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Curso de Pós-graduação a Distância

Saúde Mental na
Atenção Primária
e na Saúde da
Família

Autor:
Jeferson Camargo Taborda

Universidade Católica Dom Bosco Virtual


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SUMÁRIO

UNIDADE 1 - ENVOLVIMENTO FAMILIAR NA REABILITAÇÃO DO PORTADOR


DE DOENÇA MENTAL ............................................................................................ 03
1.1 Família nuclear como construção ....................................................................... 04
1.2 Famílias e relações de poder .............................................................................. 11
1.3 A família como agência e perspectiva rizomática ............................................... 13
1.4 Família como território de agenciamentos .......................................................... 15
1.5 A relação entre quem cuida e quem é cuidado ................................................... 18
1.6 Cuidadoras: desvalorizadas, mas sobrecarregadas ........................................... 22

UNIDADE 2 – ESTRATÉGIA DO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA E O


CUIDADO EM SAÚDE MENTAL ............................................................................. 25
2.1 Conhecendo as famílias do território de atuação ................................................ 27
2.2 Identificando os principais problemas de saúde mental ...................................... 28
2.3 Planos e programações de enfrentamento ......................................................... 32
2.4 Ações educativas aos problemas de saúde ........................................................ 35
2.5 Centro de Atenção psicossocial – CAPS ............................................................ 39

UNIDADE 3 – A SAÚDE MENTAL EM DIFERENTES CONTEXTOS – ESCOLA,


TRABALHO, COMUNIDADE .................................................................................. 44
3.1 Saúde Mental na escola .................................................................................... 45
3.2 Saúde Mental no trabalho ................................................................................... 49
3.3 Saúde Mental na comunidade ........................................................................... 52

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 57

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UNIDADE 1 - ENVOLVIMENTO FAMILIAR NA REABILITAÇÃO DO PORTADOR
DE DOENÇA MENTAL

"A loucura, longe de ser uma anomalia, é a condição normal humana.


Não ter consciência dela, e ela não ser grande, é ser homem normal.
Não ter consciência dela e ela ser grande, é ser louco.
Ter consciência dela e ela ser pequena é ser desiludido.
Ter consciência dela e ela ser grande é ser gênio."
Fernando Pessoa

Atualmente a família constitui o principal suporte


de apoio ao portador de doença mental, contudo nem
sempre foi assim. A fim de melhor compreender como a
família passou de simples coadjuvante a principal apoio
na questão da saúde mental, convém analisar seus
principais antecedentes: o confinamento e sua
desinstitucionalização.
Fonte: http://migre.me/dXLY7
No ocidente, os regimes de confinamento constituíram e ainda constituem
uma prática constante de controle social: nos primórdios da educação, os
internatos; na religião, os conventos; na área da saúde, os hospitais; e no campo
jurídico, a prisão, o regime de confinamento por excelência (DELEUZE, 1992). Para
tudo o mais que escapasse dos discursos de normalidade, o hospital psiquiátrico
seria o lugar da loucura.
Proveniente de um modelo biomédico centrado na doença, além do
confinamento, uma longa tradição instituiu a psicoterapia e os psicofármacos como
os principais procedimentos no tratamento moderno da doença mental. A família da
pessoa adoecida, quando não culpabilizada pelo desencadeamento da doença,
quase sempre não ficava de fora de seu tratamento.
Das iniciais experiências de superação dos manicômios, em que se incluem
Estados Unidos, França e Inglaterra, nenhuma conseguiu um maior poder de
transformação do que o movimento de crítica institucional ocorrido na Itália.
Coordenado por Franco Basaglia, a mobilização junto aos sindicatos, partidos
políticos, organizações não governamentais e intensos debates, possibilitam que
em 1978 o parlamento italiano aprovasse a Lei 180 que passa a garantir o

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fechamento dos Hospitais Psiquiátricos mediante novas propostas de atendimento à
saúde mental (MELMAN, 2006).
Segundo Melman (2006), dentre os principais pontos da Lei 180 constam: a
proibição de construir novos hospitais psiquiátricos, a instalação de serviços
territoriais, a abolição do estatuto de periculosidade do doente mental – considerado
agora cidadão de plenos direitos – e a proibição da internação ou tratamento
compulsório.
No Brasil, uma série de movimentos institucionais e políticos constituem a
Reforma Psiquiátrica Brasileira. Efeito tanto das críticas mundiais à ineficácia dos
manicômios quanto da denúncia e constatação de inúmeros casos de maus tratos,
mediante a regulação de leis, diretrizes e o desenvolvimento de novas políticas
públicas possibilitou-se um considerável avanço na desinstitucionalização da
loucura, passando a retirar a família de sua posição periférica em relação ao
tratamento (MELMAN, 2006).
A desinstitucionalização possibilitou assim, uma enorme transformação na
função da família em relação à saúde mental. De um grupo familiar com pouca ou
quase nenhuma participação na reabilitação do membro adoecido, a família tornou-
se objeto central do tratamento.

1.1 Família nuclear como construção

No pensamento ocidental, influenciado grandemente pelo idealismo


platônico, a ciência constituiu-se marcada por uma forte tendência generalista,
tornando-se muito comum a ideia de sujeito universal, como se fosse possível falar
dos seres (pessoas, grupos ou objetos) de uma forma válida para todas as nações
e períodos históricos.
Quando se fala do portador de alguma doença mental, não é difícil perceber
que os diagnósticos carregam esta noção universal, omitindo as singularidades da
pessoa em questão. O mesmo vale para o campo da família que muitas vezes é
impregnado de certo idealismo, limitando uma melhor compreensão que suas
múltiplas configurações podem abarcar.
Ariès (1978), em seu clássico estudo sobre a formação da família moderna,
afirma que a família tal como a conhecemos começa a surgir somente no século
XVII, graças ao movimento de escolarização promovido por moralistas católicos e

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protestantes. Se antes, tão logo a criança ganhasse alguma autonomia já era
misturada aos adultos (vizinhos, amigos, amos, criados...) para ofícios de
aprendizagem, é com a escolarização que emerge o sentimento de infância, e
consequentemente o sentimento de família (ARIÈS, 1978).
A princípio a escolarização das crianças se limitava às famílias mais
abastadas da época, as chamadas famílias burguesas. Durante muito tempo ainda,
o ofício da aprendizagem das
crianças pobres conviveu com a
escolarização das crianças ricas.
Posteriormente, proveniente da
consolidação do modo de vida
burguês como modelo de
sociedade, o sentimento de família
torna-se hegemônico perdurando
até os dias atuais (ARIÈS, 1978).
Fonte: http://pt.wikipedia.org/

Não por acaso, proveniente deste sentimento de família, uma intensa culpa
toma a família quando algum membro seu é acometido com transtornos mentais. A
autoestima dos pais é abalada de forma ainda mais intensa, pois estes sentem
como uma denúncia das falhas do sistema familiar (MELMAN, 2006).
Mas não foi somente o modelo de vida burguês que impregnou o atual
sentimento de família dos dias de hoje, conforme Deleuze e Guatarri (2004), boa
parte desta centralização provem do discurso psicanalítico. Ao desenvolver o
Complexo de Édipo como metáfora dos afetos inconscientes dos filhos pelos pais,
os estudos freudianos passam a colocar a família como o centro para o
desenvolvimento da personalidade. Com a aceitação cada vez maior da Psicanálise
pela ciência, e consequente popularização de seus princípios inclusive fora do
circuito acadêmico, as constatações sobre a relação entre as famílias burguesas de
Viena e a subjetividade que emergia, logo passaram a ser generalizadas a todas as
famílias (DELEUZE; GUATARRI, 2004).
O discurso da família burguesa associado ao Édipo psicanalítico enraizaram-
se no imaginário social forjando um modelo ideal de família: alicerçado numa
relação patriarcal, monogâmica, previsto numa união em amor e estabilidade entre

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seus elementos: pai, mãe e filho (os). Isto é, consolida-se a crença de uma família
padrão, calcada na harmonia e na ordem (SZYMANSKI, 2005).
Além disso, importantes transformações durante o século XX provocaram
diversos efeitos na família, principalmente nas últimas décadas. A hegemonia do
modelo burguês de família certamente dura até os dias atuais, contudo, a partir de
meados da década de 60, uma série de transformações sociais, políticas e
científicas (movimentos feministas, política neoliberal e a invenção dos
anticoncepcionais, por exemplo), possibilitaram diversas modificações no modelo
tradicional de família.
Dentre as novas configurações se destacam:

[...] a diminuição do número de filhos; matrimônios facilmente


desfeitos; a ida da mulher ao mercado de trabalho e mudança nas
configurações de poder no seio familiar; relações afetivas e de poder
mais simétricas entre os sexos; regras e funções menos rígidas;
maior proximidade relacional entre pais e filhos; liberação sexual
entre os casais; comunicação mais transparente entre os membros
familiares; maior longevidade dos pais e novas estruturas nas
famílias (ex. famílias não tradicionais, homossexuais, etc.)
(BAPTISTA, 2009, p. 62-63).

Mesmo que a família nuclear ainda seja o arranjo preponderante no Brasil,


um dos efeitos da desconexão entre um modelo tradicional de família e as novas
configurações constitui o estigma da “família desestruturada” (SZYMANSKI, 2005).
O conceito de família desestruturada seria assim, uma estratégia de individualizar e
reduzir a complexidade das injustiças e das desigualdades econômico-sociais
(TABORDA, 2012). A ilustração abaixo, analisada na dissertação de Taborda
(2012), exemplifica muito bem estes reducionismos:

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Figura 1 - Adesivos de carro

Fonte: Taborda (2012)

Para avançar este pensamento, já se busca compreender a família num


espectro muito mais ampliado, que de um modo geral designa qualquer grupo
social, unido por vínculos afetivos e econômicos, que compartilham ou não a
mesma consanguinidade (SZYMANSKI, 2005).
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) possui a seguinte
definição de família: “Conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco,
dependência doméstica ou normas de convivência, residente na mesma unidade
domiciliar, ou pessoa que mora só em uma unidade domiciliar” (IBGE, 2012).
Após esta breve discussão sobre a necessidade de um entendimento
ampliado da família atual, é possível avançarmos a outro discurso bastante
predominante, tanto no senso comum quanto no meio científico: a família como
núcleo da sociedade. O modelo ecológico de Bronfenbrenner pode auxiliar a
compreender visualmente isso.

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Figura 2 - Modelo Ecológico de Bronfenbrenner

Fonte: De Antoni; Koller (2000)

Quando se pensa no portador de doença mental é inevitável não pensar em


sua família e nas influências que os cercam: esta família possui um plano de saúde
particular ou depende exclusivamente do governo? Como ocorrerá a escolarização
da criança portadora de doença mental? Um pai de família não possui condições
mentais para continuar provendo sua família, e agora? Enfim, as influências são
sistêmicas.
Na perspectiva ecológica, baseando-se no modelo das “bonecas russas”, um
sistema se conecta a outro subsistema, tendo no indivíduo e sua família seu centro.
Os sistemas seriam assim dimensionados: no microssistema se encontram as
relações cotidianas como a casa, a escola, o trabalho ou vizinhança; o
mesossistema será o entrecruzamento entre os microssistemas (paciente e
profissionais de saúde, pais e professores...); o exossistema é quando um terceiro
sistema afeta o sujeito indiretamente (por exemplo, um pai frustrado no trabalho
pode “descontar” suas frustrações maltratando seu filho); no macrossistema são as
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dimensões culturais abrangentes que afetam o modo de ser dos sujeitos – sistema
político, religioso e econômico (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2008).

A presença ou ausência de valorização da família, de políticas


sociais para o combate à violência e a promoção da educação e
saúde, de políticas econômicas para melhorar a qualidade de vida
da população, são exemplos de macrossistema que têm reflexo
direto no desenvolvimento do sistema familiar. (DE ANTONI;
KOLLER, 2000).

Por fim, há o cronossistema, que é a dimensão temporal dos acontecimentos.


