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Espectro da Esquizofrenia e outros

Transtornos Psicóticos
1. O chamado “espectro da esquizofrenia” é caracterizado por
um conjunto de transtornos em que a marca principal é a
presença de sintomas psicóticos. O que são sintomas
psicóticos? Quais são as principais características e os
transtornos que compõem esse espectro?
Os sintomas psicóticos se caracterizam por uma ruptura com a realidade,
levando a alterações na percepção (gerando alucinações, mais frequentemente
auditivas), nas emoções, cognições e pensamentos (gerando delírios – juízos
falsos acerca da realidade) e comportamentos. Assim sendo, os pacientes
psicóticos tipicamente têm um insight prejudicado, ou seja, uma precária
consciência da sua doença, dos seus sintomas e da sua condição em geral.
Trata-se de um grupo de transtornos com etiologias heterogêneas, graves e
crônicas, com importante prejuízo no funcionamento social e laborativo. Os
transtornos psicóticos são representados pelos seguintes estados mentais:
esquizofrenia, transtorno esquizoafetivo, transtorno esquizofreniforme,
transtorno delirante, transtorno psicótico compartilhado, transtorno psicótico
breve e catatonia.
 
2. Os sintomas psicóticos podem ser positivos ou negativos.
Qual é a diferença entre eles? Procure dar exemplos de
sintomas psicóticos positivos e negativos.                            
Os sintomas psicóticos positivos são caracterizados pela inserção patológica
de algum elemento no funcionamento psíquico normal do paciente. Assim,
são manifestações novas, floridas e produtivas do processo psicótico.
Poderíamos afirmar que “é aquilo que o paciente não deveria ter, mas tem”.
São representados pelos delírios e alucinações.
            Já os sintomas psicóticos negativos são caracterizados por perdas de
certas funções psíquicas, na esfera da vontade, do pensamento, da linguagem,
etc. Há um empobrecimento global da vida afetiva, cognitiva e social do
indivíduo. Poderíamos afirmar que “é aquilo que o paciente deveria ter, mas
não tem”. São representados pelo embotamento afetivo, retraimento social,
hipobulia, hipopragmatismo e alogia (discurso desorganizado).  
PSICOEDUCAÇÃO FAMILIAR NA ESQUIZOFRENIA

O uso adequado da medicação é essencial para o sucesso do tratamento da


esquizofrenia. Mas existem  intervenções adicionais com potencial para aumentar
a superação, a qualidade de vida e reduzir as taxas de recaídas (Pitshel- Walz,
2001).
Existem evidências que as pessoas com esquizofrenia são altamente sensíveis ao
ambiente emocional. Vários estudos identificaram que esses indivíduos, quando
pertencentes a famílias com níveis altos de expressão negativa de emoções,
apresentavam pior evolução. Inclusive com número maior de hospitalizações.
Além da falta de adesão correta aos medicamentos, fatores familiares poderiam
influenciar no fenômeno conhecido como “porta giratória”. A situação em que
vários pacientes, após receberem alta estabilizados de seus internamentos,
rapidamente são trazidos por seus familiares para retornarem aos hospitais.

As emoções negativas identificadas foram os comentários críticos, a hostilidade e


a superproteção com envolvimento excessivo nas vidas dos pacientes. O problema
das emoções negativas é comum a outros transtornos mentais, mas foi teorizado
que elas interagem com a dificuldade dos pacientes em processar emoções
complexas e de se manterem atentos em ambientes carregados emocionalmente.
Falta também aos pacientes habilidades de comunicação social. Como os
pacientes com esquizofrenia são particularmente dependentes do apoio de seus
familiares, o conceito de “emoções negativas” é importante para o
desenvolvimento de intervenções familiares de psicoeducação.

Uma série de intervenções familiares foi testada empiricamente nos últimos anos
com resultados promissores. Recentemente foi apresentada uma extensa
revisão sobre o efeito de intervenções de psicoeducação de baixa complexidade,
para familiares de pacientes com esquizofrenia e transtornos similares, em
ambiente extra-hospitalar (Cochrane, 2014). Apesar da qualidade dos dados ter
sido considerada muitas vezes insuficiente, os resultados indicaram que as
intervenções podem reduzir o risco de recaídas e melhorar a aderência aos
medicamentos. Os custos dos programas de psicoeducação familiar podem ser
compensados com a redução das hospitalizações e do uso de outros serviços.
(McFarlane, 2003)

É importante que os grupos familiares de psicoeducação apresentem as mesmas


características comuns e não específicas das diferentes intervenções
psicoterápicas. Por exemplo, acolhimento, escuta empática, apoio emocional e
uma expectativa de que o tratamento seja benéfico. Além disso, os programas
devem também incluir, em proporções variadas, uma explicação da esquizofrenia e
outros transtornos mentais e seus tratamentos, orientação sobre recursos clínicos
existentes a serem utilizados em períodos de crise, instruções de como aumentar
a rede comunitária e social e treinamento em técnicas de resolução de problema e
de habilidades de comunicação.

Os grupos podem ser restritos apenas a uma família ou podem ser multifamiliares.
O programa pode ser oferecido também para cuidadores não familiares. Em
alguns programas apenas os familiares são incluídos e em muitos também estão
presentes os não familiares. Os grupos podem ser realizados na casa, em serviços
de saúde ou em locais comunitários. Tanto familiares como cuidadores devem ser
considerados como parceiros e não como passíveis de tratamento. A realização de
psicoterapia individual ou de família não apresentou efeitos aditivos sobre as taxas
de recaída ou de novas hospitalizações.

Não foi possível identificar características de famílias ou de pacientes que


pudessem se beneficiar mais da psicoeducação familiar. A avaliação sobre
quando indicar a psicoeducação deve incluir a presença de familiar em contato
contínuo com o paciente,  o interesse do paciente e de seus
familiares, considerações sobre a existência de intervenções alternativas e
esclarecer que os medicamentos não podem ser interrompidos (Dixon, 2000). Os
grupos de maior duração de acompanhamento apresentaram melhores resultados.
O compromisso deve ser de pelo menos por nove meses. Para pacientes
desacompanhados, outros tratamentos psicossociais individuais, focados na
esquizofrenia, foram desenvolvidos e também com influência positiva nas taxas de
recaídas.

