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Capítulo 4

Ansiedade clinicamente relevante: um relato de caso

Segundo Skinner, a analise funcional ou causal é um modo investigativo, no


qual se tem uma relação de causa e efeito entre as variáveis dependentes (o efeito para
qual procuramos a causa e as variáveis independentes (causas do comportamento). Por
meio de tal análise buscamos a explicação do comportamento, ou seja identificamos as
variáveis das quais o comportamento é função, ou ainda identificar a resposta e suas
consequências reforçadoras. Sendo assim o comportamento deve ser analisado em
função das contingências reforçadoras.

Diferença entre avaliação funcional e análise funcional:

O termo avaliação funcional diz respeito as infinitas formas de se tentar


identificar os antecedentes e consequências de um comportamento ou ainda pode ser
apontado como a identificação das relações entre o indivíduo e o seu mundo (R – C e a
relação entre ambos). Deste modo quando diante de um comportamento desejarmos
modifica-lo precisaremos avaliar funcionalmente o mesmo, descrevendo-os,
identificando-os e até suas consequências visando a formulação das hipóteses.

A classe de respostas é construída no decorrer da avaliação, tanto por relatos


verbais quanto pelas observações no meio.

Ansiedade

Trata-se da resposta diante de um evento de perigo ou ameaça. Em decorrência


disso, temos o surgimento de algumas sensações, como visão borrada, formigamento,
tontura, faltas de ar, dentre outras.

Aqui temos respostas ao perigo, denominadas como respostas de luta e fuga, que
são reações fisiológicas do próprio organismo que visa protege-lo. Essas respostas
surgiram em decorrência do processo de adaptação que a espécie surgiu ao longo dos
anos.

Obs: ocorrem geralmente em decorrência de experiências negativas e estímulos


aversivos.
A ansiedade é vista como fenômeno clinico quando há comprometimento do
indivíduo em diversas áreas da vida, quando envolve sofrimento significativo para o
indivíduo e quando as respostas de fuga/esquiva comprometem o andamento cotidiano
do mesmo.

Transtorno de pânico – manual de psiquiatria

De acordo com o DSM-5, boa parte dos transtornos de ansiedade incluem


características de medo e ansiedade excessivos. Sendo assim o medo passa a se
caracterizar como uma resposta emocional a ameaça iminente real ou percebida,
enquanto a ansiedade é caracterizada como uma resposta de antecipação de ameaça que
pode acontecer no futuro.

Enquadrado dentro dos transtornos de ansiedade, segundo o manual da


psiquiatria, o transtorno de pânico apresenta como característica principal surgimento
inesperado e recorrente, caracterizado como um surto abrupto de desconforto intenso ao
qual se alcança o pico em minutos e do qual decorrem sintomas fisiológicos também,
como palpitações, calafrios, medo de perder o controle e etc.

Barlow 2016, aponta que a ansiedade a mais derivada do ataque de pânico ou a


mudança/consequência decorrente disso é que define o transtorno de pânico. Essa
ansiedade a mais junto com as cognições catastróficas diante dele é o que diferencia o
transtorno de pânico dos demais transtornos de ansiedade.

Método

Participante:

Sexo feminino, com 41 anos, identificada por N.

Casada há 19 anos, mãe de um filho de 15.

Dona de casa, apresentando ensino fundamental incompleto.

Materiais e ambiente:
As sessões de terapia ocorreram em um consultório psicológico em uma cidade
do estado do Mato Grosso.

Foi utilizado o questionário de História Vital, que abordam 13 aspectos da vida


do indivíduo. Para abordar a psicoeducação, foi-se utilizado um notebook para
apresentação de conteúdo em PowerPoint. Além disso foi empregado também
atividades de registro como o diário de registro, que envolvem alguns aspectos
dispostos em coluna; Diário de registro de comportamento inadequado e adequados do
filho, com colunas para o registro dos mesmos e uma folha de registro para o período de
férias também.

Procedimento:

A paciente foi selecionada por meio do contato da terapeuta com pessoas


conhecidas e profissionais da área da saúde para quem comunicava que estava em busca
de alguém com diagnostico relacionado a ansiedade. Ao identifica-la, foi feito o convite
e marcado a primeira sessão.

Ocorreram 30 sessões com duração de 5º minutos cada uma.

1ª e 2ª sessão: foi explicado como seria feito o trabalho, tiradas as dúvidas e


apresentando e coletando assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.
Realizada também entrevista para levantar informações sobre queixas e eventos
antecedentes e consequentes aos comportamentos queixa relatados. Foi entregue
também o questionário de história vital de Lazarus 1975/1980 como tarefa de casa.

3ª sessão: realizou-se uma hierarquia das situações geradoras de medo e


utilizou-se a escala subjetiva de desconforto, que objetiva identificar o nível de
ansiedade baseado numa escala de 0 a 10.

4ª e 5ª sessão: realizou-se psicoeducação sobre o medo e ansiedade com base no


conteúdo do texto fisiologia e psicologia do medo e da ansiedade. O conteúdo foi lido
junto a paciente e as dúvidas retiradas à medida que surgiriam. A paciente recebeu uma
cópia do texto.

