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Alberto Caeiro

O guardador de rebanhos

O poema, constituído por três estrofes (duas sextilhas e um dístico) de versos brancos e
métrica irregular, apresenta-nos um sujeito poético que se assume, metaforicamente, como
um pastor, remetendo assim para o início do poema I, no qual se lhe comparava. A primeira
estrofe inicia-se com uma metáfora (“Sou um guardador de rebanhos”) que institui o sujeito
poético como um ser natural e que anula a oposição entre o pensar e o sentir, através da
identificação entre pensamentos e sensações, característica do sensacionismo de Alberto
Caeiro: o conhecimento da realidade adquire-se pela sua apropriação direta mediante os cinco
sentidos humanos, isto é, ele relaciona-se com a realidade, seja ela flor, fruto, ou um dia de
calor, através dos sentidos. E isso basta-lhe, pois é essa relação que lhe traz a verdade desse
real. Por outro lado, ao afirmar a sensação como fonte única do conhecimento do real, o
sujeito poético nega o pensamento, submetendo-o à sensação. Deste modo, ele consegue unir
o pensar ao sentir: “Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la / E comer um fruto é saber-lhe o
sentido.” (vv. 7-8).A enumeração dos órgãos associados aos sentidos nos versos 4 a 6 (olhos,
ouvidos, mãos, pés, nariz e boca) reforça a importância do sentir afirmada no verso 3 e
hierarquiza as sensações de acordo com o grau de conhecimento que permitem apreender: as
sensações visuais são a primeira fonte de saber, seguindo-se as auditivas, as táteis, as olfativas
e, por fim, as gustativa.Os versos 7 e 8 exemplificam a identificação entre pensar e sentir,
primeiro através de uma definição, depois metaforicamente (“E comer um fruto é saber-lhe o
sentido.” – v. 8), procedendo à objetivação do pensamento, isto é, conferindo-lhe um estatuto
concreto, de objeto. A estrofe final, começa por afirmar a sua tristeza, que advém do excesso
(“Me sinto triste de gozá-lo tanto” – v. 10), daí que seja natural e não perturbe o
conhecimento da realidade nem a felicidade. O sujeito poético aceita, então, essa tristeza
porque ela provém de um excesso natural de felicidade. Porém, a tristeza evolui para
felicidade (v. 14) no momento em que o sujeito poético substitui a perceção mental do prazer
(“gozá-lo”, v. 10) pela ligação direta com a realidade (“Sinto todo o meu corpo deitado na
realidade”, v. 13).

Quando vier a Primavera

“Quando vier a Primavera,/Se eu já estiver morto,/As flores florirão da mesma maneira/E sãs
arvores não serão menos verdes que na primavera passada/A realidade não precisa mais de
mim.” E na segunda: ”Sinto uma alegria enorme/Ao pensar que a minha morte não tem
importância nenhuma”. Essas duas estrofes fazem introdução ao poema e à uma temática ao
qual Caeiro gostava muito que era a sua posição face a natureza. Sua maior ambição era deixar
de pensar, acreditava demasiadamente na necessidade de simplificar a vida. Ao descrever a
chegada da primavera e imaginar-se morto, o eu-lirico transmite uma sensação de
naturalidade, pois a natureza não pensa e todos os seus processos são conjuntos e não
individuais. Na natureza a ausência de um ser não para a evolução dos demais, então o eu-
lirico pensa que se a natureza ignora sua morte é porque ela o aceita como seu constituinte.Na
terceira estrofe temos como característica principal nestas estrofes a aceitação do destino,
que é um outro ponto fundamental na visão do mundo de Alberto Caeiro. Na sua visão do
mundo o homem não luta contra o destino, antes, o aceita sem discussão, na sua
inevitabilidade. Não aceitar o destino seria pensar na vida e não aceitá-la tal como ela é. Este
objetivismo absoluto de Caeiro é por vezes difícil de compreender, mas é, também,
imensamente simples.

O meu olhar é nítido como a primavera

Este poema é a materialização do sensacionalismo. Nele, o sujeito poético expõe a sua


tese sobre como ser feliz, como obter conhecimento e sobre o amor.
Assim, o poema começa com uma comparação “O meu olhar é nítido como um
girassol”, pois o girassol, para além de ser um elemento da natureza (e o “eu”
comparando-se com ele, aproxima-se da sua realidade, afirmando que também ele faz
parte da natureza), é um se irracional que, mesmo sem pensar, consegue seguir o sol.
Depois, num tom coloquial, muito próximo da prosa e da oralidade, enaltece a sua visão e
a importância que esta tem para a compreensão do mundo, usando palavras do campo
lexical da mesma, como “olhando”, “vejo” e “visto”. De seguida, propõe-nos uma
permanente atitude de ingenuidade face à natureza “Sei ter o pasmo comigo/Quem tem
uma criança se, ao nascer/ Reparasse que nascera deveras…”. Na 2ª estrofe expõe-nos a
sua teoria sobre o que é pensar “… pensar é não compreender…” e demonstra que recusa
o pensamento para viver em comunhão com a natureza. Considera que a única forma de
de conhecer o mundo é através dos sentidos e que não existe um sentido oculto nas
coisas, devemos apenas sentir o que nos rodeia e assimilá-lo, sem refletir: “O mundo não
se fez para pensarmos nele/…/Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo”. Por fim,
apresenta-nos a sua definição de amor que pressupõe ingenuidade.
Em suma, o “eu” privilegia os sentidos (sobretudo o olhar) em detrimento do
pensamento para melhor viver em paz com a natureza e consigo.

