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CÍNTIA MARA CAMPOLINA ROSSI

ROBERTA MAÍZA FERREIRA


MORGANA VALENTE ABEILICE
ZORAIA DE SALVO LISBOA

TERAPIA COGNITIVA DA ESQUIZOFRENIA

Belo Horizonte

2012
CÍNTIA MARA CAMPOLINA ROSSI
ROBERTA MAÍZA FERREIRA
MORGANA VALENTE ABEILICE
ZORAIA DE SALVO LISBOA

TERAPIA COGNITIVA DA ESQUIZOFRENIA

Trabalho apresentado à disciplina Psicologia Cognitiva


(Fundamentos Teóricos e Metodológicos), do Curso de
Psicologia, da Faculdade de Ciências Humanas, Sociais e
da Saúde - Universidade FUMEC.
Orientador: Prof.: Marco Antônio Silva Alvarenga.

Belo Horizonte

2012
Sumário

Introdução......................................................................................................................3
Desenvolvimento ........................................................................................................ 4
1. Visão Geral da Esquizofrenia.................................................................................6
2. Contribuições Biológicas........................................................................................6
3. A Conceituação Cognitiva dos Delírios..................................................................7
4. A Conceituação Cognitiva das Alucinações Auditivas...........................................7
5. A Conceituação Cognitiva dos Sintomas Negativos..............................................8
6. A Conceituação Cognitiva do Transtorno do Pensamento Formal........................9
7. Avaliação................................................................................................................9
8. Engajamento e Promoção da Relação Terapêutica............................................10
9. Avaliação e Terapia Cognitivas para Delírios......................................................11
10. Avaliação e Terapia Cognitivas para Alucinações Auditivas............................12
11. Avaliação e Terapia Cognitivas para Sintomas Negativos...............................13
12. Avaliação e Terapia Cognitivas para o Transtorno do Pensamento Formal....14
13. Terapia Cognitiva e Farmacoterapia.................................................................15
14. O Modelo Cognitivo Integrativo da Esquizofrenia.............................................17
Conclusão ................................................................................................................. 19
Referências Bibliográficas...........................................................................................20
3

Introdução

Este trabalho apresenta um resumo do livro de Aaron T. Beck: Terapia


Cognitiva da Esquizofrenia, com base nas normas da Associação Brasileira de
Normas Técnicas (ABNT). O trabalho segue a seguinte estrutura: introdução,
desenvolvimento, conclusão e referências bibliográficas. O objetivo do livro é
apresentar um histórico sobre o desenvolvimento do estudo sobre a esquizofrenia e
como a Terapia Cognitiva (TC) é hoje um promissor tratamento para a esquizofrenia,
levando em conta a farmacologia utilizada no trato da doença e as limitações da TC.
4

Desenvolvimento

Entre as décadas de 80 e 90, o modelo cognitivo foi direcionado também para


a esquizofrenia, por pesquisadores do Reino Unido, produzindo uma melhora no
tratamento desse transtorno. A estratégia de tratamento foi a mesma utilizada para a
depressão. Aaron Beck acredita que é muito importante entender o aspecto
neurocognitivo e psicológico-cognitivo da esquizofrenia e não deixar de levar em
conta sua singularidade como transtorno psiquiátrico. O autor destaca John
Hughlings Jackson, Emil Kraepelin e Eugen Bleuler, como pioneiros na pesquisa
moderna sobre a esquizofrenia.
O neurologista inglês John Hughlinhs Jackson classifica a esquizofrenia como
uma doença cerebral, codifica sua sintomatologia em um modelo bicameral e
heurístico que reúne como sintomas mentais positivos as elaborações e distorções
das percepções, crenças e comportamentos normais; enquanto os déficits na fala,
motivação, emoção e prazer são reunidos como sintomas negativos; e propõe uma
interface entre a biologia e a sintomatologia.
O psiquiatra alemão Emil Kraepelin criou a nosologia (sistema classificatório)
para a esquizofrenia e agrupou três manifestações de insanidade – hebrefenia
(comportamento desorganizado), catatonia (falta de movimento e por outro lado
comportamento agitado) e a paranoia (delírios de perseguição e grandeza) – as
colocou em uma categoria denominada dementia praecox. Ele não era otimista
quanto a uma recuperação do paciente acometido pela dementia praecox. Até hoje a
categoria de Kraepelin é usada nos diagnósticos tanto do Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana (2000), 4ª
edição (DSM-IV-TR) e a Classificação Internacional de Doenças da Organização
Mundial da Saúde (1993), 10ª edição (CID-10).
O psiquiatra suíço Eugen Bleuler (1911/1950) cunhou o termo esquizofrenia e
a caracterizou como uma família de transtornos mentais (Healy, 2002). A formulação
de Bleuler era dimensional (Wing e Agrawal, 2003), compreendendo desde uma
disfunção leve da personalidade, que mais tarde, seria chamada de traço
esquizotípico e esquizoide, até a dementia praecox. Bleuler teve grande impacto na
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pesquisa da esquizofrenia, principalmente, pela conceituação sobre os mecanismos