Para Papalia, Olds e Feldman (2008), seriam duas as principais formas de
acontecimentos: primeiro, há os eventos “normativos”, que são os eventos mais ou
menos esperados, pois ocorrem de maneira semelhante com a maioria das pessoas
– podendo ser eventos biológicos (puberdade ou menopausa) ou culturais (entrada
na escola formal ou casamento).
A segunda categoria são os eventos “não-normativos”, que podem ser um
grande gerador de estresse nos sujeitos envolvidos1 (marcados por situações
típicas, mas não esperadas, como a morte de um familiar, ou uma situação atípica:
uma mãe grávida que descobre que seu filho nascerá com uma grave doença
mental, por exemplo. Independente do sentido positivo ou negativo que o evento
imprima, como uma gravidez não planejada, de qualquer forma, o fato de não ser
esperado é o que provavelmente poderá ser um grande gerador de estresse nos
sujeitos envolvidos (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2008).
Mesmo contemplando uma perspectiva sistêmica, trata-se de uma visão em
que estes sistemas se encontram plenamente integrados, tendo na família um
centro que sempre busca seu equilíbrio. Não por acaso, esta concepção do corpo
familiar se encontra estreitamente próxima ao racionalismo mecanicista da
biomedicina, entendendo o corpo humano como um conjunto de sistemas tendendo
a homeostase (CAMARGO Jr., 2005).

1 A questão do estresse do cuidador será abordada mais à frente.


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Figura 3 – Visão Mecanicista

Fonte: http://www.sxc.hu/

De fato, o entendimento da família como um centro de onde derivam todas as


outras relações pode ser uma forma de compreender o envolvimento da família no
cuidado ao portador de doença mental. Contudo, mesmo partindo de uma noção
intersistêmica, uma das limitações de perspectivas que individualizam a família é
que nem sempre estes sistemas se encontram integrados ou nem mesmo buscam
um senso de equilíbrio (DE ANTONI; KOLLER, 2000).
Só para citar duas situações que poderiam escapar deste discurso: Uma
criança portadora de doença mental, deixada para adoção desde bebê, pode ter
sido desde sempre institucionalizada e nunca ter conhecido o que é pertencer a
uma “família” nos moldes tradicionais. Um morador de rua com transtornos
psiquiátricos pode não ter mais nenhum vínculo familiar ou social.
É claro que a família como o primeiro suporte social repercute de modo
inigualável no desenvolvimento da subjetividade dos sujeitos. Seria um erro crasso
contrariar aqui está sua função. A proposta é refletir sobre como as teorias
científicas – em que se incluem as teorias sociais e políticas – deslocaram a família

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de uma posição opaca e periférica para uma posição central no entendimento de
cuidado da sociedade e, consequentemente, na atenção à saúde mental.

Exercício 1

1. Qual a melhor definição para o termo família desestruturada?


a) São famílias nucleares fora dos padrões normais, por isso são chamadas
de famílias “problemáticas”.
b) Uma estratégia de individualizar e reduzir a complexidade das injustiças e
das desigualdades econômico-sociais.
c) São aquelas famílias de pais separados, cujos filhos são criados pelas
avós.
d) Famílias que não conseguiram desenvolver o complexo de Édipo, segundo
a Psicanálise.

1.2 Famílias e relações de poder

Uma grave limitação para compreensão das famílias será pensá-las longe de
suas lutas e contradições, correndo-se então o risco de omitir as relações de poder
e de força, implícitas a toda e qualquer relação.
Para ampliar nosso entendimento sobre o relacionamento familiar com o
portador de doença mental e com as políticas públicas, analisemos o entendimento
de poder em Foucault (1979).
Para este autor, o poder não existe, o que existe são relações de poder, e
parte dos seguintes pressupostos: a) não existe poder pelo fato de que o poder não
é algo que se possua em detrimento de um outro que não “teria” poder; b) o poder
é capilar, isto é, só existe em rede entre outras relações de poder; c) não existe
nem antes nem depois do ato, visto que aplica-se a pessoas livres2; e d) ao invés
de um poder repressor, ele defende que antes de tudo, o poder é produtivo
(FOUCAULT, 1979).

2Uma condição intrínseca do poder é que só ocorre entre sujeitos livres. Portanto, toda relação de
poder, inevitavelmente produz focos de resistência. Quando não há liberdade o que há são relações
de violência (FOUCAULT, 1979).
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Entendendo as relações de poder também como sinônimo de relações
políticas, dentre os efeitos da centralização da família está a despolitização de suas
outras muitas conexões com o mundo que lhe cerca.
Neste sentido, as políticas públicas de saúde mental seriam vistas apenas
como paliativas, já que a principal responsável seria a própria família: “A nossa
sociedade ocidental investiu e idealizou intensamente o núcleo familiar. Já que a
família é tudo, também é responsável por tudo. Se tudo remete à família, tudo é
culpa da família”. (MELMAN, 2006, p. 38).
É necessário, portanto, avançarmos para além de concepções individualistas
para noções mais ampliadas sobre o campo da família. Porém, não parece ser
tarefa fácil transpor um modelo de família como núcleo primário, visto que na
própria Constituição Federal de 1988 há uma evidência muito forte deste
pensamento, no Art. 227:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e


ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão. (BRASIL, 1988).

A Constituição Federal de 1988, como parte destas relações de poder, tem


em seu artigo 227 um instrumento que determina à família a responsabilidade
primária a cumprir estes deveres. É preciso salientar, conforme Pinto (1999), que as
Constituições brasileiras – que ao todo foram oito em duzentos anos de história –,
ao mesmo tempo em que reordenam as instituições e seus pactos regentes,
rearranjam também as relações de força dos grupos sociais que constituem a
sociedade.
Contudo, Cruz, Hillesheim e Guareschi (2005), argumentam sobre tamanha
responsabilidade incumbida à família, em especial as mais pobres, se se considerar
que muitas vivem abaixo da linha da pobreza: “Como as famílias poderiam
assegurar os direitos de acesso à saúde, educação, alimentação e lazer [...]? Quem
está sendo negligente? A família ou o Estado?” (CRUZ, HILLESHEIM e
GUARESCHI, 2005, p. 47).
A doença mental, seja ela congênita ou adquirida, seria assim um desafio a
ser vencido, de maneira quase exclusiva, pelas famílias.
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1.3 A família como agência e a perspectiva rizomática

O mundo não começa nos pais, afirmam Deleuze e Guatarri (2004), visto que
estes também fazem parte de outros inúmeros processos. Segundo estes autores, a
família deve ser concebida como uma agência, como uma dentre tantas outras
formas de conexão com a existência (DELEUZE; GUATARRI, 2004).
Um modo para compreender os efeitos múltiplos e contraditórios na qual a
família se encontra está em partir de uma perspectiva “arborescente” para uma
perspectiva “rizomática”.
Na perspectiva tradicional e, portanto, a mais comum, há o modelo
arborescente, se baseando na metáfora das árvores. Tendo como pressuposto uma
origem primordial, a família seria uma semente ou raiz, que ao evoluir constituiria a
grande árvore chamada sociedade. Trata-se de um modelo transcendental que
durante séculos perdura no modo de compreensão no ocidente (DELEUZE;
GUATARRI, 2000). Além disso, dentro de um discurso universal, este seria um
modelo válido para todas as famílias.

Quadro 1 - Diferença entre modelos

Modelo Arborescente (Árvore) Modelo Rizomático (Rizoma)


Estrutura Sistema
Hierarquia / Filiação Aliança
Linearidade Imprevisibilidade
Início, meio e fim Intermezzo (entre)
Pivô central Multiplicidade
Fonte: Elaboração Própria

Em botânica, chama-se rizoma o tipo de caule de algumas plantas, que


possui a característica de crescerem horizontalmente, em geral no meio
subterrâneo, mas que podem avançar para fora do subsolo em porções aéreas.3
Deleuze e Guattari (2000), utilizam este conceito da botânica para enriquecer
a perspectiva do agenciamento: “um rizoma não começa nem conclui, ele se
encontra sempre no meio, entre as coisas, interser, intermezzo. A árvore é filiação,
mas o rizoma é aliança, unicamente aliança” (p. 36).

3 A grama e a hera constituem alguns exemplos de rizoma. Para um melhor entendimento da


perspectiva rizomática acesse: http://www.rizomas.net/filosofia/rizoma/76-mil-platos-trechos-
selecionados-do-vol-1-rizoma.html.
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Enquanto na metáfora da árvore os seres evoluem verticalmente a partir de
uma origem primordial e transcendental, na perspectiva rizomática os seres
encontram-se espalhados pela superfície, isto é, agenciados, mediante a
multiplicidade e a imanência.
Dito de outro modo, quando se afirma que a família vai muito além de um
núcleo “duro” da sociedade, muito além de uma família-cuidado, não se quer
diminuir sua responsabilidade, mas evidenciar sua “permeabilidade”, como mais um
modo, dentre outros inúmeros modos, de agenciar o sujeito ao mundo.
A família continua como o primeiro suporte social dos sujeitos, mas ao
posicioná-la como agência, tem-se uma equivalência nas relações de força, visto
que a atividade do cuidado pelas famílias, só existe conectada com todas as outras
dimensões da sociedade (TABORDA, 2012).
A Reforma Psiquiátrica assim como a atual situação econômica do país,
garantindo um melhor poder aquisitivo das famílias, constituem ótimos exemplos de
como as questões políticas e econômicas afetam diretamente o modo de vida de
cada portador de alguma doença mental, e de todos os mais próximos de seu
cuidado, sejam estes familiares ou não familiares, famílias tradicionais ou não
tradicionais.
Ao escapar da noção transcendental de núcleo, o agenciamento familiar
também possibilita compreender o modelo tradicional de família, assim como as
novas configurações, como construções sociais que respondem às atuais
transformações na sociedade, e não apenas como binômios que limitam e
patologizam famílias entre “estruturadas” e “desestruturadas”.
Independentemente de sua configuração, o que a atual literatura científica
aponta, é que um bom relacionamento familiar se constitui como fator de proteção
no desenvolvimento de transtornos mentais (SOUZA et al, 2011). Também é
consenso que há um grande sofrimento quando uma doença mental emerge,
abalando a todos, independente de sua configuração. O sentimento de culpa e de
fracasso, bem como a desorientação quanto ao futuro e aos procedimentos frente à
doença constituem grandes desafios aos membros do grupo familiar (ROMAGNOLI,
2006; MELMAN, 2006).
O entendimento da família como um suporte agenciador possibilita sair de
discursos que culpabilizam ou vitimizam os familiares, além de escapar do círculo
vicioso que centraliza o problema no doente ou na família.

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1.4 Família como território de agenciamentos

Compreender a família como agência significa não mais remetê-la a um


território fixo, mas um território mutante, em que acontecimentos, como a
emergência de uma doença mental, possibilitam a criação ou não de novos
territórios existenciais (ROMAGNOLI, 2006).
A noção de território aqui empregada se encontra consonante à concepção
atualmente utilizada:

Compreende-se a noção de território em suas várias dimensões, tais


como o “território físico” (material, visível e delimitado), o “território
como espaço-processo” (construído cultural e socialmente, de forma
dinâmica) e o “território existencial” (referido às conexões
produzidas pelos indivíduos e grupos na busca de sentidos para a
vida). Na prática, é importante perceber como essas diferentes
perspectivas coexistem, se interpenetram e, às vezes, se tensionam.
Um exemplo é o que ocorre nas chamadas “cidades-dormitório”, e
outro é o dos territórios escolhidos/inventados pelas pessoas em
situação de rua (BRASIL, 2011).

Para Deleuze e Guatarri (2000), o território existencial, isto é, a realidade é


composta por linhas, estruturadas em duas formas básicas: as linhas duras e as
linhas flexíveis.
As linhas duras – sustentadas pelo plano de organização – constituem a
necessidade humana em classificar e organizar a realidade, geralmente em
combinações binárias: homem-mulher, saúde-doença, mente-corpo, etc. São linhas
que demarcam identidades a partir de fronteiras rígidas. Um bom exemplo disso são
os tradicionais diagnósticos de doença mental.
Acontece que o sujeito não é neutro e é afetado de múltiplas formas pelo
mundo que o cerca. Este aspecto da realidade invisível seria devido às linhas
flexíveis (sustentada pelo plano de consistência) que marcam o encontro com as
diferenças, podendo ou não, gerar novos sentidos. No campo das linhas flexíveis
não há oposição, somente variação (DELEUZE; GUATARRI, 2000).
Em suma, as linhas duras e as linhas flexíveis seriam tramadas sobrepostas
tais como um tecido, sendo a primeira uma forma de controlar as disrupturas da
segunda.

