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FUNDAMENTOS DE ERGONOMIA

Programa de Ergonomia Embraer


Comitê de Ergonomia
Grupo Ergo&Ação/UFSCar
Julho 2001

1
Apresentação

A Embraer em conjunto com a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e o


Instituto Nacional de Tecnologia (INT) do Rio de Janeiro, estará implementando
nos próximos dois anos o seu Programa de Ergonomia Industrial. Esta iniciativa
visa adequar as situações de trabalho na empresa aos preceitos da NR 17 do
Ministério do trabalho, bem como, colocar a empresa em consonância com as
práticas usuais nas organizações líderes do setor aeronáutico e aeroespacial.

Este caderno síntese apresenta os fundamentos da Análise Ergonômica do


Trabalho (AET), método referencial para a construção do programa. Objetiva
estabelecer para o leitor, uma base conceitual que lhe permita compreender e
cooperar com o programa.

O caderno está dividido em três capítulos. O capítulo 1, apresenta a ergonomia


enquanto disciplina e profissão. O capítulo 2, apresenta os conceitos
fundamentais de ergonomia. O capítulo 3, o método de Análise Ergonômica do
Trabalho. No conjunto, visa situar o que é ergonomia dentro da perspectiva da
AET.

Como resultado, espera-se estabelecer com este caderno uma linguagem comum
na empresa acerca da ergonomia e da sua importância enquanto ação de
prevenção e promoção da saúde e da produtividade da população de
trabalhadores da empresa.

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Sumário

1 Ergonomia

2 Fundamentos Conceituais para a AET

3 Método de ação ergonômica

4. Bibliografia

3
1. Ergonomia

Para estabelecer um sentido comum do que é ergonomia será utilizado como


referência a definição e os domínios de especializações estabelecidos pela
Associação Internacional de Ergonomia (IEA) 1. Na seqüência serão estabelecidos
limites para a delimitação da ação ergonômica no campo do trabalho.

1.1. Definição e especialidades

Ergonomia (ou fatores humanos) é a disciplina científica interessada com a


compreensão das interações entre os humanos e outros elementos de um
sistema, e a profissão que aplica teoria, princípios, dados e métodos para projetar
para aperfeiçoar o bem -estar humano e o desempenho do sistema global.
Ergonomistas contribuem na concepção e avaliação de tarefas, trabalhos,
produtos, ambientes e sistemas para os fazer compatível com as necessidades,
habilidades e limitações das pessoas.
Derivada dos termos gregos ergon (trabalho) e nomos (leis), denotando a ciência
do trabalho, a ergonomia é uma disciplina sistêmica que na atualidade se estende
por todos os aspectos de atividade humana. Ergonomistas trabalham
freqüentemente em setores econômicos ou domínios de aplicação particulares.
Domínios de aplicação não são mutuamente exclusivos e eles constantemente
evoluem; são criados novos e velho assumem novas perspectivas.
Domínios de especialização dentro da disciplina de ergonomia são amplamente
caracterizados como os segue.

Ergonomia física está preocupada com características humanas anatômicas,


antropométricas, fisiológicas e biomecânicas e como estas relacionam -se com as
atividades físicas. Tópicos pertinentes incluem posturas, manuseios de materiais,
movimentos repetitivos, Desordens muscoesqueléticas relacionadas ao trabalho,
layout dos postos de trabalho, segurança e saúde.

Ergonomia cognitiva está relacionada aos processos mentais, como percepção,


memória, raciocínio, e resposta motora, como eles afetam interações entre os
humanos e outros elementos de um sistema. Tópicos pertinentes incluem carga
de trabalho mental, tomada de decisão, qualificação, interação homem-
computador, confiabilidade, stress e treinando, integrando-os na concepção da
relação homem -sistema.

Ergonomia organizacional está relacionada com a otimização do sistema


sociotécnico, incluindo suas estruturas organizacionais, políticas, e processos.
Tópicos pertinentes incluem comunicação, administração de recursos, projeto do
trabalho, jornada de trabalho, trabalho em equipe, projeto participativo, ergonomia
de comunidades, trabalho cooperativo, novos paradigmas de trabalho,
organizações virtuais, teletrabalho, e administração de qualidade.
Para melhor entendimento, considere a Figura 1. Nela estão representados os
três campos de especialidade da ergonomia, que em última instância representam
1
http://www.iea.cc/

4
diferentes dimensões de uma situação de trabalho. Em outras palavras, toda
atividade de trabalho, comporta uma dimensão física, indicando a necessidade de
uma mobilização do corpo biológico do sujeito; uma dimensão cognitiva,
associada aos conhecimentos e raciocínios necessários para o desempenho do
trabalho, e, uma dimensão organizacional, caracterizando o caráter social do
trabalho, inserido numa relação de interdependência com outras atividades, com
as quais interage e se complementa. A atividade de trabalho representa a
intercessão destas três dimensões sendo irredutível a uma ou outra.

