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Kazimir Malevich: Quadrado negro sobre fundo branco, uma das obras paradigmáticas da
escola abstrata
Em que pese a grande influência do esteticismo, cujo corolário apareceria no início do século
XX na forma do abstracionismo, uma apoteose do individualismo artístico,[17] houve correntes
que o combateram. Hippolyte Taine elaborou uma teoria de que a arte tem um
fundamento sociológico, aplicando-lhe umdeterminismo baseado na raça, no contexto social e
na época. Reivindicou para a estética um caráter científico, com pressupostos racionais e
empíricos. Jean Marie Guyau apresentou uma perspectiva evolucionista, afirmando que a arte
está na vida e evolui com ela, e assim como a vida se organiza em sociedades, a arte deve ser
um reflexo da sociedade que a produz.[18] A estética sociológica teve associações com os
movimentos políticos de esquerda, especialmente o socialismo utópico, defendendo para a
arte o retorno a uma função social, contribuindo para o desenvolvimento das sociedades e da
fraternidade humana, como se percebe nos trabalhos de Henri de Saint-Simon, Lev
Tolstoi e Pierre Joseph Proudhon, entre outros. John Ruskin e William Morris denunciaram a
banalização da arte causada pelo esteticismo e pela sociedade industrial, e defenderam a volta
ao sistema corporativo e artesanal medieval.[19][20]
Na mesma época a arte começou a ser estudada sob o ponto de
vista psicológico e semiótico através da contribuição de Sigmund Freud. Ele declarou que a
arte poderia ser uma forma de representação de desejos e de sublimação de pulsões
irracionais reprimidas. Disse que o artista era um narcisista, e que as obras de arte podiam ser
analisadas da mesma forma que os sonhos, os símbolos e as doenças mentais. Continuou
nessa linha seu discípulo Carl Jung, que introduziu o conceito de arquétipo na análise artística.
[21]
Outra novidade foi introduzida por Wilhelm Dilthey, considerando arte e vida serem uma
unidade. Prefigurando aarte contemporânea, reconheceu a importância da reação do público
na definição do que é um objeto artístico, o que instaurava uma espécie de anarquia do gosto,
inaugurando a estética cultural. Reconheceu também que a época assinalava uma mudança
social e uma nova interpretação da realidade. Ao artista caberia intensificar nossa visão de
mundo em uma obra coerente e significativa. [22]
Na primeira metade do século XX conceitos inovadores foram introduzidos pela Escola de
Frankfurt, destacando-se Walter Benjamin e Theodor Adorno, estudando os efeitos
da industrialização, da tecnologia e da cultura de massa sobre a arte. Benjamin analisou a
perda da aura do objeto artístico na sociedade contemporânea, e Adorno refletiu que a arte
não é um reflexo mecânico da sociedade que a produz, pois a arte expressa o que não existe e
indica a possibilidade de transformação e transcendência. Representante
do pragmatismo, John Dewey definiu a arte como "a culminação da natureza", defendendo
que a base da estética é a experiência sensorial. A atividade artística seria uma consequência
da atividade natural do ser humano, cuja forma organizativa depende dos condicionamentos
ambientais em que se desenvolve. Assim, arte seria o mesmo que "expressão", onde fins e
meios se fundem em una experiência agradável. Já Ortega y Gasset apontou o caráter elitista e
a desumanização da arte de vanguarda, devido ao seu hermetismo, ao repúdio da imitação da
natureza e à perda da perspectiva histórica. Na escola semiótica, Luigi Pareyson elaborou uma
estética hermenêutica, onde arte é a interpretação da verdade. Para ele, a arte é "formativa",
ou seja, expressa uma forma de fazer que ao mesmo tempo inventa sua própria linguagem e
seus meios. Assim a arte não seria o resultado de um projeto predeterminado, mas
simplesmente encontraria o resultado no processo de fazer. Pareyson influenciou a
chamada Escola de Turim, que desenvolveu o conceito ontológico de arte. Umberto Eco, seu
maior expoente, afirmou que a obra de arte só existe em sua interpretação, na abertura de
múltiplos significados que pode ter para o espectador. [23]
Vênus de Willendorf
Um shedu assírio
Dama de Elche ibérica
Arte clássica (1000 a.C.-300 d.C.)[editar | editar código-fonte]
