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O boicote do Lobo Mau
O pátio da escola Raio de Luz estava praticamente lotado quando chegaram, mas
não se preocuparam, pois Sirius pediu para Andrômeda guardar os lugares no anfiteatro,
se chegassem muito tarde para a peça. Era o último dia de aula antes do Natal do primeiro
ano de Ninphadora e a escola promoveu uma feira de eventos, que incluíam atrações
diversas, barracas com guloseimas e ainda uma peça teatral, da qual Ninphadora
participaria.
– Diz de novo porque estamos aqui, Sirius – pediu James; todos eles parados em
frente à escola, observando as crianças barulhentas, remelentas e outros adjetivos mais
apropriados para quem tem entre cinco e dez anos de idade.
– Porque Andrômeda iria brigar comigo se eu não viesse e provavelmente ela ainda
vai brigar por chegarmos atrasados, então eu precisava trazer vocês para que a desculpa
do atraso seja de vocês e não minha, é claro.
James riu, já acostumado da cara de pau do amigo. Remus tapou os olhos com as
mãos, desolado, mas ainda sorrindo. Peter olhava com certo receio em volta, tinha uma
espécie de fobia de crianças, principalmente as hiperativas. O problema é que para onde
ele olhava, parecia que todas as crianças ali presentes – até as de colo – eram hiperativas.
– E você ainda diz que ela é sua prima favorita – replicou Lily, em tom de censura.
Segurou a mão do namorado e o puxou relutante para a entrada do colégio. Os outros o
seguiram devagar.
– Concordo, Sirius – disse James – Esse abajur não vai combinar em nada com as
cortinas rosa de listras amarelas, mas acho que podemos mudar de cor, que acha
querida?
– É só vocês trocarem a cor das cortinas com um toque da varinha– Sirius retorquiu
antes de Lily se manifestar.
– Bem, vou falar com Andrômeda, acabei de vê-la, e quando vocês terminarem de
discutir a decoração da minha futura casa juntem-se a nós.
Os quatro pareciam decepcionados (tudo bem, três deles estavam, Peter se sentiu
de certo modo aliviado), tendo em vista que acabaram de ver uma barraca de tiro ao alvo,
mas seguiram Lily, que andava com dificuldade tendo que carregar tantos embrulhos sem
o uso da magia. James e Remus logo se prontificaram a ajudá-la, enquanto Peter e Sirius
os seguiam logo atrás.
– Culpa deles – Sirius apontou sem cerimônia para os amigos, que rolaram os olhos
sem responder.
– Tem sido difícil controlar a Dora com as transformações, sabem – Ted tentou se
explicar, como se desculpando pela filha – Ela muda de forma sem perceber,
principalmente quando está nervosa. Acho que o convívio com os trouxas pode fazê-la ter
um pouco mais de autocontrole, então...
– Por isso concordei que ela estudasse aqui – disse Andrômeda, sem esconder o
desagrado, aparentemente algumas características da família ainda persistiam nela – Mas
ela sabe que qualquer deslize, voltará a ser educada por um professor particular. Ah,
chegamos.
– Lá está Dora – disse Andrômeda, apontando para o palco quando uma figura
baixa com um capuz vermelho espiava por detrás da cortina. – Está linda, não está? Não
sei do que se trata a história, mas espero que ela não caia em nenhuma cena. Dora é
muito desastrada...
A mãe acenou para a filha, que acenou de volta e como resultado, se desequilibrou
e caiu para fora do palco. Algumas risadas foram ouvidas, mas depois de se levantar com
ajuda, Ninphadora foi ao encontro dos pais quase correndo, devido a estar mancando.
– Está tudo bem – ela massageou o joelho e ainda sorrindo. Andrômeda a encarou.
– Desde que o John fez eu tropeçar e eu caí de boca em um móvel duro – ela disse,
como se falasse do tempo – Aí em troca eu soquei a cara dele, mas fui suspensa depois
disso. – ela diz rindo e dando de ombros. Sirius e James riram com vontade, enquanto os
outros abafavam as risadas diante dos pais.
Ela piscou várias vezes para assimilar o que foi dito e quando o encarou
novamente, sentiu as bochechas esquentarem. A raiz da franja começou a se tingir de
vermelha, mas logo voltou à cor natural.
