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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO

CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIAS AGROPECUÁRIAS


LABORATÓRIO DE FITOTECNIA

PROPAGAÇÃO DE PLANTAS – APOSTILA REVISADA

Silvio Lopes Teixeira


Virginia Silva Carvalho
2009

Conteúdo:
1. Considerações gerais:
Conceitos e divisões da Horticultura. Sistemas de classificação e regras de nomenclatura das
plantas cultivadas. Conceito de propagação de plantas. Métodos de propagação: seminífera e
vegetativa (vantagens e desvantagens). Bibliografia.

2. Viveiricultura:
Considerações gerais sobre viveiricultura. Conceito e importância da Viveiricultura. Conceito e
finalidade do viveiro. Tipos de mudas produzidas no viveiro. Localização do viveiro. Preparação,
plantio e tratos culturais das mudas. Poda das plantas de viveiro. Instalações usadas em
propagação de plantas. Recipientes e substratos. Embalagem, transporte e comercialização.
Fatores do ambiente e seu controle no viveiro.

3. Sistemas de produção de mudas:


A campo, sob estruturas de proteção e cultivo in vitro.

4. Propagação seminífera:
Considerações gerais sobre os órgãos reprodutivos vegetais. Apomixia. Obtenção das
sementes. Colheita, processamento e conservação de sementes. Dormência em sementes e seu
controle.

5. Propagação vegetativa natural:


Tipos, características e manejo de estruturas naturais de propagação.

6. Propagação vegetativa artificial:


Considerações gerais. Modificações clonais.

6.1. Propagação vegetativa artificial: estaquia:


Conceito. Base anatômica e fisiológica da regeneração de órgãos adventícios. Classificação das
estacas, estratificação e técnicas de plantio de estacas de caule e folha. Controle do
enraizamento. Auxinas e sua aplicação no enraizamento de estacas.

6.2. Propagação vegetativa artificial: mergulhia:


Conceito. Tipos e execução.

6.3. Propagação vegetativa artificial: enxertia:


Conceitos básicos. Tipos de enxertia. Encostia. Usos da enxertia. Base anatômica e fisiológica
da enxertia. Fatores que afetam o êxito da enxertia. Relações enxerto e porta-enxerto.

(Apostila em fase de revisão; proibida a reprodução)

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1. Considerações gerais:
1.1. Conceitos e divisões da Horticultura.
1.2. Sistemas de classificação e regras de nomenclatura das plantas cultivadas.
1.3. Conceito de propagação de plantas.
1.4. Métodos de propagação: seminífera e vegetativa.
1.5. Bibliografia.

1.1. Conceitos e divisões da Horticultura:


Segundo o dicionário Aurélio, o termo Agricultura é a arte de cultivar os
campos; cultivo da terra; lavoura; cultura. É também o conjunto de operações
que transformam o solo natural para produção de vegetais úteis ao homem.
Atualmente o conceito é mais amplo. Agricultura pode ser definida como a
ciência que estuda as plantas com o objetivo de tirar delas o melhor proveito
econômico.
A agricultura se divide em vários ramos cada um cuidando do estudo e da
exploração econômica de um grupo de espécies reunidas em função das
características em comum. Dentre esses ramos temos a Horticultura que é a
arte de cultivar hortaliças, fruteiras, plantas ornamentais, medicinais e
aromáticas. O termo horticultura não deve ser utilizado como sinônimo de cultivo
de hortaliças. Para isso tem-se o termo olericultura. Horticultura é o ramo da
fitotecnia que se dedica ao estudo das plantas exploradas de forma intensiva
pelo homem para serem utilizadas como alimento, para fins medicinais, para
satisfação estética dentre outros.
A horticultura é explorada de forma intensiva por exigir tratos agriculturais
intensivos em operações de sementeira, viveiro, preparo de covas individuais,
podas, desbastes de frutos e manejo pós-colheita especial.
Na horticultura como produtora de alimentos, temos a fruticultura, a
olericultura e as plantas condimentares e aromáticas; para satisfação estética,
temos a floricultura e a horticultura paisagística; e, para fins medicinais, tem-se
um grupo importante de plantas hortícolas de natureza herbácea, arbustiva e
arbórea, muitas das quais classificadas também como ornamentais e produtoras
de alimentos. A Fruticultura, Olericultura, Floricultura, Plantas Condimentares,

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Aromáticas e Medicinais devido a importância no contexto da agricultura,
constituem disciplinas específicas dentro do curso de Agronomia.
Um tema da mais alta relevância dentro da horticultura é a viveiricultura,
definida como sendo a parte da horticultura que cuida da exploração técnica,
racional e econômica de mudas.

1.2. Sistemas de classificação e regras de nomenclatura das plantas cultivadas:


Desde os primórdios da ciência da Horticultura o homem tem sentido a
necessidade de reunir as plantas em grupos com características semelhantes,
para fins de estudo e exploração econômica. Essa forma de classificação, que
persiste até hoje, denominada Classificação Hortícola, é feita de maneira
rudimentar reunindo as plantas em função de características biológicas comuns
como o hábito de crescimento, a duração do ciclo de vida, a persistência das
folhas, a adaptação climática, o uso comum, dentre outras.
Com relação ao uso, as plantas podem ser divididas em: comestíveis,
medicinais, condimentares, ornamentais, estimulantes, produtoras de óleo, de
borracha, de madeira, dentre outras.
Quanto ao porte, as plantas são divididas em: herbáceas, trepadeiras,
arbustos e árvores.
Quanto à persistência das folhas, as plantas podem ter folhas
persistentes ou caducas. As plantas perenifólias são aquelas cujas folhas são
substituídas continuamente, à medida que envelhecem e caem, permanecendo
a planta enfolhada durante todo o ano. As caducifólias perdem todas as folhas
no outono, ficando a planta totalmente desprovida de folhas no inverno.
A classificação hortícola é chamada de artificial, por não levar em
consideração o parentesco botânico entre as plantas, mas tem importância para
a tomada de decisões em horticultura, principalmente na fase de planejamento
de um empreendimento, bem como em várias outras ocasiões. Por exemplo,
conhecer as plantas de determinado porte é da maior importância, quando da
tomada de decisões no planejamento de um jardim, ou da escolha do
equipamento necessário à aplicação de defensivos; conhecer uma relação de

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plantas de determinada exigência climática é imprescindível, ao decidir sobre as
culturas a serem exploradas em certa região. Enfim, em todas as ocasiões, na
prática da horticultura, esta forma de classificação é utilizada.
Outra forma de classificação denominada Classificação Botânica, surgiu
no século XVIII, idealizada pelo botânico sueco Carolus Linnaeus, baseado na
teoria de que todos os seres vivos evoluíram por meio de mutações acumuladas
nos seus ascendentes com o passar das gerações, o que pressupõe a
existência de parentesco botânico entre eles e os seus descendentes. Desta
forma, as plantas que apresentam certas características botânicas comuns entre
si foram reunidas em divisões ou ramos, que constituem a categoria mais
elevada. As plantas dentro de cada divisão, e de acordo com semelhanças entre
si e que as diferenciam das demais, foram reunidas em classes; estas, seguindo
o critério citado, foram divididas em ordens, as ordens em famílias, estas em
gêneros, os gêneros em espécies, e estas em variedades (variedades
botânicas). Esta forma de classificar as plantas é chamada de natural, porque
leva em consideração o parentesco botânico entre elas.
Seguindo a Classificação Botânica, cada nova planta descoberta é
descrita tendo como base a espécie, que é identificada por dois nomes em latim
ou latinizados, sendo que o primeiro é o epíteto do gênero e o segundo da
espécie. Ao conjunto de normas utilizadas na classificação botânica deu-se o
nome de Código Internacional de Nomenclatura Botânica, que é adotado em
todo o mundo e oferece várias vantagens como permitir a identificação de uma
planta desconhecida coletada na natureza e a correta identificação de uma
determinada planta em trabalhos técnicos ou científicos. Além disso, o
conhecimento das relações taxonômicas entre as plantas possibilita uma melhor
visualização dos aspectos morfológicos, genéticos, fisiológicos e ecológicos,
auxiliando no prognóstico das exigências culturais, compatibilidades na enxertia,
possibilidade de hibridação de uma planta desconhecida, dentre outras
vantagens.
Com o passar do tempo, à medida que muitas espécies foram sendo
coletadas na natureza, sendo identificadas e cultivadas pelo homem através dos

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séculos, começaram a aparecer dificuldades para a identificação precisa dos
seus descendentes. As espécies na natureza estão sujeitas às modificações
genéticas segundo os princípios da evolução e as espécies cultivadas são
modificadas artificialmente, por meio da intervenção do homem. Destas
modificações, surgem novas formas melhoradas, que são selecionadas e
passam a ser cultivadas em substituição àquelas que as antecederam e que
serviram de base para a descrição e classificação das espécies. É o caso, por
exemplo, da laranja doce, batizada por Linneaus como Citrus sinensis. Ao longo
dos séculos de cultivo surgiram vários tipos de laranjas doces diferentes, hoje
chamadas de laranja pêra, lima, seleta, Bahia, valência, natal e outras, diferindo
uma das outras pela forma, cor, tamanho e sabor do fruto, número de sementes,
época de florescimento e de colheita, além de outras características que,
contudo, não as tornam diferentes o suficiente para que lhes seja dado o status
de novas variedades botânicas dentro da espécie-tipo descrita como Citrus
sinensis. Desta forma, as normas do Código Internacional de Nomenclatura
Botânica não permitem a sua identificação perfeita, uma vez que todas são
Citrus sinensis. Isto acontece com a maioria das plantas cultivadas. Contudo é
necessário que os técnicos e cientistas as identifiquem com precisão uma vez
que tais características são da maior importância para a sua exploração
econômica.
Por este motivo foi criado, por uma comissão composta de especialistas
nas áreas de botânica e horticultura, durante o XIII Congresso Internacional de
Horticultura realizado em Londres, em 1952, o Código Internacional de
Nomenclatura das Plantas Cultivadas, que foi modificado e ampliado
posteriormente (IAPT, 1969) e que estabeleceu regras para tornar mais precisa
a nomenclatura e a identificação das plantas cultivadas. Para que este objetivo
fosse atingido, algumas regras básicas foram estabelecidas: em primeiro lugar
foi criado o termo cultivar, formado por partes das palavras inglesas “cultivated
variety”, ou variedade cultivada, que se diferencia do termo variedade, conferido
pelo Código Internacional de Nomenclatura Botânica à categoria botânica que
vem logo abaixo de espécie. Segundo este código, variedade é definida como

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sendo um “grupo de plantas dentro de uma espécie, com distribuição geográfica
distinta, diferenciando-se da espécie por alguma característica especial e que,
quando multiplicada por processo sexual, produz descendentes com esta
característica”.
Diferentemente da variedade botânica, a variedade cultivada ou cultivar é
definida pelo Código Internacional de Nomenclatura das Plantas Cultivadas
como um “grupo de plantas cultivadas, claramente distinguíveis por qualquer
característica (morfológica, fisiológica, citológica, química, ou outra), e que,
quando reproduzidas por processo sexuado ou assexuado, retêm suas
características distintas“. Assim, aqueles tipos de laranjas antigamente
denominadas de “variedade Bahia”, “variedade lima”, etc., devem ser
tecnicamente denominadas “cultivar Bahia”, “cultivar lima”, etc. Neste caso,
embora possa ocorrer variabilidade genética nos descendentes de uma
laranjeira, quando multiplicada por sementes e, portanto, não pode ser uma
variedade botânica, é possível obter plantas geneticamente iguais à planta
original, se propagada vegetativamente como por enxertia, por exemplo.
Portanto, o termo cultivar (variedade cultivada) abrange desde as
espécies e as verdadeiras variedades botânicas e seus variantes genéticos, até
os híbridos naturais ou artificiais, desde que se possa obter, a partir deles,
descendentes geneticamente homogêneos, por meio de qualquer técnica de
propagação assexual.
O Código Internacional de Nomenclatura das Plantas Cultivadas não
estabeleceu normas para a nomeação das cultivares, mas recomenda que o
nome que for dado a uma cultivar seja respeitado para sempre e em todas as
partes do planeta, podendo, contudo haver variação na grafia ou pronúncia do
nome, em virtude de diferenças de alfabeto nos diferentes países. Além disto,
determinou que, o nome científico das plantas cultivadas seja aquele
estabelecido pelo Código Internacional de Nomenclatura Botânica, seguido do
nome da cultivar. Isto pode ser feito de duas formas diferentes. Por exemplo,
para a manga espada: Mangifera indica cv espada ou Mangifera indica ‘espada’;
para a laranja seleta: Citrus sinensis cv seleta ou Citrus sinensis ‘seleta’. Se tiver

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sido descrita uma variedade botânica dentro de uma espécie, como no caso da
nectarina (Prunus persica var nucipersica) e se dentro desta variedade houvesse
uma cultivar, aqui hipoteticamente denominada “pingo de mel”, a citação desta
cultivar seria: Prunus persica var nucipersica cv pingo de mel, ou então Prunus
persica var nucipersica ‘pingo de mel’.
Além destas normas básicas, outras foram estabelecidas, com o objetivo
de disciplinar a nomeação das plantas cultivadas e, embora isto ainda não tenha
solucionado completamente o problema da identificação destas plantas, o
respeito a estas normas torna esta identificação bem mais precisa do que antes.

1.3. Conceito de propagação de plantas:


A propagação de plantas é o processo por meio do qual uma planta dá
origem a novas plantas, com a finalidade de perpetuação da espécie.
A propagação de plantas tem sido uma atividade de fundamental
importância para a humanidade desde o início da civilização. A agricultura
iniciou-se há cerca de dez mil anos quando o homem aprendeu a plantar. Com a
evolução da civilização, o homem passou não só a cultivar espécies para a
produção de alimentos mas também aquelas que lhe forneciam fibras,
substâncias medicinais, etc.. A partir da grande diversidade de espécies
existentes foi possível selecionar plantas particularmente úteis ao homem e seus
animais. O progresso no desenvolvimento da agricultura envolveu a seleção de
plantas com características superiores e a reprodução destas espécies em larga
escala, surgindo assim, a técnica da propagação de plantas.
Propagação de plantas é a multiplicação por meios sexuados ou
assexuados que requer conhecimentos do crescimento, desenvolvimento e
morfogênese das plantas, podendo ser considerada, dentro deste contexto,
como a ciência da propagação. Requer ainda conhecimento da manipulação
mecânica, ambiental e química, além de habilidade manual de quem a pratica.
Isto pode ser considerado a arte da propagação. Assim, formação básica,
principalmente, em química, botânica, fisiologia e genética são de elevada
importância, uma vez que auxiliam o profissional no entendimento das

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operações que ele executa e no aprimoramento das mesmas além de capacitá-
lo a solucionar problemas que possam surgir. Outro aspecto importante é o
conhecimento das características culturais da espécie com a qual se trabalha e
os métodos adequados para sua propagação. De maneira geral, o método
selecionado para uma determinada espécie deve considerar o tipo de resposta
que se deseja e a situação existente. O progresso no melhoramento de plantas
teria pequeno significado e a maioria das espécies cultivadas seriam perdidas ou
teriam o seu potencial genético reduzido na ausência de métodos eficientes de
propagação que preservassem a superioridade genética dos tipos
desenvolvidos. Como conseqüência, tem ocorrido paralelamente aos métodos
de melhoramento o desenvolvimento de processos e técnicas de propagação de
plantas.
Foram desenvolvidos vários métodos que tem permitido propagar as mais
diversas espécies dentre frutíferas, ornamentais, arbóreas e outras. Muitos
destes métodos surgiram antes mesmo que a escrita fizesse parte das
características da humanidade. Os métodos da estaquia e enxertia têm sido
amplamente utilizados, uma vez que permitem a obtenção de bons resultados a
curto prazo e a um baixo custo, apesar de requererem certa habilidade manual.
Vários métodos como garfagem, borbulhia ou a simples divisão de rizomas e
tubérculos têm conquistado seus espaços na medida da exigência de
determinadas espécies para serem propagadas.
A invenção das casas de vegetação no século XIX e o uso de câmaras de
nebulização tornou factível a obtenção de mudas por meio de enraizamento de
folhas e estacas herbáceas e semi-lenhosas, assim como permitiu a expansão
do uso de viveiros de forma comercial. A descoberta dos reguladores de
crescimento, a partir de 1928, quando F. W. Went isolou com sucesso uma
auxina e mais tarde, em 1955, com a descoberta da cinetina (uma citocinina)
deu início a possibilidade do uso de métodos mais modernos de propagação de
plantas, através da cultura in vitro de células e tecidos vegetais, permitindo
benefícios aos agricultores, melhoristas, botânicos, biologistas moleculares,
bioquímicos, fitopatologistas, etc..

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A biotecnologia vegetal alcançou resultados práticos para a agricultura e
melhoramento de plantas, permitindo multiplicar em larga escala e curto espaço
de tempo, espécies de interesse comercial ou tipos genéticos superiores, como
é o caso de várias espécies ornamentais exóticas; muitas vezes permite
recuperar espécies em extinção, cujo único modo possível de multiplicação, com
manutenção das características genéticas, é a cultura de tecidos. Ao longo das
décadas, a propagação de plantas vem se tornando uma atividade bastante
promissora tanto no âmbito comercial quanto científico.

1.4. Métodos de propagação: seminífera e vegetativa:


Denomina-se propagação de plantas ao fenômeno por meio do qual uma
planta dá origem a novas plantas. Entre os métodos utilizados pelo homem para
propagar as plantas, alguns se originaram naturalmente, ao longo dos séculos
de evolução, como é o caso da propagação por sementes (propagação
seminífera ou generativa) e por estruturas vegetativas especializadas que se
originaram de modificações do caule ou da raiz de algumas espécies herbáceas
perenes (propagação vegetativa natural).
Outros métodos foram desenvolvidos pelo homem (propagação
vegetativa artificial), provavelmente devido à observação de fatos acidentais,
como a formação de raízes em pontos de ramos acidentalmente cobertos pelo
solo (mergulhia, estaquia), ou então a soldadura de raízes ou ramos
casualmente encostados e pressionados um contra o outro (encostia, enxertia).
Mais recentemente, surgiram as técnicas de propagação em laboratório
(propagação in vitro), como resultado do aumento das pesquisas e do
conhecimento científico.
A propagação in vitro a cada dia assume maior importância por permitir
novas alternativas de manipulação de plantas, tecidos e células vegetais em
laboratório e assim resolver problemas antes insolúveis pelas técnicas
convencionais, ou fazê-lo de maneira mais econômica ou mais rápida. A estes
métodos de propagação em laboratório se deu o nome genérico de “cultura de
tecidos vegetais”, “propagação in vitro” ou “micropropagação”, que engloba

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diferentes metodologias, por meio das quais se manipulam órgãos inteiros ou
segmentos de órgãos, tecidos ou células in vitro, para se regenerarem plantas
em larga escala, em pequenos espaços físicos e curto espaço de tempo. A
evolução da tecnologia de cultivo in vitro tanto de células vegetais quanto de
animais abre perspectivas fantásticas, não sendo ainda possível vislumbrar os
limites que poderão vir a ser atingidos.
Quando analisados do ponto de vista genético, os métodos de
propagação são reunidos em dois grupos, denominados de propagação sexual
ou generativa e assexual ou vegetativa. A propagação sexual é definida como “o
processo de propagação no qual as novas plantas se originam de embriões
formados pela união de gametas”. Isto significa que eles carregam metade da
carga genética de cada um dos progenitores. Contrariamente, a propagação
assexual é definida como “o processo de propagação no qual as novas plantas
se originam diretamente de células somáticas”, o que significa que elas
carregam uma carga genética exatamente igual à da planta matriz doadora do
propágulo.
A propagação sexual ou generativa, dá origem a embriões zigóticos,
podendo os descendentes ser geneticamente iguais ou diferentes da planta
mãe, já que os embriões se originam de um processo meiótico, que se inicia
com redução do número de cromossomos de cada progenitor à metade, seguido
de recombinação genética, pela união dos gametas assim formados. Desta
forma, no caso de espécies autógamas, os descendentes serão em princípio
geneticamente iguais à planta mãe; no caso de espécies alógamas, eles serão
diferentes.
A propagação assexual, vegetativa, ou clonagem, é aquela efetuada a
partir de estruturas vegetativas, sendo os descendentes, em princípio,
geneticamente iguais à planta mãe (matriz). Na propagação vegetativa, a nova
planta se origina através de um processo mitótico, no qual as células se
multiplicam e depois se diferenciam e se organizam, formando uma nova planta.
Este fenômeno é importante, na Ciência Agronômica, quando se visa obter

