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26/01/22, 15:31 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça


Processo: 11/21.2YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DO CONTENCIOSO
Relator: MARGARIDA BLASCO
Descritores: PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
JUIZ
DIREITO DE DEFESA
SANÇÃO DISCIPLINAR
SUSPENSÃO
IMPUGNAÇÃO
CUMPRIMENTO DE PENA
NOTIFICAÇÃO
ATO ADMINISTRATIVO
VIOLAÇÃO DA LEI
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO
APRECIAÇÃO DA PROVA
DISCRICIONARIEDADE
ESCOLHA DA PENA
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Data do Acordão: 21-12-2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AÇÃO ADMINISTRATIVA
Decisão: JULGADA IMPROCEDENTE.
Sumário :
I. A jurisprudência constitucional tem unanimemente defendido que os
direitos de audiência e defesa previstos no artigo 32.º, da CRP, apesar
de terem de ser reconhecidos na generalidade de procedimentos ou
processos sancionatórios, não gozam do remanescente do regime
garantístico do processo criminal para todos os demais ramos do direito
sancionatório e, em particular, para o processo disciplinar. Essa
exigência constitucional não tem aplicação ao processo disciplinar e
nem sequer ao processo contraordenacional. A CRP, nesse tipo de
processos, tem somente em vista assegurar os direitos de audiência e de
defesa do arguido; e só poderá haver um juízo negativo de
constitucionalidade quando qualquer tipo de sanção
(contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou
qualquer outra) é aplicada sem prévia audição do arguido e sem lhe
conferir condições para se defender das imputações que lhe são feitas,
apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências
tendentes a apurar a verdade.
O artigo 122.º, do EMJ, quando interpretado no sentido de permitir que
um arguido, sancionado com uma pena de suspensão, comece a
cumprir a pena antes de transitar em julgado a decisão que a aplicou,
não é inconstitucional. O magistrado a quem seja aplicada sanção
disciplinar pode sempre lançar mão de impugnação administrativa
necessária para o Plenário do CSM, nos termos do disposto no artigo
167.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do EMJ, ou pode impugnar
contenciosamente a deliberação que lhe aplique tal sanção, nos termos
do disposto nos artigos 169.º e 170.º do EMJ. Pelo que, a sanção
disciplinar não se consolida enquanto tais impugnações não forem
objecto de decisão.
E, nos termos do disposto no artigo 122.º, do EMJ, a decisão punitiva
pode nem sequer começar a produzir efeitos de imediato, ou até pode
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ver esses efeitos suspensos, se o magistrado punido a impugne


administrativamente para beneficiar da suspensão automática que
decorre do artigo 167.º-A do EMJ; ou então, já em fase contenciosa, e
apesar de a acção administrativa não ter tal efeito (artigo 172.º, n.º 1, do
mesmo diploma), pode sempre interpor providência cautelar de
suspensão de eficácia até ao trânsito em julgado da decisão naqueloutra
acção administrativa (artigo 128.º do CPTA, ex vi artigos 172.º, n.ºs 2 e
3, e 174.º, ambos do EMJ).
Por último, a decisão não se consolida porque, em caso de procedência
da impugnação contenciosa do acto punitivo por decisão jurisdicional,
o acto ou é declarado nulo e não produz quaisquer efeitos (artigo 162.º,
n.º 1, do CPA), ou é anulado, destruindo-se, assim, retroactivamente
todos os seus efeitos (artigo 163.º, n.º 2, do CPA). Além disso, sempre
operará o efeito de reconstituição da situação actual hipotética que
decorreria para o magistrado punido no caso de não ter sido praticada a
sanção entretanto anulada (artigo 173.º do CPTA).
Pelo que apenas uma decisão jurisdicional pode transitar em julgado.

II. Da notificação da decisão (punitiva) não consta a obrigatoriedade da


advertência sobre a data de produção de efeitos, nos termos do disposto
nos artigos 121.º e 118.º, n.ºs 1 e 2, do EMJ, e 114.º, n.º 2, do CPA.

III. Os pressupostos do acto administrativo são as circunstâncias


objectivas, normativamente previstas, de cuja verificação depende a
constituição do órgão administrativo no poder-dever de agir mediante a
prática de um acto administrativo de determinado tipo legal. Se a
emissão do acto se baseou nos pressupostos legalmente devidos, mas
não efetivamente existentes, ocorre falta de um pressuposto real ou de
facto (a circunstância legalmente prevista não se verificou na
realidade).

IV. O vício de violação de lei ocorre quando é efectuada uma


interpretação errónea da lei, aplicando-a à realidade a que não devia ser
aplicada ou deixando-a de aplicar à realidade que devia ser aplicada.

V. Quanto ao erro sobre os pressupostos de facto em processos em que


se discute a validade de actos que aplicam penas disciplinares, cabe ao
interessado alegar e provar os vícios que possam pôr em dúvida a
validade do acto. Estando em causa um erro quanto aos pressupostos de
facto, não pode o interessado limitar-se a manifestar a sua discordância
com a matéria de facto e a pedir a reapreciação de toda a prova
produzida no processo administrativo ou a sua renovação perante o juiz
administrativo, impondo-se antes que delimite com precisão os
aspectos relativamente aos quais se verificou um erro de apreciação das
provas ou os concretos pontos de facto que entende não
corresponderem à realidade, bem como os concretos meios de prova
que pertinentemente possam demonstrar a ocorrência de um erro na
fixação dos factos.

VI. Pelo que o interessado não pode bastar-se com a simples ou mera
negação dos factos que lhe são imputados, cabendo-lhe alegar um
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conjunto de factos que corporizem a falta de consistência da imputação


e sanção de que foi alvo, dos quais se indicie a ilegalidade e que aponte
para o erro da imputação.

VII. Importa distinguir entre a situação em que o impugnante contradita


os factos que serviram de fundamento à decisão administrativa e requer
ao tribunal a produção de novos meios de prova ou a renovação de
meios de prova já produzidos no procedimento administrativo,
daqueloutra em que pretende apenas discutir a validade do juízo
formulado pela entidade administrativa quanto à prova coligida,
porquanto num caso está em causa a reapreciação da matéria de facto
com base num possível erro na fixação dos factos materiais da causa e,
no outro, discute-se apenas um eventual erro na apreciação das provas.

VIII. No tocante à apreciação da prova disciplinar, e de harmonia com


os princípios da oficialidade e da verdade real, vale para o instrutor a
regra da liberdade da apreciação das provas [artigo 91.º, n.º 2, do CPA],
salvo existência de regra legal que a afaste.

IX. Na fixação da medida da pena, a Administração, embora tenha de


respeitar os parâmetros legais, goza de certa margem de liberdade.

X. A gravidade da pena a aplicar depende do grau de responsabilidade


do agente. A sua apreciação está entregue ao critério dos titulares do
poder disciplinar que a avaliarão de acordo com os conhecimentos da
personalidade do infractor e das circunstâncias em que agiu. Por isso,
ao contrário do que sucede no direito criminal, não se estabelece a
correspondência rígida de certas sanções para cada tipo de infracção,
deixando-se a quem haja de decidir amplo poder discricionário para
punir as infrações verificada.

XI. O artigo 266.º, n.º 2, da CRP sujeita toda a atividade administrativa


aos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da
imparcialidade e da boa-fé. Tais princípios concretizam uma
objectivação dos critérios jurídicos de controlo do exercício da margem
de livre apreciação, conferindo verdadeiros parâmetros de
racionalidade a partir dos quais o Tribunal, face à dinâmica factual
apurada e a situação concreta que lhe é submetida, afere da respetiva
compatibilização com a juridicidade.

XII. O controlo jurisdicional do exercício administrativo de poderes


discricionários é um controlo externo e negativo, que apenas permite
aos tribunais a anulação da solução adoptada se ela violar os cânones
da razoabilidade e racionalidade básicas, quer em termos jurídicos,
quer em termos de senso comum; mas proíbe a definição, pela positiva,
do caso concreto, substituindo-se à Administração Pública na
ponderação das valorações que integram a margem de livre apreciação,
salvo nas chamadas situações de redução da discricionariedade a zero,
a que alude o n.º 2, do artigo 71.º, do CPTA. Daí que a violação dos
princípios aludidos no n.º 2, do artigo 266.º, da CRP apenas devam

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determinar a anulação do acto administrativo se for flagrante e


ostensiva.
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 11/21.2YFLSB


Autor/recorrente: Juiz de Direito Dr. AA
Entidade demandada: Conselho Superior da Magistratura.

Acordam na Secção do Contencioso do Supremo Tribunal de


Justiça

I. RELATÓRIO
1. O Autor, Juiz de Direito Dr. AA vem intentar Acção Administrativa
de Impugnação de Acto Administrativo contra o Conselho Superior da
Magistratura (CSM), consubstanciado na Deliberação do Conselho
Plenário do CSM, de 20 de abril de 2021, que indeferiu a impugnação
administrativa, “aplicando ao Senhor Juiz de Direito Dr. AA, por
violação dos deveres de zelo e de assiduidade e pela prática da
infração disciplinar prevista na alínea e) do n.º 1 do art.º 83.º-H do
Estatuto dos Magistrados Judiciais, a sanção disciplinar de 90 dias de
suspensão”.
2. Na sua Petição Inicial, suscita, em síntese, as seguintes questões:
a) Inconstitucionalidade do artigo 122.º do Estatuto dos Magistrados
Judiciais (EMJ), quando interpretado no sentido de permitir que um
arguido, sancionado com uma pena de suspensão, comece a cumprir a
pena antes de transitar em julgado a decisão que a aplicou;
b) Nulidade / irregularidade de notificação de decisões punitivas;
c) Violação de lei, por errónea interpretação da Lei e aplicação do
direito, por violação do princípio do contraditório, do direito à defesa e
do princípio da presunção de inocência;
d) Erro na apreciação da prova:
a. Incorreção do facto dado como provado sob o n.º 15, já que a
diligência não se realizou por falta do autor;
b. Incorreção do facto dado como provado sob o n.º 17, já que não faz
qualquer sentido que o autor tenha avisado a Sra. Procuradora de que
iria faltar a um julgamento de um processo cível em que ela não tinha
qualquer intervenção;
c. Todas as suas faltas ao serviço deveriam ter sido consideradas como
justificadas.
e) Violação do princípio da proporcionalidade.
3. Foram notificados da petição inicial e documentação anexa, o CSM e
o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal
de Justiça, ao abrigo do disposto no n.º 1, do artigo 85.º, do Código de
Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA).
4. Em 1.06.2021, veio o CSM apresentar a sua contestação, pugnando
pela sua improcedência.
5. Na mesma data - 01.06.2021-, foram apensados aos presentes autos,
os de Processo Disciplinar n.º ……/PD/…10.
6. Veio o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto, junto deste Supremo

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Tribunal de Justiça emitir Parecer no sentido da improcedência da


acção.
7. Por despacho 2.07.2021, foi determinada a notificação das partes do
teor deste Parecer, para que do mesmo tomem conhecimento e possam
pronunciar-se, querendo.
8. Neste despacho foi ainda determinado ao abrigo do disposto nos
artigos 27.º, n.º 1, alínea a), e 87.º, n.ºs 1, alínea a) e c), e 3, ambos do
CPTA, ex vi remissão operada pelos artigos 166.º, n.º 2, 169.º, 172.º, n.º
2, e 173.º, todos do EMJ, notificar o autor para, no prazo de 10 dias, vir
aos autos, querendo, informar, com referência para a petição inicial,
quais os concretos FACTOS que pretende ver provados com recurso às
declarações de parte e aos depoimentos de testemunhas arroladas,
devendo levar em linha de consideração, em tal indicação, os factos
que (apenas) dependem de prova documental.
9. Notificadas as partes, veio o autor requerer a produção de meios de
prova- testemunhal e depoimento de parte.
10. O CSM na sua resposta entendeu pela desnecessidade de realização
das diligências, por entender que sendo a prova documental, são
irrelevantes as requeridas diligências por parte do autor.
11. Foi proferido despacho em 5.10.2021 que, em suma, julgou
desnecessária a abertura de um período de instrução, por considerar a
prova essencialmente documental, pelo que se considerou de nenhum
relevo as requeridas declarações de parte do autor com vista à
comprovação de todos os factos alegados na petição inicial.
12. Mais se determinou neste despacho o seguinte que se transcreve
para melhor compreensão: Findos os articulados, cumpriria agora
proferir despacho saneador, porventura seguido de despacho com
identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova,
sendo este o momento oportuno para equacionar a convocação de
audiência prévia, nos termos do disposto nos artigos 87.º-A ss., todos
do CPTA. In casu, porém, não se divisa qualquer utilidade ou
conveniência em convocar a audiência prévia. Há, de resto, inúmeros
factores que militam em sentido abertamente desfavorável a tal
desiderato. Enunciamo-los sucintamente de seguida. Em primeiro
lugar, é não só muito discutível, como efectivamente controvertido, que
a matéria em apreço nos autos, atinente à discussão da legalidade de
um ato administrativo, não se encontre subtraída à disponibilidade das
partes. Por esse motivo, nunca se convocaria audiência prévia para os
efeitos de forjar e promover uma tentativa de conciliação, nos termos
previstos nos artigos 87.º-A, n.º 1, alínea a), e 87.º-C, ambos do CPTA.
Dito isto, a convocação de audiência prévia apenas teria utilidade
para os efeitos previstos nas demais alíneas [maxime as alíneas b), c) e
d)] do mesmo artigo 87.º-A, n.º 1, do mesmo diploma.  Sucede que,
mesmo para estes efeitos, não se divisa utilidade em convocar
audiência prévia. Desde logo, inexiste qualquer exceção que não tenha
sido já debatida nos articulados. (…) Neste conspecto, atendendo à
causa de pedir e respetivos pedidos, julgamos que o estado do processo
contém elementos suficientes para o Tribunal, com segurança,
conhecer de imediato da questão de facto e de direito da causa. (…)

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Assim, considerando a causa de pedir e os pedidos concretamente


formulados, os poderes de cognição do Tribunal e a vasta prova
documental carreada para o processo, entende este Tribunal que os
autos dispõem de todos os elementos necessários à apreciação e
decisão do mérito da causa. Não há, pois, necessidade em proferir
despacho a fixar objeto do litígio e enunciar temas da prova, a que
alude o artigo 89.º-A, n.º 1, do CPTA, pelo que também não se
verificam as situações que aconselhariam a realização de audiência
prévia enunciadas nas alíneas c), d), e), f) e g) do n.º 1 do artigo 87.º-A
do mesmo diploma. Segundo o disposto no n.º 2, do artigo 87.º-B, do
CPTA, “o juiz pode dispensar a realização da audiência prévia quando
esta se destine apenas ao fim previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo
anterior […]”, ou seja, “facultar às partes a discussão de facto e de
direito, quando […] tencione conhecer imediatamente, no todo ou em
parte, do mérito da causa”. Face ao exposto, e considerando ainda que
a aludida discussão de facto e de direito está plenamente assegurada
nos autos (posto que, na fase de articulados, as perspetivas dissonantes
das partes foram amplamente explanadas), dispensa-se a realização de
audiência prévia, ao abrigo do disposto nos artigos 27.º, n.º 1, alínea
a), e 87.º-B, n.º 2, ambos do CPTA.
13. Cumpre, pois, apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

A. Da Factualidade apurada com relevância para a causa:


1) A 05.02.2020, o Sr. Juiz Presidente da Comarca …. comunicou à
entidade demandada CSM que haviam sido adiadas várias diligências
agendadas para os dias 29.01.2020 e 04.02.2020, dada a ausência ao
serviço do ora autor (cfr. fls. 1-4 do processo administrativo, na
acepção dos artigos 1.º, n.º 2, do Código de Procedimento
Administrativo e 84.º do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos, doravante designado abreviadamente por PA, cujo
teor se dá por integralmente reproduzido).
2) A 06.02.2020, o Sr. Juiz Presidente da Comarca ....... voltou a
comunicar nova ausência do autor, agora no dia 05.02.2020 (cfr. fls. 6-
9 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
3) Por despacho de 21.02.2020, o Sr. Juiz Presidente da Comarca .......
considerou justificadas as faltas ocorridas a 29.01.2010, 04.02.2020 e
05.02.2020 ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.ºs 4 e 7, do EMJ,
mais consignando ter tomado conhecimento de que o autor também não
havia comparecido ao serviço na manhã do dia 10.02.2020 e no dia de
11.02.2020 (cfr. fls. 16-17 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
4) No âmbito da ausência no dia 11.02.2020, referida em 3), resulta do
PA, além do mais, o seguinte:
a. No âmbito do processo n.º 212/18….., com diligência agendada para
esse dia 11.02.2020, pelas 09h30 (cfr. fls. 118 do PA, cujo teor se dá
por reproduzido):
i. Deu entrada nos autos, na véspera e no próprio dia, pelas 09h08, um
requerimento das partes, com pedido de homologação de transacção;
ii. O Sr. Escrivão de Direito abriu termo de conclusão nesse mesmo dia;
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iii. Sobre o termo de conclusão referido supra, foi proferido despacho


pelo ora autor, na qualidade de magistrado titular dos autos, com
assinatura eletrónica aposta a 12.02.2020, com o seguinte teor: “Na
presente ação declarativa comum, em que são autores […] e réus […],
examinando o objeto e qualidade dos intervenientes da respetiva
transação, julgo-a válida, pelo que homologo por sentença,
condenando nos seus precisos termos, julgando extinta a instância, nos
termos do disposto […] e determino, oportunamente, o arquivamento
dos autos. // Custas nos termos acordados. // Notifique e Registe. //
Dou sem efeito a audiência final. // Desconvoque // D.N. // d. s.”;
b. No âmbito do processo n.º 55/19….., com diligência agendada para
esse dia 11.02.2020, pelas 14h00, as partes estavam presentes e foram
desconvocadas, por ausência do autor (cfr. fls. 112 do PA, cujo teor se
dá por reproduzido).
5) Por despacho de 04.03.2020, o Sr. Vice-Presidente do CSM
determinou a abertura de inquérito por forma averiguar os factos
relatados pelo Sr. Juiz Presidente da Comarca referidos em 1), 2), 3) e
4) (cfr. fls. 26 a 38 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
6) A 05.03.2020 foram comunicadas novas faltas do autor,
nomeadamente, a 04.03.2020 e 05.03.2020, sendo a 10.03.2020
determinado pelo Sr. Vice-Presidente do CSM a ampliação do objeto
do inquérito aberto pelo despacho referido em 5) a tais ausências (fls.
121-122 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
7) Sendo comunicadas à entidade demandada novas ausências do autor
nos dias 19.05.2020 e 27.05.2020, foi determinando novo alargamento
do objeto do inquérito, conforme despacho do Sr. Vice-Presidente do
CSM, de 01.06.2020 (cfr. fls. 142 do PA, cujo teor se dá por
reproduzido).
8) A 30.06.2020, o Sr. Inspetor Judicial deu por concluído o inquérito
aberto pelo despacho referido em 5) e propôs ao CSM a instauração de
procedimento disciplinar contra o autor, pela violação dos deveres de
assiduidade, lealdade e de zelo em relação às ausências ao serviço nos
dias 10.02.2020, 11.02.2020, 04.03.2020, 05.03.2020 e 19.05.2020, e
que o inquérito constitua a parte instrutória de tal processo disciplinar,
mais propondo o arquivamento relativamente às ausências ao serviço
nos dias 3.052020 e 27.05.2020 (cfr. fls. 195 a 208 do PA, cujo teor se
dá por reproduzido).
9) Por despacho de 01.07.2020, ractificado pelo Plenário a 07.07.2020,
o Sr. Vice-Presidente do CSM concordou com a proposta do Sr.
Inspetor referida em 8) (cfr. fls. 210 do PA, cujo teor se dá por
reproduzido).
10) No âmbito do processo disciplinar n.º …./PD/…10, foi deduzida a
acusação a 09.07.2020 (cfr. fls. 218-222 do PA, cujo teor se dá por
reproduzido).
11) O autor apresentou defesa, alegando, em suma, o seguinte (cf. fls.
227-240 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
a. relativamente ao dia 10.02.2020, recebeu “notícia do falecimento de
uma pessoa próxima”, tendo ficado “abalado psicologicamente”, tendo
contactado “a Digna Magistrada do Ministério Público no sentido de

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transferir as duas diligências” da manhã para o início da tarde, sendo


que, no entanto, as partes não tinham disponibilidade, tendo ainda
realizado um julgamento, nessa mesma tarde, no âmbito do processo
sumário n.º 29/20.2GPARC;
b. relativamente ao dia 11.02.2020, não se ausentou do serviço, esteve
a trabalhar no seu domicílio, porquanto, no processo 212/18….
agendado para as 09h30, as partes transigiram quanto ao objeto do
processo e, relativamente ao processo n.º 55/19…., agendado para as
14h15, afirma que “o Senhor Escrivão (CC) informou o arguido que
todos os mandatários pretendiam que a mesma fosse dispensada,
porquanto um dos mandatários tinha cerca de 40 (quarenta)
documentos para juntar”;
c. quanto aos dias 04.03.2020 e 05.03.2020, afirmou que esteve doente
e que as faltas apenas foram consideradas injustificadas porque a
justificação foi apresentada tardiamente;
d. quanto ao dia 19.05.2020 justificou a sua ausência ao serviço devido
a suspeita de contágio do seu filho com o vírus SARS-CoV-2, sendo que
no período da tarde tais sintomas se agravaram.
12) Na sua defesa, o autor arrolou quatro testemunhas, cujas
inquirições ocorreram entre os dias 14 e 17 de setembro (cf. fls. 266,
268, 269, 270 e 272 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
13) A 2.10.2020, foi pelo Sr. Inspector elaborado relatório final, onde
se propunha, pela violação dos deveres de assiduidade, lealdade e de
zelo, previstos nos artigo 7.º-A, n.º 1, 7.º-C, 10.º, n.ºs 1, 2 e 7 do EMJ, a
aplicação, como reincidente, da pena de 90 (noventa) dias de suspensão
de exercício de funções, para além da perda de vencimento e não
contabilização de tempo de serviço (cinco dias), nos termos dos artigos,
10.º, n.º 6, e 74.º alínea c), do EMJ (cfr. fls. 275-287 do PA, cujo teor se
dá por reproduzido).
14) Na sessão da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do
Conselho Permanente do CSM realizada a 17.12.2020, foi decidido
aplicar ao autor, como reincidente, da sanção de 90 (noventa) dias de
suspensão de exercício, para além da perda de vencimento e não
contabilização de tempo de serviço (quatro dias), nos termos dos
artigos, 10.º, n.º 6, e 74.º alínea c), do EMJ (cfr. doc. 1 junto à PI e fls.
295-337 do PA, cujo teor se dá por reproduzido).
15) A deliberação referida em 14) foi notificada pessoalmente ao autor
a 23.12.2020, através de ofício confidencial com o seguinte teor
(transcrição):
(…)
Pelo presente ofício fica V. Exa. notificado, de todo o conteúdo da
decisão proferida em 17-12-2020, pelo Conselho Permanente – Secção
de Assuntos Inspetivos e Disciplinares deste Órgão no processo supra
referenciado em que V. Exa. É arguido, registado na Secretaria deste
Conselho sob o n.º ...../PD/...10, decisão da qual se remete fotocópia.
Igualmente se remete fotocópia do relatório final elaborado pelo Exmo.
Senhor Inspetor Judicial, Juiz desembargador, Dr. BB.
Da referida deliberação poderá reclamar para o Plenário no prazo de
30 dias – artigo 167.º, n.º 2, al. a) do EMJ.