– Porque não é você que tem o apelido de “Ninfa Voadora” – ela retrucou, querendo
brigar com ele, mal humorada, mas ainda envergonhada. Remus riu.
– Dora, não ligue para o que os outros falam, você é uma Tonks – disse
Andrômeda, com pomposidade. Foi a vez de Ted ficar com o rosto corado, orgulhoso –
Agora diga olá ao Sirius e seus amigos, querida.
– Como é que vai, Sirius? – ela o cumprimentou com um gesto típico de motoqueiro,
que foi retribuído por ele.
– Quando for maior de idade, Sirius – respondeu Andrômeda no lugar da filha. Ele a
ignorou.
– Conhece meus amigos? Esse é James e sua namorada, Lily – aqui ele se
aproximou da garota para sussurrar – em breve esposa, mas ela ainda não sabe, porque
ele ainda não fez o pedido, mas eu já dei o presente.
Dora riu e acenou para James e Lily, que estava morrendo de vergonha.
– E esses dois manés – Sirius continuou – São Remus Lupin e Peter Pettigrew.
– Dora! – alertou sua mãe. Os outros riram, mesmo Peter, que dessa vez só deu
uma risada discreta, visto que o novo apelido não agradou.
– Apelidos perfeitos. – disse James – Por que não pensamos nisso antes?
– Não deixa de combinar com você, Peter – disse Sirius, ainda rindo.
Dora endireitou sua postura e estufou o peito. Ergueu a cabeça e respondeu, tão
solene quanto o maroto.
– Sim, mas como sou muito comportada, merecerei todos os chocolates do mundo
até o fim do ano.
– Vamos fazer o seguinte – disse ela, como se estivesse fazendo uma negociação –
Você me dá um chocolate agora para garantir e mais um no fim da peça, que acha?
Dessa vez a risada foi geral, mesmo Andrômeda riu, um tanto envergonhada pela
atitude ousada da filha.
– Tudo bem, você me pegou. – dizendo isso, ele tirou uma barra de chocolate e a
entregou para a garota, que sorriu, deixando o dente quebrado à mostra. – Sabe
barganhar muito bem.
– Sim, mas o soco que dei no John o deixou inconsciente, então estavam tentando
reanimá-lo para depois disfarçar o olho roxo com a maquiagem – disse ela, naturalmente.
Antes que os pais de Ninphadora pudessem reclamar, a risada dos marotos agora
ecoava por todo o anfiteatro e algumas pessoas à frente se viravam para ver do que se
tratava.
– John acordou, mas se recusa a contracenar com você – disse ela, sem rodeios
diante dos pais, achava que Dora merecia um castigo – E bem, apesar de ser tentador,
não acho justo ter que substituir você, mas não tem ninguém que queira substituir o John,
tampouco.
– Ora essa, mas aí chegar a cancelar! – foi Sirius quem se manifestou – Mas
escuta, dona? Qual o papel do tal John?
– Claro que não! E nem pensar em cancelar a peça, fora de cogitação – exclamou
James.
– Não podemos deixar que todas essas crianças sejam frustradas por conta de um
único protótipo de ator-mirim que está se borrando nas calças com medo de uma garota!
– Bem, foi uma atitude muito indigna dessa mocinha, além do mais...
– Fazer com que ela quebrasse um dente também não pareceu muito digno por
parte do moleque – Peter observou, pela primeira vez se manifestando de modo decente.
– Ele foi devidamente castigado, assim como Dora, mas quanto à peça, lamento
dizer que...
– Hã... Sim? – a professora começava a ser influenciada pelo entusiasmo dos dois.
– Temos alguém que faria um perfeito papel de lobo! – disse Sirius, já apontando
para Remus.
– Ele é modesto, mas com certeza desempenhará muito bem seu papel – tornou
James, sorrindo como em uma propaganda de pasta de dente.
A professora encarou Remus criticamente. Não acreditou muito que ele fosse apto,
principalmente porque ele não parecia nem um pouco disposto a colaborar. Lily olhou para
James, às vezes era impossível impedir esses rompantes de infantilidade, principalmente
quando Sirius estava presente.