FÍSICA

OR
A
TIV

GA
I

N
GN

IZA
CO

CI
NA O
L

Figura 1: Campos de especialização da ergonomia.

No sentido atual do termo, a ergonomia surge nos anos 40, reunindo em seu
escopo uma diversidade de escolas com diferentes abordagens tanto no campo
da pesquisa como da ação. No que pese tal diversidade, existe uma convergência
entre os ergonomistas em dois pontos fundamentas:

a) a busca da adaptação do trabalho ao homem em contraposição à


adaptação do homem ao trabalho, preceito este vigente no período do
surgimento da ergonomia e presente ainda hoje em algumas abordagens de
áreas do conhecimento que atuam sobre o trabalho; e,

b) a ergonomia integra conhecimentos acerca do homem e utiliza tais


conhecimentos agindo sobre a relação homem-trabalho.

2. Fundamentos conceituais para a AET

Como já estabelecido a ergonomia integra conhecimentos de diferentes


especialidades. Os fundamentos ou pressupostos conceituais da ergonomia
caracterizam aquilo que é próprio desta disciplina, aquilo que constitui o olhar da
ergonomia e orienta tanto a pesquisa como a aplicação. São quatro os conceitos
básicos a serem compreendidos.

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O primeiro deles trata da distinção entre tarefa e atividade. Tarefa é aquilo que a
organização do trabalho estabelece ou prescreve para o trabalho a ser realizado.
A atividade, aquilo que o sujeito realmente faz para atingir os objetivos prescritos.
O esclarecimento destes termos leva necessariamente ao conceito de trabalho e
sua relação com a ergonomia.

O segundo pressuposto está associado ao conceito de variabilidade. Esta é


associada tanto às características e condutas do homem que trabalha, bem como,
às características da empresa. Trata-se de reconhecer a diversidade no interior
das situações produtivas.

A variabilidade está presente nas situações produtivas e decorre tanto dos


sujeitos como do dispositivo técnico e organizacional. Conceitualmente a
variabilidade está associada ao imponderável, ou aquilo que não foi previsto,
manifesto dentro das situações produtivas.

No referente à variabilidade dos sujeitos, a ergonomia classifica uma


variabilidade intra-individual, que busca considerar as alterações que o indivíduo
sofre ao longo do tempo, e a variabilidade inter-individual2, que considera as
diferenças biocognitivas e histórias de vida de cada um. Por exemplo, o tempo de
serviço numa dada atividade provoca mudanças na forma que um sujeito realiza o
seu trabalho (intra-individual). Quanto mais experiências ele experimenta mais ele
desenvolve a sua competência. Por outro lado, dois sujeitos com o mesmo tempo
de trabalho não necessariamente realizam suas atividades da mesma forma. Eles
desenvolvem competências especificas (inter-individual).

A consideração da variabilidade no projeto do trabalho do ponto de vista físico, se


dá por meio de princípios de projeto como o projeto para indivíduos extremos3,
que busca atender às variações antropométricas e biomecânicas por meio da
utilização dos valores mínimos e máximos das variáveis em questão, para uma
dada faixa da população, em contraposição ao uso das médias.

No tocante à variabilidade da empresa, relacionada aos materiais,


equipamentos e organização, destacam-se duas categorias: a variabilidade
normal 4, decorrente das características intrínsecas do trabalho executado e que
podem ser do tipo sazonal ou periódica; e a variabilidade incidental, decorrente
de eventos aleatórios e desconhecidos antes da sua revelação pelo revés.

No tocante à AET, o reconhecimento da variabilidade implica na necessidade


reconhecer a instabilidade implícita, no sistema homem-trabalho. O conhecimento
de suas fontes não permite a eliminação global das mesmas, porém permite
introduzir tal conhecimento na concepção dos dispositivos técnicos de produção e
na organização do trabalho. Os efeitos da variabilidade sobre a carga de trabalho
implicam na sua elevação ou diminuição e determina a necessidade de uma
reelaboração constante pelos trabalhadores do seu modo operatório.