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Partindo da realidade como sendo composta por linhas, o pensamento
deleuziano pode facilitar este entendimento do território familiar como um território
vivo e em constante transformação, mas que se confunde com um território
homogêneo e pouco variável. O mesmo pode ser afirmado para a doença mental,
pois possibilita sair de um sentido estático, para um novo campo de possibilidades.
Conforme Romagnoli (2006), o sentido homogêneo que se tem dos objetos –
seja da família ou do diagnóstico de alguma doença mental, por exemplo –, advém
da insistência e da repetição dos elementos heterogêneos que compõem os
processos de subjetivação de cada pessoa. E justamente pelo fato de serem
heterogêneos, isto é, de se originarem de múltiplas fontes, não há como estabelecer
modelos universais, visto que os processos de subjetivação são completamente
variáveis conforme cada pessoa e cada momento sócio-histórico (FOUCAULT,
1979).
Tendo esclarecido melhor este ponto sobre a necessidade de descentralizar
o foco exclusivo sobre a família, fica mais fácil compreendermos a importância da
melhor capacitação de profissionais na área de saúde mental, bem como a melhoria
das políticas públicas neste campo.
Além de centralizar a família como um núcleo sólido, outro efeito negativo
das concepções arborescentes é a centralização do cuidado na doença, omitindo a
pessoa doente.
Voltando ao estudo das linhas deleuzianas, além das supracitadas linhas
duras e flexíveis, há também, por vezes, a possibilidade da emergirem linhas de
fuga e que dão condições de possibilidade a novos territórios. As linhas de fuga
seriam como as pontas soltas desta longa trama formada pelas linhas duras e pelas
linhas flexíveis, ou seja, trata-se de fissuras capazes de formar novas tramas,
trazendo consigo a possibilidade de imprimir novos sentidos.
A interessante pesquisa de Denise Morel (1990) (apud MELMAN, 2006),
exemplifica bem a construção de novos territórios a partir da doença mental. Sua
hipótese parte de que as terapias tradicionais, mediante os sintomas, tendem a
focar exclusivamente no aspecto doentio das pessoas. Contudo, estudando grupos
parentais, alguns de pessoas reconhecidas mundialmente como Camille Claudel4,
chegou à conclusão de que o que difere uma família criadora de uma não criadora,

4Camile Claudel (1864-1943) foi uma fabulosa escultora e reconhecida como a maior discípula de
Rodin, sendo-lhe inclusive atribuída autoria de várias obras deste. Confira em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Camille_Claudel>. Acesso em: 13 set. 2018.
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seja ela portadora de alguma doença mental ou não, refere-se, sobretudo à
possibilidade de explorar territórios incomuns (MOREL, 1990 apud MELMAN, 2006).
No Brasil, um caso exemplar é o de Arthur Bispo do Rosário, diagnosticado
com Esquizofrenia paranoide, considerado atualmente um dos maiores gênios das
artes plásticas brasileiras, utilizando como matéria-prima o lixo do hospital
psiquiátrico no qual estava internado.

Figura 4 - Barco elaborado por Arthur Bispo do Rosário

Fonte: https://goo.gl/ps332C

O Museu Imagens do Inconsciente5, organizado por Nise da Silveira, que


integra uma vasta coleção de pinturas e outras artes plásticas desenvolvidas por
pacientes psiquiátricos, também é outro exemplo brasileiro que revela como a
loucura pode ser compreendida como campo de possibilidades.
Desta forma, uma prática terapêutica efetiva ao portador de doença mental
consiste em alterar o foco na doença para um cuidado exclusivo ao doente6. A
criação de espaços criativos seria capaz de aumentar os aspectos saudáveis e
criativos do portador da doença.
Há de se ter também um cuidado para não cair no outro extremo, que seria
pensar no espaço criativo como elemento capaz de fazer desaparecer o sintoma –
possivelmente o maior desejo dos familiares. A criatividade vale para qualquer

5 Museu Imagens do Inconsciente: http://www.museuimagensdoinconsciente.org.br/html/historia.html.

Acesso em: 13 set. 2018.


6 Além das artes, terapias alternativas como a equoterapia também possibilitam alterar o enfoque da

doença para a pessoa. Confira esta matéria: http://www.trnoticias.com.br/2012/828-apae-


equoterapia.html. Acesso em: 13 set. 2018.
17
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pessoa, seja ela doente mental ou não, portanto, o desaparecimento do sintoma,
pode ou não acontecer. O fato é que com o enfoque voltado aos aspectos
saudáveis do sujeito, há a possibilidade de abertura para novos territórios a partir da
doença mental e, portanto, a atribuição de novos sentidos ao adoecer.
Ressignificar os sentidos não significa que a pessoa e seus familiares
passariam a um utópico estado de “felicidade”7. A doença mental, seja qual for sua
natureza, tende a causar muito sofrimento e angústia a todos os envolvidos. Há
ainda o fato de que muitas são severas e debilitantes, além daquelas que são
crônicas. Portanto, o que seria benéfico do espaço criativo seria facilitar a tolerância
e a integração dos aspectos patológicos do paciente (MELMAN, 2006).

1.5 A relação entre quem cuida e quem é cuidado

A ação de cuidar de uma pessoa portadora de doença mental muito além de


um ato e de puro amor constitui-se numa atividade complexa, abarcando questões
sociais, financeiras, materiais, tudo imerso em sentimentos ambíguos e
contraditórios.
Constituindo-se como a base das relações familiares modernas, a atividade
do cuidar de parte da família pode ser compreendida como “um conjunto de direitos
e deveres, arranjos e rearranjos, que se expressam através de sentimentos e
apoios diversos” (PEIXOTO, 2005, p. 225).

Figura 5 - Passeio com cuidadora

Fonte: Brasil (2008).

7O conceito de felicidade utópica é desenvolvido pela filósofa Viviane Mosé a partir de sua leitura de
Nietzsche: https://www.youtube.com/watch?v=wszgKT2zS-c.
18
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De um modo geral, a atividade do cuidado é caracterizada tanto por questões
de cunho material quanto afetivas. A dimensão material diz respeito aos cuidados
tangíveis, ou seja, são os apoios instrumentais oferecidos: financeiros ou atitudinais
como levar e buscar a pessoa, acompanhar ao médico, etc. Já a dimensão afetiva
condiz com as relações socioafetivas que são estabelecidas pelo vínculo entre os
membros (PEIXOTO, 2005).
Por se tratar de um evento não esperado, o adoecimento mental de um
familiar demanda um reposicionamento de todos os demais membros, terminando
quase sempre com a eleição de um cuidador.
O cuidador pode ser entendido como a pessoa com ou sem vínculos
familiares que, remunerada ou não, é capaz de fornecer ajuda às necessidades e
afazeres cotidianos – podendo ir desde a administração financeira até a higiene
pessoal (BRASIL, 2012).
Conforme o Guia Prático do Cuidador (2008):

O bom cuidador é aquele que observa e identifica o que a pessoa


pode fazer por si, avalia as condições e ajuda a pessoa a fazer as
atividades. Cuidar não é fazer pelo outro, mas ajudar o outro quando
ele necessita, estimulando a pessoa cuidada a conquistar sua
autonomia, mesmo que seja em pequenas tarefas. Isso requer
paciência e tempo (BRASIL, 2008, p. 08).

Alguns autores fazem a distinção entre o cuidador informal e o formal.


Cuidador formal pode ser compreendido como o profissional habilitado por uma
instituição de ensino, capaz de prestar cuidados de acordo com sua formação
curricular (BRASIL, 2012). Um exemplo seriam os profissionais da área da saúde,
com formação em técnico, graduação ou pós-graduação.
Já o cuidador informal é um membro da família ou da comunidade que, de
acordo com sua disponibilidade e capacidade, exerce qualquer forma de cuidado a
alguma pessoa dependente. Além disso, entre o cuidador formal e informal há
também pessoas que exercem a atividade principal do cuidado e outros que o
auxiliam nesta atividade.
Enquanto o cuidador principal constitui aquele que assume total
responsabilidade pelas tarefas realizando a maioria das atividades, os cuidadores
secundários complementam estes auxílios (BRASIL, 2012). Demais membros da
família, amigos ou vizinhos, por vezes exercem esta atividade secundária.

19
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Perceba que até aqui, em nenhum momento foi dito o “papel do cuidador”, e
isto merece um maior esclarecimento. Podendo ser uma atividade temporária ou
por toda a vida. Quando digo o “papel do cuidador” realço um aspecto estático e
natural desta atividade, ao mesmo tempo em que nego que tal função está imersa
em relações de poder e de resistências. Em certos casos, os portadores de doença
mental abandonados nas instituições, mais do que negar o papel dos cuidadores,
podem revelar dificuldades econômicas, emocionais ou sociais pelas quais as
famílias estão passando.
O termo posicionamento procura então substituir algumas limitações
referentes ao uso da noção de papel social (SPINK, 2004). Há duas formas básicas
de posicionamento: “o posicionamento interativo, onde o que uma pessoa diz
posiciona o outro; e pode haver posicionamento reflexivo, no qual nos
autoposicionamos”. (SPINK, 2004, p. 51).
Se afirmamos antes que a família se constitui em constante transformação,
também a noção de cuidador precisa acompanhar este entendimento.
Visto que as interações cotidianas são absolutamente fluidas, a posição de
cuidador garante maiores possibilidades a estas pessoas, e consequentemente,
uma melhor qualidade de vida: hoje posso estar posicionado como o cuidador
principal, amanhã pode ser outro.
De certa forma, entender o cuidador como alguém posicionado nesta função,
abarca a capacidade dinâmica e transformadora que os sujeitos possuem, além de
facilitar a compreender as paradoxais e contraditórias situações cotidianas. (SPINK,
2004). Ou seja, se compreendermos o cuidador como produto de suas interações
sociais, não há como os enxergarmos com um papel fixo, pronto e acabado.

Figura 6 - Alterando posições

Fonte: http://www.sxc.hu/
20
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Todas estas precauções tomadas aqui em relação aos conceitos utilizados
não dizem respeito apenas a uma melhor forma de se expressar, a um modo
“politicamente correto”. Antes, a atenção ao se referir à família, àquele que cuida e
ao portador de doença mental, deve-se ao fato de que a linguagem é matriz da
produção de novos sentidos (SPINK, 2004). E é justamente a linguagem que
usamos sobre a família e o cuidado ao portador de doença mental que possibilitam
ou não a produção de novos sentidos.
Seja no meio acadêmico ou mesmo em conversas do cotidiano, ao produzir
sentidos mediante a linguagem, não nos encontramos neutros, mas estamos
posicionando as pessoas, podendo inclusive nos encontrar reforçando posições de
exploração ou submissão.
Também o modo de cuidar não pode ser generalizado. Embora já existam
guias e cartilhas procurando auxiliar a vida dos cuidadores – cada vez mais útil e
necessário –, cada sujeito constrói sentidos únicos nas relações que o cercam,
tanto para quem cuida, quanto para quem é cuidado.

A forma de identificar quais as necessidades de cuidado do outro


pode ser compreendida como uma construção social, por ser
efetivada no interior da cultura, podendo sofrer variações de um
segmento social a outro. O cuidado para com a saúde pode ser uma
ação priorizada e organizada a partir das concepções sobre o
processo saúde e doença, o desenvolvimento humano e o contexto
sociocultural dos indivíduos que se estuda (PEGORARO;
CALDANA, 2008, p. 88).

Deve-se isto pelo fato de que o sentido de saúde se trata de um fenômeno


complexo, construído conforme cada contexto cultural específico.
Para se ter uma ideia da relevância de se trabalhar com os sentidos da
posição de cuidador, um viés que não pode ser omitido são as questões de gênero,
visto que em nossa sociedade a mulher é a principal responsável pelo cuidado
informal: “normalmente, são as mulheres do núcleo familiar, mães, irmãs e avós,
que cuidam ou se responsabilizam por usuários de serviços psiquiátricos extra-
hospitalares” (PEGORARO; CALDANA, 2008, p. 83).
Isto se deve, sobretudo, a um forte discurso que prega o cuidado como algo
próprio do papel da mulher. Um breve olhar para as proveniências históricas deste
discurso pode auxiliar a perceber o cuidado como produto de jogos de luta, enfim,
uma questão de posicionamento.

