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Universidade Federal de Minas Gerais

Departamento de Sociologia
Disciplina: Metodologia IV
Professor: Bráulio Figueiredo Alves da Silva
Aluno(a): Letícia Lara Quintão Souza
Matrícula: 2018113873

2.2 Incluir mais dois artigos principais à sua seleção de textos e desenvolver um texto
no formato da seção de revisão da literatura (modelo de artigos) demonstrando seu
domínio sobre os principais debates teóricos da área de pesquisa.
1. WACQUANT, Louic. QUE É GUETO? CONSTRUINDO UM CONCEITO
SOCIOLÓGICO Revista de Sociologia e Política. ISSN: 0104-4478 (versão
impressa) 1678-9873 (link)
Resumo do artigo:
Ao invés de produzirem um conceito analiticamente robusto de gueto, as Ciências Sociais utilizam o termo de
maneira descritiva, não raro lhes conferindo significados do senso comum emprestados das sociedades em que o fenômeno é
identificado. A partir da produção historiográfica sobre a diáspora judaica na Europa renascentista, da Sociologia da
experiência negra na metrópole fordista dos EUA e da Antropologia da marginalidade étnica na Ásia Oriental, o artigo constrói
um conceito relacional de gueto como um instrumento bifacetado [Janus faced] de cercamento e controle etno-racial. Por meio
desse procedimento, o gueto revela-se como um dispositivo sócio-organizador composto de quatro elementos (estigma, limite,
confinamento espacial e encapsulamento institucional) que emprega o espaço para reconciliar seus dois propósitos
contraditórios: exploração econômica e ostracismo social. O gueto não é uma área natural, produto da história da migração
(como Louis Wirth defendia), mas sim uma forma especial de violência coletiva concretizada no espaço urbano. A articulação
do conceito de gueto possibilita o desvelamento da relação entre guetização, pobreza urbana e segregação, assim como o
esclarecimento das diferenças estruturais e funcionais entre guetos e aglomerações étnicas. Esse proceder também possibilita
que realcemos o papel do gueto como matriz e incubador simbólico da produção de uma identidade maculada, indicando que
seu estudo seja feito por analogia a outras instituições voltadas para o confinamento forçado de grupos despossuídos e
desonrados como o campo de refugiados, a reserva e a prisão.