– Ah, vai Remus! – dessa vez foi Dora quem se manifestou – Por favor, por mim!
– Tudo bem, tudo bem... Mas acho que agora é você quem me deve um chocolate,
Dora. – disse ele, puxando o capuz para esconder a franja de Dora, de modo que a
professora pensasse que era brincadeira.
Ela sorriu em resposta e seu cabelo voltou ao normal. Tomou a mão dele, já
correndo para os bastidores. Remus conseguiu ouvir o som das risadas dos amigos, roxo
de vergonha.
Ele não teve tempo de decorar todas as falas, se leu uma vez o roteiro, foi muito. O
que mais o desagradou foi a roupa que teria que usar, uma imitação de pele de cachorro
que fez com que Remus se sentisse de certo modo ofendido e tomasse as dores de sua
classe. Afinal, os pêlos dos lobos não eram daquele jeito!
A peça ainda demorou aproximadamente 15 minutos para começar. O tormento
maior para Remus foi quando começou a tocar a música de abertura, que parecia
enjoativa até para as crianças que participavam da peça.
E quando entrou no palco, queria morrer ali mesmo ao ouvir as risadas dos seus
amigos e ainda de alguns expectadores. Como ele queria morrer...
O pior de tudo foi que ficou paralisado e se deu conta: tinha medo de palco. Ele
olhou para as pessoas e elas continuavam encarando, Sirius, James e Peter ainda
gargalhavam, mas foram reduzindo ao verem o embaraço do amigo. Lily olhava para ele,
tentando passar confiança, mais um dos fatores que faltavam a Remus naquele momento.
Então ele olhou para o palco e percebeu que Ninphadora já havia entrado em cena
e saía do palco, para a deixa do lobo. Ela o encarava do outro lado, um pouco assustada,
provavelmente percebendo que ele não conseguiria fazer a sua fala. Remus
definitivamente não queria decepcionar aquela garotinha, embora não quisesse fazer o
papel ridículo que estava fazendo. Respirou fundo e fez um esforço para se aproximar
mais da platéia, mas a professora o chamou.
– O lobo canta uma música dele mesmo. – disse ela, como se fosse óbvio – Ora
vamos, nunca ouviu falar da história?
Tendo nascido bruxo, Remus nunca ouviu falar de tal história, ele queria
simplesmente tirar aquela roupa ridícula e sair correndo.
– É assim – e ela segregou no ouvido dele e Remus ficou ainda mais horrorizado,
como se tivesse ouvido algo impróprio.
– Arruma outro lobo, então – ele já estava tirando as orelhas de lobo quando ouviu a
professora.
– Olha só, Dora parece feliz, não parece? Você vai desistir agora e deixar que ela
passe o vexame de não ter a peça finalizada?
Remus encarou a professora e observou Dora, que olhava para ele do outro lado do
palco, nos bastidores.
– Certo...
Remus foi pisando duro para o palco, ele podia sentir seu próprio rosto queimando,
tamanha era a vergonha que estava sentindo. Encarou a platéia, encarou os amigos, que
se controlavam para não rir (muito) naquele momento, e se posicionou no cenário da
floresta.
– Eu... – ele olhou para trás e viu não só a professora, mas também outros alunos,
entre eles Dora, incentivando. Por fim ele deu um longo suspiro e soltou de uma vez – Eu
sou o lobo mau, lobo mau, lobo mau, eu pego as crianças pra fazer mingau!
Ele abaixou a cabeça, com os olhos fechados. Pôde sentir seu rosto aquecer mais
ainda de vergonha e ouvir as gargalhadas de toda a platéia não amenizou a situação.
Remus permaneceu desolado, parado no meio do palco, até que sentiu alguém
pegar a sua mão. Ao abrir os olhos, ele viu Ninphadora sorrindo, exultante, e ele não
soube dizer se era pela coragem dele ter se humilhado com aquela música ou porque ela
estava se divertindo com a situação. Provavelmente era a segunda hipótese.
– Bem... Sou – Remus piscou, pensando que, apesar das roupas totalmente sem
noção da realidade, era óbvio que ele era um lobo.
– Hã... Então, hm... – ele tentava se lembrar da fala – Aham! O que traz uma
menininha graciosa como você sozinha a essa floresta?