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1.6 Cuidadoras: desvalorizadas, mas sobrecarregadas

Conforme Donzelot (1986), após a Revolução Francesa (1789), o


enfraquecimento da Igreja deu amplas condições para a ampliação do domínio
científico. Dentre as diversas ciências emergentes, graças à aglomeração da
população nos centros urbanos e à necessidade de controle das doenças, ninguém
mais que a medicina conseguiu maior força política (DONZELOT, 1986).
O cruzamento do poder médico aliado ao modelo burguês de família, já em
pleno vigor, possibilitou uma verdadeira transformação no campo do cuidado:

O retângulo pais−filhos deve se tornar uma espécie de homeostase


da saúde. Em todo o caso, desde o fim do século XVIII, o corpo
sadio, limpo, válido, o espaço purificado, límpido, arejado, a
distribuição medicamente perfeita dos indivíduos, dos lugares, dos
leitos, dos utensílios, o jogo do "cuidadoso" e do "cuidado",
constituem algumas das leis morais essenciais da família. E, desde
esta época, a família se tornou o agente mais constante da
medicalização. A partir da segunda metade do século XVIII ela foi
alvo de um grande empreendimento de aculturação médica
(FOUCAULT, 1979, p. 199-200).

Desta forma, foi possível desviar a atenção dos tratamentos hospitalares –


que além de custosos financeiramente eram grandes focos de doenças – para as
residências. E isto se dá principalmente pela emergência do médico da família, que
concomitantemente eleva a figura da mãe como enfermeira do lar. Esta promoção
do status social da mãe não apenas se tornou proveniência para os futuros
movimentos feministas, como também lhe possibilitou o posto de principal
responsável do cumprimento do cuidado e da normalização familiar: “[...] se o
homem preferir o exterior, as luzes do cabaré, se as crianças preferirem a rua, seu
espetáculo e suas promiscuidades, será culpa da esposa e da mãe” (DONZELOT,
1986, p. 46).

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Figura 7 - Relações de gênero

Fonte: Quino, 1996.

Dadas as naturalizações ainda presentes acerca da relação mulher-cuidado,


percebe-se como se torna extremamente relevante a problematização de suas
proveniências históricas. Além disso, outro espectro que também constitui a relação
entre gênero e cuidado diz respeito a sua dimensão axiológica, isto é, o seu valor
em nossa sociedade de consumo.
Para Carrasco (2003), trata-se de uma atividade necessária e consumível em
si mesma, mas que por não ser remunerada, o cuidado quase sempre foi
desvalorizado na cultura ocidental. E mesmo quando tomado de algum valor,
entende-se geralmente como um ato voluntário, oculto sob a naturalização dos
papéis sociais, pois o cuidado em nossa sociedade tende a não ser contabilizado
como “trabalho” (CARRASCO, 2003).
Diversos estudos atuais apontam os impactos que a contínua atividade do
cuidado ocasiona aos cuidadores. Nos casos mais graves, as limitações do portador
de doença mental requerem tempo integral do cuidador, tornando a atividade
principal deste por toda a vida.
“Sobrecarga familiar” (family burden) foi o termo desenvolvido para
compreender o estresse vivenciado pelo cuidador e pelos familiares no trato ao
portador de doença mental (CARDOSO; GALERA; VIEIRA, 2012). Envolvendo
diversos aspectos da dinâmica familiar, a responsabilização econômica, física e
emocional, faz com que a sobrecarga familiar tenha que ser entendida como uma
questão multidimensional.
Alguns autores compreendem a sobrecarga em duas vertentes: uma
dimensão objetiva e outra subjetiva. A vertente objetiva da sobrecarga relaciona-se
ao excesso de tarefas, aumento das despesas, limitação de atividades de lazer,
enfraquecimento das relações familiares entre si e com os de fora. A dimensão
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subjetiva remete à percepção dos familiares na convivência com uma pessoa com
transtorno mental, a presença de sentimentos ambivalentes e a preocupação
quanto ao futuro: “a sobrecarga subjetiva está relacionada a sentimentos de
desamparo, tristeza e culpa” (CARDOSO; GALERA; VIEIRA, 2012).
No campo da saúde, o que as pesquisas vêm evidenciando, é que a
sobrecarga quase sempre está associada a uma série de efeitos nocivos para o
cuidador:

Tal como problemas de saúde mental, o isolamento social, os


sintomas de depressão e ansiedade. A sobrecarga do cuidador pode
culminar em doenças agudas e crônicas e, consequentemente, no
uso de diversas medicações, tornando-o tão doente quanto a
pessoa cuidada. [...] Podem ser observados sentimentos de
anulação pessoal, incompetência pelo desempenho do papel de
cuidador e ausência de reconhecimento do seu desempenho
funcional (BRASIL, p. 07-08, 2012).

Além disso, dependendo da gravidade da doença mental, a pessoa pode, de


forma temporária ou permanente, se encontrar incapacitada para o trabalho. No
caso das famílias pobres, todo o sofrimento que o processo da doença mental
ocasiona no campo psíquico e social, pode tornar-se multiplicado perante as
dificuldades financeiras e materiais.

Exercício 2

Qual o principal motivo para a atividade do cuidado ficar incumbida às


mulheres?
a) O instinto materno assegura às mulheres uma maior predisposição ao
cuidado.
b) Os homens não possuem a mesma sensibilidade para o cuidado como as
mulheres.
c) O cuidado como algo valorizado em nossa sociedade naturalmente tornou o
ato de cuidar uma função própria das mulheres.
d) O cuidado como algo próprio do gênero feminino é proveniente de uma
longa construção histórica e social.

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UNIDADE 2 - ESTRATÉGIA DO PROGRAMA SAÚDE DA FAMÍLIA E
O CUIDADO EM SAÚDE MENTAL

“O poder, na verdade,
não se exerce sem que custe alguma coisa”.
Michel Foucault

A emergência do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil mediante a Lei


8080/90, como efeito do Movimento da Reforma Sanitária que se inicia por volta de
1980, certamente marcou uma enorme transição nas políticas públicas de saúde até
então praticadas (BRASIL, 2007; NUNES, 2006).
Normas Operacionais, Portarias e regulações mediante conferências e
processos decisórios entre gestores e a sociedade brasileira, possibilitaram a
reorientação do modelo de assistência e estrutura dos serviços de saúde (BRASIL,
2007).
Dentre os efeitos do Sistema Único de Saúde no campo da saúde mental se
encontra a Lei Orgânica da Saúde mediante a Portaria 224/1992. Este dispositivo
legal, que resgata os princípios do SUS, passa a definir as normas para a atenção
em saúde mental desde o nível ambulatorial (Unidade Básica de Saúde, Centro de
Apoio Psicossocial) até o nível hospitalar. Torna-se assim um marco no que
concerne às ações de saúde mental na atenção básica.8 (VECHIA; MARTINS,
2009).
A atenção básica é definida pela Política Nacional de Atenção Básica como:

[...] um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo,


que abrangem a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de
agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção
da saúde. (BRASIL, 2006, p. 12)

Procurando escapar dos modelos tradicionais de atendimento, que atuam


apenas no nível do indivíduo, tal estratégia visa ampliar o escopo de ação para os
vários níveis do processo saúde-doença.
Outro efeito do SUS nas políticas de saúde mental se deve ao
desenvolvimento da Estratégia Saúde da Família (ESF).

8 Paralelo aos textos atuais, utiliza-se aqui o conceito de Atenção Básica e de Atenção Primária
como equivalentes.
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Tendo início como um programa governamental em 1994, o ESF ancora-se
no princípio de universalidade do SUS, isto é, busca colocar em prática a cobertura,
o atendimento e o acesso universal ao Sistema Único de Saúde, garantidos pela
Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2005b).

Fonte: http://migre.me/dXYyd

O Ministério da Saúde traz a definição da Saúde da Família como uma “[...]


estratégia estruturante dos sistemas municipais de saúde visando à reorientação do
modelo de atenção e uma nova dinâmica da organização dos serviços e ações de
saúde” (BRASIL, 2005b, p. 17).
Partindo do princípio de vigilância à saúde, o ESF possui como principais
eixos a territorialização, a intersetorialidade e a resolutividade. A territorialização
remete desde o espaço geofísico descentralizado até a necessidade de
adequações a cada contexto social, cultural e político. A intersetorialidade diz
respeito ao enfrentamento aos problemas por meio da responsabilidade
compartilhada, isto é, a responsabilidade entre os diversos setores da sociedade e
não unicamente pelo setor saúde. Por fim, a resolutividade que é a busca por
atendimentos focados na solução das demandas, evitando encaminhamentos
desnecessários. (ESPÍRITO SANTO, 2008).
Pressupondo a família como o primeiro suporte social da sociedade, o ESF
possui como objetivos:
 conhecer as famílias de seu território de abrangência;

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 identificar os principais problemas de saúde e as situações de risco
existentes;
 elaborar planos e programações de enfrentamento a estes;
 desenvolver ações educativas relacionadas aos problemas de saúde;
 prestar assistência às famílias de sua responsabilidade por meio da
atenção básica (BRASIL, 2005b).
A seguir, veremos em detalhes como estes objetivos são executados.

2.1 Conhecendo as famílias do território de atuação

Considerando que a Reforma Psiquiátrica e a desospitalização da loucura


colocaram as famílias no centro da questão dos cuidados em saúde mental, o
programa Estratégia Saúde da Família - ESF emerge como principal política na
atenção básica.
Na relação entre as famílias e as políticas públicas de saúde mental, o elo de
contato privilegiado das famílias com o ESF deve se dar por meio do agente
comunitário de saúde (ACS). Diferente das práticas antecedentes em saúde que
passivamente esperavam os pacientes, na política do ESF, cabe ao ACS realizar o
cadastramento das famílias, manter periódicas visitas domiciliares, assim como
identificar as possíveis enfermidades junto ao ESF de sua região (BRASIL, 1997).

Figura 8 - Conhecendo as famílias

Fonte: http://www.sxc.hu/

Na prática, esperam-se dos ACS basicamente três ações em saúde mental:


identificação de novos casos, acompanhamento dos casos conhecidos e o devido
encaminhamento aos profissionais de nível superior, daqueles casos não tratados
ou desestabilizados (DRUMMOND JUNIOR, 2009).
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Como estratégia recente, não são poucos os desafios que ainda permeiam o
trabalho dos ACS em relação às famílias.
Assim como em outros trabalhos acadêmicos que analisam os desafios do
ACS, na tese de doutorado defendida por Silva (2010), nos discursos analisados
entre os agentes comunitários de saúde, o termo família desestruturada é uma
constante.
Na pesquisa realizada por Taborda (2012), sobre a centralização do cuidado
familiar e as políticas públicas, as chamadas “famílias desestruturadas” também
aparecem no discurso dos ACS, mas longe de ser uma exclusividade destes,
constitui um discurso pulverizado nos mais variados meios: jurídico, religioso,
jornalístico, assim como entre profissionais da saúde.
Segundo Foucault (1979), um discurso faz ver e faz falar e se encontra
pulverizado nas mais diversas camadas da sociedade. Portanto, é preciso muita
cautela para perceber se o discurso da desestruturação familiar não se encontra
permeado pela equipe do ESF, tendo na figura dos ACS seus “porta-vozes”.
Para Rauter (2011), noções negativistas como a de famílias desestruturadas,
produzem limitações no atendimento adequado da equipe de saúde. Ampliar o
conceito de família para além dos moldes tradicionais trata-se de um grande desafio
a ser vencido pelo ESF. E a capacitação dos membros da equipe e dos ACS
certamente constitui um destes caminhos.

2.2 Identificando os principais problemas de saúde mental

Conforme a revisão de literatura realizada por Martins, Braga e Souza (2009,


p. 166), a demanda em saúde mental na população atendida pela atenção básica é
caracterizada “[...] em grande parte por casos de quadros depressivos e ansioso-
leves, assim como preocupações, irritabilidade e múltiplos sintomas
psicossomáticos”. Este conjunto de sintomas depressivos, ansiosos ou
somatoformes caracteriza o que ficou conhecido como Transtornos Mentais
Comuns (TMC).
Caracterizado por sintomas não psicóticos, isto é, sintomas em que não há
perda de contato com a realidade, como nas esquizofrenias, os TMC podem se
manifestar por sintomas persistentes como fadiga, dores de cabeça, dificuldades de

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concentração, queixas somáticas sem especificação, insônia, irritabilidade e
esquecimento (MARAGNO et al, 2006).
Estudos sobre saúde mental têm constatado que a prevalência dos TMC
encontra grande associação em variáveis sociodemográficas (MARAGNO et al,
2006). De um modo geral, quanto maiores as dificuldades econômicas e sociais,
maiores as probabilidades do desenvolvimento dos TMC.
Tais análises vão ao encontro dos resultados da Pesquisa sobre os
Determinantes Sociais da Saúde (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007) que dentre
outras questões, aponta que o processo saúde-doença se encontra associada não
apenas à pobreza, mas à produção de situações evitáveis ocasionadas pela
injustiça social.