Referências

O QUE É?
A esquizofrenia é um dos principais transtornos mentais e acomete 1% da população em
idade jovem, entre os 15 e os 35 anos de idade. Segundo a Organização Mundial de
Saúde (OMS), é a terceira causa de perda da qualidade de vida entre os 15 e 44 anos,
considerando-se todas as doenças.
Apesar do impacto social, a esquizofrenia ainda é uma doença pouco conhecida pela
sociedade, sempre cercada de muitos tabus e preconceitos. Crenças como “as pessoas
com esquizofrenia são violentas e imprevisíveis”, “elas são culpadas pela doença”, “elas
têm dupla personalidade”, “elas precisam permanecer internadas” são fruto do
desconhecimento e do preconceito.
A esquizofrenia caracteriza-se por uma grave desestruturação psíquica, em que a pessoa
perde a capacidade de integrar suas emoções e sentimentos com seus pensamentos,
podendo apresentar crenças irreais (delírios), percepções falsas do ambiente
(alucinações) e comportamentos que revelam a perda do juízo crítico.
A doença produz também dificuldades sociais, como as relacionadas ao trabalho e
relacionamento, com a interrupção das atividades produtivas da pessoa. O tratamento
envolve medicamentos, psicoterapia, terapias ocupacionais e conscientização da família,
que absorve a maior parte das tensões geradas pela doença.
A esquizofrenia não tem cura, mas com o tratamento adequado a pessoa pode se
recuperar e voltar a viver uma vida normal.
__A esquizofrenia foi inicialmente descrita como doença no final do século XIX pelo
psiquiatra alemão Emil Kraepelin. Na época, ele chamou-a de Demência Precoce, pois
as pessoas acometidas por ela, na sua maioria jovens, exibiam um comportamento
regredido e desorganizado, que lembrava os idosos portadores de demência, como a
Doença de Alzheimer.
__No início do século XX, Eugen Bleuler, psiquiatra suíço, cunhou o termo
esquizofrenia (esquizo=cindida; frenia=mente), por achar o termo anterior inadequado.
Para ele, a principal característica da doença era a cisão entre pensamento e emoção,
dando a impressão de uma personalidade fragmentada e desestruturada. Os pacientes
não tinham necessariamente uma evolução deteriorante como na demência e muitos se
recuperavam.
Contudo, a alcunha de doença degenerativa acompanhou a esquizofrenia por muitas
décadas. Com um arsenal terapêutico limitado, a doença encheu vários hospitais em
todo o mundo, a ponto de ter o maior índice de hospitalização.
A dificuldade de reintegração à sociedade, motivada por internações muito prolongadas
e pelos poucos recursos de tratamento, aumentou o estigma e o preconceito que cercam
a doença até hoje.
Nos últimos 25 anos assistimos a uma revolução na maneira de tratar os doentes
mentais: medicamentos modernos capazes de controlar a doença e de permitir a
reintegração dos pacientes à família e à comunidade, dispositivos alternativos aos
hospitais, que acolhem a pessoa dentro de sua singularidade e que trabalham pela sua
reabilitação psíquica e social, mais informação para vencer os tabus e preconceitos da
sociedade, participação colaborativa da família e de redes sociais imbuídas do objetivo
comum de apoiar e lutar pela recuperação dos pacientes.
Tudo isso parece não bastar para derrotar o preconceito e o estigma. O rótulo
“degenerativo” continua perseguindo a esquizofrenia, apesar dos inúmeros exemplos
contrários.
A pessoa acometida pela esquizofrenia tem grande potencial à sua frente. Precisa lutar
contra as dificuldades do transtorno, é verdade. Mas pode se recuperar, vencer os
obstáculos e seguir seus sonhos. Nesta batalha, precisa ter ao seu lado sua família, seus
amigos, pessoas que a amem e apóiem e que, sobretudo, saibam compreendê-la. Tem a
seu favor medicamentos eficazes, suporte psicológico e terapias de reabilitação capazes
de ajudá-la nessa superação. Certamente contará com uma sociedade mais justa e que
possa recebê-la um dia como igual.

QUAIS OS SINTOMAS?
Sintomas Iniciais
Os sintomas precoces da esquizofrenia, também conhecidos como prodrômicos (do
grego pròdromos = precursor), são aqueles que ocorrem meses a anos antes de um
primeiro surto. Eles não são específicos da doença e não permitem um diagnóstico
precoce do transtorno.
Podem ocorrer comportamento hiperativo (inclusive desde a infância), desatenção e
dificuldades de memória e aprendizado, sintomas de ansiedade (inquietação,
somatizações, como taquicardia, palpitações e falta de ar), desânimo, desinteresse
generalizado e humor depressivo. O início do transtorno pode ser confundido com
depressão ou outros transtornos ansioso (Pânico, Transtorno Obsessivo-Compulsivo,
Ansiedade Generalizada).
Em alguns casos ocorre interesse demasiado por temas exóticos, místicos, religiosos,
astronômicos ou filosóficos, que passam a dominar o cotidiano da pessoa. Dúvidas
acerca da sua existência, explicações filosóficas sobre coisas simples da vida e uma
necessidade permanente de buscar significados podem deixar a pessoa mais
introspectiva e isolada socialmente.
É comum haver, pouco ou muito tempo antes do primeiro surto, dificuldade, ou mesmo,
descontinuidade de atividades regulares, como escola, cursos, trabalho, esporte ou lazer.
Nota-se também maior dificuldade para viver relações sociais e familiares.
Algumas pessoas podem desenvolver um comportamento mais arredio ou
indisciplinado, ter momentos de explosão de raiva ou descontrole emocional diante de
situações em que se esperaria maior desenvoltura para resolver os problemas.
A esquizofrenia pode ainda se manifestar sem um período prodrômico muito claro e
com desencadeamento rápido dos primeiros sintomas psicóticos.

Sintomas Positivos
Os sintomas positivos estão relacionados diretamente ao surto psicótico. Entende-se por
surto psicótico um estado mental agudo caracterizado por grave desorganização
psíquica e fenômenos delirantes e/ou alucinatórios, com perda do juízo crítico da
realidade. A capacidade de perder a noção do que é real e do que é fantasia, criação da
mente da própria pessoa, é um aspecto muito presente nos quadros agudos da
esquizofrenia.
A pessoa adoecida pode criar uma realidade fantasiosa, na qual acredita plenamente a
ponto de duvidar da realidade do mundo e das pessoas ao seu redor. É o que chamamos
de delírio. O delírio pode ter diversas temáticas, inclusive num mesmo surto. As mais
comuns são a idéia de estar sendo perseguida por alguém, de ser observada ou de que as
pessoas falam dela ou sabem de tudo que se passa na sua vida. Outras idéias fantasiosas,
como de cunho religioso, místico ou grandioso também podem ocorrer. Menos
frequentemente ocorrem delírios de culpa e de ciúme.
O delírio não é uma criação intencional da pessoa ou motivada por fatores psicológicos
ou de relacionamento. Na esquizofrenia, o delírio surge espontaneamente e invade e
domina a consciência da pessoa, tirando dela a capacidade de lutar e vencer sozinha
suas próprias idéias. É comum ela se sentir acuada e amedrontada, ou então, agir com
vigor, mas sem um propósito claro ou racional. O delírio traz consigo uma sensação de
sofrimento e fragmentação da própria personalidade, como se a pessoa perdesse o chão,
suas referências básicas, o controle de sua própria vida.
Outro sintoma positivo igualmente importante é a alucinação. A pessoa pode ouvir ou
ver coisas que não existem ou não estão presentes, como escutar vozes dialogando entre
si ou se referindo à própria pessoa, insultando-a ou ordenando que faça algo. Pode ver
vultos ou imagens de pessoas, personagens de seu delírio, com as quais é capaz de
conversar e interagir. Há casos também de alucinações olfativas (sentir cheiros
estranhos), gustativas, táteis (sentir choques ou como se bichos andassem em seu corpo)
e dos órgãos internos (como, p.ex., sentir o coração derretendo, órgãos apodrecendo).
Assim como no delírio, o paciente não tem nenhum controle sobre as alucinações. Elas
têm igual capacidade de dominar a consciência e influenciar o comportamento. A
percepção de uma alucinação é igual a que ocorre para um objeto real, não sendo
possível, para o paciente, distingui-la da realidade.
Existem outros sintomas positivos, como acreditar que é outra pessoa ou que tem
poderes paranormais, como a capacidade de ler a mente dos outros. O paciente pode
fantasiar acerca de seus familiares, acreditando que eles sejam impostores ou sósias, ou
confundir pessoas estranhas com alguém familiar.
Os sintomas positivos podem não ocorrer em todos os casos de esquizofrenia e, mesmo
quando presentes, podem variar na intensidade e qualidade dos sintomas. Existem
pacientes que não possuem muitos delírios e outros que nunca alucinaram. Há os que
apresentam mais sintomas de desorganização psíquica e do comportamento e que não
apresentam delírios ou alucinações.

