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Introdução
Dada a importância que se tem de trabalhar com a formação continuada dos
profissionais da Educação, buscando o aperfeiçoamento das práticas desenvolvidas,
bem como o acesso a novos conteúdos e pesquisas, é fundamental criar espaços e
momentos para que esse processo possa ser concretizado.
Torna-se imprescindível repensar o ensino da Matemática nas Séries Iniciais
do Ensino Fundamental tendo em vista as práticas correntes que podem ser
observadas nas escolas públicas e particulares, destacando como pano de fundo a
teoria construtivista de Jean Piaget. Tal teoria tem como pressuposto que o sujeito
constrói seu conhecimento a partir de suas trocas com o meio em que vive e,
portanto, quanto mais rico e desafiante for esse meio, mais serão as possibilidades
de construção do sujeito.
Nesse contexto, o papel do educador enquanto responsável pela criação de
situações-problema adequadas ao desenvolvimento e aprendizagem de seus alunos
precisa ser aperfeiçoado. Assim, é importante que o mesmo busque a construção de
seus próprios conhecimentos enquanto educador, pois o educador compara-se a um
eterno pesquisador no sentido de buscar cada vez mais ao longo de sua prática
profissional condições melhores para propiciar aprendizagens mais significativas aos
seus educandos e à Educação no seu sentido mais amplo.
Partindo dessas idéias, o objetivo do presente trabalho é discutir práticas
educativas para o ensino da Matemática, fundamentadas no referencial teórico
piagetiano, propondo reflexões a partir de cursos de formação continuada nessa
área de conhecimento vivenciados em municípios do interior do Estado de São
Paulo.
A construção do conhecimento
A gênese do conhecimento é explicada por Piaget (1976) como fruto do
processo de equilibração. A partir da interação do sujeito com o meio, esse processo
é desencadeado por meio de desequilíbrios que suscitarão reequilibrações,
possibilitando, assim, o progresso na construção do conhecimento.
Neste sentido, os desequilíbrios exercem a função motivacional, pois exigem
que o sujeito saia do estado atual de construção e busque direções novas por meio
de compensações.
O papel da escola, partindo dessa concepção, deveria se voltar ao
oferecimento de desafios à criança a fim de provocar o desencadeamento do
processo de construção do conhecimento lógico-matemático.
À escola precisa estar clara a concepção de conhecimento e a compreensão
dos processos de aprendizagem que favoreçam a produção de novos
conhecimentos.
O conhecimento não deve ser entendido como exterior ao sujeito, trazido pelo
professor, mas sim como um processo dialético que emerge do próprio sujeito de
acordo com suas diferentes formas de agir sobre o mundo. A aprendizagem passa a
ser, além de capacidade de assimilar conteúdos, a capacidade de transformar, ou
seja, de construir novas formas possíveis de assimilar conteúdos. A aprendizagem é
função do desenvolvimento, de esquemas e estruturas construídas, que se
generalizam conforme se aplicam ativamente às novas formas.
Segundo Piaget (1976), o desenvolvimento mental ocorre por etapas
denominadas períodos ou estágios. Os estágios possuem estruturas originais, cuja
construção os diferem dos estágios anteriores. Não existem saltos, ou seja, todos
passamos pela mesma ordem sucessiva dos estágios.
É fundamental que o professor saiba como as crianças pensam e se
desenvolvem em cada um desses períodos, para que possam propor desafios
adequados em suas intervenções.
Nas séries iniciais do Ensino Fundamental, as crianças deveriam estar
entrando no período operatório concreto, sendo importante, assim, que o educador
desafie o raciocínio da criança criando situações-problema adequadas a essa etapa
de desenvolvimento infantil.
A matemática na escola
As dificuldades de aprendizagem da Matemática presentes no âmbito escolar
são apontadas em muitos estudos.
Os trabalhos de Piaget e seus seguidores do grupo de Genebra e os dos
grupos do Brasil têm contribuído para a compreensão do raciocínio matemático.
Assim sendo, torna-se necessário retomar o papel da psicologia educacional na
formação dos professores, idéia esta apoiada por Brito (2001):
nos cursos de formação de professores de matemática (incluindo aqui cursos que formam
professores das séries iniciais da escola elementar), a disciplina psicologia educacional
deveria abandonar o caráter geral que tem assumido e tratar de forma fecunda o
desenvolvimento do pensamento matemático, a aprendizagem dos conteúdos da matemática
e as formas mais eficazes de ensinar esta disciplina, levando a um aumento das atitudes
positivas em relação à matemática e às demais ciências exatas e tecnológicas (p.64).