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(…)
(cf. fls. 320 e 337 do PA, cujo teor se dá por reproduzido)
16) A 10.03.2020, o autor apresentou impugnação administrativa para o
Plenário do CSM da deliberação referida em 14) (cfr. fls. 362-367 do
PA, cujo teor se dá por reproduzido; vide também doc. 2 junto à PI).
17) A 20.04.2021, o Plenário do CSM, reunido para apreciar a
impugnação administrativa referida em 16), proferiu deliberação com o
seguinte teor (transcrição):
(…)
Processo Disciplinar n.º ...../PD/...10:
Impugnação Administrativa
Deliberam, no plenário do Conselho Superior de Magistratura,
I – Relatório

Por despacho de 4 de março de 2020, posteriormente ampliado por


despachos de 10 de Março e de 1 de Junho, de 2020, determinou o
Senhor Conselheiro Vice-Presidente do Conselho Superior da
Magistratura a realização de inquérito com vista ao apuramento de
factos relativos ao Senhor Juiz de Direito Dr. AA, atualmente em
exercício de funções no Juízo Local de Competência Genérica de …….
e respeitantes a ausências ao serviço e adiamento de diligências sem
justificação, no Juízo Local de Competência Genérica ……..
Concluída a instrução do inquérito, foi elaborado o relatório datado de
30 de junho de 2020, no qual foi proposta pelo Senhor Instrutor a
instauração de processo disciplinar ao Senhor Juiz de Direito em
relação às ausências ao serviço dos dias 10 e 11 de fevereiro; 4, e 5 de
março; e 19 de maio, todos do ano de 2020, e que o inquérito
constituísse a parte instrutória desse processo. Mais propôs o Senhor
Inspetor o arquivamento em relação às ausências relativas aos dias 3
de março e 27 de maio, de 2020. Concordando com a referida
proposta, remeteu-a o Senhor Vice-Presidente ao Plenário do Conselho
Superior da Magistratura, que a ratificou na sua sessão de 7 de julho
de 2020.
Em 9 de julho de 2020 foi deduzida acusação, nela se imputando ao
Senhor Juiz de Direito arguido o cometimento de infração disciplinar
genericamente prevista no art. 82. ° do Estatuto dos Magistrados
Judiciais, por violação dos deveres de assiduidade, lealdade e de zelo,
por infração aos arts. 7.°-A, n.º 1; 7.°-C; e 10.°, n.ºs 1, 2 e 7, sendo
essa infração considerada grave nos termos do proémio do art. 83.°-H
e também especificamente nos termos da al. e) - sendo certo que as
faltas injustificadas por si, se mais não houvesse, sempre seriam
punidas nos termos do artigo 83.°- I, al. a), todos do Estatuto do
Magistrados Judiciais anunciando-se a punição dessa infração com
pena de suspensão de exercício, uma vez que a conduta em causa
consubstancia grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres
profissionais e manifesto desprestígio para a função jurisdicional -
arts. 91 n. ° 1, al. d), 95. ° e 101. ° do Estatuto dos Magistrados
Judiciais. Mais se referiu em tal peça que o Sr. Juiz de Direito arguido
deverá ser punido agravadamente como reincidente, por se verificarem
os pressupostos do art. 86.°, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados
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Judiciais, uma vez que as circunstâncias do caso revelam a ausência de


eficácia preventiva da condenação anterior, sendo por isso o limite
mínimo da suspensão dilatado nos termos do n.º 2 do referido
normativo e ainda que as ausências ilegítimas por cinco dias implicam
ainda a perda de vencimento e a não contabilização de tempo de
serviço, nos termos dos artigos 10.°, n° 6 e 74.°, al. c), também do
Estatuto dos Magistrados Judiciais.
Notificado da acusação, apresentou o Senhor Juiz defesa, na qual
pugnou pelo arquivamento do processo, porquanto, em suma:
- No dia 10/02/2020 não se apresentou ao serviço da parte da manhã
face à notícia do falecimento de uma pessoa próxima, que comunicou à
Magistrada do Ministério Público, tendo-se, porém, deslocado ao
Tribunal da parte da tarde com o intuito de realizar as diligências da
manhã, o que não foi possível porque as partes não tinham
disponibilidade para a parte da tarde. De todo o modo realizou
julgamento da parte da tarde no âmbito de um processo sumário.
Assim sendo, a ausência ao serviço no dia 10/02, apenas da parte da
manhã e que se enquadra materialmente no art. 10. ° do EMJ, não tem
relevância ou densidade disciplinar;
- No dia 11/02/2020, ao início da manhã, foi informado
telefonicamente pelo Sr. Escrivão de Direito, que no dia anterior tinha
dado entrado um requerimento de transação, pelo que a audiência
final não se iria realizar, pelo que o informou que iria ficar em casa a
trabalhar. Relativamente à audiência da tarde, o Sr. Escrivão informou
o arguido que os mandatários pretendiam que fosse dispensada
porquanto um dos mandatários tinha cerca de 40 documentos para
juntar, pelo que compreendendo os argumentos apresentados não se
realizou a agendada audiência prévia para a parte da tarde, pelo que
nesse dia o arguido não esteve ausente ao serviço;
- Nos dias 04 e 05/03/2020, esteve ausente ao serviço, mas porque
esteve doente, tendo havido apenas uma comunicação tardia de tal
facto ao Sr. Juiz Presidente da Comarca, pelo que o único
comportamento censurável, no limite, é a comunicação tardia, que não
tem relevância disciplinar;
- No dia 19/05/2020 não de deslocou ao serviço uma vez que o seu
filho apresentava sintomas compatíveis com "SARS-CoV-2",
nomeadamente febre, pelo que decidiu permanecer na sua habitação
comunicando tal facto à secretaria e que a diligência devia ser
transferida para a parte da tarde. Face ao evoluir dos sintomas do seu
filho, não pôde deslocar-se ao Tribunal no período da tarde, pelo que
informou de tal a secretaria e pediu para informar os intervenientes
processuais e o Sr. Presidente da Comarca .......;
- No final do dia 19/05, início do dia 20/05, o arguido depois de
conhecer o quadro evolutivo da doença do seu filho, deu conhecimento
ao Sr. Presidente da Comarca ....... e pediu a justificação da sua
ausência, o que não ocorreu. Porém, a falta devia ter sido justificada
ao abrigo do art. 10. °, n.º 1 do EMJ, sendo certo que logo que teve a
certeza que iria estar ausente ao serviço (da parte da tarde) e não
realizaria as diligências agendadas, o arguido ordenou que tal

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comunicação fosse efetuada ao Sr. Juiz Presidente, pelo que foi


tempestiva e deve ser considerada justificada. Mesmo que assim não
fosse, o motivo da ausência, sempre seria válido, mas com atraso na
comunicação, ou seja sem relevância disciplinar.
Concluiu pedindo que os autos fossem arquivados, sendo que caso
assim não se entenda, os factos imputados ao arguido não revelam
falta de zelo e grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres
funcionais e manifesto desprestígio para função jurisdicional e muito
menos pode ser punido como reincidente, pelo que considerando a sua
boa conduta, que descreve, é injusta uma pena disciplinar mais grave
que a admoestação. Requereu a tomada das suas declarações, arrolou
quatro testemunhas e juntou documentos. Foram tomados os
depoimentos das testemunhas arroladas. Não se procedeu à tomada de
declarações ao Senhor Juiz arguido que, através do seu Ilustre
Mandatário, declarou prescindir de prestar declarações.
Finda a produção de prova, elaborou o Senhor Inspetor relatório final,
em conformidade com o disposto no artigo 120. ° do Estatuto dos
Magistrados Judiciais, no qual são dados como provados e não
provados os factos seguintes e respetiva motivação:
«1 - Factos provados
» 1 - O Sr. Juiz de Direito AA ingressou no Centro de Estudos
Judiciários em …./2004 (…° Curso). Por deliberação de …./2006, foi
nomeado Juiz de Direito em regime de estágio e colocado no Tribunal
Judicial da Comarca ........, após o que foi nomeado Juiz de Direito e
sucessivamente colocado:
» - No Tribunal Judicial da Comarca ........ (auxiliar) - Decisão de
04/07/2007, com data de posse em 01/08/2007;
» - Na Bolsa de Juízes do Distrito Judicial ........ (auxiliar) - Decisão de
16/07/2007, com data de posse de 05/09/2007 e, por essa via, afeto ao
Tribunal Criminal da Comarca ........, por decisão de 12/09/2007;
» - No Tribunal Judicial da Comarca ........ (efetivo) - Decisão de
15/07/2008, com data de posse de 08/09/2008;
» - Na Bolsa de Juízes do Distrito Judicial ........ (efetivo) - Decisão de
14/07/2009, com data de posse de 04/09/2009 - e, por essa via, afeto ao
Tribunal Cível ........
, por decisão de 07/09/2009, ao Tribunal Judicial da Comarca ........,
por decisão de 02/09/2010, ao Tribunal Judicial da Comarca ........, por
decisão de 15/12/2010, ao Tribunal Judicial da Comarca ........ e ao
Tribunal Judicial da Comarca ........, por decisão de 02/02/2011, ao
Juízo de Pequena Instância Criminal ........, por decisão de 25/02/2011,
ao Tribunal Criminal ......., por decisão de 01/09/2011, ao Tribunal de
Família e Menores ........, por decisão de 09/11/2011 e à Vara Mista
........, por decisão de 30/03/2012;
» - Na Bolsa de Juízes do Distrito Judicial ........ (efetivo) - Decisão de
10/07/2012, com data de posse de 24/09/2012 e, por essa via, afeto ao
Juízo de Instância Criminal ......., por decisão de 04/09/2012, ao
Círculo Judicial ......., por decisão de 04/04/2013, ao Juízo de Instância
Criminal ......., por decisão de 07/07/2013, ao Juízo de Família e
Menores ......., por decisão de 01/11/2013 e ao Juízo de Família e

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Menores ......., por decisão de 14/11/2013;


» - Na Instância Local ....... - Secção de Competência Genérica (agora
Juízo de Competência Genérica .......) - Juiz .. - Decisão de 08/07/2014,
com data de posse de 01/09/2014;
» - No Juízo de Competência Genérica ......., afeto no cumprimento da
pena disciplinar de transferência, por decisão de 04/12/2019, com
tomada de posse em 17/12/2019;
» 2 - Tem as seguintes classificações de serviço:

Classificação Data de Tribunais Período


Homologação
Bom 17/11/2009 Tribunal da De
Comarca ........ 10/9/2007 a
Bolsa de Juízes 31/6/2009
........ (1.º e 2.º
Juízos Criminais
........

Bom 3/6/2014 Bolsa de Juízes De 7/9/2009


........ a 16/9/2013

 a) Tribunal Cível
........
  b) 1.º Juízo do
Tribunal ........
 c) 2.º Juízo do
Tribunal ........
 d) 1.º Juízo do
Tribunal ........
 e) 2.º Juízo do
Tribunal ........
 f) Juízo da Pequena
Instância Criminal
........
 g) 1.º e 2.º Juízos
Criminais do TJ
.......
              h) TFM ........
 i) Vara Mista ........

 j) Juízo de
instância criminal
....... em agregação
com o Juízo de
Instância Criminal
....... (Comarca
.......)
k) Círculo Judicial
........
....... 24/4/2018 Juízo de De
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Competência 17/9/2013 a
Genérica ....... – J… 6/9/2017
JFM ....... JFM .......

» 3 - Em 07/05/2018, na sequência da deliberação de 24/04/2018 do


Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura que atribuiu
a classificação de "......." ao Exmo. Sr. Juiz arguido, o mesmo foi
suspenso preventivamente do exercício de funções;
» 4 - Por deliberação de 03/12/2013 do Conselho Permanente do
Conselho Superior da Magistratura, proferida no processo disciplinar
n° …..-124/PD, junta aos autos e que aqui se dá por reproduzida, o Sr.
Juiz arguido foi condenado por factos ocorridos entre 09/11/2011 e
16/07/2012 (período em que desempenhou funções no Tribunal de
Família e Menores ........ e na Vara Mista ........) na pena única de 20
dias de multa suspensa na sua execução pelo período de um ano pela
prática de uma infração disciplinar por violação dos deveres de
assiduidade, de pontualidade e de prossecução do interesse público
(faltas injustificadas, incluindo em dias de serviço de turno, e atrasos
injustificados - factos ocorridos entre 28/11/2011 e 29/06/2012), a que
correspondeu a pena parcelar de 10 dias de multa, de uma infração
disciplinar por violação do dever de domicílio necessário, a que
correspondeu a pena parcelar de 15 dias de multa, e de uma infração
disciplinar por violação do dever de zelo, a que correspondeu a pena
parcelar de advertência;
» 5 - Por deliberação de 04/06/2019 do Conselho Plenário do
Conselho Superior da Magistratura, proferida no processo disciplinar
n.º ….-40/PD, junta aos autos e que aqui se dá por reproduzida, o
Exmo. Sr. Juiz visado foi condenado por factos ocorridos entre
17/09/2013 e 06/09/2017 na pena única de 180 dias de suspensão de
exercício e transferência para tribunal diferente daquele em que
exercia funções pela prática de uma infração disciplinar por violação
grave dos deveres funcionais de prossecução do interesse público, de
zelo e de assiduidade (por atrasos na prolação de decisões, atrasos em
depósitos de sentenças, adiamentos injustificados e faltas injustificadas
com inerente adiamento de diligências), tendo cumprido essa
suspensão entre 19/06/2019 e 15/12/2019;
» 6 - Na prossecução da função jurisdicional no Juízo Local de
Competência Genérica ......., competiu ao Sr. Juiz de Direito arguido
desde a sua tomada de posse a tramitação de todos processos desse
Juízo;
» 7 - No dia 10 de fevereiro de 2020, o Sr. Juiz de Direito AA não
compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência
Genérica ......., até por volta das 15.30 horas;
» 8 - Nessa sequência, não se realizaram as diligências nos processos
de promoção e proteção n.ºs 310/19….. e 311/19….., agendadas para o
dia 10/02/2020 da parte da manhã;
» 9 - Apesar de ter contactado o Tribunal, através de mensagem
telefónica enviada para a Exma. Sra. Procuradora da República, DD,
e ter informado que por motivo de falecimento de familiar apenas
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compareceria pelas 11.30 horas, o que não sucedeu, transferindo


posteriormente as diligências para as 14.00 horas;
» 10 - Não tendo comparecido a esta última hora, contactou novamente
o Tribunal por volta das 14.00 horas, transferindo as diligências para
as 15.00 horas, tendo, porém, os intervenientes, abandonado as
instalações do Tribunal;
» 11 - Nesse dia 10 de fevereiro acabou por se apresentar nas
instalações do Juízo Local de Competência Genérica ....... por volta
das 15.30 horas, tendo realizado julgamento no âmbito do processo
sumário crime n.º 291/20…., que estava agendado para as 14.00
horas;
» 12 - Nos processos de promoção e proteção n.ºs 310/19….. e
311/19….., tendo sido aberta conclusão no dia da realização das
diligências, despachou nos seguintes moldes:
“Não se mostrando viável e realização da diligência no dia de hoje,
por razões de organização do agendamento e serviço, transfiro a
mesma para o dia 17 de fevereiro, pelas (…)”
» 13 - Tais justificações genéricas não tinham qualquer
correspondência com a realidade, tanto mais que os despachos foram
proferidos apenas, respetivamente, pelas 20.30 horas e pelas 20.32
horas, quando as diligências estavam agendadas para a parte da
manhã;
» 14 - No dia 11 de fevereiro de 2020, o Sr. Juiz de Direito AA não
compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência
Genérica .......;
» 15 - Nessa sequência, não se realizou a audiência prévia no processo
comum n.º 55/19….. e o julgamento no processo comum n.º
212/18……., agendados para as 14.15 e 9.30 horas, respetivamente;
» 16 – O Sr. Juiz de Direito arguido não justificou nem comunicou
estas suas ausências, nomeadamente ao Sr. Juiz Presidente do Tribunal
da Comarca .......;
» 17 - Em relação ao processo comum n.º 55/19….. informou a Sra.
Procuradora da República, Dra. DD, que não iria comparecer,
informação que foi transmitida por esta à secção e posteriormente aos
intervenientes processuais presentes para a realização da diligência;
» 18 - No que concerne ao processo comum n.º 212/18….., no dia
anterior e no dia do julgamento, pelas 9.08 horas, deu entrada em
juízo um requerimento das partes, tendo sido aberta conclusão ao Sr.
Juiz de Direito arguido neste mesmo dia, homologou a transação
efetuada apenas no dia seguinte (12/02/2020), tendo, porém,
despachado com "d.s." e dizendo "Dou sem efeito a audiência final.
Desconvoque", como se a sentença tivesse sido proferida antes do
julgamento;
» 19 - O Sr. Escrivão de Direito contactou telefonicamente o arguido
na manhã do julgamento informando que tinha entrado um
requerimento de transação;
» 20 - Nos dias 04/03/2020 e 05/03/2020, o Sr. Juiz de Direito AA não
compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência
Genérica ......., tendo contactado e informado telefonicamente a secção

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nesses dias que teve uma indisposição no primeiro dos referidos dias e
que se encontrava de baixa médica no segundo dos dias em causa;
» 21 - Nessa sequência, com a informação referida supra, lavrada por
"termo", não se realizaram os julgamentos nos processos comuns
singulares n.ºs 201/19......, 694/19...... e 221/19......., no dia 04/03/2020,
as conferências nos processos de promoção e proteção n.ºs 245/19.......,
299/19........, 298/19......., de incumprimento de responsabilidades
parentais n.º 497/07......., a leitura de sentença no processo comum
singular n.º 97/19....... e a inquirição de testemunhas no procedimento
cautelar n.º 277/19......., no dia 05/03/2020;
» 22 - Apenas no dia 06/03/2020, pelas 18.19 horas, através de correio
eletrónico, o Dr. AA comunicou as suas ausências ao serviço nos dias 4
e 5/03/2020 ao Sr. Juiz Presidente do Tribunal da Comarca .......,
informando que tinha estado doente nesses dias e juntando atestado
médico (documento junto aos autos a fls. 251);
» 23 - Por despacho de 10/03/2020, Sr. Juiz Presidente do Tribunal da
Comarca ......., considerou as faltas injustificadas devido à
comunicação tardia e por já as ter comunicado ao Sr. Vogal do
Conselho Superior da Magistratura (documento junto aos autos a fls.
123);
» 24 - No dia 12/03/2020, o Sr. Juiz de Direito arguido apresentou novo
requerimento de justificação das ausências ao serviço nos dias 04 e
05/03/2020 ao Sr. Juiz Presidente do Tribunal da Comarca .......,
juntando certificado de incapacidade temporária para trabalho e
pedindo esclarecimentos sobre o despacho de 10/03/2020 (documentos
juntos aos autos a fls. 124);
» 25 - Por despacho de 13/03/2020, manteve o Sr. Juiz Presidente da
Comarca ....... o despacho que considerou injustificadas as faltas
(documento junto aos autos a fls. 125);
» 26 - No dia 19/05/2020, o Sr. Juiz de Direito AA não compareceu ao
serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência Genérica .......,
tendo contactado telefonicamente a secção e informado que se
encontrava impedido de se deslocar ao Tribunal e que a diligência
designada para essa manhã, para as 11.30 horas, no âmbito do
processo de promoção e proteção n.º 421/12....... ficava adiada para a
parte da tarde, pelas 14.00 horas;
» 27 - Para além da diligência no processo de promoção e proteção n°
421/12......., encontravam-se agendadas diligências para a parte da
tarde nos processos urgentes de promoção e proteção n.º 101/20......
(13.45 horas), e comuns singulares n.ºs 232/14....... (audição de
arguido - 14.00 horas) e 59/18....... (julgamento - 14.15 horas);
» 28 - Por volta das 14.30/14.35 horas, O Sr. Juiz de Direito AA
contactou novamente a secção informando que não podia comparecer
no Tribunal por estar impedido de se deslocar a Tribunal e que todas
as diligências ficavam sem efeito, o que foi apenas nessa altura
comunicado a todos os intervenientes processuais presentes, que aí se
deslocaram;
» 29 - Pelas 14.44 horas, através de mensagem de correio eletrónico, o
Sr. Escrivão de Direito BB, por determinação do Sr. Juiz de Direito