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descendentes semelhantes oriundos de uma planta matriz dotada de qualidades
superiores.
Quando se leva em consideração o tipo de estrutura empregado para se
obter a nova planta, os métodos de propagação se dividem em seminífero e
vegetativo. A propagação seminífera é aquela efetuada através do uso de
sementes e, a vegetativa, através do uso de estruturas vegetativas. Esta última
se divide em natural ou artificial. A propagação vegetativa natural baseia-se no
uso de estruturas vegetativas especializadas, como bulbo, rizoma, tubérculo,
estolhos, etc.. Na propagação vegetativa artificial utilizam-se estruturas
vegetativas não especializadas como raízes, ramos e folhas, através dos
processos de estaquia, mergulhia e enxertia para a propagação.
A propagação sexual é normalmente considerada sinônimo de
propagação pela semente, ou seminífera. Semelhantemente, a propagação
assexual é normalmente considerada sinônimo de propagação vegetativa.
Entretanto, quando se aprofunda mais detalhadamente nos aspectos biológicos
da reprodução vegetal, observa-se a existência de exceções a estes casos. Por
exemplo, no fenômeno da apogamia ou apomixia, que consiste na formação de
embriões diretamente a partir de células do saco embrionário e de tecidos
somáticos do óvulo, os embriões apomíticos podem se formar diretamente a
partir de um dos gametas, sem a ocorrência de fusão prévia entre eles; ou então
de células do endosperma, que é resultante da fusão de um dos gametas com
os dois núcleos polares; ou ainda do nucelo, que é um tecido somático como
qualquer outro tecido vegetativo. Todavia, todos os embriões das origens citadas
se formam no interior da semente, portanto um método seminífero, mas não
sexual. No que diz respeito às técnicas in vitro, situação semelhante acontece,
quando se regenera um embrião a partir da fusão prévia de duas células
somáticas provenientes de plantas diferentes. Neste caso, a metade da carga
genética do embrião provém de cada um dos progenitores como é a regra no
processo sexual. Todavia, esta metade corresponde à carga genética total de
cada um dos progenitores, já que foram utilizadas células somáticas para efetuar
a fusão. Quando se obtêm plantas haplóides in vitro, a partir de cultura de

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anteras, o embrião traz apenas a metade da carga genética paterna; portanto,
não pode ser um processo tipicamente sexual e nem tampouco tipicamente
vegetativo. São desnecessários outros argumentos para demonstrar que, à luz
dos conhecimentos atuais, nem sempre a propagação seminífera corresponde a
um processo sexual e que a propagação vegetativa nem sempre corresponde a
um processo tipicamente assexual.
Todavia, para efeito de simplificação e melhor entendimento, a
propagação seminífera ou generativa será aqui considerada como o método de
propagação realizado através da regra geral na semente, em que a nova planta
resulta de um processo tipicamente sexual, ou seja, é proveniente de um
embrião zigótico; quando se referir a embriões de outras origens, como o
embrião nucelar, que é a exceção mais freqüente na semente e importante para
a propagação comercial de certas espécies, isto será ressaltado. Da mesma
forma, a propagação vegetativa ou clonagem será considerada como o método
de propagação assexual no qual as novas plantas são regeneradas a partir de
estruturas vegetativas especializadas ou não; quando se referir ao processo
assexual que acontece na semente (embriões nucelares) isto será ressaltado.
Considera-se que a propagação seminífera ou generativa apresenta as
seguintes vantagens: maior longevidade das plantas, plantas de
desenvolvimento vigoroso, sistema radicular também vigoroso e profundo, além
de permitir a eliminação de viroses. Como desvantagens, em relação à
propagação vegetativa, citam-se o porte elevado das plantas, frutificação tardia,
produção irregular e de baixa qualidade nos primeiros anos, além de produzir
uma população heterogênea, no caso de plantas alógamas, e suas
conseqüências, como menor produtividade média e produto não padronizado.
A suposta vantagem de produzir plantas de maior longevidade, na
realidade não corresponde à realidade. Em primeiro lugar, isto acontece de
maneira marcante quando se compara com plantas com problema de
incompatibilidade na enxertia, ou então no caso de plantas originadas por
qualquer método assexual, a partir de matrizes portadoras de doenças
sistêmicas. Quando isto não acontece, as plantas provenientes de qualquer

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processo vegetativo são tão longevas quanto aquelas provenientes de
propagação seminífera. Quanto ao desenvolvimento mais vigoroso das plantas
provenientes de propagação seminífera, isto só constitui vantagem quando se
trata de plantas de pequeno porte, como as herbáceas em geral, e para as
plantas florestais e outras, onde se deseja maior volume de biomassa. Para as
plantas frutíferas lenhosas, esta suposta vantagem resulta justamente em uma
das maiores desvantagens da propagação seminífera, pois o porte elevado da
planta dificulta a realização da poda, desbaste e ensacamento de frutos, da
colheita e de outras operações culturais. Mesmo no caso de plantas florestais
que apresentam elevada taxa de alogamia, como o eucalipto, a propagação
seminífera tem dado lugar à estaquia, pelas vantagens que esta oferece.
Pelos motivos expostos, a propagação seminífera é muito usada para
plantas autógamas de pequeno porte, em trabalhos de limpeza clonal de certas
espécies, em trabalhos de melhoramento genético, para a obtenção de porta-
enxertos, ou ainda, como último recurso, para plantas que, embora apresentem
problemas de variabilidade genética, como é o caso do mamoeiro, não se
propagam comumente por processo assexual.
Como consequência, o uso da propagação seminífera, com finalidade
comercial, se restringe a plantas autógamas, como as espécies das grandes
culturas anuais, e para plantas com elevada taxa de poliembrionia, visando a
obtenção de porta-enxertos; nos trabalhos de melhoramento genético, como
técnica de limpeza clonal; e na exploração de plantas que não são propagadas
por outros métodos, como o mamoeiro e algumas outras.
A propagação vegetativa ou clonagem é o método de propagação de
plantas que utiliza partes vegetativas como propágulos. Este método de
propagação se baseia no princípio da totipotência das células, que é definida
como a capacidade que tem as células de seres multicelulares de dar origem,
por si só, a um indivíduo completo. Este princípio se baseia na premissa de que
as células de organismos multicelulares encerram no seu genoma toda a
informação genética necessária a isto. Graças à totipotência, é possível obter
um embrião a partir de uma única célula isolada e cultivada in vitro em meio de

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cultura apropriado; podem-se obter raízes ou ramos adventícios a partir de um
segmento de folha, de ramo ou de raiz, como na propagação por estaquia e
obter a união de partes de plantas, por meio da proliferação e entrelaçamento de
células no ponto de contato entre elas, como no caso da enxertia.
Embora se diga que na propagação vegetativa, os descendentes são,
geneticamente, idênticos à planta matriz, na prática não é raro o aparecimento
de indivíduos que diferem do restante da população por alguma característica, à
medida que as clonagens se sucedem, fenômeno denominado de variações
clonais, a ser discutido mais adiante.

Na produção comercial de mudas, uma das grandes vantagens da


propagação vegetativa ou clonagem, em relação à propagação seminífera, é a
manutenção das características genéticas da planta matriz nos descendentes, o
que resulta numa população com maior produtividade e produto homogêneo, de
melhor qualidade. Isto permite obter uma grande população de plantas com as
mesmas características, a partir de uma matriz de qualidade elevada, surgida
numa população heterogênea proveniente de propagação seminífera.
Outra vantagem de grande importância prática, principalmente para
plantas lenhosas, é a redução do período juvenil das plantas obtidas, já que a
propagação é feita a partir de partes vegetativas de plantas adultas, resultando
em plantas com um período juvenil muito curto, iniciando cedo o florescimento e
a produção. Como exemplo, plantas cítricas, mangueira e outras, originadas de
sementes só florescem após os seis ou sete anos de vida; quando originadas
pelo método vegetativo da enxertia, florescem já no primeiro ou segundo ano
após serem enxertadas.
Como vantagens adicionais, a propagação vegetativa consiste num meio
mais econômico e mais rápido, em certos casos, para se obter novas plantas;
permite também a propagação de plantas que não produzem sementes, como a
bananeira, lima Tahiti, laranja Bahia, figueira, algumas cultivares importantes de
videira; além de permitir a solução de alguns problemas culturais, como, por
exemplo, o cultivo de certa cultivar intolerante a alguma fonte de estresse no
solo, que pode ser suportada por um porta-enxerto adequado. Neste caso, as

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videiras constituem um bom exemplo, existindo para elas um grande número de
porta enxertos adaptados às mais diferentes condições de solo, além de
resistentes ao ataque da Filoxera, praga que ataca as raízes de Vitis vinifera,
levando as plantas à morte.
Outra vantagem citada para a propagação vegetativa é a possibilidade de
se realizar indexação de plantas para a presença de patógenos sistêmicos,
utilizando a enxertia para transmitir o patógeno, porventura existente na planta,
para outra planta, sensível a ele, a qual apresentará os sintomas.
O processo de propagação vegetativa apresenta também algumas
desvantagens, porém, todas elas são contornáveis tecnicamente. Uma delas é o
risco de se cultivarem áreas extensas com populações de plantas
geneticamente homogêneas, como acontece com os citros e as plantas
florestais no Brasil e em outras partes do mundo. O risco seria principalmente o
do aparecimento de uma praga ou doença devastadora, à qual toda a população
fosse sensível. O problema, entretanto, pode ser contornado, plantando-se uma
mistura de diversos clones, de modo a reduzir os riscos.
A desvantagem da transmissão de patógenos sistêmicos para os
descendentes, através de propágulos vegetativos, pode ser evitada, se a tarefa
for executada por um profissional qualificado, conhecedor dos princípios de
propagação de plantas e dos problemas das espécies com as quais trabalhe,
bem como das maneiras de contorná-los.
Outra desvantagem normalmente citada para a propagação vegetativa é
a formação de sistema radicular fasciculado, sem uma raiz pivotante, na
propagação por estaquia, o que o tornaria muito superficial, mais sujeito ao
efeito da seca e ancoramento deficiente de plantas de porte elevado como o
eucalipto. Contudo isto não corresponde à realidade, já que a estaquia de
eucalipto no Brasil já vem sendo efetuada há décadas e em larga escala, sem
que isto tenha sido constatado. Além disso, a maioria das espécies de palmeira
é propagada por semente e formam um sistema radicular fasciculado e bem
superficial, sem que isto seja problema, mesmo para espécies de porte elevado
como a palmeira imperial.

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Longevidade reduzida é outra desvantagem atribuída a plantas clonadas,
mas que não encontra apoio em dados experimentais. Mesmo que isto fosse
comprovado do ponto de vista biológico, do ponto de vista agronômico não teria
nenhuma importância, já que as culturas comerciais de plantas lenhosas em
geral não são exploradas por mais de 40-50 anos, devido tanto ao acúmulo de
pragas e doenças do sistema radicular ou da copa, quanto ao porte elevado que
atingem as plantas, resultando na necessidade de sua substituição. Além disso,
são conhecidos pomares principalmente de videira, propagados por enxertia, e
de figueira, propagados por estaquia, conduzidos com poda e tratamento
fitossanitário e nutricional adequados, que vêm sendo explorados
comercialmente por séculos.
Como as desvantagens da propagação vegetativa são contornáveis e as
vantagens são muito grandes em relação à propagação seminífera, a
propagação vegetativa é sempre preferida para a produção comercial de mudas.

1.8. Bibliografia
International Association for Plant Taxonomy. International Code of Nomenclature of
Cultivated Plants - 1969. Ultrecht, Netherlands, IAPT. 1969. 32 p.

16
2. Viveiricultura:
2.1. Considerações gerais sobre viveiricultura: conceito e importância.
2.2. Conceito e finalidade do viveiro.
2.3. Tipos de mudas produzidas no viveiro.
2.4. Localização do viveiro.
2.5. Preparação, plantio e tratos culturais das mudas.
2.6. Poda das plantas de viveiro.
2.7. Instalações usadas em propagação de plantas.
2.8. Recipientes e substratos.
2.9. Embalagem, transporte e comercialização.
2.10. Fatores do ambiente e seu controle no viveiro.

2.1. Considerações gerais sobre viveiricultura: conceito e importância.


A Viveiricultura é uma atividade ligada diretamente às demais áreas de
conhecimento da Agricultura, por ser a que se dedica à propagação de plantas,
qualquer que seja o destino delas. A muda constitui uma peça fundamental em
qualquer exploração agrícola e a sua qualidade depende o sucesso do
empreendimento. Por isso a viveiricultura é uma atividade extremamente
importante e altamente especializada. Quando se trata de propagação de
plantas ornamentais a viveiricultura chega a graus elevados de sofisticação onde
há um rigoroso controle de qualidade em termos de simetria da planta, vigor,
ausência de manchas e outras imperfeições além do controle da época em que
a planta ornamental chega florida ao consumidor. Esses fatores são
fundamentais na agregação de valor ao produto. No caso de plantas frutíferas, é
evidente também a necessidade de conhecimentos especializados no que diz
respeito à escolha adequada de porta-enxerto para uma determinada situação,
seleção e manutenção adequada de plantas-matrizes e de outros artifícios
utilizados para contornar problemas fitossanitários que afetam determinadas
espécies, além de conhecimentos gerais na área de Fitotecnia. Por este motivo,
a atividade de propagação de plantas em diversos países é praticada por
profissionais com elevada qualificação e vem experimentando uma fase de
profissionalização crescente no Brasil, principalmente por meio da iniciativa
privada. Somente nos últimos anos as universidades e entidades de pesquisa
brasileiras têm dedicado atenção especial ao desenvolvimento de tecnologias
modernas adaptadas às condições do país e à produção de mudas em larga

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escala, principalmente para plantas tropicais, bem como à formação de
profissionais especializados nesta área, onde a demanda é bastante grande.
Para melhor compreensão da importância da viveiricultura faz-se
necessário visualizar a sua localização no contexto mais amplo da Agricultura.
Como o reino vegetal é formado por uma grande diversidade de tipos de plantas,
com características as mais diversas e que podem ser utilizadas
economicamente pelo homem das mais diferentes maneiras, elas foram
reunidas em grupos, de acordo com suas características comuns, para tornar
possível o seu estudo, cultivo e utilização. Devido a essa necessidade, a ciência
da agricultura se divide em vários ramos, cada um cuidando do estudo e
exploração econômica de certo grupo de espécies, reunidas em função de
características comuns. Desse modo, a Silvicultura, se dedica ao estudo das
espécies florestais, principalmente as plantas produtoras de madeira e celulose
e aos métodos para regenerar os povoamentos florestais para atender às
necessidades do mercado ou para o repovoamento de áreas degradadas; a
Agrostologia estuda as plantas forrageiras; as plantas cultivadas
extensivamente, não importando como serão utilizadas, são estudadas pelo
ramo denominado Grandes Culturas que muitas vezes é utilizado com sinônimo
de agricultura. A Horticultura difere do ramo denominado Grandes Culturas
principalmente por cuidar de plantas que exigem um tratamento intensivo,
entendendo-se como tal as operações de produção de mudas em sementeira,
em leitos de enraizamento, em recipientes ou em hidroponia; a seleção e
repicagem para viveiro; a enxertia; a poda; a cultura sob estruturas especiais; o
desbaste e ensacamento de frutos, dentre outras. As plantas hortícolas exigem
um tratamento muitas vezes esmerado e individual, ou seja, cada planta é vista,
em certas ocasiões, como um elemento à parte do todo e recebe tratamento
personalizado. É o caso das hortaliças, fruteiras e plantas ornamentais. Nas
Grandes Culturas, as plantas são vistas como um todo, ou seja, em geral as
sementes são lançadas coletivamente diretamente no campo, os tratos culturais
como adubação e pulverização são efetuados sem se olhar cada planta

18
individualmente e as plantas são colhidas coletivamente. É o caso do arroz,
milho, feijão, soja, trigo dentre várias outras.
Neste contexto, a viveiricultura é a parte da agricultura que cuida da
exploração técnica, racional e econômica de mudas, ou seja, dedica-se a
produção de mudas de plantas em geral.
O homem vem constatando cada vez mais o valor da horticultura para
seu bem estar, e, por isso, maior tem sido o espaço conquistado pela
viveiricultura, sendo esta a principal fonte econômica em muitas regiões do país,
principalmente onde a horticultura já é explorada em grandes áreas. A
viveiricutura é uma das atividades agrícolas que melhor se ajusta às pequenas
propriedades rurais podendo ser desenvolvida por pequenos grupos familiares.
Em um período de tempo relativamente curto é possível produzir milhares de
mudas por hectare, dependendo da espécie vegetal explorada e dos demais
fatores de produção.
A viveiricultura pode constituir-se em uma alternativa concreta de trabalho
para engenheiros agrônomos que pretendam estabelecer-se como autônomos,
dedicando-se à produção comercial de mudas de plantas frutíferas, de plantas
olerícolas, de plantas ornamentais, ainda que para isso tenham que arrendar
uma possessão de terreno. Nesse sentido, estes profissionais poderão criar,
paralelamente, uma firma de planejamento, visando a implantação de pomares,
jardins e hortos florestais.
No Brasil, para ocupar o espaço que lhe está reservado e a importância
que lhe é de direito, a viveiricultura necessita libertar-se do empirismo das
técnicas de propagação ainda hoje adotadas. A viveiricultura moderna emprega
técnicas tais como o cultivo in vitro, a fertirrigação e a produção de mudas
diretamente em recipientes e em instalações com maior controle dos fatores
ambientais e bióticos. A incorporação destas técnicas tem dado uma nova
dimensão à viveiricultura nacional, tornando-a mais competitiva e mais lucrativa,
com reflexo direto na melhoria qualitativa e quantitativa da horticultura brasileira.

2.2. Conceito e finalidade do viveiro:

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É a área de terreno em que propágulos: sementes, plântulas oriundas do
cultivo in vitro, estacas, mudas provindas do processo de enraizamento
adventício e estruturas de propagação vegetativa natural são colocados para
crescer e desenvolver convenientemente até alcançarem um padrão
arquitetônico e uma idade mínima para a comercialização ou para serem
levados para o campo definitivo, não importando qual seja o processo de
propagação ou o sistema de produção. Costuma-se dizer que viveiro é a área de
terreno destinada à criação ou à produção de mudas. Como área para produção
de mudas, o viveiro contempla aquelas espécies vegetais em que os propágulos
apresentam um desenvolvimento natural adequado, não exigindo interferência
muito grande do homem no processo de formação da muda. Já o viveiro como
área de criação de mudas se refere àquelas plantas que precisam ter sua
conformação e seu porte disciplinados e orientados com forte interferência do
viveiricultor. Por exemplo, mudas de plantas frutíferas que se destinam à
formação de pomares, devem apresentar seus elementos vegetativos bem
distribuídos, com porte e conformação adequados. Para isto, elas precisam ser
trabalhadas ou criadas previamente no viveiro. Este tema é tão importante, que
o Ministério da Agricultura estabelece normas, padrões e procedimentos para a
produção de mudas para aquelas espécies de expressão agronômica para uma
região ou Estado. A razão disto, é que o valor qualitativo e quantitativo de uma
cultura é, em grande medida, reflexo da qualidade da muda. Pelo padrão
qualitativo desta, pode-se, inclusive, prever a longevidade e produtividade futura
da planta.
As características gerais de um viveiro são semelhantes para as plantas
frutíferas, ornamentais, olerícolas e florestais.
Ao instalar o viveiro, o viveiricultor deve verificar a finalidade do mesmo
pois toda a organização ou atividade econômica precisa ser bem planejada e
estruturada. Nessa organização, deve-se saber previamente o destino final das
mudas a serem produzidas, ou seja, se visam atender apenas às necessidades
próprias do viveiricultor - por exemplo, para instalar seu próprio pomar, parque
florestal ou jardim - ou se tem finalidade estritamente comercial. Neste caso,

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deve-se obter informações sobre a oferta e a demanda de mudas na região,
onde a análise econômica deve deixar bem clara a relação custo-benefício.
Qualquer que seja a finalidade, o viveiricultor precisa estudar,
criteriosamente, quais as espécies e, ou cultivares a serem exploradas visando
principalmente as necessidades regionais visto que o transporte é um fator que
eleva significativamente o custo de produção. Tendo finalidade comercial, o
viveiricultor terá necessidade de montar uma firma para produção e
comercialização de mudas e registrá-la junto ao Ministério da Agricultura e
Abastecimento.

2.3. Tipos de mudas produzidas no viveiro:


2.3.1. Mudas de plantas frutíferas:
Naturalmente que a espécie e, ou cultivar e a quantidade de mudas
produzidas em uma região dependerá da importância cultural local desta ou
daquela espécie. Todavia, a nível nacional, dentre todas as espécies de
frutíferas, a maior demanda é pela muda cítrica. A expansão e diversificação da
fruticultura brasileira têm estimulado um crescente aumento de produção e de
demanda por mudas de outras frutíferas tais como mangueira, abacateiro,
goiabeira, bananeira, videira, aceroleira, gravioleira, etc. Outro fator que muito
tem contribuído para essa expansão é a exigência do pomicultor em adquirir
mudas comprovadamente isentas de fitoparasitas e oriundas da propagação
vegetativa.
2.3.2. Mudas de plantas ornamentais:
A viveiricultura para plantas ornamentais tem alcançado extraordinário
crescimento nos últimos anos. Sem dúvida, trata-se de uma atividade agrícola
com grande potencial econômico. Além disto, geralmente atende aos
consumidores de maior poder aquisitivo. As plantas ornamentais cujas mudas
têm alcançado real destaque são:
Árvore de natal: O artificialismo paisagístico que tem caracterizado
principalmente os grandes centros urbanos vem, sucessivamente, aumentando
as perspectivas comerciais para esse tipo de muda. Na Europa e nos Estados

21
Unidos, por exemplo, dado seu alto grau de desenvolvimento, esta exploração é
altamente rentável. Sua desvantagem é a comercialização ocorrer apenas em
um curto período de tempo, ou seja, na época do Natal.
Grama: A seleção e produção de melhores cultivares de grama
constituem um excelente negócio, dada a grande procura desta planta para
jardins, parques e orlas viárias. Em regiões mais adiantadas e tecnificadas, os
viveiricultores já possuem máquinas apropriadas para a retirada mecânica da
grama sob forma de tapetes o que facilita a operação de plantio da mesma no
local de destino. Para exploração desta planta o viveiricultor precisa se
preocupar com a reconstituição do solo, em face de suas mudas levarem
consigo uma camada de mais ou menos 5 cm de solo (do melhor solo).
Orquídea: Constitui-se, também, em um ótimo negócio desde que se
tenha boas matrízes. O comércio de orquídeas atende a um público seleto e
especial. Por ser resistente, a muda pode ser enviada ao comprador, inclusive,
via correio.
Rosa: Também bastante demandada, a muda de roseira pode ser
produzida pelos métodos tradicionais de propagação, inclusive, enxertia de
mesa.
Além destas, existe uma gama vastíssima de plantas ornamentais com
elevado valor comercial.
2.3.3. Mudas de essências florestais:
Os constantes desmatamentos, bem como a destruição de florestas, cada
vez mais, vêm exigir o restabelecimento ou recuperação da flora. Nesse
contexto, a produção de mudas de espécies florestais passou a ser uma opção
agronômica rentábil e promissora. Além disso diversas espécies florestais têm
grande importância econômica como eucalipto, Pinus, etc.
2.3.4. Mudas especiais:
São geralmente mudas de espécies vegetais altamente vulneráveis aos
ataques de patógenos sistêmicos, notadamente vírus, tais como batata inglesa e
morangueiro, que precisam passar periodicamente por limpeza clonal para
eliminação das respectivas viroses e depois multiplicadas vegetativamente, sob

22
telado ou casa de vegetação, à prova de inseto (vetor), para em seguida serem
comercializadas para os plantios extensivos. A comercialização deste tipo de
muda é um bom negócio, visto que o agricultor precisa anualmente adquirir
material propagativo isento de vírus, micoplasma ou bactéria.

