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Hierarquia Administrativa e Substituição Hierárquica, Paulo Otero

Poderes do superior:

A) Poder de direção

Este poder traduz-se na faculdade de o superior hierárquico emanar comandos


vinculativos a todos os órgãos subordinados. Estes comandos podem ser especializados
para uma situação concreta e individualizadora (ordens) ou podem gozar de
aplicabilidade generalizada e abstrata para situações futuras (instruções).

A direção também tem uma função de interpretação da lei, ou seja, ao abrigo de


tais poderes o superior indica o sentido a atribuir a determinados preceitos legais; assim
sendo a interpretação do superior prevalece vinculativamente sobre os subalternos,
ainda que a interpretação perfilhada não seja a mais correta face à norma.

Os comandos hierárquicos além de originarem a imposição de comportamentos,


encontram-se assistidos de dupla proteção sancionatória a nível disciplinar e criminal.
Os comandos hierárquicos têm natureza jurídica apenas interna, não produzindo
quaisquer efeitos jurídicos alheios à administração.

B) Poderes de Controlo
1. Poder de inspeção

Este poder confere ao superior hierárquico a faculdade conjunta de:

 Fiscalizar o cumprimento da legalidade em geral, a conveniência e oportunidade


da atividade desenvolvida pelos subalternos;
 Verificar a obediência e o cumprimento perfeito dos comandos hierárquicos por
parte dos serviços e órgãos dependentes;
 Conhecer na globalidade os factos respeitantes ao funcionamento dos serviços
colocados sob a sua direção e o comportamento dos seus subordinados.
2. Poder de supervisão

Consiste na faculdade de o superior hierárquico revogar, modificar ou suspender


os atos praticados pelos subalternos.

3. Poder disciplinar
Este funciona como garantia especial do cumprimento do dever de obediência
dos subalternos ao comando do superior.

C) Poderes dispositivos de competência


1. Poder de resolução de conflitos de competência;
2. Poder de delegação;
3. Poder de substituição primária.

Em relação ao problema da obediência do subalterno a ordens, por parte do


superior hierárquico, que sejam ilegais temos 3 correntes:

 Corrente hierárquica;
 Corrente legalista;
 Correntes ecléticas

Excluindo a lei a existência do dever de obediência em certos casos, ela confere


ao subalterno a faculdade de avaliar a legalidade de todo e qualquer comando
hierárquico de um órgão superior. No sistema português são necessários 3 requisitos
para que haja dever de obediência:

 Requisito subjetivo: ser aquele que dá a ordem o superior hierárquico


habilitado por lei.
 Requisito objetivo: a matéria de que é alvo a ordem ou a instrução tem
que ser matéria de serviço do subalterno.
 Requisito formal: há que cumprir a forma necessária para que o ato de
direção seja válido.

Mas, retirando isso, caso sejam cumpridos os requisitos e o conteúdo do ato ,que
é alvo de ordem ou instrução, for contrário à lei, existirá aí um dever de obediência? A
CRP aponta que cessa o dever de obediência quando o cumprimento da ordem ou
instrução resulte num crime (art.º 271/3). PO julga que se exclui do crime de
desobediência (388º do CP) o incumprimento de ordens ilegais.

3 importantes corolários a retirar do art.º 271º/3:


 O dever de obediência não é absoluto, cessa perante situações de
ilegalidade criminal do comando hierárquico, a qual se consubstancia
num ato nulo
 Ao cessar o dever de obediência a comandos cujo cumprimento se traduz
em crime, a lei confere ao subalterno competência para examinar a
legalidade do comando, avaliar os meios e as consequências do
cumprimento do mesmo, impondo-lhe o dever de desobediência caso
verifique o caráter criminoso de qualquer um dos elementos analisados;
 A circunstância de uma norma excluir expressamente a obediência a um
único caso de ilegalidade, permite concluir o caráter excecional da norma
e aferir o respetivo princípio geral subjacente: a ilegalidade do comando
hierárquico não exclui o dever de obediência, salvo em casos
excecionais.

PO acha que não se aplicam apenas aos atos criminosos estes corolários e,
consequentemente, a cessação do dever de desobediência. Segundo o Ilustre professor
cessa o dever legal de obediência quando:

a) O conteúdo do comando seja alheio ao poder administrativo (usurpação


de poderes), ou se traduza na violação de regras de repartição de
atribuições (incompetência absoluta);
b) Sempre que o objeto ou o conteúdo do comando seja impossível (física
ou juridicamente), indeterminável, seja contrário à ordem pública ou se
mostre ofensivo dos bons costumes;
c) Se a execução do comando determina a violação ostensiva e dificilmente
reparável do núcleo essencial de direitos, liberdades ou garantias
fundamentais;
d) Quando o comando hierárquico carece de uma vontade juridicamente
válida, ou aquela se traduz numa declaração não séria,
e) Se o cumprimento do comando origina muito provavelmente e com
evidência, qualquer outro caso de nulidade, salvo tratando-se de
inconstitucionalidade, ou existir uma situação excecional de estado de
necessidade administrativa.

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