaram


maiores dimensões, perderam aos poucos o elemento discreto e
minúsculo, até chegar à sociedade atual, na qual convivem, lado a lado,
passado, presente e futuro em que observamos crianças, brincando
com brinquedos artesanais ao lado de outros semi-industrializados e ou
eletrônicos altamente sofisticados.

Assim, os brinquedos artesanais, os industrializados e os virtuais, numa


variedade de tipos e objetivos para sua utilização, atualmente convivem
juntos, algumas vezes na perspectiva de serem instrumentos na escola
para a aprendizagem e outras vezes para extravasar, acalmar, censurar
ou ocupar o tempo da criança.

Construa um texto sobre as mudanças do brinquedo bem como


do seu significado ao longo do tempo como um espaço em que
a criança poderá expressar as diferentes impressões vivenciadas a
partir do brinquedo.

50 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


ARIÉS, P. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara, 1981.

BENJAMIN, Walter. reflexões sobre a criança, o brinquedo e a


educação. 34. ed. São Paulo: Duas Cidades, 2002.

BROUGERE, Gilles Brougère. brinquedo e cultura. 3. ed. São Paulo:


Cortez, 2000.

______. O que é brincadeira? In: revista criança, n. 31, p. 3-9, 1998.

KISHIMOTO, Tizuko M. o Jogo e a educação Infantil. São Paulo: Pioneira,


1983.

MIRANDA, Simão de. do fascínio dos jogos à alegria do aprender nas


séries iniciais. Campinas, SP: Papirus, 2001.

OLIVEIRA . Vera Barros (Org.). o brincar e a criança: Petrópolis: Vozes,


2000.

PIAGET, J. a formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho.


Rio de Janeiro: Zanar, 1971.

WEISS, Luise. brinquedos e engenhocas: atividades lúdicas com sucata.


São Paulo: Scipione, 1997.

Brincar, Linguagem Atemporal e Universal | UNIDADE 2 51


O BRINCAR NO
DESENVOLVIMENTO INFANTIL

e
Objetivos

ad
.
• Reconhecer as fases do brincar da criança nos estágios
propostos por Piaget;

id
• Identificar as bases neurofisiológicas do brincar;

Un
• Discutir a importância do brincar de faz de conta para o
desenvolvimento;
• Reconhecer o brincar como laboratório do espírito e do
intelecto;
• Compreender as mudanças no brincar e seus efeitos no
desenvolvimento;
• Identificar as principais formas de brincar.

1 Introdução

O primeiro parceiro do brincar da criança é a mãe e depois os outros


adultos que cuidam da criança. O primeiro brinquedo é o próprio corpo,
que ao descobrir, vai revelando o seu eu, dando um sentido à sua exis-
tência.

Nesse primeiro período da vida chamado por Piaget de sensório-motor,


existem três estágios: o dos reflexos; o da organização das percepções e
de hábitos; e o da inteligência propriamente dita.

Esse período caracteriza-se pela construção de esquemas de ação que


possibilitam à criança assimilar objetos e pessoas e pela construção prá-
tica das noções de objeto, espaço, causalidade e tempo.

Esses conceitos são necessários à acomodação ou ajustamento destes


esquemas aos objetos e pessoas com os quais ela interage. É importante
observar que essa construção se realiza sempre no plano das sensações
e da motricidade.
“Piaget denominou o estágio que vai desde o nascimento até 2 anos
de vida da criança como período sensório-motor. Utilizou essa deno-
minação, pois é durante os primeiros anos de vida que o bebê primei-
ramente percebe o mundo e atua nele, onde coordena as sensações
vivenciadas junto com comportamentos motores simples, juntando
o sensorial a uma coordenação motora primária. O bebê tem sensa-
ções e descobre o mundo através do deslocamento de seu corpo. Há
uma interdependência em perceber o mundo e atuar nesse mundo”.

Fonte: http://psicologado.com/psicologiageral/desenvolvimeno-humano/o-periodo
sensorio-motor-de-piaget © Psicologado.com

Essa fase se caracteriza por um contato direto, isto é, sem representação,


pensamento ou linguagem, da criança com objetos ou pessoas (Figura 1).

Só mais tarde, para descobrir e construir conhecimentos apreendendo


a realidade, a criança ampliará seu universo e passará a utilizar o brincar
de faz de conta. Ela vai pouco a pouco diferenciar e integrar os esquemas
de ação entre si, ao mesmo tempo em que se separa, enquanto sujeito,
dos objetos. Pode então interagir de forma mais complexa com eles.

figura 1 – Brincar na fase sensório-motor


fonte: psicopedagogiacurutiba.com.br

A partir da aquisição da fala, de um a dois anos de idade, a criança ingres-


As Seis Subfases do sa no período simbólico, o período pré-operatório e até os seis, aprende a
Período Sensório Motor
de 0 a 2 anos ... articular realidade e fantasia, presente e passado, aos poucos substituin-
www.youtube.com/ do o concreto pelo abstrato. De dois a quatro anos, é o momento em que
watch?v=0UzZH971TcM
o brincar simbólico e a ausência de um modelo tende a se combinar.

54 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Esse é um momento de descobertas, com mudanças consideráveis que
vai fazendo com que a criança passe a ver o mundo de forma mais am-
pla em termos de sua espacialidade, aumento a qualidade dessas per-
cepções, e que Oliveira (2000, p. 108) expressa da seguinte forma:

[...] Assim, até os dezoito meses, aproximadamente, ela


organiza a sua realidade física, concreta, imediata e a partir
daí é que vai lidar melhor, de forma lúdica, imagética e
verbal, com suas representações, que, no princípio,
dizem sempre respeito ao que ela vive no seu dia a
dia, para só aos poucos irem adquirindo características
mais fantasiosas e irreais, com o desenvolvimento da
imaginação. Dos dezoito aos trinta e seis meses a criança
atravessa o chamado pensamento mágico e anímico,
que com características muito autorreferentes, constrói
a realidade à sua volta à sua imagem, dando-lhe vida e
modificando-a, em sua brincadeira, a seu gosto e prazer.

É a partir desse período que a criança começa a mudar o seu brincar


e, embora ainda mantenha seu próprio corpo como núcleo central do
brincar, ela vai saindo da brincadeira de exercício para o de faz de con-
ta, passando a projetar nos brinquedos aquilo que viveu pessoalmente
enquanto bebê.

Ainda fala pouco sobre o que está fazendo enquanto brinca, com uma
representação mais gestual e postural do que verbal para em seguida,
ampliar o leque de suas brincadeiras de faz de conta (simbólico, repre-
sentativo, imaginativo, fantástico, de simulação, ou de ficção).

2 As bases neurofisiológicas do brincar

O brincar tem suas etapas de desenvolvimento cognitivo, emocional e


social. Inicialmente a criança brinca só, posteriormente procurará com-
panheiros para as brincadeiras e desenvolve o conceito de grupo e os
prazeres e desprazeres da relação com outras crianças. Aprende a ga-
nhar e a perder, a esperar a vez, a respeitar regras, a cooperar.

Na primeira infância e no período gestacional está o principal momento


do processo de estruturação neuropsicológica e social. Entre as ativida-
des que mais promovem o desenvolvimento infantil está a atividade lú-
dica. “O cérebro é vulnerável aos efeitos adversos do ambiente e é, igual-

Brincar no Desenvolvimento Infantil | Unidade 3 55


mente, susceptível aos efeitos positivos de ambientes ricos, afetivos e
equilibradas.” (AFFONSO, 2012, p.27).

“Crianças que não brincam ou são raramente tocadas desenvolvem


cérebros 20 a 30% menores do que o normal para a idade. Neuro-
cientistas tem demonstrado evidencia física através de neuroima-
gens funcionais, a consequência relativa da estimulação ou negli-
gência ambiental. Os jogos e brincadeiras infinitos que os jovens
praticam, na realidade auxiliam a programar o cérebro para habi-
lidades da linguagem, arte,
música, matemática, relações
interpessoais, motoras, cog-
nitivas e inteligência. Brinca-
deiras infantis imaginativas e
jogos de faz de conta são for-
mas poderosas que viabilizam
que eventos complexos e assustadores se tornem compreensíveis
e manejáveis (AFFONSO, 2012, p.32).

Brincar é um aspecto importante no desenvolvimento neurocompor-


tamental. Ele está relacionado à atividade cerebral. O brincar motor,
comportamental e mental está presente e tem uma importante função
adaptativa.

Affonso (2012) diz que Frost (1996) após descrever as transmissões ele-
troquímicas e o aumento do número de sinapses durante os três primei-
ros anos de vida de uma criança, concluiu que as experiências precoces
tem um papel crítico na determinação de arquitetura cerebral, na ampli-
tude e qualidade das habilidades intelectuais da criança.

Nesse sentido, a relação entre o brincar e o desenvolvimento cerebral já


está demonstrada. Todos os mamíferos jovens saudáveis brincam. Por-
tanto, os pais humanos devem oferecer estruturas e orientações para o
brincar, sabendo que sua amplitude e complexidade aumentam rapida-

56 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


mente à medida que os neurônios iniciam as interconexões estruturais
em velocidades e taxas significativas.

Brincar programa a estrutura neuronal progressivamente


mais complexa que, por sua vez, influencia e propicia
brincares cada vez mais complexos. Os jogos, brincadeiras
e frivolidades animais e humanos precoces os equipam
com as habilidades que serão necessárias futuramente
na vida. Eles apreendem flexibilidade, inventividade,
criatividade e versatilidade, praticam habilidades motoras,
linguagem e negociação, engajam-se em análise de tarefas
socialmente e culturalmente mediadas e na resolução de
problemas progressivamente mais complexos durante
suas brincadeiras. Brincar, é, portanto, essencial para o
desenvolvimento saudável.”

Os estudos em Neurociência mostram que experiências da primeira in-


fância exercem impacto preciso na estruturação da circuitaria neuronal.
E dão ênfase à atividade lúdica durante os primeiros anos de vida sem
instruções dirigidas, isolamento, privação ou abuso que representará
uma diferença positiva no desenvolvimento cerebral e funcionamento
humano subsequente.

as brincadeiras de faz de conta e seu importante papel.

O faz de conta é marcado por um diálogo que a criança estabelece


com seus parceiros e mesmo
com bonecos. Ele requer cons-
tante negociação de significa-
dos e de regras que regem uma
situação conforme as crianças
assumem papéis, o que faz
com que o desenrolar do enre-
figura 2 - Faz de conta
do construído pelas interações fonte: www.educacao fisicanaveia.com.br

das crianças seja sempre imprevisível. Com isso a brincadeira cria


novidades. http://brinquedoteca.net.br

Brincar no Desenvolvimento Infantil | UNIDADE 3 57


3 O brincar de faz de conta

Observamos que enquanto brinca, mesmo quando sozinha a criança


conversa com os personagens a quem está dando vida, através dessa
brincadeira simbólica. Ela fará progressiva ampliação e dinamização
de seu meio, em suas duas vertentes complementares, a externa e a
interna, pois:

a) Ao criar condições de evocação de suas lembranças, contribui para


que aprenda a se abrir no momento presente com base nesse fato;
b) Ao representar situações vividas socialmente, aprende a se deslocar
de sua posição autocentrada e se colocar no lugar do outro, adquirin-
do flexibilidade mental, condição de sua sociabilização progressiva; e
c) Em relação ao espaço, ao fazer de conta que está em outros lugares,
aprende a jogar com ele, a articulá-lo com outras possibilidades, além
da atual.