2.4. Localização do viveiro:


Quanto a localização do viveiro, deve-se levar em consideração diversos
fatores, dentre os quais:
A. Ponto de venda:
É conveniente efetuar a venda, preferencialmente, na própria região onde
está estabelecido o viveiro, já que o transporte é um sério fator a elevar o custo
final de produção da muda. Da mesma forma, se a finalidade da muda for
atender as necessidades próprias do agricultor, o viveiro deverá se localizar o
mais próximo possível do futuro pomar, horto florestal ou jardim.
B. Vias de acesso:
O viveiro deve se localizar na propriedade, em uma área de terreno cujas
vias de acesso não sejam cortadas por áreas pantanosas ou excessivamente
lamacentas no período chuvoso. O local de instalação do viveiro deve ser tal que
venha facilitar o escoamento da muda, tornando o transporte mais rápido,
mesmo sendo a época chuvosa, pois é exatamente aí que se verifica uma maior
demanda por mudas.
C. Tamanho de área:
O tamanho global do terreno ocupado pelo viveiro vai depender de certos
fatores, tais como:
Tamanho da área do viveiro propriamente dito. Vai depender da quantidade de
mudas a produzir. Para calcular esta quantidade de mudas, é preciso definir
previamente o espaçamento a ser utilizado. Os espaçamentos dependem da
espécie vegetal, das condições edafoclimáticas, do sistema de produção e do
nível de tecnologia adotado.
Tamanho da área do terreno destinado à sementeira ou aos leitos de
enraizamento de estaca.

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Área do terreno necessária à implantação dos pomares de plantas matrizes, as
quais irão fornecer materiais propagativos: sementes para obtenção de
hipobiotos; borbulhas e garfos para enxertia; ramos ou estacas para
enraizamento adventício; explante para cultivos in vitro, etc.
Área de terreno necessária à instalação de ripado, telado, casas de vegetação,
câmaras de nebulização, etc.
Área de terreno necessária à instalação de: escritório, almoxarifado, abrigo de
maquinarias e implementos agrícolas, instalações para armazenar, misturar
substratos e encher recipientes.
Área de terreno destinada à instalação de um laboratório de cultura de tecidos
vegetais. Quando a atividade visar a exploração de plantas, cujas mudas
venham alcançar preços compensadores. Esta técnica vem sendo empregada
com sucesso para plantas ornamentais, frutíferas etc. de grande importância
como abacaxizeiro, morangueiro, batata inglesa, bananeira, orquídeas, violetas,
dentre outras.
Conhecendo previamente as características edafoclimáticas, o sistema de
produção e o nível de tecnologia que se vai adotar, torna-se fácil dimensionar a
área do viveiro propriamente dito. Também é fácil dimensionar a área para
muitas das outras instalações a serem usadas na viveiricultura. Por exemplo, no
dimensionamento da área do telado em um espaço de tempo de 15 dias (é o
período mínimo recomendado para aclimatização ou cura da muda), é preciso
saber qual a área ocupada por cada muda, sem se esquecer de considerar as
passarelas internas para efetuar os tratos culturais das mudas.
Por outro lado, o dimensionamento da área necessária para sementeira já
é mais complexo e requer estudos mais pormenorizados para cada espécie
vegetal.
D. Natureza física e química do terreno:
Essas características só serão importantes se as mudas forem
produzidas diretamente no solo. A tendência mundial é o uso de substratos e a
produção de mudas em recipientes. As características físicas do substrato
deverão ser rigorosamente observadas. Com relação a sua composição

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química, não há tanto problema pois normalmente é feita adubação
complementar.
E. Topografia:
Os terrenos planos são excelentes para a viveiricultura por facilitar os
tratos culturais e o tráfego e trânsito de veículos e maquinarias no viveiro.
F. Disponibilidade de água:
O viveiro deve se localizar próximo a uma fonte de água de boa
qualidade.
G. Aspectos fitossanitários:
Deve-se evitar instalação de viveiro em áreas que apresentem sérios
problemas de doenças e/ou pragas, pois muitos fitoparasitas foram
disseminados por meio de mudas contaminadas, para regiões ou áreas até
então idôneas. Por isso a tendência atual de produção de mudas suspensas, ou
seja, em bancadas, sem contato com o solo.
Também por fatores ligados à fitossanidade, para evitar que fitoparasitas
ataquem as plantas no viveiro.
H. Ervas daninhas de difícil extirpação:
Só serão problema se as mudas forem produzidas diretamente no solo, o
que não é recomendado em viveiros comerciais.
I. Obstáculos Climáticos:
Dentre os fatores climáticos a observar, é preciso evitar locais em que os
ventos são fortes e frios ou, usar estruturas de proteção adequadas e quebra-
ventos. Deve-se preferir locais bem ensolarados.
J. Proximidade de Estradas:
É importante evitar que o viveiro fique próximo a estradas não
pavimentadas para evitar contaminações fitoparasíticas e uma possível
deposição de poeira na parte aérea da planta o que, por certo, prejudicará as
atividades biológicas normais da planta e lhe dará um mal aspecto, de modo a
depreciar seu valor comercial.
K. Necessidade de Cercar o Viveiro:

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É importante cercar a área do viveiro, de tal modo a evitar a presença de
animais e dificultar o acesso de pessoas estranhas ao empreendimento.
L. Disponibilidade de mão-de-obra:
Tão importante quanto os fatores já mencionados, é a disponibilidade de
mão-de-obra no viveiro, pois de sua habilidade dependerá muito o êxito do
empreendimento.
Como discutido acima é vital que o viveiricultor analise criteriosa e
meticulosamente todos os fatores inerentes a escolha do local de instalação do
viveiro. O esquecimento de um fator, por menor que possa parecer, poderá
implicar em insucesso no empreendimento como um todo.

2.5. Preparação, plantio e tratos culturais das mudas:


A. Preparo do viveiro:
Limpeza da área e construção das estruturas: telados, casas de
vegetação, escritório, laboratório de cultivo in vitro, etc.
B. Plantio do viveiro:
No viveiro, pode-se plantar sementes, estacas, mudas provenientes do
leito de enraizamento, mudas provenientes do leito de sementeira, estruturas de
propagação vegetativa natural (bulbos, rizomas, tubérculos, raízes tuberosas e
estolhos) e mudas provenientes do cultivo in vitro.
C. Tratos culturais no viveiro:
Se entende por tratos culturais do viveiro, como sendo o conjunto de
operações agriculturais necessárias à condução do viveiro, o qual somado ao
emprego de material propagativo de qualidades genéticas e fitossanitárias
superiores, irá proporcionar um melhor e mais rápido desenvolvimento dos
propágulos no viveiro e concorrer para a formação de mudas com padrão
superior de qualidade.
Os principais tratos culturais a serem observados são: adubação,
irrigação, controle fitossanitário (pragas e doenças), desbrotas, toaletes, podas
de formação das mudas.

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As desbrotas são operações efetuadas com bastante freqüência no
viveiro e visam eliminar brotações laterais. Geralmente, os propágulos, quando
levados para o viveiro, são induzidos à brotação. Além disso, plantas como o
abacateiro, apresentam o fenômeno do policaulismo, enquanto outras, como os
citros e a mangueira, o fenômeno da poliembrionia, nas quais se deve eliminar
as plântulas menores e menos vigorosas, deixando no viveiro apenas uma,
aquela mais vigorosa.
Para aquelas mudas oriundas do processo de enraizamento adventício
por estaquia ou mergulhia e produzidas no viveiro, isto é, que não precisam da
interferência do homem para formar sua arquitetura, a eliminação dos ramos
laterais devem se dar até a altura de 50 a 70 cm. Para aquelas mudas
propagadas pelo mesmo processo anterior, mas criadas no viveiro, isto é, que
necessitam da interferência do homem para uma formação adequada de sua
arquitetura, as desbrotas devem ser realizadas até que o fuste principal e único
desenvolva, de modo a atingir de 0,7 a 1,0 m de altura, época em que se vai
efetuar a primeira poda de formação. Para aquelas mudas que serão criadas e
cujo processo propagativo seja a enxertia, as operações de desbrotas são
bastante freqüentes no viveiro, de modo a eliminar as brotações laterais tanto no
hipobioto quanto no epibioto. Algumas espécies, como os citros, necessitam
dessa desbrota. Sendo assim, uma prática recomendável é fazer desbrotas,
tantas quantas necessárias, no sentido de promover o desenvolvimento de um
fuste único e de forma mais rápida, de modo a antecipar a operação de enxertia
e acelerar os processos de formação da muda cítrica.
As desbrotas devem ser feitas manualmente, tendo os brotos, no máximo,
poucos centímetros de comprimento, por dispensar o uso de canivetes ou
tesoura de poda.
A "Toilet" ou toalete é uma operação precedente à enxertia, que visa
remover folhas, espinhos e brotações presentes no hipobioto de modo a facilitar
a realização da enxertia. Vale ressaltar que em algumas plantas enxertadas por
garfagem no topo, a permanência das folhas no hipobioto parece contribuir para
se alcançar maior índice de pegamento do enxerto.

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Entende-se por formação das mudas ao conjunto das operações
efetuadas no viveiro com a finalidade de orientar o crescimento e o
desenvolvimento das mudas e lhes dar formas convenientes, isto é, formar uma
arquitetura adequada, com uma boa distribuição dos elementos vegetativos, de
modo a proporcionar, futuramente, maior longevidade e produtividade da planta.
O chamado grupo das plantas perenifólias é geralmente considerado
sensível ou pouco tolerante à poda, razão pela qual deve haver o mínimo
possível de intervenção do homem, onde o papel deste deve visar tão somente
a formação das mudas, uma vez que elas apresentam, nesse processo de
formação, uma adequada e conveniente distribuição de seus elementos
vegetativos. Por outro lado, o grupo das plantas caducifólias é, geralmente,
considerado resistente ou bastante tolerante aos efeitos da poda. Dada a
caducidade foliar periódica, estas plantas esgalham abundantemente e tendem
a crescer verticalmente, razão pela qual o homem precisa intervir ativa e
intensamente no sentido de auxiliar na formação de suas mudas para que estas
tenham uma arquitetura adequada. Portanto, dependendo do estatus vegetativo
das plantas, tem-se dois grupos, quanto a formação de suas mudas:
a. plantas de formação natural: representadas normalmente pelas
plantas tropicais e parte das subtropicais. São as plantas
perenifólias.
b. planta de formação artificial: representadas em geral pelas plantas
temperadas e parte das subtropicais. São as plantas caducifólias.
Existem plantas como os citros (consideradas subtropicais) que, embora
de folhagem permanente, são tolerantes às podas sendo englobadas no grupo
de formação artificial. A diferença é que, para os citros, as podas finais de
formação terminam no viveiro, quando da segunda poda de formação realizada
momentos antes da retirada da muda no viveiro; e, para as plantas de folhagem
caduca, terminam alguns anos após, no local definitivo: pomar, jardim ou horto
florestal.

2.6. Poda das plantas de viveiro:

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Dentre os tratamentos intensivos que as plantas hortícolas recebem, um
deles é a poda, que já começa no viveiro e geralmente prossegue no local
definitivo, às vezes por toda a vida da planta. Deve, portanto, o viveirista,
conhecer bem esta operação, para executá-la de maneira correta durante a
produção da muda, bem como para tornar-se apto a orientar a condução das
plantas na fase posterior, se necessário, uma vez que dela dependerá o sucesso
na exploração de certas espécies.
A poda é definida como sendo “a operação que consiste em se eliminar
partes da planta, de modo a lhe conferir forma adequada ou regularizar a
produção e melhorar a qualidade do produto”. Quando o objetivo da poda é
conferir forma adequada à planta ela é considerada uma arte e procura orientar
o crescimento da planta de modo a formar um esqueleto mecanicamente
resistente, além de permitir bom arejamento e penetração de luz, bem como
reduzir o crescimento em altura, ou então adaptar a planta a determinado tipo de
suporte, ou ainda conferir a uma planta ornamental uma forma esteticamente
agradável. Quanto ao objetivo de regularizar a produção e melhorar a qualidade
do produto, a poda procura obter uma redução do crescimento vegetativo em
benefício do reprodutivo, dentro dos limites do potencial genético da planta e de
maneira equilibrada, de modo a obter produtividade média máxima e máxima
qualidade do produto a longo prazo. Se a operação resultar num crescimento
desequilibrado neste sentido, os resultados iniciais podem vir a ser favoráveis,
mas a longo prazo os resultados poderão ser desastrosos, devido ao
depauperamento progressivo das reservas da planta. Desta forma, para se
entender melhor o funcionamento desta técnica e utilizá-la corretamente de
maneira a obter os melhores resultados, é preciso conhecer alguns princípios
gerais envolvidos no fenômeno.

2.6.1. Princípios gerais da poda:


Como regra geral, as plantas tropicais não necessitam ser podadas para
produzirem normalmente durante toda a sua vida, podendo ser até prejudicial.
Nos casos em que a poda é praticada em algumas dessas plantas, isto acontece

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não porque elas necessitem da operação; em geral o objetivo é outro, como no
caso da goiabeira, cujo objetivo é estimular a frutificação fora de época; ou então
para manter o crescimento dos ramos da planta dentro de certos limites, como
no caso do guaranazeiro. No caso da goiabeira, há dados experimentais
mostrando que a poda causa sempre queda de produção: quanto mais distante
do mês de julho for feita a poda, maior será esta queda. E é muito provável que
isto aconteça também com outras plantas tropicais. Por outro lado, no caso das
plantas de clima temperado e muitas sub-tropicais, principalmente entre aquelas
que apresentam um período de repouso vegetativo hibernal, a poda de
frutificação é quase sempre obrigatória. Estas plantas apresentam um
comportamento comum quanto à sua resposta ao ambiente, que pode explicar
em parte por que elas se beneficiam da poda sem sofrerem os efeitos adversos
da eliminação de ramos e folhas. É que, dentre as modificações bioquímicas e
fisiológicas profundas que ocorrem nestas plantas durante o outono, quando
elas se preparam para suportar o frio hibernal, uma delas é o acúmulo de
reservas energéticas para uso na fase de crescimento que se iniciará na
primavera seguinte. E estas reservas, principalmente sob a forma de amido, são
armazenadas ou nas raízes ou nos ramos grossos e no tronco, não sendo
perdidas por ocasião da poda, já que a maioria dos ramos eliminados nesta
operação são os mais finos.
Dentre os princípios gerais sobre os quais se baseia a poda, destacam-se
os seguintes:
- Em algumas espécies, os carboidratos se acumulam principalmente na
parte aérea; em outras este acúmulo se verifica nas raízes;
- As funções vegetativa e reprodutiva são antagônicas;
- A natureza da poda depende dos hábitos de vegetação e florescimento
da planta;
- Ramos horizontais tendem a florescer mais intensamente do que ramos
verticais;
- A intensidade do florescimento depende do estado nutricional da planta;

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- Em algumas espécies o florescimento ocorre sobre os ramos do ano;
em outras, o florescimento ocorre sobre os mesmos ramos, durante toda a sua
vida;
- Em algumas espécies o florescimento ocorre no inverno, sobre ramos
do ano anterior e já maduros e em repouso vegetativo;
- Em algumas espécies o florescimento ocorre durante todo o período de
crescimento do ramo.

2.6.2. Hábitos de vegetação e florescimento:


Os pontos de crescimento da parte aérea da planta são estruturas
formadas pelo meristema apical envolvido por brácteas denominadas escamas;
ao conjunto se denomina gema vegetativa. Estas se localizam nas extremidades
dos ramos e nas axilas das folhas. Quando a planta é induzida a florescer,
surgem gemas modificadas, denominadas gemas floríferas, em muitos destes
pontos de crescimento.
As gemas vegetativas podem dar origem a ramos vegetativos,
reprodutivos, ou mistos, dependendo da espécie. O ramo vegetativo produz
apenas folhas e gemas vegetativas. O ramo reprodutivo é um tipo de ramo
especializado, de entrenós curtos, sobre o qual se formam folhas e gemas
floríferas, denominado “esporão”. É um ramo característico das rosáceas e se
forma nas axilas de folhas de ramos vegetativos. O ramo misto forma, além de
folhas e gemas vegetativas, também gemas floríferas. A figueira é um exemplo
típico desta classe. A laranjeira e a mangueira são exemplos de plantas cujos
ramos são vegetativos durante o período inicial de sua formação; após alguns
meses ocorre a indução floral e eles passam a ramos mistos. No caso da
laranjeira, ocorre formação de gemas vegetativas na extremidade apical desses
ramos e ramos mistos em gemas axilares. A videira e a goiabeira são exemplos
de plantas cujos ramos são apenas vegetativos inicialmente; após a formação
de uns poucos nós, elas emitem gemas floríferas axilares em dois ou três deles;
depois continuam até o final do ciclo apenas vegetativamente. Os ramos do
pessegueiro crescem apenas vegetativamente durante o ano; as gemas

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floríferas se formam nos nós destes ramos já em repouso, durante o inverno. Os
ramos vegetativos da macieira formam ramos reprodutivos a partir de gemas
axilares, durante o período de crescimento do ano; após a entrada da planta em
repouso, no inverno, as gemas floríferas se formam sobre os ramos
reprodutivos.
A gema florífera pode dar origem a uma flor ou uma inflorescência sobre
a qual se formarão as flores. A posição das flores ao longo do ramo é variável
com a espécie e até mesmo com a cultivar. Ela pode ser terminal, como no
marmeleiro, ou lateral, como no pessegueiro. Quando lateral, as flores podem se
distribuir na porção distal, mediana ou proximal do ramo, dependendo da
espécie ou da variedade.

2.6.3. Efeitos da poda:


Como a poda consiste na eliminação de ramos da planta e, portanto,
também de folhas, ela resulta basicamente numa debilitação temporária da
mesma. Esta debilitação será tanto maior, quanto mais intensa for a poda, ou
seja, quanto maior for a quantidade de folhas eliminadas e também quanto mais
ela contrariar a natureza da planta.Todavia, se efetuada em harmonia com as
características biológicas da planta, de maneira a não haver perda substancial
de reservas da mesma, a recuperação será rápida e sem maiores
conseqüências. Contudo, sabe-se que a planta podada sistematicamente terá
sempre um porte mais reduzido do que outra que não tenha sido submetida a
este tipo de tratamento, não significando, porém, que esta redução do porte
signifique uma redução do potencial produtivo da planta. O que acontece é que
a poda, quando efetuada de maneira tecnicamente correta, regulariza o
crescimento da planta, estabelecendo uma harmonia entre o crescimento
vegetativo e reprodutivo, de maneira que a energia gasta pela planta na
formação de partes vegetativas seja apenas suficiente para formar novos ramos
vigorosos e capazes de sustentar uma nova carga de frutos de qualidade. Isto
significa refrear o crescimento vegetativo em favor do reprodutivo, de maneira

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equilibrada. Como conseqüência, a planta vai crescer menos, mas produzirá o
máximo que seu potencial genético permite.
Em vista disso, a poda produz os seguintes resultados: a) redução do
porte da planta e do sistema radicular; b) redução do vigor do tronco e dos
ramos podados; c) alteração do vigor dos novos ramos; d) retardamento do
início de frutificação de plantas juvenis; e) alteração do número e tamanho dos
frutos; f) regularização das safras; g) produção média mais elevada.