Fonte: Quino, 1996

Dada a dificuldade na identificação dos TMC dentre outras possíveis formas


de rastreamento destes transtornos como escuta clínica, visita domiciliar, entrevista
e trabalho com grupos, também podem ser utilizadas escalas. A escala Self Report
Questionnaire (SRQ-20) é um instrumento recomendado pela Organização Mundial
da Saúde no levantamento e estudos na Atenção Básica, tanto pela facilidade de
aplicação quanto pelo custo reduzido (MARAGNO et al, 2006).
É importante salientar que os TMC não preenchem os critérios formais para
os diagnósticos de depressão ou ansiedade contidos no DSM-IV (Diagnostic and
Statistical Manual of Mental Disorders – quarta edição) nem da CID 10
(Classificação Internacional de Doenças – décima revisão). E mesmo os TMC
trazendo sofrimento e prejuízos funcionais, de um modo geral, esse quadro clínico
tende a ser subestimado tanto pelas pessoas acometidas quanto pelos profissionais
da saúde, o que pode levar ao agravamento do quadro (MARAGNO et al, 2006).

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Neste sentido, cabe aos profissionais da área de saúde mental o
desenvolvimento de uma excelente capacidade diagnóstica. Para Baptista (2009, p.
62), duas perguntas devem nortear o processo de avaliação das famílias: “‘o que
realmente deve-se avaliar?’ e ‘Como avaliar?’”.
Lembrando que para maior eficácia, orienta-se conciliar o uso de entrevistas,
métodos observacionais, com ao menos dois instrumentos na avaliação, visto que
os instrumentos são apenas um complemento ao diagnóstico.
Além dos TMC que podem acometer pessoas de qualquer faixa etária, dois
elementos do grupo familiar merecem atenção especial na identificação da saúde
mental: crianças e adolescentes e a população idosa.
Embora boa parte do atendimento em saúde mental no ESF constitua-se de
população adulta, outro grave problema na identificação dos transtornos mentais se
refere às crianças e adolescentes, visto que em certos casos a identificação
precoce do transtorno pode minimizar a evolução da doença.
Tradicionalmente no Brasil, a saúde mental de crianças e adolescentes foi
relegada a instituições filantrópicas e privadas, sendo que a criação de uma política
de saúde mental específica para esta população data somente de 2005 (BRASIL,
2005; FRIAS; MULLACHERY; GIUGLIANI, 2009).
Conforme Brasil (2005), estima-se que até 20% da população de crianças e
adolescentes possuam transtornos mentais, dos quais até 4% necessitam de
tratamento intensivo. Autismo, deficiência mental, transtornos de ansiedade e
psicose infantil estão entre os principais transtornos, mas observa-se também entre
adolescentes um crescente aumento do abuso de substâncias psicoativas e de
suicídio (BRASIL, 2005).
Situações graves como violência doméstica, abuso sexual, maus tratos,
abandono, perda, rompimento ou ausência de vínculos familiares próximos e outras
situações críticas devem igualmente ser objeto de identificação da equipe do ESF
(ESPIRITO SANTO, 2008).
Percepções de sinais de sofrimento psíquico e a escuta clínica estão entre as
principais ferramentas na identificação do nível de saúde mental desta clientela. A
anamnese detalhada junto ao histórico familiar e social, assim como o
acompanhamento pela Unidade de Saúde (US) e o possível encaminhamento a
serviços especializados constituem os procedimentos subsequentes (ESPIRITO
SANTO, 2008).

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Outro cuidado especial na identificação da saúde mental da família diz
respeito à pessoa idosa. O aumento desta população nas últimas décadas traz
novos desafios às políticas públicas. Abaixo o fluxo de atendimento na saúde
mental do idoso:

Figura 9 - Fluxo de atendimento da pessoa idosa

Fonte: Adaptado de Espírito Santo (2008).

A identificação da pessoa idosa, com sessenta anos ou mais no grupo


familiar indica a necessidade de avaliação da equipe do ESF. Isto porque além dos
fatores biológicos gerais que se associam às doenças e condições comuns a outras
faixas da população, o envelhecimento possibilita patologias típicas, como a
demência.
Somados aos fatores biológicos e à associação negativa do envelhecimento
em nossa sociedade, que igualmente afetam condição subjetiva da pessoa idosa,
determinados fatores psicossociais podem influenciar sobremaneira a saúde mental
do idoso, e, portanto, merecem atenção da equipe do ESF:

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A perda do seu papel na família e na sociedade em função do
reordenamento familiar (casamento de filhos, mudanças de casa),
aposentadoria, incapacidade física, etc., perda de suas relações
sociais por falecimento de seus conhecidos coetâneos, sentimento
de solidão e dificuldade de comunicação decorrente do que foi
anotado anteriormente; dificuldade de construção de novas
relações; sentimento de rejeição, etc.; sentimento de fracasso,
consciência de ser explorado e desconsiderado (ESPIRITO SANTO,
2008, p. 94).

Apesar das similaridades com a população geral, a associação entre fatores


biológicos e psicossociais pode trazer um alto desgaste emocional para a pessoa
idosa, o que pode vir a fragilizar sua saúde mental.
Lembrando que o atendimento preferencial e integral são algumas das
orientações preconizadas pelo Estatuto do Idoso no trato da pessoa idosa.
Mesmo tendo um cuidado especial a grupos mais vulneráveis como crianças
e adolescentes assim como o grupo de idosos, independente da faixa etária,
pesquisas em saúde mental realizadas em diversos países constataram que cerca
de 40% dos suicidas procuram algum serviço de saúde antes de efetivar o ato
(CAMURI; DIMENSTEIN, 2010). Sem mencionar o que estão sofrendo, estes
números revelam a grande necessidade de habilidade da equipe do ESF na
identificação de possíveis transtornos mentais.

2.3 Planos e programações de enfrentamento

Conforme a Portaria GM nº. 2048/2002 (ESPÍRITO SANTO, 2008), as


Unidades de Saúde de todos os municípios brasileiros devem realizar acolhimento e
atendimento das urgências de baixa complexidade.
Dos agravos da saúde mental que se espera atendimento, como parte dos
planos e programas na atenção básica constam:

Síndromes extrapiramidais (parkinsonismo, acatisia, distonia); Fugas


do lar e deambulação excessiva e vaga, sem agitação psicomotora;
Crise convulsiva em paciente com transtorno mental associado
(epiléptica); Crise histérica (epileptiformes); Estados de embriaguez;
Situações de risco psicossocial sem quadro agudo (pessoa incapaz
de cuidar de si mesma, desestruturação familiar, recusa do
tratamento, população de rua, deambulação); Vítimas de maus

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tratos e abuso sexual; Crise de ansiedade; Transtornos depressivos
leve e moderado (ESPIRITO SANTO, 2008, p. 44).9

Quando se fala em acolhimento em saúde mental, é preciso compreendê-lo


como uma tecnologia, mais precisamente uma tecnologia do cuidado. O conceito de
tecnologia utilizado no campo da saúde engloba três dimensões, as tecnologias
duras (máquinas e equipamentos), as tecnologias leve-duras (protocolos e
conhecimentos consolidados como a Psiquiatria e a Epidemiologia), e as
tecnologias leves referentes às relações entre
profissionais e usuários (BRASIL, 2011;
CARVALHO; CUNHA, 2006). Mesmo que
algumas áreas da atenção básica privilegiem
mais uma a outra tecnologia, todas em algum
momento se utilizam destas três tecnologias.
Fonte: http://www.sxc.hu/

O acolhimento se encontra no campo das tecnologias leves e pela


complexidade e sofrimento que a doença mental traz ao portador e à sua família,
trata-se de uma tecnologia fundamental que pode definir a eficácia ou não do modo
de atenção à saúde mental.
Presente em todas e quaisquer relações de cuidado, mais do que um
discurso, o acolhimento pode ser compreendido como as práticas resultantes do
encontro entre profissionais da saúde e usuários, podendo ocorrer de formas
múltiplas e variadas: “[...] ele não é, a priori, algo bom ou ruim, mas sim uma prática
constitutiva das relações de cuidado” (BRASIL, 2011, p. 19).
Mais apropriado do que se questionar se há ou não acolhimento, será
questionar como se dá este acolhimento (CARVALHO; CUNHA, 2006). Não se
limita à triagem ou à recepção do usuário, nem tão pouco a posturas diferenciadas
quando dentro ou fora do “horário de atendimento”, por exemplo.
O acolhimento eficaz ao portador de doença mental e sua família deve ser
tomado como diretriz que deve ir além, mediante a escuta qualificada da demanda,
constituindo elemento chave no modo de reorganizar o atendimento na atenção
básica:

9Para maiores esclarecimentos sobre definições: Diretrizes da Saúde Mental (ESPÍRITO SANTO,
2008).
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É importante, por exemplo, que as equipes discutam e definam
(mesmo que provisoriamente) o modo como os diferentes
profissionais participarão do acolhimento. Quem vai receber o
usuário que chega; como avaliar o risco e a vulnerabilidade desse
usuário; o que fazer de imediato; quando encaminhar/agendar uma
consulta médica; como organizar a agenda dos profissionais; que
outras ofertas de cuidado (além da consulta) podem ser
necessárias, etc. (BRASIL, 2011, p. 22).

Todas estas recomendações sobre a importância do acolhimento servem


para sobrepor a lógica do encaminhamento fragmentado e tecno-burocrático que
imperou por anos nos serviços de saúde (CAMURI; DIMENSTEIN, 2010).
Isto não significa que o encaminhamento deve deixar de existir. O
encaminhamento pode ser compreendido de duas formas: na concepção
tradicional, há a predominância de um acolhimento insuficiente, em que a
fragmentação do cuidado leva a uma lógica de deslocar o usuário de uma equipe a
outra, aumentando ainda mais seu sofrimento.
Já o encaminhamento responsável pode e deve fazer parte do atendimento a
casos mais complexos, visto que exige outros saberes e práticas. Contudo, o
envolvimento entre os setores e as equipes envolvidas bem como o
compartilhamento das informações, devem somar e não dividir o auxílio procurado
no campo da ESF (CAVALCANTE; JORGE; SANTOS, 2012).
Visto que o atendimento clínico individual mostra-se limitado perante as
múltiplas necessidades de saberes sobre a saúde, uma das características dos
planos e programas do ESF está na condição de seu trabalho em equipe10.
Atento a esta problemática, a portaria GM nº 154, de 24 de janeiro de 2008,
republicada em 04 de março de 2008, instituiu o Núcleo de Apoio à Saúde da
Família – NASF (BRASIL, 2008b).
Trata-se de equipes de saúde compostas por profissionais de diferentes
campos de saber, com o objetivo de ampliar as ações da atenção básica desde a
qualificação até a complementaridade das equipes do ESF. Assim, as equipes do
NASF buscam atuar de forma integrada com a rede de serviços de saúde,
acolhendo as demandas identificadas juntamente com a equipe de saúde da família
(BRASIL, 2008b).

10 De início a composição do ESF era constituída por um médico(a), um(a) enfermeir(o)a, um(a)

auxiliar de enfermagem e até seis agentes comunitários de saúde. A partir de 2000, foram
incorporados também um(a) odontólogo(a) e um(a) atendente de consultório dentário (BRASIL,
2008b).
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Pautado no modelo do Apoio Matricial, mais do que uma nova forma de
encaminhamento, o NASF visa ampliar a resolubilidade dos serviços prestados.
Portanto, não se trata de um serviço de entrada dos usuários, mas um apoio às
equipes de saúde da família.
Existem duas modalidades do NASF que variam conforme a demanda
populacional atendida. O NASF I visa atender no mínimo oito e no máximo vinte
equipes de saúde da família e pode ser composta de no mínimo cinco profissionais
da saúde de áreas distintas, podendo ser:

Médico Acupunturista; Assistente Social; Profissional da Educação


Física; Farmacêutico; Fisioterapeuta; Fonoaudiólogo; Médico
Ginecologista; Médico Homeopata; Nutricionista; Médico Pediatra;
Psicólogo; Médico Psiquiatra e Terapeuta Ocupacional (BRASIL,
2008b).