Ver artigo principal: Arte da Grécia Antiga, Arte da Roma Antiga, Arte etrusca
A arte da Grécia Antiga marcou a evolução da arte ocidental. Depois de um começo em que
salientaram as civilizações Minoica e Micênica, a arte grega se desenvolveu em três períodos:
arcaico, clássico e helenístico. Na arquitetura se destacaram os templos, com suas três ordens:
dórica, jônica e coríntia. Na escultura dominou a representação do corpo humano, atingindo
uma síntese entre naturalismo e idealismo no período clássico, com destaque para a produção
de Míron, Fídias, Policleto e Praxíteles. Com claros precedentes na arte etrusca e na arte grega,
a arte romana alcançou quase todos os cantos da Europa, Norte de África e do Oriente Médio,
estabelecendo as bases da arte ocidental. Grandes engenheiros e construtores, se destacaram
na arquitetura civil desenvolvendo o arco e a cúpula, com a construção de estradas, pontes,
aquedutos e obras urbanas, bem como os templos, palácios, teatros, anfiteatros, circos,
banhos, arcos triunfais, etc. A escultura, inspirada na grega, é também centrada na figura
humana, mas de forma mais realista. A pintura e o mosaico são conhecidos pelos vestígios
encontrados em Pompeia e alguns outros lugares.[29]
O Panteão romano
A respiração do deserto, 1997, land art de Danae Stratou, Alexandra Stratou e Stella
Constantinides
Há muito o que celebrar com este livro publicado recentemente por Cristina
Meneguello, fruto de sua tese de doutoramento. A autora debruça-se sobre um tema
pouco tratado em nosso meio: as manifestações artísticas do século XIX, centrando-se
em facetas das manifestações medievalistas na Inglaterra. Elabora uma revisão crítica
da historiografia sobre o tema, em especial a inglesa, esmiúça fontes documentais do
mais alto interesse, explora de maneira exaustiva artigos de periódicos da época e tece
uma série de considerações que nos auxiliam a ter uma visão mais abrangente da real
complexidade da produção daquele período, inclusive no que respeita à preservação
do patrimônio cultural.
O século XIX foi um século pleno de contradições, privilégio que não pertence apenas
àquela época; as contradições dos oitocentos, porém, foram com freqüência mal
compreendidas, encaradas como “defeitos” ou “desvios” e, raramente, como um
processo variado e fértil. A autora explora de maneira exemplar esse período fecundo
em idéias conflitantes, com inúmeros resultados de interesse, apesar da enorme
disparidade das manifestações. Para abordar esse complexo universo, Meneguello fez
um recorte claro nas intenções e preciso na abordagem e na estruturação. Trata da
temática em três capítulos bastante densos. No primeiro, a cidade de Manchester é
eleita como personagem privilegiada na narrativa: extrapolando seu papel de
paradigma dos problemas das cidades industriais do século XIX, trata de sua apreensão
através de variados olhares, escolhendo o Town Hall como exemplo do maior
interesse: “A cidade Manchester surge aqui como o local onde as forças da busca pelo
passado e da invenção da própria história atuam. Trata-se de um convite a um olhar
descongestionado: do conhecido paradigma da cidade industrial, salta a cidade
medievalizada” (p. 20). No segundo capítulo, a autora volta-se ao neogótico,
explorando sua apreensão e as variadas formas do medievalismo no período, as forças
díspares que moviam a discussão, a fortuna crítica dessas manifestações, tanto através
das querelas da época (a “batalha dos estilos”) quanto de seu acolhimento pela
historiografia através do tempo. O terceiro capítulo é dedicado às questões ligadas ao
patrimônio arquitetônico e urbano, e às forças em ação na tentativa de preservar as
marcas do passado: “a maneira como tais forças velozes moveram-se rumo ao passado
a ser encontrado no futuro, de um lado determinado o nascimento da questão do
patrimônio urbano e edificado e da necessidade latente de preservar os traços da
cidade que desaparecem ou são irremediavelmente alterados; de outro, buscando a
comunidade utópica, solução para os males da cidade industrial” (p. 20). Em todos os
capítulos são evidenciadas as várias formas de relação com o passado, e o modo como
isso é apreendido (e construído) pela própria escrita da história.