6ª e 7ª sessão: aplicação de técnicas de hiperventilação e respiração


diafragmática, que respectivamente simulavam a reação de luta e fuga produzida pela
ativação do SNAS, e em seguida com o objetivo de ativar o SNAP restaurando a
sensação de relaxamento.
8ª, 9ª, 10ª e 11ª sessão: realizada psicoeducação sobre o ciclo de pânico, por
meio de uma apresentação verbal + PowerPoint, junto a descrição de exemplos
cotidianos. Foi entregue também um diário de registro como tarefa de casa para registro
de data/hora, situação, sensações, pensamentos, emoções /comportamento e
consequência, além de questões acerca da veracidade dos pensamentos.

12ª e 13ª sessão: aplicação da técnica de ACALME-SE, cada letra da sigla


aponta algo que se deve seguir como objetivo de auxiliá-la manejar a ansiedade,
aceitando assim sua ansiedade, contemplar as coisas a sua volta, agir com ansiedade,
liberar o ar de seus pulmões, examinas seus pensamentos, dentre outros.

14ª sessão: foi entregue um registro para a casa sobre os comportamentos


inadequados do filho, durante a semana com o objetivo de verificar o tipo e a frequência
de comportamentos inadequados emitidos pelo adolescente e observados pela (mãe)
participante.

15ª e 16ª sessão: foi verificado o registro de comportamentos inadequados e


passado um novo registro, agora de comportamentos adequados do filho com o objetivo
de verificar os comportamentos adequados emitidos pelo filho e emissão de respostas
em forma de atenção social pela mãe participante em consequências a esses
comportamentos.

17ª sessão: foi entregue uma atividade para registro durante o período de
recesso, cuja duração foi de três semanas. Foi proposto a participante que registrasse as
atividades realizadas nesse período bem como as técnicas por ela utilizadas.

18ª sessão: levantou-se informações sobre queixas aquele momento da terapia e


verificado o registro proposto no período das férias.

19ª a 26ª sessão: foi realizada a exposição por imaginação das situações
geradoras de medo (exposição/ situação de hierarquia). As situações eram relacionadas
a viajar, costurar e relacionadas a estímulos sonoros inesperados. Visando ver o nível de
desconforto da mesma diante a imaginação das situações e aplicação as técnicas de
respiração para chegar ao relaxamento. Elas seguiam da situação que causaria menor
grau de desconforto até a de maior grau.

27ª a 30ª sessão: avaliações finais, continuação da exposição/situação de


hierarquia, com o relato da situação, comportamento e consequência.
Resultados:

A participante queixou-se de sintomas fisiológicos, como palpitação, coração


acelerado, taquicardia, sudorese, tremores, sensações de falta de ar, desconforto
torácico, náusea, sensação de tontura, parestesias, medo de perder o controle, além de
medo de sair de casa sozinha, medo ou ansiedade marcantes de permanecer em espaços
abertos e em locais fechados e, ainda ansiedade e preocupação excessiva com o filho e
perturbação no sono.

Eventos antecedentes: 2002 seu filho nasceu e com poucos dias devida teve
problemas de saúde, necessitando de cuidados médicos na unidade de terapia intensiva
neonatal onde ficou por 10 dias; após um ano do nascimento do seu filho, buscou um
psiquiatra por estar deprimida e com insônia, sendo diagnosticada com depressão e
submetida a tratamento medicamentoso: fluoxetina e clonazepan. Por volta de 2005, seu
filho estava com três anos, vivenciou uma crise em seu casamento decorrente de uma
traição por seu marido, o que a abalou muito. A partir daí buscou um psiquiatra com as
queixas: falta de iniciativa, baixa autoestima, sentimento de inutilidade, humor
deprimido, acentuada diminuição do interesse ou prazer, insônia, sendo mantido o
diagnóstico de depressão acompanhado agora de ansiedade. Medicada com bupropiona
300mg.

Instalação do transtorno de pânico: há cerca de 3 anos N., experimentou seu


primeiro ataque de pânico em decorrência de um evento envolvendo seu filho que
estava com 12 anos: o mesmo foi agredido por uma colega na escola, até desmaiar. O
ataque de pânico foi caracterizado por tremores, coração acelerado, náusea, desconforto
abdominal e calafrios. Nessa ocasião buscou um psiquiatra que prescreveu
venlafaxina 50 mg, clonazepan, lamotrigina 100mg, Brintellix e a orientou a buscar
tratamento psicológico. Na época deste estudo a paciente por conta própria interrompeu
os medicamentos lamotrigina 100mg e Brintellix, mantendo apenas os outros dois.

Notou-se mediante as contingências de reforço mantenedoras dos


comportamentos de fuga-esquiva, que os mesmos são provavelmente mantidos por
reforçamento negativo, que visam remover ou eliminar ou ainda adiar determinada
demanda, diminuição das sensações corporais ou sensação de alivio momentâneo. E
isso propicia que os comportamentos de fuga/esquiva no futuro voltem a ocorrer. Porem
contrariamente à mesma também fica frustrada por ter que deixar de ir aos lugares, o
que fez com que a mesma passasse a emitir comportamentos desejáveis, incluindo as
técnicas de respiração para controlar a ansiedade e medo que pudessem vir a surgir, o
que permitiu que a mesma entrasse em contato com reforçadores positivos como
atenção do marido e cachorros.

Importância da Analise comportamental

Ficou inferido que a avaliação funcional para a identificação de contingências


mantenedoras dos comportamentos-problema apresentados por N., por sua vez mantidos
por reforçamento negativo, resultaram nas intervenções que foi eficaz na diminuição das
respostas fisiológicas, promoção de comportamentos desejáveis.

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