Já o NASF II vincula até no mínimo três equipes de Saúde da Família e só


pode ser instituído em municípios com densidade populacional abaixo de 10
habitantes por quilômetro quadrado, conforme o IBGE. No caso do NASF II este
deve ser composto por no mínimo três profissionais das seguintes áreas: Assistente
Social; Profissional da Educação Física; Farmacêutico; Fisioterapeuta;
Fonoaudiólogo; Nutricionista; Psicólogo e Terapeuta Ocupacional (BRASIL, 2008b).
Mesmo com todas estas novas propostas no campo da saúde mental, um
risco muito grande aos planos de enfrentamento é o engessamento em programas
instituídos. Os Transtornos Mentais Comuns assim como outras demandas
espontâneas que emergem no cotidiano revelam a necessidade do trabalho em
equipe e a ineficácia da permanência única em seguir protocolos.

2.4 Ações educativas aos problemas de saúde

O desenvolvimento de ações educativas na área da saúde, bem como a da


saúde mental, constitui outra proposta de inovação do ESF. O hegemônico modelo
biomédico, que tradicionalmente concebia a saúde como ausência de doenças, foi
provavelmente, uma forte influência para que o tratamento às doenças mentais,
durante muitos anos, se restringisse à prescrição de medicamentos.
Conforme Camargo Jr. (2005), medicalização é o nome que se dá aos
discursos e práticas reducionistas que transformam tanto a saúde mental como as

35
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mais variadas questões sociais em problemas puramente médicos. Obsessão no
controle de “riscos”, massivas recomendações a “estilos” de vida saudáveis,
utilização excessiva de exames e diagnósticos duvidosos, abuso na prescrição de
medicamentos assim como a automedicação, são alguns dos efeitos do
reducionismo medicalizante que visa favorecer indústrias farmacêuticas,
corporações profissionais e empresas biotecnológicas (CAMARGO Jr., 2005).

Fonte: http://www.sxc.hu/

É importante reforçar que, assim como o discurso das “famílias


desestruturadas” não deriva apenas dos ACS, a medicalização não procede apenas
dos médicos ou da equipe de saúde, mas se encontra amplamente pulverizada – de
variadas formas – nas mais diversas camadas sociais, inclusive entre os usuários
(TABORDA, 2012).
Birman (2005), afirma que dois grandes fatores foram fundamentais para a
consolidação das perspectivas medicalizantes: o primeiro refere-se ao discurso
calcado nos argumentos biologicistas, onde por meio de uma lógica causa-efeito,
seriam suficientes não só para sanar os problemas da saúde, como também as
questões sociais e econômicas. O outro grande fator foram os surtos epidêmicos
que permitiam práticas higienistas11 por meio do esquadrinhamento urbano e social,
acrescentando ainda mais popularidade à eficiência médica (BIRMAN, 2005).
Mesmo criticado pela Reforma Psiquiátrica, o modelo medicalizante de
educação em saúde mental ainda persiste e faz parte da rotina de muitas equipes
do ESF (CAMURI; DIMENSTEIN, 2010).

11 O higienismo é uma doutrina que nasce com o liberalismo, na primeira metade do século
XIX quando os governantes começam a dar maior atenção à saúde dos habitantes das cidades.
Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Higienismo>. Acesso em: 14 set. 2018.
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Neste modelo, a educação em saúde atua de modo preventivo, visando
substituir e prescrever regras de condutas individuais, considerada principal
etiologia das doenças (NUNES, 2006). Ignorando totalmente fatores sociais e
políticos, este modelo de educação em saúde consiste basicamente na
retransmissão de orientações que visam substituir comportamentos nocivos por
comportamentos saudáveis (ROECKER; MARCON, 2011; NUNES; 2006).
Visando preencher as lacunas da perspectiva preventivista, uma ação
educativa no campo da saúde mental bastante disseminada foi o modelo
psicoeducativo. Conforme Melman (2006), este modelo propõe as seguintes
intervenções familiares: fornecer informações em linguagem acessível sobre o
transtorno mental como possibilidades de recaída e a importância da medicação;
melhorar a qualidade da comunicação entre familiares, assim como clarificar
desejos e necessidades e; reconhecer sinais e sintomas que antecipam as
recaídas, intervir em situações de crise assim como resistência ao tratamento
(MELMAN, 2006, p. 76).
Para ampliar as ações educativas e contornar as perspectivas
medicalizantes, o ideal é que a equipe do ESF possua um amplo leque de ofertas
de cuidado: grupos variados, oficinas, práticas corporais e de autocuidado,
atividades lúdicas, educativas e laborais, etc. (BRASIL, 2011).
Das diversas possibilidades de atuação, Melman (2006), exemplifica o
trabalho com oficinas, afirmando inclusive que os usuários aderem mais fácil do que
o trabalho “terapêutico” em si. Segundo o autor, na postura clínica ou mesmo em
grupos terapêuticos, espera-se que as pessoas relatem problemas e suas aflições,
contudo, familiares e usuários podem evitar encontros desta natureza, visto que
muitas vezes não desejam reviver seu sofrimento. Nesses casos, a clínica acaba se
associando a um espaço do adoecimento.
As oficinas, que podem ir do artesanato a até mesmo a dança acabam se
tornando uma importante ferramenta educativa em saúde, pois exercitam a
liberdade, trabalhar de um modo solto e descontraído diversas questões como
autonomia e autoestima, por exemplo.

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Fonte: Elaboração própria.

Para os familiares, que também podem participar das oficinas, outro


importante recurso são os cursos diretivos. Em linguagem adaptada ao vocabulário
das famílias, é possível trabalhar temas importantes da doença como história da
loucura e da psiquiatria; tratamentos tradicionais e atuais aos transtornos; noções
sobre medicamentos, etc. (MELMAN, 2006).
Para Melman (2006), o importante é que tais informações educativas sejam
um convite à reflexão, um território para outras possibilidades. Um risco muito
comum de palestras e cursos é justamente voltar às perspectivas medicalizantes,
onde um fala e o outro escuta, correndo inclusive o risco de culpabilizar ainda mais
as pessoas.
Enfim, para avançar na qualidade de atendimento, é preciso aumentar a
resolutividade e a capacidade do cuidado. Mais que programas instituídos, é preciso
ter como objetivo a diminuição do sofrimento e a elevação da autonomia de
familiares e usuários portadores de transtorno mental.
Lembrando que todos os objetivos do ESF aqui descritos devem ter como
principal foco a assistência às famílias de seu território de abrangência, assistência
esta que possui como norte a atenção básica (BRASIL, 2005b).

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Exercício 3

Medicalização significa:
a) Automedicação, isto é, o uso de remédios sem receita médica.
b) Medicina focada apenas na prevenção.
c) Termo utilizado para definir as ações médicas.
d) Discursos reducionistas que transformam a saúde e questões sociais em
problemas puramente médicos.

2.5 Centro de Atenção Psicossocial - CAPS

Até meados do século XX, de um modo geral, a saúde mental era apenas
tomada num sentido negativo como anormalidade e desrazão, ainda dentro de um
discurso de saúde como ausência de doenças.
A obra “Princípios de Psiquiatria Preventiva” de Gerald Caplan, lançada nos
EUA em 1964, constitui-se numa referência ao trazer novos pressupostos nas
práticas psiquiátricas, passando a enfocar a prevenção da saúde mental das
coletividades realizada por equipes comunitárias (PENIDO, 2007).
Por outro lado, a doença mental passa a ser vista como um desvio que pode
ser detectado precocemente via intervenção em ambientes possivelmente
patogênicos: as famílias. Ou seja, um dos efeitos negativos destas práticas foi
contribuir aos discursos que culpabilizam exclusivamente os familiares pela doença.
De qualquer forma, muitas das atuais práticas dos profissionais de saúde
como o atendimento domiciliar e o controle da saúde da população, provêm, isto é,
têm influências dos enunciados de Caplan (PENIDO, 2007).
As críticas formais ao modelo de saúde como ausência de doenças se
consolidaram somente em 1977, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS)
definiu: “Saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não
apenas a ausência de doenças” (BRASIL, 1977).
Concomitantemente, o modelo biopsicossocial emerge em 1977 com George
Engel, considerado o primeiro teórico a sistematizá-lo. Ao inserir o aspecto
“psíquico” e “social” no campo da saúde, ampliou suas possibilidades (DE MARCO;
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CÍTERO; MARTINS, 2007). Dentre outros efeitos, tanto o conceito da OMS quanto
o modelo biopsicossocial constituíram importantes contribuições ao campo
epistemológico das políticas de saúde mental.
A perspectiva psicossocial se consolidou nas políticas públicas brasileiras no
ano de 1987, com o surgimento do primeiro Centro de Atenção Psicossocial em São
Paulo (PORTAL DA SAÚDE, 2013). O avanço da Reforma Psiquiátrica fez possível
que os CAPS se transformassem em uma estratégia de substituição definitiva ao
modelo hospitalocêntrico.
Entendido como os ordenadores da rede de saúde mental, os CAPS
constituem-se como referência e tratamento aos portadores de transtornos mentais
e outros casos que justifiquem cuidados intensivos, bem como aos seus familiares
(PORTAL DA SAÚDE, 2013).
Pautando-se numa perspectiva comunitária e aberta, a equipe dos CAPS é
responsável por realizar atendimento, acompanhamento e reinserção social dos
usuários da saúde mental.
Consoante aos princípios da atenção básica e as diretrizes do ESF, as
funções do CAPS incluem:

a) prestar atendimento clínico em regime de atenção diária, evitando


as internações em hospitais psiquiátricos; b) acolher e atender as
pessoas com transtornos mentais graves e persistentes, procurando
preservar e fortalecer os laços sociais do usuário em seu território;
c) promover a inserção social das pessoas com transtornos mentais
por meio de ações intersetoriais; d) regular a porta de entrada da
rede de assistência em saúde mental na sua área de atuação; e) dar
suporte a atenção à saúde mental na rede básica; f) organizar a
rede de atenção às pessoas com transtornos mentais nos
municípios; g) articular estrategicamente a rede e a política de
saúde mental num determinado território; h) promover a reinserção
social do indivíduo através do acesso ao trabalho, lazer, exercício
dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários
(PORTAL DA SAÚDE, 2013).

Ou seja, o valor dos CAPS está não em complementar os serviços


psiquiátricos, mas juntamente com os Hospitais-dia e as Comunidades
Terapêuticas, constituem-se numa rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico. Na
perspectiva dos CAPS, a família também é principal protagonista no cuidado à
saúde mental do usuário.
Tendo como parâmetro o critério populacional, junto a ações de saúde
mental, os CAPS compõem a rede de atendimento em saúde mental. Definem-se

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como CAPS I, CAPS II, CAPS III, álcool e drogas (CAPS ad) e infanto-juvenil
(CAPSi).

Quadro 2 - Parâmetros dos CAPS


Parâmetro populacional - por
Política de saúde mental
município
Rede básica com ações de saúde
Até 20.000 habitantes
mental
CAPS I e rede básica com ações
Entre 20 a 70.000 habitantes
de saúde mental
CAPS II, CAPS AD e rede básica
Mais de 70.000 a 200.000 habitantes
com ações de saúde mental
CAPS II, CAPS III, CAPS AD,
CAPSi, e rede básica com ações
Mais de 200.000 habitantes
de saúde mental e capacitação do
SAMU.
Fonte: Adaptado de Brasil (2012).