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arguido, informou o Sr. Presidente do Tribunal Judicial da Comarca


....... da sua não comparência nas diligências agendadas para o dia
19/05/2020 por motivos pessoais;
» 30 - No dia 20/05/2020, às 04.08 horas, através de mensagem de
correio eletrónico, enviada para o Sr. Juiz Presidente do Tribunal
Judicial da Comarca ......., sem juntar qualquer documento, veio
comunicar que esteve ausente do serviço no dia 19/5/2020, dizendo que
foi aconselhado a ter o mínimo contacto possível, principalmente com
terceiras pessoas não abrangidas pelo agregado familiar, em face da
eventualidade de o seu filho mais novo estar infetado com "o vírus".
Mais aduziu que se tratou aparentemente de uma situação de falso
alarme e continuaria a despachar os processos de casa, por não ter
mais diligências agendadas nessa semana. Concluiu dizendo que a
justificação apresentada se subsumia a motivos pessoais, pois foi o
mesmo que acompanhou o menor durante o dia, pretendendo, "por
ora", que a justificação à ausência ao serviço verse sobre o dia em
causa (documento junto aos autos a fls. 161 e 162);
» 31 - Por despacho de 22/05/2020, o Sr. Juiz Presidente do Tribunal
Judicial da Comarca ......., depois de fazer uma resenha sobre o
sucedido e o informado, indeferiu a justificação da falta por não ter
comunicado tempestivamente a respetiva ausência ao serviço ao
Presidente do Tribunal, pois que a mesma lhe foi comunicada ao meio
da tarde pelo Sr. Escrivão de Direito, já depois da hora designada para
a realização das diligências, quando poderia ter sido feita antes, sendo
que desta forma já não podia ter qualquer intervenção que permitisse
salvaguardar a realização das diligências designadas (documento
junto aos autos a fls. 168e 169);
» 32- A 26/05/2020, o Sr. Juiz de Direito arguido apresentou novo
requerimento ao Sr. Juiz Presidente do Tribunal Judicial da Comarca
......., novamente sem juntar qualquer documento, pedindo a
reponderação da justificação da falta, referindo, para além do mais,
que o que estava em causa era o art. 10°, n.º 1 do EMJ, que não havia
expressamente mencionado, tendo o Sr. Juiz Presidente do Tribunal
Judicial da Comarca ......., a 27/05/2020, indeferido tal pretensão,
concluindo que "Para além da falta de comunicação, o fundamento da
decisão, a avaliação do motivo ponderoso em concreto, o contágio do
"SARS-coV-2", o risco de contágio ou eventual sujeição a quarentena
preventiva, não se bastaria com uma simples menção do
circunstancialismo que invoca e descreve, teria de ser comprovado
através do procedimento e certificação previstos, cuja existência
sequer foi mencionada." (documentos juntos a fls. 151 a 154);
» 33-0 Senhor Juiz de Direito arguido sabia estar obrigado a
comparecer ao serviço e apesar disso, sem ter qualquer justificação
válida, não compareceu nas instalações do Juízo de Competência
Genérica ....... e não realizou as diligências agendadas nos dias 10 e
11/02 e 19/5. Também nos dias 4 e 5/03, não compareceu ao serviço e
comunicou tardiamente as suas ausências, sem qualquer justificação
para tal atraso, tal como também sucedeu no dia 19/05, o que tudo fez
de forma deliberada, livre e consciente;

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» 34 - Sabia ainda que tais comportamentos, reveladores de falta de


zelo e de grave desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres
funcionais e de manifesto desprestígio para a função jurisdicional,
constituíam infração disciplinar e eram punidos disciplinarmente,
tendo revelado com a sua postura que a sanção anteriormente aplicada
de suspensão do exercício de funções por que foi condenado (também
por infração disciplinar de idêntica natureza) não alcançou suficiente
advertência em termos do cometimento da presente infração
disciplinar.
35-0 arguido transmite a perceção de ser independente, isento nas
decisões, na conduta processual e empenhado, embora os seus atrasos
recorrentes e faltas tenham causado perturbação no serviço;
» 36 - Tem bom relacionamento com os funcionários judiciais,
mandatários, bem como com os demais magistrados;
» 37 - Trata com urbanidade e dignidade todos os intervenientes
processuais e o público em geral;
» 38 - Exerce as funções com reserva e serenidade.
» 2 - Factos não provados
» De entre o alegado na defesa que não se limita a reproduzir o que já
resultava dos factos apurados, que contenha juízos meramente
conclusivos, jurídicos, ou opinião pessoal quanto à relevância
disciplinar da conduta, não se provou, com algum interesse para a
decisão final a proferir:
» 1 - Que tenha falecido uma pessoa próxima do arguido, pela qual
nutria elevada estima e consideração, e que com isso o arguido tenha
ficado abalado psicologicamente e considerado não ter condições para
realizaras diligências agendadas para o dia 10/02/2020 da parte da
manhã;
» 2 - Que em relação ao art. 19. ° da defesa que o Sr. Escrivão tenha
dito que o julgamento não se ia realizar;
» 3 - Que nessa sequência, o arguido tenha informado o Sr. Escrivão de
Direito que ia ficar em casa a trabalhar;
» 4 - Art. 23° da defesa;
» 5- Art. 24° da defesa;
» 6- Art. 25° da defesa;
» 7- Arts. 41°, 43°, 44°, 45°, 46°, 54°, 55°, 56°, 58°, 59°, 60°, 61°, 62°,
63°, 64° e 66. ° da defesa, para além do que consta dos factos
apurados.
» 3 - Motivação
» Os factos dados como provados assentam na apreciação crítica e
global da prova produzida e que se consubstanciou no seguinte:
» - Registo biográfico, incluindo o registo disciplinar do Sr. Juiz de
Direito arguido e respetivas deliberações do Plenário do Conselho
Superior da Magistratura;
» - Depoimento do Sr. Presidente do Tribunal da Comarca ......., Juiz
Desembargador EE, que basicamente confirmou teor do que constava
da documentação junta aos autos em que teve intervenção;
» - Depoimento da Sra. Funcionária Judicial FF, que auxiliava o Dr.
AA nas diligências e que basicamente confirmou a matéria que deu por

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assente quanto ao seu comportamento enquanto Magistrado (itens 35 a


38);
» - Depoimento de BB, Escrivão de Direito, que foi relevante
designadamente para determinar a hora de chegada ao Tribunal por
parte do Dr. AA no dia 10/02/2020, da informação por si prestada no
dia seguinte ao Dr. AA, bem como para esclarecer que o mesmo ligou
nesse segundo dia da parte da tarde à hora da diligência ou depois
dessa mesma hora para saber se havia acordo ao invés de estar a essa
hora em Tribunal, como era a sua obrigação. Foi ainda relevante para
a matéria dada por adquirida constante dos itens 35 e seguintes;
» - Depoimento da Sra. Funcionária Judicial CC, que confirmou o teor
da cota de fls. 112 na sequência do que lhe foi transmitido pelo
escrivão, daí que se mantenha a matéria em causa nos factos assentes
(item 17), embora pouca relevância assuma quem transmitiu tal
informação (A Sra. Procuradora ou o Sr. Escrivão);
» - Depoimento da Sra. Procuradora da República, Dra. DD, que
confirmou que no dia 10/2 recebeu uma mensagem do Dr. AA
informando que só iria para o Tribunal pelas 11.30 horas por motivo
de falecimento de um familiar. Tal depoimento foi ainda relevante para
o apuramento da matéria constante dos itens 35 e seguintes;
» - Registo de faltas, licenças e férias do Sr. Juiz de Direito arguido;
» - Elementos documentais extraídos do sistema informático “citius”
relativos aos processos com diligências agendadas para os dias das
ausências ao serviço;
» - Informações juntas aos autos, designadamente as prestadas pelo Sr.
Juiz Presidente da Comarca .......;
» - Expediente remetido pelo Conselho Superior da Magistratura,
nomeadamente relativo aos despachos proferidos pelo Sr. Juiz
Presidente da Comarca ....... e requerimentos apresentados pelo Sr. Juiz
de Direito arguido, a que se reporta a acusação;
» - Documentos juntos com docs. n.ºs 3 a 7 com a defesa para a prova
da atinente matéria, que aliás já resultava inclusivamente de outros
documentos. Não se considerou naturalmente a parte conclusiva desses
documentos, designadamente a não realização de diligências por baixa
médica nos dias 4 e 5/3.
» Quanto à factualidade que quedou não assente, tal resultou da total
ausência de prova necessária para o efeito. Especificamente, em
relação ao dia 10/2, não ficou provada a versão de que o arguido
faltou por causa do falecimento de uma pessoa próxima (nenhuma
prova foi oferecida, nem identificada essa pessoa próxima ou familiar
como referiu em mensagem enviada para a Sra. Procuradora da
República, que aliás nunca se dignou identificar). Acresce que tal está
inclusivamente em contradição com o que consta dos despachos
proferidos, assumindo o Sr. Juiz de direito tacitamente a sua
falsidade.»
O relatório do Sr. Inspetor termina concluindo que Sr. Juiz de Direito
arguido violou «…os deveres de assiduidade, lealdade e de zelo (cfr.
arts. 7.°-A, n.° 1, 7.°-C 10.°, n.ºs 1, 2 e 7) ao faltar injustificadamente
ao serviço cinco dias úteis, não tendo em dois desse dias sequer

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comunicado de todo a sua ausência (10/02 e 11/02) e com adiamento


em todos os casos de diligências, gerador de responsabilidade
disciplinar nos termos do proémio do art. 83°-H e especificamente nos
termos da al. e) (o incumprimento injustificado, reiterado e revelador
da falta de zelo profissional dos horários estabelecidos para a
realização das diligências, na sua forma exponencial e total, pois que
nem compareceu às mesmas), sendo certo que as faltas injustificadas
por si, se mais não houvesse, sempre seriam punidas nos termos do art.
83°-I, al. a) do Estatuto do Magistrados Judiciais», propondo-se que
seja aplicada ao Sr. Juiz de Direito Dr. AA, como reincidente, a pena
de 90 (noventa) dias de suspensão de exercício, para além da perda de
vencimento e não contabilização de tempo de serviço (cinco dias), nos
termos dos arts. 10.°, n° 6 e 74. °, al. c), do referido diploma legal.
No relatório, para a escolha da medida da pena, foram ainda
ponderados os seguintes antecedentes disciplinares:
- Por deliberação de 03/12/2013 do Conselho Permanente do Conselho
Superior da Magistratura, proferida no processo disciplinar n°
….-124/PD, o Sr. Juiz arguido foi condenado por factos ocorridos entre
09/11/2011 e 16/07/2012 (período em que desempenhou funções no
Tribunal de Família e Menores ........ e na Vara Mista ........) na pena
única de 20 dias de multa suspensa na sua execução pelo período de
um ano pela prática de uma infração disciplinar por violação dos
deveres de assiduidade, de pontualidade e de prossecução do interesse
público (faltas injustificadas, incluindo em dias de serviço de turno, e
atrasos injustificados - factos ocorridos entre 28/11/2011 e
29/06/2012), a que correspondeu a pena parcelar de 10 dias de multa,
de uma infração disciplinar por violação do dever de domicílio
necessário, a que correspondeu a pena parcelar de 15 dias de multa, e
de uma infração disciplinar por violação do dever de zelo, a que
correspondeu a pena parcelar de advertência.
- Por deliberação de 04/06/2019 do Conselho Plenário do Conselho
Superior da Magistratura, proferida no processo disciplinar n°
….-40/PD, o Exmo. Sr. Juiz visado foi condenado por factos ocorridos
entre 17/09/2013 e 06/09/2017 na pena única de 180 dias de suspensão
de exercício e transferência para tribunal diferente daquele em que
exercia funções pela prática de uma infração disciplinar por violação
grave dos deveres funcionais de prossecução do interesse público, de
zelo e de assiduidade (por atrasos na prolação de decisões, atrasos em
depósitos de sentenças, adiamentos injustificados e faltas injustificadas
com inerente adiamento de diligências), tendo cumprido essa
suspensão entre 19/06/2019 e 15/12/2019.
No dia 17/12/2020, foi proferida deliberação da Secção de Assuntos
Inspetivos e Disciplinares do CSM, com o seguinte teor: «Tudo
ponderado, pela prática de uma infração disciplinar consubstanciada
em cinco dias de faltas injustificadas e duas delas não comunicadas,
com não realização de diligências, prevista no art. 82.°, no proémio do
art. 83.°-H e também especificamente na sua al. e) do Estatuto dos
Magistrados Judiciais, por violação dos deveres de assiduidade,
lealdade e de zelo, previstos nos arts. 7.°-A, n.º 1, 7 °-C, 10. °, n.ºs 1, 2

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e 7 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a Secção de Assuntos


Inspetivos e Disciplinares do Conselho Permanente do Conselho
Superior da Magistratura delibera aplicar ao Senhor Juiz de Direito
Dr. AA, como reincidente, a sanção de 90 (noventa) dias de suspensão
de exercício, para além da perda de vencimento e não contabilização
de tempo de serviço (quatro dias), nos termos dos arts. 10.°, n° 6 e 74.
°, al. c), do referido diploma legal.».
O Sr. Juiz de Direito arguido, Dr. AA, foi pessoalmente notificado, pelo
Secretário de Inspeção, GG, no dia 23/12/2020, como consta da
certidão do mesmo dia, assinada pelo arguido. No dia 24/12/2020, nos
termos do disposto no art. 122.º do EMJ, iniciou-se o cumprimento da
sanção disciplinar de suspensão do exercício de funções.
No dia 10/03/2021, ainda em tempo por força da suspensão de prazos
ditada pela Lei n.º 4-B/2021, deu entrada o Recurso Hierárquico
(designação do arguido) da deliberação da Secção de Assuntos
Inspetivos e Disciplinares do CSM, o qual foi autuado com data de
11/02/2021, no qual o arguido vem:
- Apresentar Impugnação Administrativa [Recurso Hierárquico] para
o Plenário do Conselho Superior de Magistratura [artigos 167°/2/a (a
contrario) e 168° EMJ1], juntando de imediato e em anexo as suas
alegações.
- Requerer, considerando que o arguido iniciou de imediato o
cumprimento da sanção de suspensão de exercício e que as
impugnações administrativas suspendem os efeitos dos atos
impugnados (167°-A do EMJ), para evitar dúvidas interpretativas, se
digne informar em que data deve o arguido retomar o serviço no Juízo
Local de Competência Genérica ......
Atento o disposto no art. 167.º-A do EMJ, o qual refere que as
impugnações administrativas suspendem os efeitos dos atos
impugnados, por despacho do Sr. Vice-Presidente do CSM de dia
10/03/2021, foi suspensa a execução da sanção disciplinar de
suspensão aplicada ao arguido, que regressou ao serviço no dia
11/03/2021. O mandatário do arguido foi notificado logo no dia
10/03/2021.
No que respeita à impugnação administrativa, da mesma constam os
seguintes pedidos, com os seguintes fundamentos:
1.Inconstitucionalidade do art. 122.º do EMJ, de acordo com a
dimensão normativa que permite a aplicação imediata da sanção
disciplinar de suspensão do exercício de funções, apesar de estar ainda
a decorrer prazo para impugnação administrativa, requerendo-se que
seja a referida norma declarada inconstitucionalidade, com as legais
consequências;
2.Nulidade/Irregularidade da notificação, por não constar da mesma
qualquer informação e/ou advertência quanto à produção de efeitos da
sanção disciplinar;
3.Impugnação da matéria de facto, nos termos que já haviam sido
aduzidos em sede de defesa escrita, concluindo-se pela eliminação da
matéria de facto constante dos pontos 15 e 17 da matéria de factos
dada como provada;

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4.Impugnação da matéria de facto, nos termos que já haviam sido


aduzidos em sede de defesa escrita, concluindo-se pela violação dos
artigos 83°-H, 84°, 86°, 99°, 101° do EMJ.
II – Questão Prévia: inconstitucionalidade da aplicação imediata da
pena de suspensão.
O arguido pede que seja declarada a inconstitucionalidade do art.
122.º do EMJ, de acordo com a dimensão normativa que permite a
aplicação imediata da sanção disciplinar de suspensão do exercício de
funções, apesar de estar ainda a decorrer prazo para impugnação
administrativa, com as devidas consequências legais. Porém, tratando-
se do CSM um órgão da administração pública, nos termos do disposto
no art. 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP), o
CSM encontra-se vinculado à CRP e à lei, estando obrigado a aplicar
as leis que se encontram em vigor, não podendo afastar a aplicação de
uma lei em vigor com fundamento na sua inconstitucionalidade.
Atendendo ao teor do art. 280.º da CRP, apenas os tribunais podem
afastar a aplicação de leis com fundamento na sua
inconstitucionalidade. Assim, e independentemente do juízo que poderá
ser feito, em sede própria, sobre a conformidade constitucional do art.
122.º do EMJ, o CSM estava obrigado a aplicá-lo, o que fez, não
merecendo qualquer censura a decisão da Secção de Assuntos
Inspetivos e Disciplinares do CSM.
Por outro lado, estando já suspensa a sanção disciplinar aplicada ao
arguido, aguardando tal suspensão pela deliberação final do Plenário
do CSM, não se vislumbra quais as consequências legais que se
retirariam da peticionada declaração de inconstitucionalidade.
Pelo que deve ser indeferido o peticionado no que respeita à
declaração de inconstitucionalidade do art. 122.º do EMJ.
III – Fundamentação (quanto à impugnação administrativa)
Requer ainda o arguido que seja declarada a nulidade/Irregularidade
da notificação, por não constar da mesma qualquer informação e/ou
advertência quanto à produção de efeitos da sanção disciplinar.
Consultados os autos, verifica-se que o Sr. Juiz de Direito arguido, Dr.
AA, foi pessoalmente notificado, pelo Secretário de Inspeção, GG, no
dia 23/12/2020, como consta da certidão do mesmo dia, assinada pelo
próprio. Foi o seguinte, o teor da notificação:
«Pelo presente ofício fica V. Exa. notificado, de todo o conteúdo da
decisão proferida em 17-12-2020, pelo Conselho Permanente – Secção
de Assuntos Inspetivos e Disciplinares deste Órgão no processo supra
referenciado em que V. Exa. é arguida, registado na Secretaria deste
Conselho sob o nº ...../PD/...10, decisão da qual se remete fotocópia.
Igualmente se remete fotocópia do relatório final elaborado pelo Exmo.
Senhor Inspetor Judicial, Juiz Desembargador, Dr. BB. Da referida
deliberação poderá reclamar para o Plenário no prazo de 30 dias –
Artº 167º, nº 2, al. a) do EMJ.»
Ora, nos termos do disposto nos arts. 118.º e 121.º do EMJ, da
notificação deve apenas constar a decisão final, acompanhada do
relatório do Inspetor Judicial, bem como, por via do art. 118.º do EMJ,
com as devidas adaptações, uma referência aos meios e prazos de

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impugnação, o que sucedeu. Não decorre da lei qualquer obrigação de


que conste da notificação a forma de execução, ou o início da
produção de efeitos, da sanção disciplinar aplicada. Tais efeitos
resultam, diretamente e sem necessidade de qualquer mediação ou
espaço de discricionariedade decisória, do art. 122.º do EMJ.
Tratando-se o arguido de um Juiz de Direito, com extensa formação
jurídica e obrigação de conhecer a fundo o disposto no EMJ – tal
obrigação decorre do disposto na alínea e) do n.º 1, e n.º 7, do art. 73.º
da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, que estabelece o dever
de zelo como dever de “conhecer e aplicar as normas legais e
regulamentares e as ordens e instruções dos superiores hierárquicos,
bem como exercer as funções de acordo com os objetivos que tenham
sido fixados e utilizando as competências que tenham sido
consideradas adequadas”, aplicável por via do art. 188.º do EMJ – o
legislador presume tal conhecimento, não exigindo que esta
informação conste da notificação.
Ora, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 123.º do EMJ, «constitui
nulidade insuprível a falta de audiência do arguido com possibilidade
de defesa e a omissão de diligências essenciais para a descoberta da
verdade que ainda possam utilmente realizar-se ou cuja realização
fosse obrigatória». Não é legalmente obrigatória a menção do início
de produção de efeitos da sanção disciplinar na notificação da decisão
final ao arguido. Tal especificidade também não se afigura essencial
para a descoberta da verdade, pois que não se relaciona diretamente
com os factos que sustentam a prática da infração disciplinar. Pelo que
não existe qualquer nulidade ou irregularidade.
Por fim, vem o arguido impugnar a matéria de facto e de Direito,
defendendo a eliminação dos factos provados n.ºs 15 e 17, e invocando
a ausência de faltas injustificadas, com os seguintes argumentos:
No que respeita aos dias 10 e 11/02/2020:
«31. Na tarde do dia 10.02.2020, o arguido esteve presente no tribunal
e realizou diligências, pelo que só esteve ausente durante a manhã, e
não todo o dia;
» 32. As diligências do dia 11.02.2020 não se realizaram por factos
alheios à vontade do arguido (transação num processo e acordo entre
as partes para juntarem documentos, e solicitarem a dispensa da
audiência prévia).
» 33. Aliás, a decisão impugnada confunde, na fundamentação, a tarde
de 11/02/2020, com a tarde de 10/02 (na tarde de 11/02, o arguido não
faltou a qualquer julgamento/diligência (ver penúltimo parágrafo da
pág.. 22/44)»
No que respeita aos dias 04 e 05/03/2020:
«34. Se é verdade que o arguido esteve, de facto, ausente do serviço
nos dias 04 e 05 de Março de 2020, também é verdade não esteve
ausente porque quis, antes porque esteve doente;
» 35. Tendo junto, embora tardiamente, o certificado de incapacidade
temporária para o trabalho por doença;
» 36. Tendo estado doente nesses dias (4 e 5 de março), faz sentido
valorar negativamente essas ausências como se tivesse faltado por