Já no terceiro ano de vida, as brincadeiras simbólicas se expandem e


se organizam, diferentes espaços e tempos começam a ser configura-
dos, vários personagens podem aparecer na mesma brincadeira vivida
pela criança.

No quarto ano, há uma explosão de brincadeiras, tanto na estrutura-


ção como na dramatização na representação simbólica e na amplitu-
de de espaço relacional, que se intensificará ainda mais aos cinco e
seis anos.

Segundo Piaget (apud OLIVEIRA, 2000, p. 130), aos quatro anos de ida-
de, a criança atinge o apogeu do brincar de imitar, em seu mundo de faz
de conta, e experimenta momentos extremamente ricos, podendo ser
visto como uma intercessão de dois conceitos amplos: brincar e simu-
lar que, para Oliveira (2000, p.15):Possibilitam e agilizam continuamente
a integração e adequação dos desejos, sonhos e fantasias à realidade,
mantendo aberto e fluente o acesso, aos mecanismos e conteúdos me-
nos conscientes;

• Favorecem a separação saudável de realidade e fantasia;

• Integram passado ao presente, através das lembranças, que carre-


gam consigo os desejos e sonhos, construindo a memória.

58 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


A brincadeira do faz de conta tem muita importância pelo fato de que
a criança da pré-escola está vivendo esse momento e essa atividade ca-
racteriza o descobrir do mundo através da representação, da imitação e
criação de novos papéis, enquanto reinventa o que para o adulto já tem
um significado.

Ao brincar de faz de conta, uma criança:

• Transforma os objetos presentes na sala em alguma outra coisa


que não corresponde ao que é na realidade;
• Transforma recantos do ambiente físico de acordo com a ativida-
de que está desenvolvendo;
• Representa personagens (mãe, filha, e nenê...), desenvolvendo
um script com regras para serem seguidas pelos participantes da
brincadeira;
• Representa animais, assumindo com o uso do corpo as caracterís-
ticas do animal representado; e
• Trata objetos inanimados como animados.

Coelho e Pedrosa (apud OLIVEIRA, 2000, p. 52-54)

Para realizar essas transformações, as crianças usam dos meios de que


Brincar de faz de conta,
dispõem e que são: as crianças buscam supe-
rar contradições, motiva-
• Gestos - manuseio de brinquedos e objetos; das pela possibilidade de
lidar com o acaso, com
• Posturas - uso do próprio corpo para evocar personagens; a regra e a ficção, e pelo
desejo de expressar uma
• Som - vocalização que remete a animais e/ou coisas; visão própria do real,
embora por ele marcada.
• Palavras - algumas vezes apenas uma palavra é capaz de evocar si- Na linguagem criada no
tuações e/ou coisas; e jogo simbólico, dentro
de uma atmosfera “como
• Frases - que explicitam papéis, significados atribuídos a objetos e a se fosse assim ou assa-
do”, a criança recombina
recantos do ambiente físico. Na Figura 3 há uma demonstração da elementos perceptuais,
brincadeira de faz de conta. cognitivos e emocionais,
cria novos papéis para si
e reorganiza cenas am-
bientais, criando espaço
para a fantasia.
fonte: http://brinquedo-
teca.net.br/?p=1825

Brincar no Desenvolvimento Infantil | UNIDADE 3 59


Machado (1993, p. 51) diz que, por volta dos cinco anos, o brincar, cons-
truir e expressar-se pode vir a ser uma coisa só, pois a criança constrói
cenas, objetos, cenários, enquanto se autoexpressa de forma verbal e
simbólica. Ao passar a adquirir uma visão realista e objetiva de si mesma
e do mundo ao seu redor, torna-se um pouco mais consciente de si.
Ao brincar, a criança as-
sume papéis e aceita as
regras próprias da brin- Com isso, já se consolidam limites e o “[...] primeiro espaço, ou espaço
cadeira, executando,
imaginariamente, tare- fundamental, ou seja, lugar nesse limite em que ocorrerá o crescimen-
fas para as quais ainda to natural e espontaneamente”. Quando a criança brinca, assimila o
não está apta ou não
sente como agradáveis mundo à sua maneira, pois sua interação com o objeto não depende
na realidade.
da natureza, mas da função que a criança lhe atribui.
Lev Vygotsk

Por volta dos seis/sete anos, a criança começa a fase de cooperação e ra-
ciocínio lógico, o operatório-concreto, quando é capaz de resolver pro-
blemas e relacionar-se com outras crianças, embora ainda esteja ligada
aos limites da prática e do concreto. O brincar já se torna mais elabora-
do, criam-se regras e estratégias, passam a existir situações de desafios,
o uso do corpo é mais intenso e de forma vigorosa e muitas representa-
ções do cotidiano ou de fantasia estão presentes.

Nessa idade, no espaço da escola, com outras crianças, desenvolve seu


espírito construtor e artístico, conhecendo a si e ao outro. Nessa passa-
gem dos jogos de exercício para os jogos simbólicos, utilizando o faz de
conta, busca se introduzir no mundo dos adultos, aprendendo a pensar
sobre si enquanto atravessa as diversas etapas (Figura 3).

figura 3 - Brincar na escola


fonte: revistaescola.abril.com.br

60 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Seus jogos passam a ser mais complexos e de maior duração, assim
como a linguagem que, nesse momento, já está bem ampliada. Apre-
senta suas próprias variações com um mesmo brinquedo, trabalha com
muita propriedade de encaixe e construção, quebra-cabeça e jogos de
regras. Neste logo se iniciam regras mais complexas, que, para Piaget,
são difíceis para crianças com menos de cinco anos de idade.

Para Vygotsky (1996), o que pode definir o caráter do brincar é a situa-


ção imaginária criada pela criança. De acordo com a idade, o brincar vai
mudando e os interesses também, à proporção que a criança cresce.
Para ele, a imaginação é uma atividade consciente que não está presen-
te na criança muito pequena, já que, é praticamente impossível a uma
criança com menos de três anos envolver-se em situação que envolva
a imaginação, isso porque, para passar do concreto para o abstrato, há
uma descontinuidade. Só pelo brincar é que ela vai perceber o objeto
como gostaria que fosse e não como ele é.

Diante do exposto sobre a importância da brincadeira do faz de


conta e considerando suas leituras, responda:

“Atualmente, é possível dizer que, na maioria das instituições de


Educação, a brincadeira é reconhecida pela sua importância. Afi-
nal, estudos realizados em Antropologia, Sociologia, Psicologia e
Linguística têm apontado que brincar é o principal modo de ex-
pressão da infância. Brincando, a criança aprende a viver e a se
desenvolver”.

Qual é a sua percepção a respeito? Qual a sua experiência sobre a


temática?

Brincar no Desenvolvimento Infantil | UNIDADE 3 61


4 brincar, laboratório do espírito e do intelecto
e suas transformações

Segundo Oliveira (2000,


p. 7), no brincar casam- O desenvolvimento dessas etapas na vida da criança e a forma como ela
-se a espontaneidade e
a criatividade com a pro- vai ampliando a sua noção de espaço é muito interessante e de grande
gressiva aceitação das re- importância uma vez que se inicia na criança bem pequena a ideia de
gras sociais e morais. Isso
significa que, através do segurança de um lugar, um território, que acredita ser seu, onde pode
brincar é que a criança
se humaniza, aprende a
sempre voltar, como um núcleo básico de afirmação pessoal, conceito
conciliar de forma efetiva muito importante para o entendimento de muitos outros.
a afirmação de si mesma
com a criação de víncu-
los afetivos duradouros. Oliveira (2000, p. 99) relaciona isso, à própria forma como o homem se es-
tabeleceu na terra. Fixando-se em um local, desenvolveu a característica
de criar laços de afetos mais permanentes e pessoais, aprendeu a plantar
e a esperar a época do plantio, “[...] teve tempo ocioso para se encantar
com o céu cheio de estrelas e decorar e circunscrever melhor seu habitat
começou a dividir tarefas e colheitas com o grupo com o qual convivia, e
principalmente, começou a refletir sobre a vida e a morte”.

O prolongar-se de forma regular num núcleo espacial de sua maior con-


vivência com objetos e pertences, cria condições extremamente favorá-
veis ao desenvolvimento do senso social, moral e estético. Esse processo
ocorre com todas as crianças ao ampliar suas noções de espaço, partin-
do do local, para o regional, o nacional e o mundial, que fará parte de
sua vida e se constituirá da leitura de mundo ao seu entorno, pois, antes
do período de iniciação escolar, já adquiriram noções básicas.

Para Chateau (1987, p. 29), é muito importante o brincar para a criança,


a tal ponto de se constituir em construção de seu equilíbrio futuro, de
suas atividades a serem desenvolvidas na idade adulta. Para ele, o exer-
cício do brincar é o laboratório do espírito e do intelecto, onde ocorrem
as necessárias experiências das vivências futuras:

[...] uma criança que não brinca, é uma criança cuja


personalidade não se afirma, que se contenta com ser
pequena e fraca, um ser sem determinação, sem futuro.
Sem brincar ela não vive a infância, queima etapas,
deixando vazios que mais tarde se manifestarão com
bases instáveis da personalidade.

Com a criança, o brincar não só dá continuidade a características váli-


das para outras espécies vivas, mas também as prolonga, aperfeiçoa e

62 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


especializa, havendo esse fato se convertido numa das estratégias se-
lecionadas pela natureza e pelo próprio homem, na formação de sua
autonomia e sociabilidade, ajudando-o a atravessar sua infância e ado-
lescência.

Ainda uma observação importante sobre o brincar deve ser feita quanto
às mudanças que vão se efetuando no decorrer dos séculos. Friedmann
(1996) cita uma pesquisa realizada a partir de uma coletânea minucio-
sa de documentos, analisando a brincadeiras espontâneas das crianças
brasileiras no decorrer do século XX, reunindo mais de mil tipos entre
vários estados da federação e constatando significativas mudanças.

4.1 Mudanças no brincar e seus efeitos no desen-


volvimento

Embora, atualmente, a importância do brincar para o desenvolvimento


infantil seja amplamente reconhecida, é comum observarmos crianças,
mesmo muito pequenas, com uma rotina bastante atribulada por
diversas atividades e compromissos. Muitas vezes, fica difícil ter espaço
e tempo para brincar.

A realidade nos mostra que em todos os países, independente de seu


grau de desenvolvimento, as brincadeiras tradicionais estão sendo
deixadas de lado pelo uso da informatização. Alguns pais não acreditam
no brincar para o processo de formação da criança, por achar que é algo
dispensável e sem funcionalidade. Porém apesar dessas mudanças que
ocorrem com o passar do tempo no brincar, a criança continua a ser uma
imitação do mundo que a rodeia e as suas brincadeiras passam a ser
expressões desse mundo.

Como ser sociável, ela passa a interagir com outras crianças e suas
brincadeiras ficam cada vez mais complexas, pois para interagir com o
outro é necessário criar regras, métodos. Portanto, desta forma, e por
isso, brincar torna-se um novo meio de aprender a conviver com uma
sociedade que naturalmente necessita de regras a serem seguidas.