2
Santos et al, 1997.
3
Iida, 1992
4
Gerin, et al, 1991.

6
O terceiro pressuposto trata do conceito de carga de trabalho. Este está
associado as diferentes dimensões humanas mobilizadas pelo o sujeito que
trabalha, englobando sua dimensão biológica, cognitiva e subjetiva.

O conceito de carga de trabalho está associado em ergonomia à fração da


capacidade de trabalho que o operador investe na tarefa5. Tal idéia pressupõe um
modelo de homem com capacidade de trabalho limitada, o qual regula sua carga
de trabalho, dentro dos limites da sua capacidade disponível, por meio da
modificação do seu modo operatório.

Para efeitos de análise, a carga de trabalho é dividida em uma parcela física e


outra mental, sendo a última subdividida em cognitiva e psíquica. Esta divisão da
carga de trabalho em dimensões é puramente teórica. A atividade assim como o
homem é um ser único, não podendo ser reduzido a uma ou outra dimensão.
Podemos analisar individualmente cada uma destas dimensões, porém a síntese
conclusiva do que é a carga de trabalho em uma atividade deve ser global.

É fácil compreender isto considerando, por exemplo, um sujeito unindo peças com
rebites e usando um martelete pneumático. Se considerados constantes, o rebite,
o instrumento e uma determinada postura, pergunta-se: seria a carga de trabalho
física a mesma para qualquer situação deste tipo? A resposta é não. Dependendo
da relevância da união específica em execução a carga cognitiva se altera.
Quanto maior a importância relativa da tarefa, maiores serão as exigências em
termos de raciocínio e de atenção.

. A figura 2 representa este modelo.


S i t u a ç ã o

Psíquica
Cognitiva
Física

Carga de trabalho global

Figura 2: Setores da Carga de Trabalho e regulação psíquica.

Qualquer quantificação da carga de trabalho, sob o ponto de vista da ergonomia,


é entendida como a busca de indicadores, dentro de uma situação produtiva
específica, e não a busca de valores absolutos.

Finalmente o conceito de modo operatório que decorre dos conceitos anteriores


e representa a resposta individual às determinantes de uma situação de trabalho.
Modo operatório é um termo próprio da ergonomia que visa caracterizar as
diferentes maneiras de se executar uma mesma tarefa. A adoção de diferentes
modos operatórios depende da capacidade de regulação que o sujeito dispõe
frente à situação.

5
Millot, 1988

7
Por exemplo, numa situação de trabalho onde o trabalhador tem dificuldade para
acessar um ponto de trabalho, irá exigir uma dada postura, sem grandes
possibilidades de variação. Portanto, seu modo operatório estará condicionado a
priori, com poucas ou nenhuma possibilidade de alteração. Por outro lado, em um
ponto de fácil acesso, o sujeito pode escolher sua postura e os movimentos que
irá realizar. Neste caso o espaço de regulação é grande e ele pode adotar
diferentes modos operatórios.

Os conceitos apresentados são fundamentais para a compreensão da AET e irão


constituir a base da linguagem a ser adotada no decorrer da Análise Ergonômica
do Trabalho das situações em estudo. Considerando tais conceitos, pode-se
estabelecer o que significa o sucesso de uma intervenção de ergonomia. São dois
os critérios: a) ampliação dos espaços de regulação; e, b) redução da carga
de trabalho.

Considera-se, portanto, que no desenho do trabalho deve-se buscar ampliar as


possibilidades de adoção dos distintos modos operatórios frente às circunstâncias
da situação de trabalho. Porém tal ampliação deve significar concomitantemente
uma redução da carga de trabalho.

Frente a tais objetivos a ergonomia não parte de um modelo definido a priori para
o desenho das situações de trabalho. Ao contrário, é a partir da realidade da
atividade e das hipóteses explicativas da carga de trabalho contextualizadas
numa situação específica, que a ergonomia buscará por meio da sua base
conceitual revelar as representação dos diferentes atores envolvidos e negociar
ações que objetivam fundamentalmente adequar a situação produtiva ao homem.
Na seqüência será explicitado o método de como faze-lo.