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vontade própria?
» 37. Não está em causa o motivo da ausência - que é válido (doença) -
mas apenas a comunicação tardia dessa ausência ...;
» 38. Apesar do arguido ter informado a secretaria judicial em tempo
útil, é verdade que não comunicou de imediato ao pelo Senhor Juiz
Presidente da Comarca;
» 39. Contudo, a eventual irregularidade formal (não ter comunicado
de imediato ao Senhor Juiz Presidente da Comarca) em nada belisca
ou põe em causa o motivo da ausência;
» 40. O único comportamento censurável, no limite, é a comunicação
tardia e não a ausência ao serviço, em si mesma;
» 41. A comunicação tardia não tem dignidade disciplinar, razão pela
qual as ausências ao serviço dos dias 04 e 05 de Março não podem ser
valoradas como tal.
» 42. Ou, quando muito, têm de ser muito pouco valoradas, face ao
diminuto grau de ilicitude.»
No que respeita ao dia 19/05/2020:
«44. O arguido esteve ausente do serviço no dia 19 de Maio para
prestar assistência inadiável ao seu filho (menor de 10 anos), que tinha
sintomas compatíveis com "SARS-CoV-2", nomeadamente tosse e
febre;
» 45. Fez questão de informar a secretaria judicial ao início da manhã
e deu instruções para informarem os intervenientes processuais e o
Senhor Presidente da Comarca ......., quer telefonicamente, quer por
escrito;
» 46. É certo que só no final do dia 19/05, início do dia 20/05, é que o
arguido endereçou diretamente ao Senhor Presidente da Comarca .......
uma exposição escrita, dando conta do sucedido e requerendo que a
sua ausência fosse considerada justificada;
» 47. Salvo melhor opinião, essa falta deve ser considerada justificada,
à luz do art. 10. °/1 do EMJ que prevê: “Quando ocorra motivo
ponderoso, os magistrados judiciais podem ausentar-se da
circunscrição respetiva por número de dias que não exceda três em
cada mês e 10 em cada ano, comunicando previamente o facto ao
presidente do tribunal, ou. não sendo possível, imediatamente após o
seu regresso.”
» 48. O motivo indicado pelo arguido é claramente ponderoso, ou seja,
suspeita de contágio por “SARS-CoV-2” do seu filho, pelo que era de
todo imperioso que o arguido lhe prestasse assistência inadiável;
» 49. Quanto ao momento da comunicação, o arguido comunicou à
secretaria judicial a impossibilidade comparecer durante a manhã do
dia 19/05 e ordenou que fosse comunicado ao Senhor Juiz Presidente
da Comarca ....... no início da tarde porque só aí teve conhecimento
que estaria ausente do serviço e não realizaria as diligências
agendadas (quer as anteriormente agendadas, quer a transferida nessa
manhã).
» 50. Não o podia ter feito antes, porquanto não tinha a certeza do
impedimento;
» 51. Assim, o arguido comunicou previamente ao Senhor Juiz

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Presidente da Comarca ......., ou seja, mal teve a certeza que estaria


ausente do serviço (de tarde)»
Mais argumenta o arguido, no que respeita à matéria de Direito, o
seguinte:
«53. Os factos imputados ao arguido não revelam falta de zelo e grave
desinteresse pelo cumprimento dos seus deveres funcionais e manifesto
desprestigio para a função jurisdicional;
» 54. Muito menos pode ser punido como reincidente, uma vez que as
circunstâncias do caso não revelam a ausência de eficácia preventiva
da condenação anterior;
» 55. Os factos dados como provados nos pontos 35 a 38 revelam zelo
e interesse no cumprimento dos seus deveres funcionais e de prestígio
da função jurisdicional, o que não foi devidamente valorado na
decisão aprovada.
» 56. É injusta a aplicação ao arguido de uma pena disciplinar mais
grave que a pena de multa.»
No que respeita aos dias 10 e 11/02/2020, não tem razão o recorrente,
na medida em que, efetivamente, quanto ao dia 10/02, esteve ausente
na parte da manhã e ficou por realizar a diligência agendada para as
14h (tendo os intervenientes deslocando-se ao tribunal, para se
ausentarem por volta das 15h, sem que a diligência fosse efetuada),
tendo apenas sido realizado um julgamento sumário às 15h30. Mais,
não foi junto qualquer comprovativo (através de prova testemunhal ou
documental) do falecimento de um familiar, o que podia e devia ter
sido feito, nem foi o alegado motivo ponderoso previamente (ou
sucedaneamente) comunicado ao Presidente do Tribunal. No que
concerne ao dia 11/02/2020, não foram realizadas as duas diligências
que estavam agendadas para esse dia (audiência de julgamento no
processo comum n.º 212/18......, às 9h30, e audiência prévia no
processo comum n.º 55/19....., às 14h15), tendo o arguido ficado a
trabalhar em casa. Embora tenha sido junta uma transação pelas
partes (no processo comum n.º 212/18......) e cerca de 40 documentos
por uma das partes (no processo comum n.º 55/19.....), tal como se
explica na Deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e
Disciplinares do CSM «como não houve despacho prévio ao
julgamento, devia ter sido em ata de audiência de julgamento que
deveria ter sido proferida a sentença homologatória, dando assim sem
efeito o julgamento a realizar e já não proferir despacho no dia
seguinte.» Também no que toca à diligência da tarde de dia 11/02, não
se afigura suficiente para expurgar a existência de uma falta
disciplinar o facto de terem sido juntos, por uma das partes, já durante
a tarde, cerca de 40 documentos. Tal facto, por si só, não impediria que
fosse realizada a diligência, ainda que a contraparte não prescindisse
de prazo de vista, na medida em que se tratava de mera audiência
prévia, podendo desde logo ser ouvidas as partes quanto à prova já
junta. Por outro lado, no momento em que o arguido decide não se
deslocar ao Tribunal, não era ainda certo qual a tomada de posição da
contraparte no que respeita ao prazo de vista. Em qualquer caso,
releva ainda, de modo central, a falta de comunicação da ausência ao

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Presidente do Tribunal.
Dispõe o art. 10.º, n.º 1, do EMJ, que a falta será justificada quando
ocorra motivo ponderoso e haja comunicação prévia, ou, não sendo
possível, assim que o Juiz retornar ao serviço, ao Presidente do
Tribunal. No caso, face ao dia 10/02, não só não foi demonstrada a
existência de motivo ponderoso, como não foi feita – como poderia e
deveria ter sido – a comunicação prévia ao Presidente do Tribunal.
Por estas razões, foi corretamente considerada injustificada a referida
falta. Irreleva o facto de o arguido ter realizado uma outra diligência
na tarde do dia 10/02, pois ficou demonstrado que as partes se
deslocaram ao tribunal por volta das 14h, tendo aí permanecido cerca
de 1 hora, sem que a diligência para a qual haviam sido convocadas
fosse realizada, tendo havido, manifesta perturbação do serviço e
inconveniente para as partes. No que respeita ao dia 11/02, dispõe o n.º
2 do art. 10.º do EMJ que «o exercício de funções que pela sua
natureza não careça de ser realizado no tribunal pode excecionalmente
ser assegurado pelo juiz fora das respetivas instalações, não sendo
considerado ausência de serviço quando não implique falta ou
perturbação dos atos judiciais». Ora, no caso, existiam diligências
agendadas, pelo que não poderia o arguido ter optado por ficar a
trabalhar em casa, sem antes se assegurar que as diligências não
tinham condições para serem realizadas, ou que deveriam ser adiadas,
o que não sucedeu. O que parece ter sucedido, é que o arguido
aproveitou algumas vicissitudes processuais (possibilidade de
transação e junção de documentos) para proceder ao adiamento ou
não realização das diligências.
Não tem também razão o arguido quando alega que a falta de
comunicação da ausência ao Presidente do Tribunal não tem qualquer
relevância disciplinar. O n.º 1 do art. 10.º do EMJ exige, para que a
ausência seja legítima, dois requisitos cumulativos:
a) Motivo ponderoso;
b) Comunicação prévia (ou, excecionalmente, posterior) ao Presidente
do Tribunal.
E o n.º 6 do art. 10.º do EMJ estabelece que: «a ausência ilegítima
implica, além de responsabilidade disciplinar, a perda de vencimento
durante o período em que se tenha verificado». A norma não se refere
às faltas injustificadas (conceito autónomo), mas antes à «ausência
ilegítima», numa clara referência ao disposto no n.º 1 do art. 10.º do
EMJ. Assim, a infração disciplinar, no que respeita aos magistrados
judiciais, pode decorrer da ausência de motivo ponderoso (falta
injustificada) ou da ausência de comunicação ao Presidente do
Tribunal (ausência que poderia ser justificada, mas é ilegítima).
Entende-se que assim seja, pois, a comunicação ao Presidente do
Tribunal não corresponde a uma mera formalidade, sendo antes
essencial para garantir a boa prossecução do interesse público na
administração da justiça (dever de todos os magistrados judicias,
consagrado nos arts. 3.º e 7.º-C do EMJ), já que permite que seja
acionada a substituição do magistrado, quando seja possível, a tempo
útil, bem como, não sendo possível a substituição, que sejam avisados

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os intervenientes, evitando-se deslocações inúteis ao tribunal.


No que respeita aos dias 04 e 05/03/2020, embora haja uma
justificação (entrega de baixa médica que atesta situação de
incapacidade para o trabalho), falhou o arguido o dever de
comunicação prévia ao Presidente do Tribunal, o que podia e deveria
ter feito (não tendo sido alegados quaisquer factos que demonstrassem
a incapacidade de realizar esta comunicação, tanto mais que o arguido
comunicou com a seção). Trata-se, portanto, de mera ausência
ilegítima por falta de comunicação prévia.
No que respeita ao dia 19/05/2020, não existe justificação comprovada
para a falta, concordando-se com o relatório do Sr. Inspetor e com a
deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM
quando concluem não ser credível a explicação avançada pelo
arguido. Efetivamente, caso o filho do Sr. Juiz de Direito arguido
estivesse, efetivamente, com sintomas compatíveis com a «SARSCoV-
2», afiguram-se três hipóteses: a) deveria a criança ter sido testada,
esclarecendo-se na dúvida (caso em que o arguido teria comprovativo
da realização do teste); b) deveria a criança ter-se deslocado ao
Centro de Saúde/Hospital ou médico para fazer a despistagem (caso
em que haveria comprovativo da deslocação e/ou consulta); c) ou, em
caso de dúvida e não havendo indicação do SNS para testagem nem
possibilidade de recurso a um médico, deveria ter sido cumprido um
período de 14 dias de isolamento profilático, isolamento este que se
estenderia a todo o agregado familiar. O que não é credível, à luz da
experiência comum que temos tido, ao longo de mais de 1 ano, da
sinalização de pessoas com sintomas compatíveis com a «SARSCoV-
2», é que houvesse suspeitas de manhã, de tal modo que constituíssem
motivo ponderoso de ausência, e que, sem qualquer uma das
diligências referidas em a) e b), o arguido pudesse comparecer a uma
diligência, no mesmo dia, no período da tarde. Assim, no que toca ao
dia 19/05/2020, é forçoso concluir-se que ocorreu uma verdadeira falta
justificada, por ausência de motivo ponderoso comprovado.
Face aos factos dados como provados, não está em causa a aplicação
da alínea a) do art. 83.º-I do EMJ, uma vez que não ocorreu uma
ausência ilegítima e continuada a circunscrição judicial por mais de 3
dias. Também não se preenchem, por não se tratar de ausências
continuadas, a alínea d) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ, nem a alínea f)
do art. 83.º-G do EMJ. Resta saber se, como se concluiu no relatório
do Sr. Inspetor e na deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e
Disciplinares do CSM, o comportamento global do arguido permite
ainda que esteja preenchida a alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ.
E, de facto, o que está em causa neste procedimento é um conjunto de
comportamentos de violação grave e grosseira do dever de zelo, na
medida em que, ainda que se pudessem aceitar, em tese, as
justificações dadas pelo arguido para estar ausente do tribunal, de
modo algum se consegue justificar a reiterada e renitente ausência de
comunicação prévia das referidas ausências ao Presidente do Tribunal.
Tal recusa reiterada em cumprir uma regra de fácil execução, para
além de inexplicável, trouxe inegáveis prejuízos para o serviço, como

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foi expressamente declarado pela testemunha DD (Procuradora da


República) e pela testemunha BB (Escrivão de Direito); bem como
para terceiros (intervenientes que se deslocaram inutilmente ao
tribunal na tarde do dia 10/02).
Foi assim, nos termos do disposto nos arts. 82.º, 10.º, n.ºs 1 e 2, e n.º 6,
e alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H, todos do EMJ, por violação dos
deveres de zelo e de assiduidade, praticada uma única infração grave,
de execução reiterada sucessiva. Concorda-se, também, com o
relatório do Sr. Inspetor e com a deliberação da Secção de Assuntos
Inspetivos e Disciplinares do CSM na parte em que concluem no
sentido de ser adequada ao caso a pena de suspensão, atendendo aos
antecedentes disciplinares do arguido. De facto, tendo já sido aplicada
uma pena de suspensão por violação do dever de zelo e de assiduidade
(180 dias de suspensão), exigia-se, no mínimo, que o arguido se tivesse
sensibilizado para a necessidade de cumprir escrupulosamente com os
seus deveres no que respeita à presença no tribunal e comunicação
atempada de eventuais ausências inevitáveis.
Resta, por fim, verificar se se deve manter o juízo concreto de
gravidade do ilícito e da culpa do arguido e a medida concreta da
sanção disciplinar de suspensão. O arguido expressamente invoca a
violação do disposto no art. 84.º do EMJ, estando aqui em causa,
especialmente o seguinte segmento desta norma: «na escolha e medida
da sanção disciplinar a aplicar, o órgão decisor tem em conta todas as
circunstâncias que, não estando contempladas no tipo de infração
cometida, deponham a favor ou contra o arguido, nomeadamente».
E, aqui, discorda-se do juízo feito pelo relatório do Sr. Inspetor
(secundado na deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e
Disciplinares do CSM), que concluiu pela existência de uma ilicitude
muito grave, com o seguinte fundamento: «O grau da ilicitude dos
factos é algo elevado, uma vez que não se tratou de um episódio
isolado, antes tendo ocorrido cinco situações de faltas, que geraram
múltiplos adiamentos de diligências, com os inerentes transtornos para
os intervenientes processuais que se deslocaram a Tribunal, sendo que
se trataram de atrasos na sua extensão máxima, isto é atrasos que
levaram à não realização das diligências.». Porém, na graduação da
ilicitude de uma dada infração, ao abrigo do princípio da proibição de
dupla valoração, não podem ser tomadas em consideração as
circunstâncias concretas, na sua dimensão exata, que foram essenciais
para o preenchimento do ilícito típico, como decorre do já citado art.
84.º do EMJ. Ora, o arguido não praticou uma infração disciplinar por
se ter ausentado, sem justificação ou ilegitimamente, em cinco dias
intercalados, do tribunal. Já se verificou que este comportamento,
isoladamente ou globalmente considerado, não se integra nas alíneas
dos arts. 83.º-G a 83.º-I do EMJ. Está aqui em causa a construção de
uma infração disciplinar reiterada de execução sucessiva (interpolada)
em que é a valoração global do comportamento do arguido, o qual, por
força das suas características e circunstâncias concretas – combinação
de faltas injustificadas e faltas justificadas com ausências ilegítimas
por falta de comunicação prévia, com o recurso a pretextos e

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expedientes processuais para não se deslocar ao tribunal, com


confusão de avisos e ordens a diferentes agentes do tribunal, gerando
confusão, com falta a diligências marcadas e prejuízo para
intervenientes processuais e adiamento de várias diligências – permite
sustentar uma violação grave do dever de zelo e, consequentemente, o
preenchimento da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. De outro
modo, estaria em causa a mera ocorrência de duas faltas injustificadas
e 3 dias de ausência ilegítima do tribunal, o que apenas permitiria
concluir pela prática de cinco infrações disciplinares leves.
Por conseguinte, não poderão estas mesmas circunstâncias, que foram,
como resulta do próprio relatório do Sr. Inspetor (aqui confirmado
pela deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do
CSM), essenciais para o preenchimento do tipo de ilícito disciplinar
constante da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ, ser duplamente
valoradas, agora para se concluir por uma ilicitude muito elevada no
âmbito das graduações possíveis do leque de potenciais violações da
alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. Deverá, assim, conclui-se
apenas por uma ilicitude mediana (bem como intensidade mediana na
violação dos deveres de zelo e de assiduidade), mantendo-se, no
restante, intactos os juízos relativos ao modo de execução e grau de
culpa do agente.
Mantém-se também alterado o juízo agravado de censura, no que
respeita à valoração da prevenção especial, pois o Sr. Juiz arguido foi
condenado por factos ocorridos entre 17/09/2013 e 06/09/2017 na
pena única de 180 dias de suspensão de exercício e transferência para
tribunal diferente daquele em que exercia funções pela prática de uma
infracção disciplinar por violação grave dos deveres funcionais de
prossecução do interesse público, de zelo e de assiduidade (por atrasos
na prolação de decisões, atrasos em depósitos de sentenças,
adiamentos injustificados e faltas injustificadas com inerente
adiamento de diligências). De acordo com o constante no relatório do
Sr. Inspetor, «passados cerca de três meses do regresso ao exercício de
funções e depois de cerca de nove meses de ser punido voltou a
incorrer em infrações disciplinares de idêntica e de similar natureza e
revelando com a sua postura que a sanção anteriormente aplicada não
alcançou suficiente advertência em termos do cometimento de novas
infrações disciplinares, pelo que deve ser punido agravadamente nos
termos do art. 86.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais».
Deverá, portanto, manter-se a sanção disciplinar nos 90 dias de
suspensão, uma vez que estamos perante uma moldura que vai dos 60
dias de suspensão aos 240 dias de suspensão, tendo esta assim já sido
fixada muito perto do limite mínimo.
IV – Deliberação
Em face do exposto, delibera o Plenário do Conselho Superior da
Magistratura, indeferir a impugnação administrativa, aplicando ao
Senhor Juiz de Direito Dr. AA, por violação dos deveres de zelo e de
assiduidade e pela prática da infração disciplinar prevista na alínea e)
do n.º 1 do art. 83.º-H do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a sanção
disciplinar de 90 dias de suspensão.

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(…).
        (cf. doc. 3 junto à PI e fls. 390-402 do PA).
18)  Esta deliberação (17) foi notificada pessoalmente ao autor a
23.12.2020, através de ofício confidencial com o seguinte teor que se
transcreve:
(…)
Pelo presente ofício fica V. Exa notificado de todo o conteúdo da
decisão que se anexa, proferida em 20-04-2021, pelo Conselho
Plenário deste Órgão no processo supra referenciado em que V. Exa. é
arguido, registado na Secretaria deste Conselho sob o nº ...../PD/...10.
Igualmente se remete cópia do relatório final elaborado pelo Exmo.
Senhor Inspetor Judicial, Juiz Desembargador Dr. BB.
Mais se informa V. Exa. que, nos termos do art. 71.º al. b) do E.M.J.
deverá suspender as suas funções a partir da presente notificação.
(…)
     (cf. doc. 4 junto à PI e fls. 405-407 do PA, cujo teor se dá por
reproduzido).