A narrativa é iniciada a partir de um caso particular, a sede da prefeitura de
Manchester − o Town Hall −, para levantar uma série de questões e conflitos latentes
relacionados à obra, que darão bases para depois alargar seu olhar sobre a cidade. O
edifício, de 1875, um enorme complexo neogótico de oito mil metros quadrados, foi
projetado pelo arquiteto Alfred Waterhouse, tornando-se, já naquela época, exemplo
de grande importância. A autora explora de variados modos o edifício, as vicissitudes
do concurso que a ele deu origem e outras polêmicas relacionadas, como o uso de
linguagem medievalizante e sua pertinência, ou não, ao presente e a escolha dos
temas para os murais de ornamentação do interior, em que um tópico ausente (algo já
ressentido por algumas vozes do período) é a própria época e a industrialização. O
intuito é explorar as várias interpretações do passado relacionadas a essas disputas,
em especial “a posse de um passado real (entendido como provado pela história) e do
passado imaginado (na busca de dar a Manchester um pertencimento à história
oficial)” (p. 38), evidenciando os processos de construção, e, mesmo, de “invenção” do
passado, de modo a legitimar o presente.
Partindo desses olhares diversificados sobre o edifício, a autora expande o discurso
para as diversas miradas sobre a cidade (e como o edifício com ela se relacionava), em
especial a social, que explora a Manchester paradigma da cidade da Revolução
Industrial. Inicia pelos contemporâneos, e o papel fundador desempenhado por Engels
ao tratar das mazelas da industrialização e das condições de trabalho, dando via à
crítica da cidade industrial e do espaço urbano, e suas relações com a realidade social.
Partindo da crítica social, emergem vários temas como a contraposição entre
Manchester e Londres, a complementaridade, ou oposição, entre cidade e natureza, e
a apreensão da cidade pelos literatos, romancistas, urbanistas, viajantes etc.
Manchester é apresentada como um paradigma não apenas da cidade industrial, mas
também do modo de narrar a si mesma, a partir das tentativas de construção de um
passado por meio de diversos discursos – de historiadores, antiquários, memorialistas,
“arqueólogos de fim-de-semana” –, muitos deles buscando superar certo sentimento
de inferioridade de uma cidade que fora esquecida pelos textos oficiais até o século
XVI. As gamas eram variadas: desde as que apelam para a recriação de um passado
mítico, centrado nas raízes romanas da cidade e que se opunham à imagem da
Manchester industrial, até aquelas que buscavam a redenção pela celebração da
própria industrialização. Vários desses aspectos emergem na Exposição do Jubileu Real
em Manchester, de 1887, em que os cinqüenta anos de reinado de Vitória é o mote
para celebrar a arte e a indústria da cidade, não sem ironias, pois a autora mostra que
a proposta, que incluía uma reconstrução, na verdade uma reinvenção poética, da
antiga Manchester, “buscava criar um cenário convincente, mas para um passado
imaginado” (p. 79). Meneguello devota também especial interesse às ruínas – que
aparecem de variados modos em todo o seu texto: como modo de conhecer o
passado, de relembrar a finitude da própria vida a, até mesmo, como exercício de
imaginar as construções do presente em ruínas, procurando prever as mensagens que
seriam deixadas ao futuro –, tecendo relações entre passado, memória e identidade.
O segundo capítulo volta-se a tema de grande complexidade: as interpretações dadas
à revivescência de expressões medievais, que foram múltiplas e muito debatidas,
analisando desde proposições do próprio século XIX até interpretações de uma
historiografia mais recente. A autora discorre sobre as tentativas de caracterizar essas
expressões ora como revivalismo (gothic revival), ora como reinterpretação de
linguagem que permaneceu presente ao longo dos séculos (survival e não revival), ou,
ainda, como postura conciliatória (tradição gótica continuada) entre todas elas. Mais
do que arrolar e analisar os elementos formais que caracterizam esses movimentos,
Meneguello propõe-se a enfrentar essa difícil questão apontando os modos como
foram entendidos pelos contemporâneos e depois tratados pela historiografia ao
longo do tempo. Evidencia o fato de essas manifestações – que deram origem a
ardorosos debates e a muitas obras – que estiveram no centro de muitas discussões
nos oitocentos, serem depois desconsideradas, principalmente por uma historiografia
calcada nos princípios do modernismo, que via as manifestações baseadas em
reinterpretações de historicismo como movimentos (e momentos) empobrecidos, que
produziram edifícios sem valor. Só mais recentemente passaram a receber uma
abordagem cultural mais ampla, que perscruta as implicações políticas e estéticas,
redimensionando historicamente o neogótico como algo muito mais complexo do que
mero efeito do romantismo (pp. 96-113).