de transtorno.
A esquizofrenia apresenta um quadro variado de sintomas, que podem ser
classificadas em três dimensões, os psicóticos - alucinações e delírios; os de
desorganização - comportamento bizarro e transtorno do pensamento formal
positivo; e os negativos - afeto embotado, alogia, avolição e anedonia.
Sua epidemiologia mostra que ela afeta uma em cada cem pessoas,
independentemente do gênero. Os homens têm mais risco do que as mulheres de
desenvolvê-la, o que ocorre mais cedo. O meio urbano e ser migrante de pele
escura para área de grupo predominantemente de pele clara, são fatores que
aumentam o risco de desenvolvê-la. Indivíduos com esquizofrenia morrem
prematuramente e a morte por suicídio, na fase inicial da doença, é maior. A
esquizofrenia é altamente hereditária e familiares de portadores da doença têm dez
vezes maior probabilidade de desenvolvê-la na comparação com sujeitos não
psiquiátricos. No estudo da adoção os fatores genéticos são maiores que os
ambientais e ainda não se sabe os genes específicos que estão ligados à
esquizofrenia. Fatores ambientais são significativos na etiologia da doença. A
fisiopatologia da esquizofrenia ainda é de difícil explicação, mas avanços são
encontrados na compreensão da neurobiologia quando estudos recentes
comprovam que um conjunto complexo de pequenas diferenças por todo o córtex
caracteriza a diferença entre indivíduos portadores de esquizofrenia e controles
normais (Davatzikos et al., 2005). O comprometimento cognitivo é característica
central da esquizofrenia.
Quando se pensa em tratamento antipsicótico, vê-se que os medicamentos
antipsicóticos existem há apenas meio século. Anteriormente o tratamento era feito
com hidroterapia, terapia por coma insulínico e lobotomia frontal. Em 1952 a
clorpromazina, passa a ser o primeiro medicamento neuroléptico, diminuindo
alucinações e delírios. Estudos da década de 60 mostraram que as drogas
neurolépticas causavam efeitos colaterais como sedação, ganho de peso e efeitos
colaterais extrapiramidais. Na década de 70 evidências mostraram que esses
medicamentos ajudam a prevenir recaídas e já na década de 80 uma segunda
geração de medicamentos antipsicóticos surgiu, com melhor eficácia,
comprometimento cognitivo reduzido e efeitos colaterais com perfil melhor. Tanto os
medicamentos de primeira como os de segunda geração não mostraram efeito
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melhor sobre a neurocognição. Apesar do avanço em relação às drogas


neurolépticas não houve mudança nos prognósticos da doença com a introdução
dos antipsicóticos. A maioria dos prognósticos permanece desfavorável a longo
prazo.

1. Visão Geral da Esquizofrenia

A limitação dos medicamentos e a pouca qualidade de vida dos indivíduos


com esquizofrenia levaram ao desenvolvimento da terapia cognitiva (TC) como
tratamento adjuvante para esses pacientes. Tendo como grande influência o modelo
de Beck para a depressão (Beck et al., 1979) e a abordagem de David Clark para os
transtornos de ansiedade (1986). Em 2007, já haviam sido publicados mais de
trezentos estudos que traziam os resultados positivos da TC para a esquizofrenia,
todavia existe espaço para a melhora no tratamento.
A abordagem cognitiva da esquizofrenia, trabalhada no livro, traz as quatro
categorias de sintomas primários, delírios, alucinações, sintomas negativos e
transtorno do pensamento formal e como tratá-los sob a luz da terapia cognitiva.

