Você está na página 1de 18

A PSICANÁLISE

DOS
CONTOS DE FADA

A PSICANÁLISE
DOS CONTOS DE
FADAS
FOCALIZADORA: Vera Lúcia
Focalizadora: Vera Lúcia Ravagnani
Ravagnani
CONHECIMENTO EM CASA
CURSOS DE AMPLIAÇÃO
CULTURAL
CONTEÚDOS

1
INTRODUÇÃO

2.
Contos de
fadas: de sua
origem à
clínica
contemporânea

3.
PARA SABER
MAIS

4.
REFERÊNCIAS
INTRODUÇÃO

Todo mundo conhece a De curiosidades a leituras


história da Chapeuzinho psicanalíticas, passando por
Vermelho, certo? Será mesmo? contextualizações históricas e
E se eu te contasse que tem distintas adaptações o
muita coisa por trás daquilo que minicurso "A psicanálise dos
sabemos sobre os contos de
contos de fadas” módulo
fadas, além do que nos contaram
propõe um breve, porém
na infância? Ninguém é capaz de
profundo mergulho nesse
afirmar com clareza de onde vêm
universo de fantasia, que faz
essas histórias, mas uma coisa é
certa: há múltiplas Cinderelas por
parte do nosso inconsciente
aí, vindas de povos diferentes, coletivo e que vem
com culturas, línguas e valores atravessando séculos e
diferentes - o que nos deixa uma fronteiras geográficas, sempre
infinidade de possibilidades se reinventando e encantando
interpretativas para mergulhar adultos e crianças mundo
nesses contos clássicos. afora.
Contos de fadas: de sua origem à clínica
contemporânea

Raquel Elisabete Finger SchneiderI*; Sandra Djambolakdijan TorossianII**


IUniversidade do Vale do Rio dos Sinos
IIUniversidade Federal do Rio Grande do Sul