Ao examinar a historiografia relacionada a essa temática, a autora aborda também
uma série de outras questões como as diferenças entre “revival” e “historicismo”,
manifestações goticizantes do século XVIII e o neogótico do XIX, ligações entre
medievalismo, revivalismo gótico, religião, a literatura e as artes em geral – com
especial interesse pela arquitetura a pintura dos pré-rafaelitas –, e um renascer da
“ciência histórica” no próprio período. Assim, oferece várias visões das ligações com o
passado medieval e “torna-se evidente que não existe uma causa única para a relação
estabelecida com o passado medieval; por vezes, a adoção de seus temas e motivos
coexistia com um discurso contrário aos vestígios do feudalismo; para muitos
arquitetos, encapsular edifícios dentro de um esquema medieval mascarava obras que,
de fato, eram o resultado da produção em massa e da tecnologia moderna” (p. 130).
Os temas que se seguem e os argumentos que levanta através de fontes primárias,
explorando de maneira exemplar uma fonte até agora pouco aproveitada – os textos
da revista The Builder – são do mais alto interesse. A começar pela chamada “batalha
dos estilos” contrapondo partidários do classicismo, na Inglaterra especialmente o de
raiz grega, e o gótico. Batalha que partindo de mera oposição, desdobra-se depois num
debate mais ponderado – em que se evidenciam os méritos de uma ou outra forma de
expressão para buscar uma medida para seu o uso – e num questionamento sobre a
incapacidade de se criar algo novo e, ainda, numa crítica à inexistência de um estilo
que fosse próprio à época; busca de linguagem própria que foi um verdadeiro
tormento para muitos arquitetos do período. Ao examinar esses debates, os motivos e
argumentos que os moviam – analisando de modo mais aprofundado os “revivals” –, a
autora distancia-se das abordagens que viam essas manifestações como imitativas e
sem originalidade, oferecendo subsídios importantes para a apreensão das
complexidades do período. O item que segue aborda outro tema fundamental: a
valorização do passado medieval através do ornamento, da variedade – associada à
apreciação do trabalho do homem, do artífice – dando voz a três eminentes autores:
Augustus W. N. Pugin, John Ruskin e William Morris. A releitura do mediavalismo – de
seus valores e de sua expressividade formal – é tratada como elemento-chave para
compreender a imaginação da época (p. 169) e para mostrar a importância crescente
dada às próprias construções medievais, em especial as ruínas, e as relações desse
processo com o surgimento da noção moderna de preservação, tema explorado no
terceiro e último capítulo.
Em contraposição à cidade de Manchester percebida como caótica e portadora das
mazelas do processo de industrialização do primeiro capítulo, a autora inicia o terceiro
capítulo tratando das utopias no campo literário, no pensamento político e social e sua
repercussão na concepção de comunidades ideais e de propostas higienistas do século
XIX. Aborda sucessivamente as “cidades de industriais” (ou “cidades de companhia”,
as industrial villages), a sua contrapartida anti-industrial – as fazendas cartistas – e, a
seguir, as cidades-jardim, já no século XX. Explora nesses exemplos os renovados
modos de distribuição espacial, de relação com o território, as novas formas de
sociabilidade e os aspectos que denunciam uma leitura crítica àquele presente feitas
no próprio período. O texto é construído de modo a concatenar as relações entre
neogótico, medievalismo, ruína, comunidades ideais para depois atrelar a essa
discussão a preservação do patrimônio. De início, a autora critica a visão redutora de
grande parte da historiografia, que examina as questões de preservação no período de
maneira simplificadora e dual, acentuando a contraposição entre Viollet-le-Duc e
Ruskin, entre a teoria intervencionista e a antiintervencionista, entre o racional e o
emocional, entre França e Inglaterra, entre o modelo estatal de proteção dos
monumentos francês e o modelo inglês calcado na sociedade civil organizada.