2. Contribuições Biológicas

Os aspectos biológicos da esquizofrenia podem se mostrar importantes para


o entendimento e a utilização dos princípios e das técnicas da TC.
A esquizofrenia é um agrupamento de sintomas que pode vir a ser uma
doença ou um grupo de doenças relacionadas. É fato que existe um componente
poligênico na etiologia da esquizofrenia; que complicações obstétricas e estressores
ambientais aumentam a probabilidade de adquirir o transtorno; que existem
perturbações em partes do cérebro que provavelmente ocorrem no início do
desenvolvimento neural, mas isso não é causa de diferenças notáveis até a
maturação neural que ocorre na adolescência, e é fato também que uma interação
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atípica entre essas regiões cerebrais resulta em interação também atípica do


indivíduo com o meio social, decorrente de vários sintomas e alterações cognitivas.
São tarefas para os neurobiólogos: determinar os fatores que contribuem para
a etiologia da esquizofrenia, seja como transtorno único ou transtorno múltiplo, e
como esses fatores interagem para causar as manifestações externas da
esquizofrenia. Já a tarefa dos terapeutas cognitivos deve ser na direção de aplicar
os resultados da neurobiologia ao tratamento psicoterápico da esquizofrenia.

3. A Conceituação Cognitiva dos Delírios

Definição dada a Delírio pelo DSM-IV:


→ Uma crença falsa baseada em inferência incorreta sobre a realidade externa, que
é mantida firmemente apesar do que pensam quase todas as pessoas e apesar do
que constitui prova ou evidência irrefutável e óbvia do contrário. A crença não é
aceita comumente por outros membros da cultura ou subcultura da pessoa (p.ex.,
não é artigo de fé religiosa).
Uma análise fenomenológica das características dos delírios esquizofrênicos
e seu desenvolvimento são a base do modelo cognitivo dos delírios. São observados
os vieses do processamento de informações e o conteúdo do sistema de crenças
antecedentes, que em conjunto, podem agir aumentando a vulnerabilidade
psicológica ao desenvolvimento da paranoia e delírios de natureza compensatória. A
intenção ao interpretar os delírios dentro de um modelo cognitivo, é compreendê-los
em termos de conceitos familiares, como crenças disfuncionais, viés de atenção e
distorções cognitivas. Conceituando-os assim, a intervenção psicoterápica é
facilitada e pode-se ampliar para a explicação de outros delírios, como transmissão
ou inserção de pensamentos e crenças ainda mais bizarras. Conclui-se que são
necessários muitos outros estudos sistemáticos da fenomenologia dos delírios,
como também abordagens experimentais para expandir e validar as formulações
cognitivas propostas nesse modelo.

4. A Conceituação Cognitiva das Alucinações Auditivas


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As alucinações são definidas como “experiências perceptivas na ausência de


estimulação externa, que ocorrem no estado de vigília. Elas costumam estar
associadas ao uso de psicoestimulantes ou diversos transtornos mentais” (Beck
et.al. 2010, p. 94). As alucinações auditivas possuem diversas características,
podendo se manifestar para o paciente na segunda ou na terceira pessoa e,
também, como alucinações não verbais, constituindo-se de sons variados. Nos
pacientes esquizofrênicos, determinadas situações podem ocasionar as alucinações
auditivas, podendo permanecer latentes após a experiência inicial e surgir
novamente durante períodos de estresse. Beck et.al. (2010).
De acordo com Beck et.al. (2010), no modelo cognitivo a formação inicial e
manutenção de alucinações são formados pelos seguintes componentes:
Predisposição à imagem mental auditiva, crenças e cognições hiperativas,
perceptualização, desinibição, viés externalizante, teste da realidade deficiente, viés
do raciocínio, progressão da cognição quente para vozes. Delírios relacionados com
um agente externo, crenças nucleares subjacentes e percepção do “relacionamento”
mantêm as alucinações.

5. A Conceituação Cognitiva dos Sintomas Negativos

Nos pacientes com esquizofrenia, os sintomas negativos podem ser


observados a partir do seu comportamento, estes sintomas “podem ter uma função
protetora e compensatória para o paciente que enfrenta delírios e alucinações
ameaçadoras” (Beck et.al, 2010, p. 131). Nota-se o empobrecimento da linguagem e
pensamento, embotamento afetivo, consequentemente levando ao isolamento social
e dificuldade no envolvimento e obtenção de prazer nas atividades. O
comprometimento neurocognitivo gera no paciente dificuldade na concentração e
resolução de problemas, planejamento e execução de ações e realização de tarefas
cotidianas. Com a elaboração de crenças negativas, ativadas a partir do
comprometimento cognitivo e sintomas negativos baseando-se em fatores como
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crenças que contribuem para a baixa motivação, o paciente evita a execução de


diversas atividades.
Os sintomas negativos secundários são resultados da interação entre
sintomas positivos e negativos. “Essas respostas comportamentais secundárias,
costumam ser mediadas por crenças e posturas negativas” (Beck.et.al, 2010, p. 131)

