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Gestão Cultural Profissional

António Jorge Monteiro *

Numa perspectiva da Gestão Cultural Profissional abordar a gestão das organizações Culturais tem
obrigado, sempre, a não deixar de ter em conta outros domínios associados e indispensáveis para a
sua contextualização bem como, de acordo com as necessidades, fazê-lo tendo em conta os diversos
aspectos organizacionais e espaciais, nomeadamente, Mundial, Ocidental, Europeu e Nacional.

Nos anos de 1980, depois do aparecimento e generalização, em Portugal, do novo conceito de


“Gestão”, em termos profissionais, começou a sentir-se a necessidade de orientar, tanto quanto
possível, esta nova área de conhecimento multidisciplinar e a sua estrutura académica, teórico-
prática, para os sectores de actividade económica, tradicionais, como o industrial, o comercial e os
serviços, começando a aparecer designações como: Gestão Industrial, Gestão Comercial, Gestão
Bancária, Gestão de Turismo e muitas outras.

De fora deste tipo de formação ficavam os sectores não predominantemente Económicos,


nomeadamente, o Social e o Cultural, para os quais, no entanto, a necessidade de lhes procurar dar
resposta, em termos de formação académica em Gestão, era maioritariamente e esmagadoramente
consensual.

Não muito consensual era se, para estes dois sectores, o Social e o Cultural, tradicionalmente e
maioritariamente pertencentes ao chamado sector “sem fins lucrativos” ou “terceiro sector”, em muitos
casos associados a fins caritativos, necessitavam de uma abordagem de Gestão distinta.

Sobre esta questão entendia-se que a Gestão no Sector Cultural, nomeadamente nas instituições
sem fins lucrativos, na esmagadora maioria dos casos, necessitava de uma atitude distintiva e
proactiva de procura de financiamento baseada no Patrocínio Cultural, no Mecenato Cultural e nos
apoios Públicos e Privados, tendo em conta a sua natureza particular e específica evidenciada por
William Baumol e William Bowen, na chamada Lei de Baumol (1) e pelo seu posicionamento na Teoria
da Hierarquia das Necessidades (Pirâmide) de Abraham Maslow (2).

Em 1990, foi iniciado um projecto de criação de uma “Escola de Gestão das Artes” (3), (4), inspirada
pela excelência do Colégio das Artes, criado em Coimbra, em 1547, por D. João III e dirigido por
André de Gouveia.

Entre 1990 e 1992, foram contactadas cerca de vinte personalidades, profundamente ligadas à
Gestão e à Cultura, no Porto e em Lisboa, a quem foi apresentado um anteprojecto e com quem foi
discutida a oportunidade e pertinência de se avançar com esta iniciativa.

De todos os contactados, a única opinião de que não se justificava a criação de uma formação
específica, em Gestão das Artes, foi do estimado e saudoso Professor Carlos Barral, Director do ISEE
Instituto de Estudos Empresarias, da Universidade do Porto e responsável pelo criação na região do
Norte, dos pioneiros programas de MBA Master Business Administration e CGG Curso Geral de
Gestão, da Universidade Nova de Lisboa.

Posteriormente, num período em que o conceito de “Terceiro Sector” estava de moda, o Professor
Doutor Alberto Castro, outra respeitável e estimada personalidade, com vasta experiência académica,
entendia também que uma formação académica em “Gestão de Instituições Sem Fins Lucrativos”
seria a abordagem mais recomendável, para satisfazer as necessidades do Sector Cultural.

Outra opinião curiosa sobre a Gestão Cultural Profissional, em Portugal, registou-se em 2004, durante
o Encontro Internacional de Teatro “Portogofone”, proferida pelo Presidente do Conselho de
Administração e Director Artístico do TNSJ Teatro Nacional de São João, Dr. Ricardo Pais que, em
resposta a uma pergunta de uma participante, referiu: “não me falem em gestão cultural, porque é a

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nova profissão para as tias”, tendo ficado por entender qual o verdadeiro significado que se deveria
atribuir à palavra ”tias”.

Por razões diversas, também, já abordadas no texto “Gestão Cultural em Portugal - Uma visão, um
(5)
projecto, uma história e vários protagonistas” , só em 1998 é retomado o que veio a ser o projecto
da Gestão Cultural, cujo historial e resultados estão reflectidos, também, nesse texto.

Foi nesta altura que se entendeu alterar o conceito de “Gestão das Artes”, relacionado directamente
com o subsector das Actividades Artísticas, para “Gestão Cultural” por forma a integrar, também, os
(6)
subsectores do Património Cultural e das Indústrias Culturais .

No referido texto, também, se pode ler: “Entende-se por Gestão Cultural a actividade de Gestão
orientada para as organizações do Sector Cultural, nas áreas do Património Cultural, das Actividades
Artísticas e das Indústrias Culturais, no âmbito do Estado, da Sociedade Civil e do Mercado.”, bem
como, “O projecto da Gestão Cultural tem sido, desde sempre, orientado por uma visão: ”Portugal, a
Europa e o Mundo, com um Sector Cultural Sustentável, gerido por profissionais competentes em
Gestão Cultural”.