Sintomas Negativos
Os sintomas negativos estão mais relacionados à fase crônica da esquizofrenia. Embora
possam ocorrer na fase aguda, eles se estendem por mais tempo e predominam a longo
prazo. Esses sintomas são chamados também de deficitários, como referência à
deficiência de algumas funções mentais, como a vontade e a afetividade.
A falta de vontade, de iniciativa ou da persistência em algumas atividades da vida
cotidiana é vista pela maioria dos familiares como sinal de preguiça ou má vontade.
Entretanto, este é um sintoma da esquizofrenia. Em graus variados de intensidade,
pacientes têm dificuldade de iniciativa, demonstram-se desinteressados ou indiferentes
aos desafios e atividades que lhes são propostas. Tendem a escolher atividades mais
passivas, onde não é exigido esforço físico ou cognitivo, como assistir TV, ouvir rádio,
ou mesmo passar grande parte do tempo ociosos. As deficiências da vontade são
responsáveis por grande parte das dificuldades em atividades produtivas, como trabalho
e estudos, e sociais, contribuindo para maior isolamento.
A afetividade compreende a nossa capacidade de demonstrar afetos e sentimentos. Para
isso usamos nossa mímica facial, os gestos, o tom de voz e a nossa empatia. Alguns
pacientes têm dificuldade em expressar e demonstrar seus afetos claramente e isso leva,
em geral, a uma falta de empatia e a uma dificuldade de interação e comunicação social.
Isto não significa que não tenham sentimentos, que não sejam capazes de reagir
emocionalmente ao ambiente e às pessoas. O que está comprometido é a forma de
demonstrar seus afetos, mas não a capacidade de sentir emoções.
A fala, o pensamento e as idéias podem estar lentificados ou desconectados, sem um
encadeamento lógico para quem está ouvindo. Porém, é importante que familiares e
amigos procurem compreender o significado do que está sendo dito, que escutem e
acolham a pessoa com suas diferenças e limitações.
Os sintomas negativos, por serem mais duradouros e interferirem com funções básicas
como vontade e afetividade, acarretam dificuldades sociais e laborativas que
percebemos em muitos pacientes. É fundamental a compreensão e as tentativas de
estímulo e apoio, dentro de um contexto sócio-familiar saudável e acolhedor.

Sintomas da Cognição
A cognição pode estar comprometida na esquizofrenia de diversas formas. As mais
comuns são a falta de atenção e concentração e o prejuízo da memória. Essas alterações
podem ocorrer antes mesmo do primeiro surto e piorar nos primeiros anos do
transtorno.
Alguns pacientes têm dificuldade em manter a atenção por longo tempo, tornando-se
facilmente distraídos e dispersos. Em uma conversa num ambiente tumultuado e
ruidoso, por exemplo, podem não conseguir manter o foco, distraindo-se com estímulos
alheios. Isto ocorre devido à incapacidade de inibir completamente estímulos do
ambiente que não sejam importantes naquele momento. O comprometimento da atenção
também interfere em atividades como leitura e escrita.
Em relação à memória, pode haver dificuldade para buscar lembranças passadas em
momentos oportunos, como, por exemplo, quando se está conversando sobre um
episódio e o paciente se esquece de mencionar fatos importantes relacionados a ele. O
aprendizado também pode estar prejudicado, com maior lentidão para aprender
informações novas, que pode ser atribuído à dificuldade na formação de estratégias para
aceleração do aprendizado e por problemas na fixação do conteúdo.
Existem outros prejuízos da cognição, como pensamento mais concreto, com
dificuldades para abstrair e compreender figuras de linguagem, impulsividade na hora
de tomar decisões, fazendo escolhas erradas, baseadas em decisões imaturas de primeiro
momento, e disfunções executivas, como dificuldade de planejamento das tarefas, não
conseguindo priorizar as mais simples frente às complexas.
Os sintomas da cognição também interferem na vida social e profissional, contribuindo
para prejuízos em outras áreas de funcionamento da pessoa, como estudo, trabalho e
relacionamentos interpessoais.

Sintomas Neurológicos
Os pacientes com início mais precoce e/ou formas mais graves da esquizofrenia podem
apresentar sinais neurológicos, como tiques faciais, prejuízo dos movimentos mais finos
(o que os torna mais desajeitados ou estabanados), trejeitos e movimentos mais bruscos
e descoordenados, aumento da frequência de piscar os olhos e desorientação direita-
esquerda.
Muitos desses sinais também estão presentes em outros transtornos psiquiátricos e
neurológicos, como o Transtorno de Tiques e a Síndrome de Gilles de La Tourette.
Portanto, a presença isolada desses sintomas, sem os demais característicos da
esquizofrenia, não deve sugerir esse diagnóstico.
A explicação para a ocorrência dos sinais neurológicos não é bem conhecida. A maioria
não os apresenta e aqueles que são acometidos, os revelam de maneira tênue e que
passam despercebidos por pessoas com menor grau de intimidade.
Não existem exames neurológicos, como eletroencefalograma, tomografia
computadorizada ou ressonância magnética, capazes de diagnosticar a esquizofrenia. As
alterações que podem aparecer nesses exames são inespecíficas e podem ocorrer
também em outras doenças psiquiátricas e neurológicas.