B. Do Direito

1. Da inconstitucionalidade do artigo 122.º do EMJ


Alega o autor que o artigo 122.º do EMJ, quando interpretado no
sentido de permitir que o arguido comece a cumprir a sanção antes de
transitar em julgado, padece de inconstitucionalidade, por violação do
princípio da presunção de inocência e por negar ao arguido do processo
disciplinar, o direito à defesa, ao contraditório e a um processo
equitativo.
Diga-se, desde já, que não lhe assiste razão. Vejamos porquê.
Estipula o artigo 122.º, do EMJ o seguinte: “A decisão que aplicar a
sanção disciplinar não carece de publicação, começando a sanção a
produzir os seus efeitos no dia seguinte ao da notificação do arguido
nos termos do artigo 121.º, ou 15 dias após a afixação do edital, no
caso de desconhecimento do paradeiro daquele.”.
Por um lado, a asserção inspiradora e apriorística de que parte o autor -
a de que os princípios decorrentes do artigo 32.º da CRP, aplicáveis ao
processo criminal, estendem o seu âmbito de aplicação, na íntegra, a
qualquer processo sancionatório, designadamente o disciplinar - não se
verifica.
Apesar de não o negarmos, registemos que não são desconhecidas as
especiais exigências constitucionais que se fazem sentir ao nível do
direito disciplinar público. Com efeito, sendo imposta pelo artigo 271.º
da CRP, uma responsabilidade do tipo disciplinar, somos, desde logo,
confrontados com a perspectiva de um cidadão poder ficar sujeito a
sanções decorrentes do exercício indevido de tarefas especificamente
confiadas ao abrigo de funções públicas, que se distinguem em face das
missões que lhe são atribuídas e do interesse por si prosseguido[1].
Razão pela qual, a CRP não permita que esse regime disciplinar não
seja acompanhado de garantias substantivas e processuais suficientes.
Isso mesmo é estipulado no artigo 269.º, n.º 3, da CRP que assegura ao
arguido de procedimento disciplinar integrado no regime da função
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pública, os direitos procedimentais de audiência e defesa, precisamente


aqueles que, sendo próprios do estatuto de arguido em sede criminal, o
n.º 10, do artigo 32.º, da CRP, reconhece como devendo ser estendidos
e aplicáveis a qualquer procedimento sancionatório.
Todavia, e sem que se possa negar pertinência a esta constatação,
também teremos de asseverar, em contrapartida, que as demais
garantias constitucionais previstas para o processo criminal
(nomeadamente as previstas nos restantes números do citado artigo
32.º) não deverão ser aplicadas tout court e qua tale a qualquer
processo sancionatório. Além de que, o diferente impacto produzido
por uma sanção penal não justificaria essa equiparação legal absoluta.
Isso mesmo foi decidido no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º
659/2006, de 28.11.2006, proferido no processo n.º 637/06.
Por isso, a propósito dos procedimentos disciplinares, a jurisprudência
constitucional tem unanimemente defendido que os direitos de
audiência e defesa previstos naquela norma constitucional, apesar de
terem de ser reconhecidos na generalidade de procedimentos ou
processos sancionatórios, não originam o remanescente do regime
garantístico do processo criminal para todos os demais ramos do direito
sancionatório e, em particular, para o processo disciplinar. Essa
exigência constitucional não tem aplicação ao processo disciplinar e,
nem sequer, ao processo contraordenacional. A CRP, nesse tipo de
processos, tem somente em vista assegurar os direitos de audiência e de
defesa do arguido; e, só poderá haver um juízo negativo de
constitucionalidade quando qualquer tipo de sanção
(contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou
qualquer outra) é aplicada sem prévia audição do arguido (direito de
audição) e sem lhe conferir condições para se defender das imputações
que lhe são feitas (direito de defesa), apresentando meios de prova e
requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade.
Aliás, este tem sido o entendimento veiculado, quer pelo Tribunal
Constitucional [2], quer por este Supremo Tribunal de Justiça [3].
Por outro lado, a tese do autor confunde os conceitos de trânsito em
julgado da sentença condenatória penal com caso decidido
administrativo-disciplinar. Na certeza, porém, de que só uma decisão
jurisdicional (e nunca a decisão punitiva aplicada pelo CSM, órgão de
natureza administrativa) é que pode transitar em julgado, isto é,
consolidar-se definitivamente no ordenamento jurídico, logo que não
seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação [4].
Na verdade, o preceito aqui em análise insere-se no âmbito de um
procedimento administrativo de índole disciplinar e não difere sequer
de preceitos afins no âmbito disciplinar das relações jurídicas de
emprego público. Nomeadamente, tem uma redação muito similar à do
artigo 223.º da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas (LGTFP),
ou à do artigo 262.º do Estatuto do Ministério Público (EMP). A razão
de ser desses preceitos tem respaldo precisamente na dimensão
estritamente administrativa do procedimento disciplinar, por ausência
de uma visão integrada do fenómeno sancionador no âmbito do Estado.
É precisamente por estarmos perante uma decisão administrativa e não
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jurisdicional que podemos recuperar noções próprias e tradicionais do


direito administrativo, como o sejam o do privilégio de execução
prévia e de autotutela declarativa e executiva, que permitem à
Administração executar as suas decisões sem necessidade de para tal
obter, previamente, do tribunal um título executivo.
A ratio genérica e inspiradora destas soluções normativas poderá ser
encontrada em razões de interesse público, que se prendem com a
necessidade de garantir uma Administração Pública célere e eficaz,
permitindo-se às autoridades administrativas, como a aqui entidade
demandada, que possam, por si próprias, auto-executar os seus actos, se
necessário com o auxílio dos meios de coacção previstos na lei (artigos
175.º ss. do CPA).
Mais se pode vislumbrar como escopo específico destas normas o de
“proteger e acautelar o interesse do Estado no respeito pelo
desempenho regular das funções públicas ou profissionais que exige
título bastante para tal ou a conjugação de requisitos ou condições
especiais de exercício”[5], motivo pelo qual, inclusive, a lei pune o
trabalhador que permaneça no exercício de funções públicas após
notificação da decisão de aplicação de pena disciplinar expulsiva ou de
suspensão de funções com pena de prisão até 2 anos ou com pena de
multa até 240 dias, por crime de usurpação de funções, p. e p. no artigo
358.º do Código Penal (CP).
De todo o modo, por outro lado ainda, e mais decisivamente, não se
pode acompanhar o autor no paralelismo com o trânsito em julgado da
sentença condenatória porque não corresponde sequer à verdade que a
sanção disciplinar se consolide, apesar de começar a produzir efeitos.
Aliás, não se divisa que esta solução possa enfermar da
inconstitucionalidade alegada pelo autor, nomeadamente por deixar o
magistrado objecto de sanção disciplinar em posição de maior
vulnerabilidade e com preterição de garantias constitucionais.
Vejamos.
Desde logo, malgrado a regra de início automático de produção de
efeitos, não se pode afirmar, summo rigore, que a decisão disciplinar se
consolida pela mera prolação do acto punitivo. Tal deve-se pela razão
de tal decisão ser susceptível de impugnações, como aliás decorre da
presente acção.
Com efeito, o magistrado a quem seja aplicada sanção disciplinar pode
lançar mão de impugnação administrativa necessária para o Plenário do
CSM dos actos ou omissões do Conselho Permanente em matéria
disciplinar, nos termos do disposto no artigo 167.º, n.ºs 1 e 2, alínea a),
do EMJ. Além disso, pode também impugnar contenciosamente a
deliberação que lhe aplique tal sanção, através de acção administrativa
perante esta Secção de Contencioso do STJ (artigos 169.º e 170.º do
EMJ). Em qualquer caso, lançando o magistrado punido
disciplinarmente mão de qualquer destes meios impugnatórios,
obrigando a um reexame ou revisão da decisão punitiva, é apodítico
que a sanção disciplinar não se consolida enquanto tais impugnações
não forem objecto de decisão.
A que acresce que, apesar da redação do artigo 122.º, do EMJ, a
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decisão punitiva pode nem sequer começar a produzir efeitos de


imediato, ou até pode ver esses efeitos suspensos: basta que o
magistrado punido a impugne administrativamente para beneficiar da
suspensão automática que decorre do artigo 167.º-A do EMJ; ou então,
já em fase contenciosa, e apesar de a acção administrativa não ter tal
efeito (artigo 172.º, n.º 1, do mesmo diploma), pode sempre interpor
providência cautelar de suspensão de eficácia até ao trânsito em julgado
da decisão naqueloutra acção administrativa (artigo 128.º do CPTA, ex
vi artigos 172.º, n.ºs 2 e 3, e 174.º, ambos do EMJ). Em qualquer destes
casos, a decisão punitiva vê os seus efeitos suspensos até prolação de
decisão por órgão (Plenário, em caso de impugnação administrativa) ou
pessoa (este STJ, em caso de impugnação contenciosa) distinta e
exógena, supraordenada ao órgão autor do acto punitivo.
Por último, a decisão não se consolida precisamente porque, em caso
de procedência da impugnação contenciosa do acto punitivo por
decisão jurisdicional, o acto ou é declarado nulo e não produz
quaisquer efeitos (artigo 162.º, n.º 1, do CPA), ou é anulado,
destruindo-se, assim, retroactivamente todos os seus efeitos (artigo
163.º, n.º 2, do CPA). Além de que sempre operará o efeito de
reconstituição da situação actual hipotética que decorreria para o
magistrado punido, no caso de não ter sido praticada a sanção
entretanto anulada (artigo 173.º, do CPTA).
Face a tudo o exposto, decide-se julgar improcedente, nesta parte, a
pretensão do autor com este fundamento.

          2. Da nulidade da notificação da decisão punitiva.


O autor invoca a nulidade/irregularidade da notificação, uma vez que a
mesma não se fez acompanhar de qualquer advertência quanto à
produção de efeitos, informação sobre os seus direitos de impugnação e
respectivo prazo.
Diga-se, desde já, que o autor não identifica qual a notificação a que se
refere: se a notificação da deliberação da Secção do Conselho
Permanente, reproduzida em 15) dos factos provados; ou, se a
notificação da deliberação do Conselho Plenário, parcialmente
transcrita em 18) do probatório.
De todo o modo, seja qual for a notificação a que se reporte, não lhe
assiste qualquer razão, como veremos de seguida.
Relativamente à notificação da decisão, dispõe o artigo 121.º do EMJ,
que: “a decisão final, acompanhada de cópia do relatório a que se
refere o art. 120.º, é notificada ao arguido com observância do
disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 118.º”.
Por sua vez, o artigo 118.º, n.ºs 1 e 2, do EMJ estabelece que: “a
decisão de arquivamento ou de acusação é entregue pessoalmente ao
arguido ou remetida pelo correio, sob registo, com aviso de receção” e
que, “se não for conhecido o paradeiro do arguido, procede-se à sua
notificação edital mediante a afixação de um edital na porta do
tribunal do exercício de funções e na da sua última residência
conhecida”.
Cotejemos estas previsões normativas, específicas do contexto
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disciplinar regulado no EMJ, com a precisão genérica do artigo 114.º,


n.º 2, do CPA, que, sobre a notificação dos atos administrativos.
Estabelece este último artigo que: “da notificação do ato
administrativo deve constar: a) o texto integral do ato administrativo,
incluindo a respetiva fundamentação, quando deva existir; b) a
identificação do procedimento administrativo, incluindo a indicação do
autor do ato e a data deste; c) a indicação do órgão competente para
apreciar a impugnação administrativa do ato e o respetivo prazo, no
caso de o ato estar sujeito a impugnação administrativa necessária”.
Da leitura dos citados preceitos, de nenhum deles consta a
obrigatoriedade (legal) da advertência sobre a data de produção de
efeitos. De resto, e como se disse, nem o próprio autor identifica
qualquer base legal que dê respaldo a essa exigência.
Certo é que, cotejando as duas notificações em apreço (a da deliberação
da Secção do Conselho Permanente e a do Plenário da entidade
demandada), reproduzidas em 15) e 18) do probatório, com as normas
que disciplinam o conteúdo e a forma das notificações, temos que de
tais notificações constam os elementos obrigatórios do artigo 121.º, do
EMJ (decisão final, cópia do relatório a que se refere o artigo 120.º,do
EMJ), tendo sido a mesma realizada pelo meio que se prescreve no
artigo 118.º, n.º 1, do EMJ, pessoalmente, e com observância, ademais,
do disposto no n.º 2, do artigo 114.º, do CPA (ou seja, foi remetido o
texto integral do acto administrativo, foi identificado o procedimento
administrativo, o autor do acto e a data do mesmo, sendo ainda, no caso
da notificação da deliberação da Secção do Permanente, indicado o
prazo e o órgão competente para apreciar a impugnação administrativa
- artigo 167.º, do EMJ).
Como tal, não procede, também nesta parte, a pretensão do autor com
este fundamento.
3. Da incorreta valoração de factos (erro nos pressupostos)
3.1. O autor alega que a matéria dada como provada não retrata
correctamente a realidade e/ou é manifestamente insuficiente para a
punição, ou da mesma, em todo o caso, não poderiam ser extraídas as
conclusões expressas pela entidade demandada, porque, do seu ponto
de vista, considerando os factos que deveriam ter sido dados como
provados e não o foram, as regras da lógica e da experiência comum
que fundamentaram a decisão teriam conduzido a uma apreciação e
resultado diferentes.
A este respeito, insurge-se essencialmente contra os seguintes aspetos:
         - Incorreção do facto dado como provado sob o n.º 15, já que a
diligência não se realizou por falta do autor;
         - Incorreção do facto dado como provado sob o n.º 17, já que não
faz qualquer sentido que o autor tenha avisado a Sra. Procuradora de
que iria faltar a um julgamento de um processo cível em que ela não
tinha qualquer intervenção;
         -Todas as suas faltas ao serviço deveriam ter sido consideradas
como justificadas.

3.2. Os pressupostos do acto administrativo são as circunstâncias


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objectivas, normativamente previstas, de cuja verificação depende a


constituição do órgão administrativo no poder-dever de agir mediante a
prática de um acto administrativo de determinado tipo legal.
Se a emissão do acto se baseou nos pressupostos legalmente devidos,
mas não efetivamente existentes, ocorre falta de um pressuposto real ou
de facto (a circunstância legalmente prevista não se verificou na
realidade).
Reafirmando jurisprudência constante, tem vindo a Secção de
Contencioso do STJ a decidir reiteradamente que “o vício de violação
de lei ocorre quando é efetuada uma interpretação errónea da lei,
aplicando-a à realidade a que não devia ser aplicada ou deixando-a de
aplicar à realidade que devia ser aplicada”[6].
Quanto ao erro sobre os pressupostos de facto em processos em que se
discute a validade de actos que aplicam penas disciplinares, em
concreto, tenhamos presente, como ponto de partida para o excurso que
se segue, que é “sobre o interessado incide […] o ónus de alegar e
provar os vícios que possam pôr em dúvida a validade do ato […]” e
que, estando em causa “um erro quanto aos pressupostos de facto, o
autor não pode limitar-se a manifestar a sua discordância com a
matéria de facto e a pedir a reapreciação de toda a prova produzida no
processo administrativo ou a sua renovação perante o juiz
administrativo [impondo-se antes que] delimite com precisão os
aspetos relativamente aos quais se verificou um erro de apreciação das
provas ou os concretos pontos de facto que entende não
corresponderem à realidade, bem como os concretos meios de prova
que pertinentemente possam demonstrar a ocorrência de um erro na
fixação dos factos”[7].
Daí que “o autor não possa, assim, bastar-se com a simples ou mera
negação dos factos que lhe são atribuídos / imputados, cabendo-lhe
alegar um conjunto de factos que corporizem a falta de consistência da
imputação e sanção de que foi alvo, dos quais se indicie a ilegalidade e
que aponte para o erro da imputação”[8].
Na certeza, porém, de que importa “distinguir entre a situação em que
o impugnante contradita os factos que serviram de fundamento à
decisão administrativa e requer ao tribunal a produção de novos meios
de prova ou a renovação de meios de prova já produzidos no
procedimento administrativo, daquela outra em que pretende apenas
discutir a validade do juízo formulado pela entidade administrativa
quanto à prova coligida porquanto num caso está em causa a
reapreciação da matéria de facto com base num possível erro na
fixação dos factos materiais da causa e, no outro, discute-se apenas um
eventual erro na apreciação das provas”[9].
No caso dos autos, o autor não pretende impugnar qualquer
factualidade que esteja controvertida; mais do que isso (ou mesmo ao
invés disso), o que pretende demonstrar é que, partindo de um dado
ponto de partida fáctico, a entidade demandada, na deliberação
impugnada, procedeu a uma incorrecta valorização dos meios de prova

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e dos factos apurados e laborou em erro na subsunção dessa dinâmica


factual nos tipos de infracção apontados no acto impugnado.
Dito por outras palavras: aquilo contra o que o demandante se insurge
não é, summo rigore, um qualquer suposto erro sobre os pressupostos
de facto proprio sensu, a demonstrar através de meios de prova em sede
contenciosa, mas antes, em bom rigor, um erro de apreciação de provas
e um erro de subsunção num tipo de infracção.
Por último, neste enquadramento preliminar, cumpre ter presente que,
no tocante à apreciação da prova disciplinar, e “de harmonia com os
princípios da oficialidade e da verdade real, vale para o instrutor a
regra da liberdade da apreciação das provas [artigo 91.º, n.º 2, do
CPA], salvo existência de regra legal que a afaste […]”[10].

3.3. Alega o autor que, com referência ao dia 10.02.2020, apenas esteve
ausente da parte da manhã e esteve presente e realizou diligências da
parte da tarde. Por conseguinte, não andou bem a deliberação
impugnada, ao considerar como falta do autor todo o dia.
A matéria de facto a que se reporta o autor está consignada nos pontos
7) a 13) dos factos dados como provados na deliberação impugnada
que, em si mesmo (isto é, enquanto dinâmica factual apurada,
expurgada de asserções conclusivas ou de índole jurídica), não foram
impugnados pelo demandante. Por esse motivo, recuperemo-los aqui
(transcrição):
(…)
“7 - No dia 10 de fevereiro de 2020, o Sr. Juiz de Direito AA não
compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo Local de Competência
Genérica ......., até por volta das 15.30 horas;
8 - Nessa sequência, não se realizaram as diligências nos processos de
promoção e proteção n.ºs 310/19..... e 311/19....., agendadas para o dia
10/02/2020 da parte da manhã;
9 - Apesar de ter contactado o Tribunal, através de mensagem
telefónica enviada para a Exma. Sra. Procuradora da República, DD,
e ter informado que por motivo de falecimento de familiar apenas
compareceria pelas 11.30 horas, o que não sucedeu, transferindo
posteriormente as diligências para as 14.00 horas;
10 - Não tendo comparecido a esta última hora, contactou novamente o
Tribunal por volta das 14.00 horas, transferindo as diligências para as
15.00 horas, tendo, porém, os intervenientes, abandonado as
instalações do Tribunal;
11 - Nesse dia 10 de fevereiro acabou por se apresentar nas instalações
do Juízo Local de Competência Genérica ....... por volta das 15.30
horas, tendo realizado julgamento no âmbito do processo sumário
crime n.º 291/20......, que estava agendado para as 14.00 horas;
12 - Nos processos de promoção e proteção n.ºs 310/19..... e 311/19.....,
tendo sido aberta conclusão no dia da realização das diligências,
despachou nos seguintes moldes:
“Não se mostrando viável e realização da diligência no dia de hoje,
por razões de organização do agendamento e serviço, transfiro a
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mesma para o dia 17 de fevereiro, pelas (…)”


13 - Tais justificações genéricas não tinham qualquer correspondência
com a realidade, tanto mais que os despachos foram proferidos apenas,
respetivamente, pelas 20.30 horas e pelas 20.32 horas, quando as
diligências estavam agendadas para a parte da manhã;”.
(…).
Vejamos.
É certo que, tal como alega o autor, no dia 10.02.2020 apenas esteve
ausente da parte da manhã e esteve presente e realizou diligências da
parte da tarde.
Contudo, também é inequívoco que a sua ausência ilegítima impediu a
realização das diligências agendadas para as 11 horas e depois para as
14 horas, tendo comparecido apenas pelas 15 horas e 30 minutos como,
aliás, foi dado como provado.
Recorde-se que, segundo a dinâmica factual (expurgada de asserções
conclusivas e alegações jurídicas) apurada no âmbito do procedimento
disciplinar, que o autor rigorosamente não contradiz, para esse dia, o
autor tinha agendadas duas diligências no período da manhã: uma no
processo n.º 310/19....., para as 10h30; e outra no processo 311/19.....,
agendada para as 11h30. Sendo que, no período da tarde, a diligência
no processo n.º 291/20......, estava agendada para as 14h00.
O autor entrou em contacto quer com a Sra. Procuradora, quer com a
secretaria, indicando que lhe havia falecido pessoa próxima, e que
transferia as diligências para as 14h00. Não comparecendo às 14h00,
contactou novamente a secretaria transferindo as diligências para as
15h00, tendo, porém, os intervenientes processuais que se mantiveram
no tribunal desde período da manhã, abandonado tais instalações.
Certo é, porém, que o autor apenas se apresentou no Juízo Local de
Competência Genérica ....... pelas 15h30, tendo realizado, nesta altura,
o julgamento no âmbito do processo sumário 291/20......, que se
encontrava agendado para as 14h00.
Nos processos de promoção e protecção n.º 310/19..... e n.º 311/19.....
foi aberta conclusão em que o autor despachou nos seguintes moldes:
“Não se mostrando viável a realização da diligência no dia de hoje,
por razões de organização do agendamento e serviço, transfiro a
mesma para o dia 17 de Fevereiro, pelas (…)”. Tais despachos,
conforme consta de fls. 109 e 110 (verso) do PA, foram proferidos
pelas 20h20 e 20h32 de dia 10.02.2020, sendo que as diligências nos
referidos processos se encontravam agendadas para as 10h30 e 11h30
desse dia. Ora, tais despachos não tinham, assim, qualquer
correspondência com a verdade.
Mas, sobretudo, o que importa reter é que em circunstância alguma o
autor comunicou a sua ausência ao órgão competente, o que
inviabilizou a sua substituição; e, nem apresentou qualquer documento
justificativo, tal como estava obrigado. A ausência foi, pois, ilegítima,
posto que não foi apresentado qualquer comprovativo do falecimento
de um familiar do autor, nem foi comunicada ao Sr. Presidente do
Tribunal. Eis um primeiro ponto que importa relevar.
Assim como, também ficou demonstrado que, em virtude da

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comunicação que o autor estabeleceu com a secretaria, os


intervenientes processuais nos processos n.º 310/19..... e n.º 311/19.....,
que se tinham deslocado ao tribunal na manhã do dia 10.02.2020, ali
permaneceram até ao período da tarde, com esperança de que as
diligências se realizassem pelas 14h00. Como, no entanto, o autor não
compareceu mais uma vez pelas 14h00 horas, verificou-se que a sua
ausência causou prejuízo para as partes que se deslocarem ao tribunal
de manhã e ali permanecerem até ao período da tarde,
desnecessariamente.
A este respeito, e tal como se conclui na Deliberação do Plenário de
20.04.2021, “[i]rreleva o facto de o arguido ter realizado uma outra
diligência na tarde de dia 10/02, pois, ficou demonstrado que as partes
se deslocaram ao tribunal por volta das 14h, tendo aí permanecido
cerca de 1 hora, sem que a diligência para a qual haviam sido
convocadas fosse realizada, tendo havido, manifesta perturbação do
serviço e inconveniente para as partes”.
Também a diligência que se encontrava agendada para as 14h00, no
processo 291/20......, apenas teve início às 15h30, sem qualquer
explicação para esse atraso.
Ora, conforme vimos supra, o autor alega que só esteve ausente de
manhã e não todo o dia. Todavia, esse facto não invalida que não tenha
causado grave prejuízo, quer pela não realização das diligências
agendadas para o período da manhã e reagendadas para o período da
tarde, quer no atraso da diligência realizada no período da tarde.
Como, aliás, se refere na Deliberação do Plenário de 20.04.2021, em
segmento que se recorda: (…) “Face aos factos dados como provados,
não está em causa a aplicação da alínea a) do art. 83.º-I do EMJ, uma
vez que não ocorreu uma ausência ilegítima e continuada a
circunscrição judicial por mais de 3 dias. Também não se preenchem,
por não se tratar de ausências continuadas, a alínea d) do n.º 1 do art.
83.º-H do EMJ, nem a alínea f) do art. 83.º-G do EMJ. Resta saber se,
como se concluiu no relatório do Sr. Inspetor e na deliberação da
Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM, o
comportamento global do arguido permite ainda que esteja
preenchida a alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. E, de facto, o
que está em causa neste procedimento é um conjunto de
comportamentos de violação grave e grosseira do dever de zelo, na
medida em que, ainda que se pudessem aceitar, em tese, as
justificações dadas pelo arguido para estar ausente do tribunal, de
modo algum se consegue justificar a reiterada e renitente ausência de
comunicação prévia das referidas ausências ao Presidente do
Tribunal. Tal recusa reiterada em cumprir uma regra de fácil
execução, para além de inexplicável, trouxe inegáveis prejuízos para
o serviço, como foi expressamente declarado pela testemunha DD
(Procuradora da República) e pela testemunha BB (Escrivão de
Direito); bem como para terceiros (intervenientes que se deslocaram
inutilmente ao tribunal na tarde do dia 10/02)” (sublinhados nossos).
Pelo que, não se vislumbra nenhum erro sobre os pressupostos de facto
ou de direito que implique um juízo de invalidade sobre o acto

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impugnado, pelo que improcede, nesta parte, a pretensão do autor com


este fundamento.