2. ZALUAR, Alba. Juventude violenta: processos, retrocessos e novos percursos


SciELO Brasil (2012). Capítulo 1 UM DEBATE PARTICULAR: ESTRUTURA DE
CLASSES OU PROCESSO HISTÓRICO? (link)
Resumo do artigo:
É necessário incluir outras dimensões além da pobreza para explicar o alarmante aumento da criminalidade violenta
entre os jovens brasileiros a partir do final dos anos 1970. A autora destaca que a pobreza não deve ser tomada como a
determinação (econômica) do crime em uma abordagem determinista por sociologia objetivista que considera a causalidade
em uma única direção, excluindo a subjetividade e a indeterminação. Trabalhando com o modelo da complexidade, ela
reconstrói parte do debate maior sobre o aumento do crime e da violência na cidade do Rio de Janeiro. Ela aponta para novas
teorias que podem lançar luz sobre as questões mais quentes neste debate, como a teoria da formação subjetiva no ethos
guerreiro (Norbert Elias), informalização (Cas Wouters) e as teorias ecológicas focando mais na ideia de social desorganização,
mas buscando as vulnerabilidades e inconsistências nos processos de socialização dos jovens da família e dos bairros, levando
em consideração as diversas formas de associação de moradores, as organizações governamentais e não governamentais
atuantes nesses bairros, e a oferta de serviços públicos de educação e atendimento Jovens.
Texto:
O Brasil, fruto de uma recém ditadura militar, vêm se baseando em uma ideologia
totalitária e progressista para construir a cidade que vemos hoje: a tentativa da imposição de
uma imagem modelo que configura o ator social em defensor dos valores tradicionais
categorizado como “cidadão de bem”. Como expressão de uma patologia social da cidadania
brasileira, o “cidadão de bem” se submete a discursos morais e políticos relacionado ao apelo
punitivista, ao conservadorismo e caminha contra as representações ideológicas de raça,
classe e gênero, servindo para eliminar diversas formas simbólicas dos atores que não se
encaixam nessa figura referencial para a sociedade. A representação dessa figura repressora
é um entre vários motivos que limita as direções de quem não se encontra neste arquétipo,
direcionando “os outros” para banimentos, prisões, mortes ou apagamento de sua cultura.
A favela, como maior alvo desse sistema punitivista que reflete os interesses de classe
no poder, foi e continua sendo vista pelas suas exterioridades como um território que abriga
os grupos sociais considerados hostis ou impróprios para mudanças que o país concebeu
para construir a imagem do progresso. Wacquant (2004), definiu o conceito de gueto como
um dispositivo sócio organizador composto de quatro elementos: Estigma, limite,
confinamento espacial e encapsulamento institucional, que emprega o espaço para
reconciliar seus dois propósitos contraditórios: ostracismo social e a exploração econômica.
O gueto assumindo as ruas dos centros urbanos devido ao trabalho informal, se tornou outro
fio do paradoxo brasileiro. Com diversas fiscalizações e regulamentações que se aplicam
para esse setor de lojistas/ambulantes, sendo elas inteiramente administrativas, encobertam
os verdadeiros males sociais dos quais gera a falta de qualificação e desemprego.
Se tornou impossível sair da favela e ocupar centros urbanos seja pelo comércio ou
pelo lazer. Analisar como o capital de personalidade entre os jovens das periferias brasileiras
vem se estruturando ao longo das décadas, está totalmente comprometido com a
segregação, as diferenças estruturais históricas, o desemprego e outras diversas questões
sociais que foram se sucedendo pela [...] interrupção e incompletude do processo de
informalização e igualitarismo social (Alba Zaluar, 2012, p.337). A permanência da hierarquia
social no Brasil da qual influencia tais práticas, vem se apresentando como um dos motivos
pelo qual acontece o rompimento do processo de diálogo com as figuras de autoridade que
configura a sociabilidade urbana na discussão das “regras do jogo”, especialmente nas
camadas menos escolarizadas e mais subalternas. Essa permanência tornou as lutas diárias
incessantes, onde o morador periférico segue na tentativa de estabelecer conexões fora das
margens e sofre pelo cansaço da repressão na busca pela sobrevivência.
As regras de convívio que foram sendo estabelecidas pela sociabilidade urbana e
influenciou o processo de significação e ressignificação do espaço público, é discutida por
Alba Zaluar (2012) como regras de convívio e como elas excluem grupos sociais periféricos
de participar dos jogos de sociabilidade, abrindo caminhos para o desconhecimento das
regras da civilidade imposta pelas formalidades de um conjunto de etiquetas e padrões de
conduta. A maneira como os grupos se inserem no ambiente, os exploram e os transformam,
define um processo de aculturamento como uma representação de um conjunto de ações
articuladas de territorialização e desterritorialização como afirma MCDOWELL (1996). Essas