2.6.4. Tipos de poda:


A poda pode ser executada de diferentes maneiras, de acordo com o seu
objetivo, podendo, assim, ser classificada de diversas formas: quanto à
porcentagem do ramo a ser eliminada, quanto à porcentagem da copa a ser
eliminada e quanto à sua finalidade.
Quanto à porcentagem do ramo a ser eliminada, a poda se classifica em:
poda de desbaste - quando visa eliminar totalmente o ramo pela base (100%
dele); e poda de rebaixamento - quando visa apenas reduzir o comprimento do
ramo (ou rebaixar o ramo), eliminando apenas parte dele. Esta pode ser: longa -
quando se elimina 25% ou menos do comprimento total do ramo; média -
quando se elimina entre 25% e 50% do comprimento do ramo; e curta - quando
se elimina mais de 50% do ramo.
Quanto à porcentagem da copa a ser eliminada, a poda pode ser: leve -
quando se elimina 25% ou menos da copa; moderada - quando se elimina entre
25% e 50% da copa; e intensa ou drástica - quando se elimina mais de 50% da
copa.
Quanto à finalidade a que se destina, a poda pode ser: de formação -
quando objetiva conferir forma adequada à planta; de limpeza - quando o
objetivo é eliminar ramos indesejáveis; de produção - quando objetiva
estabelecer um equilíbrio entre o crescimento vegetativo e o reprodutivo, de
modo a obter máxima produção (quando efetuada em fruteiras, esta poda se
denomina de frutificação); e poda de recuperação ou rejuvenescimento, quando
o objetivo é revigorar plantas velhas ou enfraquecidas por manejo inadequado.

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A poda de formação de muitas espécies se inicia no viveiro, procurando-
se formar um arcabouço com três ou quatro ramos saindo a diferentes alturas,
na extremidade de uma haste central de comprimento que varia com o destino
que se dará à planta. Para fruteiras em geral, os ramos do arcabouço da copa
devem ser formados a uma altura de cerca de 70 cm acima do solo, de modo a
formar uma copa não muito alta e com ramos bem distribuídos em torno da
haste principal, de modo a formar uma copa mecanicamente resistente. No caso
de plantas destinadas à arborização de ruas e praças, o comprimento da haste
principal deve ser de 1,70 m, de modo que os ramos do arcabouço da copa se
desenvolvam a uma altura superior à de uma pessoa adulta, para evitar
acidentes aos transeuntes. Depois de plantadas no local definitivo, algumas
espécies devem continuar a receber poda de formação anualmente, de modo a
forçar um crescimento dos ramos mais no sentido horizontal, em detrimento do
crescimento em altura. Isto visa manter os ramos crescendo a uma altura que
possibilite os trabalhos manuais de desbaste de flores ou frutos, ensacamento
de frutos, colheita manual e outras, como no caso de fruteiras produtoras de
frutos delicados, como o pessegueiro e a goiabeira. Em outros casos, esta poda
de formação anual visa manter o crescimento da planta bem distribuído sobre
um suporte, com finalidade econômica ou estética. Isto se aplica principalmente
ao caso de plantas frutíferas ou ornamentais de caule volúvel. No caso de
plantas usadas na arborização de ruas, a poda de formação é feita também
anualmente, durante toda a vida da planta, de modo a manter as dimensões da
copa nos limites adequados, visando evitar a interferência com a fiação elétrica
e telefônica, ou com as construções porventura existentes nas proximidades.
Quando aplicada aos bonsais (plantas anãs), a poda de formação é uma arte
bem sofisticada e efetuada também durante toda a vida da planta, visando
manter as suas dimensões diminutas, com ramos tortuosos e aspecto de planta
adulta de aparência secular característico; neste caso, a atrofia da parte aérea é
causada pela poda sistemática também das raízes e o seu confinamento num
ambiente de dimensões reduzidas.

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A poda de limpeza visa a eliminação de ramos doentes, fracos,
quebrados e mal localizados na copa, que constituem material indesejável, pelas
conseqüências danosas que eles podem trazer à planta: os ramos doentes
podem constituir fonte de contaminação mais generalizada da planta; os ramos
quebrados podem constituir porta de entrada de patógenos; os ramos fracos
(finos) são improdutivos, e aqueles que crescem no interior da copa, sem atingir
a sua superfície, ou são improdutivos, ou produzem frutos de má qualidade e
sem valor comercial, além de servirem para dificultar a circulação de ar e
penetração de luz no interior da copa, favorecendo o desenvolvimento de
doenças. Por estes motivos, a poda de limpeza deve ser feita anualmente, ou a
cada dois ou três anos. Nas espécies que exigem poda anual de produção, a
poda de limpeza é feita também anualmente, concomitantemente àquela.

A poda de produção pode ser efetuada com dois objetivos diferentes,


dependendo do hábito de vegetação e de florescimento da espécie. Para
espécies que tendem a vegetar intensamente, a poda procura frear o
crescimento vegetativo excessivo e desnecessário, de modo a direcionar esta
energia extra para a produção. Para espécies que tendem a florescer e frutificar
em excesso, além da sua capacidade potencial, o que resultaria em consumo
também excessivo de reservas e o conseqüente enfraquecimento gradativo da
planta e redução da produção e da qualidade do produto, a poda procura reduzir
este excesso de produção a níveis que estejam em harmonia com a sua
capacidade genética, de modo a manter a qualidade do produto e uma
produtividade média compatível com este potencial.
A poda de produção é a que exige maior conhecimento e experiência do
operador para a obtenção dos melhores resultados. A eliminação de uma porção
excessiva da copa resulta em desastre imediato para a produção, pois a planta
reagirá com crescimento vegetativo. A eliminação de uma porcentagem da copa
menor do que a ideal, resultará na produção de uma carga de frutos maior do
que a capacidade genética da planta, com o conseqüente depauperamento de
suas reservas para o ano seguinte e uma carga menor de frutos. Se isto for
repetido por anos a fio, resultará em depauperamento contínuo da planta.

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A porcentagem correta da copa a ser eliminada na poda de frutificação
varia grandemente com a espécie. Assim, a figueira suporta poda drástica
anualmente, sem problemas para a planta, enquanto para a macieira isto seria
desastroso. Para o pessegueiro, a poda anual deve ser moderada, porém muito
bem distribuída entre poda de desbaste e de rebaixamento.
Desta forma, a realização de uma poda de frutificação com perfeição
exige, além de teoria, para se conhecer a exigência de cada espécie, também e
principalmente o acompanhamento da operação efetuada por pessoa habilitada.
A operação começa com uma poda de limpeza, eliminando-se os ramos
indesejáveis, ou seja: ramos doentes, quebrados, com tendência a crescer
verticalmente ou encostando no solo e ramos que crescem para dentro da copa.
Em seguida se efetua a poda de frutificação propriamente dita, a qual começa
com a visualização mental do número de ramos que devem permanecer. No
caso da figueira este número é fixo e varia com o destino dos frutos, se para a
indústria ou para o consumo in natura. O passo seguinte é realizar o desbaste
de todos os demais ramos que devem ser eliminados e que devem ser os mais
finos, por serem os menos produtivos. Este detalhe é da maior importância.
Finalmente, os ramos que permanecerão - os mais vigorosos - serão
encurtados, e a intensidade do encurtamento varia com a espécie. Em figueira e
certas videiras, permanecem apenas 1 a 2 entre-nós, enquanto no pessegueiro
elimina-se em geral apenas 1/3 do ramo, mas pode variar com a cultivar;
algumas florescem mais para a extremidade do ramo e outras mais para a base.
Conhecer estes detalhes é fundamental, portanto, para o sucesso da operação.
A poda de recuperação ou rejuvenescimento consiste na recepa (corte
pela base) ou eliminação da maior parte da copa de plantas adultas, por meio de
uma poda drástica, de modo a permanecerem apenas os ramos mais vigorosos,
submetidos à poda curta. Desta forma, depois de recuperada a copa, esta será
constituída por um número menor de ramos, porém vigorosos e com elevado
potencial de produção, em substituição aos muitos ramos finos e improdutivos
que existiam anteriormente. Esta poda é normalmente efetuada apenas uma vez

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na vida da planta e se aplica a plantas velhas, já debilitadas, porém dotadas de
um sistema radicular sadio e vigoroso.

2.7. Instalações usadas na propagação de plantas:


A produção da muda em viveiro constitui uma etapa importante na
implantação de culturas de espécies hortícolas. Em alguns casos, esta
necessidade se deve ao fato de se tratar de plantas muito delicadas, como
muitas espécies ornamentais e hortaliças; em outros casos há a vantagem de
enxertia, seleção de plantas mais vigorosas ou de formato mais adequado. Tudo
isto leva à necessidade de se formar tais plantas em ambiente mais controlado
para a obtenção de plantas mais vigorosas. Para controle do ambiente, há a
necessidade do emprego de instalações especiais.
A produção da muda em viveiro geralmente é feita em duas fases: fase
de sementeira e fase de viveiro propriamente dita: a primeira fase constitui a
formação da plântula que constituirá o propágulo a ser utilizado na implantação
do viveiro; a segunda fase é o crescimento e formação da muda, que será
utilizada para a instalação da cultura no campo. Daí surge a necessidade de
dois tipos de instalações: sementeiras e leitos de enraizamento, e estruturas de
proteção, estas podendo ser de vários tipos, conforme descrito a seguir.
A. Sementeiras e leitos de enraizamento:
Da mesma forma que a instalação de uma cultura com mudas produzidas
em viveiro resulta em maior produtividade e melhor qualidade do produto,
também a instalação do viveiro com plântulas que tenham recebido um
tratamento esmerado durante a primeira fase da sua vida, resulta na produção
de mudas de qualidade superior. Daí resulta a necessidade das sementeiras e
leitos de enraizamento, que são instalações onde as plantas a serem
enviveiradas passarão a primeira fase de seu ciclo de vida.
O emprego destas instalações proporciona às sementes ou às estacas,
condições mais controladas e desejáveis para o início de crescimento das
plântulas, tais como substrato mais equilibrado quanto ao arejamento e
umidade, desprovido de patógenos e onde as plântulas estejam reunidas numa

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área mais restrita onde as adubações, irrigações e outros cuidados possam ser
efetuados com mais eficiência. Além disso, as sementeiras e leitos de
enraizamento permitem que se faça uma primeira seleção de mudas pelo estado
sanitário, vigor e outros aspectos, o que resultará em maior rendimento do
viveiro em mudas de qualidade superior, com reflexo na produtividade da cultura
e na qualidade do produto final.
As sementeiras e leitos de enraizamento são instalações semelhantes,
com uma única diferença: por serem as estacas em geral estruturas de maiores
dimensões do que as sementes, o leito de enraizamento precisa ser 5 a 10 cm
mais alto do que o leito das sementeiras. Por este motivo, a discussão a seguir
se referirá apenas às sementeiras.
A.1. Tipos de sementeiras:
As sementeiras podem ser feitas diretamente no solo ou em recipientes.
As sementeiras no solo, ou sementeiras de campo, são aquelas montadas
diretamente no campo, e se dividem em dois tipos: sementeira provisória e
sementeira permanente. A sementeira em recipientes é feita principalmente
sobre bandejas especiais.
Sementeiras de campo: não são mais utilizadas em produção comercial de
mudas.
Sementeiras em recipientes: consiste em se fazer a semeadura em bandejas
especiais, ou outro recipiente onde as plântulas serão mantidas até o momento
de serem transferidas para o campo. Constitui a versão mais moderna de
sementeira, desenvolvida como conseqüência do cultivo de grandes áreas,
inicialmente com plantas florestais e posteriormente também com hortaliças,
plantas ornamentais e fruteiras. No cultivo de áreas extensas, o planejamento da
exploração deve ser feito com precisão, de modo a evitar pequenas falhas nas
diferentes atividades que, em conjunto, podem resultar em perdas substanciais.
Assim, a sincronização das atividades que sucedem umas às outras é da maior
importância, da mesma forma que a prevenção de outros imprevistos. No que
diz respeito à formação das mudas em larga escala, a utilização das
sementeiras de campo tradicionais, resulta em grandes riscos, daí o surgimento

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de produtores especializados na produção de mudas em condições mais
controladas, onde a semeadura em recipientes constitui uma exigência, bem
como a utilização de ambiente protegido. Os recipientes para esta finalidade são
em geral bandejas de diversos tipos, placas de espuma fenólica e blocos
prensados.
Bandejas: são recipientes de plástico ou isopor, de forma retangular, divididas
em células em forma de prisma invertido, de base quadrada, que se afunila em
direção à parte inferior, a qual termina em um orifício, cuja finalidade é o
escoamento da água de irrigação e poda das raízes pelo ar. As dimensões das
células variam de 2,5cm a 5 cm de lado, por 2,5 cm a 12 cm de profundidade.
Estas bandejas são utilizadas em geral para a semeadura de hortaliças e
plantas ornamentais herbáceas. Além destes tipos de bandeja, cujas células
constituem divisões dentro da bandeja, existem outros tipos que funcionam
como suporte para tubetes de diferentes tamanhos e que se encaixam nas
aberturas da bandeja podendo ser removidos quando necessário. Os tubetes se
assemelham às células das bandejas, porém normalmente com seção circular
ou quadrada, apresentam sempre volumes maiores do que os das células, com
dimensões que variam de 2,6 cm a cerca de 14 cm de diâmetro por 2,6 cm a
mais de 30 cm de altura. Suas maiores dimensões se destinam a permitir a
semeadura de plantas dotadas de sistema radicular com raiz pivotante longa,
como as árvores frutíferas, ornamentais e florestais. A semeadura em bandejas
sobre suporte oferece as vantagens de promover a formação de mudas fora do
contato com o solo, mantê-las a uma altura que permite o trabalho do operário
em pé, que é mais confortável, além de possibilitar a repicagem das plântulas
com bloco, sem portanto, a perda de parte do sistema radicular, como acontece
nas sementeiras a campo. Por estas vantagens, a semeadura em bandejas é
um sistema que vem sendo utilizado até para a produção em pequena escala e
mesmo a nível doméstico.
Outros recipientes: os demais recipientes utilizados como alternativa à
sementeira de campo, como as placas de espuma fenólica e os blocos
prensados têm tido uso mais limitado.

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B. Estruturas de proteção:
Denominam-se estruturas de proteção as instalações destinadas a
proteger as plantas contra fatores do ambiente quando fora de limites
desejáveis, como excesso de temperatura ou temperaturas muito baixas, ventos
fortes, excesso de chuvas, granizo e luminosidade excessiva. Dentre estas
estruturas, as mais utilizadas tradicionalmente são as estufas ou casas-de-
vegetação e os telados.
A primeira referência ao cultivo protegido remonta a quatro séculos antes
de Cristo. Em Roma, as estruturas eram cobertas com lâminas de mica e
aquecidas com esterco em decomposição. Na França, no século 14, já havia
casas-de-vegetação cobertas com vidro para o cultivo de flores. Em 1700 já
havia estruturas semelhantes na Inglaterra. Em 1800 foi construída a primeira
nos USA; desde então o seu número cresceu rapidamente até os dias atuais.
Hoje as maiores áreas cobertas com estruturas de proteção se encontram na
Holanda, Itália, Japão, Rússia, Alemanha Oriental, Inglaterra, Bélgica, Estados
Unidos, Israel, Turquia e Espanha.
A finalidade principal do uso destas instalações nestes países é criar um
ambiente com temperaturas mais elevadas nos meses mais frios do ano,
quando o cultivo de plantas seria impossível, necessitando, na maioria das
vezes, de aquecimento artificial. Daí receberem, nos países de língua
portuguesa, o nome de "estufa", quando nos países de língua inglesa o nome é
"greenhouse" (casa-verde), ou "glasshouse" (casa-de-vidro).
Nos países mais desenvolvidos, as estufas se desenvolveram e
sofisticaram, constituindo hoje estruturas com armação metálica, cobertura de
vidro, aquecimento e resfriamento artificiais, com controles automáticos por
computador, de temperatura, iluminação e irrigação. Paralelamente, ocorreu
uma evolução das mesmas instalações, no sentido da simplificação,
principalmente em países de clima sub-tropical e tropical, onde os custos das
instalações sofisticadas são proibitivos, além de serem instalações
desnecessárias, já que as temperaturas hibernais nestes países não são tão
baixas e as do verão são muito altas, com resultados desastrosos para as

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plantas nestas estruturas. Como resultado, surgiram estruturas com diversas
formas, mais baratas e mistas entre a estufa e o telado, que promovem
aquecimento limitado durante o dia, porém sem excesso, além de proteção
contra excesso de chuvas, granizo e ventos fortes.
Desta forma, hoje é possível dispor de estruturas com diferentes
características, que atendem as exigências dos diversos microclimas
distribuídos pelo país: para os climas mais amenos do Sul, estruturas mais
fechadas, com maiores áreas cobertas com plástico ou vidro; para os climas
mais quentes do Norte, estruturas mais abertas, com maiores áreas cobertas
com tela de nylon e apenas a cobertura superior com plástico.
Muitas das estruturas de proteção usadas no Brasil constituem
improvisações muito simples e de natureza provisória, constituídas por armação
de bambu ou cano plástico, montada a pequena altura sobre canteiros e
cobertas com plástico, podendo ser retiradas no final do ciclo da cultura e
transferidas para outro local. Outras possuem estrutura de eucalipto ou outra
madeira de curta duração, coberta com plástico, tela de nylon, ou combinação
de tela e plástico; no final de 2-4 anos o material se deteriora e é substituído.
São, todas, estruturas simples, baratas e sem qualquer controle sofisticado. Em
geral, as estruturas mais baixas e simples são empregadas para a proteção de
plantas instaladas diretamente no solo; as mais altas, com aspecto mais próximo
das estufas, são utilizadas para o cultivo de plantas em recipientes, como na
produção de mudas de hortaliças em bandejas e plantas ornamentais em vasos,
devido a proporcionarem condições ambientais mais estáveis, necessárias ao
crescimento rápido e saudável das plantas. As estruturas mais baixas, que se
elevam pouco acima do nível dos canteiros, não permitem mais do que o
simples levantamento e abaixamento do plástico de cobertura, para controle
parcial da temperatura.
O emprego destas estruturas, embora exija investimentos mais elevados
quando comparado à cultura a céu aberto, permite a produção de plantas de
melhor qualidade, produtividade mais elevada, produção em época ou ambiente
adverso, além do encurtamento do ciclo da planta, o que resulta em grandes

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vantagens. Além disso, a produtividade mais elevada permite a utilização de
áreas valorizadas, mais próximas de grandes centros consumidores, o que
reduz o custo de transporte e danos causados pelo transporte a longa distância.
B.1. Telado e ripado:
São estruturas constituídas por pilares de 2,0 - 2,5 m de altura, de teto
horizontal e cobertos de tela de nylon (telado) ou ripas de madeira ou bambu
(ripado) na parte superior e nas laterais. Em geral suas dimensões se situam
entre 20 e 30 m de comprimento e 6 a 9 m de largura.
A finalidade destas estruturas é principalmente proporcionar
sombreamento parcial, principalmente no verão, a plantas sensíveis à irradiação
solar plena, as chamadas "plantas de sombra".
O telado pode ser usado também para a proteção de plantas contra o
ataque de insetos, utilizando a tela anti-afídeo, para plantas como citros,
morango, batata inglesa e outras, sujeitas a viroses transmitidas por estes e
outros insetos.
Os ripados são estruturas mais rústicas e baratas, em geral construídos
com postes de eucalipto ou outra madeira comum, tendo a parte superior
guarnecida com ripas, as laterais abertas e o piso de terra batida, ficando as
plantas em recipientes diretamente no chão.
Os telados são em geral estruturas mais completas, constituídos das
seguintes partes:
Pilares - feitos de metal (aço, alumínio, canos de água), canos de PVC, ou
postes de concreto ou de madeira.
Mureta - feita de alvenaria de tijolos, com até 90 cm de altura, contornando toda
a estrutura ao longo das linhas dos pilares.
Piso - feito de concreto, tijolos rejuntados, chão batido ou coberto com
pedregulhos.
Bancadas - nem sempre são usadas, podendo ser de concreto, madeira, ou
combinação de tela de arame ou grade de madeira sobre suportes de concreto
ou madeira, com 90 cm de altura.

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Passagens - entre as bancadas, de 60-70 cm de largura, de alvenaria,
pedregulho ou areia.
Armação de cobertura – plana e feita com hastes de metal, madeira, cabos de
aço ou arame grosso de aço zincado.
Material de cobertura superior e lateral - tela de nylon cinza, com abertura
variando entre 30 e 80% de interceptação dos raios solares, dependendo da
finalidade. Quando o objetivo é exclusão de insetos, usa-se a tela anti-afídio,
que é branca e com malhas diminutas. Neste caso, a entrada do telado deve
possuir uma anti-câmara, com duas portas, para assegurar que insetos não
penetrem na estrutura, por ocasião da entrada e saída de pessoas.
Por serem estruturas mais simples, os telados e ripados nem sempre
apresentam instalação elétrica, mas é imprescindível que sejam dotados de
instalação hidráulica.
B.2. Estufa:
É a instalação mais sofisticada e, por isto mesmo, a mais cara dentre as
estruturas usadas em propagação de plantas, desenvolvida com a finalidade de
permitir o aquecimento artificial nos meses frios do ano, em países de clima frio,
daí o nome de "estufa" que lhe é dado nos países de língua portuguesa e
espanhola, embora a denominação tradicional destas instalações tenha sido,
desde longa data, "casa-de-vegetação".
A estufa típica, toda coberta de vidro, é uma estrutura viável e
imprescindível em países de clima temperado; todavia, mostrou-se imprópria
para a maior parte do Brasil, não só pelo seu preço elevado, mas principalmente
pelo excessivo aquecimento interno no verão, podendo gerar temperaturas de
até 500C nos horários mais quentes do dia, o que resulta na necessidade de
usar técnicas de resfriamento artificial, de custo elevado. Em alguns casos,
porém, ela pode ser necessária, onde o fator economia não seja importante,
como no caso de instituições de pesquisa, ou então quando a valor elevado da
planta justificar, além de outros casos especiais.
É uma estrutura constituída das mesmas partes que o telado, porém com
algumas diferenças. A principal diferença é o tipo de material de cobertura, que

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é sempre transparente (vidro, fibra de vidro ou plástico) e na altura do pé-direito,
que deve ser igual ou superior a 2,5 m de altura, para evitar que os raios
infravermelhos, irradiados pelo material transparente de cobertura, incidam
diretamente sobre as plantas. Além disso, o teto precisa ser inclinado, com a
cumeeira a 4,0-4,5 m de altura. Adicionalmente, a estufa é sempre dotada de
sistema de ventilação natural, através de janelas laterais e no teto, além de
sistemas de ventilação e resfriamento forçados, que podem ser de vários tipos,
sendo por isto também provida de instalação elétrica, além de instalação
hidráulica.
Estufas para climas tropicais não podem ter as mesmas características
daquelas de climas temperados. É imprescindível que apresentem janelas
amplas no teto e nas laterais, para permitir uma circulação de ar ampla e assim
evitar superaquecimento. Mesmo assim, esta ventilação natural não é suficiente,
havendo necessidade de utilização de um ou mais sistemas de resfriamento
forçado, o que exige também um fornecimento ininterrupto de energia elétrica.
Em locais onde o fornecimento de energia elétrica sofre interrupções longas e,
ou freqüentes, é recomendável não se utilizar de sistemas de resfriamento
forçado para cujo funcionamento haja necessidade de se fechar totalmente as
janelas, já que uma eventual interrupção de energia pode resultar em elevação
excessiva de temperatura, com resultados desastrosos. Por este motivo, deve-
se adotar sempre os sistemas de resfriamento que funcionam com as janelas da
estufa abertas; assim, em caso de interrupção do fornecimento de eletricidade,
continuará ocorrendo a troca de ar da estufa, por convecção, com menor
elevação da temperatura.