Funcionamento Social
O funcionamento social engloba as capacidades de interação e comunicação social, de
autonomia, da vida laborativa, acadêmica, familiar e afetiva. Enfim, é tudo aquilo que
diz respeito à interação da pessoa com o meio em que vive.
Na esquizofrenia, o funcionamento social pode estar prejudicado pelo conjunto de
sintomas que já abordamos, como os sintomas positivos, negativos e cognitivos. É
indiscutível que, no período de surto (fase aguda), o funcionamento da pessoa fique
muito comprometido, pois os sintomas da crise psicótica afetam o equilíbrio e a
sensatez da pessoa, alteram seu comportamento e a capacidade de administrar seus
sentimentos e relacionamentos, gerando conflitos. Isso não é exclusividade da
esquizofrenia, podendo ocorrer na fase aguda de qualquer transtorno psiquiátrico.
Passada a crise, à medida que a pessoa vai se reestruturando, ela passa a ter mais
condições de avaliar e mudar seu comportamento. Entretanto, na esquizofrenia, alguns
pacientes permanecem com dificuldades sociais mesmo após a fase aguda. Os sintomas
mais impactantes neste período são os negativos e cognitivos, os que mais interferem
com o funcionamento do indivíduo.
Alguns ficam com maior dificuldade para relacionamentos, para fazer novas amizades,
tendem a se isolar ou a restringir o convívio à família. Em casos mais graves, pode
haver limitações para coisas mais simples, como ir a um supermercado ou a um banco,
devido a uma inadequação ou inabilidade para agir em situações sociais, com prejuízos
para a autonomia da pessoa.
As capacidades de trabalho e estudo também podem ser afetadas, pois dependem da
eficiência cognitiva e social. Muitos pacientes conseguem retornar ao trabalho ou à
escola após sua recuperação, enquanto outros se beneficiariam de atividades menos
exigentes e estressantes. A adequação da vida social e laborativa ao real potencial de
cada um é medida sine qua non para sua estabilidade a longo prazo.

Comportamento
O comportamento pode ser afetado pelos sintomas já comentados, como os positivos e
negativos, porém alguns padrões de comportamento são mais freqüentes e merecem um
comentário à parte. Como a esquizofrenia é um transtorno de apresentação heterogênea,
incluindo quadros clínicos muito diferentes, existem pacientes com maior ou menor
grau de alteração do comportamento, que também é variável de acordo com a fase da
doença (aguda ou crônica).
→ Suicídio
As tentativas de suicídio não são raras na esquizofrenia. Pesquisas apontam que cerca de
50% dos pacientes tenta o suicídio ao menos uma vez na vida, com uma taxa de suicídio
consumado em torno de 15%. Esta estimativa é a maior dentre todos os transtornos
mentais, inclusive a depressão.
O suicídio pode ocorrer na fase aguda ou crônica, devendo o familiar ficar atento a
alguns aspectos: se o paciente fala em se matar, caso refira ouvir vozes ordenando que
se fira ou que atente contra a própria vida, quando ocorre intensa ansiedade ou angústia,
se ele se mostra depressivo ou se tem algum comportamento auto-agressivo ou
autodepreciativo.
A família não deve temer abordar esse assunto com o paciente, pois geralmente ele
sente a necessidade de falar disso para obter algum alívio para o seu sofrimento. Caso
haja intenção ou risco de suicídio, a equipe responsável pelo tratamento deve ser
imediatamente avisada.
→ Agressividade
O comportamento agressivo não deve ser associado à esquizofrenia, pois a maioria dos
pacientes não é agressiva em nenhum momento ao longo do transtorno. Uma minoria
pode ter reações impulsivas e ataques de raiva ou fúria, geralmente nas fases agudas,
como no surto, mas melhorando significativamente com o tratamento.
O familiar deve ter paciência e compreensão e jamais revidar algum ato agressivo, sob o
risco de haver aumento da violência e das agressões se tornarem recorrentes ou
constantes. Caso seja necessário conter a pessoa, abraçando-a ou imobilizando-a,
explique o motivo de sua atitude e tente acalmá-la até a chegada de um auxílio médico.
→ Manias
Alguns pacientes têm um comportamento mais rígido ou repetitivo, com dificuldade
para mudar determinados padrões. Isso pode variar de hábitos elementares, como
relacionados à higiene, à alimentação e ao vestuário, até hábitos sociais, como rotinas de
atividades, atitudes metódicas ou mecanicistas (precisa fazer aquilo naquela ordem e
daquele jeito). Alguns podem desenvolver rituais e repetições semelhantes ao transtorno
obsessivo-compulsivo (TOC).
O paciente resiste a mudar algumas manias e isto provoca conflitos com a família. Por
outro lado, esses comportamentos não podem ser mudados na base da imposição ou da
força, devendo o familiar ter muito diálogo e paciência. Deve procurar, aos poucos,
convencê-lo das desvantagens e encorajá-lo a melhorar suas atitudes.
→ Solilóquios e risos imotivados
Solilóquios é o termo técnico para quem fala sozinho. Há pacientes que os apresentam
nas fases agudas, quando respondem às alucinações (vozes ou pessoas imaginárias).
Outros têm esse comportamento na fase crônica, falando baixinho ou simplesmente
mexendo os lábios e cochichando.
Os risos imotivados ocorrem quando o paciente ri sem motivo aparente ou fora de um
contexto. Esses sintomas são, na maioria das vezes, automáticos e involuntários, sem
que ele possa controlá-los inteiramente. A irritação de terceiros pode inclusive
intensificá-los.

Abuso de drogas
O uso e abuso de drogas lícitas e ilícitas é comum na esquizofrenia. Entre as drogas
lícitas, os tranqüilizantes, o álcool, a cafeína e o cigarro são os mais comuns. O café ou
bebidas cafeinadas (principalmente a coca-cola) são usados pelos seus efeitos
estimulantes, enquanto o álcool e tranqüilizantes, pelos efeitos ansiolíticos ou sedativos.
O cigarro é usado para controle da ansiedade, mas também porque alivia alguns efeitos
colaterais do medicamento (efeitos de impregnação). Essas substâncias podem interferir
com o metabolismo e a ação terapêutica dos antipsicóticos, medicamentos utilizados no
tratamento da esquizofrenia. No caso do álcool, é crescente o número de pacientes que
desenvolvem o alcoolismo pelo consumo abusivo e contínuo da substância, o que
agrava muito o prognóstico da esquizofrenia.
No que tange às drogas ilícitas, a maconha e a cocaína são as mais utilizadas, embora
preocupe o crescimento do número de usuários de crack nas grandes cidades. O ecstasy
é mais usado em festas e de forma recreativa. A maconha parece ter um papel
desencadeador da psicose, ainda não muito bem conhecido. Quando associado à
esquizofrenia, a dependência química tem um papel devastador para a doença,
aumentando sobremaneira o número de recaídas. Pacientes com dependência de drogas
devem ser levados a tratamentos em centros especializados paralelamente ao tratamento
para a esquizofrenia.