Ela sorriu e se dirigiu para ele, se posicionando de modo que não ficasse de costas
para a platéia.
– Hm... – ele assentiu, completamente esquecido de sua fala. Dora percebeu, então
tentou improvisar.
– Minha mãe disse para eu ir direto para a casa da minha avó, sabe – disse Dora,
tentando ajudar – E me proibiu de... – ela se aproximou dele – Falar com estranhos,
entende?
Risadinhas da platéia indicavam que todos estavam cientes do quanto o lobo estava
confuso.
– Então... Desculpe a minha falta de educação; Eu sou o Lobo! – ele ouviu mais
risadas da platéia.
– Muito prazer – Remus repetiu, se sentindo um idiota por estar naquela situação.
– Tudo bem – ele inspirou e respirou – Então... Chapeuzinho, o que tem nessa
cesta?
– Você tem que chegar lá cedo, não é verdade? – mais uma vez Remus esquecera
a fala.
– Sim... Como eu disse, mamãe falou que não era para falar com estranhos, nem
me demorar pelo caminho. – Dora se divertia com a confusão dele.
Mais risadas da platéia, que agora não vinham de seus amigos, na verdade, eles
pareciam querer entender do que se tratava a peça. Do palco, Remus pôde ver a
professora nos bastidores olhar para o roteiro, com toda certeza ele errara a fala de novo.
Ele ouviu uma nova risada e percebeu que era Dora.
– Não, obrigada – ela decidiu adaptar o roteiro aos diálogos de Remus – Minha mãe
disse para eu mesma carregar. Mas sabe, esse canteiro de flores parece bem convidativo,
você acha que vou perder muito tempo se colher algumas? Sabe, não quero que ninguém
chegue antes para armar tocaia...
– Ah, certo... – ele olhou para o jardim artificial para onde ela apontava, quando se
lembrou mais ou menos do que devia dizer – Mas está um dia muito bonito, ensolarado e
tudo mais – mais risadas da platéia – Você pode colher algumas flores para sua
vovozinha, depois é só pegar um atalho. Não vai perder tempo de forma alguma.
– Eu? Ah, eu... Eu tenho umas contas para pagar, uns amigos para matar e procurar
um emprego decente que não seja de ator substituto, – agora ele pôde distinguir a risada
de Sirius vinda da platéia – então não poderei acompanhá-la hoje. Quem sabe outro dia.
Dora deu de ombros, acenou para Remus, que acenou de volta e foi para o
canteiro. Enquanto isso, Remus caminhava para fora do palco, enquanto o narrador
colocava a platéia a par do que ia acontecer: o lobo se dirigia à casa da vovó para devorar
a velhinha e pegar os doces da Chapeuzinho.
Remus achou aquele roteiro um absurdo. Desde quando um lobo tinha inteligência
suficiente para uma armadilha desse tipo? Só um animago mesmo, ou então um
lobisomem. Sorriu tristemente, lembrando que era a sua própria condição e estava quase
perdoando os amigos pelo vexame quando a professora o chamou novamente.
– Não está nada mau, apesar dos erros. Você tem que cantar de novo agora.
– Você deve estar brincando? – ele berrou – Eu já cantei uma vez, não vou cantar
de novo!
- É o roteiro! Pelo menos faça isso certo, já que está tudo fora do lugar!
– Por favor, senhor! Já chegou até aqui, não chegou? Vai querer decepcionar a
Dora agora?
Remus olhou para o palco, onde Dora agora era retirada com o cenário pelos
contra-regras, para que mudassem para o cenário da casa da vovó. Ele revirou os olhos e
pensou no tipo de chantagem que as pessoas podem fazer usando crianças para
alcançarem seus objetivos.
– Tudo bem! – ele gritou, já de volta ao palco, assustando a platéia. Ele apontou
para onde seus amigos estavam sentados – Vocês aí em cima me devem por isso! – E
tomou um grande fôlego para continuar – Eu sou o lobo mau, lobo mau, lobo mau, eu pego
as criancinhas para fazer mingau! PRONTO, CANTEI E NÃO VOU CANTAR DE NOVO!
