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A biblioteca pública como um empório de ideias: evidências do seu lugar na


sociedade contemporânea

Article  in  Informação & Sociedade: Estudos · March 2019


DOI: 10.22478/ufpb.1981-0695.2017v12n2.37152

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A BIBLIOTECA PÚBLICA COMO UM

artigo de revisão
EMPÓRIO DE IDEIAS:
evidências do seu lugar na
sociedade contemporânea

Bruna Lessa*
Henriette Ferreira Gomes**

RESUMO Estudo crítico da literatura da área da Biblioteconomia. Ciência


da Informação e Sociologia para reflexão do papel social da
biblioteca pública na contemporaneidade, com o objetivo
de identificar e analisar sua função de mediadora cultural e
da informação. Ao refletir sobre a mediação cultural, suas
implicações sociais e conceituais, situa a biblioteca pública como
espaço social dessa ação ao realizar a mediação da informação.
Discutindo as possibilidades de atuação da biblioteca pública,
aponta seu potencial transformador ao representar um espaço
de encontro e de diálogo em meio a diversidade cultural e de
dispositivos tecnológicos, que diversificam o modo de produção
e circulação dos bens culturais, passando a se caracterizar
como uma espécie de “empório de ideias”, que também deve * Mestre em Ciência da Informação
pela Universidade Federal da Bahia,
permitir o conforto da permanência do usuário. Conclui que Brasil. Professora Assistente do
a biblioteca pública na atualidade é convidada a repensar sua Instituto de Ciência da Informação
da Universidade Federal da Bahia, Brasil. 
atuação enquanto espaço de mediação da informação que tanto E-mail: lessbruna@gmail.com.
preserva a memória social quanto oferece as condições para a
criatividade e produção cultural, assegurando que o respeito à ** Doutora em Educação pela
Universidade Federal da Bahia,
diferença seja o motor do protagonismo social e do respeito e Brasil. Professora Titular do Instituto de
exercício da cidadania. Ciência da Informação da Universidade
Federal da Bahia, Brasil. Docente
permanente do Programa de Pós-
Palavras-chave: Biblioteca pública - Mediação da informação. Biblioteca pública Graduação em Ciência da Informação
da Universidade Federal da Bahia, Brasil. 
– Mediação cultural. Biblioteca pública – Função social. E-mail: henriettefgomes@gmail.com.

1 INTRODUÇÃO da cultura e a transformação do usuário em


sujeito social ativo.

E
studo crítico a partir da prospecção das Tendo a biblioteca pública como foco
reflexões compartilhadas na literatura central da análise, o texto parte das reflexões
da área da Biblioteconomia. Ciência da acerca da mediação cultural, suas implicações
Informação e Sociologia, que permitiu identificar sociais e conceituais, situando a biblioteca
e analisar a mediação sociocultural como pública como espaço social também envolvido
uma ação inerente à biblioteca pública que na nessa ação, já que esta deve realizar a mediação
contemporaneidade, mais do que um lugar de da informação. Mas ao discutir as inúmeras
guarda de coleções de livros, deve se caracterizar possibilidades de atuação da biblioteca pública,
como mediadora da informação e espaço também se analisa seu potencial transformador
social de inúmeras possibilidades ao usuário, quando esta se coloca como espaço do encontro
favorecendo, mais do que o consumo da cultura, e do diálogo, oferecendo o acesso à diversidade
a apropriação cultural que sustenta a produção de bens culturais, serviços e produtos de

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Bruna Lessa e Henriette Ferreira Gomes