3. Método de Análise Ergonômica do Trabalho

Nos itens anteriores foram apresentados os fundamentos e os objetivos da


ergonomia. Na seqüência é apresentado o método de Análise Ergonômica do
Trabalho (AET). De uma forma geral, um método significa um conjunto de
procedimentos que orientam um pesquisador ou um prático na condução do seu
trabalho. O método deve conferir racionalidade ao conjunto de procedimentos
adotados.

Como apresentado na Figura 3, o método AET configura-se em dois grandes


blocos. O primeiro representa a fase de análise subdividida em três etapas:
análise da demanda, análise da tarefa e análise da atividade. O Segundo, a fase
de síntese, subdividida nas etapas de diagnóstico e de implementação. Em cada
uma destas etapas, o ergonomista colhe dados da situação sob investigação e
confronta com os conhecimentos acerca do homem no trabalho.

O método como estabelecido, não faz a distinção clássica entre teoria e


aplicação. No entendimento da AET este é um processo que se dá de forma
conjunta. Considera-se que numa situação específica, os conhecimentos acerca
do homem não podem ser aplicados de forma direta e passam necessariamente

8
por uma reinterpretação. Isto não quer dizer que não existam conhecimentos
válidos e generalizáveis sobre o homem no trabalho, mas sim que, é a situação
de trabalho quem condiciona a aplicação destes.
Situação de Trabalho

ANÁLISE ERGONÔMICA DO TRABALHO

Pesquisa Bibliográfia: Conhecimento acerca do homem no trabalho


Análise
Análise da Demanda:
Contexto
Análise da Tarefa:
Hipóteses Condicionantes
Análise da Atividade:
Dados Hipóteses Determinantes

Dados Hipóteses

Dados

Diagnóstico:
Modelo Operante

Implementação: Hipóteses

Caderno de Encargos Dados

Síntese

Figura 3: Meto de Análise Ergonômica do trabalho.

Na seqüência serão apresentados em linhas gerais os conteúdos de cada etapa,


bem como, as principais técnicas utilizadas.

3.1. Análise da Demanda

O ponto de partida de toda intervenção ergonômica é a delimitação do objeto de


estudo, definido a partir da formulação da demanda. A demanda, em ergonomia,
é uma demanda social, expressa em um quadro institucional, por um mais dos
atores sociais envolvidos com a situação de trabalho, cujos pontos de vistas não
são, necessariamente, coerentes.

A Formulação da demanda, ou seja, identificados os problemas no campo da


ergonomia que deverão ser estudados, permite estabelecer as possibilidades e
limites para a intervenção, bem como, definir as técnicas a serem utilizados no
processo de análise/síntese.

São fundamentais nesta fase os dados do serviço médico e os indicadores gerais


de produção, produtividade e absenteísmo. Via de regra a demanda surge de
questões relacionadas com a saúde ou com a produtividade.

Para compreender a demanda, o ergonomista deve estudar, ou estar


familiarizado, com os aspectos técnicos, econômicos e sociais da empresa. Para
não se afastar da realidade da situação de trabalho, é preciso conhecer a
tecnologia que os homens operam e a linguagem correspondente que adotam. É

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necessário igualmente, considerar os fatores econômicos que delimitarão, em
parte, as soluções que serão propostas. Finalmente deve-se levar em conta os
dados sociais: a caracterização da população de trabalhadores, o tempo de
serviço na profissão, o grau de escolaridade e as condições gerais de vida. Estas
informações serão importantes para situar os problemas formulados pela
demanda, dentro do contexto da situação de trabalho a ser analisada.

A análise da demanda no seu contexto social e organizacional constitui-se numa


fase preliminar onde o analista de ergonomia confronta os conhecimentos
adquiridos sobre a situação concreta de trabalho com aqueles que possui sobre o
homem em atividade. Desta confrontação surge um certo número de hipóteses
explicativas para a carga de trabalho, as quais, irão orientar o prosseguimento do
estudo. Na realidade em cada fase da análise estas hipóteses irão sendo
refinadas e aprofundadas, na media que o estudo avança.

Ainda, durante a análise da demanda, os ergonomistas buscam construir as


condições ideais que deveriam ser alcançadas para a condução da análise:

a) discutir os objetivos do estudo com o conjunto das pessoas envolvidas


(direção da empresa, serviços funcionais, gerências, supervisores,
trabalhadores e suas organizações).

b) obter a aceitação dos trabalhadores que ocupam o posto (ou postos) a ser
estudado. A participação destes trabalhadores é, de fato, indispensável para
realizar uma boa análise das atividades. Para julgar a pertinência das variáveis
e ajudar na interpretação dos resultados; e,

c) esclarecer as respectivas responsabilidades, tanto do analista, quanto da


direção da empresa, dos trabalhadores e das organizações destes, em relação
ao desenvolvimento do estudo e da utilização dos resultados.