Classificação
A esquizofrenia pode ser classificada em tipos distintos de acordo com sua apresentação
clínica.
→ Esquizofrenia paranóide
É caracterizada pelo predomínio de sintomas positivos (delírios e alucinações) sobre os
sintomas negativos. Em geral, os pacientes apresentam tramas delirantes bem
estruturadas e alucinações, com alterações de comportamento compatíveis com suas
vivências psíquicas, como inquietação ou agitação psicomotora, comportamento de
medo ou fuga, ausência de juízo crítico, dentre outras. Nesses casos, o paciente melhora
dos sintomas mais agudos com o tratamento, retomando boa parte de suas atividades e
relacionamentos, permanecendo com poucos prejuízos na fase crônica, já que os
sintomas negativos não estão tão presentes. Podem ocorrer sintomas cognitivos que
dificultam a retomada de algumas atividades após a fase aguda.
→ Esquizofrenia hebefrênica ou desorganizada
Nesse caso há predomínio dos sintomas negativos e de desorganização do pensamento e
do comportamento sobre os sintomas positivos. Alucinações e delírios podem não
ocorrer, ou se ocorrerem, não são uma parte importante do quadro, que se caracteriza
mais por um comportamento pueril ou regredido, desorganização do pensamento e do
comportamento, dependência de terceiros para atividades mais básicas, perda da
autonomia, desinteresse, isolamento ou perda do contato social e afetividade mais
superficial ou infantil. Os sintomas mais agudos, como a desorganização do pensamento
e do comportamento, podem melhorar com o tratamento, mas alguns sintomas negativos
podem persistir e dificultar mais a retomada das atividades. Ocorrem alterações
cognitivas, principalmente relacionadas à atenção, memória e raciocínio, que podem
trazer prejuízos sociais e laborativos.
→ Esquizofrenia Catatônica
É o tipo menos comum, caracterizado por sintomas de catatonia na fase aguda. O
paciente pode falar pouco ou simplesmente não falar, ficar com os movimentos muito
lentos ou paralisados (p.ex., numa mesma posição por horas ou dias), recusar se
alimentar ou ingerir líquidos, interagir pouco ou simplesmente não interagir com
ninguém, embora desperto e de olhos abertos. O tratamento melhora os sintomas de
catatonia, podendo o paciente permanecer com sintomas negativos e cognitivos na fase
crônica. Há casos em que, na fase aguda, podem ocorrer comportamento agitado e
repetitivo sem um propósito claro ou identificável.
→ Esquizofrenia Indiferenciada
Quando os sintomas positivos e negativos estão igualmente presentes, havendo delírios
e alucinações em intensidade semelhante aos sintomas negativos e desorganizados,
classifica-se o tipo como indiferenciado. A evolução e o prognóstico nesses casos são
muito variáveis, geralmente pior do que na esquizofrenia paranóide, porém superior ao
tipo hebefrênico.
→ Esquizofrenia Simples
Em casos em que os sintomas negativos ocorrem isoladamente, sem sintomas positivos
e de desorganização, e não há uma diferença bem delimitada entre as fases aguda e
crônica, optou-se por chamar de esquizofrenia simples. Alguns autores equivalem esse
diagnóstico ao transtorno de personalidade esquizotípico, caracterizado por afetividade
superficial ou imprópria, falta de vontade e comportamento excêntrico ou desviante,
com tendência ao isolamento e desinteresse social. Os sintomas negativos ocorrem
mesmo sem um surto psicótico que os preceda.
→ Esquizofrenia Residual
Utilizado para tipificar quadros mais crônicos, de longos anos de evolução ou que
evoluem rapidamente para um comportamento mais deteriorado, com muitos prejuízos
sociais e para a autonomia da pessoa, afetando sua capacidade de comunicação,
inclusive verbal, gerando passividade ou falta de iniciativa, lentidão psicomotora,
monotonia e prejuízos inclusive para o autocuidado e higiene pessoal.
QUAL A CAUSA?
Genética
A esquizofrenia tem causa multifatorial, envolvendo fatores genéticos e do ambiente
ainda não muito conhecidos. A hereditariedade do transtorno é conhecida desde que a
doença foi descrita por Kraepelin e Bleuler, há um século atrás. Há na família de
pacientes adoecidos, outras pessoas com os mesmos sintomas ou quadros muito
parecidos. A hereditariedade, entretanto, não parece ser o fator determinante, já que
também é comum filhos de pais esquizofrênicos não desenvolverem a doença.
Hoje, após várias pesquisas que investigam a causa da esquizofrenia, sabe-se que a
genética é responsável por cerca de 50% da chance de adoecer, cabendo a outra metade
aos fatores ambientais. A maior evidência disso são estudos com gêmeos idênticos (e
que, portanto, possuem DNA iguais), que revelaram uma concordância de apenas 50%
no diagnóstico de esquizofrenia. Isto significa que, quando um dos gêmeos desenvolve a
doença, o outro também adoece em 50% dos casos.
Alguns genes já foram relacionados à esquizofrenia e, provavelmente, outros também o
serão. Os genes da esquizofrenia são responsáveis por regular etapas importantes do
desenvolvimento cerebral, bem como a produção de neurotransmissores (substâncias
produzidas no cérebro para transmitir impulsos elétricos de um neurônio a outro). Esses
genes seriam ativados por fatores ambientais de risco, desencadeando uma cascata de
eventos que culminariam em alterações sutis do desenvolvimento do cérebro,
caracterizadas principalmente por um erro na comunicação entre neurônios de diferentes
áreas cerebrais (desconexão neuronal).
Contudo, um dos maiores obstáculos na pesquisa genética é a inespecificidade dos
genes relacionados. Alguns são comuns a outros transtornos mentais, como o distúrbio
bipolar, o que sugere que doenças psiquiátricas possam ter uma origem genética
comum. O quadro clínico dependeria, portanto, do número de genes envolvidos em cada
pessoa. Isso parece também fazer sentido na diferenciação entre os casos mais graves da
esquizofrenia, que teriam, teoricamente, uma maior carga genética em comparação aos
quadros mais leves.
As pesquisas genéticas em psiquiatria ainda estão em fases iniciais e muito há para ser
descoberto. Tratamentos e medicações poderão ser aperfeiçoados a partir das novas
perspectivas nesta área.