Os CAPS seguem as recomendações do Pacto pela Vida, assim a eleição


das prioridades do ESF é feita mediante metas nacionais, estaduais, regionais e
municipais (BRASIL, 2012).
Conforme o informativo eletrônico Saúde em Dados, levando em conta o
cadastramento de 122 CAPS até 2012, a cobertura nacional em saúde mental
chegou a 72% da população. Além disso, a Rede de Atenção Psicossocial conta
ainda com “625 Residências Terapêuticas, 3.961 beneficiários do Programa De
Volta Para Casa, 92 Consultórios de Rua e 640 iniciativas de inclusão social pelo
trabalho de pessoas com transtornos mentais”. (BRASIL, 2012).12
Tendo como modelo a perspectiva biopsicossocial, a reabilitação psicossocial
constitui-se no grande alvo de todas estas atuais políticas de saúde mental.
Antes da Reforma Psiquiátrica, reabilitar o portador de doença mental
consistia em tentativas de trazer o sujeito de volta à “normalidade”, sem levar em
conta as especificidades de sua doença. Atualmente a reabilitação psicossocial
supõe oferecer condições ampliadas na recuperação das pessoas portadoras de
transtorno mental e seus familiares, promovendo o autocuidado, a autonomia e a
autoestima (JORGE et al, 2011).

12Para informações sobre o Serviço Residencial Terapêutico, o Programa De Volta Para Casa e
demais iniciativas confira: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/mentaldados10.pdf
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Contudo, mesmo com diversos avanços nas políticas de saúde mental, várias
limitações precisam ser vencidas ainda.
No campo teórico houve o desenvolvimento e a consolidação da perspectiva
biopsicossocial trazendo novas possibilidades
às práticas de saúde mental. Contudo, ao
mesmo tempo que emerge como condição de
novas possibilidades a este campo,
possibilitou forjar discursos que ao invés de
ampliar, fragmentam o sujeito, agora em
corpo-mente-ambiente. Nas práticas iniciais,
os médicos ficaram com o “bio”, psicólogos e
psiquiatras com o “psi” e os assistentes
sociais com o “social” (SPINK, 2007).
Fonte: elaboração própria
Não apenas no campo da saúde mental, mas em várias áreas da saúde, o
modelo biopsicossocial ainda se encontra dentro de um discurso medicalizante, que
ao invés de integrar, passou a hierarquizar e delimitar as fronteiras profissionais de
atuação (SPINK, 2007).
Mesmo de início emergindo como uma crítica aos modelos da época, a
inserção dos aspectos psicológicos e sociológicos, antes mesmo de trazerem uma
maior integração de fatores conforme se propunha, o discurso biopsicossocial se
essencializou como a “unidade” de trabalho no campo da saúde (PENIDO, 2007;
SPINK, 2007).
A revisão de literatura empreendida por Souza et al (2012), detectou alguns
obstáculos na efetividade dos CAPs. De acordo com estes autores, o pequeno
número de profissionais, a falta de integração entre estes, a baixa remuneração e a
falta de capacitação, tornam a estratégia do apoio matricial pouco efetiva. Camuri e
Dimenstein (2010), corroboram igualmente com estas constatações afirmando que
a proposta de interlocução entre os profissionais mediante o matriciamento se
encontra num estado precário.
É possível encontrar serviços fragmentados e dispersos na relação entre a
atenção básica e os CAPS, além disso, a posição deste último no SUS não está
ainda bem definida (SOUZA et al, 2012).

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Ultrapassar os discursos medicalizantes e fragmentados, assim como investir
na capacitação dos profissionais e na integração entre os setores constituem alguns
dos obstáculos impostos às políticas de saúde mental.
Neste sentido, o grande desafio ao ESF e aos profissionais da saúde está em
transformar o cuidado em saúde mental não um fardo, mas entender que cada
pessoa assim como cada familiar atendido constitui uma forma de subjetivação
singular (CAMURI; DIMENSTEIN, 2010).

Exercício 4

Qual a afirmação correta sobre os Centros de Atenção Psicossocial


(CAPS)?
a) Constituem-se numa rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico, juntamente
com os Hospitais-dia e as Comunidades Terapêuticas.
b) Constituem-se numa rede alternativa ao Hospital Psiquiátrico, juntamente
com os Hospitais-dia e as Comunidades Terapêuticas.
c) Constituem-se em hospitais psiquiátricos focados no modelo
biopsicossocial.
d) São as mesmas Unidades de Saúde, mas com foco exclusivo na atenção
psicossocial.

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UNIDADE 3 - A SAÚDE MENTAL EM DIFERENTES CONTEXTOS
(ESCOLA, TRABALHO, COMUNIDADE)

É certo que uma grande contribuição do modelo biopsicossocial ao campo da


saúde foi a ampliação do discurso de que saúde vai muito além do campo biológico.
Se antes saúde significava apenas “ausência de doenças”, remetendo a um
discurso medicalizante, a perspectiva biopsicossocial buscou integrar junto ao
biológico, os aspectos psicológicos e sociais no intuito de empreender maneiras
mais ampliadas de se pensar e de se fazer saúde.
Contudo, diversos discursos e práticas biopsicossociais não apenas não
conseguiram estancar as perspectivas medicalizantes, como também possibilitaram
novos modos de fragmentar, hierarquizar e até limitar este campo sob nova
roupagem (TABORDA, 2012).
Assim, considerando que certas práticas biopsicossociais carregam consigo
noções medicalizantes, não é de se estranhar que o termo saúde mental quase
sempre se encontre atrelado a doença mental. Partindo do pressuposto de que todo
problema de saúde implica em sofrimento, então qualquer doença, de certa forma,
constitui-se num “adoecimento mental”. Ao mesmo tempo, quando se fala em saúde
mental não é possível deixar de falar em produção de saúde. Mas o que é mesmo
produção de saúde?
Conforme a Carta de Ottawa (WHO, 1986), a promoção da saúde pode ser
entendida como o processo que visa aumentar a capacidade dos indivíduos e das
comunidades para controlarem a sua saúde no sentido de melhorarem. Isto significa
que a melhoria da qualidade de vida deve ser garantida nos mais diversos territórios
e constitui um direito de todos.
A promoção da saúde também pode ser compreendida a partir de uma
perspectiva rizomática, pois implica em todo o modo de viver das pessoas.

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Figura 10 – Promoção da saúde

Fonte: Elaboração própria.

Economia, política, cultura, classe social, constituem algumas das dimensões


que podem determinar como ocorre a produção de saúde numa determinada
comunidade.

3.1 Saúde mental na escola

É possível observar nos dias de hoje algumas experiências visando à


promoção da saúde no campo escolar (GONÇALVES et al, 2008). No entanto,
muito antes das tentativas contemporâneas de interlocução entre estes campos, já
houve encontros marcantes entre ambas. E dentre as interlocuções ocorridas,
certamente se destacam as práticas higienistas.
Schechtman (2005), afirma que no Brasil, em 1925, um forte movimento
higienista, de inspiração eugênica13, via na escola o ambiente ideal para o
desenvolvimento de técnicas de prevenção de anomalias, buscando separar os
alunos “aptos” dos “inaptos”. Dentro dos muros escolares, até meados do século

13Galton definiu eugenia como o estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou
empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Eugenia>. Acesso em: 14 set. 2018.
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XX, a busca pelos “desvios” de normalidade tornou-se um mercado fértil para
especialistas como psiquiatras e psicólogos (SCHECHTMAN, 2005).
Movimentos como o da Reforma Psiquiátrica a partir dos anos 70,
denunciaram o quão ineficaz e cruel podem ser as práticas higienistas, limitando
boa parte de suas ações. Contudo, Schechtman (2005), alerta que, sob novas
roupagens, diagnósticos como “problemas de aprendizagem” ou “hiperatividade”
constituem ainda hoje, tentativas de culpabilizar e capturar sujeitos ditos
“desviantes”.
Outro capítulo da saúde mental e da infância, diz respeito a sua relação com
a filantropia. Historicamente no Brasil, na ausência de políticas públicas, instituições
filantrópicas, em especial as APAEs e as Pestalozzis, durante muitos anos foram as
principais instituições no cuidado à saúde mental infanto-juvenil (BRASIL, 2005).
Donzelot (1986), afirma que a filantropia emerge na sociedade ocidental
justamente para sanar o grande paradoxo capitalista: o livre mercado e a liberdade
individual coexistindo com a extrema pobreza e a desigualdade social. Neste
sentido, até pouco antes da Reforma Psiquiátrica na década de 70, eram as
entidades filantrópicas que respondiam de modo quase exclusivo pela saúde mental
de crianças e adolescentes brasileiros (FRIAS; MULLACHERY; GIUGLIANI, 2009).
Em 1986, a Carta de Ottawa constituiu-se numa nova estratégia de borrar as
fronteiras entre saúde e educação, trazendo inclusive novas possibilidades para a
área da saúde mental. O território da educação passou assim, a constituir-se num
dos pré-requisitos para que os países sejam capazes de promover saúde (WHO,
1986).
A VIII Conferência Nacional de Saúde (BRASIL, 1990) também trouxe novas
possibilidades ao campo da saúde mental ao incluir a educação como um de seus
vetores. Passa-se a compreender saúde como o resultado das condições de
“alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte,
emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de
saúde” (BRASIL, 1990).
Mesmo a Carta de Ottawa e a VIII Conferência Nacional de Saúde apontando
para a necessidade de ampliar a sinergia entre saúde mental e contexto escolar,
será fundamental para a construção destes laços não apenas legislações, mas a
transformação dos discursos cotidianos.

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Para tanto, é preciso que, assim como mencionado sobre a família no
primeiro capítulo, a escola seja concebida para além de instituição de ensino alheia
às discussões políticas da sociedade, para além de um setor estanque das
necessidades de sua comunidade, mas que passe a ser considerada como território
de agenciamento, como território de promoção da saúde.
Alguns princípios de práticas de promoção da saúde nas escolas são
apontados por Gonçalves et al (2008, p. 183):

i) a valorização da subjetividade e intersubjetividade no processo de


conhecimento da realidade, privilegiando o diálogo como expressão
da comunicação; ii) o estímulo à participação como algo inerente ao
viver coletivo; iii) a utilização de estratégias que permitam a
coexistência da interface de várias áreas do conhecimento; iv) o
reconhecimento da dimensão afetiva no processo de transformação
e tomada de decisão, e v) o incentivo e fomento de parcerias por
meio de redes sociais de apoio.

Para a atual realidade das escolas, a promoção da saúde e a ampliação dos


discursos sobre saúde mental, mediante estes princípios solidários e participativos
podem parecer ilusórias e até utópicas.
Contudo, a Comissão Nacional sobre
Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS,
2008c), alerta que a escolaridade está fortemente
associada ao apoio mútuo, também chamado de
capital social.
Capital social constitui o conjunto das
relações de confiança e solidariedade entre
pessoas e grupos e que constituem as redes
sociais e comunitárias (CNDSS, 2008c).
Fonte: http://www.sxc.hu/

É importante ressaltar que a promoção da saúde nas escolas, mediante


práticas coletivas e solidárias, não deve se limitar a discursos “otimistas” ou
“inócuos”, mas deve ser constituído como prática necessária à promoção da saúde
mental, visto que as redes de apoio social e comunitário constituem um importante
fator na diminuição da prevalência das doenças mentais (CNDSS, 2008c).
Uma hipótese que explica a importância do capital social na saúde mental diz
respeito à diminuição dos níveis de estresse, pelo fato de haver maiores
47
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possibilidades de cooperação e de confiança. A promoção de bem-estar gerado
pelos relacionamentos, mesmo na ausência de estresse, constitui outra hipótese
que reforça o apoio social como um importante fator de proteção ao adoecimento
mental. (CNDSS, 2008c).
O espaço escolar, cuja referência de ação é o desenvolvimento dos
educandos, pode e deve ser concebido como um sinalizador de saúde de sua
comunidade.
É importante salientar que a saúde mental na escola não se restringe
unicamente aos alunos. A promoção da saúde dos professores constitui uma
grande necessidade no campo da educação.
Ocasionado pelo estresse, o esgotamento físico e psicológico que afeta
muitos professores de maneira crônica e debilitante recebe o nome de Síndrome de
Burnout. Esta síndrome
caracteriza-se principalmente
pela fase de exaustão, e
assim como os cuidadores e
profissionais de saúde, é
muito comum entre
profissionais que lidam
cotidianamente com pessoas
(ANDRADE; CARDOSO,
2012).
Fonte: http://migre.me/dY5Uu

Para você saber mais a respeito da Síndrome de Burnout, assista ao


vídeo da Rede Anísio Teixeira (Série Saúde do Professor), disponível no endereço:
<https://www.youtube.com/watch?v=I52nJhSynzc>. Acesso em: 13 set.
2018.