A mudança do brincar se inicia com mudança do olhar para a criança.


Ou seja, de acordo como a sociedade a vê e recebe o tratamento para o

Brincar no Desenvolvimento Infantil | Unidade 3 63


seu brincar. A maioria dos pesquisadores da história da infância diz que
até o final do século XVII permaneceu uma atitude autoritária e mesmo
feroz para com as crianças em função de que eram vistas como repre-
sentantes do pecado original (Figura 4).

Figura 4 – Brincar nas Idades Antiga, Média e Moderna


Fonte: slideplayer.com.br/ educador.brasilescola.com / www.dican.br

Após esse século, começou a surgir uma nova atitude social, maior apro-
ximação das crianças com os pais, saindo da concepção de frutos do pe-
cado, passando à condição de objetos de consumo. Os pais começaram
a dar mais atenção aos filhos a ponto de os mais privilegiados econo-
micamente gastarem muito investindo em seu futuro (ÁRIES, 1981; DE
MAUSE, 1925 apud CORAZZA, 2000).

Dentre as causas mais significativas da transformação do brincar no de-


correr desse século nas grandes cidades foram consideradas:

1. uma significativa redução do espaço físico: com o crescimento das


cidades e a falta de segurança, os espaços lúdicos viram-se seriamente
ameaçados e diminuídos;

2. a redução do espaço temporal: dentro da instituição escolar foi deixa-


do de lado em detrimento de outras atividades julgadas mais produti-
vas. No contexto familiar, mudança no papel da mulher, o grande espa-
ço ocupado pela televisão no cotidiano infantil, ou por outras atividades
extracurriculares, constituíram aspectos significativos na diminuição do
estímulo para as brincadeiras;

3. o incremento da indústria de brinquedos colocou no mercado ob-


jetos muito atraentes, transformando as interações sociais, nas quais o
objeto passa a ter um papel relevante; e

4. a propaganda contribuiu para o incremento do consumo de brinque-


dos industrializados no mundo infantil.

Essa realidade é fruto do rápido crescimento urbano e da realidade das


cidades brasileiras que vão retirando a possibilidade de a criança dispor
de um espaço maior para brincar, como a rua, aumentando a responsa-

64 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


bilidade das áreas destinadas à Educação Infantil serem muitas vezes o
único local que a criança ainda dispõe para interagir em determinados
tipos de jogos e brincadeiras que exigem espaço:

[...] livres para brincar são hoje cada vez mais raros. As casas
ocupam a maior parte dos terrenos, e no quintal o lugar
que sobra ficou para o automóvel. Brincar na rua em nossa
cidade se tornou praticamente impossível. O medo do
trânsito e dos assaltos é uma constante. As praças são mal
frequentadas e mal cuidadas. Nos prédios de apartamentos
as áreas de lazer que substituíram os quintais são
comunitárias. Isso significa que novamente a criança estará
dividindo o espaço com outras crianças e adultos dentro
de normas estabelecidas (MACHADO, 1993, p. 137).

Diante dessa realidade, nas últimas décadas pode ser observado que a
criança usa pouco as brincadeiras mais tradicionais e canta menos as can-
tigas de roda, e até muitas delas desconhecem músicas que atravessaram
gerações e que são pouco conhecidas hoje porque estão sendo deixadas
de lado. Isso especialmente porque parece haver um cerceamento à liber-
dade de brincar, principalmente nas grandes cidades, causado entre outros
fatores, pelo problema já mencionado de limitação de espaço (Figura 5).

Figura 5 – Brincar na contemporaneidade


Fonte: revistacrescer.globo.com.br

Acrescentamos a isso não só o aumento da violência urbana, mas o fato


de que alguns pais têm suprimido da vida da criança o lúdico, envolven-
do-a na vida moderna em diversas atividades que lhe ocupam todo o
tempo, ou porque deixaram de brincar, de cantar com os filhos e emba-
larem seu sono com cantigas de ninar.

Compreende-se, de acordo com essas reflexões, que brincar é uma gran-


de aventura, em que envolve afeto, motricidade, linguagem, percepção,
representação, memória. Ao brincar, a criança passa a compreender as

Brincar no Desenvolvimento Infantil | Unidade 3 65


características dos objetos, seu funcionamento, os elementos da nature-
za e os acontecimentos sociais, segundo Oliveira (2000).

Torna-se importante lembrar Piaget quando considera que, para ob-


servar o brincar da criança e perceber suas possibilidades nesse caráter
de atividade lúdica, devemos distinguir esse ato de uma atividade não
lúdica que a criança esteja executando. Para isso, ele aponta as caracte-
rísticas do brincar, que deve ser considerado como uma atividade que
denote representatividade, prazer e autodeterminação.

São elas:

1. ter um fim em si mesma;


2. ser uma atividade espontânea;
3. ser uma atividade de prazer;
4. ter uma relativa falta de organização;
5. ser caracterizada como um comportamento livre de conflitos; e
6. ser uma atividade que envolva uma motivação intensa.

Podemos resumir a importância do brincar, pelos aspectos que decor-


rem dessa vivência, utilizando-nos das palavras de Rodrigues (2000, p.
31) ao afirmar que a criança estabelece relações, produz conhecimen-
tos diversos e adquire conquistas que se estendem a todos os campos
do desenvolvimento humano, entre as quais, cita como exemplo:
• Desenvolvimento da linguagem corporal, da escrita e da oralidade;
• Ampliação do vocabulário;
• Estímulo à inteligência;
• Exercício da concentração e da atenção;
• Estímulo à curiosidade, à iniciativa e à autoconfiança;
• Descoberta de potencialidades;
• Exercício de habilidades;
• Aproximação do outro, do convívio social;
• Interação e amadurecimento emocional;
• Vivência das pulsões agressivas simbolicamente;
• Tradução da realidade para o contexto infantil; e
• Diminuição do sentimento de impotência da criança diante do
adulto.

66 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Resumo

Estudamos na Unidade, que o primeiro parceiro do brincar da criança é a


mãe e depois os outros adultos que cuidam dela. O primeiro brinquedo
é o próprio corpo, que ao descobrir, vai revelando o seu eu, dando um
sentido à sua existência.

Vimos que nesse primeiro período da vida chamado por Piaget de


sensório-motor, existem três estágios: o dos reflexos; o da organização
das percepções e de hábitos; e o da inteligência propriamente dita. Essa
fase se caracteriza por um contato direto, isto é, sem representação,
pensamento ou linguagem, da criança com objetos ou pessoas.

Discutimos que a partir da aquisição da fala, de um a dois anos de idade,


a criança ingressa no período simbólico, o período pré-operatório e até
os seis, aprende a articular realidade e fantasia aos poucos substituindo
o concreto pelo abstrato. De dois a quatro anos, é o momento em que o
brincar simbólico e a ausência de um modelo tende a se combinar.

Compreendemos que brincar é um aspecto importante no desenvolvi-


mento neurocomportamental. Ele está relacionado à atividade cerebral.
O brincar motor, comportamental e mental está presente e tem uma
importante função adaptativa. Vimos que já no terceiro ano de vida, as
brincadeiras simbólicas se expandem e se organizam, vários persona-
gens podem aparecer na mesma brincadeira vivida pela criança.

Discutimos o fato de que no quarto ano, há uma explosão de brinca-


deiras, tanto na estruturação como na dramatização na representação
simbólica e na amplitude de espaço relacional, que se intensificará ain-
da mais aos cinco e seis anos.

Por volta dos seis/sete anos, a criança começa a fase de cooperação e ra-
ciocínio lógico, o operatório-concreto, quando é capaz de resolver pro-
blemas e relacionar-se com outras crianças, embora ainda esteja ligada
aos limites da prática e do concreto. O brincar já se torna mais elaborado.

Vimos que as causas mais significativas da transformação do brincar no


decorrer desse século nas grandes cidades foram consideradas:

Brincar no Desenvolvimento Infantil | Unidade 3 67


1. uma significativa redução do espaço físico: com o crescimento das
cidades e a falta de segurança, os espaços lúdicos viram-se seriamente
ameaçados e diminuídos;

2. a redução do espaço temporal: dentro da instituição escolar foi dei-


xado de lado em detrimento de outras atividades julgadas mais produ-
tivas; 3. o incremento da indústria de brinquedos colocou no mercado
objetos muito atraentes, transformando as interações sociais, nas quais
o objeto passa a ter um papel relevante;

4. a propaganda contribuiu para o incremento do consumo de brinque-


dos industrializados no mundo infantil.

Diante dessa realidade, nas últimas décadas pode ser observado que a criança
usa pouco as brincadeiras mais tradicionais e canta menos as cantigas de
roda, e até muitas delas desconhecem músicas que atravessaram gerações e
que são pouco conhecidas hoje porque estão sendo deixadas de lado.

Concluimos que por meio do brincar as crianças desenvolvem sua


capacidade de raciocinar, de julgar, de argumentar, de como chegar a
um consenso, reconhecendo o quanto isto é importante para dar início
à atividade em si.

Segundo Oliveira (2000) o brincar não significa apenas recrear,


é muito mais, caracterizando-se como uma das formas mais
complexas que a criança tem de comunicar-se consigo mesma
e com o mundo, ou seja, o desenvolvimento acontece através
de trocas recíprocas que se estabelecem durante toda sua
vida. Assim, por meio do brincar a criança pode desenvolver
capacidades importantes como a atenção, a memória, a imitação,
a imaginação, ainda propiciando à criança o desenvolvimento
de áreas da personalidade como afetividade, motricidade,
inteligência, sociabilidade e criatividade.

Diante do exposto, afinal, para você por que o brincar é considerado


algo tão importante para o desenvolvimento das crianças?

68 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


ARIÉS, P. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara, 1986.

DE MAUSE, Llyoyd. La evolucion de la enfancia. In: I. D. História de la


infância. Madrid: Aliança, 1995.

FRIEDMANN, Adriana. brincar crescer e aprender: o resgate do jogo


infantil. São Paulo: Moderna, 2005.

______. o direito de brincar: a brinquedoteca. 3. ed. São Paulo: E.


Páginas Aberta Ltda, 1996.

______. o universo simbólico da criança: Olhares sensíveis para a


Infância. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2005.

MACHADO, M. L. M. exclamações, interrogações e reticências na


instituição de educação infantil: uma análise a partir da teoria sócio-
interacionista de Vigotsky. Dissertação de Mestrado não publicada, PUC,
São Paulo, 1993.

OLIVEIRA. Vera Barros (Org.). o brincar e a criança: Petrópolis: Vozes,


2000.

OLIVEIRA, Zilma de Moraes Ramos (Org.). educação infantil: muitos


olhares. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2000.

PIAGET, J. a formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho.


Rio de Janeiro: Zanar, 1971.

VYGOTSKY, L. S. (1979) – pensamento e linguagem. Lisboa: Edições


Antídoto, 1996.