Ambiente
As pesquisas sobre fatores de risco do ambiente na esquizofrenia são muito difíceis de
serem realizadas, pela alta complexidade metodológica. Algumas já conseguiram
identificar fatores de risco mais associados ao transtorno, mas provavelmente existem
muitos outros ainda desconhecidos.
Em linhas gerais, o ambiente pode influenciar o adoecimento nas etapas mais precoces
do desenvolvimento cerebral, da gestação à primeira infância. É nesse período que o
cérebro é mais sensível, por estar crescendo com rapidez e depender do ambiente para o
aperfeiçoamento de suas funções. Esta etapa também é aquela em que os genes de
regulação do desenvolvimento estão mais ativos e que, na presença de variáveis
genéticas da esquizofrenia, podem interferir em processos naturais do desenvolvimento.
A adolescência é um outro momento delicado, pois o cérebro começa a moldar-se para a
vida adulta. Um processo conhecido como poda neuronal apara as arestas do
desenvolvimento, que sempre gera conexões esdrúxulas ou desnecessárias. A
esquizofrenia pode estar relacionada a um menor número de podas, com conexões
errôneas entre os neurônios. Fatores ambientais na adolescência podem influenciar esse
processo, desencadeando o primeiro surto da doença.
Um fator que vem sendo relacionado a um risco maior de esquizofrenia e autismo é a
idade avançada do pai no momento da concepção. A explicação para isso seria um
aumento na frequência de mutações que ocorrem no momento da divisão celular para
produção de espermatozóides. No momento de cópia do DNA, uma sequência do
código genético pode ser duplicada ou subtraída por um erro conhecido como CNV
(copy number variations) e este novo DNA é transmitido ao filho no momento da
fecundação. Esse tipo de mutação é conhecido como mutações “de novo”, pois não são
herdadas do DNA dos pais. A frequência de CNV parece aumentar com a idade do pai,
o que não ocorre com a mãe. Nem todas as mutações “de novo” são maléficas, algumas
estão relacionadas à evolução e à diversidade, porém alguns genes que sofrem este tipo
de mutação têm sido relacionados a um risco maior de esquizofrenia e autismo. Este é
mais um exemplo de como o ambiente pode interferir com a genética para predispor a
doenças.
Os genes que predispõem à esquizofrenia têm isoladamente efeito pequeno, por isso
acredita-se que os fatores do ambiente sirvam como ativadores ou amplificadores desse
efeito. Um exemplo é a maconha. Algumas pessoas que possuem determinado alelo de
um gene relacionados à doença têm até 5 vezes mais risco de desenvolver psicose se
usarem maconha aos 15 anos. O risco é menor se a exposição à droga ocorrer somente
após os 18 anos de idade. O ambiente, neste caso, pode fazer a diferença entre a pessoa
ficar ou não ficar doente, dependendo do uso da droga. Este é apenas um dos genes
relacionados à esquizofrenia, que pode influenciar uma parcela de casos, já que muitos
outros não têm relação com o uso de maconha.
Na tabela abaixo alguns fatores de risco conhecidos no ambiente e relacionados à
esquizofrenia:

COMO AGIR EM
EMERGÊNCIAS?
Situações de emergência podem ocorrer na esquizofrenia e pegar a família de surpresa,
já que muitas vezes o início do tratamento se dá depois de uma primeira crise aguda, em
que pouco se conhece a respeito da doença.
Entretanto, situações emergenciais também podem ocorrer depois do diagnóstico,
quando o paciente já está em tratamento, seja por uma recaída do quadro ou pelo
surgimento de novos sintomas que antes não aconteciam e, portanto, não eram previstos
pela família.
Em todas essas situações é fundamental que a família conte com o apoio de um
psiquiatra que possa orientá-la sobre as providências a serem tomadas. O plano de ação
nessas situações é complexo e será melhor executado e sucedido se a família tiver o
apoio especializado, necessário para delinear as ações de acordo com a particularidade
de cada caso.
Portanto, se o paciente ainda não possui um psiquiatra ou se recusa a ir, é recomendável
que a família busque um profissional, mesmo sem o paciente. Numa primeira consulta,
os familiares poderão contar a história do paciente e narrar os fatos ocorridos para que o
psiquiatra os ajude na abordagem ao paciente.
Você pode encontrar os serviços públicos de assistência psiquiátrica, como o CAPS e
hospitais especializados, clicando aqui.

INTERNAÇÃO
Nem toda situação de emergência requer a internação do paciente. O importante é
encontrar um profissional e obter aconselhamento de como levar o paciente até o
médico para tratamento. Porém existem situações de urgência psiquiátrica, em que não
há tempo hábil para aguardar uma consulta da família com o psiquiatra e o familiar
precisa tomar uma atitude em poucas horas.
Geralmente essas urgências são:
– agressividade física dirigida a terceiros ou a si próprio
– tentativa de suicídio
– situações que colocam o paciente ou terceiros em risco iminente de vida (p.ex. atear
fogo na casa, ameaça grave contra sua vida ou de terceiros, comportamento de fuga de
um paciente confuso e desorganizado, etc)
Nesses casos o familiar se vê ainda mais sozinho, desamparado, confuso e sem saber
que atitude tomar. Não raro também não encontra resposta dos serviços de assistência
no tempo de que necessita.
O ideal é sempre ter um plano de ação pronto para situações como esta, mas isso só é
possível quando já se conhece essa possibilidade ou quando o paciente já está em
tratamento. Este plano de ação deve conter as seguintes informações:
– telefones e endereços de serviços de emergência psiquiátrica na sua região que
possam atendê-lo a qualquer momento
– telefones de ambulâncias com equipe especializada em psiquiatria que possam fazer o
primeiro atendimento em domicílio, quando não for possível o deslocamento até uma
emergência
– telefones de pessoas da família ou amigos que possam ajudar numa situação de
urgência (seja na abordagem ao paciente, seja para se responsabilizar por crianças ou
dependentes que possam precisar de um responsável no momento de ausência do
familiar)
Se for possível pesquisar previamente os recursos de sua região e anotar em um papel
esses dados para uma eventual emergência, isso lhe poderá ser bastante útil, pois no
momento de uma emergência pode ser difícil lembrar de todos os contatos.
É bom discutir com o paciente enquanto ele estiver estabilizado que, em caso de
emergência, pode ser necessário acionar o plano de emergência, de forma que ele fique
menos desconfiado ou aborrecido sem saber o que esperar numa situação como esta.
Caso não tenha tempo hábil, lembre-se que o Serviço de Atendimento Móvel de
Urgências (SAMU) possui uma equipe especializada para atendimento psiquiátrico
domiciliar 24h por dia e pode ser acionada pelo telefone 192. Esse é um programa do
Governo Federal que é operacionalizado por Estados e Municípios em todo território
nacional.
O protocolo do SAMU prevê diretrizes para o atendimento à situações de saúde mental
(BC 28 a BC 32) que podem ser acessadas clicando aqui. A equipe pode decidir levar o
paciente até um serviço de emergência psiquiátrica se for o caso.
O melhor é ligar para o SAMU. A Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros só devem ser
chamados em último caso, pois os profissionais treinados para situações como esta são
os paramédicos do SAMU. A PM pode trazer um risco adicional devido à presença de
arma de fogo e só deve ser acionada se o paciente estiver armado.
Não leve o paciente de carro para o serviço de emergência, exceto se ele concordar em
ir. Caso ele aceite, peça ajuda a pelo menos dois familiares, que irão com ele no banco
de trás, em cada ponta (o paciente deve ir no meio). Isso é uma segurança tanto para o
paciente como para quem vai dirigir o veículo, caso o paciente mude de ideia no
caminho ou se torne agressivo.
Não tome nenhuma atitude forçada ou à revelia do paciente, busque sempre o diálogo e
conte com a equipe especializada.

