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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO

GROSSO/PROFLETRAS - UNIDADE SINOP

Disciplina: Literatura infantil e juvenil


Docente: Profª. Dra. Rosana Rodrigues da silva

Discente: Meri Cristiane Magalhães


Rocha
Contos Fantásticos
e Maravilhosos
PORQUE LER CONTOS NO MUNDO
DE HOJE, COM TANTO ATRATIVO
PARA DISTRAIR AS PESSOAS, EM
ESPECIAL CRIANÇAS E JOVENS?
Ler é viajar nas emoções, na curiosidade, no conhecimento, na
aprendizagem, no prazer. É produzir sentidos, para si, para o mundo,
para a vida.
Como garante Ana Maria Machado ler é antes de tudo um direito:

Mas não fiquem achando que eu acho que o professor deve ler, e
que o aluno deve ler. Nada disso. Não se trata de dever. Leitura
não é dever de ninguém. É um direito, isso sim, de todo cidadão,
e por ele temos de lutar. Isso sim é um dever. (MACHADO,
2001)
Contar história faz parte da herança cultural da espécie humana, habilidade
que marca fronteiras entre o homem e o animal. a narrativa possibilita o
registro de um evento, um fato do cotidiano, um feito heroico ou mesmo a
criação de enredos inusitados, fruto da imaginação humana.

A literatura fantasista “apresenta o mundo maravilhoso, criado pela


imaginação, e que existe fora dos limites do real e do senso comum”
(COELHO, 1991).
A origem do maravilhoso remonta a tempos pretéritos, época de fadas,
fontes mágicas, bosques encantados, associada, na literatura, às narrativas
primordiais.
No inicio dos tempos , o maravilhoso foi a fonte misteriosa e privilegiada de onde
nasceu a literatura. Deste maravilhoso nasceram personagens que possuem poderes
sobrenaturais; deslocam-se contrariando as leis da gravidade.; sofrem metamorfoses
continuas; defrontam-se com as forças do bem e do mal personificadas; sofrem
profecias que se cumprem; são beneficiadas com milagres; assistem fenômenos que
desafiam as leis da lógica, etc... (COELHO, 2000)

Para o historiador Jacques Le Goff, o maravilhoso contrapõe-se a


banalidade e normatividade regular do cotidiano, considerando que “Na
literatura encontra-se quase sempre .um maravilhoso cujas raízes são pré-
cristãs”.
Os animais podem ser “naturais” como o gato de botas, ou imaginários, como
o dragão e o unicórnio. As terras e o lugares podem ser também “naturais como as
florestas encantadas , ou oriundos da ação humana , como cidades, castelos,
associados ao sobrenatural.

Há ainda os objetos que Le Goff classifca como protetores (anel), produtores


(taça), fortalecedores (espada, cinturão), sagrados (jardim).
O crítico literário Tzvetan Todorov dedicou-se a estudar o fantástico, o
maravilhoso e o estranho como gêneros textuais. Define Fantástico como "a
hesitação experimentada por um ser que só conhece as leis naturais em face de
um acontecimento aparentemente Sobrenatural“(TODOROV,2004).

Filipe Furtado de certa forma da continuidade aos postulados todorovianos,


propondo que as narrativas do fantástico, do maravilhoso e do estranho agrupem-
se e como literatura do sobrenatural, devido a nela se tornarem dominantes os
temas que traduzem uma “fenomenologia metaempírica” (FURTADO, 1980).
Ao lado do maravilhoso que seduz crianças e adultos faz de presente a marca
da realidade por vezes remetendo a dureza da vida cotidiana.

