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Evolução da legislação brasileira no uso de animais

A sociedade contemporânea ocidental tem demonstrado uma


característica antropocêntrica em relação à natureza. Objetivando o
desenvolvimento, o homem agride e destrói o meio ambiente. O
desenvolvimento ecologicamente adequado se faz com preservação,
proteção, respeito à natureza e convívio harmônico, e como não ocorre
espontânea ou voluntariamente, torna-se necessária a criação de leis
específicas para regrar a conduta humana, especialmente na busca de
resguardar o “direito do animal”.

A filósofa Cristina Beckert afirmou que a expressão “direito do animal”


torna-se geradora de equívocos, pois abarca muitas vertentes – direitos
morais, legais e éticos – para todos os seres sencientes, ou seja, seres com
sentimentos (dor, prazer, etc.).

No tocante à ética animal, podemos tecer dois panoramas:

Animal Welfare – bem-estar do animal.

Animal Rights – direito do animal.

Em algumas circunstâncias, afasta-se os limites da moralidade com a


justificativa do desenvolvimento e bem-estar humano, sejam eles alimentar,
entretenimento, experimento, etc. Dessa forma, a natureza tem sido submetida
a agressões e os animais utilizados em experimentos laboratoriais.

Nesta seara, ainda que de forma preliminar, buscaremos traçar um


paralelo dos avanços do direito dos animais abordando a legislação brasileiras
e seus desafios e os avanços alcançados em outros países.

Debates filosóficos e científicos.

Pitágoras afirmava que “os animais dividem conosco o privilégio de


terem uma alma”. Tal crença foi amplamente difundida e abrange a
possibilidade de a alma humana encarnar em animais ou vegetais. Aristóteles
escreveu no século IV a.C. argumentando que os animais estavam distantes
dos humanos na Grande Corrente do Ser ou escala natural. Alegando
irracionalidade, concluía-se que os animais não teriam interesse próprio,
existindo apenas para benefício dos seres humanos.[6]

Em contrapartida, o filósofo René Descartes defendia que os animais


não têm alma, logo, não sentem dor, de modo que os maus-tratos poderiam
ser tolerados. Voltaire, filósofo contemporâneo, critica tais ideias de Descartes.

Em relação à ética direcionada à experimentação animal, os estudos


iniciaram de forma mais efetiva com os pesquisados Max Russell e Rex Burch
em 1959, com a publicação do livro The principles of humane experimental
technique. Tal livro contém alguns conceitos como distresse e bem-estar
animal, uma abordagem mais humanitária dos animais, sobretudo a influência
nos resultados, qualidade das pesquisas e testes biomédicos. O tratamento
humanitário dos animais não deve ser obstáculo e sim pré-requisito para
alcançar bons resultados científicos. Também foi proposto balancear o
distresse infligido aos animais com os objetivos do experimento. Inicialmente,
essa proposta teve pouca aceitação científica, mas com o passar dos anos ela
tem sido aceita com mais facilidade (RUSSELL & BURCH, 1959).

Com o objetivo de reduzir ou remover o distresse dos animais, os


pesquisadores Russell e Burch estabeleceram o princípio dos três Rs:
Substituição (Remplacement), Redução (Reduction) e Refinamento (Refine)
(RUSSELL & BURCH, 1959). Tais princípios constituíram a base de novos
manuais e legislações destinadas à criação e utilização dos animais nas
instituições de ensino e pesquisa. Logo, essas instituições precisam se
adequar à nova legislação para que as pesquisas científicas possam ser
realizadas e os resultados divulgados.

Muitas vezes, os limites e técnicas de manipulação desses animais


sencientes em experimento científico são violados, mesmo em nossos dias, e
não raras vezes chegam tais questões ao judiciário brasileiro.

Regramentos Internos
A Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu artigo 225, preceitua
que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações”. Mais ainda, especifica em seu item VII,
“proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem
em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou
submetam os animais à crueldade”. Portanto, cabe ao Poder Público o dever
de defender e à coletividade a obrigação de preservar.

A Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, em seu artigo 32, prevê como


crime “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres,
domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou


cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando
existirem recursos alternativos.

§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do


animal.”

O texto expresso neste artigo coibiu o uso indiscriminado de animais em


métodos cruéis quando houver métodos alternativos. Mas o legislador, no § 1º,
abre exceção ao pesquisador, dando margem ao uso de animais em
experiências cruéis mediante justificativa de ausência de métodos
alternativos para obtenção de seus resultados.

Devido à necessidade de uma lei que estabelecesse parâmetros mais


específicos e regrasse a atividade de experimentação animal, em 8 de outubro
de 2008 foi promulgada a Lei 11.794, também conhecida como Lei Arouca. Ela
regulamenta o artigo 225, §1º, subseção VII da Constituição Federal Brasileira.
Essa Lei cria o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal –
CONCEA; estabelece procedimentos para a criação e o uso de animais do filo
Chordata, subfilo Vertebrata em atividade de ensino e pesquisa; organiza o
Sistema Nacional de Experimentação Animal; e revoga a Lei n 6.638 de 8 de
maio de 1979.
A partir da Lei 11.794/08, as atividades educacionais com a utilização
de animais fica restrita a estabelecimentos de ensino superior e
estabelecimentos de educação profissional técnica de nível médio da área
biomédica.

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