Meneguello, matiza vários temas: as variadíssimas tendências existentes em ambos os
ambientes culturais; o papel do Estado na Preservação na Inglaterra (discorre sobre a
consolidação do sistema legal de proteção na Inglaterra no final do capítulo); a ação
dos próprios protagonistas. Explora não apenas os pontos que diferenciam Ruskin e
Viollet-le-Duc, ou os pontos de aproximação já consolidados pela historiografia
(contemporaneidade, apreciadores da natureza, envolvimento com o debate
arquitetônico, conhecimento da arquitetura), mas ressalta outros laços que os
assemelham, construindo o discurso através das formas de apreciação do gótico por
ambos, além de explorar suas respectivas complexidades e contradições.
Outro ponto sobre o qual insiste, e sobre o qual se deve insistir, é contradizer a visão
simplista de considerar Ruskin e Morris como fatalistas, avessos a qualquer
intervenção: ao contrário, preconizavam manutenção constante para prolongar, o
quanto possível, a vida das obras. Contrapunham-se, porém, às restaurações como
praticadas no período, que descaracterizavam os edifícios ao extremo. Para termos
uma idéia da dimensão do problema, invocamos aqui os dados apresentados por
Stephan Tschudi-Madsen (Restoration and Anti-restoration, 1976, p. 25) que informa
que entre 1840 e 1873 foram restauradas 7144 igrejas na Inglaterra, algo que
correspondia a cerca de metade das igrejas medievais do país. Com efeito,
o revival gótico despertou o interesse pela arquitetura medieval; as tentativas de levar
seus exemplares a um “novo esplendor”, como se aventava na época, acabou por
engendrar a deturpação de muitos deles, através das obras de arquitetos como James
Wyatt ou George Gilber Scott, que foram alvo da contraposição de autores como
Pugin, Ruskin e Morris e depois da atuação de sociedades de preservação, como
a Society for the Protection of Ancient Buildings (SPAB), formada em 1877 com a
condução de Morris e o National Trust. A autora conclui o capítulo apresentando outro
tema essencial: o problema das “desrestaurações” executadas no último quartel do
século XX que, ao suprimir restauros do século XIX, acabaram por destruir elementos
importantíssimos para a compreensão do pensar e fazer arquitetura daquele período.
Ironicamente, essas ações perpetradas no final do século passado, muito se
assemelham às intervenções feitas no século XIX na busca da unidade de estilo (e de
formas idealizadas), tão veementemente criticadas pelos principais interlocutores de
Meneguello naquele século e por numerosos autores ao longo de todo o século XX,
dando origem ao pensamento contemporâneo sobre a restauração, que, em teoria,
preconiza o respeito por todas as estratificações da obra (inclusive os restauros feitos
no passado); na prática, a dificuldade em fazer isso é enorme.
Além das numerosas temáticas que surgem no texto, o livro coloca-se como crítica e
contrapartida à historiografia que se consolidou no século XX que, ao lançar seu olhar
sobre o século precedente, não conseguiu ler as experiências de reinterpretação do
passado como buscas qualificadas; ao contrário, essas revivescências foram tidas como
desvios de conduta. Aquilo que em larga medida ocorreu e que muitas vezes ainda
ocorre é buscar, no século XIX, apenas os elementos de matriz racionalista que
prenunciam correntes modernistas do século XX, sem explorar as manifestações
daquele século no contexto em que foram produzidas e em toda a sua complexidade.
O livro de Meneguello lança renovadas luzes sobre o problema ao abraçar as
contradições da época e evidenciar o papel dessas variadas manifestações naquilo que
significaram para o período, os múltiplos modos como o passado foi interpretado na
construção daquele presente, as variadas crises e críticas, as grandes utopias, os
elementos propositivos e de animação de um vivo debate cultural, que afloram por
todo o livro e que, se devidamente perscrutados, oferecem muitas lições para os dias
de hoje.
sobre o autor
Beatriz Mugayar Kühl é arquiteta formada pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade de São Paulo (1988), com especialização e mestrado em preservação
de bens culturais pela Katholieke Universiteit Leuven (1989-1992), Bélgica, doutorado
pela FAUUSP (1996) e pós-doutorado pela Università degli Studi di Roma "La Sapienza"
(2001-2005). É professora do Departamento de História da Arquitetura e Estética do
Projeto da FAUUSP