Se faltam a criança um censo do real mais desenvolvido,


vivências mais profundas e um conhecimento que lhe permita
decodificar apropriadamente sua circunstância, não se pode
esperar que uma literatura infantil rigorosamente realista
preencha o efeito desejado, pois, para tanto, teria de contar
com o que ainda não existe (Zilberman, 2003).
Entra as narrativas da tradição, várias são as que apresentam maravilhoso em
sua tessitura. O próprio tempo mítico em que se passam o “era uma vez”
configura desde o início da história, o cenário em que as forças ligadas ao
maravilhoso atuam.
Outros elementos do maravilhoso são: a intervenção mágica ou divina,
geralmente atribuída a fadas ou outros seres sobrenaturais, como ocorre nos
contos.
Faz parte do maravilhoso, a maneira instantânea, o “passe de
mágica” que soluciona os problemas mais difíceis ou satisfaz
os desejos mais impossíveis. Tais soluções atende, sem sombra
de dúvida, a uma aspiração profunda da alma humana:
resolver, de maneira mágica ou por um golpe de sorte, os
problemas insuperáveis ou conquistar algo aparentemente
inalcançável. (COELHO, 2000)
Mais recentemente , no Brasil, há escritores que não se furtam a focalizar de
forma literária a realidade da vida. De certa forma, não há porque e nem como
preservar a criança de temas que abordam situações difíceis, as quais precisam
ser enfrentadas para que haja amadurecimento. Os contos contemporâneos e
tradicionais tratam do temas como abandono, morte, rejeição, dor, obstáculos,
etc. , ajudando a criança a vencer o medo e a enfrentar as dificuldades da vida.
Bruno Bettelheim critica nas histórias infantis modernas o quanto elas evitam
focalizar problemas existenciais, o que não ocorre na obra dos grandes escritores
da literatura infantojuvenil brasileira, em especial a contemporânea, tal a
qualidade de que se revestem os textos:

A criança necessita muito particularmente que lhe sejam dadas


sugestões em forma simbólica sobre a forma como ela pode
lidar com estas questões e crescer a salvo para a maturidade.
As estórias “fora de perigo” não mencionam nem a morte e
nem o envelhecimento, os limites de nossa existência, nem o
desejo pela vida eterna. O conto de fadas, em contraste,
confronta a criança honestamente com os predicamentos
humanos básicos.. (BETTELHEIM ,2003).
Por onde
andam as
fadas?
Há uma distinção, proposta por Neli Novaes Coelho, entre o conto
maravilhoso e o de fadas. O primeiro, cuja raízes encontram-se em narrativas
orientais, definir-se por sua natureza material social/sensorial (COELHO, 2000).
Temas mais relacionados à vida prática, cotidiana, de que Aladim e a lâmpada
maravilhosa ou Gato de Botas são exemplos. O conto de fadas, por sua vez, até
de natureza espiritual/ ética/ existencial ligado a magia féérica, originou-se entre
os celtas, relacionando-se sistematicamente ao mistério do além-vida e a
realização interior do ser humano, como se vê em Rapunzel e a bela adormecida.
Mas…quem são as fadas? De onde vieram?

A fada projeta-se no cenário da cultura ocidental, cristã e patriarcal como


marca de um feminino detentor de poderes que transcende a realidade de senso
comum: ela é um ser que vem de épocas muito antigas, habitando territórios
sobrenaturais. Geralmente imaginada com imagem também em termos de aspecto
físico. Distinguindo-se da bruxa velha com o nariz torto e verruga, seu revés, a
fada é pensada como uma bela e doce jovem pronta realizar os desejos mais
importantes dos seus eleitos: sua missão é “prever” e “prover” o futuro de algum
ser, pois simboliza talvez a face positiva e luminosa dessa força feminina e
essencial (COELHO, 2000)
A origem da fada remonta às moiras Gregas e as parcas latinas, cuja função
era presidir a vida humana, desde o nascimento até a morte. Portadoras do
“quinhão” reservado aos homens, essas divindades da metodologia representa o
destino, o fado:

A palavra fada, nas línguas românticas tem um significado


ligado ao conto maravilhoso ou de fadas, pois remonta a uma
palavra latina feminina, fata, variante rara de fatum (fado), que
se refere a uma deusa do destino. As fadas se assemelham a
esse tipo de deusas, pois também conhecem os caminhos da
sorte. Fatum, literalmente “aquilo que é falado”, o particípio
passado do verbo fari, “falar” em francês resulta em fée, no
italiano em fata, no espanhol em hada, todas as palavras
significando “fada” e contendo conotações ligadas ao fado.
(WARNER ,1999)
São três as parcas: Cloto Láquesis e Átropos, responsáveis respectivamente
por puxar o fio da vida (iniciando-a), por cuidar do desenvolvimento desse fio e
por cortá-lo com uma enorme tesoura (pondo-lhe fim). A elas associam-se, assim,
não só o destino como as ideias de vida e morte
A origem das fadas remete ainda ao povo celta, ao culto da Grande Deusa
Mãe, de certa forma a evolução do culto da Terra Mãe. Na sociedade celta, a
mulher desfrutava um espaço de liberdade e soberania. A banshee, fada irlandesa
a quem os próprios druidas se submetiam, associa-se tanto a vida como o anúncio
da morte. Ela é mensageira de outro mundo personagem que habita os territórios
do sobrenatural.
Em muitos contos de Perrault e dos Irmãos Grimm surgem fadas boas e más..
Em Pele de Asno, a Fada dos Lilases ajuda e protege a heroína e é graças também
a mediação mágica da fada madrinha que Cinderela consegue ir ao baile. Em
outros contos de Perrault, a fada exerce uma função que mais se aproxima de
juíza: em As fadas, surge na fonte como uma velha senhora para boa menina e
como rica a princesa para a irmã orgulhosa, concedendo a primeira, pela gentileza
de servir-lhe água, dom de expelir flores, pérolas e pedras preciosas ao falar,
enquanto para outra, por sua descortesia, o de cuspir sapos e cobras, oferece
portanto o prêmio ou castigo de acordo com o merecimento.
Em A Bela Adormecida do Bosque, conto consagrado por Walt Disney nas
telas de cinemas, a fada que não fora convidada para um banquete em
comemoração ao nascimento da princesinha aparece, conferindo-lhe o dom de
morrer ao espetar a mão em um fuso.
Com o passar do tempo, o bem e o mal exercido pela mesma figura separam-
se, o bem para se concentrar nessa personagem da fada, enquanto as ações
maléficas são atribuídas às bruxas.

Fadas = dom do bem e beleza


Bruxas = ser maléfico e fisicamente assustador
Na literatura infanto-juvenil brasileira nos últimos tempos novas fadas e
bruxas habitam as páginas dos livros levando seus leitores a repensar a
configuração desses personagens. Se considerarmos as narrativas fantásticas e
maravilhosas, os títulos são extensos: Há Lewis Carroll com Alice no País das
Maravilhas, C.S Lewis com as Crônicas de Nárnia, Tolkien e o Senhor dos Anéis,
Harry Potter de J.K Rowling e no Brasil se destaca as obras de Monteiro Lobato,
divisor de água entre os Contos Brasileiros anteriores adaptados dos clássicos
europeus.
Umberto Eco defende o “acordo ficcional” como norma para se penetrar nesse
mundo da ficção, destacando que é necessário o leitor perceber que o fato de a
história ser imaginada não se confunde com a mentira. O que importa é a
estrutura textual.
O conhecimento da especificidades do gênero auxilia a leitura desse tipo de
texto. Healt, retomando o estudo de René Predal sobre o cinema fantástico,
distingue três processos fundamentais que podem ser utilizados na narrativa
literária, todos os três articulando real e o sobrenatural:
•Intrusão de um elemento extraordinário no mundo ordinário;
•projeção de um elemento ordinário no mundo extraordinário;
•presença de elementos extraordinários no universo também extraordinário.
Para estimular a leitura dos contos fantásticos, várias estratégias são possíveis
e normalmente envolvem o antes, durante o depois. Assim é bastante produtivo
despertar a curiosidade do Futuro leitor para o livro.