Geralmente apresenta sintomas como irritabilidade, insônia, angústia, tristeza


e desinteresse, fatores que são extremamente nocivos para a saúde mental. Além
disso, o transtorno mental advindo do estresse crônico constitui o principal

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responsável pelo afastamento do trabalho dos professores (ANDRADE; CARDOSO,
2012).
Na revisão de literatura realizada por Andrade e Cardoso (2012), constatou-
se que, dos estudos realizados sobre a Síndrome de Burnout entre professores, há
um forte predomínio de pesquisas descritivas, com poucas ou quase nenhuma
apontando intervenções ou programas de enfrentamento, o qual revela a carência
da promoção da saúde desses profissionais.
Não é difícil perceber que a realidade escolar ainda se encontra muito
distante de efetivas intervenções no sentido da promoção da saúde, tanto na
perspectiva dos professores quanto dos alunos.

Exercício 5

Sobre o capital social, é correto afirmar que:


a) Trata-se do conjunto das relações de confiança e solidariedade entre
família de portadores de transtorno mental e profissionais da saúde.
b) Trata-se do conjunto das relações de confiança e solidariedade entre
família, portadores de transtorno mental e profissionais da saúde.
c) Trata-se do conjunto das relações de confiança e solidariedade entre
pessoas e grupos e que constituem as redes sociais e comunitárias.
d) Trata-se de estratégias capitalistas que se utilizam do elemento social.

3.2 Saúde mental no Trabalho

A relação entre o trabalho e o portador de doença mental pode ser


segmentada por duas vertentes, a das pessoas que podem trabalhar e das que não
podem. Mediante as análises de Castel (1998) é possível afirmar que os portadores
de doença mental que não podem trabalhar fazem parte da “teoria da
desvantagem”, ou seja, todas aquelas pessoas que não conseguem sobreviver por
conta própria e por isso são isentas do trabalho – como crianças e idosos, por
exemplo.
No caso das famílias pobres, um membro incapacitado significa que as
dificuldades financeiras constituirão em mais um grande desafio a ser vencido.
Como forma de minimizar tamanhas dificuldades, as famílias que possuem renda

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inferior a ¼ do salário mínimo per capita (por pessoa), possuem o direito de receber
até um salário mínimo, chamado de “Benefício de Prestação Continuada” – BPC
(BRASIL, 2008).
Previsto pela Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) e integrando o
Sistema Único de Assistência Social (SUAS), trata-se de um direito garantido por lei
e pago pelo governo federal como forma de auxílio.
Dentre as pessoas que podem receber o BPC constam:

As pessoas idosas com 65 anos ou mais e pessoas com deficiência;


Quem não tem direito à previdência social; Pessoa com deficiência
que não pode trabalhar e levar uma vida independente; renda
familiar inferior a 1/4 do salário mínimo (BRASIL, 2008).

Além da teoria da desvantagem, outra possibilidade de análise da


impossibilidade do trabalho pode ser realizada mediante o fator de dependência das
políticas públicas.
Nesta perspectiva é possível estabelecer duas linhas: as famílias que
garantem sua própria sobrevivência e aquelas que não conseguem se sustentar. A
dependência de benefícios do governo certamente constitui um auxílio necessário
para as famílias dos portadores de doença mental, principalmente as famílias
pobres. Contudo, a atual cultura neoliberal tende a reforçar uma constante
descrença e aversão à dependência das políticas sociais, tendo como efeito a
responsabilização cada vez maior dos sujeitos (ORTEGA, 2008 apud TABORDA,
2012).
Sob a ótica neoliberal, tanto mais uma família será “estruturada” quanto
menos depender dos suportes sociais, tendo em vista alguma autonomia para
recorrer à iniciativa privada quando necessário (TABORDA, 2012). Iniciativa privada
esta, que se consolidou mediante a Revolução Francesa no século XVIII, ao mesmo
tempo em que possibilitava uma maior integração entre loucura e trabalho.
Conforme Foucault (1972), a Revolução Francesa constitui um importante
marco do trabalho na história da loucura. Sob uma suposta universalização dos
direitos do homem, os sujeitos considerados desajustados, pobres e loucos, foram
encaminhados a instituições beneficentes que, após uma seleção dos mais aptos,
eram então encaminhados ao mercado de trabalho como mão de obra barata
(FOUCAULT, 1972).

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Com o nascimento da Psiquiatria no século XIX, o trabalho emerge para as
pessoas confinadas com o chamado tratamento moral, objetivando disciplinar os
devaneios e controlar os comportamentos, sem qualquer conotação subjetiva ou
material (FOUCAULT, 1972).
Não por acaso, o trabalho como um direito de cidadania aparece somente
com a emergência da Reforma Psiquiátrica. Um dos eixos norteadores dos CAPS
está na inserção social que, além da cidadania, do lazer e do fortalecimento dos
laços familiares, possibilitou a inclusão social pelo trabalho tendo em vista tanto a
reabilitação quanto a autonomia dos sujeitos.
Neste sentido, junto à Reforma psiquiátrica, emerge a economia solidária14
como uma das estratégias de inclusão social. Segundo Paul Singer:

A economia solidária e o movimento antimanicomial nascem da


mesma matriz – a luta contra a exclusão social e econômica. Uns
são excluídos (e trancafiados) porque são loucos, outros porque são
pobres. Há ricos, que enlouquecem porque empobreceram e há
pobres, que enlouquecem porque ninguém os nota (o que é uma
forma particularmente cruel de exclusão). A matriz comum de ambos
é uma sociedade que fabrica pobres e loucos de modo casual e
inconsciente (BRASIL, 2006b).

A inclusão social pelo trabalho é apontada como estratégica à reabilitação,


visto que possibilita a “ampliação de trocas sociais, autonomia, democracia,
autogestão, cooperação, cidadania, solidariedade e desenvolvimento local”
(BRASIL, 2006b, p. 08).
No entanto, é necessário que as iniciativas de promoção da saúde mental
não levem em consideração apenas a dimensão terapêutica do trabalho na vida do
portador de doença mental, mas que o mesmo se encontre pautado em discussões
políticas como desigualdade e a injustiça social.
Filizola et al (2011), constataram a importância do trabalho ao pesquisar um
empreendimento solidário composto por familiares e usuários de um CAPS.
Os familiares pesquisados pelas autoras perceberam uma considerável
melhora na autoestima dos usuários afirmando que o ganho financeiro, além de
auxiliar a família, trouxe aos usuários a sensação de valor e utilidade (FILIZOLA et
al, 2011).

14 O site Saúde Mental - Rede Nacional de Empreendimentos contém inúmeros links para
experiências de geração de renda: http://www.cooperativismopopular.ufrj.br/saudemental/index.php
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Como se percebe, ao invés de centralizar a família unicamente pelo suporte
social aos usuários, esta pode e deve constituir-se como agência de interconexão
entre o usuário e o mundo do trabalho.
Além disso, conforme salientado sobre a Síndrome de Burnout, o tipo de
trabalho ao qual a pessoa se encontra submetida pode ser um elemento
extremamente nocivo à sua saúde mental.
É neste sentido que o trabalho se constitui tanto como um dispositivo da
saúde mental quanto estratégia de promoção da saúde.

Exercício 6

Paul Singer (BRASIL, 2006b), afirma que a luta contra a exclusão social e
econômica é a matriz da economia solidária e do Movimento anti-
manicomial. Por quê?
I. A matriz comum de ambos são as situações de extrema pobreza, pois
constituem fortes indícios para os Transtornos Mentais Comuns.
II. O movimento da economia solidária e o Movimento antimanicomial são o
mesmo.
III. A matriz comum de ambos é uma sociedade que fabrica pobres e loucos
de modo casual e inconsciente.
a) Apenas o enunciado I está correto.
b) Apenas o enunciado II está correto.
c) Apenas o enunciado III está correto.
d) Nenhum enunciado está correto.

3.3 Saúde Mental na comunidade

O modelo comunitário e aberto constitui um eixo fundamental nas políticas de


saúde mental (BRASIL, 2006). Após a Reforma Psiquiátrica, a atenção básica em
saúde mental, foi sendo construída com o objetivo de oferecer cuidados em
conformidade aos recursos disponíveis na comunidade.
Dentre as vantagens deste novo modelo de assistência, está a possibilidade
de a comunidade cuidar de sua própria saúde, tendo como posição estratégica a
figura do Agente Comunitário de Saúde (BRASIL, 2005b).

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A Portaria nº 1886/GM, de 18 de dezembro de 1997, que aprova as normas e
diretrizes do Programa de Agentes Comunitários de Saúde e do ESF possui as
seguintes adequações destes às práticas em saúde mental na comunidade:

• Identificação dos portadores de deficiência psicofísica com


orientação aos familiares para o apoio necessário no próprio
domicílio;
• Incentivo à comunidade na aceitação e inserção social dos
portadores de deficiência psicofísica;
• Realização de ações para a sensibilização das famílias e da
comunidade para abordagem dos direitos humanos;
• Estimulação da participação comunitária para ações que visem à
melhoria da qualidade de vida da comunidade (BRASIL, 1997, p.
07).

A identificação das famílias constitui uma das grandes transformações no


modo de praticar este novo modelo de assistência. O encontro do ACS com famílias
cujo membro seja portador de algum transtorno mental visa assim proporcionar
novas políticas de saúde mental com uma posição ativa.
Mesmo com a emergência da Reforma Psiquiátrica a partir da década de 70,
ainda hoje aceitar e incluir socialmente as pessoas com alguma doença mental
constitui uma grande dificuldade para nossa sociedade. A noção de periculosidade
do “louco” emerge apenas a partir do século XIX quando a medicina legal, isto é, os
saberes psiquiátricos e jurídicos se unem para capturar os casos de crimes em que
não teria culpado – visto que antes ”louco” era alguém “demente” e, portanto, isento
de culpabilidade (FOUCAULT, 1972).
O desenvolvimento da noção de periculosidade da pessoa com transtorno
mental, forjada na Europa e consolidada no século XIX, pode ser considerada a
principal responsável pela expansão do modelo hospitalar e asilar no ocidente.
Neste sentido, cabe à equipe do ESF ações educativas e de sensibilização das
famílias e da comunidade visando não apenas transmitir conhecimento, mas
principalmente ouvir os anseios e temores das pessoas em relação à loucura
(MELMAN, 2006).
É preciso, pois, enfocar a pessoa portadora de transtorno mental como um
sujeito de direitos como qualquer outro cidadão. A desconstrução da figura do
“louco perigoso” poderá auxiliar bastante para vencer os estigmas familiares,
auxiliando assim na reabilitação. Isto porque a reabilitação também é compreendida

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como processo facilitador da restauração do indivíduo com limitações, no melhor
nível possível, da autonomia e do exercício de suas funções na comunidade.
Mas acontecem também casos de pessoas com graves transtornos mentais
que devido ao asilamento perderam totalmente seus vínculos familiares e sociais.
Uma estratégia na desinstitucionalização e reabilitação e inserção social destas
pessoas com longo histórico de internação é o Serviço Residencial Terapêutico
(SRT).
Os SRTs são casas vinculadas aos CAPS ou algum serviço ambulatorial,
dentro do espaço urbano, construídas para atender esta clientela (BRASIL, 2012).

Gráfico 1 - Implantação dos SRTs

Fonte: Adaptado de Brasil (2012).

Desde sua implantação em 2002 até o final do ano de 2011, constavam


implantados 625 SRTs pelo Brasil, com o total de 3470 moradores, além de mais
154 em fase de implantação (BRASIL, 2012).
Para tanto, a supervalorização da família como acesso único e exclusivo à
vida social da pessoa com transtorno mental ainda precisa ser vencida. Conceber a
família como uma agência dentre tantas outras formas de agenciamento certamente
constitui-se um grande desafio a ser vencido no campo da saúde mental.

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Exercício 7

Devido a um longo histórico de asilamento, acontece de pessoas com


graves transtornos mentais perderem totalmente seus vínculos
familiares e sociais. Qual o nome do programa que visa preencher esta
lacuna.
a) Serviço Residencial Terapêutico.
b) Serviço Ambulatorial Terapêutico.
c) Serviço Residencial Biopsicossocial.
d) Serviço Residencial Psiquiátrico.
e) Serviço Hospitalar Terapêutico.

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