3.4. Mais se insurge o autor contra a valoração que foi efectuada pela
entidade demandada quanto aos factos dados como provados nos
pontos 14 e 15 do relatório final e da deliberação impugnada,
porquanto, segundo o demandante, as diligências do dia 11.02.2020 não
se realizaram por factos alheios à vontade do autor (transacção num
processo e acordo entre as partes para juntarem documentos, e
solicitarem a dispensa da audiência prévia), porquanto:
         i) quanto ao processo n.º 212/18....., as partes fizeram chegar aos
autos no dia anterior, com subscrição pela outra parte às 09h08, uma
transacção, sendo que esse julgamento não se realizou porque as partes
celebraram uma transacção na véspera, pelo que não faz o menor
sentido dar como provado que o autor faltou ao serviço no dia 11.02 e,
por essa razão, não se realizou o julgamento;
         ii) em relação ao processo 55/19....., esta matéria está estritamente
ligada à matéria alegada no artigo 23.º da defesa e que foi, mal, dada
como não provada no ponto 4 dos factos não provados, sendo que, se
tivesse sido junta aos autos certidão do referido processo judicial, ter-
se-ia constatado ser verdadeira a versão do arguido, ou seja, que foram
juntos inúmeros documentos pelas partes antes da audiência prévia (o
que só corrobora a sua versão) – “se assim não fosse, como é que as
partes adivinhavam que o autor ia estar ausente e decidiam apresentar
os documentos..!” (sic).

Vejamos.
Constata-se que para este dia encontravam-se agendadas diligências
nos processos n.º 212/18......, para as 09h30, e n.º 55/19....., para as
14h15.
Relativamente ao processo n.º 212/18......, no dia anterior e no dia do
julgamento, pelas 9h08, deu entrada em juízo requerimento das partes,
com pedido de homologação de transacção.
Todavia, é certo que o julgamento agendado para as 09h30 não se
realizou porque o autor não estava presente. Se estivesse presente,
como era devido, teria homologado a transacção apresentada em acta,
na própria sessão agendada, e mesmo sem a presença das partes. Tal
como se consignou na deliberação do Plenário do CSM de 20.04.2021,
fazendo referência à deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e
Disciplinares do CSM, “como não houve despacho prévio ao
julgamento, devia ter sido em ata de audiência de julgamento que
deveria ter sido proferida a sentença homologatória, dando assim sem
efeito o julgamento a realizar e já não proferir despacho no dia
seguinte”.
Ou, no limite, o autor teria dispensado a realização de audiência,
mediante despacho proferido antes da mesma. Mas, não foi isso que
sucedeu: tendo o Sr. Escrivão de Direito contactado telefonicamente o
autor, na manhã do dia do julgamento, informando que tinha entrado
um requerimento de transacção, tendo sido aberta conclusão no mesmo
dia, 11.02.2020 (cf. fls. 118 do PA), constata-se que foi proferido pelo
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autor despacho nesse termo de conclusão com o seguinte teor: “Na


presente ação declarativa comum, em que são autores […] e réus […],
examinando o objeto e qualidade dos intervenientes da respetiva
transação, julgo-a válida, pelo que homologo por sentença,
condenando nos seus precisos termos, julgando extinta a instância, nos
termos do disposto […] e determino, oportunamente, o arquivamento
dos autos. // Custas nos termos acordados. // Notifique e Registe. //
Dou sem efeito a audiência final. // Desconvoque // D.N. // d.s.”
(negrito nosso).
Sobre o referido despacho foi aposta assinatura eletrónica datada de
12.02.2020 [cfr. facto provado em 18) da deliberação impugnada e 4)
do probatório]. Significa isto que, apesar de o autor ter inscrito a
menção d.s., querendo fazer parecer que o despacho tinha sido
proferido antes do julgamento (e no momento da abertura do termo de
conclusão), conforme consta no canto esquerdo do documento, tal
despacho foi assinado pelo autor apenas a 12.02.2020. Pelo que não
tinha correspondência com a verdade.
Por seu turno, no que respeita ao proc. n.º 55/19....., com audiência
agendada para as 14h00 desse mesmo dia, o autor alega que as partes
solicitaram a dispensa de audiência prévia porque juntaram
documentos. Mas, a verdade é que o autor não compareceu ao tribunal,
pelo que não se realizou a diligência no processo 55/19....., agendada
para as 14h00, e a desconvocação das partes que, à hora marcada, se
encontravam presentes no Tribunal [conforme consta da cota de fls. 112
do PA - vide ponto 4) b. do probatório].
Sempre se refira, tal como bem se consignou no acto impugnado a este
respeito, que o facto de terem sido juntos, por uma das partes, durante a
tarde, cerca de 40 documentos, não impedia, por si só, a realização da
“diligência, ainda que a contraparte não prescindisse de prazo de
vista, na medida em que se tratava de mera audiência prévia, podendo
desde logo ser ouvidas as partes quanto à prova já junta. Por outro
lado, no momento em que o Autor decide não se deslocar ao tribunal,
não era ainda certo qual a tomada de posição da contraparte no que
respeita ao prazo de vista”.
De todo o modo, a este respeito nem autor, nem entidade demandada,
dissentem no tocante ao essencial da dinâmica factual apurada: no dia
11.02.2020 estavam agendadas duas diligências (uma audiência prévia
no processo comum n.º 55/19..... e uma audiência final no processo
comum n.º 212/18......, agendados para as 14h15 e 09h30,
respetivamente); o autor não compareceu no tribunal a horas do início
daquelas diligências; no processo n.º 212/18..... as partes fizeram
chegar aos autos uma transacção, no dia anterior, com subscrição pela
outra parte às 09h08; e no processo 55/19....., foram juntos inúmeros
documentos pelas partes antes da audiência prévia.
Onde as partes dissentem é apenas na valoração que a entidade
demandada efectuou da ausência do autor, no sentido de,
independentemente da transacção e dos documentos juntos, lhe atribuir

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relevância para a não realização das diligências e de considerar a sua


conduta com relevância disciplinar.
Significa isto que nenhuma das diligências se realizou, sendo que em
tal dia, o autor não compareceu ao serviço, nas instalações do Juízo
Local de Competência Genérica ........
O autor também não comunicou ou justificou tais ausências,
impossibilitando, deste modo, a sua substituição.
Acresce que, no dia 11.02.2020, o autor estava obrigado a deslocar-se
ao Tribunal, porquanto, tinha diligências agendadas (cfr. artigo 10.º, n.º
2, do EMJ). Não se divisa, por conseguinte, qualquer erro sobre os
pressupostos na deliberação impugnada, quando aí se consignou, além
do mais, que o ora autor “não poderia ter optado por ficar a trabalhar
em casa, sem antes se assegurar que as diligências não tinham
condições para serem realizadas, ou que deveriam ser adiadas, o que
não sucedeu. O que parece ter sucedido, é que o arguido aproveitou
algumas vicissitudes processuais (possibilidade de transação e junção
de documentos) para proceder ao adiamento ou não realização das
diligências”, e, consequentemente, não se deslocar ao tribunal.
Mais alega o autor, a propósito desta falta no período vespertino, e
reportando-se ao facto dado como provado no ponto 17) da deliberação
impugnada, que não teria qualquer lógica comunicar à Sra. Procuradora
a sua ausência, já que estava em causa a realização de diligência num
processo cível.
Também quanto a este ponto entendemos que possa assistir-lhe razão: é
que uma leitura integrada e holística do acto impugnado, conjugando e
cotejando os factos provados com a motivação da convicção probatória,
permite depreender que a entidade demandada julgou verificada a
factualidade pertinente para a subsunção na tipologia da infracção
disciplinar, independentemente de quem tenha dado a indicação de que
estaria ausente (sendo esse um elemento meramente acessório ou
complementar e não decisivo para a qualificação da infracção).
Veja-se que, da motivação da deliberação impugnada constava, além do
mais, o seguinte: “Depoimento da Sra. Funcionária Judicial CC, que
confirmou o teor da cota de fls. 112 na sequência do que lhe foi
transmitido pelo escrivão, daí que se mantenha a matéria em causa
nos factos assentes (item 17), embora pouca relevância assuma quem
transmitiu tal informação (A Sra. Procuradora ou o Sr. Escrivão);”
(sublinhado nosso).
De todo o modo, independentemente de quem tenha dado a informação,
há uma constatação que releva e se sobrepõe ao alegado: nesse dia o
autor não se deslocou ao tribunal, apesar das diligências que se
encontravam agendadas.
Pelo que, a pretensão do autor é julgada improcedente também neste
ponto.

3.5. Alega o autor que, nos dias 04 e 05.03.2020 esteve doente e, por
isso, não esteve ausente voluntariamente, não devendo as faltas nesses
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dias ter sido valoradas negativamente. Apenas existiu a comunicação


tardia ao Presidente do Tribunal, que não reveste dignidade disciplinar.
Vejamos.
No dia 04.03.2020, o autor contactou telefonicamente a secção de
processos indicando que teve uma indisposição e, no dia seguinte,
05.03, indicou que se encontrava de baixa médica. Apesar da realização
de tal comunicação à secretaria, o autor reconhece que não a
comunicou ao Juiz Presidente da Comarca, tal como se encontrava
obrigado, pelo que inviabilizou a sua substituição, o que determinou
que não se realizassem as diligências nos processos 201/19......,
694/19......, 221/19......., no dia 04.03.2020, e as diligências nos
processos 245/19......., 299/19........, 298/19......., 497/07......., 97/19.......
e 277/19......., agendadas para o dia 05.03.2020.
O autor apenas comunicou ao Juiz Presidente do Tribunal de Comarca
a sua ausência, pelas 18h19 do dia 06.03.2020, através de correio
eletrónico, juntando atestado médico.
Ora, nos termos do disposto no artigo 10.º, do EMJ, subordinado à
epígrafe “Faltas e ausências”:“quando ocorra motivo ponderoso, os
magistrados judiciais podem ausentar-se da circunscrição respetiva
por número de dias que não exceda três em cada mês e 10 em cada
ano, comunicando previamente o facto ao presidente do tribunal, ou,
não sendo possível, imediatamente após o seu regresso” (n.º 1), sendo
que “o exercício de funções que pela sua natureza não careça de ser
realizado no tribunal pode excecionalmente ser assegurado pelo juiz
fora das respetivas instalações, não sendo considerado ausência de
serviço quando não implique falta ou perturbação dos atos judiciais”
(n.º 2). Em qualquer caso, “[…] os magistrados judiciais devem
informar o local em que podem ser encontrados” (n.º 5), sendo que “a
ausência ilegítima implica, além de responsabilidade disciplinar, a
perda de vencimento durante o período em que se tenha verificado”
(n.º 6).
Mais, estabelece o aludido preceito que: “as faltas por doença são de
imediato comunicadas pelo magistrado judicial ao presidente do
tribunal” (n.º 7), que, “no caso de faltas por doença que se
prolonguem por mais de cinco dias úteis, ou sempre que o considere
justificado, deve ser exigida pelo presidente do tribunal a apresentação
de atestado médico” (n.º 8) e que “as faltas e as ausências previstas no
presente artigo são comunicadas pelo presidente do tribunal ao
Conselho Superior da Magistratura” (n.º 9).
É, pois, o EMJ que exige que as ausências por doença têm de ser
comunicadas, imediatamente, ao Juiz Presidente do Tribunal.
No caso vertente, o autor não comunicou a sua ausência ao serviço,
imediatamente, conforme se encontrava obrigado, uma vez que também
não se encontrava impedido de efectuar tal comunicação, pois fê-lo
junto da secretaria nos dias 04.03.2020 e 05.03.2020.
Como tal, mesmo reconhecendo tratar-se apenas de meras ausências
ilegítimas por falta de comunicação prévia ao Presidente do Tribunal, é
manifesto que as mesmas têm relevância e dignidade disciplinar: não se
tratando, summo rigore, de violação do dever de assiduidade, sempre

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manifestam a violação do dever de zelo, devendo considerar-se


preenchida a previsão da alínea e), do n.º 1, do artigo 83.º-H do EMJ.
Pelo que, também quanto a esta alegação, improcede a pretensão do
autor, pelos motivos supra expostos.

3.6. Quanto ao dia 19.05.2020, alega o autor que esteve ausente do


serviço para prestar assistência inadiável ao filho, menor de 10 anos,
que tinha sintomas compatíveis com a COVID 19.
Na manhã daquele dia 19.05, o ora autor comunicou telefonicamente à
secção que se encontrava impedido, determinando que a diligência
agendada para a manhã desse dia, no processo de promoção e protecção
n.º 421/12......., passaria para as 14h00. Para essa tarde estavam
também agendadas as diligências no processo n.º 101/20...... (promoção
e protecção) para as 13h45, no processo n.º 232/14....... (audição de
arguido) agendado para as 14h00 e no processo 59/18....... (julgamento)
agendado para as 14h15.
Cerca das 14h30/14h35, o autor contactou novamente a secção,
informando que não podia comparecer no tribunal por estar impedido
de se deslocar ao mesmo e, que todas as diligências ficavam sem efeito.
Tal foi comunicado, nesse momento, a todos os intervenientes
processuais que se haviam deslocado ao tribunal desnecessariamente,
quer os que permaneceram desde o período da manhã cuja diligência
foi reagendada para as 14h00, quer os restantes que tinham as
diligências agendas para o período da tarde.
Pelas 14h44, o Sr. Escrivão de Direito, por ordem do autor, comunicou
ao Juiz Presidente de Comarca a ausência do mesmo, fundando-se em
motivos pessoais.
O autor apenas comunicou a sua ausência ao Juiz Presidente da
Comarca no dia seguinte, 20.05.2020, pelas 04h08, através de correio
electrónico, indicando que foi aconselhado a ter o mínimo contacto
possível, principalmente com terceiras pessoas não abrangidas pelo
agregado familiar, em face da eventualidade de o seu filho mais novo
estar infectado com o vírus. Nessa comunicação não juntou qualquer
documento que atestasse a situação relatada. Aduziu ainda, na
comunicação dirigida ao Juiz Presidente da Comarca, que se tratou
aparentemente de uma situação de falso alarme e continuaria a
despachar os processos em casa, por não ter mais diligências agendadas
nessa semana. Concluiu, dizendo que a justificação apresentada se
subsumia a motivos pessoais, pois foi o mesmo que acompanhou o
menor durante o dia, pretendendo, por ora, que a justificação à
ausência ao serviço versasse sobre o dia em causa.
Consignou-se a este propósito no acto impugnado o seguinte
(transcrição):
(…)
No que respeita ao dia 19/05/2020, não existe justificação comprovada
para a falta, concordando-se com o relatório do Sr. Inspetor e com a
deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do CSM
quando concluem não ser credível a explicação avançada pelo
arguido. Efetivamente, caso o filho do Sr. Juiz de Direito arguido
estivesse, efetivamente, com sintomas compatíveis com a “SARSCoV-
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2”, afiguram-se três hipóteses: a) deveria a criança ter sido testada,


esclarecendo-se na dúvida (caso em que o arguido teria comprovativo
da realização do teste); b) deveria a criança ter-se deslocado ao
Centro de Saúde/Hospital ou médico para fazer a despistagem (caso
em que haveria comprovativo da deslocação e/ou consulta); c) ou, em
caso de dúvida e não havendo indicação do SNS para testagem nem
possibilidade de recurso a um médico, deveria ter sido cumprido um
período de 14 dias de isolamento profilático, isolamento este que se
estenderia a todo o agregado familiar. O que não é credível, à luz da
experiência comum que temos tido, ao longo de mais de 1 ano, da
sinalização de pessoas com sintomas compatíveis com a “SARSCoV-
2”, é que houvesse suspeitas de manhã, de tal modo que constituíssem
motivo ponderoso de ausência, e que, sem qualquer uma das
diligências referidas em a) e b), o arguido pudesse comparecer a uma
diligência, no mesmo dia, no período da tarde. Assim, no que toca ao
dia 19/05/2020, é forçoso concluir-se que ocorreu uma verdadeira falta
[in]justificada, por ausência de motivo ponderoso comprovado.
 (…).
Não se vislumbram motivos para dissentir do decidido na deliberação
impugnada.
Alega, ainda, o autor que tal falta poderia ter sido justificada ao abrigo
do artigo 10.º, n.º 1, do EMJ. Contudo, não comunicou, tal como estava
legalmente obrigado, a sua ausência ao Presidente do Tribunal da
Comarca, quando lhe foi possível, ou seja, no mesmo momento em que
comunicou à secretaria.
Argumenta, ainda, o demandante que a comunicação foi feita
previamente, pela secretaria judicial, tal como estabelece o artigo 10.º,
n.º 1, do EMJ, conforme ordenou. No entanto, a comunicação por
interposta pessoa não olvida a que tenha que existir uma comunicação
formal da ausência ao serviço, que deve ser realizada pelo próprio
magistrado ao órgão competente, uma vez que tal como vimos, não se
encontrava impedido de a fazer.
Em suma: esta justificação não foi aceite na Deliberação do CSM por
se entender que a mesma não merece credibilidade. Na verdade, o autor
não apresentou qualquer comprovativo da realização de um teste na
pessoa do filho, nem qualquer comprovativo da sua deslocação a
qualquer centro de Saúde, nem ocorreu qualquer período de isolamento
profilático por parte do demandante.
Por isso, a falta foi correctamente considerada como injustificada.
Pelo que, também quanto a esta alegação, improcede a pretensão do
autor, pelos motivos supra expostos.

3.7. Aduz, ainda, o autor que os factos que lhe foram imputados não
revelam falta de zelo e grave desinteresse pelo cumprimento dos seus
deveres funcionais, também tendo em conta o que decorre dos factos
dados como provados em 35) a 38) da deliberação impugnada, e que
nenhuma das suas ausências tinha “dignidade disciplinar”.
Resulta dos factos dados como provados invocados pelo autor o
seguinte (transcrição):

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(…)
35 - O arguido transmite a perceção de ser independente, isento nas
decisões, na conduta processual e empenhado, embora os seus atrasos
recorrentes e faltas tenham causado perturbação no serviço;
36 - Tem bom relacionamento com os funcionários judiciais,
mandatários, bem como com os demais magistrados;
37 - Trata com urbanidade e dignidade todos os intervenientes
processuais e o público em geral;
38 - Exerce as funções com reserva e serenidade.
(…).
Mesmo à luz destes factos, julgamos que o acto impugnado, ao
censurar disciplinarmente a conduta do autor, não padece de qualquer
erro. O que os autos evidenciam, ao invés, é que existiu efectivamente
violação do dever de zelo, que resultou em elevados prejuízos para o
serviço, e para as partes que se deslocaram ao tribunal sem que as
audiências para as quais se encontravam convocadas ocorressem, além
de que, o autor, reiteradamente, não comunicou as suas ausências,
evitando assim o recurso à substituição por forma a causar o menor
prejuízo para o serviço.
O que está em causa neste procedimento, é um conjunto de
comportamentos de violação grave e grosseira do dever de zelo, na
medida em que, ainda que se pudesse aceitar, em tese, as justificações
dadas pelo autor para estar ausente do tribunal, de modo algum se
consegue justificar a reiterada e renitente ausência de comunicação
prévia das referidas ausências ao Presidente do Tribunal da Comarca.
Secundamos, deste modo, o juízo efectuado no acto impugnado,
segundo o qual, tal recusa reiterada em cumprir uma regra de fácil
execução, para além de inexplicável, trouxe inegáveis prejuízos para o
serviço, bem como para terceiro.
Por isso, o demandante foi considerado autor de uma única infracção
grave, de execução reiterada e sucessiva por violação dos deveres
gerais de zelo e de assiduidade.
Quanto ao mais, atinente à suposta falta de dignidade disciplinar,
limitamo-nos a reproduzir nesta sede, pelo acerto hermenêutico, o que
se deixou estabelecido na deliberação impugnado a este respeito
(transcrição):
(…)
Não tem também razão o arguido quando alega que a falta de
comunicação da ausência ao Presidente do Tribunal não tem qualquer
relevância disciplinar. O n.º 1 do art. 10.º do EMJ exige, para que a
ausência seja legítima, dois requisitos cumulativos:
a) Motivo ponderoso;
b) Comunicação prévia (ou, excecionalmente, posterior) ao Presidente
do Tribunal.
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E o n.º 6 do art. 10.º do EMJ estabelece que: “a ausência ilegítima


implica, além de responsabilidade disciplinar, a perda de vencimento
durante o período em que se tenha verificado”. A norma não se refere
às faltas injustificadas (conceito autónomo), mas antes à “ausência
ilegítima”, numa clara referência ao disposto no n.º 1 do art. 10.º do
EMJ. Assim, a infração disciplinar, no que respeita aos magistrados
judiciais, pode decorrer da ausência de motivo ponderoso (falta
injustificada) ou da ausência de comunicação ao Presidente do
Tribunal (ausência que poderia ser justificada, mas é ilegítima).
Entende-se que assim seja, pois, a comunicação ao Presidente do
Tribunal não corresponde a uma mera formalidade, sendo antes
essencial para garantir a boa prossecução do interesse público na
administração da justiça (dever de todos os magistrados judicias,
consagrado nos arts. 3.º e 7.º-C do EMJ), já que permite que seja
acionada a substituição do magistrado, quando seja possível, a tempo
útil, bem como, não sendo possível a substituição, que sejam avisados
os intervenientes, evitando-se deslocações inúteis ao tribunal. (…).
(sublinhados nossos).
Pelo que também nesta parte, improcede a pretensão do autor, com este
fundamento.