OS DEZ MANDAMENTOS EM CASO DE UMA CRISE


Essas são recomendações do “World Fellowship for Schizophrenia and Allied
Disorders” para abordar pessoas que estejam numa situação de emergência ou urgência
psiquiátrica.
1) Lembre-se que você não pode discutir com a pessoa em crise
2) Lembre-se que a pessoa pode estar assustada com a própria perda de autocontrole
3) Não manifeste irritação ou raiva
4) Não grite
5) Não seja sarcástico
6) Reduza coisas que provoquem maior distração (desligue TV, rádios, luzes
fluorescentes que piscam, etc)
7) Peça a qualquer visitante casual para ir embora, quanto menos gente, melhor
8) Evite o contato olho a olho de forma contínua
9) Evite tocar a pessoa
10) Sente-se e peça a pessoa para se sentar também
PLANO DE AÇÃO PARA PREVENÇÃO DE CRISE
Todo o paciente em tratamento deve ter um plano de ação para situações de crise. Ele
deve ser elaborado pelo psiquiatra em conjunto com o paciente quando ele estiver
estabilizado. O plano pode ser útil para o paciente e para a família como orientação de
como proceder caso ocorra alguma recaída e o paciente possa, momentaneamente,
perder seu juízo crítico e mostrar-se reticente em aceitar ajuda.
O plano de ação deve conter:
– sinais e sintomas que foram comuns na crise anterior e que servem de alerta para uma
futura crise
– telefones de familiares, terapeutas e psiquiatras que se dispõem a ajudar o paciente
caso esses sintomas reapareçam
– medicamentos que deram certo no tratamento da crise anterior, se possível com a
dosagem que estabilizou o paciente
– elaboração de um plano de ação, p.ex.: caso o paciente comece a ter alucinações ele
ou seu familiar vai ligar para o seu médico e para seu terapeuta informando a ocorrência
do sintoma e agendando uma consulta o mais breve possível ou, na inviabilidade disso,
vai iniciar o uso dos medicamentos que deram certo na crise anterior até a consulta com
seu médico.
O paciente e o familiar devem guardar uma cópia deste plano de ação em um local
acessível e junto a outros documentos do seu tratamento para que numa eventual
situação de crise possam lê-lo e dar início ao plano estabelecido.

O PAPEL DA FAMÍLIA
Sentimentos e Emoções
Os portadores de esquizofrenia, pelas características da própria doença, passam a maior
parte de seu tempo com suas famílias, principalmente seus pais e irmãos. As pessoas
diretamente ligadas a eles também sofrem com os desgastes provocados pelo transtorno.
A esquizofrenia pode interferir nas relações familiares, provocar sentimentos negativos,
como raiva, medo e angústia, pela sensação de impotência que os sintomas trazem.
Como reagir frente a um delírio ou uma alucinação, que comportamento deve se ter
diante de alguém desmotivado, que se isola ou que reluta em fazer alguma atividade?
Como aceitar os percalços que a doença traz sem descontar no paciente, sua principal
vítima, as nossas próprias frustrações?
O impacto emocional que o adoecimento traz aos familiares é muitas vezes tão intenso
quanto àquele que atinge o paciente. Algumas reações comuns entre os familiares,
particularmente no início da doença, quando tomam conhecimento do diagnóstico, são:
→ Negação ou subestimação: sentimento de incredulidade ou de irrealidade, como se
aquilo não estivesse acontecendo ou como se fosse um pesadelo do qual se poderia
acordar a qualquer momento. O familiar pode criar fantasias acerca da doença, duvidar
ou questionar seus sintomas, acreditar numa cura miraculosa ou achar que o problema é
menor e não deve gerar preocupações.
→ Sentimento de culpa: procurar responsabilizar alguém ou a si próprio, buscar um
culpado para a doença.
→ Sentimento de revolta: agir com raiva diante do paciente ou de outro familiar, por
não aceitar a doença.
→ Superproteção: acreditar que a doença vai deixar o paciente incapacitado e
dependente, desenvolvendo formas de controle e cerceamento que irão tolir a liberdade
e limitar a autonomia da pessoa.
O familiar precisa de tempo e de informação para mudar seus sentimentos, refletir sobre
suas convicções e perder os preconceitos. Aprender a lidar com os sintomas vem a partir
da vivência cotidiana, que precisa de reflexão e reavaliação constantes. Nossas atitudes
podem ser determinantes para o futuro da pessoa que sofre de esquizofrenia. Atitudes
positivas contribuirão para uma melhor recuperação, um futuro mais promissor, com
menores índices de recaída, maiores possibilidades para se trabalhar a autonomia e
melhorar a qualidade de vida e dos relacionamentos. Atitudes negativas desgastam as
relações, impossibilitam a recuperação plena e estão associadas a um maior número de
recaídas e a uma evolução mais grave da esquizofrenia.
Emoção expressada (E.E.) é o termo dado por pesquisadores ao conjunto de atitudes,
sentimentos e reações de familiares que refletem emoções desajustadas relacionadas à
doença e ao familiar adoecido. Quando se diz que uma família tem altos níveis de E.E.,
significa que os relacionamentos estão em conflito, aumentando a sobrecarga e o
estresse. A capacidade de solucionar os principais problemas trazidos pela doença e sua
convivência fica muito prejudicada. Por esse motivo, altos índices de E.E. são um dos
fatores que mais se relacionam às recaídas e a um pior prognóstico.
Os familiares e pessoas próximas precisam dedicar um tempo ao conhecimento dos
aspectos da doença, como forma de compreender melhor seu familiar e amigo, refletir
sobre suas atitudes, mudar padrões errados de comportamento e reduzir o grau de
estresse, buscando solucionar da melhor forma os conflitos do dia-a-dia. Essa nova
maneira de encarar a esquizofrenia vai se reverter em benefícios para si, aliviando o
sofrimento e o impacto causados pelo adoecimento e, sobretudo, melhorando a
convivência e o ambiente familiar.

Padrões Emocionais
Os sentimentos provenientes da convivência do familiar com o paciente podem se
cristalizar com o tempo, ditando atitudes e comportamentos que se repetirão no dia-a-
dia. Muitos não percebem que estão agindo de maneira errada, pois o padrão de
relacionamento estabelecido está tão enraizado, que permeia, de forma automática,
grande parte do contato entre eles. O familiar passa a ter dificuldade de agir de forma
diferente, na maioria das vezes culpando o paciente por isso, quando, na verdade, ele
próprio não vem conseguindo mudar o seu comportamento sozinho. Isso leva a um ciclo
vicioso, onde não se sabe mais onde está a causa e a conseqüência.
Os principais padrões emocionais encontrados em familiares de esquizofrênicos são
detalhados a seguir. Um mesmo familiar pode apresentar mais de um padrão.
→ Hipercrítica – atitude crítica em relação ao paciente, cobrando atividades, tarefas e
resultados com um nível elevado (e, muitas vezes, incompatível) de exigência,
resultando quase sempre em seu fracasso. O familiar pode se tornar demasiadamente
crítico também em relação aos sintomas e comportamentos provenientes da doença e
que o paciente tem dificuldade de controlar. Esta atitude resulta comumente num padrão
mais hostil de relacionamento.
→ Hostilidade – atitude hostil e de briga, com discussões e desavenças freqüentes, que
pode evoluir, em alguns casos, para agressividade verbal e física de ambas as partes.
→ Permissividade – atitude permissiva, descompromissada ou indiferente, que, em
geral, revela a pouca disponibilidade do familiar de se envolver com o paciente, não se
importando com coisas boas ou negativas relacionadas a ele.
→ Superproteção – atitude superprotetora, preocupação demasiada, tendência a tomar
a frente do paciente nas decisões e atividades que lhe cabem, restringindo sua liberdade
e autonomia. Pode ocorrer controle excessivo, gerando discussões e desentendimentos
entre o controlador e o paciente, evoluindo para um clima hostil.
→ Superenvolvimento afetivo – alguns familiares anulam-se, deixam de reservar um
tempo para si, para atividades sociais e de lazer, passando a cuidar exclusivamente do
paciente. Podem desenvolver quadros afetivos que variam da estafa à ansiedade e
depressão. Sacrificam muito o seu lado pessoal e deixam transparecer sua frustração e
cansaço, passando a impressão de que o paciente é um estorvo ou culpado por seu
sofrimento. Muitos precisam também de um tratamento médico e de um
acompanhamento psicoterápico.
É importante que o familiar identifique se alguns dos padrões característicos estão
ocorrendo e reflita sobre suas atitudes e sentimentos. Uma recomendação geral é que
cada um possa dedicar parte de seu tempo às atividades que proporcione prazer, uma
válvula de escape para o estresse. Ter um período sozinho, para se cuidar, fazer
atividades físicas, ter uma leitura agradável ou para relaxar e refletir sobre si mesmo.
Buscar atividades sociais e de lazer que incluam o paciente também ajuda a aliviar as
tensões e a reaproximar as pessoas. Conversar, trocar idéias e experiências, buscar
soluções em conjunto e dividir melhor a sobrecarga, buscando a união de todos para
enfrentar as dificuldades do dia-a-dia.