• 1 Os contos de fadas e a • 2 Na mágica viagem dos


infância contos de fadas, um pouco de
história
• Considerando que os contos de
fadas são histórias difundidas • O surgimento dos contos de fadas
desde a Antiguidade, com perde-se no tempo. A literatura
comprovada influência e registra que são histórias
relevância para o público infantil transmitidas oralmente de
também na contemporaneidade, geração a geração e que, mesmo
esta revisão de bibliografia visa a com toda a tecnologia existente,
contribuir para os estudos da mantêm seu espaço de destaque
aplicabilidade terapêutica dessa narrativo junto à infância. Já não
literatura. se reservam apenas à função de
distração ou de acalanto ao sono
• Percorremos a literatura em das crianças, mas seu poder se
busca de subsídios que expressa na magia e na fantasia
sustentassem o uso dos contos que despertam no infante.
na pesquisa em Psicologia clínica. Tornam-se, assim, alvo do estudo
Realizamos uma “garimpagem científico de diversas ciências do
arqueológica”dos contos de fadas conhecimento e do
e, no decorrer das “escavações”, desenvolvimento infantil, como a
fomos surpreendidos com Pedagogia, a Psicologia e, em
fragmentos, achados inusitados e especial, a psicanálise.
peças raras. Dessa “garimpagem”,
resultaram inúmeros achados • Muito se escreveu e ainda se
singulares e estabeleceu-se uma escreve sobre essa modalidade
necessidade seletiva. de literatura, numa tentativa de
abordar as questões pertinentes
• Procuramos organizar este artigo ao seu entendimento. Há
em torno de dois principais eixos. registros bastante antigos sobre
Num primeiro momento, os contos e seu uso nas mais
trataremos especificamente da diversas culturas. Os contos de
pesquisa dos contos de fadas, fadas, especialmente, têm
abordando a tradição oral e encantado várias gerações em
artesanal do Período Medieval até diferentes países e, antes mesmo
a contemporaneidade, com de serem registrados pela escrita
autores pioneiros, como Charles na forma como os conhecemos,
Perrault, o brasileiro Monteiro eram responsáveis pela formação
Lobato, situando as contribuições coletiva da espiritualidade e da
mais recentes da literatura que cultura de inúmeros povos (Melli
apontam para um processo & Giglio, 1999; Oliveira, 1993).
singular de subjetivação dos
corpos infantis. Num segundo
ponto, sustentamos a
aplicabilidade dos contos de fadas
na clínica psicológica, recorrendo
a diversas correntes teóricas.
A literatura, embora não seja • Originalmente construídos
unânime, aponta para a para o universo adulto, a
origem céltica (século II a.C.) partir da “descoberta da
dos contos de fadas. Hisada infância”(Ariés, 1981, p.
(1998) aborda os escritos de 11), passam a sofrer
Platão, nos quais mulheres mais adaptações no sentido de
velhas empregavam suas contemplarem as
histórias recheadas de simbologia
na educação de crianças. A necessidades das crianças,
autora cita Apuleio, filósofo do bem como de sua vida
século 2 d.C., e seu romance “O imaginária. Os contos se
Asno de Ouro”, que, em muito, configuravam em artifícios
lembra o conto “A Bela e a Fera”. fascinantes à fantasia
Também no Egito, refere Hisada infantil, narrados pelas
(1998), nos papiros dos irmãos amas, governantas e, ou,
Anúbis e Bata, foram
encontrados registros de contos pelas “cuidadoras”das
de fadas. Ferreira (1991) relata crianças, que se
que os povos da Antiguidade incumbiam de contar e
conheciam o universo fantástico perpetuar histórias de
existente nos contos. Seu enredo origem popular,
é tramado por tecidos de construídas com base na
refinadas matrizes do imaginário cultura do povo.
humano, cuja linguagem, repleta
de significados simbólicos e de • Os contos de fadas
metáforas, tem a capacidade de distinguem-se das demais
interligar o consciente e o
inconsciente. histórias infantis por
características como o uso
Os contos, em sua essência, não de magia e
eram destinados ao universo das encantamentos, um núcleo
crianças, uma vez que as problemático existencial no
histórias eram recheadas de
cenas de adultério, canibalismo, qual o herói ou a heroína
incesto, mortes hediondas e busca sua realização
outros componentes do pessoal e, finalmente, a
imaginário dos adultos. Souza existência de obstáculos a
(2005) faz menção aos contos, serem enfrentados pelos
descrevendo-os como histórias heróis (Caldin, 2002;
que narravam o destino dos Oliveira, 2001; Radino,
homens, suas dificuldades, seus
sentimentos, suas inter-relações 2003; Turkel, 2002). Para