“Dividi a sala em grupinhos de quatro alunos, expliquei-lhes as regras do jogo, logo após
distribui os materiais (folhas sulfites e dois dados cada grupo). Coloquei na lousa os números
e perguntei: Por que vocês acham que não aparecem os números 1 e 7 no jogo? Antes
deles responderem, eles já tinham me falado que eu havia pulado o número 1 e 7.
Eles (na maioria) responderam porque o jogo era assim, mas o PAT disse que não tem jeito
de tirar o 1 porque tem dois dados. O GUL falou que não tem número 7 no dado por isso não
aparece no jogo.
O PAT retrucou que é claro que tem como tirar 7, é só cair no 4 e 3.
Logo a CAL disse que então não era para riscar e não tinha o 7, porque o jogo se chamava 7
cobras e cada vez que caia o tinha que desenhar uma cobrinha. Fiz várias perguntas e eles
iam respondendo.
Fui passando de grupo em grupo e fazendo perguntas: Se você tirar 5 no primeiro dado,
que número você tem que tirar para riscar o 10? Uma criança respondeu que era o 5.
Então perguntei: Que outra forma ela poderia riscar o 10? A criança pensou e respondeu
que poderia ser também o 4 primeiro e depois o 6.
Para um aluno com mais dificuldade perguntei com números menores como: Se você tirou 3,
qual número terá que sair para que possa riscar o 5? A criança pensou, contou nos dedos
e disse 2.
Após o jogo resolvi fazer uma atividade no papel. Perguntei para eles que números precisaria
tirar nos dados para riscar os números 8, 11 e 9?
Foi uma atividade muito divertida na qual pensaram bastante durante as intervenções.
Mesmo uma aluna que não gosta de participar de atividades em grupo, duplas, se soltou
durante o jogo.”
Pode-se afirmar pelo registro da professora que a turma em que foi aplicado o
jogo mostrou-se interessada do início ao fim. Durante as jogadas, a professora
propôs questões que pudessem suscitar o processo de equilibração. Para a criança
resolver a situação-problema proposta a partir do jogo precisaria utilizar os
conteúdos matemáticos de adição e subtração.
Figura 1: Resolução de Criança de segundo ano no Jogo Sete Cobras
B) Resolução de Problemas:
Em relação à resolução de problemas, foram estudadas diferentes
possibilidades de se trabalhar com problemas com as crianças, inclusive com
problemas diferentes dos convencionais, buscando valorizar o raciocínio da criança.
Apresentaremos a seguir um exemplo de problema proposto pela professora,
seu registro reflexivo da aplicação da atividade e um exemplo de solução realizada
pela criança.
O problema utilizado foi apresentado à criança de forma desordenada. A
criança precisava recortar as partes misturadas, montar o problema e depois
resolvê-lo. Observe como foi proposto às crianças:
Pode-se afirmar que uma atividade desse tipo trabalha o raciocínio, diferente
de quando as crianças mal lêem o problema, apenas pegam alguns números e
fazem uma operação qualquer. A interação e a discussão entre elas também são
fundamentais para o processo de construção do conhecimento.
Considerações Finais
Diante do exposto no presente trabalho, torna-se importante tecer algumas
considerações finais em relação à formação do professor em serviço.
Ao mencionarmos o professor comparado ao pesquisador, queremos
destacar a busca incansável de novas formas de ensinar, considerando que seu
aluno constrói seus conhecimentos e não simplesmente os copia da realidade
externa. Compartilham dessa idéia Azzi e Silva (2000) ao afirmarem que:
quando falamos que todo professor precisa ser um pesquisador, na verdade estamos
assumindo que a percepção do professor a respeito de seu próprio papel precisa ser alterada,
ou melhor, o professor precisa reconhecer-se como sujeito ativo e capaz de transformar a sua
realidade. Para tanto, é preciso que todo professor seja despertado (e formado) na direção de
enfrentar o contexto educacional através de um olhar questionador, sistemático, consistente e
fundamentado – características inerentes ao trabalho do pesquisador (p.146).
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