informação, que reflitam a diversidade cultural e existe, é possível construir novos conceitos,
que oferte o acesso, o encontro, o diálogo, tanto novas afirmações, novas atitudes. A mediação
no espaço virtual quanto no seu espaço físico, não é passiva, ela provoca, porque interfere.
proporcionando o conforto que gera no usuário Contudo, não se pode dizer que sua interferência
o sentimento de pertença, potencializador da sua seja impositiva, manipuladora e intencional, a
condição de protagonista social. mediação deve provocar, sobretudo, a reflexão
Na síntese integradora do estudo conclui- sobre as diferenças, questionar o falso e o
se que a contemporaneidade convida ao repensar verdadeiro, aquilo que é, e o que poderá ser.
das condições efetivas da biblioteca pública Perrotti e Pierruccini (2008), por exemplo,
enquanto espaço de mediação da informação, ao justificarem o caráter cultural da mediação,
de mediação cultural, de preservação da dizem que esta é articulada ao processo
memória social, de criação e produção de semiótico por meio do qual se produz sentidos,
cultura e encontro e diálogo com o Outro, cujas envolvendo linguagens e discursos. No âmbito
particularidades e perspectivas são singulares, social, a função da mediação consiste em
permitindo que a diferença seja o motor da organizar e estruturar as relações no ambiente.
criatividade, do respeito e exercício da cidadania, Os dispositivos de comunicação – a escrita, a fala,
e a construção do espaço de ação a partir do qual as imagens, as obras de arte, entre outros – unem
se ergue o protagonismo social. aqueles que, de igual modo, podem decodificá-
los, da mesma maneira que aproxima e motiva
o Outro pela curiosidade em contemplar as
2 MEDIAÇÃO SOCIOCULTURAL diferenças.
Os contextos culturais e sociais podem
A mediação está intrinsecamente interferir no processo de comunicação, quando
relacionada à interação entre sujeitos. Em observados apenas como variáveis no processo
virtude de sua dimensão coletiva, considera- de mediação, pois tanto favorecem aqueles em
se que as atitudes realizadas por um sujeito que esses contextos representem similaridade,
motivarão outros a se colocarem em prontidão quanto impedir que haja compreensão de um
para a ação, construindo a possibilidade determinado assunto por um grupo que não
de interlocução para a construção de ações está inserido num determinado ambiente social.
coletivas, o que, de certa forma, caracterizarão Entretanto, essas reflexões só começam a ter valor
um grupo ou uma comunidade. Desse modo, a ao se reconhecer a existência do Outro e quando
mediação se apresenta como uma ação voltada há quem o possa compreender.
para a promoção e integração da sociedade, Signates (1998), preocupado com os
intervindo nos contextos socioculturais como estudos sobre o conceito de mediação, apoia-
um processo comunicacional de transformação e se nos estudos culturais de Williams, Martín-
reorganização das relações sociais. Barbero e Orozco Gómez para refletir sobre o
A mediação está relacionada às consenso de um conceito. Em seu texto, esse
interlocuções que acontecem entre sujeitos que autor faz um esboço histórico do tema, passando
possuem laços sociais dentro de uma comunidade pela noção de reflexo e intermediação baseadas
e a partir dessas relações constroem maneiras numa abordagem hegemônica Williams, a
incomuns de viver. Isto se harmoniza com o fato relação com cultura e suas formas de apropriação
de que o desenvolvimento das relações humanas Martín-Barbero, até chegar ao conceito de
inclui o processo de dependência interacional mediações múltiplas e as fontes de mediação
entre indivíduos de um mesmo grupo para Orozco Gómez.
que possam sobreviver em comunhão. Tem-se Na área da comunicação, Martín-Barbero
aqui a interlocução e a interação como fatores (1997) em “Dos meios às mediações”, aponta
essenciais para se viver em grupo, criando-se para os aspectos socioculturais utilizando a
uma identificação social, uma lógica de pertença. mediação como dispositivo de transformação
As diferenças sociais, educacionais ou cultural. Martín-Barbero (1997, p. 262, destaque
até econômicas, ao contrário do que se possa do autor) defende que “O campo daquilo que
pensar, ao invés de excluir podem aproximar. denominamos mediações é constituído pelos
Por meio da consciência de que a alteridade dispositivos através dos quais a hegemonia

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A biblioteca pública como um empório de ideias

transforma por dentro o sentido do trabalho e da nos o simulacro da “conversão cultural”


vida da comunidade.” traduzida pela necessidade de exploração de
Por esse aspecto, verifica-se que a um território economicamente vantajoso. No
mediação sociocultural ocorre a partir das processo exploratório, há um jogo de poder
interações entre os sujeitos e a construção e quando dominado e dominador encontram um
reconstrução de suas identidades. ponto de intercessão em prol da negociação de
conflitos cotidianos. Por este aspecto, a cultura
A mediação é a institucionalização de se aproxima da ação, e o sujeito que a promove
um sistema de regras que mobilizam
assume protagonismo em determinado contexto.
a mudança de comportamento e que
visam a reduzir a desarmonia entre Para Martín-Barbero (1995 apud ESCOSTEGUY,
visões de mundo e a promover um 2010, p. 106),
diálogo entre elas. O exercício da
mediação apresenta instrumentos de A hegemonia nos permite pensar a
aplicação e formas de objetivação muito dominação como um processo entre
diversas. Essas múltiplas formas de sujeitos onde o dominador intenta não
mediação permitem a interligação de esmagar, mas seduzir o dominado,
mundos diferenciados e pressupõem e o dominado entra no jogo porque
a ruptura com o modo de pensar e se parte dos seus próprios interesses está
comportar tanto de mediadores quanto dita pelo discurso do dominador. E,
de mediados. (DEPONTI; ALMEIDA, segundo elemento que nos traz Gramsci
2008, p. 2). com o conceito de hegemonia, é que
essa dominação tem que ser refeita
Assim, a relação entre a mediação e a continuamente, tanto pelo lado do
cultura está na constituição social do “saber dominador como pelo do dominado.
humano”, subsidiado pelas experiências do
cotidiano. Diante disso, importante salientar que Nesta perspectiva, as diversidades
durante algum tempo, a cultura foi entendida culturais são necessárias para se manter o
como um dispositivo hegemônico que assegurava equilíbrio social. Por meio de tais diferenças, é
as divisões entre classes sociais, definindo possível a aproximação entre os sujeitos sociais,
hierarquias dentro da própria sociedade. De ainda que ocupem condições sociais distintas de
forma conservadora, definia o belo e o feio, o dominador ou dominado. Até mesmo para que
bom e o ruim, o vulgar e o elegante, o erudito a hegemonia de um grupo sobre outro ocorra,
e o iletrado. Neste contexto, segundo Bauman aproximações e mediações são realizadas para
(2013, p. 12), a cultura “[...] seria uma agente de que uma cultura se sobreponha a outra. E tais
mudança de status quo [...] um instrumento de aproximações e mediações são constantes porque
navegação para orientar a evolução social rumo a a luta pela hegemonia sempre é restabelecida no
uma condição humana universal.” curso das complexidades da vida em sociedade.
Tal orientação, que emergiu do Iluminismo E, nessa “luta” permanente os povos vão
com o objetivo de tornar a sociedade mais estabelecendo suas identidades culturais.
igualitária, foi extremamente sectária ao procurar A cultura, portanto, é a base para a
redefinir costumes e adaptá-los a um padrão construção da história de um povo - elemento
planejado por uma minoria. Esta reflexão, fez essencial para o progresso social. Por este
com que a cultura adquirisse a característica de aspecto, compreende-se que para a constituição
“[...] ferramenta básica para a construção de uma da identidade de um povo seja necessário um
nação, de um Estado e de um Estado-nação [...]” elemento comunicacional para a organização
(BAUMAN, 2013, p. 13). e intermediação das relações sociais. Nesse
A partir desta concepção de cultura, sentido, a unidade linguística torna possível as
foram surgindo as missões colonizadoras a interações, as interpretações e as negociações
fim de “resgatar” povos desconhecidos da entre os sujeitos sociais. Assim, tem-se a língua
“aculturação”. A história da colonização do como a manifestação de uma cultura, sendo esta
Brasil, por exemplo, quando narra a chegada relação indissociável e diacrônica, já que ambas
dos portugueses às terras brasileiras e o encontro servem de suporte uma da outra.
com a população ameríndia, com costumes Partindo desta lógica, a linguagem dá con-
totalmente contrários aos dos europeus, mostra- dições à apropriação da cultura como uma ferra-