e suas crenças no sobrenatural. Bettelheim (1980), é
Eram relatados por narradores característica desses
profissionais, os quais herdavam contos a presença de um
essa função dos antepassados, dilema existencial de forma
ou como uma simples tradição sucinta e categórica.
transmitida de pessoa para Cashdan (2000) afirma que
pessoa. Geralmente, as
narrações ocorriam em campos o conto de fada tem quatro
de lavouras, reuniões sociais, nas etapas: a travessia, a
salas de fiar, casas de chá, nas viagem ao mundo mágico;
aldeias ou nos demais espaços o encontro com o
em que os adultos se reuniam personagem do mal ou o
(Radino, 2001, 2003). obstáculo a ser vencido; a
dificuldade a ser superada;
e a conquista (destruição
do mal); a celebração da
recompensa.
Os contos se caracterizam por serem uma • Entre os precursores na coleta
narrativa cujos personagens heróis e, ou, dessasnarrativas populares, os contos,
heroínas enfrentam grandes desafios para, encontra-se Perrault (1628-1703). Esse
no final, triunfarem sobre o mal. autor registrava as histórias com base
Permeados por magias e encantamentos, em narrações populares, adaptava-as e
animais falantes, fadas madrinhas, reis e as floreava conforme a necessidade da
rainhas, ogros, lobos e bruxas corte francesa da época, acrescentando
personificam o bem e o mal. No conto de proeminências e censurando detalhes
fadas, tapetes voam, galinhas põem ovos da cultura pagã e da sexualidade
de ouro, pés de feijão crescem até o céu, humana. Seus contos, até mesmo as
enfim, traz-se à tona o inverossímil, e é versões infantis, são recheados de uma
essa magia que instiga a mente humana mensagem moral explícita,
(Bettelheim, 1980; Hisada, 2003; Radino, normalmente colocada em apêndices
2003). sob forma de versos. A mensagem
moral, conforme descreve Perrault,
Na forma como atualmente são tinha como finalidade servir de
conhecidos, os contos de fadas surgiram orientação e de ensinamento aos que a
na Europa, especialmente na França e na ouvissem. Apesar de escrever contos de
Alemanha, no final do século XVII e XVIII fadas, em suas histórias, as fadas são
(Lubetsky, 1989). O momento histórico se personagens pouco presentes. Perrault
configurava com a Inglaterra, que passava preferiu introduzir figuras
pela sua segunda Revolução Industrial e
detinha o controle capitalista da época, e • humildes, como lenhadores, serviçais,
a Igreja, que atravessava a aldeões, damas e cavaleiros. Outro
Contrarreforma. Os contos daquele aspecto relevante de seus contos
período eram permeados pela “Moral mostra-se na escolha em retratar as
Vitoriana”, de uma sociedade repressiva lindas paisagens francesas, suas
quanto às questões sexuais, considerando campinas, a atmosfera desses lugares.
que os conceitos de infância e de Sua obra mais famosa,
educação também não eram vigentes intitulada Contos da Mamãe Gansa,
naquela época. veio ao público em meados de 1697 e
apresenta uma versão da história de
Chapeuzinho Vermelho, ressalvando o
fato de o Lobo sair vitorioso ao final.
Também integram essa coletânea
contos como A Bela Adormecida, Barba
Azul, O Gato de Botas, As Fadas,
Cinderela, O Pequeno
Polegar (Figueiredo, 1998, Góes, 1991;
Lima, 2000; Lubetsky, 1989; Oliveira
2001; Radino, 2003; Silva, 2004;
Souza, 2005).
Há registros na literatura Inúmeros contos foram
consultada de que o movimento registrados também pelos
romântico instaurado na época alemães Jacob Grimm (1785-
trouxe aos contos um sentido 1863) e Wilhelm Grimm (1786-
mais humanitário (Góes, 1991). 1859), mais conhecidos como os
Dessa forma, a violência Irmãos Grimm. Filósofos e
presente nos contos de Perrault estudiosos da mitologia
concede espaço ao humanismo germânica e da história do direito
que, de forma delicada, perpassa alemão, passaram a coletar e a
as histórias escritas pelos irmãos estudar uma grande massa de
Grimm, preconizando a textos e de histórias populares
solidariedade e o amor ao medievais de origem germânica e
próximo. Os aspectos mais francesa contadas oralmente
agressivos ainda se mostram (Robinson, 2004). Como
presentes, personificados consequência, publicaram (1812-
principalmente na figura do Lobo 1822) 210 histórias em três
e da Bruxa, porém, ao final, volumes para crianças e adultos.
impera a esperança, a confiança Seus contos são povoados por
na vida e o indispensável final madrastas malvadas, príncipes
feliz. encantados, casas de chocolate,
bruxas perversas, feras, entre
outros personagens singulares.