O quadro 1 apresenta os principais dados requeridos.


Categoria Dados
Empresa Setores de Atividade.
Importância sócio-econômica.
Objetivos no curto, médio e longo prazo.
Tecnologia utilizada.
Modo de gestão do pessoal.
Sistema Produtivo Estrutura e funcionamento do processo global de produção.
Interações e inter-relações entre os sub-sistem as.
População Efetivo
Repartição por idade e sexo.
Tempo de serviço na empresa e no posto.
Nível de formação.
Nível de qualificação.
Situação de Trabalho Posição da situação dentro do sistema global de produção.
Condições ambientais de trabalho.
Condições organizacionais de trabalho.
Indicadores de saúde e Índices de produção e produtividade.
Produtividade Absenteísmo.
Rotatividade.
Afastamentos médicos.
Quadro 1: Dados a serem levantados na análise da demanda.

10
A análise da demanda é uma análise global. Ela indica para o prosseguimento do
estudo quais as situações que deverão ser priorizadas, bem como, orienta a
pesquisa bibliográfica a ser realizada em paralelo.

3.2. Análise da Tarefa

A análise da tarefa é o estudo daquilo que o trabalhador deve realizar e as


condições ambientais, técnicas e organizacionais desta realização. é fundamental
conhecer como o trabalho é organizado e prescrito no interior da organização pela
engenharia de métodos. Também, realiza-se uma descrição o mais precisa
possível da situação, observações e medidas sistemáticas de variáveis.

Dois tipos de instrumentos são fundamentais nesta etapa. Um primeiro, visando


conhecer o trabalho prescrito e as condicionantes para a sua realização. Outro,
que visa captar a percepção dos trabalhadores acerca dos problemas na
execução da tarefa. Particularmente, neste projeto, serão utilizados os
instrumentos apresentados nas figuras 4 e 5.

O instrumento apresentado na figura 4 (EWA) é um protocolo desenvolvido pelo


Instituo Finlandês de Saúde Ocupacional e objetiva uma primeira aproximação do
ergonomista com a situação em estudo.

Figura 4: EWA, Ergonomics workplace analisys.

O instrumento apresentado nas figuras 5a a 5c, foi desenvolvido pelo grupo


Ergo&Ação em projetos anteriores de ergonomia. O ponto de partida do
instrumento é a descrição da tarefa desenvolvida no EWA. O instrumento busca
estabelecer com maior precisão as tarefas executadas pelos operadores e o
tempo dedicado a elas.

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TEMPO (em minutos) POSIÇÃO
Não +5 até +30 até +60 até
ATIVIDADE Até 5 Em pé Sentado Andando Agachado
Participa 30 60 8 horas
Recepção e descarregamento
caixas com as amostras
Abertura das caixas e
identificação
Separação dos lotes e
inspeção das amostras
Colocar as amostras na estufa
Ensaio de determinação da
resistência à abrasão: preparação
das amostras

Figura 5 a: Tarefas e tempo de execução.

Num segundo momento o instrumento capta a percepção dos operadores acerca


das exigências das tarefas. Trata-se de considerar o que o trabalhador considera
penoso do ponto de vista físico, cognitivo e/ou psíquico.

Questão 2: Das atividades que você marcou na questão 1, assinale 2 (duas) que sejam mais
pesadas ou cansativas fisicamente:

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13
14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26
27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37

Figura 5b: Queixas associadas às tarefas executadas.

Finalmente o instrumento procura correlacionar as queixas com os diferentes


seguimentos corporais. Isto é feito por meio de um boneco adaptado do meto de
Corlet6.
TIPO DE DESCONFORTO GRAU DE INTENSIDADE
REGIÃO Pes Formiga- Agu- Insupor
o mento lhada Dor Leve Moderado Forte -tável
01 – Cabeça 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
02 – Pescoço 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
03 – Ombro Direito 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
04 – Ombro Esquerdo 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
05 – Coluna Alta 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
06 – Coluna Baixa 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
07 – Nádega Direita 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
08 – Nádega Esq. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
09 – Braço Direito 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
10 – Braço Esquerdo 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
11 – Cotovelo Dir. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
12 – Cotovelo Esq. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
13 – Antebraço Dir. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
14 – Antebraço Esq. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
15 – Punho Direito 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
16 – Punho Esquerdo 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
17 – Mão Direita 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
18 – Mão Esquerda 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
19 – Coxa Direita 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
20 – Coxa Esquerda 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
21 – Joelho Direito 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
22 – Joelho Esquerdo 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
23 – Perna Direita 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
24 – Perna Esquerda 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
25 – Pé Direito 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
26 – Pé Esquerdo 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Figura 5c: Desconfortos e graus de intensidade nas tarefas.