Brincar no Desenvolvimento Infantil | UNIDADE 3 69


O brincar e a aprendizagem no
desenvolvimento infantil

Objetivos
.
• Reconhecer a visão pedagógica do brincar das socieda-
des antigas;
• Discutir a inserção na escola dos Brinquedos, brincadeiras
e jogos e sua importância para o desenvolvimento infantil;
• Compreender o brincar atual na Escola como possibilida-
de de construção de conhecimentos.

1 Introdução

Através dos brinquedos, das brincadei-


ras e dos jogos há um diálogo entre a
escola, a criança e o mundo. Nele se de-
Fonte: www.diarioliberdade.org / Fonte: www.familiarte.com.br

senha a ampliação dos significados e da


aquisição de novas e diferentes lingua-
Figura 1 – Criança de sociedades diferentes

Unidade
gens construídos pela criança. Conside-
ramos que esse diálogo permite a com-
preensão do conjunto de movimentos
que dá sentido ao mundo e a apreensão
de seu sentido, que a Escola deve apre-
sentar à criança.

Essa perspectiva está fortemente ligada


à visão de mundo, de escola e de criança
que a sociedade tem. Ao longo do tempo
essa visão foi adquirindo perfis diferentes
(Figura 1).
2 visão pedagógica do brincar das sociedades
antigas

Na escola, o brinquedo é utilizado desde os gregos e romanos a partir


Filosofia mítica consiste
na forma pela qual um das ideias de Platão e Aristóteles. A região da Grécia, na época, era palco
povo explica os aspectos
essenciais da realidade
de misturas étnicas e culturais, de grandes navegadores do mar Medi-
em que vive: a origem terrâneo que formaram colônias e viviam uma filosofia mítica. Construí-
do mundo, o funciona-
mento da natureza e dos ram concepções de criança e de brinquedos alicerçados nessa filosofia e
processos naturais e as
origens do povo, bem
na mistura de culturas diferentes.
como seus valores bási-
cos e a explicação que é Entre os diversos ângulos pelos quais os gregos antigos viam as crianças,
dada apelando ao sobre-
natural e ao mistério, ao costumavam associá-las às suas ideias sobre os escravos e os negros colo-
sobrenatural, ao sagrado
nizados. Eles afirmavam que essas categorias não atingiam o pensamento
e à magia (MARCONDES,
2001, p. 30). abstrato e eram pouco inteligentes, por isso viviam o presente sem previ-
são para o futuro, deixando-se levar pelos seus caprichos.

Nessa perspectiva, a criança também era comparada ao operário, ao po-


bre, com suas características de imprevidente, dependente, ignorante e
sem raciocínio abstrato (Figura 2).

figura 2 – Brincar na Antiguidade


fonte: www.ondafilosofal.com

É importante lembrar o fato de que nas sociedades antigas, não havia


um interesse específico centrado na criança. Para alguns pesquisadores,
como Ariès (1981, p.10) elas são as grandes ausentes da história, já que
o espaço que elas ocupam hoje e o significado que tem a infância são
específicos da contemporaneidade, pois para chegar a essa visão dos

72 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


nossos dias, houve uma trajetória permeada de indiferença quanto à
sua significação social: [...] simplesmente porque, no chamado “passado”
- da Antiguidade à Idade Média-, não existia este objeto discursivo a que
chamamos “infância”, nem essa figura social e cultural chamada “criança”,
já que o dispositivo de infantilidade não operava para, especificamente,
A Filosofia de Platão se
criar o “infantil.” (CORAZZA, 2002, p. 81). desenvolve a partir dos
ensinamentos de seu
Segundo Rizzo (1998, p. 14b), Platão elaborou documentos contendo mestre Sócrates. Ele de-
fine a primeira formula-
os primeiros apontamentos sobre a educação da criança, em 400 a.C. ção clássica, os aspectos
centrais da Filosofia, de-
Sugeria associar o estudo ao prazer, sendo este uma forma de brincar.
senvolvendo-se durante
Suchodolsky (1984,p. 112) afirma que “[...] a filosofia de Platão foi uma os vinte e cinco séculos
seguintes até os dias de
das fontes principais das concepções de várias correntes filosóficas, hoje. Sua obra pode ser
desde a época helenística ao Renascimento, e foi o grande responsável entendida como uma
longa reflexão sobre a
em por em relevo o papel da educação como de conduzir o homem à decadência da demo-
cracia ateniense, de seus
descoberta do ideal.” valores e ideais.

Platão, em “As Leis”, destacou a importância de aprender brincando


em oposição á utilização da violência e da repressão. Apesar disso,
Platão não fugiu da forma grega de perceber a criança, pois a via como
alguém próximo do estado animalesco, privada de razão. Para ele “[...]
Para o autor referencia-
a criança é de todos os animais o mais intratável, na medida em que do, “não é que não exis-
seu pensamento, ao mesmo tempo cheio de potencialidades e sem tissem seres humanos
pequenos, gestados,
nenhuma orientação reta ainda, o que o torna o mais ardiloso, o mais paridos, nascidos, ama-
mentados, crescidos - a
hábil de todos os bichos.” (Figura 3). maioria deles mortos,
antes de crescerem - mas
é que a eles não era atri-
buída a mesma significa-
ção social e subjetivida-
de de hoje (ib id).

figura 3 – Filósofos da Grécia Antiga


fonte: pt.slideshare.net

Era necessário cuidar dessa situação no sentido de fazer as devidas


correções da criança. Essa filosofia da domesticação por meio da razão

O Brincar e a Aprendizagem | UNIDADE 4 73


percorreu um caminho de Platão até Santo Agostinho na Idade Média
quando tratou a infância como um ser com pecados originais, e veio até
a Modernidade com o racionalismo de Descartes.

Platão assegurou que não adianta querer encher a criança de ensinos,


regras e normas. O importante é preparar sua alma para crescer e
desenvolver sua inteligência respeitando seu ritmo próprio. Essa linha
de pensamento seguiu até ao Renascimento através das pesquisas de
Montaigne e chegou às escolas contemporâneas, via Rosseau em sua
filosofia romântica sobre a infância.

Aristóteles trouxe um novo modo de pensar a criança e os brinquedos.


Ele estabeleceu princípios e formulou a lógica formal e material para as
operações do pensamento fazendo mudar as concepções que estavam
postas naquele momento. Analisou a brincadeiras como descanso do
espírito em Ética a Nicômaco e em Política.

Ele considerou tão importante o lúdico na vida do ser humano que ca-
racterizou o homem como um ser que tem três facetas ao tecer conside-
rações sobre esse aspecto na vida humana.

• Homo sapiens (o que conhece e aprende),


• Homo faber (o que faz, produz) e
• Hom o ludens (o que brinca o que cria),

O que teria levado Aristóteles numa sociedade tão antiga


considerar o lúdico como uma das facetas importantes para o
desenvolvimento humano?

Diante do exposto sobre ao brincar nas sociedades antigas, quais


as principais diferenças que você observa para o atual? Para isso,
teça considerações sobre as mudanças da sociedade e da criança.

74 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


3 Visão pedagógica do brincar das sociedades
medievais

Ariès (1981), pesquisador francês, percebeu e a diferença entre a Anti-


guidade e o Medievo no tratamento com a criança. Ele reconheceu na
Idade Medieval que ela foi vista de duas formas. Uma, na sociedade
feudal, exercendo um papel produtivo, bastante identificado como um
adulto em miniatura.

Outro, na sociedade burguesa, um ser que precisava ser preparado para


uma atuação futura. Bebês ao nascer ficavam imóveis, muitas vezes em
quartos escuros, eram enrolados em panos que limitavam seus movi-
mentos e a possibilidade de qualquer exploração com o mundo era to-
lhida (Figura 4).

Fonte 4 – Crianças da Idade Média como adultos em miniatura


Fonte: tatiananeiva.com.br/pt.slidehare.net

Os cuidados e a educação, eram tarefas de algumas mulheres e tudo o


que era vivenciado pela criança, era antes selecionado e escolhido pelo
adulto. Em outras palavras, a criança interagia pouco. Ao crescer, era
vista como mini adultos, não havia características específicas da infân-
cia que as diferenciassem do mundo adulto, participavam das mesmas
atividades e recebiam as mesmas informações, independente de terem
interesse ou maturidade para assimilar.

O autor aponta ainda que, foi apenas no século XVII, que mudanças sig-
nificativas na forma de pensar a infância começaram a surgir e só a partir
daí, foram estudados aspectos que começaram a diferenciar o mundo
infantil do adulto, evidenciando peculiaridades e necessidades comuns
a infância.

O Brincar e a Aprendizagem | Unidade 4 75


O interesse pelos jogos (na acepção de jogos infantil, de brinquedos
e brincadeiras) aparece nos escritos de Heráclito e Quintiliano
posteriormente. Encontramos na Antiguidade a primeira estratégia para
a educação infantil: usavam doces em forma de brinquedos comestíveis
no ensino de Filosofia, Matemática, estudo de línguas e outros.

Na antiguidade utilizaram-se dados, assim como doces e


guloseimas em forma de letras e números, para o ensino
das crianças. A importância da educação sensorial nesse
período determinou, portanto, o uso do “jogos didático”
por professores das mais diferentes áreas, como Filosofia,
Matemática, estudo da língua e outros (VIAL apud
WAJSKOP, 1997).

Essa forma de educação sensorial influenciou profundamente as escolas em


todos os seus segmentos e seus vários deles até à Modernidade, por meio da
assertiva de que as ideias derivam direta ou indiretamente da experiência
sensível, numa filosofia empírica que deu uma perspectiva sensorial aos
brinquedos, especialmente os pedagógicos, utilizados na escola (Figura 5).

Figura 5 – Brincar na Idade Média


Fonte: www.efdeportes.com

As brincadeiras ainda eram relacionadas com recreação, lazer ou fuga.


Não se registra naquele momento o brinquedo direcionado às necessi-
dades biopsicossociais da criança, que também é uma visão contempo-
rânea, pois o desconhecimento da infância dura até o século XII, confor-
me Araújo (1998, p. 14):

76 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Até o século XII havia um desconhecimento da infância.
Uma comprovação disso é que as crianças não eram
representadas pelos artistas da época, uma das fontes
mais importantes de registro, sendo desta forma,
excluídas. Os homens não se detinham diante da imagem
infantil, pois não tinham interesse por um período de
transição que logo ia ser ultrapassado e cuja lembrança
era rapidamente perdida. O humanismo foi um
movimento intelectual
iniciado na Itália no sé-
culo XIV com o Renasci-
mento e difundido pela
4 brinquedos, brincadeiras e jogos e sua inserção Europa, rompendo com
na escola a forte influência da
Igreja e do pensamen-
to religioso da Idade
Média. O teocentrismo
(Deus como centro de
Segundo Brougère (2000, p. 91), não foi a razão que colocou a brinca- tudo) cede lugar ao
antropocentrismo, pas-
deira no centro da educação da criança, mas a exaltação da naturalida- sando o homem a ser
o centro de interesse.
de, uma filosofia que se impôs como uma ruptura com o racionalismo
O humanismo procura
das Luzes. Ainda no século XVI, os humanistas começaram a perceber o melhor nos seres hu-
manos e para os seres
o valor educativo dos jogos, e os colégios jesuítas foram os primeiros a humanos sem se servir
recolocá-los em prática. Impuseram pouco a pouco às pessoas de bem da religião.
A filosofia humanista
e aos amantes da ordem, uma opinião menos radical com relação aos
oferecia novas formas
jogos (ALMEIDA, 2000, p. 21). de reflexão sobre as ar-
tes, as ciências e a polí-
tica, revolucionando o
Ariès (1981, p. 112) afirma que os padres compreenderam desde o iní- campo cultural e mar-
cio que não era possível nem desejável suprimi-los. Propuseram então cando a transição entre
a Idade Média e a Idade
introduzir nos programas e regulamentos e controlá-los. Assim, os jo- Moderna.

gos foram reconhecidos como bons, passaram a ser recomendados e


considerados como meio de educação. Os jesuítas editaram em latim as
regras para jogos de azar, danças, comédias, transformados em práticas
educativas para aprendizagens da ortografia e gramática (Figura 6).

figura 6 – Jogo do Humanismo


fonte: www.amurt.com.br

O Brincar e a Aprendizagem | UNIDADE 4 77


O Renascimento foi um movimento cultural que marcou a fase de
transição dos valores e das tradições medievais para um mundo
totalmente novo, em que os códigos cavalheirescos cedem lugar
à afetação burguesa, às máscaras sociais desenvolvidas pela
burguesia emergente.