ações determinam as identidades, valores, símbolos e condições de adaptação, de uso e
apropriação, e consequentemente cria-se uma hierarquia que funciona de dentro – centro –,
para fora – margens –.
É urgente descentralizar a visão criativa que se consolidou através da hierarquia dos
padrões de formalidades. A favela já vem fazendo isso por muitas décadas, mesmo que não
haja visibilidade para esta ação, porém, tem sido feito de dentro dos morros e para a
comunidade, criando-se novas formas de se vestir, de pensar, de falar e de viver. Por mais
que a falta de sociabilidade urbana atinja diretamente o morador periférico, ele não se tornou
submisso desta falta de interação em âmbitos de personalidade e isso refletiu na sua própria
forma de lazer em bailes funk e rodas de samba, na própria economia girando de dentro da
favela, no modo de se vestir em base do estilo de “não me importo com o que você acha” e
várias outras simbologias.
Desde o estigma estampado nos jornais que sempre representou o morro de forma
depreciativa, criminosa e grosseira, aos bailes e rodas de samba em que a favela mostrou
tendências, não há como negar que a estética da favela ganhou um lugar na cultura visual e
está presente no conceito de imaginário de diversos brasileiros – e obviamente a burguesia
julga, mas copia e “se amarra” –.
Desde os anos 1990 a cultura de platinar o cabelo (loiro pivete) e descolorir os pelos
tem sido tendência nas favelas, porém, essa não é uma tarefa fácil. O loiro pivete que a
juventude da classe média adora usar é acima de tudo uma estética de cria que representa
atitude e identidade. No Rio de Janeiro, descolorir o cabelo além de ser proibido em algumas
comunidades, é associado à criminalidade e pode aumentar mais ainda as chances de se
ganhar um “pulão” (batida ou operação policial).
Além do loiro pivete, a camisa de time é outra marca da cultura periférica. Há várias
personalizações da camisa de time nas escolas de samba e o traje sempre foi usado como
referência. Os grillz e corrente de ouro também nunca deixaram de ser moda nos morros,
sendo bastante utilizados pelos bicheiros (pessoa responsável por registrar e receber as
apostas no jogo do bicho). A favela sempre ditou a moda, trazendo de volta para o presente
os buckets, pochetes, óculos, tênis e ressaltando as marcas que formam os trajes (Adidas,
Nike, Lacoste e entre outras). Recentemente, houve uma grande ascensão dos passinhos de
funk e sabemos que a dança é outro elemento marcante nas comunidades. Assim, os
passinhos se tornaram destaque e começaram a ser reproduzidos por jovens de classe média
em seus rolês fora do morro.
A favela quando se configura como dominante na moda, sugere a simplificação dessa
cultura para vendê-la em larga escala e no se “amarrar” da classe média, o processo de
adaptação de uma pessoa, grupo ou subgrupo a outra cultura da qual não está inserida – em
outras palavras, apropriação cultural –, auxilia no afastamento dos valores importantes da
cultura originária. Isso pode acarretar diversos efeitos negativos para os consumidores
periféricos que estão no mesmo espaço em que os consumidores de classe média
começaram a frequentar: Preços que sobem, policiamento para vigilância de uns e opressão
para outros; fetichismo do favelado ou medo do favelado; gentrificação e higienismo da
cidade.
Quando uma favela está no topo de uma hierarquia simbólica, a hierarquia
automaticamente se transforma em um ciclo sem existir uma escala de poder. Porque quem
realmente possui o poder, se encontra no lugar de destaque da favela apropriando
culturalmente de algo por “estar na moda”. A apropriação cultural nada mais é que a tomada
de elementos identitários de uma cultura, tendo em vista sua utilização por pessoas não
pertencentes à cultura original. O problema não é simplesmente a apropriação em si, mas o
que ela causa. Pessoas negras e periféricas são violentadas por usufruírem de seus próprios
elementos enquanto pessoas não-negras e não-periféricas usufruem livremente, sem
nenhum dano. Assim, percebermos mais uma vez o privilégio de pessoas brancas, agora em
relação a algo que os próprios fundadores não podem utilizar sem sofrerem as violências
raciais, sem lucrarem com o próprio produto e retornando ao início do grau hierárquico no
conceito de ostracismo social e exploração econômica.

Referências Bibliográficas

WACQUANT, Louic. QUE É GUETO? CONSTRUINDO UM CONCEITO SOCIOLÓGICO


Revista de Sociologia e Política. ISSN: 0104-4478 (versão impressa) 1678-9873
ZALUAR, Alba. Juventude violenta: processos, retrocessos e novos percursos SciELO
Brasil (2012). Capítulo 1 UM DEBATE PARTICULAR: ESTRUTURA DE CLASSES OU
PROCESSO HISTÓRICO? (link)
MCDOWELL, Linda. A transformação da geografia cultural. In: Geografia Humana –
Sociedade, Espaço e Ciência Social. GREGORY, Derek; MARTIN, Ron; SMITH, Graham
(orgs.); tradução: Mylan Isaack; Revisão Técnica, Pedro Geiger. – Rio de Janerioo: Jorge
Zahar Ed., p. 299, 1996.

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