Mestre, são plácidas

O sujeito poético, através de uma apóstrofe, dirige-se ao seu Mestre (Alberto Caeiro), ao qual
apresenta o resultado de uma reflexão que levou a uma aprendizagem, isto é, ao qual dá conta
do que aprendeu. Assim sendo, Alberto Caeiro será o destinatário do discurso do sujeito
poético, sendo o propósito desse discurso explicar como se deve viver.O sujeito poético terá
descoberto a solução para os problemas que atormentam ambos: o tempo que vai passando
até à morte (“Todas as horas que nós perdemos”) será vivido de forma plácida, calma, não
angustiada se (oração subordinada adverbial condicional) vivermos a vida de forma moderada,
se a encararmos de forma leve. A comparação dos versos 5 e 6 sugere exatamente essa defesa
do prazer moderado, de viver a passagem do tempo de forma não angustiada: as flores postas
numa jarra simbolizam a beleza da Natureza, beleza essa, no entanto, que é efémera, pois irá
murchar (ou seja, morrer). Assim, as flores remetem para a efemeridade da vida, a qual torna
inútil qualquer ação. Por outro lado, as jarras são recipientes que podem ser preenchidos ou
não; neste poema, configuram uma metáfora para as horas. Na segunda sextilha, o sujeito
poético defende que devemos manter uma atitude de indiferença perante as paixões e os
sentimentos intensos. Pelo contrário, sustenta a abdicação e o manter-se afastado das
perturbações do quotidiano. De seguida, defende a sabedoria do sábio incauto,
despreocupado, ou seja, que não devemos viver a vida. Note-se como valoriza, neste passo, o
ato de pensar e o saber. A forma verbal «decorrê-la» (v. 13) significa deixar que a vida passe,
não a vivendo intensamente, com preocupações e ilusões e sem estar consciente de que a
morte é uma realidade certa. Em suma, na segunda e terceira sextilhas, o sujeito poético
sugere que a melhor forma de evitar o sofrimento e as preocupações da vida passa por abdicar
de uma existência intensa e optar por uma atitude imperturbável face às adversidades.Na
quarta estrofe, evocando o bucolismo da Natureza, sugere que nos devemos deixar levar pela
vida, que deve ser vivida de forma despreocupada, sem esforço ou agitação, «Conforme calha»
(v. 21), usufruindo dela enquanto dura, fruindo de forma tranquila o presente (vv. 22-23) e
agindo de modo a que se prolongue.

Vem sentar-te comigo, Lidia

No poema " Vem sentar-se comigo LÍdia" podemos identificar caracteristicas epicuristas, as
quais defendem a busca de paz de espírito ou tranquilidade, alcança o prazer através de uma
vida moderada, livre de medo e dor. O sujeito poético convida a amada ao desejo epicurista de
viver o momento presente, a breve existência da vida, na certeza de que a vida é passageira e
que temos pouco tempo para viver. Com isso, convida-a a enlaçar as mãos nessa caminhada
sem volta que os leva a um lugar mais distante do que dos deuses, uma vez que a mortee
chegará a todos.Por a vida ser passageira é necessário buscar a felicidade. De mãos enlaçadas
ou não o que importa é buscar a felicidade evitando os desassossegos,todo e qualquer excesso
como amores, ódios, paixões, pois o que importa é a serenidade, o prazer com
medida.Percebemos a recusa de envolver-se do eu lírico como na terceira estrofe: "
Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos", ele começa a sentir alguma
coisa pela sua musa e nega assim esse prazer. Ao decorrer do poema, identificamos outro
princípio do epicurismo que é viver moderadamente. é como a quinta estrofe: "Amemo-nos
tranquilamente, pensando que podíamos, Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro Ouvindo correr o rio e vendo-o".O
autor inicia a sexta estrofe com " Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as No colo, e que seu
perfume suavize o momento", o que podemos identificar como característica do Carpe Diem,
ou seja, aproveite o momento; E para fugir da dor e do sofrimento, dá continuidade a estrofe
evitando pensar: " Este momento em que sossegadamente não cremos em naa, Pagãos
inocentes da decadência."

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