6. A Conceituação Cognitiva do Transtorno do Pensamento Formal

O transtorno do pensamento formal é composto por sintomas positivos e


negativos manifestando-se na forma de transtorno de linguagem (ou fala). Nos
sintomas positivos há o afrouxamento de associações e uso idiossincrático da
linguagem, e nos sintomas negativos estão presentes a pobreza da fala e o bloqueio
do pensamento. Beck et.al, (2010).
O modelo cognitivo conceitua que acontecimentos estimulam os pensamentos
automáticos, ou seja, geram respostas psicológicas mediante os fatos. O transtorno
do pensamento formal é considerado parte de uma resposta de estresse provocado
por diversos acontecimentos, onde indivíduos com transtorno possuem uma
vulnerabilidade maior para apresentar este tipo de comportamento mediante os
fatores causadores de estresse.
Há uma compatibilidade nos modelos cognitivos e de processamento de
informação no transtorno do pensamento formal. “Em termos do transtorno do
pensamento, muitos erros estão relacionados com a falta de progressão linear na
fala” (Beck, et.al.2010, p. 142), apresentando descontrole na escolha de palavras,
afrouxamento de associações, sonorização, perseveração, ecolalia, concretude,
neologismos.

7. Avaliação

Deve-se pensar na avaliação como um processo contínuo empregado no


percurso da terapia e na sua finalização, com o objetivo de avaliar o progresso, a
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sua eficácia, a estimulação do paciente em prosseguir o tratamento e as influências


externas na terapia. A entrevista inicial pode ocorrer antes ou após a coleta de
dados em outras fontes de informação, mas o terapeuta deve estar sempre atento
ao que o paciente traz durante a entrevista, como maneira de elucidar os outros
dados investigados.
É necessário para um bom processo terapêutico o estabelecimento do rapport
e da confiança, entre terapeuta e paciente, a partir da entrevista inicial e com auxílio
de técnicas terapêuticas de empatia. Assim, o terapeuta deve, ainda, ter cuidado
com excesso de perguntas, evitando possíveis resultados negativos, como também
deve explicar o propósito, a teoria e a metodologia da terapia.
No diagnóstico avaliativo utilizam-se escalas de avaliação mais curtas após o
início de cada sessão como forma de acompanhar o progresso ou retrocesso dos
sintomas. O processo de avaliação ocorre em cada momento da sessão, o terapeuta
deve observar todos os sinais que o paciente manifesta, além da fala e o relato de
como foi a semana, obtendo com isso dados para avaliar as melhoras ou regressões
na terapia. Cada nova situação deve ser avaliada isoladamente, a fim de evitar “um
viés que possa impedir que o terapeuta enxergue variações nas reações, sinais sutis
de melhora e mudança” (Beck, et.al, 2010, p. 157). Após o relato do paciente sobre
determinado problema, o terapeuta pode conduzir uma avaliação detalhada do
acontecimento utilizando o modelo cognitivo.

8. Engajamento e Promoção da Relação Terapêutica

Há consenso, na comunidade científica, no que diz respeito à universalidade


da terapia cognitiva, tanto para casos de ansiedade e depressão, quanto para
alguns transtornos mentais. Porém, é importante ressaltar a necessidade de
utilização de algumas estratégias como garantia de aliança terapêutica.
As primeiras sessões permitem certa flexibilidade, pois o intuito do terapeuta
é uma aproximação do paciente em um tom mais afetivo, a fim de garantir confiança,
respeito e segurança ao longo do tratamento. Uma vez que terapeuta e paciente
estejam engajados, há boa perspectiva de trabalho mútuo. O terapeuta pode
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contribuir com este quadro dando ao paciente retorno positivo acerca dos seus
progressos.
Possíveis obstáculos podem surgir em detrimento de uma boa relação. Cabe
ao terapeuta observar suas próprias crenças e preconceitos, no que diz respeito a
pacientes esquizofrênicos e seus prováveis comportamentos. E, ainda, deve estar
atento ao paciente no que se refere: ao estabelecimento de confiança,
principalmente em casos de paranoia; a manifestações de sintomas negativos
relacionados, por exemplo, a crenças disfuncionais; a transtornos do pensamento,
que podem dificultar a comunicação. Embora a terapia cognitiva seja estruturada, de
tempo limitado, com continuidade de uma sessão para a outra, com prescrição de
tarefas a serem feitas em casa e, normalmente, individual, há flexibilidade, por parte
do terapeuta, no estabelecimento da agenda das sessões, no ritmo em que estas
acontecem e na prescrição de tarefas a serem realizadas em casa. Para tal, o
terapeuta deve estar atento ao humor do paciente.