Outra característica importante das estufas para climas tropicais é o pé-


direito alto e a adoção de lanternim em substituição às janelas superiores,
devendo este ser suficientemente alto para prover aberturas amplas e circulação
mais ampla de ar. Algumas estufas modificadas para clima tropical, produzidas
no Brasil, apresentam janelas laterais amplas, mas janelas superiores pequenas,
o que anula o suposto benefício das aberturas laterais maiores, já que a perda
de ar por convecção, pelas aberturas superiores, continua reduzida.

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Material de cobertura:
As estufas são sempre cobertas, na parte superior e lateralmente, com
material transparente, com a finalidade de promover aquecimento e proteção
das plantas contra os fatores adversos do ambiente, como granizo, excesso de
chuvas, ventos fortes, além de neve nos climas frios. As estufas mais
sofisticadas normalmente utilizam o vidro como material de cobertura; outras
usam telhas de fibra de vidro, ou ainda lona plástica, no caso de estruturas mais
rudimentares.

O vidro apresenta a grande vantagem de não se deteriorar com o tempo,


sendo, porém de custo inicial elevado e pesado, o que leva à necessidade de
uma estrutura forte e também de custo elevado. O fato de ser quebrável não
constitui normalmente uma grande desvantagem, uma vez que isto acontece em
geral somente no caso de chuva de granizo muito forte, ou casos raros de
vandalismo. Outra desvantagem relatada para este material, quando usado em
instalações com a finalidade de aquecimento, é o fato de apresentar muitas
frestas nas junções da armação, o que leva a perda de calor. Quanto à
transparência, que é um fator importante neste caso, o vidro apresenta
vantagem com relação aos outros materiais, uma vez que a transparência não é
perdida com o tempo, embora ela se reduza gradativamente à medida que o
ângulo de incidência dos raios ultrapassa 60o em relação à perpendicular à
superfície do vidro. Desta forma, o vidro é o material ideal, quando se dispõe de
recursos suficientes e se deseje uma estrutura de longa duração.

A telha de fibra de vidro apresenta a vantagem de ser também


inquebrável e de custo reduzido em relação ao vidro, além de ser leve, o que
exige uma estrutura mais barata. Todavia, apresenta a desvantagem de perder a
transparência com o tempo: esta perda se inicia em poucos meses e se
completa em poucos anos, além deteriorar, devido a ação dos raios ultra-violeta.
Desta forma, ela apresenta menor duração (de apenas alguns anos), além de
apresentar muitas frestas nas junções entre elas.

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A lona plástica transparente é o material mais barato, mais leve e que, por
isto mesmo, exige a estrutura também mais simples, o que resulta em custo
inicial mais baixo, além de apresentar boa transparência. Todavia, apresenta a
grande desvantagem da curta duração. As lonas plásticas comuns não chegam
a durar 6 meses, enquanto aquelas próprias para a agricultura, chamadas
“reforçadas” por receberem aditivos químicos como proteção contra os raios
ultra-violeta, apresentam duração de 2-3 anos. Devido à pequena quantidade de
frestas, a lona plástica apresenta a desvantagem de produzir um ambiente com
excesso de umidade, devido à condensação de vapor nas paredes, mas esta
situação pode ser controlada pelo uso de área adequada de pequenas janelas
nos diferentes pontos da estrutura.

Desta forma, as estruturas destinadas a uma longa duração utilizam


cobertura de vidro e instalações mais sofisticadas, com elevado investimento
inicial, enquanto as estruturas destinadas a uma existência mais curta, com
baixo investimento inicial, utilizam cobertura de lona plástica ou telhas de fibra
de vidro e instalações mais modestas ou até mesmo bem rudimentares.

B.3. Estruturas mistas:


Dentre as modificações sofridas pelas estruturas de proteção tradicionais
- telados e estufas - muitas delas tiveram como objetivo melhorar a estrutura
correspondente, sem, porém descaracterizá-la como tal e manter a sua
finalidade: proporcionar aquecimento em climas frios, ou sombreamento em
climas quentes. Outras modificações procuraram explorar características das
duas estruturas, de modo a criar estruturas intermediárias mais eficientes, que
não são nem tipicamente estufas nem tipicamente telados, e constituem hoje a
maioria das estruturas de proteção utilizadas no Brasil. Estas estruturas
apresentam aspectos diversos e têm recebido impropriamente o nome genérico
de estufas, mas seria mais apropriado conferir a estas a antiga denominação de
"casa-de-vegetação", uma vez que têm como finalidade, além de explorar as
vantagens do aquecimento moderado das plantas nos períodos mais frios, ou
redução da temperatura nos períodos mais quentes do ano, também proteger as
plantas contra os fatores atmosféricos indesejáveis dos trópicos, como chuvas

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em excesso, granizo e ventos fortes e, com isto, promover um ambiente mais
apropriado ao crescimento das plantas em tais condições.
Estas estruturas normalmente combinam uma cobertura plástica para dar
proteção às plantas contra os fatores adversos, ou promover aquecimento
moderado nos períodos mais frios do ano, com laterais protegidas com tela de
nylon de cor cinza, ou sem nenhuma proteção, para permitir circulação livre do
ar e, assim, criar temperaturas mais amenas durante os períodos mais quentes
do dia, especialmente no verão. Outras estruturas, em regiões mais frias, são
protegidas lateralmente com plástico, mas de tal modo que este pode ser
colocado no inverno e retirado no verão. Ainda outras, constituem túneis baixos
sobre os canteiros, com estrutura simples, que permite elevar o plástico durante
o dia e baixá-lo à noite. Quanto à altura destas estruturas, é variável
principalmente com o microclima onde são utilizadas, mas uma característica
comum a todas elas é o seu baixo custo. A cobertura é sempre feita com lona
plástica e a armação com bambu, madeira de eucalipto, canos plásticos e
vergalhões de construção, nas construções improvisadas, além de canos
metálicos de pequeno diâmetro, nas instalações industriais.

2.8. Recipientes e substratos:


A tendência mundial é a produção de mudas em recipientes utilizando
diferentes tipos de substratos.
Substrato é todo material usado como suporte para o desenvolvimento de
uma planta. Ex.: água (hidroponia), composto, (de lixo orgânico, de resto de
vegetais, etc.), terriço, terra de subsolo, areia, etc.
Os substratos podem ser naturais (compostos vegetais, terriço, areia, fibra de
coco, etc.) ou sintéticos (poliuretano expandido, espuma de poliuretano, etc.).
Características de um bom substrato (Fachinello et al., 2005):
- Ser firme e denso o suficiente para manter a estrutura de propagação em
condições até a germinação ou o enraizamento;
- Não contrair ou expandir com a variação da umidade;
- Reter água em quantidade suficiente;

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- Ser suficientemente poroso para permitir a drenagem da água e a aeração;
- Estar livre de invasoras, nematóides ou outros patógenos;
- Não apresentar nível excessivo de salinidade;
- Permitir a esterilização a vapor;
- Ter baixa densidade e composição química e física equilibrada: elevada
CTC, boa capacidade de aeração e drenagem, boa coesão entre as
partículas e adequada aderência nas raízes.
- Ter baixo custo e fácil aquisição.
Características de um bom substrato para germinação de sementes (Fachinello
et al., 2005):
- Proporcionar equilíbrio adequado entre umidade e aeração, ter boa
capacidade de drenagem e retenção de umidade, bom fornecimento de
oxigênio;
- Proporcionar ambiente escuro (sementes fotoblásticas negativas e raízes
fototrópicas negativas);
- Ter capacidade de suporte físico da muda e aderência às raízes;
- Fornecer nutrientes essenciais para a planta;
- Estar isento de ervas invasoras, pragas e microrganismos.
Características de um bom substrato para o enraizamento (Fachinello et al.,
2005):
- Ter boa capacidade de aeração e retenção de água;
- Aderir bem às raízes formadas;
- Permitir que as estacas sejam removidas com um mínimo de dano às
raízes;
- Ter baixo custo e fácil aquisição;
- Não conter ou liberar substâncias fitotóxicas às estacas.
- Retenção de umidade: estacas herbáceas sob nebulização (menor);
estacas lenhosas (maior).
Importância das propriedades físicas, químicas e biológicas:

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- Propriedades físicas: forma, textura e tamanho de partículas; teores de
argila e silte; densidade, espaço poroso e capacidade de retenção de
água na saturação e na capacidade de campo. Espaço poroso: ar x água.
- Propriedades químicas: pH e disponibilidade de nutrientes;
- Propriedades biológicas: presença de microrganismos benéficos
(associações micorrízicas).
O mais importante em um substrato é as propriedades físicas, uma vez
que as propriedades químicas e biológicas podem ser mais facilmente corrigidas
(uso de adubos, de fungos micorrízicos, etc.). A tendência atual é usar materiais
inertes como substrato (apenas como enchimento e suporte), biologicamente e
quimicamente inertes, ou praticamente inertes.
Cada substrato possui características químicas e físicas distintas. Exemplo:
terriço x subsolo. Densidade terriço é menor, a quantidade de matéria orgânica e
a fauna e flora é maior no terriço. O subsolo é mais inerte que o terriço.
Análise do substrato é fundamental. Análise física, química e biológica. No
caso de composto de lixo urbano deve ser feita inclusive a análise para metais
pesados.
Não existe substrato perfeito, que reúna todas as propriedades físicas e
químicas para o bom desenvolvimento da planta. Deve-se buscar uma
proporção entre os substratos para atingir o objetivo estabelecido. Essa
proporção não deve ser estabelecida de forma empírica e sim por meio de
cálculos matemáticos baseados nas propriedades físicas e químicas dos
substratos.
Dependendo do substrato, ele deve ser tratado antes de ser utilizado. Por
exemplo, se estiver contaminado por patógenos ou sementes de ervas
daninhas.
Uma mistura de substratos muito usada é terra de subsolo: areia: esterco
curtido (1:1:1). É uma mistura empírica, mas que fornece bons resultados.
No Brasil, o uso de substratos é de forma empírica e pouco agronômica. Mas
o cenário vem mudando ao longo dos últimos anos. Maior uso de substratos
comerciais, pesquisa para adequação do substrato a cultura trabalhada,

49
pesquisa para utilização de resíduos da agroindústria como substrato para
determinadas culturas. Exemplo: fibra de coco e composto da casca de mamona
- UENF.
Os substratos mais usados atualmente na Europa são: perlita, vermiculita
expandida e fibra de coco. Nos EUA: casca de pinus e fibra de coco (orquídeas).
Tendência mundial: automação do processo de produção vegetal (uso de
substratos inertes, em recipientes, em ambientes controlados).
Para o pequeno produtor, usar, de preferência, substratos fáceis de serem
encontrados na região, de baixo custo e de baixo impacto ambiental (fazendo,
quando possível, o reaproveitamento de resíduos da própria propriedade ou da
região).
O objetivo a ser atingido é obter o mais próximo de 100% de enraizamento, o
mais rápido possível para que a planta cresça vigorosa e seja comercializada.
Exemplos de substratos: fibra de coco, pó de xaxim, casca de arroz
carbonizada, moinha de carvão, serragem, turfa, Sphagnum (musgo), argila
expandida, vermiculita, húmus de minhoca, resíduo ou torta de filtro (bagaço de
cana-de-açúcar), terra de subsolo ou de barranco, areia, esterco curtido,
plantimax, bambu compostado, casca de pinus, casca de coco triturada.
Os mais diferentes tipos de recipientes vêm sendo empregados na produção
de mudas: bandejas de poliestireno expandido, sacos plásticos e tubetes de
polietileno, etc.

2.9. Embalagem, transporte e comercialização:


Existem dois sistemas de produção de mudas: em recipiente e
diretamente no solo. A produção de mudas em recipientes tem como uma de
suas vantagens a não necessidade da operação de arranquio das mudas;
podendo tão somente necessitar da re-embalagem das mesmas, quando os
recipientes estiverem desgastados ou semi-destruídos pelas intempéries a que
ficam submetidos no campo. Já o sistema de produção de mudas diretamente
no campo, exige as operações de arranquio e de embalagem das mudas, mas
este sistema está em desuso.

50
As mudas devem ser produzidas de modo a sincronizar a época de
terminação da muda com a melhor época para a comercialização.
Os custos de transporte podem ser muito elevados, principalmente se as
mudas forem transportadas com o substrato. Portanto, deve-se fazer uma
análise prévia dos custos de transporte e da viabilidade econômica da produção
de mudas de certas espécies ou cultivares em determinado local.

2.10 Fatores do ambiente e seu controle no viveiro:


Um dos tratamentos intensivos que às vezes se dá às plantas no viveiro,
principalmente aquelas de valor econômico elevado, como as ornamentais e
algumas outras, é o controle do ambiente. Em alguns casos, este controle visa
simplesmente evitar efeitos danosos de algum fator ambiental sobre a planta;
outras vezes visa tirar proveito de determinada situação, de modo a auferir
alguma vantagem extra. No primeiro caso, temos como exemplo o artifício da
utilização de uma cobertura destinada a reduzir a incidência de luz solar sobre
as plantas e assim poder cultivar, sob condições de sol intenso, plantas que não
toleram esta situação. No segundo caso, um bom exemplo é o artifício utilizado
para induzir o florescimento fora de época, através do controle do fotoperíodo.
Para tirar proveito destes artifícios é preciso conhecer bem os diferentes
tipos climáticos existentes sobre o planeta, bem como os limites que eles
interpõem à sobrevivência das diferentes espécies, além dos micro-climas que
se formam em torno da planta no decorrer do ano e mesmo no decorrer do dia.

2.10.1. Tipos climáticos:


A latitude é o fator determinante da existência dos três grandes tipos
climáticos sobre a superfície da Terra: tropical, subtropical e temperado. A
variação do ângulo de inclinação do eixo da Terra, ao percorrer a sua órbita em
torno do Sol, determina a existência das quatro estações do ano, que modificam
os níveis de atuação dos elementos do clima, característicos de cada um destes
três tipos climáticos, resultando em variação anual principalmente na
temperatura e no comprimento do dia. Ainda um terceiro fator, a altitude, atua

51
sobre os elementos do clima, principalmente sobre a temperatura, modificando-a
dentro de certos limites.
O clima tropical se distribui entre os trópicos de câncer e de capricórnio,
localizados a 23027’ de latitude Norte e Sul, em relação à linha do equador. O
clima subtropical se distribui nas faixas localizadas entre os trópicos citados e
400 de latitude Norte e Sul. E o clima temperado se distribui entre esta última
faixa citada e o círculo polar, localizado a 66,50 de longitude Norte e Sul.
A. Clima tropical:
Caracteriza-se por apresentar temperaturas quase constantes durante o
ano, temperatura média anual acima de 220C, ausência completa de geadas e
quase nenhuma diferença no comprimento do dia durante o ano.
As espécies de clima tropical, como o abacaxi, banana, manga, coco-da-
Bahia, mamão, goiaba, caju, castanha do Pará, guaraná e outras, exigem clima
quente e úmido e pouco variável; não toleram geadas e nem temperaturas
próximas a 40C por período prolongado; apresentam folhagem permanente e
vegetação exuberante, crescimento quase contínuo durante o ano, sem um
período de repouso vegetativo marcante.
B. Clima subtropical:
Caracteriza-se pela ocorrência esporádica de temperaturas abaixo de 4oC
no inverno, temperatura média anual entre 15 e 22oC, geadas brandas e
raramente fortes, além de diferenças moderadas em comprimento de dia
durante o ano.
As espécies subtropicais, como caqui, figo, videira, citros, abacate,
nêspera, jabuticaba, noz macadâmia e outras, preferem clima ameno, com
temperaturas moderadas, pequeno grau de tolerância a geadas e a
temperaturas pouco abaixo de 4oC por período curto; a maioria apresenta
folhagem permanente, exceto caqui, marmelo, figueira, videira; apenas as de
folhas caducas apresentam pequeno período de repouso vegetativo no inverno;
apresentam vegetação moderada e diversos surtos de crescimento por ano,
exceto as de folhas caducas, que apresentam um único surto.

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C. Clima temperado:
Caracteriza-se por apresentar temperaturas abaixo de 0oC no inverno,
temperatura média anual abaixo de 15oC, geadas freqüentes e fortes, além de
neve; grande diferença no comprimento do dia durante o ano.
As espécies de clima temperado exigem clima frio, com certo número de
horas (entre 400 e 1.200 horas) de temperaturas abaixo ou iguais a 70C no
inverno; são altamente tolerantes a temperaturas abaixo de 0oC; são todas de
folhagem caduca, exceto as coníferas e apresentam acentuado período de
repouso vegetativo no inverno; apresentam vegetação moderada e um único
surto de crescimento por ano.

2.10.2. Fatores ambientais:


Sabe-se que a planta vive em interação direta e constante com os fatores
ambientais durante todo o seu ciclo de vida, dos quais vão depender todas as
suas reações morfogênicas. Estes fatores, por sua vez, se modificam no tempo
e no espaço, interagindo uns com os outros e fazendo variar o comportamento
da planta, de acordo com o micro-clima criado em torno dela num determinado
local e período do dia e do ano. Desse modo, dentro dos limites de determinado
tipo climático, o micro-clima criado em torno da planta variará com as estações
do ano, com a hora do dia (ou posição do sol na abóbada celeste), com a
altitude, com a proximidade de grandes massas de água, ventos, correntes
aéreas ricas ou pobres em vapor d’água, gases e resíduos poluentes no ar,
água de irrigação, com o tipo e quantidade de fertilizantes aplicados, com a
natureza química e física do solo, além de outras. A forma mais simples e
comum de resposta da planta à modificação na interação entre estes fatores é
por meio do aumento ou diminuição da sua taxa de crescimento diário,
modificações estas que normalmente passam despercebidas. Todavia, as
reações resultantes das variações às vezes drásticas de temperatura e
comprimento de dia, que ocorrem à medida que as estações do ano se
sucedem, são facilmente percebidas, uma vez que a planta reage também com
modificações drásticas de natureza morfológica, como florescimento, formação

53
de órgãos de reserva, entrada ou quebra de repouso vegetativo dentre outras.
Esta resposta, porém, varia com as diferentes espécies e até mesmo com a
cultivar, sendo, portanto importante o conhecimento da natureza da resposta
que cada uma delas apresenta aos diferentes fatores do ambiente, para que se
possa tirar disto o melhor proveito.
Dentre os fatores ambientais, três deles são da mais alta importância e
merecem destaque: luz, temperatura e umidade.
A. Luz:
Constitui a parte visível do espectro solar, limitada na extremidade inferior
pelo comprimento de onda infra-vermelho (380 nm) e, na superior, pelo ultra-
violeta (760 nm). Os comprimentos de onda mais curtos do espectro luminoso
são mais ricos em energia do que os mais longos e, cada um deles, afeta a
planta de uma ou mais formas diferentes. Tanto a intensidade da luz, quanto a
sua qualidade (diferentes comprimentos de onda, ou cores), bem como a
duração do período luminoso durante o ciclo de 24 h (fotoperíodo), afetam a
planta de maneira diferente, pela atuação sobre reações fotoquímicas
promovidas em diferentes pigmentos. Os comprimentos de onda vermelha e
azul atuam sobre a fotossíntese, enquanto o violeta, o azul e o verde promovem
o fototropismo. Já os comprimentos correspondentes ao vermelho e vermelho
longo estão relacionados com os fenômenos ligados ao fotoperiodismo
(florescimento, indução e quebra de repouso vegetativo em plantas, indução e
inibição de germinação de sementes e formação de órgãos de reserva).
A luz começa a agir sobre a planta já no momento em que a semente é
posta a germinar, podendo estimular a germinação ou inibi-la, dependendo da
fisiologia da espécie. Logo após a germinação, o contato com a luz estimula a
formação dos cloroplastos, clorofila e outros pigmentos. Os pigmentos amarelos
- carotenóides - quimicamente semelhantes à clorofila são constituídos pelas
xantofilas e o -caroteno, de especial interesse em nutrição animal, por se
transformar no organismo em vitamina A. A principal função dos carotenóides na
planta é a proteção da clorofila contra a destruição (foto-oxidação) sob
condições de luz intensa, o que acontece sempre que esta intensidade

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ultrapassa certos limites que variam de acordo com a espécie. Esta diferença de
tolerância à luz permite separar as plantas em dois grupos (Mastalerz, 1977):
plantas “de sol” e plantas “de sombra” (ou “de meia-sombra”). As primeiras
apresentam taxa fotossintética máxima a uma intensidade luminosa mais
elevada e podem se desenvolver a pleno sol, sem sofrer efeitos adversos; as
últimas apresentam taxa fotossintética máxima a um nível bem mais baixo de
iluminação; em condição de iluminação mais intensa elas podem sofrer desde
destruição de clorofila até a morte de tecidos, devido à desidratação excessiva
das células por excesso de transpiração. Folhas de plantas de sol podem ficar
saturadas de luz com apenas 200 a 300 lux, mas toleram intensidades de até
1.000 lux, que é o máximo observado no verão. Folhas de plantas de sombra se
saturam com apenas 50 a 100 lux e são injuriadas com pouco mais do que isto.
Estas diferenças entre as plantas determinam os seus diferentes usos ou
as práticas culturais mais apropriadas a cada uma. Assim, muitas plantas de
sombra, com características ornamentais, foram selecionadas para o cultivo em
interiores, na ornamentação de residências; outras, de importância econômica,
ornamental ou não, são cultivadas sob cobertura de tela ou à sombra de outras
plantas. As plantas de sol são normalmente cultivadas no campo, sem o uso de
qualquer artifício. Há, porém, diferença de comportamento dentro de cada grupo:
algumas espécies, como o guaranazeiro e o cafeeiro, que evoluíram sob a
sombra de árvores da floresta, necessitam de sombreamento durante a
formação da muda e por ocasião do seu plantio no campo, mas toleram
elevadas intensidades luminosas sem problemas, depois desta fase. Além disso,
o cafeeiro pode ser plantado em espaçamento reduzido, de modo a formar
renques contínuos de plantas, com os ramos sombreando uns aos outros. Já, as
plantas de sol em geral, sofrem o fenômeno da “derrama” nesta situação, que é
a seca e queda prematura dos ramos que ficarem sombreados por aqueles
situados acima; este fenômeno é utilizado na exploração florestal, que, por meio
do plantio adensado, força um crescimento rápido das plantas no sentido
vertical, em busca de luz, com formação de caules retilíneos e sem cicatrizes na
madeira, devido à seca e queda prematura e contínua dos ramos sombreados.