A Organização das bibliotecas escolares e sala de leituras também é


importante: um lugar agradável, o fácil acesso às obras, arrumadas de forma
atraente criteriosa, estimulam o frequentador desse lugar que deve ser
continuamente renovado, tanto em sua aparência física como na qualidade do
acervo. Na escola é interessante preparar o cenário da sala conforme o gênero eu
tenho modo livro, criando uma ambiente que convide os alunos a entrar no clima
da história.
Tempo X Espaço
Ao mestre cabe a função de proporcionar um passeio turístico pelo meio
ficção auxiliando seus alunos a conhecer o texto literário. Constitui chamar
atenção para a estrutura textual do gênero narrativo com personagens vivendo
uma história no tempo e no espaço narrado de acordo com determinado ponto de
vista.

Após a análise e a interpretação da obra, vem uma etapa ancorada no leitor,


atividades em que ele avalia o que mais gostou, modifique o enredo, os
personagens, proponha novos finais, crie diálogos, dramatize partes da obra ou
toda ela, construa maquetes e cenário, interagindo racional ou emocionalmente
com a história lida.
Livros e filmes que revisitam com os tradicionais

Podem ser desenvolver leituras comparativas, especialmente


no eixo da intertextualidade analisando-se textos que revisitam
outros que lhe são anteriores. Alguns exemplos que revisitam os
Contos tradicionais com novas versões:
O quarto do Barba Azul de Ângela Carter apresenta novas
versões dos Contos Barba Azul, A Bela e a Fera, O Gato de
Botas, Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho entre outros de
Ana Maria Machado.
Existem vários contos tradicionais que receberam releituras adequando-se ao
contemporâneo fazendo uma repaginada dos contos. Os trabalhos podem se
estender ao cinema, como o caso da Chapeuzinho Vermelho, com os filmes: Deu
a Louca na Chapeuzinho, Chapeuzinho no século XXI, Na companhia dos lobos.
Maurício de Sousa escreveu: Mônica em Chapeuzinho Vermelho e Mônica em
vestidinho vermelho, fazendo uma analogia a obra de Ângela Carter.
As obras literárias levadas as células dos cinemas ajudam popularizar o
gênero. Há também os filmes que transitam entre o maravilhoso e o fantástico
como: Avatar, O Labirinto do Fauno, Peter Pan, entre outros.
Há uma boa lista de filme para as crianças e jovens atualmente, que
possibilita um bom trabalho docente, às vezes incentivando a leitura da obra
original ou pesquisas sobre o assunto. A criança intuitivamente se interessa por
aquilo que seus pais ou professores estão lendo.
Qual é a razão de trabalhar com
narrativas consideradas maravilhosas
ou fantásticas?

Por que o gênero, que vem de tempo


tão longínquos permanece?
A literatura propicia o “desalojar” do leitor da sua zona de conforto. A
literatura, por ser fruto da criatividade humana, não reproduz o já dito, não
permanece na superfície da obviedade. O texto literário, por sua literalidade e sua
plurisignificação, instiga a descobertas, permite viagens insuspeitadas. Pode
proporcionar de leite ou estranhamento mas dificilmente deixará que o leitor se
mantenha indiferente estimulando a reflexão crítica ao crescimento pessoal. A
fantasia não seria apenas compensatório mas uma forma de transformar uma
realidade opressiva.
A permanência do maravilhoso tanto nos textos literários contemporâneos
quanto nos estudos dos que suscita, talvez se explique pela própria necessidade
humana de imaginar, de transpor os limite impostos pela realidade ou pelo viver
cotidiano, trajetória em que se beneficia a tentativa de realização de desejo
humanos primordiais.
O maravilhoso permanece porque continua alimentar a alma humana, tão
carente de sonhos e de transcendência, tão sedenta de contar e ouvir histórias...
Assim:
Era uma vez, num reino muito distante, ou quem sabe aqui do lado...
Referências Bibliográficas

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