9. Avaliação e Terapia Cognitivas para Delírios

No processo de avaliação terapêutica é importante distinguir em qual


momento da vida do paciente surgiram as crenças de conteúdo delirante, quais
acontecimentos contribuíram para o seu surgimento e que situações confirmaram o
conteúdo de tais crenças. Desta forma, o terapeuta procede à avaliação que é
desmembrada em três tópicos, a saber, avaliação de sintomas ou cognições,
avaliação funcional e conceituação do caso.
Durante a avaliação de sintomas ou cognições, alguns itens devem ser
observados, tais como, identificação do foco delirante, a partir do próprio discurso do
paciente ou de questões propostas pelo terapeuta, com o objetivo de localizar as
crenças delirantes mais imediatas e entender os aspectos envolvidos em seu
desenvolvimento; avaliação de distorções cognitivas, que são detectadas pelo
terapeuta a fim de apontar perspectivas alternativas ao paciente; análise de
respostas emocionais e comportamentais a interpretações delirantes; averiguação
das evidências básicas usadas para comprovar os delírios, à medida que o processo
avança, permitindo entendimento da inter-relação entre as crenças; avaliação de
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crenças subjacentes a interpretações e crenças delirantes, permitindo identificar


crenças nucleares não delirantes que contribuem para a formação dos delírios.
A avaliação funcional objetiva detectar situações que desencadeiam delírios
ou disparam gatilhos para eventuais perturbações emocionais, enquanto a
conceituação do caso permite o entendimento da história do indivíduo, bem como
fatores contributivos aos seus delírios. O tratamento tem por intuito diminuir as
crenças delirantes do paciente, das mais periféricas para as mais centrais.

10. Avaliação e Terapia Cognitivas para Alucinações Auditivas

Aqui, o enfoque são as alucinações auditivas na forma de vozes. Estas


causam perturbações ao paciente e, consequentemente, produzem comportamentos
importantes no indivíduo. Cabe ao terapeuta conduzir, com sensibilidade, o
tratamento com vistas a reduzir as perturbações geradas pelas alucinações.
O terapeuta pode utilizar instrumentos de avaliação, entre eles o BAVQ-R
(Beliefs About Voices Questionnaire – Revised), possibilitando identificar as crenças
acerca das vozes ou tentar obter relatos do paciente acerca do seu conteúdo. Sendo
assim, o paciente recebe como tarefa registrar estes conteúdos e o contexto em que
se encontravam ao terem início as vozes.
A exemplo dos delírios, os acontecimentos próximos ao início das alucinações
devem ser pesquisados, com o intuito de conhecer o reflexo do conteúdo das vozes
e das crenças sobre o indivíduo.
A elucidação, ao paciente, dos fatores contributivos para a ocorrência das
vozes é importante no processo de psicoeducação e normalização, que pode ser
enriquecido com o seu entendimento sobre o modelo cognitivo.
O terapeuta pode utilizar estratégias disponíveis para que o paciente consiga
lidar com as vozes, inclusive registrando seu conteúdo específico, características
físicas, o grau de ansiedade que elas geram e o contexto em que surgem, tudo isto
com a finalidade de diminuir sua frequência e grau de perturbação.
O conteúdo das vozes pode ser delirante ou não delirante. O terapeuta
orienta o paciente no sentido de identificar distorções cognitivas e mesmo a
veracidade ou a congruência das informações contidas nas vozes. Nos casos em
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que este conteúdo é ameaçador, o paciente pode se sentir muito ameaçado ao lidar
com as vozes e, desta forma, o terapeuta pode utilizar alternativas como demonstrar
as desvantagens em obeceder às ameaças.

11. Avaliação e Terapia Cognitivas para Sintomas Negativos

Sintomas negativos apresentam intermitência para a maioria dos pacientes.


Estes sintomas não estão relacionados apenas a características biológicas, mas
também a uma complexa rede envolvendo expectativas, crenças e estratégias
cognitivas e comportamentais.
Há muitos instrumentos de avaliação à disposição do terapeuta com o
objetivo de determinar a existência e o impacto dos sintomas negativos sobre o
indivíduo. Tais sintomas dizem respeito a efeitos colaterais de medicação;
superestimulação ou subestimulação, de acordo com o ambiente em que o paciente
se encontra; sintomas negativos secundários a transtornos de humor ou de
ansiedade; sintomas negativos secundários a sintomas positivos.
É importante identificar como o paciente percebe e avalia os seus próprios
sintomas negativos para a realização da avaliação funcional. Isto possibilita ao
terapeuta criar planilhas com foco na realidade de determinado indivíduo, resultando
na compreensão do padrão de sintomas negativos ao longo do tempo.
É interessante que o terapeuta elabore as tarefas de casa com vistas a
realizar objetivos concretos cotidianos do indivíduo, adaptadas também ao nível de
comprometimento neurocognitivo do paciente. Neste tratamento também são
consideradas a psicoeducação e a normalização, bem como a apresentação do
modelo cognitivo ao paciente.
As estratégias de enfrentamento ou comportamentos do sistema delirante são
sintomas negativos secundários, que têm como proposta de tratamento uma
redução gradativa, das situações menos ameaçadoras para as mais ameaçadoras.
No que diz respeito aos sintomas negativos primários, são utilizadas estratégias que
motivem e recriem o envolvimento emocional do paciente com fatores
preponderantes de sua vida.
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O trabalho do terapeuta inclui abordar determinados pontos importantes, a