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Bruna Lessa e Henriette Ferreira Gomes

menta para a criação de práticas socioculturais. gerados pelo ser humano ao longo das gerações,
Nesse sentido, o “apropriar-se” da cultura oportu- de modo a preservar a identidade cultural dos
niza a ressignificação da categoria de dominação, grupos sociais. Por este aspecto, para que haja
pois quando a cultura passa a receber significado e transmissão cultural deve haver primeiro, um
é construída por todos, torna-se agente de liberta- relacionamento entre indivíduos.
ção, uma vez que impulsiona o sujeito a ser parti- Adotando a perspectiva dos produtos da
cipativo, criando seus próprios modos de vida. cultura, Canclini (2011) direciona-nos para os
Tal participação, alimentada pelos desdobramentos de outros conceitos que surgem
conhecimentos de cada sujeito, é representada a partir do conceito de cultura como: consumo
conforme contextos culturais distintos, e a cultural, economia da cultura, indústria cultural,
cultura, alimentada por vários sujeitos, torna-se cultura associada ao desenvolvimento social,
produto de um conhecimento compartilhado, entre outros. Obviamente que, seguindo uma
passando a ser autônoma. perspectiva econômica, o consumo cultural
A cultura, então, de ferramenta estaria ligado a um valor estipulado, ao preço
hegemônica, assume a função de mediadora na disponível para determinado bem.
sociedade, visto que “[...] é capaz de se concentrar A questão do acesso à cultura pressupõe a
em atender às necessidades dos indivíduos, disponibilização de um espaço social para que se
resolver problemas e conflitos individuais com consuma cultura. Tais espaços podem ser desde
os desafios e problemas da vida das pessoas.” teatros, cinemas, bibliotecas, até mesmo meios de
(BAUMAN, 2013, p. 17). comunicação de massa, como a televisão, o rádio
Seguindo esta lógica, da dimensão e a internet. Contudo, mais que proporcionar
sociocultural da mediação, Oliveira e Galego acesso à cultura e promover eventos
(2005) destacam a mediação intercultural, a socioculturais, permanecem as relações entre
mediação comunitária e a mediação social. as pessoas e as redes sociais que se constroem à
Para as autoras, a mediação intercultural, medida que se oportuniza a participação social.
partindo da concepção pedagógica de Philippe De acordo com Escosteguy (2010), os
Pierre e Nicolas Delange, permite interpretar o estudos culturais, que tiveram início nos anos
Outro segundo suas diferenças. Já a mediação 1960, em Birminghan, na Inglaterra, surgem
comunitária se preocupa em potencializar a a partir do Centre for Contemporary Cultural
participação de uma comunidade na resolução Studies (CCCS), com a perspectiva de observar
de problemas, de maneira que desenvolva o relacionamento entre cultura, sociedade, e as
autonomia e responsabilidade. E a mediação possíveis transformações sociais provenientes
social está voltada à reconstrução de laços sociais desta relação. Nesse sentido, para a autora, o
para que a socialização seja mantida. sujeito não é apenas um receptor de mensagens,
A mediação sociocultural, integrada às ele é um agente de reprodução social dos
mediações apresentadas no parágrafo acima, produtos culturais que consome, ou seja, ele
pode ser concebida como a ação promotora do assume o espaço de sua atuação.
reestabelecimento das relações humanas a partir da Segundo Almeida (2007, p. 5), a grande
participação e da valorização do diálogo, respeitando contribuição desses estudos “[...] foi a análise
a heterogeneidade cultural entre os sujeitos. crítica das indústrias culturais e dos aparelhos
Desse modo, a ação humana supõe tal ideológicos de Estado [...]”, que possibilitaram
mediação, uma vez que acontece a partir das refletir sobre o papel e a influência destes
interações históricas, sociais e culturais. Sob dispositivos no desenvolvimento da cultura
este ponto de vista, a mediação sociocultural popular e de grupos minoritários.
assume um sentido antropológico, pois liga a Sob esta ótica, a recepção que os
experiência humana aos produtos da cultura, sujeitos têm das manifestações culturais e
que pode ser real e/ou simbólico. Para que haja das experiências sociais, caracteriza-se como
a representação de tais produtos, seja real ou aquilo que consomem e que, ao mesmo tempo,
simbólico, torna-se necessário o reconhecimento produzem. O acesso à cultura pela sociedade
e a ocupação dos sujeitos no espaço social. potencializa a construção de dispositivos
Nesse sentido, é indispensável refletir sobre a culturais que promovam atividades e ações
transmissão das culturas e dos conhecimentos voltadas à produção cultural. Entre esses