Esta importante etapa histórica predominou no Ocidente entre


os séculos XV e XVI, principalmente na Itália, centro irradiador
desta revolução nas artes, na literatura, na política, na religião, nos
aspectos socioculturais. Deste polo cultural, o Renascimento se
propagou pela Europa, especialmente pela Inglaterra, Alemanha,
Países Baixos e com menos ênfase em Portugal e Espanha.

fonte: www.infoescola.com/movimentoscullturais/renascimento. Acesso em: 15/09/15

Outros precursores desses novos métodos também evidenciaram a im-


portância da educação lúdica, como Rabelais (apud KISHIMOTO, 2000,
p.29) ainda no mesmo século, dizendo: “[...] ensina-lhes a afeição à leitu-
ra e ao desenho, e até os jogos de carta e fichas servem para o ensino da
geometria e gramática”. Ele cita cerca de duzentos e quatro jogos prati-
cados na época em que predominavam os de azar, com uso de cartas,
movimento, simulação, em sua obra Gargântua e Pantagruel.

Ele criticava os jogos para o que não era sério, e os valorizava como ins-
trumento de educação. Aconselhava a usá-los para ensinar conteúdos,
gerar conversas, ilustrar valores e práticas do passado, sugerindo nos
dias de chuva brincar de ossinhos enquanto discutiam como os povos
do passado pensavam e brincavam.

Um grande momento para a história dos brinquedos na educação foi


sem dúvida o do Renascimento - movimento que marca o fim da Idade
Média e começo da Idade Moderna - pela percepção da infância que lhe
inspirou. A criança passou a ser vista como alguém que possui valor po-
sitivo, natureza boa, refletindo essa visão mais poética que se fixou nos
olhos do Romantismo, fazendo uma ruptura com as ideias de punição,

78 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


castigo e rigorosa disciplina para a educação infantil, quando havia uma
nova luz focando a educação:

Os problemas da educação foram focados com uma


nova luz. Se o homem é bom por natureza, a educação
não deve ser concedida de modo a conduzir à destruição
de todo o seu eu empírico e ao renascimento da sua O projeto moderno con-
‘verdadeira essência’ oculta; a educação poderia apoiar-se solida-se com a Revolu-
sobre a totalidade do homem empírico, acompanhando ção Industrial e está nor-
malmente relacionado
o desenvolvimento de suas forças dos seus gostos e
com o desenvolvimento
aspirações (SUcHOdOLSKY, 1984, p. 89).
do capitalismo.
A modernidade transi-
A brincadeira passou a ser vista como um instrumento que favoreceria ta, em seu fechamento
e esgotamento, para a
o desenvolvimento da inteligência e ajudaria o professor no ensino, as- pós-modernidade. Mui-
sim como a criança no estudo. Nesse momento não eram mais apenas tos teóricos trataram
dessa transição e ten-
alguns estudiosos que tentavam demonstrar de forma isolada em suas taram sondar para ver
além dos limites da tran-
propostas, a vantagem do brincar como instrumento de aprendizagem
sição para tentar captar
como ocorria até então. Era consenso da maioria. que outro mundo estava
surgindo. A pós-moder-
nidade como um outro
Foi assim que os brinquedos, as brincadeiras e os jogos entraram em mundo relativamente à
modernidade também
sala de aula, como possibilidades de aprender. Foram parceiros naquele
é um tema filosófico da
momento em suas assertivas, os autores renascentistas que referencia- mais alta importância.
Pós-modernidade care-
ram em obras importantes essa relação, criticando a educação dos sofis- ce de definição, no pa-
tas vigentes na época, pois tinham um comportamento deseducativo, rece, em sí mesma, só
fazendo sentido se, em
com excessos nos jogos. conexão com a moder-
nidade, ou sua extensão,
ou sua ruptura.
A partir das mudanças políticas, econômicas, das artes e das letras
que inaugurou, o Renascimento se constituiu em grande mudança na
sociedade. A visão da criança, dos brinquedos das brincadeiras e dos
jogos mudou e foi instituída a permissão para que tantos outros inte-
ressados no assunto dessem sua contribuição ao brincar como possibi-
lidade de aprendizagem.

A história revela que os ideários da Reforma Protestantes (século XVIII)


trouxeram a grande questão dos estudiosos da educação do período:
como conciliar novas formas disciplinadoras da criança que eliminem
punições físicas? Ainda era fato a noção de que a criança nascida sobre
pecado precisava que a família ou a sociedade a corrigisse. Essa preocu-
pação levou os reformadores alemães a organizarem o tempo da crian-
ça, com rotinas a serem observadas diariamente, baseadas nos ideais
de autodisciplina a que estavam sujeitas até as crianças bem pequenas
(OLIVEIRA, 2000, p. 13).

O Brincar e a Aprendizagem | UNIDADE 4 79


A partir dessas mudanças, entrou em cena Comenuis que escreveu
Escola da Infância, considerando a infância como um período de
desenvolvimento do homem. Recomendou o brinquedo e experiências
diretas com o objeto. Chamou a atenção para a necessidade infantil e
a importância de pensar nelas no planejamento e para a afetividade,
primordial no contato com a criança.

Seu método se resumia em três ideias fundamentais que foram a base


da nova didática: naturalidade, intuição e auto-atividade. Para ele, esse
método tinha a capacidade de trazer para o ensino rapidez, facilidade
e consistência no aprendizado. Sua indicação era de que o processo de
aprendizagem se iniciava pelos sentidos. Defendeu a partir dessa pre-
missa que a educação da criança pequena deveria utilizar materiais e
atividades diferentes - passeios, quadros, modelos e coisas reais – se-
gundo sua idade, de modo a auxiliá-las no futuro a fazer aprendizagens
abstratas (OLIVEIRA, 2000, p. 12).

Foi surgindo a Modernidade em oposição à filosofia doutrinária e


dogmática da Idade Média. Ela seguia lado a lado na construção de
uma nova identidade filosófica, com rupturas consideráveis sobre
a percepção da criança e do ensino infantil, consequentemente do
brinquedo, das brincadeiras e dos jogos.

Destaca-se nesse momento Rousseau como um personagem importan-


te na construção desta história. Propôs facilitar a aprendizagem dando
liberdade à criança, permitindo-lhe errar, uma vez que o erro teria uma
função pedagógica na busca do acerto. Demonstrou que a criança tem
maneiras de ver, de pensar e de sentir que lhe são próprias; que não
aprende nada senão por meio de uma conquista ativa (Figura 7).

Figura 7 - Rosseau
Fonte: pensador.uol.com.br

80 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Ele afirmava: “Não deis a vossos alunos nenhuma espécie de lição verbal:
só da experiência ele deve receber”. Afirmou que só se aprende se os
sentidos forem exercitados, pois são instrumentos da inteligência. Para
tirar todo o proveito possível é preciso que o corpo seja robusto e são.
“A boa constituição do corpo é que torna as operações do espírito fáceis
e seguras”.

Segundo Kishimoto (apud WAJSKOP, 1997 p. 20), a influência das ideias


de Rousseau, na França, permitiu que se criassem inúmeros brinque-
dos educativos utilizando princípios da educação sensorial com vistas a
estudar crianças deficientes mentais e cujos conhecimentos foram, de-
pois, utilizados para o ensino das crianças normais.

Pestalozzi foi um dos que teve oportunidade de estudar o desenvol-


vimento psicológico do aluno e o fracasso e êxito das técnicas peda-
gógicas empregadas, numa perspectiva empirista. Atribuiu ao ensino
infantil uma grande importância. Ampliou a dimensão da educação,
percebendo que ela favorecia a ascensão social. Sua proposta envolvia
trabalhar com material concreto para que as crianças pudessem “sentir
os objetos” em vez de ouvir falar deles (Figura 8 e 9).

Figura 8 - Jogos em Pestalozzi


Fonte: noticias.terra.com.br

O Brincar e a Aprendizagem | Unidade 4 81


A arte da educação deve ser cultivada em todos os
aspectos, para se tornar uma ciência construída
a partir do conhecimento profundo da natureza
humana.

(Johann Heinrich Pestalozzi)

A obra de Pestalozzi abriu um novo rumo para a educação moderna. Ele


declarou que a escola é uma verdadeira sociedade, na qual o senso de
responsabilidade e as normas de cooperação são suficientes para edu-
car crianças e o jogo é um fator decisivo que enriquece o senso de res-
ponsabilidade e fortifica as normas de cooperação. Contribuiu também
formalizando procedimentos para treinamento de professores com no-
vos métodos para a época (Figura 8).

Segundo Suchodolsk (1984, p. 8), Decroly elaborou um sistema de pro-


cessos pedagógicos destinados a simultaneamente satisfazer as neces-
sidade da criança e contribuir para o conhecimento da realidade, além
de transformar em aquisição aquilo que ele tenha aprendido. É por essa
razão que a dança, o desenho, o canto e a palavra se tornaram elemen-
tos fundamentais da educação.

A Froebel deve-se a instalação de um ambiente de aprendizagem especí-


fico e uma filosofia direcionada para aprendizagem infantil. Discípulo de
Pestalozzi, a ele é atribuído
a criação do 1º jardim de
infância, numa Europa mar-
cada pela guerra com lutas,
conquistas e grandes bata-
lhas de Napoleão. Froebel
tinha os ideais de liberda-
de acentuados, originando
figura 9 – Jogos Froebel
sua filosofia para o trabalho fonte: revista.casavogue.globo.com
com as crianças: “[...] possibilitar ao homem o desenvolvimento de suas ap-
tidões naturais, fazendo-o crescer como um ser presente e consciente.”

82 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Sua filosofia entendia a criança como uma pequena semente com poten-
cial genético para o vir a ser um adulto feliz e produtivo, se recebesse to-
das as condições adequadas e favoráveis como adubo, como uma planta
num jardim, expostas ao seu meio ambiente que certamente desabrocha-
ria numa grande árvore em um clima de amor, simpatia e encorajamento,
estando livres para aprender sobre si mesma e sobre o mundo (Figura 9).