saber, as expectativas de prazer do indivíduo, que geralmente são baixas em
pacientes com sintomas negativos, sugerindo atividades prazerosas, pois estes
mesmos pacientes têm capacidade de sentir prazer como qualquer outra pessoa,
conforme demonstra a experiência clínica; as expectativas de sucesso, com o
objetivo de reduzir crenças disfuncionais relacionadas ao seu desempenho; o
impacto do estigma da esquizofrenia, no sentido de auxiliar o paciente a lidar com
este tipo de situação; a percepção de poucos recursos, ajudando o paciente a
dimensioná-los de forma real e objetiva para a realização de determinada tarefa.

12. Avaliação e Terapia Cognitivas para o Transtorno do Pensamento Formal

A terapia cognitiva conscientiza o paciente dos aspectos afetados e o auxilia a


reduzir tanto a frequência quanto a gravidade dos sintomas. O tratamento gira em
torno das reações cognitivas, emocionais e comportamentais relacionadas ao
sintoma. A pobreza de insights que acomete pacientes com transtornos do
pensamento formal pode gerar perturbações como o distanciamento social. A
avaliação da existência, natureza e gravidade do transtorno do pensamento formal
pode ser feita através da observação direta por instrumentos padronizados, durante
a sessão e na discussão com membros da família e da equipe. A avaliação dos
elementos cognitivos dos pensamentos automáticos, crenças, expectativas,
avaliações e suposições depende da redução do transtorno do pensamento formal,
favorecendo melhor comunicação.
São duas as escalas que descrevem os subtipos de transtorno do
pensamento formal. Uma é a escala Trought, Language and Comunication (TLC), de
Andreasen (Andreasen, 1979), e a outra é a sua escala subsequente, muito
utilizada, Scale for the Assesment of Positive Symptoms (SAPS; Andreasen, 1984c).
A SAPS é satisfatória para definir a gravidade de diferentes tipos de transtorno do
pensamento formal como o descarrilamento – ou associações frouxas: “fui almoçar.
Em terra de cego, caolho é rei”; perda do objetivo - ou deriva: “quero falar sobre
procurar um emprego. Eu trabalhava antes. Minha irmã se casou”, dentre outros.
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Para identificar melhor os transtornos do pensamento, é interessante permitir ao


paciente respostas longas para questões abertas e ouvi-lo cuidadosamente. Quando
o paciente percebe a conexão entre os sintomas e circunstâncias estressantes, é
indicado orientá-lo sobre tais circunstâncias e os pensamentos que tem sobre elas,
perguntar como percebe o desencadeamento do estresse, se ele interfere em sua
capacidade de se comunicar.
A avaliação funcional inclui um histórico do desenvolvimento e informações
sobre distorções cognitivas, envolve o paciente e, se permitido, os familiares e
instituições de saúde. Ela deve reunir fatores passados e presentes relatados na
avaliação funcional que irão nortear a atuação do terapeuta.
O tratamento é feito após o rapport e a avaliação, e deverão ser usadas
estratégias para reduzir o risco de estresse. Entra em cena logo a seguir, a
psicoeducação para reduzir o estigma e facilitar a compreensão dos sintomas
através das abordagens cognitivas e/ou comportamentais.
Quando o paciente toma consciência dos sintomas, a psicoeducação passa a
fornecer explicações sobre eles. O modelo cognitivo mostra as conexões entre as
circunstâncias estressantes e o início (pensamentos automáticos) ou agravamento
dos sintomas, assim com os efeitos da falta de insight.
Abordagens comportamentais cognitivas podem auxiliar os pacientes a
identificarem suas dificuldades de comunicação para aperfeiçoá-las. Já as
abordagens comportamentais utilizam a dramatização (role play) para os pacientes
se colocarem no lugar de ouvintes e entenderem a dificuldade das pessoas em
compreendê-los. As abordagens cognitivas trabalham a regulação emocional, já que
as cargas emocionais interferem substancialmente na qualidade da fala. É um
processo gradual que envolve empatia e escuta reflexiva, além do cuidado de
sempre minimizar o estresse.