Entre os contos que foram
traduzidos para o português,
destacam-se: A Bela e a Fera, Os
Músicos de Bremen, Branca de
Neve e os Sete Anões,
Chapeuzinho Vermelho e Gata
Borralheira. Da Alemanha, de
1850 até hoje, os contos de
Grimm traduzem histórias de
lendas e fábulas populares que
os irmãos ouviram viajando por
aquele país. À diferença de
Perrault, registraram essas
histórias nas versões originais,
sem adaptações e lições de moral
explícitas (Hisada, 1998; Lima,
2000; Lubetsky, 1989; Oliveira,
2001; Radino, 2003; Silva, 2004;
Souza, 2005).
O poeta e novelista dinamarquês • A literatura assinala três
Hans Christian Andersen (1805- importantes vértices que
1875), considerado por muitos tornam a obra de Andersen
como o pai da literatura infantil, inédita: a criança retratada por
destacou-se justamente por meio dos personagens,
escrever seus contos diretamente brinquedos que ganham vida e
para as crianças. Diferente dos histórias nas quais o papel
demais autores da época, que principal é ocupado por uma
adaptavam as histórias à criança. Esses personagens
realidade infantil, Andersen criou infantis que falam pelas
uma narrativa destinada para crianças expressando seus
esse público. Fortemente sofrimentos e temores têm na
influenciado pelas histórias obra do Patinho Feio sua
narradas por seu pai, um representação mais
humilde sapateiro, Andersen significativa. Alguns autores
utilizou-se do sofrimento aludem a esse conto, em
observado nas crianças menos especial, como sendo o retrato
favorecidas e pobres para da vida do escritor e seu difícil
rechear seus contos. Soube como percurso. Seus contos, como
ninguém retratar os desejos da o Soldadinho de Chumbo,
população, fazendo com que suas trazem a animação de objetos
histórias assumissem a estrutura como os brinquedos,
de crônicas tristes, muitas vezes caracterizando a impotência
com conteúdos extraídos de seu dos pequenos, cheios de
próprio cotidiano, inaugurando, desejos, porém não escutados
assim, o que hoje denominamos e não compreendidos. E,
de literatura infantil finalmente, credita um papel
de protagonista às crianças,
como acontece no conto A
Roupa Nova do Imperador,
narrativa que delega a uma
criança a importante tarefa de
alertar o Imperador sobre a
falta das vestes dele. Em seus
contos, encontramos também
sereias, fadas e animais
fantásticos. Ao longo da obra,
é possível perceber os valores
morais sutilmente embutidos
nas histórias, assim como a
ausência de jargões como “e
foram felizes para sempre
• Ao longo da história, • No Brasil e em Portugal, os
destacaram-se também as contos de fadas como são
importantes contribuições conhecidos hoje surgiram
do inglês Lewis Carroll, no final do século XIX sob
autor de Alice no País das o nome de Contos da
Maravilhas e Do Outro Carochinha. Somando,
Lado do Espelho; do aproximadamente, 61
italiano Carlo Collodi, que, contos populares,
em 1881, passaram a ser
escreveu Pinocchio; do denominados contos de
escocês James Berrie, fadas somente no final do
descrevendo as aventuras século XX. Radino (2003)
do levado Peter Pan; e do aponta para o fato de o
americano L. Frank Baum, termo “carochinha”significar
autor de O Mágico de Oz. carocha ou bruxa,
Esses contos infantis são concedendo-lhes, dessa
elencados por alguns dos forma, uma conotação
críticos literários, a nociva de mentira.
exemplo de Corso & Corso
(2006), como contos
modernos, em detrimento
dos clássicos escritos na
Europa do século XVII. O
que se sabe ao certo é
que, clássicos ou
modernos, os contos
infantis embalam a fantasia
e a imaginação das
crianças, sobrevivendo aos
séculos e sendo apreciados
e difundidos até os dias
atuais.
• Como destaque brasileiro na • Autores mais recentes
produção de contos de fadas, (Hillesheim, 2006; Zilberman,
podemos citar as sofisticadas 1998) analisam a construção
histórias de Monteiro Lobato, da infância e do sujeito a partir
nas quais bonecas falam e da literatura infantil
sabugos de milho se contemporânea. Eles apontam
transformam em geniais a potencialidade da literatura
cientistas. É atribuída a esse de subjetivar as crianças, uma
autor a publicação de 26 títulos vez que esses textos
direcionados ao público infantil, constroem um conceito de
influenciando autores infância com o qual as crianças
contemporâneos como Ziraldo, contemporâneas se conectam.
Ana Maria Machado e Ruth Hillesheim (2006) aponta que
Rocha. Radino (2003) enfatiza os contos desenham
que, para Monteiro Lobato, o configurações de infância,