Froebel foi um filósofo do período romântico e como tal, esteve profun-


damente alicerçado nessa realidade, propondo o jardim da criança. Ele
teve sua infância e adolescência voltada para a observação do ambien-
te, das flores, plantas, das estações do ano e todas as mudanças que
naturalmente vão se sucedendo na natureza.

De criação evangélica desenvolveu o seu entendimento de que pela


educação se poderia chegar a Deus “[...] propôs que a criança preci-
sa aprender cedo como encontrar por si mesma o centro de todos os
seus poderes e membros para agarrar e pegar com seus próprios olhos.”
(apud KISHIMOTO 2002, p. 59).

Ele valorizou e fundamentou seu estudo a partir da intuição e da ideia


da espontaneidade infantil, numa busca da criança se autoestudar por
meio de jogos. Para isso elaborou canções e jogos para a educação pe-
las sensações e emoções; desenvolveu atividades manuais e criou brin-
quedos para ensinar e aprender aritmética e geometria; cultivou com as
crianças hortas e recriou a poesia.

Ele estimulou o manuseio de objetos e a participação em atividades di-


versas de livre expressão por meio da música, de gestos, construções
com papel, argila e blocos e da linguagem, pois possibilitariam a exte-
riorização do mundo interno da criança, podendo ela então se ver obje-
tivamente e modificar-se (KISHIMOTO, 2002, p. 59) (Figua10).

Figura 10 – Prendas e Ocupações


Fonte: infed.org

O Brincar e a Aprendizagem | Unidade 4 83


Organizou seu modelo de recursos pedagógicos dividindo-os em Pren-
das e Ocupações. As prendas eram materiais que não mudavam de for-
ma: cubos, cilindros, esferas (formas geométricas que indicavam vida
harmoniosa e simétrica) bastões e lápides. Usadas em brincadeiras pos-
sibilitariam à criança formar um sentido da realidade e um respeito à
natureza.

As ocupações consistiam de materiais que não se modificavam com o


uso: argila, areia e papel. Eram usados em atividades de recorte, de en-
fiar contas em um colar, dobradura e alinhavo em cartões com diferen-
tes figuras desenhadas além de outras. Canções completavam a lista de
sugestões e atividades direcionadas pela professora que deveria ser a
jardineira.

Montessori é incluída também com muita força na história da Educa-


ção Infantil e no brincar na escola. Enfatizou o aspecto biológico do
crescimento e desenvolvimento infantil, criou materiais adequados à
exploração sensorial específicas a cada objetivo educacional. Diminuiu
o tamanho do mobiliário usado pelas crianças na escola assim como,
a exigência de miniaturizar os objetos de uso domésticos para que a
criança pudesse brincar em casinhas de boneca, representando na es-
cola o cotidiano.

Ela recebeu dura crítica pela sua rigidez com a forma como esses mate-
riais deveriam ser utilizados pela criança, seus exercícios com os mate-
riais e sua desatualização em relação aos métodos de ensino da escrita,
que deveria ser feito pelo alfabético, quando Decroly já dava ênfase à
alfabetização pelo método global.

É necessário que se faça referência a Celestine Freinet, considerado de


extrema importância para utilização dos brinquedos, das brincadeiras
e especialmente dos jogos na escola, quando chamou a atenção para
o fato de considerar os jogos trabalho e não apenas uma forma de
prazer. Como educador e idealista sua proposta pedagógica centrava-
-se na atividade e na criação, propondo “uma escola prazerosa, onde
a criança queira estar, permanecer, onde o coração, a afetividade e as
emoções predominem, onde haja alegria e prazer para descobrir e
aprender”. (Figura 11).

84 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


figura 11 – Métodos de Celestine Freinet
fonte: escolacurumim.com.br/ast.wikipedia.org/pt/slidehare.net

Como Froebel, a partir de sua experiência de vida na aldeia, que Freinet


busca uma pedagogia natural. Elias (2001, p.19) faz referência a esse
dado de sua vida:

[...] participava dos trabalhos do campo e da guarda das


cabras. Em seus trabalhos retrata as noites passadas ao
luar, a profunda comunhão com os animais, as plantas, o
céu, o universo inteiro e, em especial seu trabalho com
a família, no campo quando sua mãe lhe punha um
pequeno saco no pescoço e lhe preparava uma foice
pequeníssima, não muito afiada em que ele partia com os
adultos para cortar as flores perfumadas.

Essas experiências marcaram profundamente sua vida e a forma como


compreendeu a educação das crianças anos mais tarde, propondo uma
escola infantil inserida no seio da natureza. A Pedagogia Freinet pode
ser vista como uma prática libertadora, internacional, apoiada em qua-
tro eixos: cooperação, comunicação, documentação e afetividade. Depois
de Freinet a pesquisa quanto a importância do lúdico para o desenvolvi-
mento e a aprendizagem, seguiu com muitas personagens importantes.

Considerando os autores que estudaram e solidificaram a impor-


tância dos brinquedos, brincadeiras e jogos para a aprendizagem,
construa o quadro a seguir para resumir a principal contribuição
deles sobre o tema.

Rosseau Frroebel Pestalozzi Decroly Montyessori Freinet


________ ________ ________ ________ ________ ________
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________ ________ ________ ________ ________ ________
________ ________ ________ ________ ________ ________
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O Brincar e a Aprendizagem | UNIDADE 4 85


O brincar atual na Escola

A literatura indica que na modernidade existe o sentimento correspon-


dente a duas atitudes contraditórias dos adultos em relação à criança e
que influencia do brincar na escola: uma que é definida como paparica-
ção ao considerar a criança ingênua, inocente e pura, e a outra de mora-
lização ao reconhecer a criança como um ser imperfeito e incompleto,
necessitando da intervenção para educá-la (Figura 12).

Figura 12 – Brincar na Escola


Fonte: Porto, 2003

A implantação da sociedade industrial foi decisiva na exigência de uma


educação que privilegiasse o mundo do trabalho, equipando-a para as
novas tarefas, distanciando o brincar, o lazer e o prazer do dia a dia, na
busca constante da produção na sociedade capitalista, urbano-indus-
trial, mudando assim o papel social da criança na comunidade.

A educação, nessa nova escola, precisava repensar a criança, olhá-


-la de frente, dar respostas às suas indagações, ensiná-la a fazer as
leituras necessárias de sua vivência social. Buscar conhecer estudos
em Psicologia, Sociologia, Antropologia, Linguística, Psicanálise. A
cultura, a alfabetização, a leitura, o conhecimento, o desenvolvi-
mento humano, a relação da criança com o brinquedo, a brincadei-
ra e com o jogo, vieram à tona, durante as pesquisas, no esforço de
compreender a infância e o papel da dimensão lúdica no desenvol-
vimento da criança.

Chegou-se à conclusão que o brinquedo, as brincadeiras e os jogos edu-


cativos podem ser realizados de forma livre ou dirigidos pelo adulto. De
forma livre, permite construções sobre situações, pessoas, atitudes, res-
postas, materiais, propriedades, texturas e estruturas.

86 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Quando dirigido, permite outras inferências e variedades, que o pro-
fessor conduz, incentivando a manifestação do imaginário infantil por
meio de objetos simbólicos de forma que a função pedagógica auxilia o
desenvolvimento integral da criança.

O desenvolvimento do brincar atual é distribuído no Quadro 1 a seguir, como


brincar físico, intelectual, social e emocional, segundo Moyles (2002, p. 26).

Quadro 1 - Diferentes formas de brincar na escola

FORMA BÁSI CA DETALHE EXEMPLOS


Construção Blocos de montar
Motor amplo
Destruição Argila/areia/madeira

Manipulação Blocos de encaixar


BRINCAR Motor Fino
Coordenação Instrumentos musicais
FÍSICO
Aparelhos de subir
Aventura
Dança
Psicomotor Movimento criativo
Modelagem com sucata
Exploração sensorial
Mesa de descobertas
Comunicação/função
Linguístico Ouvir/contar histórias
Explicação/aquisição
Exploração/investigação/
Científico Brincar com água cozinhar
BRINCAR Resolução de problemas
INTELECTUAL Símbolo Representação/faz de Casa de boneca/casinha
matemático conta/ minimundos Teatro/jogos de números
Estética/imaginação Pintura/desenho
Criativo fantasia/realidade
inovação Desingning/modelagem

Agressão/regressão
Relaxamento/solidão Madeira/argila/música
Terapêutico brincar paralelo
Comunicação/interação
Linguístico Marionetes/telefone
BRINCAR cooperação
SOCIAL Repetitivo Domínio/controle Qualquer coisa!
EMOCIONAL
Animais de estimação /
Empático Simpatia/sensibilidade
outras crianças
Cantinho da casa/
Papéis/emulação
“oficinas” de serviços
moralidade/etnicidade
Autoconceito discussão
Jogos de palavras/
Jogos Competição/regras
números

Fonte: Moyles (2002, p. 26)

A partir do brincar de crianças e professores na escola, surgem várias


perguntas e entre elas, uma se destaca: A concepção de brincar da esco-
la e do professor é o da criança? Com o objetivo de compreender melhor
o comportamento social da criança em situação de brinquedos, várias
pesquisas têm sido feitas em décadas diferentes, porém o resultado

O Brincar e a Aprendizagem | Unidade 4 87


sempre tem evidenciado os seguintes comportamentos nos ambientes
de Educação Infantil:

• Comportamento desocupado: ocorre quando a criança aparente-


mente não está brincando, ocupando-se em olhar o que lhe interes-
sa, ou brincando com seu próprio corpo, seguindo o professor em
atitude descomprometida com o brincar estabelecido;
• Brinquedo solidário: é um brincar sozinho, sem dar atenção ao outro,
ao professor ou a compartilhar o brinquedo;
• Comportamento do observador: a criança não brinca, apenas obser-
va o brincar de outras crianças;
• Brinquedo paralelo: é o brincar sozinho ao lado de outra criança que
também brinca. Não existe troca, nem compartilhar dos brinquedos
com outra criança e tampouco brincam juntas, embora estejam pró-
ximos;
• Brinquedo associativo: é o brincar compartilhado, o brincar com ou-
tra criança, desenvolvendo atividades iguais ou semelhantes. Não
há divisão de trabalho e nem atividades organizadas e a criança é
livre para administrar o seu brincar;
• Brinquedo cooperativo ou organizado: a criança brinca em grupo me-
diante um objetivo comum, há uma divisão de papéis e distribuição
de atividades \pelos participantes do brincar.

As crianças menores brincam mais sozinhas, enquanto as mais velhas,


em grupos. Após terem sido repetidos em pesquisas diferentes, em dé-
cadas variadas, a busca dessa realidade demonstrou a atualidade desses
dados que foram pesquisados desde 1932 (Figura 13).

Figura 13 - Brincar pedagógico


Fonte: Porto,2003

88 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Esses dados são importantes para compreender como trabalhar de for-
ma que o brincar para o professor seja também para a criança, compor-
tamento que nem sempre corresponde, já que o que poderia ser uma
forma interessante de construir conhecimentos, pode se revelar em um
momento que não interesse à criança e não atinja os objetivos propos-
tos. Chega-se a evidência de que esse é um vasto caminho a percorrer
para compreender a relação encantadora da criança enquanto brinca e
tudo o que se envolve nessa relação.