3.8. Por último, ainda em sede de erro sobre os pressupostos, sustenta o


autor que não pode ser punido como reincidente, “uma vez que as
circunstâncias do caso não revelam a ausência de eficácia preventiva
da condenação anterior”.
Ora, o que é certo é que não se vislumbra motivo para divergir do
entendimento plasmado na deliberação impugnada, segundo a qual se
manifestava concordância “[…] também, com o relatório do Sr.
Inspetor e com a deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e
Disciplinares do CSM na parte em que concluem no sentido de ser
adequada ao caso a pena de suspensão, atendendo aos antecedentes
disciplinares do arguido. De facto, tendo já sido aplicada uma pena
de suspensão por violação do dever de zelo e de assiduidade (180 dias
de suspensão), exigia-se, no mínimo, que o arguido se tivesse
sensibilizado para a necessidade de cumprir escrupulosamente com
os seus deveres no que respeita à presença no tribunal e comunicação
atempada de eventuais ausências inevitáveis” (sublinhados nossos).
Com efeito, a dinâmica factual apurada nos autos de procedimento
disciplinar, evidenciam e indicam com clareza a ausência da eficácia
preventiva da condenação anterior, pelo que, julgamos improcedente a
pretensão do autor também nesta parte.
                  4. Da desadequação da medida da pena (violação do
princípio da proporcionalidade)
4.1. Por último, alega o autor que o acto impugnado aplicou uma
sanção excessiva padecendo de um erro grosseiro na determinação da
pena, que deveria ser, quando muito, a multa.
Estamos confrontados, nesta fase, já não com um vício de lei por erro
sobre os pressupostos da decisão, seja de facto, seja de direito: a
infracção existiu efectivamente; e as normas convocadas pela entidade
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demandada foram, no essencial, as correctas. O que agora se pede ao


Tribunal é que sindique a concreta medida da pena disciplinar, ou seja,
que promova uma accertamento judicial da dosiometria sancionatória
em concreto aplicada ao arguido de acção disciplinar administrativa.
Cumpre apreciar e decidir [11].

4.2. Vejamos o de que doutrina e jurisprudência têm vindo a postular,


de forma uniforme, o entendimento de que, na fixação da medida da
pena, a Administração, embora tenha de respeitar os parâmetros legais,
goza de certa margem de liberdade.
Este entendimento decorre, desde logo, da constatação de que “a
gravidade da pena a aplicar depende do grau de responsabilidade do
agente. Ora a apreciação desta está entregue ao critério dos titulares
do poder disciplinar que a avaliarão de acordo com os conhecimentos
da personalidade do infrator e das circunstâncias em que agia. […]
Por isso, ao contrário do que sucede no direito criminal, não se
estabelece a correspondência rígida de certas sanções para cada tipo
de infração, deixando-se a quem haja de decidir amplo poder
discricionário para punir as infrações verificadas”[12].
Note-se que o alargamento dos poderes de pronúncia do juiz que haja
de mover-se nos meandros processuais do contencioso administrativo,
decorrente da possibilidade de inclusive emitir pronúncias de
condenação dirigidas às autoridades administrativas (cfr. artigo 66.º, do
CPTA), não veio alterar o perfil de controlo da legalidade dos actos da
Administração pelos tribunais administrativos, que continua a reger-se
pelo princípio da separação de poderes. Fundamental, por isso, é que a
pretensão do autor se reporte a um aspecto vinculado do acto
administrativo a praticar - ou, pelo menos, que a apreciação do caso
concreto permita ao tribunal identificar apenas uma solução como
legalmente possível (redução da discricionariedade a zero).
Por isso, depois de consagrar, no seu artigo 2.º, o princípio da tutela
jurisdicional efetiva dos particulares perante a Administração, o próprio
CPTA estabelece, no seu artigo 3.º, n.º 1, que “no respeito pelo
princípio da separação e interdependência dos poderes, os tribunais
[…] julgam do cumprimento pela Administração das normas e
princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou
oportunidade da sua atuação”.
Assim, importa desde logo reter a ideia, resultante do citado artigo 3.º,
n.º 1, de que o princípio da plena jurisdição dos tribunais, ali
consagrado, não pode ser entendido de modo ilimitado. Na verdade,
existem zonas de actuação da Administração em que os tribunais
(administrativos e, ex vi artigos 168.º e 178.º, do EMJ, também a
Secção de Contencioso do STJ) não se podem intrometer. Existe aí,
pois, uma reserva de liberdade ou discricionariedade da Administração.
Portanto, ou existem “[…] vínculos jurídicos a condicionar, de
qualquer modo, a atuação da Administração no caso em apreço, e
pede-se ao tribunal que averigue da sua existência e (em caso
afirmativo) que os torne efetivos, ou não há vínculos desses e o
tribunal só pode abster-se de julgar a conduta administrativa.
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Naqueles aspetos em que as decisões concretas da Administração


relevam de uma qualquer opção discricionária ou de uma margem de
apreciação ou valoração autónoma, os tribunais […] – não
conseguindo formular sobre essa opção um juízo de desconformidade
com o bloco legal que lhe é aplicável – ficam, por lei, proibidos de
exercer um controlo sobre elas […]”[13] (sublinhado nosso).
Esta reserva de discricionariedade tem o seu fundamento, precisamente
pela razão que o mesmo artigo 3.º, n.º 1, do CPTA evidencia: a
necessidade de salvaguardar o princípio da separação de poderes,
plasmado no artigo 111.º, n.º 1, da CRP, nos termos do qual “os órgãos
de soberania devem observar a separação e a interdependência
estabelecidas na Constituição”, e elevado mesmo a limite material da
revisão constitucional - cfr. artigo 288.º, alínea j), da Lei fundamental.
É daí que decorre, e tal como este Supremo deixou estabelecido no
recentíssimo Ac. de 02.12.2021, no proc. n.º 37/20.3YFLSB, a fixação
de limites funcionais aos poderes de controlo dos tribunais da atuação
dos órgãos administrativos, independentemente dos meios de que se
possam socorrer. Tais limites “[…] concretizam-se através da restrição
da fiscalização jurisdicional à esfera da juridicidade, implicando que
aos tribunais se atribua apenas competências para aferir da
compatibilidade das decisões administrativas com a lei, os princípios
gerais de direito e as normas constitucionais que integram o bloco de
juridicidade. Ao fazê-lo, não estão a privar a Administração da
essência da sua função material, porque esta atua num campo em que é
heterodeterminada, aplicando ao caso concreto soluções pré-definidas
em normas e princípios jurídicos. Já são, no entanto, de excluir do
campo da jurisdição todos os poderes de decisão que englobem
questões de mérito, isto é, que impliquem a avaliação da oportunidade
e conveniência da atividade administrativa […]”[14].

4.3. No domínio específico do direito disciplinar vislumbram-se


inúmeras manifestações da formulação de valorações próprias da
função administrativa ou da margem de livre decisão.
Desde logo, é defendida de há muito a existência de um juízo de
oportunidade na própria instauração do procedimento disciplinar[15].
Esta tese, aliás, encontra respaldo normativo expresso no artigo 207.º,
n.º 1, da LGTFP, segundo o qual cabe ao órgão competente para
instaurar o procedimento disciplinar, uma vez recebida a participação
ou queixa disciplinar, decidir se ele deve ou não ter lugar. “Sendo
assim, ao poder de “participar” não corresponde, do lado passivo,
outro dever que não seja o de receber a participação e sobre ela,
proferindo despacho liminar, decidir se instaura ou não o
procedimento adequado” [16].
Além disso, na LGTFP preveem-se inúmeros espaços de abertura
normativa, nomeadamente, em sede de preenchimento de conceitos
indeterminados, como “prejuízo relevante para o serviço”, “sem
consequências importantes” (artigo 185.º), “infração que inviabilize a
manutenção do vínculo público” (artigo 187.º) ou a propósito da sanção
de suspensão, “comportamentos que atentem gravemente contra a
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dignidade e o prestígio da função” (artigo 186.º).


Não se pretende dizer com isso que existem matérias, como a da
determinação da medida da pena disciplinar, no âmbito das quais os
tribunais não podem exercer qualquer controlo: o que está em causa,
apenas, é a natureza do poder exercido em cada caso pela
Administração, o que implica apurar se determinada actuação se mostra
(no todo ou em parte) vinculada, isto é, moldada por regras jurídicas
que determinam esse concreto modo de agir, ou discricionária, caso em
que essa determinação legal não existe.
Tal também não significa obviamente que não existam aspectos que, no
exercício da atividade discricionária, se mostrem submetidos ao total
controlo judicial: eles existem. No entanto, são apenas os aspectos
vinculados dessa actividade discricionária (como, por exemplo, a
competência), ou os limites externos a qualquer actividade
administrativa, tais como os princípios a que a mesma deve obedecer,
cuja inobservância ostensiva (no caso da actividade discricionária) é
sempre judicialmente sindicável (v. gr., o princípio da
proporcionalidade).
Assim, o legislador, ao conferir aos tribunais poderes de jurisdição
plena (artigos 2.º e 3.º, do CPTA), acaba por, correspectivamente,
confiná-los à aplicação da lei e do Direito, vedando aos tribunais a
faculdade de se substituírem aos particulares na formulação de
valorações que pertencem à respectiva autonomia privada, e às
entidades públicas na formulação de valorações que, por já não terem
carácter jurídico, mas envolverem a realização de juízos sobre a
conveniência e oportunidade da sua actuação, se inscrevem no âmbito
próprio da discricionariedade administrativa. A reserva de
discricionariedade da Administração Pública, com a consequente
insindicabilidade judicial do mérito das medidas e opções
administrativas é, pois, corolário imanente do nuclear princípio
constitucional da separação de poderes.
Advirta-se, porém, na esteira dos ensinamentos da doutrina mais
autorizada, que ora se seguem de perto, que o n.º 1, do artigo 3.º, do
CPTA não opõe legalidade a discricionariedade; contrapõe, outrossim,
juridicidade a mérito. Pretende o Legislador com isto significar, em
bom rigor, não que o sumo de poderes discricionários se encontra fora
do domínio jurídico (out of law), ou que, a Administração Pública
estaria aí submetida apenas a regras de boa administração, ao arrepio de
todo e qualquer parâmetro normativo de controlo; ao contrário, o poder
discricionário partilha com o poder estritamente vinculado uma
característica transversal e inspiradora: é um poder jurídico.
Daí que, embora se detecte neste domínio, momentos próprios da
decisão que estão reservados à Administração (pelo juízo de prognose
e, porventura, de ponderação de interesses que convocam), e apesar de
ser inerentemente limitado o âmbito dos poderes de cognição dos
tribunais judiciais no quadro desta margem de livre apreciação
administrativa, a verdade é que, também aqui, a actuação
administrativa não é livre, antes estando sujeita a critérios jurídicos
(discricionariedade ou “livre decisão, que se move num campo de

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competência e legalidade, não equivale a arbitrariedade, que se move


num campo de absoluta liberdade, positiva e negativa”[17].
Esses critérios jurídicos são fixados, além do mais, pelo artigo 266.º,
n.º 2, da CRP, que sujeita toda a actividade administrativa aos
princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da
imparcialidade e da boa-fé. Tais princípios concretizam uma
objectivação dos critérios jurídicos de controlo do exercício da margem
de livre apreciação, conferindo verdadeiros parâmetros de
racionalidade a partir dos quais o Tribunal, face à dinâmica factual
apurada e a situação concreta que lhe é submetida, afere da respectiva
compatibilização com a juridicidade.
Importa, porém, ter presente que o controlo jurisdicional do exercício
administrativo de poderes discricionários é um controlo externo e
negativo, que apenas permite aos tribunais a anulação da solução
adoptada se ela violar os cânones da razoabilidade e racionalidade
básicas, quer em termos jurídicos, quer em termos de senso comum –
mas, já proíbe a definição, pela positiva, do caso concreto,
substituindo-se à Administração Pública na ponderação das valorações
que integram a margem de livre apreciação, salvo nas chamadas
situações de redução da discricionariedade a zero, a que alude o n.º 2,
do artigo 71.º, do CPTA[18].
Daí que a violação dos princípios aludidos no n.º 2, do artigo 266.º, da
CRP apenas devam determinar a anulação do acto administrativo se a
mesma for flagrante e ostensiva[19].

4.4. A própria jurisprudência, reiterada e constante, da Secção de


Contencioso do STJ, vem de há muito postulando precisamente a
existência dessa margem de livre apreciação que assiste ao CSM no
exercício do poder disciplinar, nomeadamente, na emissão do juízo
qualificativo dos tipos de infracção e na dosimetria concreta da
pena[20].
4.5. Neste domínio de apreciação jurisdicional da dosiometria de uma
sanção disciplinar, assume particular relevo o princípio da
proporcionalidade. Como bem aponta a doutrina da especialidade, “os
critérios enunciados para a ponderação discricionária da
Administração Pública apontam claramente para uma imposição de
proporcionalidade, adequação e necessidade da determinação da pena
disciplinar. Trata-se da prática de atos de poder público que limitam os
direitos dos trabalhadores e que, portanto, se devem sujeitar às
garantias do princípio da proporcionalidade. A atividade de escolha e
medida das penas é uma atividade claramente discricionária, mas não
arbitrária. O legislador aponta alguns critérios, mas não fecha mesmo
aqui a porta à consideração de circunstâncias que in casu sejam
relevantes para a escolha mais justa e proporcional: “todas as
circunstâncias em que a infração tenha sido cometida que militem
contra ou a favor dele”[21].
Dizendo por outras palavras:
“[…] da conjugação dos princípios constitucionais da prossecução do

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interesse público e da proporcionalidade há de resultar que a pena


disciplinar a aplicar […] seja sempre a “justa medida” reclamada
para salvaguarda desse mesmo interesse público, o que
necessariamente implicará que a sanção efetivamente aplicada ou a
aplicar seja necessária a acautelar as exigências disciplinares do
serviço, adequada a esse mesmo efeito e proporcional ou equilibrada
face aos interesses em presença, […]Não obstante a Administração
gozar de uma certa discricionariedade na eleição da pena a aplicar em
concreto […], não se pode esquecer que os poderes discricionários
conhecem limites, dados, justamente, entre outros, pelo princípio da
proporcionalidade. Assim sendo, este princípio impede a livre
discricionariedade da Administração para eleger a sanção, pelo que
[…] o exercício do poder disciplinar discricionário há de ser sempre
objeto de uma “revisão” posterior por parte do tribunal, destinada a
controlar a proporcionalidade da pena […]”[22] .
Ou, por outras palavras, ainda:
“O princípio da proporcionalidade é um “limite material à
intervenção” sancionatória, um parâmetro essencial da juridicidade
da aplicação de medidas sancionatórias, na determinação da
necessidade e da escolha da sanção e da sua medida, mas também no
âmbito do princípio da culpa, do princípio da tipicidade e da ilicitude.
Estabelecida a relação entre os factos e os recortes qualificantes das
normas, apurada a valoração reconducente dos factos a certa infração
disciplinar e à sanção (abstrata) que lhe corresponde, impõe-se a
determinação da concreta sanção a aplicar e ou da sanção e da sua
medida. Também no Direito Disciplinar da função pública temos dois
momentos, duas operações distintas. Há a proporcionalidade na
subsunção: a adequação do preenchimento de conceitos
indeterminados e de cláusulas gerais utilizados no recorte infracional
não pode deixar de ser controlada: para cada infração a lei prevê uma
determinada sanção e não a possibilidade de várias sanções para uma
mesma infração. E, depois, também há a proporcionalidade no
apuramento da concreta sanção. Situamo-nos aqui no plano da
ponderação dos “interesses presentes no caso concreto”, da avaliação
precisa dos factos, da natureza e gravidade da infração, do
circunstancialismo em que foi cometida, da categoria do funcionário,
da sua personalidade, do tempo de serviço ou antiguidade, da
intensidade da culpa e da natureza do serviço”. [23].

4.6. De acordo com o labor dogmático e exegético que recaiu sobre este
princípio, temos por assente que o princípio da proporcionalidade se
desdobra em três subprincípios: o princípio da adequação, o princípio
da necessidade e o princípio da proporcionalidade em sentido estrito.
O primeiro (adequação) impõe que as medidas adoptadas sejam aptas a
realizar o fim ou fins que têm em vista alcançar. A actuação
administrativa deve ser, assim, congruente com as circunstâncias do
caso e os fins que a justificam, impondo-se uma avaliação causa-efeito
entre, por um lado, o meio ou solução propostos, e, por outro, o
objectivo a atingir. Os critérios da Administração Pública têm de ser
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possíveis de conduzir ao fim do acto, que, por seu turno, deve coincidir
com o fim legal. Assim, quanto à primeira vertente, à questão que se
impõe formular (“a medida em causa é apropriada ou adequada à
prossecução do fim pretendido?”), a resposta deverá levar em conta que
“[…] a medida restritiva só será liminarmente invalidada por
inidoneidade ou inaptidão quando os seus efeitos sejam ou venham a
revelar-se indiferentes, inócuos ou até negativos tomando como
referência a aproximação do fim visado com a restrição […]”[24].
Por seu lado, o princípio da necessidade exige que se escolha, de entre
todos os meios idóneos e de igual modo aptos a prosseguir o fim
visado, aquele que produza um efeito menos restritivo. A medida
administrativa deve ser necessária para o cumprimento dos fins que
determinam a atuação pública, de tal sorte que a Administração só deve
sacrificar o direito do particular quando tal se revele indispensável para
a prossecução do interesse público. Está em causa aferir se existem,
porventura, outras medidas idóneas que sejam menos lesivas dos vários
interesses em presença. Destinado a detectar actuações excessivas,
“[…] o princípio da proporcionalidade assume-se como um princípio
comparativo, obrigando à realização de um confronto entre diferentes
meios: entre o meio efetivamente utilizado e outros meios
hipoteticamente disponíveis para alcançar o fim almejado pelo
legislador (e constitucionalmente almejado). O problema agora não é
tanto de eficácia do meio eleito pelo legislador como de eficiência ─
da sua eficiência comparada com outros meios, com outras soluções
legais, com outras vias de abordar o mesmo problema” [25].
Por último, o princípio da proporcionalidade em sentido estrito proíbe a
adopção de medidas excessivas ou desproporcionadas para alcançar os
fins pretendidos. A actuação administrativa deve, nesta perspetiva, ser
tomada na justa medida da situação carecida de resolução. A
Administração deve pesar a relação entre os benefícios que vai obter
para o interesse público e os prejuízos correlativos que vai impor ao
particular, exigindo-se que se esteja perante um meio equilibrado. Este
princípio põe em confronto os interesses perseguidos com a escolha do
procedimento e os bens, interesses ou valores sacrificados por essa
decisão, obrigando a verificar se o resultado obtido com a limitação de
efeitos configura uma justa medida face ao sacrifício de interesses que
a mesma implica. Meios e fim são, assim, “colocados em equação
mediante um juízo de ponderação, a fim de se avaliar se o meio
utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim”[26].
Tal implica o recurso a uma metodologia de ponderação de bens: de um
lado, o bem jusfundamental que é objecto de restrição; do outro, o bem
constitucional que dir-se-ia justificar essa mesma intervenção restritiva.
Esta última vertente só se pode ter por violada se, colocado o julgador
perante uma derradeira questão, se confronte com uma resposta
necessariamente negativa.
Dizendo por outras palavras: o resultado obtido é proporcional à
desvantagem que a medida adotada comporta?
Recuperando os ensinamentos da doutrina autorizada a que aludimos
supra, trata-se agora de “apreciar o desvalor do sacrifício imposto […]
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quando comparado com o valor do bem que se pretende atingir. Assim,


ao contrário do que acontecia nos controlos de idoneidade e de
indispensabilidade - exclusivamente centrados na apreciação do meio
e dando, à partida, como bom, ou pelo menos, inquestionável o fim
visado -, na proporcionalidade faz-se necessariamente uma valoração
das duas grandezas ou termos da relação em causa, apreciando-se a
gravidade da restrição em associação à importância e imperatividade
das razões que a justificam” [27].