livro, a história ou mesmo o preceituando falas nas quais
conto de fadas são vividos e culpa, irracionalidade,
experimentados pelas crianças inocência operam sobre o
como um agente disciplinamento e o controle
transformador, auxiliando-as dos corpos infantis.
na construção de sua crítica, Concomitantemente, por
de sua criatividade e, operarem como um dispositivo
sobretudo, de sua liberdade, artístico, possibilitam ruptura,
pois, neles, elas aprendem transgressão e resistência,
brincando. instaurando o “estranhamento”.
Zilberman (1998) refere que a
literatura infantil
contemporânea se ocupa de
uma linha narrativa que retrata
personagens que internalizam
várias crises do mundo social.
Tais modificações denotam,
inclusive, uma modificação na
noção de infância,
configurando-se essa em uma
imagem de criança crítica da
contemporaneidade.
3 Os contos de fadas como
dispositivo de intervenção
na prática clínica
Os contos, desde sua origem, já O conto favorece a introspecção,
exerceriam função terapêutica, afirma Caldin (2004), pois, por
fato que explicaria sua intermédio dele, a criança tem a
permanência e transmissão possibilidade de pensar sobre
transgeracional ao longo dos seus sentimentos e tem a
séculos (Gutfreind, 2003). esperança de que o sofrimento
Conforme descrito por que a acomete venha a ser
Dieckmann (1986), e mais passageiro. A introspecção, pela
recentemente por Hisada (1998) literatura, atrai as emoções do
e Melli & Giglio (1999), os contos ouvinte ou do leitor e tem a
de fadas eram amplamente capacidade de liberá-las. O autor
usados na medicina hindu como faz menção especial à criança
método terapêutico para pessoas frágil e ou mesmo doente, pois
que apresentavam problemas essa se preocupa em demasia
mentais. A elas, era oferecido o consigo mesma e, portanto,
conto com o objetivo de aprecia os textos que falam de
estimular sua meditação. O conto seus problemas. A
é vivido como personificação de universalização dos problemas é
formações e evoluções interiores uma garantia de que ela não se
da mente, pois usam a mesma encontra sozinha na sua dor.
linguagem que o inconsciente. Considera-se que a leitura ou a
narração da história produz
reflexões, mesmo quando a
criança se encontra sozinha no
seu quarto, de dia ou à noite; ao
se lembrar da história, pode
sentir-se mais reconfortada. Os
contos são fonte de prazer para
as crianças tanto pelo ouvir
quanto pela sua representação.
Prazer produz alegria, e alegria é
terapêutica, afirma Caldin
(2004).
• O discurso literário abre • Monaci (1990) afirma a
perspectivas para a percepção importância da narração de
do mundo do ponto de vista da contos e histórias não só num
infância, traduzindo suas sentido terapêutico, mas para a
emoções, seus sentimentos, estimulação do repertório de
suas condições existenciais em soluções adaptativas de
linguagem simbólica que conflitos, de entendimento de
efetue a catarse e promova um sentimentos, de motivações,
ensaio geral da vida. de solidariedade, de confiança,
Favorecem a socialização pela de transmissão de valores, da
participação em grupo, e sabe- busca do autoconceito, na
se que o convívio social tentativa de estabelecer um
mostra-se importante significado de vida. Para
instrumento na cura de criação e incentivo da
doenças. Há que se salientar imaginação, da busca do
que, ao conciliar literatura e entendimento do inconsciente,
terapia, o narrador, após a no auxílio do encontro da
história, deve incentivar a criança dentro do adulto. Ou,
criança a trocar ideias e a então, para o desenvolvimento
realizar um exercício de e compreensão da linguagem
reflexão entre o real e o oral, escrita e gestual da
imaginário (Caldin, 2004). leitura, das influências que o
contador de histórias recebe e
transmite.
• Posse (2004), ao falar sobre a
psicoterapia junguiana
direcionada a pacientes
psicossomáticos, sugere o uso
dos contos de fadas, da
interpretação de sonhos, de
imagens e mitos, uma vez que
essas reflexões podem ser um
enlace com o mundo e a psique
do paciente psicossomático.
Esse recurso favorece o diálogo
e a possibilidade de
socialização dos participantes,
promovendo, assim, uma
melhora funcional na sua
comunicação.
Ferreira (1991) enfatiza o • Chauí (1984), filosofa que
uso dos contos como se lança no entendimento
dispositivos terapêuticos com psicanalítico dos contos de
pacientes em internação fadas, trabalha e estuda o
hospitalar, pois se mostram conteúdo desses contos no
histórias imbuídas de afetos atendimento a crianças