O exercitar dos brinquedos, das brincadeiras e dos jogos é fonte para


essa leitura no ambiente escolar, onde cada sujeito ocupa um espaço e
é parte integrante de todo um sistema social, político e econômico que
a criança tem contato desde que nasce. Ressaltamos o fato de que na
contemporaneidade, ela toma conhecimento cada vez mais cedo,

5 O brincar e a aprendizagem na escola

Naturalmente, é bastante claro que há outras formas de aprendizagens


além do brincar, no entanto muitos educadores concordam que a aprendi-
zagem mais valiosa vem do brincar (MOYLES, 2002). Cada criança chega à
escola com expectativas diferentes sobre o brincar, e isso está relacionado
à sua história de vida. A maior oportunidade de aprendizagem no brincar
está em oferecer à criança algo da atividade lúdica dirigida a alguma outra
situação porque o brincar está constantemente gerando novas situações.

Ele faz a criança avançar na aprendizagem, especialmente nas atividades


livres em sua capacidade de exploração, de descobertas sobre situações,
pessoas, atitudes e respostas. O cenário desse contexto é o material, a
textura, as propriedades, as estruturas, os atributos visuais, os auditivos e
cenestésicos criando dimensões e possibilidades de explorações.

Para fazer a relação entre o brincar e o aprender, lembremos que exis-


tem várias teorias que tentam explicar o que é aprendizagem. Nessa
direção, a literatura indica as perspectivas cognitivas, comportamen-
tais, sociais/pessoais e humanísticas como teorias de aprendizagem
(MOYLES, 2002). Cada uma delas constrói o seu repertório teórico-me-
todológico do que é ensinar e aprender.

O Brincar e a Aprendizagem | Unidade 4 89


Apesar dessas opções é importante que se tenha a assertiva de que não exis-
te nenhum modelo de aprendizagem que seja eficiente em relação a todos
os indivíduos, como uma receita de bolo em que se seguir os ingredientes e o
modo de fazer, vai ser a garantia de que dará um resultado positivo.

Nesse contexto se insere o brincar como forma de aprendizagem. Segun-


do Hyland (1984), todos nós aprendemos o tempo todo. É o nosso estado
de “prontidão para o brincar” que determina isso. Por isso a aprendizagem
através do brincar é bastante favorável para a criança, considerando que ela
tem a motivação e satisfação nessa prontidão em que ela se joga mesmo
sem necessitar de uma grande variedade de brinquedos, espaço ou tempo.

Ao contrário, ela é capaz de manipular um brinquedo apenas dando-lhe


vários significados enquanto brinca e vai construindo aprendizagens
nessa atividade. Na escola, especialmente na sala de aula, ela sabe que
alguns comportamentos de brincar não podem ser inserido, como por
exemplo, gritar, explodir em gestos e atitudes que produzam muito ba-
rulho, como faria numa área externa como um parque infantil.

Para Claxton (1984, p. 216), “a aprendizagem é essencialmente um cresci-


mento, não uma acumulação, e deve sempre originar-se de e retornar àqui-
lo que é conhecido”. Moyles (2012) diz que no brincar da escola a criança se
insere num sistema de valores e ética em que suas necessidades básicas po-
dem ser satisfeitas e que se constituem em aprendizagem, tais como as de:

• praticar, escolher, preservar, imitar, imaginar, dominar, adquirir


competência e confiança;
• adquirir novos conhecimentos, habilidades, pensamentos e en-
tendimentos coerentes e lógicos;
• criar, observar, experimentar, movimentar-se, cooperar, sentir,
pensar, memorizar e lembrar;
• comunicar, questionar, interagir com os outros e ser parte de
uma experiência social mais ampla em que a flexibilidade, a to-
lerância e a auto disciplina são vitais;
• conhecer e valorizar a si mesmo e as próprias forças e entender
as limitações pessoais;
• ser ativo dentro de um ambiente seguro que encoraje e conso-
lide o desenvolvimento de normas e valores sociais.

90 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Como mediador da aprendizagem, o professor é um importante ele-
mento do processo de brincar na escola. A ele vai caber o papel de pro-
porcionar situações de brincar livre e dirigido para atender às necessi-
dades das crianças no contexto do currículo e, nesse sentido, ele pode
ser o iniciante do processo, observador e avaliador para manter o papel
vital do brincar no desenvolvimento delas. É importante que ele seja
motivado também e perceba que o brincar motiva a criança e é esse
elemento que lhe dá o seu valor educacional.

O brincar na escola é menos livre e está limitado pelo fator tempo. Nes-
sa realidade ele deve ensinar reforçando a capacidade cognitiva das
crianças, num brincar diferente do da casa dela. Ele precisa facilitar o
relacionamento entre crianças a fim de que elas adquiram o bem estar
físico e mental desejado. Para tal, é necessário que trabalhe dentro das
capacidades das crianças com um brinquedo cognitivo desafiador que
resultará em um maior potencial para futuras aprendizagens.

Nas crianças de quatro a oito anos de idade, podemos apontar no contex-


to escolar a ênfase que deve ser dada no brincar segundo Moyles (2012):

1. participação efetiva da criança em todas as experiências de aprendi-


zagem destinadas a encorajar o uso de todos os sentidos, incluindo
o movimento;
2. oportunidade de viver novas situações de aprendizagem e, mais im-
portante, de reestruturar o conhecimento existente e de transferir
habilidades e conhecimentos inerentes para novas situações e pro-
blemas, a fim de encontrar soluções;
3. oportunidade de descoberta e criatividade pessoal apoiadas pelos
adultos, levando a aprendizagem da independência do pensamen-
to e da ação;
4. interação com outras crianças e adultos, por meio da qual possa
aprender uma variedade de habilidades, princípios e valores sociais;
5. envolvimento em situações lúdicas significativas e construtivas, que
permitirão o desenvolvimento como sugerido no ítem, combinado
com experiências com uma grande variedade de materiais e recur-
sos, de aprendizagem; e
6. oportunidades de praticar e revisar habilidades em um ambiente
consistente e estável, e de aprender sem medo do fracasso.

Assim, percebe-se que são muitas as oportunidades de aprendizagens


na escola por meio do brincar. As escolas precisam estar atentas a essa

O Brincar e a Aprendizagem | Unidade 4 91


possibilidade e oferecer à criança o forte relacionamento entre o brincar
e a aprendizagem que ela pode construir.

O brincar é um campo fértil para as aprendizagens da criança.


Nessa atividade e espaço ele pode construir conhecimentos para
a vida toda. Para isso é necessário garantir no contexto escolar ou
fora dele, que a aprendizagem seja contínua e desenvolvimentista
em temas que incluem aspectos além dos intelectuais.

Nesse contexto, o emocional, o físico, o estético, o ético e o


moral precisam estar presentes como fatores interdependente
e inter-relacionado. Nesse cenário nascerá uma pessoa capaz de
se relacionar, conversar, dividir, cooperar, resolver problemas,
compartilhar, perder. Um adulto que se desenvolveu cognitivamente
e afetivamente a partir do brincar.

resumo

Nesta Unidade, estudamos que por meio dos brinquedos, das


brincadeiras e dos jogos há um diálogo entre a escola, a criança e o
mundo e que existem visões pedagógicas diferentes sobre a criança e o
brincar da atualidade em relação às sociedades antigas.

Vimos que o brinquedo é utilizado na escola a partir das ideias de Platão


e Aristóteles na região da Grécia, na época, palco de misturas étnicas
e culturais e que construíram concepções de criança e de brinquedos.
Encontramos na Antiguidade a primeira estratégia para a educação
infantil usavam doces em forma de brinquedos comestíveis no ensino
de Filosofia, Matemática, estudo de línguas e outros.

Discutimos que Platão elaborou documentos contendo os primeiros


apontamentos sobre a educação da criança, em 400 a.C. Sugeria
associar o estudo ao prazer, sendo este uma forma de brincar. Em “As

92 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


Leis”, destacou a importância de aprender brincando em oposição à
utilização da violência e da repressão.

Estudamos que Aristóteles trouxe um novo modo de pensar a criança e


os brinquedos estabelecendo princípios e lógica formal e material para as
operações do pensamento. Ele considerou tão importante o lúdico na vida
do ser humano que caracterizou este como um ser que tem três facetas:
Homo sapiens (o que conhece e aprende), Homo faber (o que faz, produz)
e Homo ludens (o que brinca o que cria). Ele analisou a brincadeiras como
descanso do espírito em Ética a Nicômaco e em Política.

Estudamos também, que na passagem do tempo surgiram visões peda-


gógicas diferentes do brincar, que há diferença entre a Antiguidade e o
Medievo no tratamento com a criança. Na Idade Medieval ela foi vista na
sociedade feudal, exercendo um papel produtivo, bastante identificado
como um adulto em miniatura e na sociedade burguesa, um ser que
precisava ser preparado para uma atuação futura.

Compreendemos que no século XVII ocorreram mudanças significativas


na forma de pensar a infância e a partir daí começaram a diferenciar o
mundo infantil do adulto, evidenciando peculiaridades e necessidades
comuns a infância. O interesse pelos jogos (na acepção de jogos infantil,
de brinquedos e brincadeiras) aparece nos escritos de Heráclito e Quin-
tiliano posteriormente.

Em nosso estudo sobre a inserção dos brinquedos, brincadeiras e jogos


na escola vimos que no século XVI, os humanistas começaram a perce-
ber o valor educativo dos jogos, e os colégios jesuítas foram os primei-
ros a recolocá-los em prática pelo reconhecimento de que são bons e
considerados como meio de educação. Os jesuítas editaram em latim as
regras para jogos de azar, danças, comédias, transformadas em práticas
educativas para aprendizagens da ortografia e gramática.

Estudamos que um grande momento para a história dos brinquedos


na educação foi o do Renascimento - movimento que marca o fim da
Idade Média e começo da Idade Moderna - pela percepção da infância
que lhe inspirou. A criança passou a ser vista como alguém que possui
valor positivo, natureza boa, refletindo essa visão mais poética que se
fixou nos olhos do Romantismo, fazendo uma ruptura com as ideias de
punição, castigo e rigorosa disciplina.

O Brincar e a Aprendizagem | Unidade 4 93


Vimos que, a brincadeira passou a ser um instrumento que favoreceria o
desenvolvimento da inteligência e ajudaria o professor no ensino, assim
como a criança no estudo. Foi assim que os brinquedos, as brincadeiras
e os jogos entraram em sala de aula, como possibilidades de ensino-
-aprendizagem. A partir dessas mudanças, entrou em cena Comenuis
que escreveu Escola da Infância, considerando a infância como um pe-
ríodo de desenvolvimento do homem. Recomendou o brinquedo e ex-
periências diretas com o objeto.

Estudamos ainda que, a Modernidade construiu de uma nova identida-


de filosófica, com rupturas consideráveis sobre a percepção da criança
e do Ensino Infantil, consequentemente do brinquedo, das brincadeiras
e dos jogos. Que nesse momento destacaram-se Rousseau, Pestalozzi,
Decroly, Froebel e Montessori, incluídos com muita força na história da
Educação Infantil.