6
Corlett, e. m., et al, 1976.

12
A confrontação entre a percepção dos trabalhadores, as variáveis identificas pelos
ergonomistas e a revisão da literatura, possibilita ao final desta etapa estabelecer
quais tarefas deverão analisadas com maior profundidade. O que se realiza na
etapa de análise da atividade.

3.3. Análise da atividade

A análise da atividade, é o que o trabalhador, efetivamente, realiza para


executar a tarefa. É a análise das condições reais de execução e das condutas
do homem no trabalho. Assim como na fase anterior, deve-se proceder a uma
descrição o mais detalhada possível das atividades de trabalho. Medidas devem
ser realizadas, sejam sobre as pessoas que trabalham (medidas fisiológicas do
esforço), sejam sobre as atividades desenvolvidas (variação dos modos e dos
tempos operativos), sejam, ainda, sobre o meio ambiente (dimensões do espaço
e do local de trabalho, níveis de iluminação, ruído, temperatura, vibração). No
geral são avaliadas as posturas, ações, gestos, comunicações, direção do olhar,
movimentos, verbalizações, raciocínios, estratégias, resolução de problemas,
modos operativos, enfim, tudo que possa ser observado ou inferido das condutas
dos indivíduos.

Do ponto de vista instrumental são duas as principais técnicas utilizadas nesta


fase. Uma voltada para estabelecer as diferenças entre o trabalho prescrito e o
trabalho real. Outra para aprofundar as análises do ponto de vista fisiológico e
biomecânico.

A figura 6 ilustra os resultados obtidos com a técnica de entrevistas coletivas.


Para cada tarefa, são identificados as prescrições, as atividades realizadas, as
causas destas distinções e os seus efeitos, sobre os sujeitos e sobre os
indicadores de produção.

Prescrição Real Causas Efeitos


Os objetos chegam Pode chegar misturado Economia de espaço nos Isso exige uma atividade
separados em containers em um mesmo container veículos a mais, uma vez que as
por categoria. objetos registrados, transportadores. cargas desses containers
simples e malotes desde são separadas, antes de
que facilmente serem transferidas para
identificáveis. os setores
correspondentes.
Todos os objetos Não é feito o registro Grande diversidade de Economiza tempo,
registrados que entram (escaneamento) dos atividades simultâneas e permitindo adiantar o
na unidade devem ser objetos contidos nas volume imprevisível de trabalho no registrado e
conferidos. malas. A conferência objetos a serem tratados. liberar pessoal para
consiste em confrontar a ajudar nas atividades
quantidade recebida dos outros setores.
com a registrada na LR.
Alguns veículos são Conforme o caso, os As quantidades de Balanceamento da carga
responsáveis pela veículos entregam encomendas e de trabalho. Se fosse
entrega de malotes e qualquer coisa dentro do telegramas variam muito seguido o prescrito, no
telegramas, enquanto seu percurso. Os de um dia para outro. mesmo dia haveria
outros pela entrega de motoristas se organizam alguns motoristas super
malote e encomendas. para dividir melhor a ocupados enquanto
carga de trabalho dentre outros estariam ociosos
eles.
A preparação dos DAs Muitos carteiros Essa atitude é justificada Esse fato pode ser um
deve preceder o ordenam todos os pelo fato de haver muito dos responsáveis pelo
ordenamento do resto objetos antes de “gato” em função da atraso da entrega dos
dos objetos. prepararem os DAs. mau elaboração dos DAs nos locais pré
CEPs e do estabelecidos .
desbalanceamento entre

Figura 6: Confrontação do trabalho prescrito e do trabalho real.

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Paralelamente, análises cinesiológicas e biomecânicas das atividades são
realizadas. Tais análises consistem em descrições detalhadas das posturas
assumidas pelos sujeitos e das exigências sobre os seguimentos corpóreos em
termos de cargas e posturas. A figura 7 ilustra a técnica.