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No viveiro, quando as mudas são produzidas em recipientes, eles são em geral
dispostos lado a lado, cobrindo toda a área do canteiro, de modo a otimizar o
espaço. Todavia, mudas de plantas lenhosas que precisam ficar por mais de um
ano no viveiro se alongam muito rapidamente nesta situação, o que resulta em
caules muito finos. Neste caso, é conveniente dar maior espaço entre os
recipientes, assim que as mudas começarem a competir entre si em busca de
luz, o que resultará em caule e ramos mais vigorosos.
Em regiões com luminosidade intensa, especialmente se associada à UR
do ar baixa, mudas recém plantadas de muitas espécies, principalmente no
período quente do ano, estão sujeitas a queimaduras no tronco e precisam,
neste caso, ter o tronco pintado com cal ou envolto com algum material protetor.
Da mesma maneira que a alta luminosidade, a ausência de luz também
causa modificações anatômicas, fisiológicas ou bioquímicas nas plantas. Com
exceção das monocotiledôneas, cujo crescimento das folhas não é inibido pela
ausência de luz (Smith, 1975) e das coníferas, musgos, samambaias e maioria
das algas, que podem formar clorofila em completa escuridão (Salisbury & Ross,
1969), a maioria das plantas crescidas na ausência de luz, porém, providas de
uma fonte de reserva (semente, tubérculo, etc), apresentam extremo
alongamento dos entrenós, supressão do desenvolvimento das folhas e
ausência de clorofila, além de supressão da formação de fibras vasculares e
outras modificações internas. A este fenômeno se dá o nome de estiolamento,
que é definido como “a condição expressa por plantas desenvolvidas em
completa escuridão ou sob luz deficiente em certos comprimentos de onda”
(Bickford & Dunn, 1978). Mesmo frutos, folhas e ramos, quando submetidos a
um período de crescimento em ausência de luz, apresentam estas modificações,
que são vantajosas em certos casos. Por exemplo, o aspargo e o aipo (salsão)
só têm valor se estiolados, o que se consegue pela cobertura dos rebentos em
desenvolvimento, com terra ou qualquer material opaco; nesta condição eles se
tornam tenros e sem fibras.
Um grande número de trabalhos de pesquisa tem mostrado que a
supressão ou redução da luz sobre os ramos da planta favorece a formação de

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raízes adventícias nas estacas deles extraídas e que a luz aparentemente age
sobre algum fator local, ou seja, compartimentalizado nas células do local onde
os primórdios radiculares se formam. Este conhecimento é utilizado na
propagação assexual de plantas pelos processos de estaquia e mergulhia, que
consistem em se cobrir com terra ou outro substrato, a parte do ramo a enraizar,
ou então cobrir com material opaco os pontos do ramo onde se deseja a
formação de raízes, algumas semanas antes da obtenção das estacas. Sabe-se
também que a cobertura da planta matriz, por algumas semanas, com tela que
exclua cerca de 30-50% da luz incidente, estimula o enraizamento das estacas
extraídas dos ramos crescidos sob esta condição.
Outra maneira segundo a qual a luz exerce um efeito marcante sobre o
desenvolvimento da planta é por meio da variação que ocorre, ao longo do ano,
na duração do comprimento do dia (fotoperíodo). O seu efeito pode ser
facilmente observado nas plantas perenes de clima temperado e algumas
subtropicais, que perdem todas as folhas no outono e paralisam o crescimento,
entrando no chamado “repouso vegetativo”. Outro efeito marcante é sobre a
indução à formação de órgãos de reserva em plantas anuais, como a batata-
inglesa, alho, cebola e muitas ornamentais. Ainda outra influência importante é
sobre o florescimento de algumas plantas, como o crisântemo e outras. Em
todos os casos, o manejo destas plantas tem que se adequar às respostas por
elas apresentadas. Por exemplo, as plantas perenes, que respondem ao
fotoperíodo com o repouso vegetativo, só podem ser cultivadas nas áreas do
globo terrestre onde a duração do dia, no outono, se reduza abaixo do limite que
estimule esta reação; além disso, é necessário que a temperatura, neste mesmo
período, também se situe abaixo de certo limite, para que a resposta aconteça.
Ainda outra exigência precisa ser satisfeita para que a planta sobreviva nestas
condições: é a de que a temperatura do inverno caia abaixo também de certo
limite, por certo número total de horas durante o inverno; caso contrário, a planta
entrará em repouso no outono, mas não reassumirá o crescimento normal na
primavera seguinte e acabará morrendo. Desta forma, tais plantas exigem um
estudo cuidadoso do clima da região, antes de se decidir sobre a sua cultura.

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Sementes destas plantas também apresentam o fenômeno da dormência e
precisam ser submetidas a um tratamento a baixa temperatura para se tornarem
aptas a germinar. Para o caso de plantas como a batata-inglesa, alho e outras,
que são induzidas a formar órgãos de reserva no inverno, ou do crisântemo, que
floresce em condições semelhantes, ou seja, quando o comprimento do dia se
reduz abaixo de certo limite, elas têm que ser plantadas numa época do ano
(final do verão ou outono) que lhes permita crescer e atingir o estado adulto
exatamente quando os dias curtos e a temperatura atinjam os limites que
induzam a resposta para que o ciclo se complete normalmente. Se as condições
indutivas acontecerem muito cedo ou muito tarde durante o ciclo de vida da
planta, a indução pode não acontecer ou, se acontecer, a produtividade poderá
ser baixa ou o órgão formado ser defeituoso e sem valor comercial.
O controle do excesso de luminosidade pode ser feito economicamente
no viveiro. No caso de plantas de sombra, como orquídea, bromélia,
samambaia, algumas palmeiras, chifre-de-veado e muitas outras ornamentais,
costuma-se reduzir a incidência de luz em 30 - 50%, mantendo-se as plantas
sob estrutura coberta com tela de nylon de cor cinza ou verde (telado), ou então
com bambu (ripado). Em outros casos, pode-se usar uma estrutura mais simples
e barata, com arcos de bambu ou ferro de construção, com cobertura de tela de
nylon, com altura de cerca de 90 cm. Em mudas recém-plantadas, usa-se fincar
uma folha de palmeira do lado oeste delas, para evitar queimadura no caule, no
período da tarde; ou então pincelar os caules com tinta de cal, para reflexão da
luz solar.
A complementação da iluminação solar para aumento da fotossíntese
com iluminação artificial não é praticada na agricultura por não ser econômica.
Todavia, esta prática é economicamente viável no viveiro, para a
complementação do fotoperíodo, no caso de plantas muito valorizadas, como
certas ornamentais, com a finalidade de se induzir artificialmente o florescimento
de espécies como o crisântemo na entressafra. Neste caso a prática é
econômica porque o produto é de elevado valor comercial, as plantas são de
pequeno porte e espaçamento reduzido; além disso, a intensidade luminosa

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necessária para indução do florescimento é muito baixa. A técnica consiste em
se criar inicialmente a condição de “dia longo” (ou noite curta), para permitir o
crescimento vegetativo, até a planta atingir a idade adulta. A partir daí cria-se a
condição de “dia curto” (noite longa), para estimular o florescimento. A condição
de dia longo é criada iluminando-se as plantas no meio da noite, por um período
de 4h, entre as 22h e 2h da madrugada, com lâmpadas de 100 watts, espaçadas
de 1,80m e situadas à altura de 1,20m acima das plantas. A condição de dia
curto é conseguida cobrindo-se as plantas com pano preto de algodão bem
fechado, a partir das 16-17h até as 7-9h do dia seguinte, durante 3-4 semanas,
quando as flores já estarão completamente formadas. Artifícios semelhantes
podem ser utilizados com outras espécies, para obtenção de flores na
entressafra.
Dentre os diferentes comprimentos de ondas eletromagnéticas emitidas
pelo Sol, a luz ultra-violeta, embora não fazendo parte da porção visível do
espectro solar, também merece destaque, devido ao seu efeito mutagênico
sobre as plantas, além de causar a destruição dos materiais plásticos
constituintes de materiais de cobertura de estruturas de proteção de plantas,
tubos de irrigação e vasos. Por este motivo, os plásticos para a agricultura são
fabricados com um aditivo que reduz os danos causados pela luz ultra-violeta e
aumenta a sua duração para alguns poucos anos; sem tais aditivos, estes
plásticos não duram mais do que alguns meses.
B. Temperatura:
Afeta o crescimento e desenvolvimento das plantas por meio,
principalmente, do efeito sobre os processos metabólicos: fotossíntese,
respiração e transpiração, além de outros processos, em interação com a luz.
Por meio deles, a temperatura afeta a produtividade e a qualidade do produto,
época de colheita, indução e desenvolvimento da flor, absorção e utilização de
água e elementos minerais, germinação de sementes e enraizamento de
estacas.
Temperaturas mais elevadas aceleram o crescimento da planta, o que
pode ser vantajoso em muitos casos, pela antecipação da colheita, mas

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desvantajoso em outros, principalmente quando se ultrapassa certo limite, como
no caso da roseira: temperaturas mais elevadas resultam em maior produção,
porém, flores menores, menor número de pétalas e pedúnculos mais curtos;
portanto, de baixa qualidade. Por este motivo, as roseiras são normalmente
cultivadas sob telado. Para maior eficiência do enraizamento de estacas, a
temperatura do substrato deve se situar acima de certos limites, que variam com
a espécie. Além disso, a manutenção da temperatura do substrato acima da
temperatura ambiente estimula a divisão celular na base da estaca e,
consequentemente, o enraizamento, enquanto a temperatura mais baixa do
ambiente retarda o abrolhamento das gemas que, de outra forma, poderiam
desenvolver-se em ramos e esgotar as reservas nutritivas da estaca ou resultar
na sua desidratação prematura.
A ação da temperatura pode se faz sentir sobre as plantas, também por
meio do “termoperiodismo”, que é a variação da temperatura do dia e da noite.
Neste sentido, a maioria das plantas prefere temperaturas diurnas mais
elevadas do que as noturnas, como é o caso do tomateiro, plantas cítricas e
muitas outras. No caso destas duas citadas, os frutos ficam mais coloridos nesta
situação. Outras plantas preferem que não haja muita diferença entre estas
temperaturas. Um caso mais raro é o da violeta africana, que prefere
temperatura diurna mais baixa (14 oC) do que a noturna (20-23 oC).
A relação ideal entre a temperatura diurna e a noturna, para crescimento
ótimo da planta, depende da intensidade luminosa do dia. Por isto, quando se
faz o controle de temperatura, a noturna deve ser fixada em função da estação
do ano, e a diurna em função da intensidade da luz durante o dia. Este controle
permite máxima produção de carboidratos durante o dia e que, à noite, a
respiração não consuma mais carboidratos do que foi elaborado durante o dia.
Em geral, a temperatura da noite deve ser de até 3 oC abaixo da temperatura
diurna se o dia anterior foi nublado, e entre 5 e 8 oC mais baixa se o dia foi
ensolarado.
C. Umidade:

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Outro fator imprescindível para a sobrevivência das plantas é a umidade
do ar e do solo. Além da sobrevivência, esse fator afeta também a sanidade da
planta e, esta, por sua vez, vai afetar a produtividade e a qualidade do produto
obtido. Assim, as plantas frutíferas em geral preferem microclimas com baixa
umidade relativa do ar, onde o desenvolvimento de doenças fica inibido e os
frutos alcançam melhor qualidade. Isto explica por que a região semi-árida do
Nordeste brasileiro está se tornando um grande produtor de frutos, inclusive de
uvas de mesa para o mercado interno e exportação. Por outro lado, algumas
espécies como o copo-de-leite, taioba, agrião, inhame, e muitas outras
herbáceas, normalmente de folhas grandes e suculentas, preferem umidade
relativa do ar elevada, além de elevada umidade do solo. Estacas, no leito de
enraizamento, exigem um controle preciso de umidade, o que pode ser decisivo
para o êxito da operação. A umidade ótima neste caso está na capacidade de
campo do substrato, o qual precisa ter, no mínimo, 10 % de espaços livres.
Excesso de umidade resulta em morte das estacas, por falta de arejamento;
deficiência de umidade resulta em morte das estacas por desidratação.

D. Outros fatores:
Outros fatores do ambiente podem ser limitantes ao cultivo de certas
espécies, porém em áreas limitadas no Brasil. É o caso dos ventos e do granizo.
Os primeiros podem ser limitantes para certas espécies, em áreas litorâneas. Na
região da baixada campista, por exemplo, os ventos fortes que sopram nos
meses finais do ano podem limitar o cultivo de bananeiras de porte elevado na
região; em tal situação, o emprego de quebra-ventos torna-se imprescindível. A
ocorrência de granizo tem causado prejuízos elevados às culturas de hortaliças
na região de São Paulo, embora esporadicamente, bem como à cultura da
macieira, em Santa Catarina. Neste último Estado, o problema tem sido
contornado com a utilização de foguetes anti-granizo.
Finalmente, o descontrole climático que vem ocorrendo nos últimos
tempos, como resultado do aquecimento da atmosfera principalmente pelos
países industrializados, tem apresentado conseqüências dramáticas para a

61
agricultura em todo o mundo, e o controle só poderá ser feito por meio de
acordos internacionais, que visem a redução deste aquecimento.

2.10.3. Sistemas de controle da temperatura, iluminação e umidade relativa do


ar em casas de vegetação:
A. Sistemas de controle da temperatura:
Como regra geral, a temperatura ideal para a maioria das espécies
hortícolas situa-se em torno de 270C, mas dentro da maioria das instalações de
propagação, cobertas pelo menos parcialmente com qualquer material
transparente, nas condições do país, a temperatura atinge níveis mais elevados
durante o dia. Por outro lado, no período de inverno, bem como à noite, em
certas regiões, a temperatura cai abaixo deste valor. Em ambos os casos,
quando a temperatura fugir do intervalo ideal de crescimento, a adoção de
algum artifício para o seu controle poderá ser conveniente e até mesmo
imprescindível, quando os limites de sobrevivência forem ultrapassados.
A.1. Princípios da troca de calor:
Os vários sistemas desenvolvidos para resfriamento e para aquecimento
das instalações de propagação de plantas baseiam-se nos mecanismos de
transferência de calor entre os corpos sólidos, líquidos e gasosos, que resultam
no aquecimento ou resfriamento de um determinado ambiente. O fator de
aquecimento mais importante é a radiação solar, que penetra através da
cobertura transparente e, após refletir-se no interior da instalação, gera os raios
infravermelhos que não mais se perdem através da cobertura transparente. O
segundo fator em importância é a radiação térmica da própria estrutura da
instalação e os equipamentos, que se aquecem pelos raios solares e passam
também a emitir raios infravermelhos. Os equipamentos elétricos podem ainda
se aquecer como resultado de seu próprio funcionamento, tornando-se também
corpos radiantes, mas sua importância é de valor reduzido. Outro fator que pode
ser desprezado é a respiração das plantas, que também libera calor, mas em
quantidade mínima. Estes mecanismos resultam sempre na produção de calor
dentro de um determinado ambiente, havendo outros cuja conseqüência vai

62
depender de cada situação: por exemplo, o calor de condução, que é transmitido
de molécula a molécula pelos corpos sólidos e líquidos, aquecerá a instalação
se ela estiver mais fria do que o ambiente externo e vice-versa; o calor de
condensação, liberado pelo vapor d’água na superfície externa das paredes da
instalação, será conduzido para o interior da mesma; se a condensação ocorrer
na superfície interna das paredes, o calor será conduzido para o exterior;
através do calor de convecção, ar frio que se aquecer no interior da instalação
levará o calor para fora; e o calor de evaporação, absorvido do ambiente pela
água ao se transformar em vapor no interior da instalação, retirará o calor da
instalação ao se perder para o exterior.
A.2. Sistemas de resfriamento:
Sistema natural: é o sistema que utiliza a circulação natural de ar entre o exterior
e o interior da instalação, através da abertura maior ou menor das janelas
laterais e superiores. O ar frio entra pelas janelas laterais, absorve o calor
interno da instalação tornando-se menos denso e, por convecção, se perde
através das janelas superiores, desta forma criando um fluxo de arrefecimento
contínuo. Todavia, esta troca de calor não chega a ser suficiente para a
manutenção da temperatura ideal, nos climas tropicais, mas a eficiência deste
sistema pode ser aumentada pelo uso de instalações com teto alto e janelas
laterais e superiores amplas.
Sistemas artificiais: são os sistemas que promovem uma retirada forçada do
calor interno da instalação, utilizando diferentes mecanismos de troca de calor:
Pintura com água de cal: é o sistema que procura reduzir a irradiância no interior
da instalação, através da pintura do teto e também das paredes laterais com
água de cal, na proporção de 2 kg de cal virgem para 10 litros de água. A pintura
pode ser feita pelo lado interno do material transparente de cobertura, ou pelo
lado externo. No primeiro caso, a pintura permanece por tempo mais longo; no
segundo caso, a pintura é feita no início da primavera e vai sendo removida
gradualmente pelas chuvas, mas pode permanecer por tempo mais prolongado
por meio da adição de cola à solução de cal. Apresenta a desvantagem da
redução da iluminação sobre as plantas, mas em geral isto não constitui

63
problema nas condições tropicais. Todavia, em regiões com baixo nível de
irradiância no inverno, a cal pode ser removida no final do verão. Por ser simples
e barato é um sistema muito usado no Brasil
Cobertura com tela de nylon: tem a mesma finalidade do sistema anterior, porém
utilizando tela de nylon para sombrear a instalação. Se a tela for fixa, o
sombreamento no inverno pode prejudicar o crescimento das plantas; mas isto
pode ser evitado instalando a tela de modo a deslizar ao longo de canos laterais,
por meio de argolas, que permitem estender ou recolher a tela com fios de nylon
presos às suas extremidades.
Ventilador com politubo: utiliza um tubo plástico com orifícios de 2,5 a 8 cm, com
30 a 60 cm ou mais de diâmetro, que se estende elevado ao longo da
instalação. Uma das extremidades do tubo plástico é fechado e o ar fresco
externo é pressionado por um ventilador situado na outra extremidade, saindo
pelos orifícios. Este sistema pode ser utilizado também para aquecimento, ou
para recircular o ar interno, para homogeneização da temperatura em qualquer
caso. É um dos sistemas artificiais mais simples e bastante usado em países
desenvolvidos.
Água corrente: consiste em dois canos de PVC ou metal, que se estendem ao
longo do teto da instalação, externamente e logo abaixo das janelas superiores,
um de cada lado do teto, perfurados de modo a deixar escorrer um filete de água
ao longo de cada fila de vidros. Um registro, à entrada dos canos, regula a
passagem de água, que tem a finalidade de esfriar o vidro, eliminando a
irradiação de calor pelo mesmo para o interior da instalação.
Nebulizadores: consiste no uso de nebulizadores distribuídos ao longo da
instalação, sobre as bancadas ou suspensos no teto e acionados por comutador
ou folha eletrônica, de modo a lançar no ambiente, a intervalos determinados,
uma neblina que se evapora e se perde naturalmente através das janelas,
removendo o calor (calor de evaporação). Este sistema tem a vantagem de
servir também para a irrigação, uma vez que parte das partículas de água caem
sobre as plantas e o substrato.