Bateu três vezes na porta e mal ela se abriu para a criança fantasiada gritar “o
lobo!”, ele simplesmente falou:
– Ahn? – a menina piscou, sem entender nada e olhou para a professora, que dava
um tapa na própria testa, lamentando quando aceitou que aquele rapaz substituísse John.
– Isso mesmo. Eu ouvi tudo, tem um homem horrível vindo para cá, ele descobriu
que a senhora contrabandeia tortas de abóbora para outra cidade e ele está vindo prendê-
la.
– Mas...
– Sinto que é meu dever garantir que sua netinha ainda tenha uma avó para dar os
doces. Inclusive, ela vem chegando aí. Então, se me der licença, eu receberei os doces
em seu lugar, os guardarei em local seguro e assim que o homem mau aparecer e eu
afugentá-lo, entrarei em contato com a senhora via sinal de fumaça para que saiba que é
seguro voltar para casa.
– Senhora, melhor correr. Ele tem um machado, o que significa que está disposto a
praticar algum ato leviano de tortura para com a senhora e sua neta.
A platéia estava estática, menos por Sirius, James e até Peter, que vibravam com a
atuação de Remus. A professora lançou o roteiro para o alto, desistindo de fazer uma peça
normal. A menina que interpretava a vovozinha encarava Remus como se ele fosse senil.
– Mas escuta, você não tinha que me devorar? – ela perguntou, ao que Remus tinha
uma resposta na ponta da língua.
Ao terminar de falar, ele tenta recuperar o fôlego. Nunca tinha falado tanto em sua
vida, tinha descarregado boa parte da sua raiva, mas achou que ainda não foi o suficiente.
– Bem... – a garota que interpretava a vovó começou, mas diante do olhar quase
assassino do rapaz, ela resolveu aderir – Tudo bem, eu só vou pegar minha bolsa, chapéu
e bengala.
Ela reapareceu à porta e piscou para o lobo, sorrindo, marota. Quando ela chegou
nos bastidores, se dirigiu à professora, mostrando a língua.
– Bem feito, quem manda escolher a Dora como Chapeuzinho? – e saiu antes que a
professora abrisse a boca para responder.
Remus entrou na cabana improvisada, com as costas levemente inclinadas, devido
à baixa altura do teto. Segundo se lembrava, tinha que se fingir de vovó para enganar o
caçador, mas ao ver as roupas pequeninas, decidiu jogá-las para o lado e usar apenas a
touca. Não se importava mais com as risadas da platéia, queria apenas terminar logo com
aquilo. Foi para a cama, que desmoronou assim que ele se sentou, mas ele não ligou. Ele
se deitou e se enrolou com um lençol até o pescoço, deixando as “patas” ridiculamente de
fora e com uma cara de poucos amigos.
Logo ele ouviu Ninphadora chegar serelepe, cantando a música dela. “Por que os
trouxas insistem em uma trilha sonora para todas as histórias? Eles não percebem o
quanto isso é ridículo?”, ele pensou, ainda com raiva.
– Olá, vovó? – Dora abriu a porta, já encarando Remus. Ela teve que colocar a mão
no rosto para esconder o riso. – Sou eu, sua netinha!
Remus não entendeu o que os olhos tinham a ver, afinal, era só ela mencionar os
pés (ou patas) que estavam fora do lençol para descobrir que ele era um lobo.
– Bem... É que está escuro aqui, então tenho que arregalar os olhos para enxergar
melhor.
– E que nariz grande a senhora tem! – ela continuou, tentando disfarçar a vontade
de rir.
– Er... Bem, é que eu me resfriei e ele está um pouco inchado – Remus suspirou, se
obrigando a ter paciência.
Ela não se controlou e riu. Remus teve que esperar alguns minutos até ela
continuar.
– É nessa parte que eu digo que sou um lobo? – ele sussurra e ela acena com a
cabeça, não muito discreta, afirmando. – Então... – Ele continuou, em voz alta – Na
verdade, eu sou o Lobo! – ele retira o lençol, revelando a si próprio. – Mas se você tivesse
reparado nas minhas... “patas” teria visto isso logo na primeira vez.
– Na verdade, apenas pensei que a senhora, ou melhor, o senhor, estivesse
precisando de uma pedicura. – ela respondeu, tentando se justificar, improvisando
também.