13. Terapia Cognitiva e Farmacoterapia

O uso da terapia cognitiva e intervenções psicossociais no tratamento da


esquizofrenia não descarta a necessidade das medicações para reduzir o impacto e
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a gravidade dos sintomas do transtorno, o que favorece condições para se investigar


o significado psicológico.
Em 1952, o médico francês Henri Laborit descobriu que a clorpromazina fazia
os pacientes terem menos interesse no ambiente ao seu redor e a partir daí, ela
passou a ser usada em pacientes psiquiátricos. Com a evolução desses
neurolépticos, surgiu na década de 1980, medicamentos antipsicóticos de primeira
geração que agiam bloqueando os receptores de dopamina.
Apesar dos medicamentos AADs (antipsicóticos antagonistas de dopamina-
AADs) reduzirem o sofrimento de diversos pacientes e suas famílias, eles
apresentam diversas limitações e efeitos colaterais, primeiro porque não são
indicados para todos os indivíduos com esquizofrenia, em segundo, porque
geralmente tratam somente os sintomas positivos (alucinações, delírios e transtorno
do pensamento). E por último, seus efeitos colaterais potenciais incluem
cronicamente a debilitante discinesia tardia e o risco fatal da síndrome neuroléptica
maligna.
Além disso, os AADs podem agravar os sintomas negativos dos pacientes
diminuindo sua motivação, prejudicando a fala e a expressão emocional. Podem
também ocorrer distonia aguda com espasmos e contrações musculares
prolongadas, acatisia (inquietação motora) e acinesia (falta de movimento).
Com a reintrodução da closapina no final dos anos 80, iniciou-se a segunda
geração de antipsicóticos com a vantagem de produzirem menos efeitos colaterais
extrapiramidais, a discinesia tardia, a hiperprolactinemia e melhorar o tratamento dos
sintomas negativos, considerada até hoje como a mais efetiva.
A risperidona foi o primeiro AADs a não exigir frequência nos exames de
sangue para o controle de glicose e é efetiva em baixas doses. A olansapina seguiu-
se à risperidona com o benefício de ser mais sedativa auxiliando no controle da
insônia e da agressividade. A quetiapina é efetiva na agressividade, nos déficits
cognitivos, no humor depressivo e na ansiedade. A aziprasidona não está associada
ao diabete melito ou à hipercolesterolemia, assim como não provoca ganho de peso.
Ajuda na depressão e na ansiedade, mas apresenta efeitos colaterais como tontura
e sedação. A loxapina ajuda a reduzir a depressão e produz menor ganho de peso
ou mesmo causar perda de peso. Pode provocar efeitos extrapiramidais, discinesia
tardia e hiperprolactinemia.
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No ano de 2002, o aripiprazol foi liberado para o uso público (Lieberman,


2004a). Sua ação estabiliza a liberação da dopamina em áreas cerebrais onde ela
falta e a reduz onde está em excesso, mantendo a estabilidade, equilibrando o
bloqueio dos receptores pré-sinápticos de D2 e receptores pós-sinápticos.
É sabido que o cérebro é capaz de transformar experiências psicológicas em
alterações fisiológicas. A terapia cognitiva apresenta a enorme vantagem de
favorecer a modificação psicológica e posteriormente a fisiológica através de novas
sinapses. Isso irá refletir em novos hábitos de pensamento e novas modalidades de
avaliação de situações.
O uso dos medicamentos é um requisito inicial para a aplicação da terapia
cognitiva. A psiquiatria e a terapia cognitiva devem intervir juntas para adequarem o
tratamento às necessidades individuais dos pacientes. Nos momentos de maior
estresse, por exemplo, prescreve-se o aumento da dose do antipsicótico atual,
muda-se a medicação e, ao mesmo tempo, trabalham-se as razões que
desencadearam o aumento do estresse.
A terapia cognitiva favorece uma melhor comunicação, melhora o insight do
paciente, favorece a adesão à medicação e diminui a gravidade dos sintomas
psicóticos. É importante situá-lo sobre os efeitos dos medicamentos e o
funcionamento cerebral, esclarecer que as vozes que ouve são um sintoma normal
da esquizofrenia, libertando-o do sentimento de culpa.
Quando psiquiatra e terapeuta se valem de empatia e cautela, o paciente se
sente mais seguro e tranquilo para melhorar seus insights.