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A biblioteca pública como um empório de ideias

dispositivos também se situam aqueles que conhecimento, representam ações que podem
permitem o acesso à informação e que, portanto, contribuir para a formação de protagonistas
também estão articulados à mediação cultural. sociais que desempenhem uma participação ativa
Por esse aspecto, os ­­ dispositivos culturais, por na sociedade, que passarão a atuar para uma
vezes inseridos em contextos culturais híbridos, afirmação social coletiva.
têm a função de disponibilizar ações e atividades Nesse contexto, pode-se entender a
culturais para a produção e circulação de mediação como uma ação que também promove
informação, utilizando da mediação cultural para a cidadania, uma atitude que está relacionada
promover o acesso à cultura. à responsabilidade social, em que o todo
Coelho (1997, p. 248), define mediação se constitui à medida em que as partes são
cultural como: construídas. Compreender a mediação como um
ato de cidadania pode representar uma estratégia
Processos de diferente natureza cuja promissora para reorganizar a sociedade e
meta é promover a aproximação entre
potencializar a inclusão social, atuando também
indivíduos ou coletividades e obras de
cultura e arte. Essa aproximação é feita para o estabelecimento de políticas públicas que
com o objetivo de facilitar a compreensão atendam, por exemplo, a população mais carente,
da obra, seu conhecimento sensível e disponibilizando-lhe o acesso à educação e à
intelectual – com o que se desenvolvem saúde, direitos básicos e essenciais para qualquer
apreciadores ou espectadores, na busca
cidadão, mas também o acesso à informação que
de formação de públicos para a cultura ou
de iniciar esses indivíduos e coletividades permite ao cidadão conhecer para agir. Assim,
na prática efetiva de uma determinada ambientes informacionais como a biblioteca
atividade cultural. [...] Os diferentes pública se caracterizam, por natureza, como
níveis em que essas atividades podem ambientes de mediação.
ser desenvolvidas caracterizam modos
diversos da mediação cultural, como a
ação cultural, a animação cultural e a 3 A BIBLIOTECA PÚBLICA: LUGAR
fabricação cultural. Diz-se ainda que os
meios de comunicação, sendo por um DE INÚMERAS POSSIBILIDADES
lado eles mesmos produtos culturais
acabados que se apresentam como fins
Pensar a biblioteca pública como um
em si, operam uma mediação entre os
diversos segmentos e modos culturais da espaço de encontro e diálogo, pressupõe
sociedade. pensar a biblioteca pública como um espaço
de participação e também de convívio. Tal
Por este aspecto, dispositivos culturais, concepção pode ser melhor compreendida ao
tais como bibliotecas, arquivos, museus, e observarmos o conceito de espaço, visto por
teatros podem ser analisados como espaços Krampen (1979, p. 25 apud SANTOS, M., 2006,
de comunicação e canais de transmissão p.63) “[...] um palco onde os humanos entram em
cultural, servindo como agentes de mediação relação com outros homens e com objetos.”
sociocultural. Na contemporaneidade, a biblioteca
Tais instituições representam espaços onde se pública que ainda atua em uma concepção
desenvolvem a autoconstrução da identidade social, tradicional tem uma série de questões a enfrentar
pois têm atuado na sociedade com este propósito: e limites a superar. Galvão (2014, p. 224) aponta
mediar a cultura e oportunizar mudanças sociais. algumas questões:
Isto se dá em virtude das interações entre os sujeitos
que delas participam, a forma como entendem o Como expandir as bibliotecas até
os lugares mais remotos? Como
mundo e suas regras e práticas. compreender a sua ausência em
A mediação sociocultural é uma estratégia lugares tão óbvios, como instituições
que pode potencializar a construção de públicas de educação infantil (PEREIRA,
caminhos que alcancem condições de extrema 2011)? Como torná-la atraente a um
transformação, que na maioria das vezes parecem público cada vez mais amplo e com
interesses tão diversos? Como dissociá-
inalcançáveis frente às barreiras econômicas, la da imagem do medo, do silêncio e do
sociais, culturais. Informar, comunicar, sagrado? Como associá-la a um lugar de
transmitir e colaborar para que se construa prazer? Como acolher os neo-leitores,