Vimos que na modernidade existe o sentimento correspondente a duas


atitudes contraditórias, dos adultos em relação à criança e que influen-
cia o brincar na escola e uma que é definida como paparicação ao con-
siderar a criança ingênua, inocente e pura, e a outra de moralização ao
reconhecer a criança como um ser imperfeito e incompleto, necessitan-
do da intervenção para educá-la.

Destacamos que o desenvolvimento do brincar atual é distribuído como


brincar físico, intelectual, social e emocional, com o seguinte perfil: Com-
portamento desocupado; Brinquedo solidário; Comportamento do obser-
vador: Brinquedo paralelo; Brinquedo associativo e Brinquedo cooperativo
ou organizado.

Estudamos ainda que para fazer a relação entre o brincar e o aprender


existem as perspectivas cognitivas, comportamentais, sociais/pessoais e
humanísticas como teorias de aprendizagem. Cada uma delas constrói
o seu repertório teórico-metodológico do que é ensinar e aprender.

Observamos que o brincar na escola é menos livre e está limitado pelo


fator tempo e que podemos apontar no contexto escolar a ênfase que
deve ser dada no brincar: participação efetiva da criança em todas as
experiências de aprendizagem; Oportunidade de viver novas situações de
aprendizagem; Oportunidade de descoberta e criatividade pessoal apoia-
das pelos adultos; Interação com outras crianças e adultos; Envolvimento

94 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


em situações lúdicas significativas e construtivas. Todas essas atividades
combinadas com experiências com uma grande variedade de materiais
e recursos, de aprendizagem e oportunidades de praticar e revisar habi-
lidades em um ambiente consistente e estável, e de aprender sem medo
do fracasso.

O Brincar e a Aprendizagem | Unidade 4 95


ALMEIDA, Paulo Nunes de. educação lúdica: técnicas e jogos
pedagógicos. 10. ed. São Paulo: Loyola, 2000.

ARAUJO, Silvana M. de. a dimensão do lúdico no processo de formação


do educador. 1998. 125 f. Dissertação (Mestrado em Educação) -
Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 1998.

ARIÉS, P. História social da criança e da família. 2. ed. Rio de Janeiro :


Guanabara, 1986.

ELIAS, Marisa Del Cioppo. cèlestin freinet: uma pedagogia de atividade


e cooperação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.

KISHIMOTO, Tizuko Morchida (Org.). brincar e suas teorias. São Paulo:


Pioneira Thonson Learning, 2002.

_______. Jogos, brinquedos, brincadeiras e a educação. 4. ed. São


Paulo: Cortez, 2000.

MOYLES, Janet R. só brincar? Porto Alegre: Artmed, 2002.

OLIVEIRA, Vera Barros de. o brincar e a criança do nascimento aos seis


anos. Petrópolis, R.J: Vozes, 2000.

RIZZO, Leonor e Haydt, Regina Célia. atividades lúdicas na educação


da criança.6.ed.São Paulo: Ed. Ática,1998 ( Série Educação).

SNYDERS, G.A. a alegria na escola. São Paulo: Manolo, 1988.

SUCHODOLSKI, Bogdan. a pedagogia e as grandes correntes filosófi-


cas. 3. ed. Lisboa: Livros Horizonte, 1984.

WAJSKOP, Gisela. brincar na pré-escola. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1997.

96 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


ANEXO
ANEXO A

Psicologia da Aprendizagem se vale de teorias que procuram explicar,


através de diferentes enfoques, como os indivíduos aprendem, como
se expressa o desenvolvimento mental de uma pessoa e como se
estruturam os modelos institucionais.

É importante que o professor detenha o conhecimento sobre essas


abordagens teóricas para a melhoria da qualidade de ensino, bem como
sobre utilização de métodos, técnicas e recursos de instrução.

Behaviorismo

As teorias comportamentais entendem o aprendiz como um ser que


responde a estímulos do meio exterior, não levando em consideração o
que ocorre dentro de sua mente durante o processo. A aprendizagem é
interpretada somente como mudança de comportamento.

Skinner - seu representante atual - acha que a aprendizagem ocorre


devido ao reforço - é a contingência do reforço que leva à aprendizagem.

Gagné considera a aprendizagem como uma mudança interior e tenta


integrar os conceitos básicos das teorias cognitivas e comportamentais.

Cognitivismo

A linha cognitivista, como já foi detalhada no capítulo anterior, enfatiza


o processo da cognição, compreensão, transformação, armazenamento
e uso da informação. Ocupa-se dos processos mentais.

Humanismo

O enfoque humanista vê o aprendiz em sua totalidade. Nesta abordagem,


o importante é a auto-realização, o crescimento pessoal.

A aprendizagem significativa é auto-centrada e estimulada pelo


relacionamento entre aluno e o facilitador da aprendizagem.

Para Rogers, principal representante desta abordagem, as experiências


de vida, o clima psicológico da sala de aula, a integração professor
(facilcitador)-aluno são fatores importantes para a aprendizagem.

ANEXO 99
Rogers enfatiza os aspectos dinâmicos e ativos do ensino do ensino que
reforçam o processo de interação na aprendizagem e considera o aluno
capaz de auto-direção, desde que em ambiente propício e interessante.

Abaixo serão apresentados os resumos das teorias de aprendizagem


apresentadas no texto:

Condicionamento Operante (Skinner)

A teoria de Skinner apóia-se na ideia de que o aprendizado tem a


função de mudança no comportamento manifesto. O condicionamento
operante é baseado na lei do efeito, segundo a qual o comportamento
que produz bons efeitos tende a se tornar mais freqüente, enquanto
que o comportamento que produz maus efeitos tende a se tornar
menos frequente. As mudanças no comportamento são o resultado de
uma resposta individual a estímulos que ocorrem no meio e portanto
reforçar tais estímulos significa fortalecer o comportamento.

Os reforçadores são designados como positivos e negativos. Os positivos


dependem dos chamados estímulos reforçadores e os negativos ocorrem
com o término de um estímulo aversivo. Um reforçador é um elogio
verbal, uma boa nota, ou um sentimento de realização ou satisfação
crescente. Um reforçador negativo é qualquer estímulo que resulta no
aumento da frequência de uma resposta, quando ele é retirado. Note-se
que um reforçador negativo é diferente de um estímulo desfavorável.
A punição é diferente do reforço negativo. Em termos conceituais, a
punição se refere a aplicação de um desprazer após um determinado
comportamento não pretendido por aquele que a aplica, enquanto
que o reforço negativo caracteriza-se pela retirada do desprazer após
a ocorrência de um comportamento pretendido por aquele que o
promove.

Condições de Aprendizado (R. Gagné)

Esta teoria convenciona que existem diferentes tipos ou níveis de


aprendizado. A importância destas classificações é que cada tipo requer
diferentes tipos de instrução. Gagné identifica cinco categorias de
aprendizado: informação verbal, habilidades intelectuais, estratégias
cognitivas, habilidades motoras e atitudes. Condições internas e externas
diferentes são necessárias para cada tipo de aprendizado. Por exemplo:

100 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


para que estratégias cognitivas sejam aprendidas é preciso que exista
uma chance para se praticar o desenvolvimento de novas soluções para
os problemas. Para aprender atitudes, a pessoa precisa ser exposta a um
modelo verossímil de papel, ou a argumentos persuasivos.

Gagné sugere que tarefas de aprendizado para habilidades intelectuais


podem ser organizadas em hierarquia, de acordo com a complexidade:
reconhecimento de estímulo, geração de resposta, seguir procedimentos,
uso da terminologia, discriminações, formação de conceito, aplicação
de regras e resolução de problemas. A hierarquia é importante para
identificar os pré-requisitos que devem ser completados para facilitar
o aprendizado em cada um dos níveis. As hierarquias de aprendizado
fornecem uma base para a sequência de instrução.

A teoria esboça nove eventos de instrução e processos cognitivos


correspondentes:

1. obter atenção (recepção);

2. informar o objetivo para os aprendizes (expectativa);

3. estimular a lembrança do aprendizado anterior (recuperação);

4. apresentar o estímulo (percepção seletiva);

5. fornecer orientação de aprendizado (código semântico);

6. obter desempenho (resposta);

7. fornecer feedback (reforço);

8. avaliar o desempenho (recuperação);

9. aumentar a retenção e a transferência (generalização).

Estes eventos devem satisfazer ou fornecer as condições necessárias


para o aprendizado e servir como base para criar a instrução e selecionar
os meios apropriados (Gagne, Briggs & Wager, 1992).

Embora a estrutura teórica de Gagne cubra todos os aspectos do


aprendizado, o foco da teoria está nas habilidades intelectuais. A teoria
foi aplicada para criar instruções em todos os domínios (Gagner &
Driscoll, 1988).

ANEXO 101
Aprendizado Experimental (C. Rogers)

Roger classifica o aprendizado da seguinte forma:

Cognitivo - É sem sentido para o aprendiz. Ele apenas é obrigado a


aprender alguma coisa pois faz parte do currículo, mas não consegue
enxergar nenhuma utilidade prática.Ex: Crianças decorando tabuada ou
aprendendo a calcular MMC e MDC.

Experimental - tem um sentido bem definido. O estudante aprende com


o objetivo de executar uma tarefa específica, o conhecimento pode ser
diretamente aplicado. Ex: consertar um carro.

Segundo Roger, deve-se buscar sempre o aprendizado experimental,


pois as pessoas aprendem melhor aquilo que é necessário. O interesse e
a motivação são essenciais para o aprendizado bem sucedido e eles se
apresentam mais claramente quando o aluno consegue visualizar uma
aplicação prática do que está sendo aprendido.

O aprendizado experimental tem o desenvolvimento pessoal do


aprendiz, fazendo parte assim de uma abordagem humanista. Segundo
Azevedo, as ideias de Rogers também estão ligadas à questão da
fenomenologia, que considera a percepção peculiar de cada indivíduo
e à educação democrática, que aceita a pluralidade de ideias. Essa teoria
enfatiza também a importância do aspecto interacional do aprendizado
(relações interpessoais e intergrupais). O professor e o aluno aparecem
como os co-responsáveis pela aprendizagem.

Se a importância maior deve ser dada ao desenvolvimento pessoal e


interno do aprendiz, não deve haver avaliação uma avaliação externa. A
autoavaliação é incentivada, com a participação do professor/facilitador,
já que ele é o co-responsável pela aprendizagem.

"Rogers acha que todos os seres humanos têm uma propensão natural
para aprender. O papel do professor é facilitar tal aprendizado. Isto inclui:
(1) proporcionar um clima positivo para o aprendizado, (2) esclarecer os
propósitos do aprendiz(es), (3) organizar e tornar disponíveis os recursos
de aprendizado, (4) balancear os componentes intelectual e emocional
do aprendizado e (5) compartilhar sentimentos e pensamentos com os
aprendizes, mas não dominando. O aprendizado é facilitado quando: (1)

102 ESPECIALIZAÇÃO EM PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO


o aluno participa completamente do processo de aprendizado e tem
controle sobre sua natureza e direção, (2) é primariamente baseado na
confrontação direta com problemas práticos, sociais, pessoais ou de
pesquisa e (3) autoavaliação é o principal método de avaliar o progresso
ou o sucesso." (PLANETA EDUCAÇÃO)

ANEXO 103

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