Neste contexto, para permitir uma adequada formação nesta área de conhecimento, em Portugal,
surgiram os Programas de Formação Avançada e Pós-graduada em Gestão Cultural, com mais de
trezentas horas lectivas, primeiro no Porto orientado para as Regiões do Norte e Centro e,
posteriormente, em Lisboa, orientado para as Regiões de Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve.

Estes programas, quer cientificamente quer pedagogicamente, foram pensados em linha com o
“estado da arte” internacional, de formação em Gestão, de matriz Europeia Continental,
desenvolvidos a partir “da gestão para a cultura” e com uma orientação aplicada, que constituiu um
modelo, absolutamente, distinto de todos os programas que, posteriormente e até hoje, têm vindo a
aparecer, no mercado do ensino da Gestão Cultural, em Portugal.

A Gestão Cultural Profissional procura articular os Objectivos (programação) e os Recursos


(produção) das organizações Culturais, com eficácia e eficiência, no sentido de poder conseguir obter
os melhores Resultados (gestão) possíveis.

Nas sociedades contemporâneas que adoptaram a abordagem da Europa Continental ao Sector


Cultural, a Gestão Cultural Profissional é a actividade que integra de forma coerente todas as
vertentes das organizações culturais - Estratégica (Programação Cultural), Operacional (Produção
Cultural) e Financeira (Captação de Recursos) -, permitindo uma abordagem sistémica na procura
sustentável da satisfação das necessidades e desejos de todos os Stakeholders (partes
interessadas), nomeadamente os Criadores e os Públicos Culturais.

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Pelo exposto, se poderá constatar a pertinência de se procurar dar satisfação à necessidade de
competências específicas em Gestão Cultural, para as áreas do Património Cultural, das Actividades
Artísticas e das Indústrias Culturais, independentemente da sua dimensão organizacional, micro,
pequena ou média e da sua natureza pública ou privada.

Acontece que a sociedade contemporânea de consumo é o motor das economias de mercado


modernas e os seus gestores, naturalmente, são provenientes das formações tradicionais em Gestão
empresarial, orientada para o Sector Económico, espaço de funcionamento da maioria da Indústrias
Culturais, onde só, excepcionalmente, em algumas micro e, eventualmente, pequenas organizações,
poderemos encontrar Gestores Culturais.

Por outro lado, não poderemos deixar de ter em conta que, muito em particular no Sector Cultural, as
posições ou lugares de gestão, têm sido ao longo do tempo capturadas pelos boys and girls,
provenientes das conhecidas “economias de favor”, instrumento de poder e influência de diversas
organizações sociais, umas visíveis como os Partidos, os Governos e as Presidências da República,
outras ocultas, nomeadamente religiosas, esotéricas ou de orientação de gênero, que acabam quase
sempre por “impor” nesses lugares, pessoas da sua confiança pessoal ou de grupo, seguramente
com méritos “particulares” mas não com “mérito pessoal e profissional” reconhecido a um Gestor
Cultural, com formação e competências comprovadas.

Enquanto isto, será de tudo fazer para procurar que os Gestores Culturais Profissionais venham a
continuar a desenvolver as suas competências profissionais específicas, acreditando que possam vir
a ocupar o seu lugar, de direito próprio, nas organizações Culturais, principalmente nas áreas do
Património Cultural e das Actividades Artísticas, combatendo-se o amadorismo, por via não
tecnocrática, e o funcionamento socialmente e eticamente pouco responsável que tradicionalmente
têm vindo a instalar-se, nomeadamente nas organizações do Sector Cultural.

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* António Jorge Monteiro


Professor convidado, Orientador e Investigador na área de Gestão de Projectos Culturais.
Coordenador de múltiplos Projectos e Programas de Pós-graduação e Mestrado em Gestão Cultural,
em diversas Escolas Superiores e Universidades, nacionais e internacionais.
Escreve em Português-padrão consuetudinário.
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Referências bibliográficas
[a]
documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação

(1)
Baumol, William J.; Bowen, William G. - “Performing Arts - The Economic Dilemma”, The MIT
Press, Massachusetts, September 1968.
(2)
Maslow, Abraham H. - “Motivation and Personality”, Harper & Row Publishers, New York, 1954.
(3) [a]
Monteiro, António Jorge - “Projecto de criação de uma escola de Gestão das Artes - Algumas
considerações estratégicas”, edição PDF, Porto, Abril 1992.
(4) [a]
Monteiro, António Jorge - “Gestão das Artes: uma contribuição”, Público, Porto, Abril 1994.
(5) [a]
Monteiro, António Jorge - “Gestão Cultural em Portugal - Uma visão, um projecto, uma história
e vários protagonistas”, edição PDF, Porto, Novembro 2011.
(6) [a]
Monteiro, Antonio Jorge - “Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional / Cultura: algumas
definições e conceitos”, edição PDF, Porto, Abril 2015.
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Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com | Agosto 2015 | v1.1

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