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crianças e adultos que, em um país de públicas fossem criadas a fim de adaptar as


universalização tardia da escolarização, bibliotecas a novos recursos e muni-las de
como o Brasil, começam, nesse início do computadores e acesso à internet. Isto pode ser
século XXI, a procurar livros, livrarias e
bibliotecas? Como fazer compreender melhor comprovado ao identificarmos que, por
que sempre haverá ameaças aparentes exemplo, no Brasil, há 127 milhões de pessoas
à biblioteca? Como se desvencilhar de com acesso à internet, sendo que 72,4 milhões
uma concepção iluminista de leitura, utilizam a internet por meio de um smartphone,
que atribui ao livro o poder de mudar segundo pesquisa da Nielsen IBOPE no segundo
as mentes? Como, então, libertar-se
da ideia de que o neo-leitor é incapaz trimestre de 2015. (BRASILEIROS, 2016). A
de construir sua própria trajetória de Secretaria de Comunicação Social da Presidência
leitor e insistir em prescrever-lhe o da República realizou a Pesquisa brasileira de
que deve e o que não deve ser lido? mídia 2015, a qual apontou que
Como incorporar a discussão da ideia,
na formação de professores e de [...] 76% das pessoas acessam a internet
bibliotecários, de que as boas e as más todos os dias, com uma exposição média
leituras são uma construção histórico- diária de 4h59 de 2ª a 6ª-feira e de 4h24
social e que os cânones literários não são nos finais de semana. Eles estão em
absolutos nem universais? busca, principalmente, de informações
(67%) – sejam elas notícias sobre temas
A problemática explicitada pela autora diversos ou informações de um modo
se relaciona a quatro problemas recorrentes na geral –, de diversão e entretenimento
(67%), de uma forma de passar o tempo
história dessa biblioteca: o seu público, o acesso livre (38%) e de estudo e aprendizagem
a essa biblioteca, a composição de seus acervos, (24%). (BRASIL, 2014, p. 49).
as práticas de leitura, o papel do bibliotecário
como mediador responsável por essa instituição Tais dados revelam que, atualmente, a
e, ainda, acrescenta-se aqui a falta de edifícios reconfiguração da biblioteca pública não está
modernos e confortáveis. apenas na oferta de acesso público à internet e
Sabe-se que a falta de recursos ou, computadores. Obviamente que, dentro desse
simplesmente, a prioridade na distribuição destes percentual há também aqueles que não utilizam
para a biblioteca é um dos principais motivos da a internet e suas ferramentas por falta de habili-
ausência de reformas e reestruturação de seus dade ou mesmo pelos custos que envolvem o uso
espaços. Contudo, a partir da revisão de literatura das novas mídias. Nesse caso, a biblioteca pú-
sobre a situação da biblioteca pública no Brasil blica assume o papel mediador, a ação de inter-
e no Mundo, identifica-se que a ressignificação ferência, colocando o conhecimento diretamente
do seu conceito e de sua função na sociedade nas mãos dos analfabetos digitais, iletrados e dos
está além dos seus serviços, mas na projeção do menos favorecidos socioeconomicamente. Atrela-
seu ambiente físico com um lugar de opinião da a esta função educadora, a biblioteca disponi-
pública, de cultura, de encontro, aberto, acessível, biliza seus serviços de maneira inovadora - enco-
atrativo e confortável. Um espaço híbrido na raja seus leitores a explorarem seus espaços para
disponibilização de seus principais serviços e fazerem leituras diferentes daquelas que se ini-
ações, um espaço de todos e para todos, que é ciam nos livros, estimula-os a ler e interagir com
envolvido constantemente com a comunidade. o mundo. As bibliotecas existem porque existem
Talvez pensar a biblioteca pública com pessoas, e não somente porque existem livros.
estas características possa dissociá-la da função Apesar dos relacionamentos sociais estarem cada
que majoritariamente a sociedade entende como vez mais baseados no virtual, a valorização do
sua, que é de guardiã de livros. Embora, esta contato físico, a interação face-a-face, pode ser
também seja uma de suas funções, a biblioteca uma importante estratégia para reavivar a apro-
deve ser compreendida como um espaço ximação entre as bibliotecas públicas e sua comu-
universalmente acessível, onde os cidadãos são nidade.
livres para se reunir e confraternizar sem se A reflexão sobre o espaço e lugar da
sentirem, apenas, como leitores. biblioteca pública na vida cotidiana da sociedade
O uso de tecnologias para buscar, produzir tem gerado algumas discussões na literatura
e armazenar informações fez com que políticas recente da área da Biblioteconomia e CI. Crippa