e mistérios, objetivando a vitimadas por abuso
totalidade psíquica. O sexual. Escreve que os
exercício de ouvir, dialogar a contos operam como uma
respeito de uma ideia, de um espécie de “rito de
sentimento, e dar expressão passagem”, ao auxiliarem a
às imagens por intermédio criança a administrar o
de traços de desenhos é, presente, a preparar-se
sem dúvida, um precioso para adversidades futuras
meio de reordenação e e a separar-se do seu
transformação, favorecendo mundo familiar, por
a evolução do paciente. consequência, seu ingresso
Fortalecida, a pessoa terá no âmbito adulto. Elenca
por consequência sua sua relação com a
capacidade de socialização sexualidade, por
ampliada. Costa (2002) abordarem as temáticas de
descreve o uso dos contos de forma ambígua. Os contos,
fadas como recurso por um vértice, permitem e
terapêutico na intervenção estimulam o acesso aos
de crianças com câncer, pelo desejos, fantasias
fato de essas histórias inconscientes; por outro,
falarem de dificuldades reforçam os padrões de
humanas e tornarem mais repressão sexual, pois
fácil a expressão das suas punem os transgressores e
angústias. mostram o momento
adequado e desejado para
a manifestação dos
conteúdos sexuais, por
vezes criando estereótipos
de masculinidade e
feminilidade.
• Cyrulnik (2005) enfatiza • Safra (2005) apresenta
o encantamento das o conto de fadas como
crianças com narrações uma possibilidade de
do tipo “era uma vez”, intervenção na clínica
por oferecerem uma psicológica, afirmando
bela passagem, uma que auxilia no
oportunidade de enfrentamento das
felicidade, um dificuldades e no
aliciamento afetivo no aprofundamento dos
qual aquele que narra vínculos da criança com
faz um convite para que o terapeuta, assim
as aventuras verbais como com seus pais.
sejam compartilhadas Aponta que o uso de
com aqueles que as histórias na psicoterapia
escutam. Ao falar da mostra-se uma
mágica viagem do “era intervenção positiva
uma vez”, Cyrulnik justamente por
antecipa que as crianças propiciar a inclusão dos
feridas emocionalmente pais, “contadores no lar”,
encontram certa no processo terapêutico
dificuldade para da criança. Sua
embarcar nessa relevância sustenta-se
aventura, uma vez que também por possibilitar
compartilhar uma seu uso em trabalhos
história de infelicidades institucionais a partir de
é sofrer uma segunda diversas perspectivas,
vez. Assinala que a seja em trabalhos
narração oferece uma individuais ou grupais.
proteção ao psiquismo • (...)
da criança, um reviver
sua história por meio do
faz de conta.
• Os contos podem ser • Constatamos, portanto,
usados, de forma que a literatura nacional e
terapêutica, como internacional oferece
mediadores entre o mundo subsídios, resgatando a
interno e a realidade veiculação secular dos
externa da criança, como contos de fadas pelas mais
dispositivos de contenção diversificadas culturas e
de seus aspectos psíquicos, gerações, encantando
sendo, ainda, uma adultos e, sobretudo,
possibilidade de crianças. Remete-nos a sua
intervenção em seu constituição histórica e
processo de artesanal no Período
desenvolvimento. Dessa Medieval, principalmente,
forma, a criança não até a atualidade,
necessitará refugiar-se em imortalizando narradores e
uma organização defensiva escritores que contribuíram
patológica, ou mesmo significativamente para o
desenvolver um sintoma registro dessas histórias de
por meio do qual o corpo origem popular. Na clínica
siga sofrendo em lugar da psicanalítica, destaca-se o
mente (Dias, 2003; Ferro, crescente uso dos contos
1995; Hisada, 1998; como instrumentos
Radino, 2001, 2003; Safra, terapêuticos em oficinas na
2005; Shepherd, Johns & área da saúde (Gutfreind,
Robinson, 1997; Winnicott, 2003; Schneider, 2008;
Shepherd & Davis, 2005). Torossian, 2008) e
percebe-se uma
congruência entre a
narrativa dos contos de
fadas e a de histórias de
vida.

4. PARA SABER MAIS

• https://www.youtube.com/watch?v=QwuDkCBqatg&ab_chann
el=NOVAACR%C3%93POLEBRASIL

• http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S1677-11682009000200009

• http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S1413-389X2012000200004
5. REFERÊNCIAS

• BETTELHEIM, Bruno (1980). A Psicanálise dos Contos de Fadas.


Rio de Janeiro: Paz e Terra.COSTA, Teresinha (2010). Psicanálise
com Crianças. Rio de Janeiro: Zahar.

• COELHO, Nelly Novaes. O conto de fadas: símbolos mitos


arquétipos. . São Paulo: DCL. . Acesso em: 01 ago. 2022. , 2003

• https://volobuef.tripod.com

Você também pode gostar