Terapia e Psicoeducação
A terapia de família na esquizofrenia é um dos tratamentos complementares de maior
eficácia, com repercussão direta no estado clínico do paciente. Existem vários trabalhos
científicos que comprovam seus efeitos na adesão ao tratamento médico, na redução de
recaídas e de hospitalizações, na melhoria da qualidade de vida e autonomia do
paciente. Para os familiares, a terapia pode ajudá-los a reduzir o estresse, a trabalhar
melhor seus sentimentos e angústias, superando a sensação de culpa e/ou fracasso, a
identificar preconceitos e atitudes errôneas e os auxilia na busca de soluções para os
problemas cotidianos.
O modelo de terapia que mais tem se mostrado eficaz na esquizofrenia é o da
psicoeducação de família, que acrescenta à terapia informações sobre a doença.
Oferecer conhecimento teórico é imprescindível para ajudar o familiar a compreender
melhor seu paciente, reavaliando julgamentos e atitudes. Esta importante etapa
educativa o prepara para a etapa seguinte, a terapia propriamente.
A terapia pode ser individual (com um ou mais membros de uma mesma família) ou em
grupo (várias famílias). Ela analisa as situações práticas do dia-a-dia e como cada um
lida com os conflitos e soluciona os problemas, propondo uma reflexão. Ela pode
recorrer a qualquer momento à etapa educativa para corrigir equívocos que porventura
persistirem. Essa reflexão é essencial para que o familiar esteja mais receptivo a novas
maneiras de lidar com o estresse e adquira maior habilidade no manejo e na solução das
situações, reduzindo assim a sobrecarga e melhorando a qualidade do relacionamento
familiar.
Leia o artigo “Qual o melhor tratamento para a esquizofrenia?”

PROTEGER DAS RECAÍDAS


Por que proteger?
A pessoa acometida pela esquizofrenia tem uma maior vulnerabilidade ao estresse, ou
seja, é menos tolerante e reage mal quando em situações de sobrecarga emocional, que
requeiram maior equilíbrio mental. Isso explica, por exemplo, porque um ambiente
familiar negativo pode ser tão danoso à estabilidade ou porque muitos pacientes entram
em crise em momentos de perigo, trauma ou estresse.
Essa dificuldade está relacionada à capacidade individual de processar informações do
meio e de planejar saídas ou soluções para uma determinada situação. A sensação de
estar perdido ou paralisado diante de algo provoca uma reação que desestabiliza a
pessoa e a torna ainda mais vulnerável ao ambiente, gerando medo, desconfiança e
deixando-a em estado de alerta.
A contrapartida comportamental disso é um maior isolamento, retraimento emocional,
necessidade de estar atento a tudo, menor necessidade de sono e avaliações deturpadas
da realidade, características que antecedem a crise. Identificar esses sintomas é essencial
para uma intervenção precoce, evitando-se um novo surto da doença.
Da mesma forma, zelar pelo ambiente do paciente, reduzindo o estresse e fatores que
possam gerar instabilidade, é fundamental na prevenção de recaídas. Sabemos que nem
todos os fatores podem ser controlados, que fatalidades ocorrem e que a crise muitas
vezes chega sem aviso prévio. Porém, é possível controlar alguns fatores de proteção e
evitar outros de vulnerabilidade, fazendo a nossa parte pela estabilidade da doença.

Como proteger?
Existem fatores que foram relacionados pelos pesquisadores a uma maior chance de
recaída e outros que conferem proteção à pessoa vulnerável a novas crises de
esquizofrenia. O equilíbrio entre esses fatores deve tender para o lado da proteção para
que o indivíduo mantenha-se estabilizado.
Os principais fatores de proteção contra recaídas são:
 Todas as formas de tratamento: médico, psicoterápico, psicossocial e de família.
 Tolerância pessoal ao estresse.
 Ambiente social e familiar em harmonia.
Os fatores de risco para a recaída são:
 A própria doença: gravidade das alterações neuroquímicas (níveis de dopamina), intensidade
dos sintomas, disfunção cognitiva e dificuldade de processamento das informações do
ambiente.
Personalidade difícil.
 Ambiente social e familiar estressante ou superestimulante.
 Eventos de vida traumáticos ou estressantes.
Os fatores de proteção devem ser maiores do que os de risco para que a doença
permaneça estabilizada. Todos os fatores de proteção podem ser aperfeiçoados com o
tratamento: a tolerância pessoal pode ser reforçada através da psicoterapia e dos
medicamentos; o ambiente social pode ser readequado através do tratamento
psicossocial e de família, levando-se em conta as potencialidades e fragilidades de cada
um; o ambiente familiar pode melhorar com a orientação ou terapia de família.
Já entre os fatores de risco, apenas o ambiente social e familiar são passíveis de
mudança. As características da própria doença, como os níveis de dopamina, a
gravidade dos sintomas e da disfunção cognitiva podem não ser completamente
neutralizados com os tratamentos. Por isso existem pacientes mais graves e que
respondem pior ao tratamento do que outros. A personalidade é mais resistente à
psicoterapia e pacientes mais difíceis não aderem bem a esse tratamento. Eventos de
vida traumáticos, como catástrofes, acidentes ou morte de algum familiar também não
podem ser controlados.
Portanto, o enfoque no tratamento médico, psicoterápico, psicossocial e de família são
os recursos hoje disponíveis, que podem manter o paciente bem por longo tempo,
ajudando na sua recuperação e na superação dos obstáculos.

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