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A biblioteca pública como um empório de ideias

(2015) discute sobre o espaço físico da biblioteca a) postura de acolhimento – espaço educati-
pública como um lugar de participação social vo e cultural que acolhe e reconhece as di-
capaz de transformar a sociedade; Frota (2014) ferenças e singularidades da comunidade;
trata da biblioteca pública como espaço de b) atitude de projeção – projeta a comunidade
formação da opinião pública; Gomes (2014a) rumo ao conhecimento;
aborda sobre a biblioteca pública como um c) fomentar a cooperação – local de fomento
espaço social de cultura; Machado, Elias Junior e a parcerias, trocas e ações cooperativas;
Achilles (2014) trazem a biblioteca pública como d) proporcionar e desenvolver sinergia –
uma instituição social no espaço público; Rasteli espaço de articulação de saberes;
e Cavalcante (2013) abordam sobre a biblioteca e) assumir comportamento pró-ativo quanto
pública como um lugar de mediação da leitura; ao desenvolvimento e implantação
Medeiros (2010) analisa a biblioteca pública como de políticas públicas – atuar pelo
um espaço para a construção da cidadania; Silveira desenvolvimento de políticas voltadas
e Reis (2011) identificam a biblioteca pública como protagonismo social e cultural;
espaço de práticas culturais e de memória. f) favorecer a formação, conservação e o
Em todos os textos citados se percebe acesso à memória coletiva – constituir e
a necessidade do aprofundamento, na disponibilizar acervos diversificados;
contemporaneidade, de debates acerca do g) cultivar e estimular a dialogia – assumindo
novo papel atribuído a biblioteca pública e as a função de local de interlocuções e trocas
apropriações que a sociedade vem construindo simbólicas;
sobre a sua imagem e a utilização de seus espaços. h) saber redesenhar-se – redefinindo
A biblioteca pública como uma instituição permanentemente suas práticas culturais
social deve possibilitar a convivência entre as e a atuação de seus profissionais
pessoas, e por isso, à medida que o ser humano (constituição do mediador da informação);
se transforma, ela também deve acompanhar tal i) constituir-se enquanto uma estação
mudança, entretanto, mantendo a historicidade cultural – promovendo a produção e
dos diversos sujeitos que passaram por ela. ressignificação dos saberes;
A presença em mais de um local – físico j) atuar no foco da infoeducação –
e virtual – denota uma nova estratégia para orientando e também educando para o
agregar, novamente, a importância da biblioteca mundo informacional.
pública para a sociedade.
Sob esta ótica, a biblioteca pública se
Em um primeiro momento, de configura como um dispositivo indispensável
aproximação com os seus usuários
a sociedade, no que tange às exigências do
e principalmente com os seus não-
usuários, tendo em vista a possibilidade mundo moderno. Entretanto, vale ressaltar sua
de ocupação e de circulação por um importância como lugar de memória que reúne
território amplamente frequentado. por meio de documentos a referência histórica
De outro lado coloca-se também como de um povo, transmitindo e movimentando
oportunidade para as bibliotecas públicas
os saberes humanos por gerações. Essa
se constituírem em agentes dessa
ocupação, tendo em vista que o acesso característica permite que a biblioteca pública
à internet não garante a qualificação nos seja compreendida, também, como mediadora
processos de busca, recuperação e uso das experiências da humanidade.
da informação. (MACHADO; ELIAS
JUNIOR; ACHILLES, 2014, p. 123).
4 A BIBLIOTECA PÚBLICA E SEUS
A ideia de uma biblioteca pública que LUGARES NA SOCIEDADE: SEU
esteja em dois tempos e dois lugares possibilita
ESPAÇO FÍSICO E VIRTUAL EM
a ampliação da acessibilidade de seus serviços,
do relacionamento e fidelização de seus usuários. DISCUSSÃO
Gomes (2014a, p. 160, destaque da autora), com
base nas dez condições defendidas por Perrotti O espaço físico da biblioteca pública
(2010) para a atuação de uma biblioteca, descreve brasileira, bem como a representação simbólica
algumas características essenciais: deste espaço, tem atendido às demandas de