4.7. Aqui chegados, e para que possamos apreciar e indagar da suposta


violação do princípio da proporcionalidade, em qualquer das suas
vertentes supra aludidas (adequação, necessidade e proporcionalidade
stricto sensu), importa ter presente o fim visado com a sanção
disciplinar.
Como tal, cumpre ler a decisão sindicada à luz das finalidades
concretas, principal e acessórias, que presidem à censura disciplinar.
É sabido que a sanção disciplinar constitui uma admoestação formal ao
trabalhador pelo seu incumprimento. O fim principal da sanção é, por
conseguinte, interpelar o trabalhador, tendo em vista a que este não
reitere a conduta censurada e actue no cumprimento dos deveres e
obrigações laborais e funcionais que sobre si impendem.
Não se trata aqui, porém, de privilegiar em exclusivo (nem sobretudo)
uma finalidade repressiva ou retributiva, em que avulte como principal
escopo da sanção o de castigar o infractor. Ao invés, a censura
disciplinar traduzirá essencialmente um meio de que a Administração
Pública se serve para repor o equilíbrio do corpo social
momentaneamente alterado pela violação de um ou mais deveres
funcionais. Neste conspecto, as medidas disciplinares, indo ao encontro
dessa necessidade de reequilíbrio, têm uma função essencialmente
preventiva e educativa ([28]).
Assim, as medidas disciplinares visam a proteção da capacidade
funcional da Administração e têm como principal finalidade a
“prevenção especial ou correção, motivando o agente administrativo
que praticou uma infração disciplinar para o cumprimento, no futuro,
dos seus deveres, sendo as finalidades retributiva e de prevenção geral
só secundária ou acessoriamente realizadas” ([29]).
Os fins essenciais são, portanto, o da prevenção especial, negativa e
positiva.
Em suma: o que justifica a punição disciplinar, em primeira linha, é
sobretudo o fim de prevenção especial. A aplicação de sanção
disciplinar visa evitar que ocorra novo incumprimento de um concreto
trabalhador - no limite, pondo termo à relação jurídica de emprego
público ([30]). De facto, nalguns casos, a prevenção negativa não
comporta senão a cessação da relação de trabalho, mediante a aplicação
de sanção extintiva da relação jurídica de emprego. Assim se explica
que seja ainda por apelo à finalidade de prevenção especial que as
medidas expulsivas sejam aplicadas em caso de infração que inviabilize
a manutenção da relação laboral e, portanto, naquelas situações em que
o agente, pela sua conduta, mostrou não dar garantias de poder
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continuar a contribuir para assegurar a capacidade funcional da


Administração.
Mas, logo a seguir podem ser apontadas outras finalidades, ainda que
acessoriamente: a de reprovação e a de prevenção geral.
Na verdade, recuperando aqui os ensinamentos da doutrina da
especialidade ([31]):
“A necessidade de punição não é indiferente ao efeito de interpelação
e dissuasão geral (função de prevenção geral positiva e negativa):
chama a atenção dos demais trabalhadores para o desvalor funcional
da conduta do funcionário infrator, demovendo-os da prática de ilícitos
disciplinares. […] Em segunda linha, [a sanção disciplinar] é um
instrumento mediato de promoção da disciplina organizacional, ao
reafirmar os deveres e obrigações de cujo cumprimento
fundamentalmente depende. A confiança a recuperar não é, por vezes,
apenas a do interlocutor disciplinar ou titular do respetivo poder (esta
não é recuperável nas penas expulsivas), é também a confiança dos
elementos da instituição no “acerto” da disciplina vigente
(previsibilidade nas atuações futuras; efeito preventivo ou dissuasor da
repetição da prática de infrações disciplinares) e, nalguns casos, a
compreensão social ante os ecos do exercício da disciplina
(inaceitabilidade dos “resultados” da não reação a ações ou omissões
disciplinarmente censuráveis) […]”.

4.8. Das diversas sanções estatutariamente previstas (artigos 85.º e ss.


do EMJ), in casu, cumpre analisar a aplicada ao autor – a pena de
suspensão efectiva, por 90 (noventa) dias – e apurar se a mesma é
manifestamente desadequada à gravidade dos factos praticados tal
como assentes.
Neste conspecto, importa aqui ter presente que, após proposta pelo Sr.
Inspetor, no Relatório Final, de aplicação ao autor, como reincidente,
da pena de 90 (noventa) dias de suspensão de exercício de funções,
para além da perda de vencimento e não contabilização de tempo de
serviço (cinco dias), nos termos dos artigos, 10.º, n.º 6, e 74.º alínea c),
do EMJ, por violação dos deveres de assiduidade, lealdade e de zelo,
previstos nos artigo 7.º-A, n.º 1, 7.º-C, 10.º, n.ºs 1, 2 e 7 do EMJ,
acolhida primeiramente na deliberação da Secção de Assuntos
Inspetivos e Disciplinares do Conselho Permanente do CSM realizada a
17.12.2020 [cf. pontos 13) e 14) do probatório], na deliberação
impugnada  foi o seguinte [cf. ponto 17)] do probatório, que aqui se
transcreve:
(…)
Resta, por fim, verificar se se deve manter o juízo concreto de
gravidade do ilícito e da culpa do arguido e a medida concreta da
sanção disciplinar de suspensão. O arguido expressamente invoca a
violação do disposto no art. 84.º do EMJ, estando aqui em causa,
especialmente o seguinte segmento desta norma: «na escolha e medida
da sanção disciplinar a aplicar, o órgão decisor tem em conta todas as
circunstâncias que, não estando contempladas no tipo de infração
cometida, deponham a favor ou contra o arguido, nomeadamente».

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E, aqui, discorda-se do juízo feito pelo relatório do Sr. Inspetor


(secundado na deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e
Disciplinares do CSM), que concluiu pela existência de uma ilicitude
muito grave, com o seguinte fundamento: «O grau da ilicitude dos
factos é algo elevado, uma vez que não se tratou de um episódio
isolado, antes tendo ocorrido cinco situações de faltas, que geraram
múltiplos adiamentos de diligências, com os inerentes transtornos para
os intervenientes processuais que se deslocaram a Tribunal, sendo que
se trataram de atrasos na sua extensão máxima, isto é atrasos que
levaram à não realização das diligências.». Porém, na graduação da
ilicitude de uma dada infração, ao abrigo do princípio da proibição de
dupla valoração, não podem ser tomadas em consideração as
circunstâncias concretas, na sua dimensão exata, que foram essenciais
para o preenchimento do ilícito típico, como decorre do já citado art.
84.º do EMJ. Ora, o arguido não praticou uma infração disciplinar por
se ter ausentado, sem justificação ou ilegitimamente, em cinco dias
intercalados, do tribunal. Já se verificou que este comportamento,
isoladamente ou globalmente considerado, não se integra nas alíneas
dos arts. 83.º-G a 83.º-I do EMJ. Está aqui em causa a construção de
uma infração disciplinar reiterada de execução sucessiva
(interpolada) em que é a valoração global do comportamento do
arguido, o qual, por força das suas características e circunstâncias
concretas – combinação de faltas injustificadas e faltas justificadas
com ausências ilegítimas por falta de comunicação prévia, com o
recurso a pretextos e expedientes processuais para não se deslocar ao
tribunal, com confusão de avisos e ordens a diferentes agentes do
tribunal, gerando confusão, com falta a diligências marcadas e
prejuízo para intervenientes processuais e adiamento de várias
diligências – permite sustentar uma violação grave do dever de zelo e,
consequentemente, o preenchimento da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-
H do EMJ. De outro modo, estaria em causa a mera ocorrência de
duas faltas injustificadas e 3 dias de ausência ilegítima do tribunal, o
que apenas permitiria concluir pela prática de cinco infrações
disciplinares leves.
Por conseguinte, não poderão estas mesmas circunstâncias, que foram,
como resulta do próprio relatório do Sr. Inspetor (aqui confirmado
pela deliberação da Secção de Assuntos Inspetivos e Disciplinares do
CSM), essenciais para o preenchimento do tipo de ilícito disciplinar
constante da alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ, ser duplamente
valoradas, agora para se concluir por uma ilicitude muito elevada no
âmbito das graduações possíveis do leque de potenciais violações da
alínea e) do n.º 1 do art. 83.º-H do EMJ. Deverá, assim, conclui-se
apenas por uma ilicitude mediana (bem como intensidade mediana na
violação dos deveres de zelo e de assiduidade), mantendo-se, no
restante, intactos os juízos relativos ao modo de execução e grau de
culpa do agente.
Mantém-se também alterado o juízo agravado de censura, no que
respeita à valoração da prevenção especial, pois o Sr. Juiz arguido foi
condenado por factos ocorridos entre 17/09/2013 e 06/09/2017 na

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pena única de 180 dias de suspensão de exercício e transferência para


tribunal diferente daquele em que exercia funções pela prática de uma
infração disciplinar por violação grave dos deveres funcionais de
prossecução do interesse público, de zelo e de assiduidade (por atrasos
na prolação de decisões, atrasos em depósitos de sentenças,
adiamentos injustificados e faltas injustificadas com inerente
adiamento de diligências). De acordo com o constante no relatório do
Sr. Inspetor, «passados cerca de três meses do regresso ao exercício de
funções e depois de cerca de nove meses de ser punido voltou a
incorrer em infrações disciplinares de idêntica e de similar natureza e
revelando com a sua postura que a sanção anteriormente aplicada não
alcançou suficiente advertência em termos do cometimento de novas
infrações disciplinares, pelo que deve ser punido agravadamente nos
termos do art. 86.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais».
Deverá, portanto, manter-se a sanção disciplinar nos 90 dias de
suspensão, uma vez que estamos perante uma moldura que vai dos 60
dias de suspensão aos 240 dias de suspensão, tendo esta assim já sido
fixada muito perto do limite mínimo.
IV – Deliberação
Em face do exposto, delibera o Plenário do Conselho Superior da
Magistratura, indeferir a impugnação administrativa, aplicando ao
Senhor Juiz de Direito Dr. AA, por violação dos deveres de zelo e de
assiduidade e pela prática da infração disciplinar prevista na alínea e)
do n.º 1 do art. 83.º-H do Estatuto dos Magistrados Judiciais, a sanção
disciplinar de 90 dias de suspensão. (sublinhados nossos).
(…)

4.9. Aqui chegados, podemos concluir que o acto impugnado observa o


princípio da proporcionalidade.
Quanto à vertente do princípio da adequação, essa observância é
inequívoca. Na verdade, sendo o propósito das medidas a prevenção de
que o autor reiterasse o incumprimento dos deveres funcionais e ainda,
acessoriamente, a defesa do prestígio do serviço público da Justiça,
julgamos verificada uma relação de causalidade positiva entre o meio e
o fim. Isto é, reconhecemos um grau sensível de capacidade dos meios
(aplicação da pena aqui sindicada) para intervir na realidade jurídica e
material no sentido de alcançar os fins propostos (prevenção especial e
geral). Ou seja, as medidas utilizadas pela entidade demandada são
aptas à salvaguarda dos fins visados.
Idêntico julgamento se deve ter por referência aos demais critérios que
norteiam o princípio sub judicio: não só a sanção é necessária a tais
desideratos, como o resultado obtido não é desproporcional à
desvantagem que a medida adoptada, comporta.
Faz-se notar que a sanção tomou em devida linha de consideração i) a
gravidade da censura de que o autor foi objeto, associada ii) à natureza
e contexto das infrações e iii) ao facto de ser reincidente.
Subjacente à adopção da sanção aplicada, portanto, está um juízo de
que as condutas apuradas são manifestamente ofensivas da função
pública desempenhada pelo autor, bem como o de que o ora
demandante agiu com grosseiro desinteresse pelos deveres
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profissionais.
Todas estas vicissitudes contribuíram para que a entidade demandada,
em juízos de prognose em que não se vislumbra qualquer erro
manifesto ou palmar, tivesse considerado: i) que o autor, pela sua
conduta, mostrou não dar garantias de poder continuar a contribuir para
assegurar a capacidade funcional da Administração da justiça no local
onde desempenhava funções, pelo que a única forma de evitar novo
incumprimento de deveres funcionais passava, não pela extinção do
vínculo, mas pela aplicação de uma sanção com privação de exercício
efectivo de funções (finalidade de prevenção especial); ii) que a
gravidade das infrações merecia uma censura o mais candente possível
dentro da moldura sancionatória aplicável, nomeadamente, através da
manutenção do vínculo funcional, embora com restrição ao exercício
efectivo de funções e da correspetiva percepção de remuneração por
um período limitado de 90 dias (finalidade de repressão ou retribuição);
e iii) que a confiança, quer dos demais elementos da instituição e da
Administração da Justiça, por um lado, quer da própria comunidade em
geral, por outro lado, apenas seria recuperada ou recuperável pelo
exercício disciplinar que culminasse numa pena de suspensão
(finalidade de prevenção geral).
Relembramos que apenas se pretende e pode sindicar, nesta fase, a
dosimetria concreta da pena. E, face à ausência de qualquer erro
manifesto na escolha da concreta medida da pena, nada podemos neste
ponto estabelecer. Se ao Tribunal é possível analisar da existência
material dos factos e averiguar se eles constituem infrações
disciplinares, já não lhe compete apreciar a concreta medida da pena,
salvo em caso de erro notório ou manifesto, o que não ocorreu no
caso dos autos.
Assim, não viola o princípio da proporcionalidade a aplicação de pena
de suspensão por 90 dias, que se mostra adequada e necessária à
gravidade da conduta, aos deveres violados e ao grau de culpa revelado
pelo autor da presente acção.
Por tudo o exposto, julga-se improcedente a pretensão do autor também
com este fundamento.

5. Destarte,
Julga-se improcedente a impugnação deduzida pelo Sr. Juiz de
Direito AA, contra a Deliberação do Plenário do Conselho Superior
da Magistratura de 20 de abril de 2021, confirmando, em
consequência, esta Deliberação.

III. DECISÃO

a) Por tudo o exposto, acordam os juízes que constituem a Secção do


Contencioso deste Supremo Tribunal de Justiça, em julgar
improcedente a impugnação deduzida, confirmando, em consequência,
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a Deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 20


de abril de 2021, tomada no âmbito do Processo Disciplinar n.º
...../PD/...10.
b) Custas a cargo do A., fixando-se a taxa de justiça em 6 UC (artigo
7.º, n.º 1, do RCP e Tabela I-A anexa).
c) Valor tributário: € 30.000,01 (artigo 34.º, n.º 2, do CPTA).
21 de Dezembro de 2021
Processado e revisto pela relatora, nos termos do disposto no artigo
94.º, n.º 2 do CPP.
Margarida Blasco (Relatora)
Maria Olinda Garcia, Ferreira Lopes, Fernando Samões, Catarina Serra,
Conceição Gomes, Leonor Cruz Rodrigues (Adjuntos)
Maria dos Prazeres Beleza (Presidente)

______________________
[1] Hoc sensu, vide Rui Medeiros / Tiago Maceirinha, «Artigo 271.º», in AA.VV., Constituição
Portuguesa Anotada, tomo iii, organização de Jorge Miranda / Rui Medeiros, Coimbra, Coimbra
Editora, 2007, p. 633; Pedro Fernández Sánchez, «Notas sobre o Enquadramento Constitucional do
Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas», in AA.VV., O Regime Disciplinar
dos Trabalhadores em Funções Públicas, Advogados e Magistrados Judiciais, coord. de Pedro
Fernández Sánchez / Luís M. Alves, edição do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos
Advogados e da Editora da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, p. 8
[2] Acórdão do TC n.º 33/2002 de 21.01.2002.
[3] Inter alia, vide o Acórdão de 23.06.2016 (proc. n.º 134/15.7YFLSB), in http://www.dgsi.pt/jstj,
cuja exposição aqui viemos seguindo de perto.
[4] Artigo 628.º do CPC, ex vi art. 4.º do CPP; Ac. STJ 11-03-2021, http://www.dgsi.pt
[5] Manuel Leal-Henriques / Manuel Simas Santos, Código Penal anotado, vol. ii, 3.ª ed., 2000,
Lisboa, Rei dos Livros, p. 1544.
[6] Acórdão desta Secção de Contencioso de 04-07-2019, proc. n.º 39/18.0YFLSB; vide ainda o
Acórdão do de 25-05-2016, proferido no processo n.º 55/14.0YFLSB, assim como, na
jurisprudência mais recente, os acórdãos de 20-02-2019, processo n.º 68/18.3YFLSB, e de 24-10-
2019, processo n.º 67/18.5YFLSB, ambos em www.dgsi.pt.
[7] Carlos Alberto Fernandes Cadilha, «A prova em contencioso administrativo», Cadernos de
Justiça Administrativa, n.º 69, 2008, Braga, Centro de Estudos Jurídicos do Minho, pp. 49 e 50.
[8] Carlos Medeiros de Carvalho, «O juiz administrativo e o controlo da prova procedimental no
processo disciplinar», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 101, 2013, Braga: Centro de
Estudos Jurídicos do Minho, p. 29.
[9] Fernandes Cadilha, cit, pp. 50 e 53.
[10] Medeiros de Carvalho, cit, p 21.
[11] Seguiremos de perto a exposição que esta Secção de Contencioso tem vindo a efectuar com
referência a este princípio de proporcionalidade (nomeadamente, os Acórdãos de STJ de
30.06.2020, proferidos nos processos que correram termos sob os n.ºs 3/20.9YFLSB e
46/19.5YFLSB, de 23.09.2020, no processo n.º  44/19.1YFLSB, a que fora apensado o processo n.º
54/19.6YFLSB, e de 16.12.2020, no processo n.º 11/20.0YFLSB, acessíveis em
https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/). 
[12] Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. ii, 10.ª ed., reimpressão, 2013,
Almedina, pp. 818 a 820.
[13] Mário Esteves de Oliveira / Rodrigo Esteves de Oliveira, Código de Processo nos Tribunais
Administrativos – volume i e Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, Almedina, 2006,
pág.123.
[14] António Cadilha, «Os poderes de pronúncia jurisdicionais na ação de condenação à prática de
ato devido e os limites funcionais da justiça administrativa», AA.VV., Estudos em homenagem ao
Prof. Doutor Sérvulo Correia. Volume ii, Coimbra, Coimbra Editora, 2010, pp. 167 e 168.

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[15] Raquel Carvalho, Comentário ao Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem
Funções Públicas, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2012, p. 131; Paulo Veiga e Moura /
Cátia Arrimar, Comentários à Lei Geral do trabalho em Funções Públicas, 1.º volume, artigos 1.º
a 240.º, 2014, Coimbra Editora, p. 597; aludindo a um «princípio de oportunidade temperado ou
“discricionariedade vinculada”», vide Ana Fernanda Neves, O Direito Disciplinar da Função
Pública, volume ii, 2007, dissertação de doutoramento, inédito, disponível e acessível para consulta
online na presente data in https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/164/2/ulsd054618_td_vol_2.pdf,
pp. 352 e passim.
[16] Ac. do STA de 08.06.2000, proc. n.º 41 879.
[17] Duarte Rodrigues da Silva, «Notas sobre o Contencioso Administrativo Disciplinar», in
AA.VV., O Regime Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas, Advogados e
Magistrados Judiciais, coord. de Pedro Fernández Sánchez e Luís M. Alves, edição do Conselho
Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados e da Editora da Associação Académica da Faculdade
de Direito de Lisboa, 2020, p. 71.
[18]  Maria Francisca Portocarrero, «Aferição judicial ab extra da legalidade do exercício
administrativo discricionário», Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 66, 2007, Braga, Centro de
Estudos Jurídicos do Minho, p. 34.
[19] Hoc sensu, vide, na doutrina, Mário Aroso de Almeida / Carlos Alberto Fernandes Cadilha
(Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4.ª edição revista, 2017,
Coimbra, Almedina, pág. 490) e Mário Esteves de Oliveira / Rodrigo Esteves de Oliveira (op. cit.,
pág. 125).
[20] Vejam-se os Acórdãos de:
i.    12-12-2002 (processo n.º 4269/01), 27-10-2009 (processos n.ºs 21/09.8YFLSB e
364/09.0YFLSB), 16-11-2010 (processo n.º 451/09.5YFLSB), 16-12-2010 (processo n.º
9/10.6YFLSB), 15-12-2011 (proc. n.º 87/11.0YFLSB), 05-06-2012 (processo n.º 127/11.3YFLSB),
19-09-2012 (processo n.º 10/12.5YFLSB), 18-10-2012 (proc. n.º 125/11.7YFLSB), 21-11-2012
(processo n.º 66/12.0YFLSB), 11-12-2012 (processo n.º 61/12.0YFLSB), 20-03-2013 (proc. n.º
96/13.5YFLSB), 21-03-2013 (processo n.º 15/12.6YFLSB), 26-06-2013 (processos n.ºs
132/12.2YFLSB e 149/11.4YFLSB), 15-10-2013 (processos n.ºs 30/13.2YFLSB e 44/13.2YFLSB)
[todos acessíveis em “Sumários do Contencioso”, em www.stj.pt];
ii.    26-02-2014 (proc. n.º 2/13.2YFLSB), 09-07-2014 (proc. n.º 57/13.4YFLSB), 16-12-2014
(proc. n.º 49/14.6YFLSB), 24-02-2015 (proc. n.º 50/14.0YFLSB), 22-02-2017 (processo n.º
10/16.6YFLSB), 30-03-2017 (processo n.º 73/16.4YFLSB), de 22-01-2019 (processos n.ºs
65/18.9YFLSB e 77/18.2YFLSB) e 10-12-2019 (processo n.º 2/19.3YFLSB), disponíveis em
http://www.dgsi.pt/jstj;
iii.   30-06-2020 (processos n.ºs 3/20.9YFLSB e 46/19.5YFLSB) e 23-09-2020 (proc. n.º
 44/19.1YFLSB, a que fora apensado o processo n.º 54/19.6YFLSB), e ainda de 16-12-2020, no
processo n.º 11/20.0YFLSB acessíveis em https:// https://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli
[21] Raquel Carvalho, op. cit., pp. 90 e 91.
[22] Veiga e Moura / Arrimar, op. cit., pág. 597.
[23] Ana Fernanda Neves, O Direito…, ii, cit., pp. 150 e 151, exposição posteriormente
aprofundada a pp. 447 a 453.
[24] Jorge Reis Novais, Os Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa,
reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, 2011, p. 168.
[25] Jorge Miranda / Jorge Pereira da Silva, «Artigo 18.º», in AAVV, Constituição Portuguesa
Anotada, Tomo i, 2.ª edição, coordenação de Jorge Miranda / Rui Medeiros, 2010, pp. 374 e 375.
[26] José Joaquim Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª edição,
13.ª reimpressão, Coimbra, Almedina, 2013, p. 270.
[27] Reis Novais, op. cit., pág. 181.
[28] Manuel Leal-Henriques, Procedimento Disciplinar. Função pública. Outros Estatutos. Regime
de Férias, Faltas e Licenças, 4.ª edição, 2002, Lisboa, Rei dos Livros, pp. 118-119.
[29] Luís Vasconcelos Abreu, Para o Estudo do Procedimento Disciplinar no Direito
Administrativo Português Vigente: As Relações com o Processo Penal, Almedina, 1993, p. 43.
[30] Ana Fernanda Neves, Direito Disciplinar…, ii, cit., pp. 513-514.
[31] Idem, ibidem.

www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/77ba481070756fb0802587b400344fa3?OpenDocument 58/58

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