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Almofada de resfriamento: consiste em um engradado coberto dos dois lados
com tela metálica e preenchida com material poroso, como fitilhos de madeira ou
argila expandida. Um tubo de PVC estendido horizontalmente na parte superior
do engradado e contendo orifícios em toda a sua extensão, deixa escorrer filetes
de água para embebimento do material poroso. Uma calha e um depósito
inferiores e uma pequena bomba elétrica fazem recircular o excesso de água.
Esta almofada se localiza em uma das extremidades ou em um dos lados da
casa de vegetação, a qual permanece com todas as janelas e portas fechadas.
Ventiladores localizados na parede oposta à da almofada succionam o ar de
dentro para fora da instalação, forçando a entrada de ar externo pela almofada,
o qual evapora a água que embebe o material poroso e a leva para o exterior
através dos ventiladores. Desta forma, cria-se um fluxo contínuo de ar saturado
de água que continua a se evaporar até a saída pelos ventiladores, desta forma
removendo o calor do interior da instalação continuamente (calor de
evaporação). Este sistema permite reduzir a temperatura da instalação a vários
graus abaixo da temperatura externa, sendo maior a sua eficiência nas regiões
com umidade relativa do ar mais baixa. É um dos sistemas mais eficientes, mas
para que funcione a instalação tem que ficar toda fechada, não aproveitando o
sistema natural de resfriamento, além de ficar vulnerável a cortes de energia que
resultariam em aquecimento excessivo.
Unidades de evaporação: este sistema reúne a almofada de resfriamento e o
ventilador em uma caixa de formato cúbico, com cerca de 1 m de aresta. As
almofadas se situam em três das faces da caixa; na quarta face se situa o
ventilador soprando o ar para o exterior. Esta face é adaptada à parede da
instalação de propagação, de modo que o ar, após ser sugado através das
almofadas para dentro da unidade, é soprado para o interior da instalação.
Várias destas unidades são fixadas nas paredes da instalação, cujas janelas
permanecem abertas, para saída do ar insuflado pelos ventiladores. Isto permite
aproveitar o sistema natural de troca de ar através das janelas abertas, o qual
continuará funcionando mesmo na ausência de energia elétrica. É, portanto, um
sistema mais seguro do que o anterior.

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Ar condicionado: é o mais eficiente de todos os sistemas, porém de custo
proibitivo, tornando-se em geral economicamente inviável comercialmente.
A.3. Sistemas de aquecimento:
Sistema natural: o controle é conseguido por meio de regulagem da abertura ou
fechamento das janelas da instalação, de modo a aprisionar o ar aquecido
naturalmente pelos raios solares que penetram no seu interior. É insuficiente
para manter o ambiente aquecido durante a noite. Daí a necessidade de se
usarem sistemas artificiais.
Sistemas artificiais: são os sistemas que procuram aquecer a instalação
introduzindo ou produzindo calor no seu interior.
Aquecimento de leito: é o sistema de aquecimento utilizado em sementeiras e
leitos de enraizamento. Pode ser feito utilizando-se cabos de aquecimento
elétricos, ou mangueiras pretas de PVC. Neste caso, o leito terá uma estrutura
especial: o cabo ou a mangueira são distribuídos ziguezagueando no fundo do
leito, de modo a manter uma distância de 15 cm entre os segmentos do cabo ou
mangueira. Logo acima destes deve ser colocada uma camada de 5 cm de solo
e, acima desta, uma tela plástica de malhas finas, para evitar que a base das
estacas (no caso de leito de enraizamento) encostem no cabo ou mangueira
aquecida. Acima desta coloca-se o substrato, numa camada de 15-20 cm.
Quando se adota cabo de aquecimento, usa-se um termostato, introduzido no
leito, para controlar a temperatura. Quando se adota mangueira, o aquecimento
é obtido com água quente, que fica em um depósito dotado de resistência
elétrica e um termostato que regula a temperatura e o funcionamento de uma
bomba hidráulica.
Matéria orgânica em decomposição: é um sistema rudimentar, que consiste em
se colocar matéria orgânica, como esterco, restos vegetais, ou mistura destes, a
se decompor sob o substrato acondicionado em recipientes ou sob leitos de
sementeira ou de enraizamento, ou mesmo distribuídos pelo interior de
pequenas instalações. A quantidade de matéria orgânica e a espessura do
substrato precisam ser bem dimensionadas, para evitar super aquecimento; mas
se bem conduzido, é um sistema que fica praticamente de graça, além de

66
resultar na compostagem da matéria orgânica, que será depois utilizada pelas
próprias plantas. Pode ser empregado com vantagem para a germinação de
sementes ou enraizamento de estacas no período frio do ano, de modo a ter
plantas prontas para transferência para o local definitivo no início do período
chuvoso, antecipando assim o início de colheita de espécies como o quiabo, que
exigem temperaturas elevadas para germinar e atingem preços elevados no
início da safra.
Canos de aquecimento: consiste em canos de metal dispostos internamente na
instalação, contornando-a ao longo das paredes e próximo ao nível do piso. O
aquecimento pode ser feito fazendo circular vapor d’água, água quente ou ar
quente no interior dos canos. O controle da temperatura é feito com termostato.
Quando se usa vapor d’água, este é gerado externamente em uma caldeira.
Quando se usa água quente, esta fica num depósito no interior da instalação e é
circulada por uma bomba hidráulica, passando por um aquecedor elétrico. O
aquecimento a gás é mais econômico e o emprego de aquecedor solar para o
aquecimento da água, que seria mantida em um depósito subterrâneo, no
interior da instalação, pode tornar o sistema ainda mais econômico. O uso de ar
quente é menos eficiente, devido à sua baixa capacidade de transporte de calor.
Quando o aquecimento exige a queima de combustível, como gás, óleo e
carvão, a fonte de aquecimento deve ficar externamente à instalação, já que a
queima incompleta destes combustíveis internamente pode gerar etileno ou
monóxido de carbono, prejudiciais às plantas.
Cabos de aquecimento: é semelhante ao sistema anterior e mais simples,
utilizando resistência elétrica em substituição aos canos metálicos. É muito
prático, porém o custo da energia elétrica é elevado. Por isso, seu emprego é
recomendado apenas para o aquecimento de leitos de sementeira ou de
enraizamento.
B. Sistemas de controle da iluminação:
O controle da iluminação nas instalações de propagação visa dois
objetivos: controle da intensidade luminosa e controle do fotoperíodo.

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O controle da intensidade luminosa em geral tem como objetivo a redução
da radiância, necessário quando se cultivam "plantas de sombra", como
orquídeas, samambaias e outras plantas ornamentais de interior, guaraná na
fase de sementeira e outras. Os sistemas de controle utilizados com esta
finalidade são: a pintura da cobertura transparente e a cobertura com tela de
nylon, já descritas na discussão dos sistemas de controle da temperatura. A
intensidade da redução através da pintura com água de cal pode ser regulada
através da espessura da camada de tinta; com a tela de nylon de cor cinza, a
redução se faz com a escolha adequada da mesma, que pode excluir entre 30 e
80% da incidência de luz
O controle do fotoperíodo é feito com dois objetivos: visando aumentar o
número de horas de luz, de modo a criar a condição de "dia longo", ou diminuir o
número de horas de luz, de modo a criar a condição de "dia curto", o que utiliza
artifícios diferentes.
Para a criação da condição de dia longo, na realidade utiliza-se um
artifício para reduzir o comprimento da noite, por meio da iluminação da
instalação com lâmpadas elétricas, entre as 10 h da noite e as 2 h do dia
seguinte, num total de 4 horas e necessitando para isso de uma irradiância
muito baixa. Um detalhe importante para se obter o resultado desejado, é que a
temperatura não pode ser muito alta, já que as plantas nesta condição não
respondem ao estímulo. Por este motivo, o artifício é apropriado para ser usado
em climas mais amenos, com temperaturas noturnas não muito elevadas, como
nas regiões serranas; ou então utilizando algum sistema artificial de
resfriamento, já que o artifício é usado nos períodos de dias longos e, portanto
mais quentes.
Para criar a condição de dia curto o artifício consiste em se cobrirem as
plantas com tecido preto, entre as 18 h e 8 h da manhã do dia seguinte.
Também neste caso a temperatura ambiente precisa ser amena. A cobertura se
faz sobre uma estrutura de canos plásticos estendidos ao longo dos canteiros,
sobre os quais o pano é estendido e desliza de uma extremidade a outra dos
canos. A operação é realizada por dois operários, que movimentam o pano

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segurando nas duas extremidades do mesmo. Em instalações mais sofisticadas,
de regiões de mão de obra cara, esta operação é feita com motores situados
nas extremidades dos canteiros.
C. Sistemas de controle da umidade relativa do ar:
A umidade pode afetar as plantas de duas formas: através da umidade
relativa do ar (UR) e da umidade do substrato. Alguns sistemas de controle
modificam a umidade dos dois ambientes ao mesmo tempo, enquanto outros
atuam sobre apenas um deles, sem afetar praticamente o outro.
Dentre os sistemas utilizados com a finalidade principal de molhar o
substrato, alguns elevam também a umidade relativa do ar e outros não a
afetam significativamente, sendo todos considerados sistemas de irrigação.
Apenas dois dos sistemas de controle de umidade não afetam
substancialmente a umidade do substrato e são utilizados no controle da
umidade relativa do ar em estruturas de propagação de plantas: o sistema de
nebulização e o sistema de atomização ou "fogger".
Sistema de nebulização: é um sistema que lança no ar gotículas de água
menores do que as gotículas produzidas pelo sistema de microaspersão, as
quais permanecem no ar por algum tempo, evaporando em parte e, com isto,
aumentando a UR, além de parte delas se condensarem à superfície das plantas
e do substrato. O nebulizador tem a mesma estrutura de um microaspersor,
porém com uma distância menor entre o anteparo que intercepta o jato de água
e o orifício de saída, desta forma estreitando a passagem do líquido, que sai
com maior pressão, o que reduz o tamanho das gotículas. No momento da
nebulização a UR atinge 100% e vai caindo gradativamente até o momento da
nova nebulização. A amplitude da flutuação da UR e o umedecimento do
substrato serão menores, quando a duração da nebulização e o turno de rega
forem também menores, e vice-versa. O controle das nebulizações se faz com
um comutador, regulado para irrigar, por exemplo, por 30 segundos, a intervalos
de 3 minutos. Quando a água já é fornecida com pressão, o comutador controla
a abertura e fechamento de uma válvula solenóide; no caso de água sem
pressão, ele regula o funcionamento de uma bomba hidráulica. A regulagem das

69
regas pode ser também feita com uma folha eletrônica, ou com a combinação de
um sensor de umidade que liga o sistema sempre que a UR cair abaixo de um
limite escolhido, e um temporizador que desliga o sistema após um período pré-
determinado de funcionamento.
Quando o sistema é instalado em ambiente externo, sobre leitos de
enraizamento, este deve ser circundado por painéis de lona plástica
transparente, criando uma câmara de cerca de 80cm de altura (chamada
câmara de nevoeiro ou câmara de nebulização), para evitar a deriva causada
pelo vento, mas com a parte superior aberta, para a perda do vapor produzido a
cada nebulização. Desta forma, evita-se a queda das partículas de água em
excesso e a consequente umidificação do substrato, além de promover
abaixamento da temperatura, pela evaporação contínua da água das
nebulizações sucessivas no ambiente.
Sistema de atomização: é o sistema mais moderno, embora mais caro, de
controle da umidade relativa do ar, o qual trabalha com pressão elevada e reduz
as gotículas de água a dimensões tão diminutas que a neblina produzida
permanece em suspensão no ar, sem cair, sendo conduzida para fora do
ambiente por ventiladores colocados na parede oposta à do atomizador, que fica
em uma das extremidades da instalação. Esta característica permite manter a
UR a 100% por todo o tempo, além de não umedecer o substrato, com a
vantagem adicional de reduzir a temperatura do ambiente.

3. Sistemas de produção de mudas:

3.1. A campo.
3.2. Sob estruturas de proteção.
3.3. Cultivo in vitro.

Devido aos avanços científicos na área de Horticultura e ao aparecimento


de novas doenças e pragas, bem como ao crescimento do mercado
internacional de mudas, que exigem mudanças constantes nas técnicas de
produção, embalagem e transporte, a tecnologia de produção de mudas tem
evoluído continuamente. O desenvolvimento de novas tecnologias, contudo, não

70
resultou no abandono completo de técnicas tradicionais. Desta forma,
tecnologias de produção de mudas, com diferentes níveis de sofisticação,
coexistem normalmente em diferentes regiões, ou mesmo numa mesma área
geográfica, constituindo diferentes sistemas de produção. Desta forma,
dependendo do grau de controle dos fatores do ambiente proporcionado aos
propágulos, podem-se distinguir dois principais sistemas de produção de mudas:
produção em viveiro e produção em laboratório.
A produção em viveiro pode ser classificada, em função do grau de
exposição das plantas aos fatores ambientais, em: produção a pleno sol (ou a
campo), e produção sob estruturas de proteção; quanto ao suporte sobre o qual
as mudas são instaladas, a produção em viveiro pode ser: no solo, ou em
recipientes.
A técnica de produção de mudas a pleno sol, é mais simples do que a
produção sob estruturas de proteção, e em geral era feita utilizando o plantio da
muda diretamente no solo, mas hoje já é comum a produção a campo em
recipientes. A produção da muda sob estruturas de proteção está associada à
produção em recipientes.
A produção em laboratório, conhecida como cultura de tecidos, é uma
tecnologia mais sofisticada, que vem se desenvolvendo muito nas últimas
décadas, com algumas vantagens sobre as tecnologias tradicionais, como a
possibilidade de produção de mudas em larga escala, em menores espaços e a
curto prazo, além de permitir a produção de mudas com elevado grau de pureza
genética e biológica, mas tendo como principal desvantagem a necessidade de
investimentos iniciais elevados em infra-estrutura, o que resulta também em
custo mais elevado. Daí não ser ela economicamente vantajosa em muitos
casos, mas altamente vantajosa em outros, no caso de espécies com problemas
genéticos ou fitossanitários, ou ainda com dificuldade de propagação por
métodos assexuais.

3.1. Campo.

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É o sistema de produção mais simples e, por isto mesmo, o que requer
menor capital inicial, por não exigir instalações sofisticadas. Por esta razão, é o
sistema de produção de mudas mais amplamente utilizado por viveiristas menos
qualificados tecnicamente, embora ele não dispense o conhecimento de
detalhes técnicos que são da maior importância para a produção de mudas de
boa qualidade. É o sistema mais utilizado tradicionalmente para a produção de
mudas das chamadas “plantas de sol”, que são plantas que suportam a
incidência da luz direta do sol em todas as fases da vida. Esta categoria reúne a
maioria das plantas lenhosas de viveiro, tanto as de clima tropical quanto as de
clima subtropical e temperado.
Neste sistema as mudas podem ser produzidas diretamente no solo com
torrão ou raiz nua, método em desuso na produção comercial de mudas; ou em
recipientes.

3.2. Sob estruturas de proteção.


Neste sistema as mudas são produzidas geralmente em recipientes sob
estruturas de proteção.
Vantagens da produção de mudas em recipientes:
- Permite o não depauperamento dos solos agricultáveis.
- Permite o uso de uma mistura especial de substratos, o que possibilita
um melhor desempenho da muda.
- Permite aumentar o número de mudas a produzir por unidade de área,
proporcionando rendimento maior e, por conseguinte, reduzindo os custos
de produção.
- Permite a condução do processo produtivo de mudas dentro de ripado,
de estufim, de casa de vegetação, de telado, ou a condução desse
processo ao nível da superfície do solo ou num plano elevado o que,
nesse caso, permite a produção de mudas em áreas contaminadas por
fitoparasitas de solo.

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- Permite a supressão de certos tratos culturais, como o arranquio de
muda, a redução no uso ou gasto de determinados insumos agrícolas, de
modo a possibilitar maior lucratividade.
- Permite um longo período de comercialização.
Desvantagens da produção de mudas em recipientes:
- Exige sistemas especiais de irrigação.
- Exige cuidados especiais com o sistema radicular.

3.3. Cultivo in vitro:


É a técnica que consiste em se cultivarem plantas ou partes de plantas,
tais como órgãos completos, tecidos ou células in vitro. A expressão "cultura de
tecidos" é de natureza restrita, se considerada literalmente, MAS na realidade ela é
usada genericamente para englobar diferentes técnicas de cultura de células,
tecidos e órgãos, tendo em comum o fato de serem efetuadas sob condições
controladas, utilizando meio nutritivo especial e ambiente asséptico.
As células, tecidos e órgãos utilizados para iniciar a cultura in vitro
recebem o nome de explantes. Teoricamente toda e qualquer parte da planta pode
ser utilizada como explante, entretanto há determinados tecidos que são mais
responsivos e dão melhores resultados em determinadas espécies. De modo
geral, explantes que apresentam tecido meristemático, como gemas apicais e
axilares são os mais utilizados.
O meio nutritivo ou meio de cultivo é constituído por uma combinação de
sais minerais (macro e micronutrientes), fonte de carbono, vitaminas, aminoácidos,
reguladores de crescimento, e outros aditivos dependendo do objetivo do trabalho.
O cultivo in vitro é um cultivo em condições assépticas, ou seja, isento de
fungos, bactérias e outros microrganismos que possam competir com os
explantes, prejudicando seu desenvolvimento.
Para um melhor desenvolvimento dos explantes, o cultivo in vitro é feito,
normalmente, em um ambiente com temperatura e luminosidade (qualidade,
intensidade e fotoperíodo) controladas.

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A cultura de tecidos se fundamenta na teoria da totipotência da célula,
postulada por dois biólogos alemães Schleiden & Schwann, em 1838. Segundo
essa teoria "os seres multicelulares encerram em cada uma de suas células toda a
informação genética necessária para a formação de um indivíduo completo".
As técnicas de propagação em laboratório, a cada dia assumem maior
importância, tanto comercialmente quanto como auxiliar ao trabalho de
cientistas, por permitirem novas alternativas de manipulação de plantas, tecidos
e células vegetais em laboratório e assim resolver problemas antes insolúveis
pelas técnicas convencionais, ou fazê-lo de maneira mais econômica ou mais
rápida.

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4. Propagação seminífera:
4.1. Considerações gerais sobre os órgãos reprodutivos vegetais.
4.2. Apomixia.
4.3. Obtenção das sementes.
4.4. Colheita, processamento e conservação de sementes.
4.5. Dormência e seu controle.

4.1. Considerações gerais sobre os órgãos reprodutivos vegetais:


O corpo do vegetal se divide em órgãos vegetativos (raízes, caules e
folhas) e em órgãos reprodutivos (flores). Os ovários das flores dão origem aos
frutos e os óvulos contidos em seu interior dão origem às sementes. Estas por
sua vez abrigam os embriões das novas plantas.
Como o mecanismo de formação dos embriões zigóticos, que constitui a
regra geral na semente, envolve segregação e recombinação genéticas, as
novas plantas formadas por esta via serão geneticamente diferentes dos
progenitores e também diferentes entre si, no caso de plantas alógamas; e estas
diferenças serão tanto maiores quanto maiores forem as taxas de alogamia
apresentadas pelos progenitores. No caso de plantas autógamas, porém, as
novas plantas formadas por esta via serão, como regra geral, geneticamente
iguais entre si e iguais aos progenitores. Todavia, nem sempre o embrião
existente na semente é de natureza zigótica, ou seja, proveniente do processo
sexual. Há espécies, como nos gêneros Citrus, Mangifera e outros, nos quais
embriões de origem assexual ocorrem até com maior freqüência, como é o caso
dos embriões nucelares na maioria das espécies cítricas. Além destes, há ainda
outras formas, embora menos freqüentes, através das quais podem surgir
embriões na semente, pela via assexual, fenômeno este denominado de
“apomixia”, mas cuja definição se apresenta confusa na literatura técnica e
científica.

4.2. Apomixia.
Os termos que caracterizam as diferentes vias por meio das quais os
embriões podem se originar na semente diferem de acordo com a opinião de
diferentes autores, gerando certa confusão na literatura (Kolturnow, 1993). Além

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disto, a evolução da ciência da propagação, principalmente na área de
biotecnologia, trouxe novas noções que modificam a amplitude e precisão de
termos criados no passado. As discrepâncias neste sentido começam com a
abrangência do termo apomixia, que foi definida por Winkler, em 1908 (citado
por Maheshwary, 1950), como: “a substituição da reprodução sexual (anfimixia)
por um processo que não envolve nenhuma fusão nuclear”. Na visão de Nygren
(1967) esta definição engloba todas as formas de propagação assexual,
inclusive aquelas que nada têm a ver com embriogênese de qualquer natureza;
já outros a consideram abrangendo apenas a formação de embriões na
semente, pela via assexual (Koltunow, 1993; Maheshwary, 1950).
Acrescentando-se a estes casos, aqueles termos relacionados com a
embriogênese obtida artificialmente in vitro, a partir de cultura de pólen ou de
células somáticas, as divergências aumentam.
Tendo como base o ponto de vista de Maheshwary (1950), com o qual
concordam os autores, considerando que o termo apomixia se refere apenas à
formação de embriões na semente, e não a qualquer via assexual de
propagação, pode-se considerar que os embriões se originam basicamente de
duas maneiras, conforme visto no quadro 1: pela via sexual, que consiste na
fusão de gametas, fenômeno ao qual se denomina anfimixia; e pela via
assexual, ou seja, sem a fusão de gametas, fenômeno denominado apomixia. A
apomixia, por sua vez pode ser dividida em três tipos: apomixia não recorrente,
apomixia recorrente e embriogenia adventícia. Na apomixia não recorrente, a
célula-mãe do megásporo sofre a redução meiótica normal e forma um saco
embrionário haplóide, sendo que o embrião apomítico pode se originar tanto da
oosfera (partenogênese haplóide) quanto de qualquer outra célula do saco
embrionário (apogamia haplóide). Na apomixia recorrente o saco embrionário é
diplóide, por originar-se de uma célula-mãe do megásporo que não sofreu a
redução meiótica, ou de uma célula do nucelo, sendo que o embrião apomítico
neste caso também pode se originar da oosfera (partenogênese diplóide), ou de
qualquer outra célula do saco embrionário (apogamia diplóide). Na embriogenia
adventícia, os embriões apomíticos se formam a partir de células somáticas de

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tecidos externos ao saco embrionário (nucelo e integumentos). Os embriões
provenientes de células do nucelo recebem o nome de embriões nucelares.

