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HISTÓRIA DA AMÉRICA II
Monitora: Janille Campos (Tradução)

 
Carta  aos  espanhóis  americanos  
Juan  Pablo  Viscardo  y  Guzmán  (1792)  

Irmãos e Compatriotas:

O quarto século de ocupação de nossos antepassados no Novo Mundo, é uma ocorrência


notável para que deixe de dedicar nossa atenção. O descobrimento de uma parte grande
de terra, é e sempre será, para os homens, o acontecimento mais memorável de sua
história. Mas para nós que somos seus habitantes, e para nossos descendentes, é um
objeto da maior importância. O
Novo Mundo é nossa pátria, e sua história a nossa, e nela que devemos examinar nossa
situação presente, para determinarmos por ela, a tomar o partido necessário para a
conservação de nossos direitos próprios e de nossos sucessores.
Embora seja a nossa história de três séculos para cá, relativamente as causas e efeitos
mais dignos de nossa atenção, sejam tão uniformes e tão notórios que se poderia reduzir
a estas quatro palavras: ingratidão, injustiça, servidão e desolação, convém, sem dúvida,
que as consideremos aqui com um pouco mais de atenção.
Quando nossos antepassados se retiraram a uma distância imensa de seu país natal,
renunciando não só ao alimento, como também a proteção civil que tinham ali e que não
podia alcançá-los a tão grandes distâncias, se expuseram a própria sorte, a procurar uma
subsistência nova, com as fatigas maiores e com os maiores perigos.
Desde que os homens começaram a unir-se em sociedade para seu maior bem, nós
somosos únicos a quem o governo obriga a comprar o que necessitamos a preços mais
altos, e a vender nossas produções a preços mais baixos. Parece que, sem renunciar todo
sentimento de vergonha, não se poderia somar nada à tão grande desprezo. Os interesses
do nosso país, não sendo os mesmo que os nossos, sua boa ou má administração recai
necessariamente sobre nós, e é evidente que a nós que pertence o direito de exercê-la, e
que somente podemos preencher suas funções, com vantagem recíproca da pátria, e de
nós mesmos.
Três séculos inteiros, durante os quais este governo tem tido sem interrupção nem
variação alguma, a mesma conduta conosco, são a prova completa de um plano
meditado que nos sacrifica inteiramente aos interesses e conveniências da Espanha;
mas, sobretudo, a passividade de seu Ministério.
A pretensão da Corte da Espanha de uma cega obediência as suas leis arbitrárias, está
fundada principalmente na ignorância, que procura alimentar e entreter, acerca dos
direitos inalienáveis do homem e dos deveres indispensáveis de todo governo. No
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entanto, apesar dos progressos de uma doutrina tão impactante, toda a história da
Espanha testifica constantemente contra sua verdade e legitimidade.
A conservação sobre os direitos naturais e, sobretudo, a liberdade e segurança das
pessoas e suas posses, é incontestavelmente a pedra fundamental a toda sociedade
humana, de qualquer maneira que esteja combinada. É pois uma obrigação
indispensável de toda sociedade, ou do governo que a representa, não somente respeitar,
mas também proteger de forma eficaz os direitos de cada indivíduo.
Queridos irmãos e compatriotas, se não há entre vocês quem não conheça e sinta suas
queixas mais intensas que eu poderia explicá-la, o ardor que se manifesta em vossas
almas, os grandes exemplos de vossos antepassados, e vossa valiosa ousadia, os
prescreve a única resolução que convém a honra que haveis herdado, que estimais e que
fazes vossa vaidade. O mesmo governo da Espanha os tem indicado a esta resolução,
considerando-os sempre um povo diferente dos espanhóis europeus, e esta diferença os
impõe a escravidão. Tentaremos por nossa parte ser um povo diferente; renunciemos a
um governo, cujo afastamento tão grande não pode procurar, ainda que em parte das
vantagens que todo homem deve esperar da sociedade que é membro; a este governo
que, longe de cumprir com sua indispensável obrigação de proteger a liberdade e
segurança de nossas pessoas e propriedades, tem posto o maior empenho em destruí-las,
e no lugar de esforçar-se a fazê-los felizes, acumula sobre nós toda espécie de
calamidades.
Por fim, abaixo qualquer aspecto que seja vista nossa independência da Espanha, se
verá que todos nossos deveres nos obrigam a terminá-la. Devemos fazê-lo por gratidão a
nossos maiores, que não pouparam seu sangue e seu suor, para que o teatro de sua glória
ou de seus trabalhos, não se converta em nossa miserável escravidão. Devemos a nós
mesmos a obrigação indispensável de conservar os direitos naturais, recebidos do nosso
Criador, direitos preciosos que não somos donos de desfazer e que não podemos ser
tomados sem injustiça, sob qualquer pretexto que seja; o homem pode renunciar a sua
razão ou pode esta ser arrancada à força? A liberdade pessoal não lhe pertence menos
do que a razão. O livre uso dos mesmos direitos é a herança inestimável que devemos
deixar a nossa posteridade.
Animados de um motivo tão grande e tão justo, podemos com confiança dirigirmos ao
princípio eterno da ordem da justiça, implorar em nossas humildes orações sua divina
assistência, e com a esperança de ser ouvido, consolarmos de antemão de nossas
desgraças.
Quantos se afastaram da opressão ou da miséria, virão a enriquecer com sua indústria,
com seus conhecimentos, e a reparar nossa população debilitada! Dessa maneira, a
América reunirá as extremidades da terra, e seus habitantes serão unidos pelo interesse
comum de uma só grande família de irmãos.  

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