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Bruna Lessa e Henriette Ferreira Gomes

seus usuários, sobretudo, às novas demandas informação, vê-se que o uso de tecnologias pelas
de espaço entendido como público e popular, bibliotecas favorece a rápida busca de informação
exigidos pela sociedade atual? Na década de pelos usuários. A biblioteca como um organismo
1980, Emir Suaiden desenvolveu um estudo que em crescimento, está sempre pronta para ampliar
apresentou um diagnóstico sobre as bibliotecas seu acervo, sua estrutura física, seus serviços,
públicas, apresentando obstáculos na atuação suas ações e atividades culturais, adequando-
dessas bibliotecas, salientando a precariedade se ao seu contexto social. (TARGINO, 2010;
nas instalações físicas, no acervo e mobiliário; GORMAN, 1998).
ausência de profissionais qualificados; falta A problemática em torno do espaço físico
de investimentos da parte governamental e, da biblioteca, de fato, é algo que interfere na
consequentemente, de visibilidade na sociedade. aproximação com seus usuários, que possuem
Após três décadas, Galvão (2014) discute demandas de atendimento específicas, que vão
alguns dos principais problemas que ainda desde a leitura de um livro no final de semana
permanecem na história das bibliotecas públicas: até utilizar espaço da biblioteca para usar o
o público, o acesso, os acervos, as formas de computador, tomar um café, ou simplesmente
leitura e o papel do profissional que a dirige, se reunir com um grupo de amigos. Para grande
acrescentando aqui a falta de edifícios modernos maioria da população o espaço da biblioteca,
e confortáveis. que é gratuito, tem sido a única oferta de lazer
O uso do ambiente virtual por bibliotecas e cultura, e representa um dos poucos espaços
públicas para promoverem suas ações e, públicos que podem atender suas necessidades
consequentemente, seus espaços físicos tem se individuais, oferecendo diversos serviços
tornando algo comum devido a dinamicidade públicos e, ao mesmo tempo, espaços livres que
e atratividade desses espaços, no entanto, por possibilitem a convivência e o desenvolvimento
que o espaço físico da biblioteca também não social e cultural, que podem ser compreendidos
deve ser um ambiente onde se articulam trocas como parâmetros que indicam como a biblioteca
dinâmicas de informação? A apresentação da pública deve se apresentar a sociedade moderna.
biblioteca pública como um lugar de leitura, A biblioteca do século XIX seduzia o
arte, lazer e cultura em sites de redes sociais, por público pela grandiosidade de seus edifícios, suas
exemplo, deve coadunar-se com a realidade do grandes escadarias de mármore e arquitetura
seu espaço físico, de forma a dar credibilidade a clássica, a biblioteca contemporânea deve seduzir
este dispositivo social. o público pelo acolhimento do seu espaço físico,
Logo, a ressignificação desse espaço removendo todo e qualquer obstáculo e barreira
apresenta-se como algo a ser refletido. Torna-se física, estrutural, visual, social entre outras.
necessário pensar na biblioteca como lugar que Tal atitude evidencia seu papel social como
acomode diferentes práticas socioculturais. As mediadora, quando favorece o desenvolvimento
bibliotecas existem porque existem pessoas e, do sentimento de pertença, pois está envolvida
se as pessoas encontram obstáculos para estar com a ação de cuidar, quando valoriza o coletivo.
na biblioteca, esta é apenas um espaço onde são (GOMES, 2014b).
guardados livros, pois é a presença dos usuários Com isso, as parcerias com organizações
que faz com que estas bibliotecas exerçam o seu da sociedade civil e órgãos públicos de
papel mediador. interesses comuns, potencializadas com o uso
Isto se reforça através, por exemplo, das de dispositivos da web social, por exemplo,
leis de Ranganathan. Sendo os livros para uso, representam uma boa estratégia para trazer
quem os usará, senão as pessoas que frequentam os usuários até o espaço físico da biblioteca.
a biblioteca? Se para cada leitor seu livro, há de Válido também ressaltar que se estas bibliotecas
se considerar multiplicidade de usuários e suas estão bem localizadas geograficamente, ou seja,
peculiaridades no acesso e uso da informação. pertencem ao centro da cidade e enriquecem
Já que cada livro tem o seu leitor, os serviços, a paisagem, elas fazem parte da concentração
produtos e práticas bibliotecárias se ampliam, urbana de serviços na área da cultura, educação
uma vez que se demanda a dinamização no e lazer, e assim, a comunicação positiva que
uso de suas coleções e no acesso ao catálogo. estabelecem com outros espaços públicos e/ou
Ao pensar no tempo do leitor na busca por organizações da sociedade civil, potencializa a

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A biblioteca pública como um empório de ideias