14. O Modelo Cognitivo Integrativo da Esquizofrenia

Recentemente ocorreu a tentativa de integrar os estudos neurofisiológicos em


um modelo cognitivo da esquizofrenia (Bentallet al., 2009: Broome et al., 2007 a;
Broome et al., 2005; Garety, Bebbington, Fowler, Freeman e Kuipers, 2007), mas os
resultados experimentais ainda são escassos para darem validade ao modelo.
É sabido que a carga cognitiva excessiva imposta por crenças hipersalientes
combinada com recursos cognitivos marginais (resultados de uma deficiência em
muitos domínios da função cerebral) interferem na avaliação e integração
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adaptativas de experiências internas e externas. Face a esse quadro, os pacientes


tendem a trabalhar com uma reserva cognitiva para realizar processos mais simples
do cotidiano, mas que é insuficiente para operações mais requintadas na percepção
da realidade devido à influência de crenças hipersalientes e de interpretações
errôneas. Além disso, esse estoque de recursos cognitivos é extremamente
prejudicado pelo efeito cumulativo dos comprometimentos (Nuechterlein e Dawson,
1984).
Os indivíduos esquizotípicos e esquizofrênicos apresentam deficiências de
pensamento semelhantes que têm enorme relação fisiológica ao estresse (Walker,
Baum e Diforo, 1998). Walker e colaboradores (2007) mostraram que a liberação do
cortisol aumenta a atividade da dopamina que, por sua vez, provoca a exacerbação
dos sintomas psicóticos durante eventos de estresse.
Há evidências de desregulação e redução do volume hipocampal
(responsável pelo controle do sistema mesolímbico de dopamina) influenciadas pelo
hipercortisolismo, fato que precede o início do transtorno clínico em indivíduos
vulneráveis.
As respostas biológicas ao estresse têm relação direta com a diátese.
Durante a transição para a psicose, ocorrem mudanças subjetivas que envolvem
alterações na percepção de si mesmo e/ou do mundo ao redor (Klosterkotter, 1992)
e disfunção cognitiva que acomete a atenção, memória de trabalho e função
executiva deficiente.
Através de avaliações, percebeu-se que indivíduos que fazem a transição
para a psicose têm um histórico elevado de traumas na infância (Fowler, 2007)
responsáveis por implantar uma imagem impotente de si mesmos diante do outro
todo poderoso. Os traumas são representados na forma de alucinações através de
vozes hostis como fragmento lembrado de uma experiência de abuso.
As disfunções do sistema neural parecem ser responsáveis pelo insight
cognitivo limitado e do pensamento desorganizado que compromete a capacidade
de reconhecer ideias delirantes como irrealistas. Entretanto, a insuficiência cognitiva
varia com o tempo e pode ser compensada pela farmacoterapia e a terapia cognitiva
que irá favorecer a melhora dos sintomas principais, ativando as funções cognitivas
superiores, afastando pensamentos disfuncionais, melhorando a avaliação das
evidências e a exploração de explicações alternativas.
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Por fim, a esquizofrenia é o resultado do intercâmbio cíclico entre a


capacidade reduzida de processamento, o enfraquecimento neural, os fatos
estressantes no ambiente e as crenças e interpretações disfuncionais. Ainda que a
terapia cognitiva não atue sobre a diátese neurofisiológica básica, ela pode modificar
as crenças disfuncionais resultantes, protegendo contra o estresse, os efeitos
tóxicos e a exacerbação dos déficits neurocognitivos.
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Conclusão

O estudo da esquizofrenia levanta, ainda hoje, dúvidas e suscita pesquisas,


pois não existe uma causa única, para sua manifestação. O surgimento da mesma
advém da interação de múltiplos fatores: genéticos, traumáticos, sociais, dentre
outros e podem atuar sozinhos ou em conjunto.
A Terapia Cognitiva (TC) mostra-se eficaz no tratamento da esquizofrenia,
aliada ao tratamento medicamentoso, segundo Beck (2010), pela redução de
sintomas em pacientes na fase crônica; pela melhoria de sintomas psicóticos
durante a aplicação na internação e nos períodos pós-tratamento, pela produção de
mudanças duradouras nos sintomas positivos e negativos e pela redução de
cinquenta por cento (50%) das taxas de recaídas. Conclui-se que a TC é um
tratamento promissor para a Esquizofrenia e como elucida Beck (2010) é importante
o contínuo trabalho de pesquisa para clarear a compreensão deste transtorno, que
se constitui um desafio para as várias abordagens científicas sobre Esquizofrenia.
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Referências Bibliográficas

BECK, Aaron T. et al. Terapia Cognitiva da Esquizofrenia. Porto Alegre:


Artmed, 2010.

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