– Tudo bem, isso agora não importa – ele se levantou com certa dificuldade, tirando
o gorro de vovó da cabeça – bastava apenas a fantasia de lobo para humilhá-lo
publicamente – Eu preciso que você entregue a sua cesta de doces, faça isso e depois
deve ir embora.
– Ela foi na frente, mas acho que desviou o caminho para o bingo da cidade.
– Escuta, mas por que eu tenho que deixar a cesta, pensei que você fosse me
devorar também!
Nesse momento, a porta se abriu e um menino moreno com uma fantasia típica de
caçador, empunhando um machado e olhando feio para os dois.
– Vocês dois são uns idiotas! – disse ele, rubro de raiva. Remus apenas arqueou a
sobrancelha e Dora pareceu atônita – Você! – apontou para Dora – Você está falando com
o LOBO! Era para você fugir, como toda garotinha amedrontada faz!
– E você, seu burro! Fez tudo errado! Onde já se viu um lobo vegetariano? Devia ter
decorado suas falas!
– Isso não interessa! E eu sou o herói da história! Deveria dar uma machadada no
lobo e abrir sua barriga para tirar a tosca da Chapeuzinho e a Vovó de dentro dela.
– Como você faria isso, se eu não as devorei de verdade? – Remus perguntou, pela
primeira vez surpreso.
– Eles mudariam o cenário! E você ainda por cima falou que eu era um assassino!
– Mas você não veio aqui com a intenção de matar o Lobo, que sou eu? –
perguntou Remus.
– Só porque você ia comer a vovó e a Chapeuzinho! – o moleque explicou, irritado.
– Não muda o fato de que você ia me matar, além do mais, eu só faria o que todos
os lobos normais e carnívoros fariam, mas sou um lobo vegetariano e mantenho minha
palavra – disse Remus, resoluto. – E se afaste da Chapeuzinho e sua cesta!
– Você é quem tem que se afastar dela! Essa história fala de um Lobo MAU, e você
É o lobo MAU! Você até cantou!
A platéia ria, mas nenhum dos dois se importava. Dora havia cruzado os braços e
olhava de um lado para o outro, entediada, acompanhando a discussão.
– Olha aqui, você está é querendo roubar a minha glória! Eu vou tacar esse
machado na sua testa mesmo assim e vou provar que sou inocente nessa história toda!
O caçador deu dois passos com o machado em mãos, mas não conseguiu se
aproximar. Recebeu um soco certeiro e foi para o chão. A platéia deu vários gritos de
espanto, exceto Sirius e James que vibravam e aplaudiam.
Dora ainda mantinha o braço com o pulso fechado estendido quando o caçador
abriu os olhos. Ela então colocou as mãos na cintura e olhou feio para ele.
Remus piscou algumas vezes para conseguir entender que Dora estava seguindo
com a história. Demorou alguns segundos antes de responder.
– Sua... – Jimmy começou, mas Dora mostrou o muque e ele recuou, com medo.
– Agora vamos ao bingo encontrar com a minha avó, ela deve estar com fome. –
disse ela, pegando a mão de Remus.
– Hm... – Remus olhou para Jimmy, o caçador, que continuava caído, aparvalhado
demais para demonstrar outra reação – Acho melhor garantirmos que ele fique longe do
machado e chamar as autoridades.
– Boa idéia – ela sorriu e Remus não soube ao certo se era um sorriso meigo típico
de criança, ou um maquiavélico de vingança. Estremeceu só de pensar.
Jimmy ofereceu certa resistência, mas contra Remus foi inútil. Logo estava no
armário, mas ainda se ouviam seus lamentos.
– Você não perde por esperar, Pontas – Remus continuava de cara fechada.
– Não me arrependo – disse ela, dando de ombros – Ele é que é um fresco metido a
herói!
Remus rolou os olhos. Depois de toda aquela encenação, ele queria era relaxar. Foi
quando sentiu alguém pegar na sua mão. Era Dora.
Todos encararam os dois atônitos. Remus, por sua vez, encarou a menina.
– Além disso, estou devendo um chocolate para o Remus e ele me deve um pela
minha brilhante atuação. Então... Papai, pode pagar o chocolate para mim? Minha mesada
já era...
Fim.