Segmento corporal ETAPA 1 : pega do ETAPA 2: leitura do ETAPA 3.1:


objeto simples objeto simples escaninho lateral
Alto
Pescoço Flexão 20 graus Flexão 30 graus Rotação 50 graus
Tronco Flexão 10 graus e Ereto Ereto
inclinação lateral
Ombro Dir. Abdução 40 graus e Flexão 50 graus Abdução 90 graus
rotação medial
Ombro Esq. Posição neutra Posição neutra Posição neutra
Cotovelo Dir. Flexão 20 graus e Flexão 100 graus e Flexão 30 graus e
pronação do antebraço pronação do supinação do
antebraço antebraço
Cotovelo Esq. Flexão 70 graus posição Flexão 110 graus e Flexão 90 graus
neutra antebraço supinação do
antebraço
Punho Dir. Posição neutra Flexão 10 graus e Extensão
desvio radial
Punho Esq. Posição neutra Extensão 10 graus Extensão
Mãos e Dedos Dir. Pega ampla Pinça Pinça
Mãos e Dedos Esq. Posição neutra Pega Pega

Figura 7: Análise cinesiológica e biomecânica.

Os dados colhidos devem ser confrontados, de um lado, com os conhecimentos


científicos, derivados das ciências que se debruçam sobre o estudo do homem no
trabalho, e de outro lado, com as diferentes interpretações identificadas no interior
da organização acerca da situação de trabalho em estudo.

A análise da atividade é encerrada com a formulação de uma explicação global


para a atividade de trabalho, para a qual, utiliza-se o Modelo Integrador da
Atividade de Trabalho, apresentado na Figura 8.

Trabalhador Contrato Empresa

Tarefa
Dados do Sujeito Complexidade da tarefa
Nível de Fromação Exigências físicas
Estado instantâneo Organização do trabalho
Vida fora do trabalho Dispositivos técnicos
Atividade

Carga de trabalho
Física
Saúde Cognitiva Produtividade
Psíquica

Figura 6: Modelo integrador da situação de trabalho.

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3.4. Diagnóstico

A etapa de síntese da análise ergonômica do trabalho, inicia-se com o diagnóstico


da situação de trabalho que fundamentará o caderno de encargos de
recomendações ergonômicas. O diagnóstico representa a recomposição das
análises parciais realizadas. Os dados levantados nas análises anteriores servirão
nesta fase como argumentos a serem confrontados e integrados numa síntese
que reflita os aspectos determinantes da situação de trabalho. Utiliza-se para
tanto o Modelo Operante, apresentado na Figura 7.

As conclusões de uma análise ergonômica, apresentadas na forma de hipóteses


para a ação, devem conduzir e orientar modificações para melhorar as condições
de trabalho em específico e da situação de trabalho, em termos mais gerais,
atuando sobre os pontos críticos que foram evidenciados, equacionando os
critérios de saúde e produtividade. As soluções apontadas no diagnóstico deverão
ser testadas, seja na forma de protótipos, seja em ambientes virtuais.

Resultados

Objetivos

Regulação Modo Operatório

Meios

Estado

Figura 7: Modelo Operante.

3.5. Caderno de encargos

As propostas testadas e aprovadas, passam a constituir um caderno de


encargos, tornando-se referência para projetos futuros e das práticas cotidianos
no posto (postos) estudados. Os cadernos de encargos, no geral deverão conter:

a) uma descrição geral do setor ao qual se destina;


b) uma descrição dos principais problemas encontrados no setor;
c) uma revisão da literatura acerca das questões evidenciadas;
d) uma listagem dos princípios que orientam o projeto do trabalho no setor; e,
e) os dispositivos técnicos e organizacionais recomendados para cada
atividade.

3.6. Considerações Finais

A apresentação geral do método AET e das principais técnicas a serem utilizadas


no decorrer do projeto visa estabelecer um referencial comum no interior da rede
de relacionamentos necessária para o sucesso do estudo. No decorrer do projeto,

15
serão discutidas em detalhes etapas apresentadas, bem como, serão
aprofundados os conteúdos técnicas a serem utilizadas.

Neste momento, é importante construir uma visão do todo. Ergonomia, como


qualquer outra disciplina, torna-se simples a partir do momento que se
compreenda seus métodos e pressupostos.

4. Bibliografia

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