concepção da biblioteca pela sociedade como protagonistas e criam novos significados para
um “empório de ideias” – lugar de inúmeras suas histórias, é pensar a biblioteca como um
possibilidades. ponto de encontro que, em meio a uma sociedade
Tal concepção se associa ao conceito de cada vez mais individualista, torna-se cada vez
espaço visto por Krampen (1979, p. 25 apud mais necessária, proporcionando a valorização
SANTOS, M., 2006, p.63): “[...] um palco onde os do contato físico e que, em se transformando
humanos entram em relação com outros homens em lugar de acolhimento, passa a ter o grande
e com objetos.” Ou mesmo ao significado da potencial para reavivar a aproximação entre as
palavra “empório”, que está relacionada a um pessoas e o mundo social.
núcleo, um centro, um porto, uma cidade onde A partir de uma perspectiva
pessoas de todos os lugares se reúnem para mercadológica, a biblioteca pública, como um
realizar atividades, seja na área comercial, seja na “empório de ideias”, é um espaço onde as
área cultural, entre outras. (HOUAISS, 2009). pessoas se sentem estimuladas a consumir e
Essa perspectiva espacial, que pode ser reproduzir informação e cultura, implicando no
planejada com o auxílio do ambiente virtual, viés de consumo cultural. Mas, paradoxalmente,
e concretizada no ambiente físico, coloca a esse mesmo viés exige da biblioteca pública
biblioteca como um ponto focal na sociedade para contemporânea um olhar sensível para que
integrar pessoas e colaborar nos processos de possa perceber as novas demandas da sociedade
aprendizagem. As discussões em torno do espaço e, assim, desenvolver estratégias para uso de
físico e também simbólico da biblioteca pública seus espaços que transcendam o acesso ao livro
contemporânea apontam para a ressignificação e a leitura, incorporando serviços, produtos e
dessa biblioteca como um espaço que transcende ações que motivem a participação dos usuários
a preservação do livro e acesso à leitura, um e sua capacidade criadora de cultura, já que
espaço de cultura e disseminador de informação, sem a presença das pessoas seu espaço perde
um espaço acolhedor e agradável que possibilita seu significado. Desse modo a biblioteca pública
a convivência entre as pessoas, um espaço de contemporânea se aproxima da biblioteca pública
práticas e representações sociais, que é adaptável prevista por Serrai (1975, p.161), quando diz
às transformações sociais e humanas, e que se que essas bibliotecas “[...] disporão de uma
preocupa em manter a identidade e historicidade organização mais racional e eficiente e, com
dos sujeitos que passaram por ela. certeza, estarão mais diferenciadas das atuais. ”
Pensar na biblioteca pública como um
espaço compartilhado, é pensar na biblioteca 5 CONCLUSÃO
como uma comunidade, onde existem sujeitos
com diversas personalidades e intenções, mas A consolidação da importância da
que são livres para discutir suas ideias, aprender biblioteca pública em sua comunidade se dará
com o outro e negociar interesses divergentes. A a partir da ressignificação de sua imagem
biblioteca pública como um “empório de ideias” diante da sociedade à medida que for capaz de
seria o lugar do crescimento mútuo e do diálogo. adaptar seu espaço físico às exigências do mundo
O espaço e lugar da biblioteca pública contemporâneo.
na vida cotidiana da sociedade e as novas A simbologia do edifício da biblioteca
formas de utilização dessa biblioteca, tornam- pública, como um templo do saber, um lugar de
se mais evidentes quando se começa a observar erudição, abre espaço para que essas bibliotecas
os avanços sociais e, consequentemente, as se tornem também importantes centros de
novas formas de relacionamento, interação e cultura de suas cidades.
aprendizado. Constituir a biblioteca pública Nesse sentido, seja no espaço físico ou no
como um espaço onde as pessoas são estimuladas virtual, sua representação perante a sociedade
à participação cidadã, onde são convocadas é (ou deve ser) de um espaço que desperta a
a formar opinião pública e discutir possíveis vontade de conhecer, aprender, produzir e
mudanças sociais, um espaço que se utiliza das compartilhar. A biblioteca pública é, portanto,
ações culturais para mediar a informação, um um espaço de criação e que dialoga como todos
espaço onde os registros da memória de um povo os níveis de discussões, contradições, esperanças
se ampliam à medida que os sujeitos se tornam e emoções.

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Bruna Lessa e Henriette Ferreira Gomes

No sentido amplo, como seria dizer que partir de suas ações direcionadas à leitura e a
uma biblioteca pública é a representação da disseminação da informação e do conhecimento.
comunidade em que está inserida? Talvez, a Portanto, entende-se que na atualidade, além
partir dessa reflexão se poderia imaginar se da prestação de seus serviços tradicionais, as
“aquela” biblioteca mais próxima nos representa. bibliotecas públicas devem se reafirmar como
Por este aspecto, a biblioteca se configura como espaços ativos nos processos de mediação e
um espaço de transformação social, pois está construção social, cultural e histórica dos lugares
dentro da sociedade interferindo na cultura a onde estão inseridas.

Artigo recebido em 25/09/2016 e aceito para publicação em 14/02/2017

A PUBLIC LIBRARY AS AN IDEA EMPORIUM:


evidence of its place in contemporary society

ABSTRACT Critical study of the Library area of ​​literature. Information Science and Sociology for reflection of
the social role of the public library in contemporary times, in order to identify and analyze their role
as cultural mediator and information. Reflecting on cultural mediation, their social and conceptual
implications, is located the public library as a social space that action to carry out the mediation of
information. Discussing the possibilities of public library operations, says its transformative potential
to represent a space for meeting and amid dialogue and cultural diversity of technological devices,
diversifying the mode of production and circulation of cultural goods, going to be characterized as a
kind of “emporium of ideas”, which should also allow the comfort of the user’s residence. Concludes
that the public library today is invited to rethink their role as information mediation space that
both preserves the social memory and provides the conditions for creativity and cultural production,
ensuring the respect for difference is the engine of social role and respect and citizenship.

Keywords: Public Library - Mediation Information. Public Library - Cultural mediation. Public Library - Social
function.

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