Quadro 1. Propagação seminífera ou generativa


___________________________________________________________
1. Anfimixia
2. Apomixia ----| Apomixia não recorrente --| Partenogênese haplóide
| Apogamia haplóide

| Apomixia recorrente---| Partenogênese diplóide


| Apogamia diplóide

| Embriogenia adventícia
___________________________________________________________

Em vista disto, observa-se que, no caso de espécies que produzem


embriões apomíticos, as plantas originadas de tais sementes podem ser
geneticamente iguais ou diferentes da planta matriz, dependendo do tipo de
célula que as originou.
No caso dos embriões nucelares, como eles provêm sempre de células
somáticas, eles serão sempre, teoricamente, geneticamente iguais à planta
matriz, a menos que ocorra alguma mutação prévia na célula inicial que deu
origem ao embrião, o que não é raro acontecer. A formação de embriões
adventícios a partir de células do nucelo é muito difundida nos gêneros Citrus e
Mangifera, além de algumas outras espécies. Neste caso, o estímulo é causado
pela polinização, havendo dúvidas sobre se há necessidade de fecundação ou
não. Se acontecer a fecundação, resultará a formação também de um embrião
zigótico, além do embrião ou embriões nucelares.

Na maioria das vezes, a apomixia resulta na poliembrionia, que é o


fenômeno da formação de mais de um embrião por semente. Além da

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embriogenia adventícia, há duas outras causas de poliembrionia: a clivagem do
embrião zigótico produzindo “gêmeos idênticos” e a formação de mais de uma
oosfera no saco-embrionário.
Independentemente do tipo do embrião, se zigótico ou apomítico, as
plantas resultantes do método seminífero são sempre vigorosas, desde que as
sementes também o sejam; além disso, elas podem ser livres de patógenos
sistêmicos, numa taxa que varia de acordo com a espécie. As técnicas de
colheita, processamento e armazenagem mais adequadas a cada espécie vai
depender da longevidade de suas sementes.
Todavia, a situação do viveirista neste sentido é bem especial, uma vez
que grande parte do material de propagação que ele utiliza não são sementes
botânicas, mas sim propágulos de natureza vegetativa. Além disso, parte das
sementes botânicas das plantas de viveiro é adquirida de firmas especializadas
na produção de sementes, o que deixa o viveirista livre de preocupações, desde
que as adquira de firmas idôneas. Por outro lado, uma boa parte das sementes
das plantas de viveiro é do tipo recalcitrante, que mantêm o poder germinativo
por muito pouco tempo, não sendo por isto produzidas e comercializadas por
firmas especializadas e precisam ser obtidas de fontes não convencionais ou
produzidas pelo próprio viveirista.
Pelo exposto, fica evidente a necessidade de se conhecer bem as
características da espécie ou espécies que se desejar propagar, quando se quer
controlar ao máximo a qualidade do material de propagação, visando à
perpetuação de características desejáveis nos descendentes.

4.3. Obtenção das sementes.


Uma grande parte das plantas cultivadas, principalmente as anuais, e
também algumas perenes como o mamoeiro e as plantas florestais, são
propagadas por meio da semente. Mesmo entre as fruteiras e outras plantas
perenes propagadas por enxertia, a produção de porta-enxerto é feita
geralmente por meio da semente, sendo também importante o controle da
qualidade destas. No caso de grande parte das hortaliças, muitas plantas

78
ornamentais e cereais, cujas sementes são em geral do tipo ortodoxas e podem
ser conservadas por mais de um até 15 anos, sem perda do poder germinativo,
a sua produção é feita por firmas especializadas, que as armazenam por longos
períodos e as comercializam a nível nacional e até mesmo internacional. Em tais
casos, a obtenção de sementes fica facilitada, bastando para isto selecionar
uma firma idônea dentre as muitas que operam no mercado. No caso da maioria
das espécies frutíferas lenhosas como mangueira, abacateiro, citros, jaqueira,
lichia, muitas palmeiras, caquizeiro, nozes macadâmia e pecan, além de chá,
seringueira, magnólia, guaraná, mangaba, entre outras, as sementes são
classificadas como “de curta duração” ou recalcitrantes, mantendo a viabilidade
por 1 ano ou menos, podendo ser até mesmo por poucos dias, quando
armazenadas mesmo com os maiores cuidados. Por este motivo, não é comum
tais sementes serem produzidas por firmas especializadas, precisando o
viveirista produzir a sua própria semente.
Devido à importância da qualidade da semente para se obter o máximo
resultado em qualquer exploração agrícola, a sua produção é uma atividade
especializada, que exige formação específica para o exercício da atividade. Por
este motivo, a técnica de produção de sementes, conforme praticada por
empresas especializadas, não será alvo de discussão neste trabalho. Esta
apostila abordará apenas as precauções que o viveirista deverá tomar ao
adquirir sementes de terceiros, bem como a técnica e os cuidados que ele
deverá tomar na produção de sua própria semente, com ênfase na colheita,
processamento e conservação de sementes recalcitrantes.
Nos casos em que as sementes de plantas de viveiro são
comercializadas por terceiros, é muito importante que o rótulo do produto traga
informações sobre o lote produzido, tais como espécie e variedade, teste de
viabilidade com data da realização e data de colheita. No caso de plantas
perenes e algumas outras espécies, mesmo anuais, com exigências climáticas
específicas, é importante obter informações também sobre estes detalhes.
Certas espécies que se distribuem por vastas áreas, como ocorre com espécies
florestais (Heit, 1964; Haddock, 1968), podem apresentar raças ou ecotipos

79
adaptados a regiões específicas e não se comportam bem em outras, devido a
exigências de clima, solo, susceptibilidade a pragas e doenças endêmicas, além
de outros problemas que podem limitar a cultura na área. Nestes casos, seria
prudente optar por sementes produzidas na própria região.
No caso de sementes de porta-enxerto de fruteiras como citros,
abacateiro, pessegueiro, mangueira, goiabeira e outras, bem como para
obtenção de “pés-francos” de goiabeira, mamoeiro, eucalipto e outras espécies
florestais, é comum o viveirista produzir a sua própria semente. Neste caso, é
freqüente a obtenção de sementes de plantas silvestres ou de pomares
comerciais, sem nenhum controle especial, constituindo uma maneira fácil e
barata, todavia desaconselhável, pelos riscos implicados, a menos que se possa
fazer uma avaliação prévia das plantas escolhidas como matrizes.
Para se garantir a produção de sementes de qualidade superior,
recomenda-se a formação de pomares matrizes com plantas de origem
conhecida, previamente testadas quanto às características desejáveis e obtidas,
de preferência, por propagação vegetativa e tratadas tecnicamente quanto à
adubação, controle fitossanitário e outros cuidados culturais. Além disso, o
produtor de sementes deve estar atento para a possível ocorrência de variações
genéticas nas plantas matrizes. Embora a probabilidade da ocorrência de
mutação de gemas seja muito baixa, ela pode acontecer e dar origem a um
ramo com alguma característica genética diferente. Se a nova característica
surgida for negativa, o ramo deve ser eliminado; se for positiva, ela deve ser
salva por algum método de propagação vegetativa e constituir uma nova cultivar.
Todas as cultivares de laranja doce existentes, a maior parte dos pomelos,
algumas cultivares de macieira e de muitas outras espécies surgiram desta
forma. Portanto, o cuidado neste sentido pode não só evitar problemas futuros
como também resultar em vantagens imediatas, já que a Lei de Registro de
Cultivares vigente no Brasil e outros países, garante ao criador de cultivares a
sua propriedade por muitos anos, com lucros que podem ser substanciais.
No caso de espécies sujeitas à infecção por patógenos sistêmicos, as
matrizes devem ser localizadas a mais de 20 m de outras plantas que possam

80
ser portadoras dos mesmos. Plantas sem importância econômica, hospedeiras
de pragas e doenças comuns às plantas matrizes, devem ser erradicadas das
proximidades. Além disso, devem ser tomados os cuidados necessários para se
evitar ou promover a polinização cruzada, nos casos em que isto for necessário
(AOSCA, 1971).
Em espécies como o mamoeiro, com elevado grau de alogamia, a
identidade da cultivar só será mantida através da polinização controlada das
matrizes. Todavia, no caso de espécies alógamas com alta taxa de
poliembrionia, como ocorre com os citros em geral e muitas cultivares de manga,
a preocupação com polinização natural ou controlada é desnecessária.
Sementes de porta-enxerto de espécies como mangueira, goiabeira,
macieira, pessegueiro, pereira e algumas outras podem ser obtidas, em maior
escala, de indústrias de conserva. É uma fonte barata de tais sementes, embora
haja riscos quanto à qualidade genética do material, bem como nos casos de
espécies susceptíveis a patógenos sistêmicos transmitidos pela semente (Childs
e Johnson, 1966), por não se conhecer a origem dos frutos. Além disso, é
preciso certificar-se de terem as sementes sido extraídas dos frutos antes destes
passarem por qualquer operação que possa prejudicar o seu poder germinativo
e não terem elas ficado amontoadas por longo tempo, sujeitas a desidratação
excessiva ou fermentação.

4.4. Colheita, processamento e conservação de sementes:


Colheita:
Quando a semente é obtida diretamente da planta matriz, o ponto ideal
para a colheita dos frutos pode variar com a espécie. No caso de espécie
produtora de frutos comestíveis, o ponto ideal é aquele em que o fruto se
encontra completamente maduro, no ponto de colheita para o consumo. Neste
ponto a semente em geral está completamente desenvolvida, com o máximo de
reservas acumuladas e o embrião apto a germinar. Algumas espécies
constituem exceção, estando os embriões já completamente desenvolvidos
antes mesmo dos frutos atingirem a maturação completa. Neste caso, às vezes

81
há vantagem em se colher os frutos antes de estarem completamente maduros
(Garner, 1976). Em outras espécies ocorre o contrário: quando os frutos já estão
completamente maduros, os embriões ainda não atingiram seu desenvolvimento
completo. Neste caso, os embriões necessitam de um período de pós-
maturação para se tornarem aptos a germinar (Lipe e Crane, 1966). Para
espécies produtoras de frutos secos, deiscentes, a colheita deve antecipar a
abertura dos frutos. Desta forma, é importante conhecerem-se as
particularidades de cada espécie, para se fazer a colheita dos frutos no
momento adequado. Colheita antecipada pode resultar em sementes inaptas a
germinar; por outro lado, colheita retardada pode resultar em formação de
envoltórios muito duros, que retardam a germinação da semente, ou em
fermentação da polpa do fruto, com a conseqüente morte de muitos embriões,
ou ainda a queda de frutos ao solo, resultando na contaminação das sementes
por patógenos de solo, além da perda de sementes pela deiscência de frutos
secos.
A técnica de colheita vai depender do tipo de fruto e altura da árvore, mas
em geral é feita manualmente. Os frutos não devem cair ao solo, mas serem
recolhidos em sacos de colheita, ou amparados com rede ou lona estendida sob
a copa da árvore, e colocados em recipientes limpos. A contaminação dos frutos
durante a colheita pode afetar a sanidade das sementes durante o
armazenamento e até mesmo das plântulas delas originadas (Platt e Opitz,
1973). A falta deste cuidado na produção de sementes de porta-enxerto de
citros, por exemplo, pode resultar em elevadas perdas na sementeira, causadas
por fungos de solo que contaminam os frutos no momento da colheita e passam
às sementes durante o seu processamento.
Processamento:
A eliminação da polpa de frutos carnosos em geral deve ser feita logo
após a extração das sementes. Em alguns casos esta separação já acontece
naturalmente durante a operação de extração.
Os frutos podem ser cortados e espremidos manualmente, ou então
dilacerados mecanicamente. Dependendo do volume de frutos e da espécie, a

82
extração pode ser feita com extratores especiais, despolpadores industriais, ou
outros equipamentos adaptados. Para frutos tenros e de sementes pequenas,
como o tomate, pode-se conseguir bons resultados com o uso de liquidificador
doméstico, cuja hélice tenha sido substituída por um pedaço de borracha de
pneu, com 10 cm de comprimento (Smith, 1950). Frutos cítricos, maracujá e
outros semelhantes podem ser dilacerados de maneira satisfatória, passando-os
por um debulhador manual de milho.
Frutos secos, deiscentes, devem ser deixados a secar por algum tempo,
para se abrirem naturalmente e soltarem as sementes. Frutos secos,
indeiscentes, precisam ser partidos manualmente ou com máquinas
apropriadas.
A separação da polpa pode ser feita manualmente, usando-se peneira e
água. A separação mecânica se faz por decantação, ou então por máquinas
providas de peneiras ou de ventiladores, para o caso de frutos secos. Outra
técnica de separação da polpa é deixá-la fermentar por algumas horas ou dias,
no fim dos quais a semente e polpa se separam naturalmente. É usada com
vantagem para alguns frutos, como o tomate, mas prejudicial ao poder
germinativo de sementes de algumas outras espécies, como no caso do
pêssego (Haut e Garner, 1934).
A secagem é uma operação imprescindível à conservação de semente de
“duração média” ou ortodoxas (1 a 15 anos) destinadas à comercialização, mas
desnecessária para sementes de “curta duração” ou recalcitrantes, a serem
usadas imediatamente pelo próprio viveirista, que é o caso mais comum.
Sementes de vida extremamente curta como as de guaraná, mangaba, manga e
outras espécies tropicais, que começam a perder a viabilidade logo em seguida
à colheita, não devem nem ser submetidas a esta operação e devem ser
semeadas imediatamente após a extração do fruto. Quando sementes de “curta
duração” precisam ser guardadas por algum tempo, a secagem é necessária,
mas deve ser feita de maneira muito cuidadosa, pois tais sementes não
suportam desidratação além de certos limites.

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A secagem pode ser feita ao ar livre, sobre superfície limpa, normalmente
forrada com folhas de jornal, e à sombra, em camada fina, podendo a operação
durar alguns dias. No caso de sementes que suportam maior taxa de
desidratação, a secagem mais rápida, de maiores quantidades de sementes, é
conseguida com o uso de ventilação forçada por máquinas secadoras providas
de ventiladores que sopram ar frio ou quente sobre as sementes, de modo a
promover a secagem rápida do envoltório, sem desidratar excessivamente o
embrião. A temperatura do ar quente deve ser de 32 0C (Hartman e Kester,
1975).
Após a secagem, as sementes devem ser polvilhadas com fungicida, para
depois serem embaladas. Mesmo sementes destinadas ao plantio imediato
devem ser tratadas com fungicida, que as protegerá por algum tempo contra
fungos do solo. Em alguns casos, sementes como as de citros são submetidas a
um tratamento térmico, para a eliminação de fungos que já tenham penetrado no
tegumento. Estas, após a separação da polpa e lavagem das sementes, são
imersas por dez minutos em água sob agitação, a 51,7 0C (Klotz et al., 1960;
Nauer e Roistacher, 1962), sendo depois secadas e tratadas com fungicida.
Conservação das sementes:
O teor de umidade da semente, a temperatura e a composição da
atmosfera de armazenamento são os três fatores principais que afetam a
viabilidade das sementes (Hartman e Kester, 1975). Este fatores atuam sobre a
taxa de respiração e, conseqüentemente, sobre a rapidez com que se
desenvolve a deterioração dos tecidos da semente, além de atuarem também
sobre o desenvolvimento de insetos e microorganismos, bem como sobre a sua
germinação precoce.
O teor de umidade da semente está em equilíbrio com a Umidade
Relativa do ar (UR) e afeta diferentemente as sementes. Sementes de longa
duração preferem baixo teor de umidade (4 a 6%), enquanto sementes de curta
duração são mais bem preservadas com teor de umidade mais elevada.
Alguns problemas surgidos no armazenamento estão relacionados com o
teor de umidade das sementes: acima de 8 % favorece o desenvolvimento de

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insetos; acima de 12 % favorece o desenvolvimento de fungos; acima de 18 %
pode ocorrer aquecimento; e acima de 40 % ocorre germinação (Harrington,
1963).
Com relação à temperatura do ar, temperaturas baixas são normalmente
favoráveis a conservação por reduzirem a taxa de respiração, além de se
contraporem ao efeito adverso da umidade elevada. Os limites mínimos ideais
variam com a espécie.
A composição atmosférica também afeta a conservação de sementes. O
teor de oxigênio no ambiente é um fator muito importante a considerar, por
afetar negativamente a viabilidade das sementes, através do estímulo à
respiração. Por este motivo, ausência de oxigênio constitui a condição ideal.
O armazenamento à temperatura ambiente é o mais simples e menos
eficiente. Este pode ser feito em recipiente aberto que é impróprio para
sementes de curta duração, mas adequado às de média e longa duração
(Hartman e Kester, 1975) ou em recipiente fechado que permite controle da
umidade e reduz a concentração de oxigênio. As sementes são colocadas em
latas, frascos de vidro, envoltórios de alumínio ou sacos plásticos, logo após a
secagem, e fechados hermeticamente. Todavia, não soluciona o problema das
sementes de curta duração.
A armazenagem em câmara fria, em temperaturas abaixo de zero é ideal,
porém entre 4 e 6 0C (temperatura de refrigeradores domésticos) são mais
empregadas, devido à maior economia de energia, sem perda considerável na
eficiência. Esta pode ser feita em recipiente aberto que dá bons resultados
quando as sementes são misturadas a substâncias higroscópicas, com 80 a 90
% de umidade, sendo conhecido como “armazenamento a frio-úmido”. Indicado
para castanha, citros, nêspera, lichia, abacate. É usado também como método
de quebra de dormência de sementes de espécies de clima temperado como
pêssego, maçã, uva e outras. Pode ainda ser feita em recipiente fechado onde
as sementes, após a secagem, são colocadas em recipientes fechados, na
câmara fria. Ideal para sementes de maçã, pêssego, uva e pinheiro, entre
outras. É o melhor tipo de armazenamento para pequenas quantidades.

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O armazenamento em atmosfera controlada consiste em colocar as
sementes em recipiente fechado, após a secagem, com a substituição do ar do
recipiente por CO2 ou um gás inerte como o nitrogênio. Tem dado bons
resultados com algumas sementes de plantas tropicais de muito curta duração e
vem sendo mais usado por empresas produtoras de sementes. Os resultados
são ainda melhores, quando os recipientes são mantidos a baixa temperatura.
Apesar destes artifícios, o aumento que se pode obter no prolongamento
da vida das sementes recalcitrantes é pequeno, sendo impossível ultrapassar os
limites ditados pela característica da espécie.

4.5. Dormência e seu controle.


Um dos mecanismos desenvolvidos por muitas espécies vegetais,
provavelmente como meio de sobrevivência a condições adversas, consiste na
formação, durante a fase de maturação da semente, ou mesmo após a sua
queda ao solo, de bloqueio ao reinício de desenvolvimento do embrião. Em
alguns casos a semente pode permanecer neste estado por vários anos, mesmo
quando submetida a condições ideais de germinação, a qual só ocorrerá se as
sementes forem submetidas previamente à ação de um agente físico, químico
ou biológico que remova o bloqueio à germinação.
A fase final de amadurecimento da semente caracteriza-se por uma
desidratação intensa dos tecidos e a conseqüente redução do metabolismo do
embrião a um mínimo necessário à manutenção da vida. Nesta condição o
embrião é denominado “quiescente”. Sementes quiescentes, sem problema de
dormência, uma vez colocadas em condições apropriadas de umidade,
temperatura, oxigênio e, às vezes, intensidade luminosa, se reidratam e a
germinação se inicia, período este caracterizado por um aumento da atividade
hormonal e enzimática da semente (Amen, 1968) e conseqüente conversão de
substâncias complexas de reserva em substâncias solúveis simples, que são
deslocadas em direção ao embrião, onde serão, ou oxidadas através da
respiração para a liberação de energia, ou utilizadas na síntese de novos
compostos (Hess, 1968).

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Nas sementes com problema de dormência, o mecanismo de reidratação,
de absorção de oxigênio, ou ainda de reinício da atividade hormonal ou
enzimática fica bloqueado, impedindo a germinação, mesmo se as sementes
forem submetidas a condições apropriadas. Desta forma, a dormência pode ser
definida como sendo “o estado em que a semente, embora viável e submetida a
condições ambientais favoráveis, se encontra incapaz de germinar”.

4.5.1. Tipos de dormência:


Os diferentes tipos de dormência podem ser agrupados de três maneiras
diferentes: em função do número de mecanismos atuando de uma só vez sobre
a semente (dormência simples e dupla), em função da época em que se forma o
mecanismo de bloqueio (dormência primária e secundária), ou ainda em função
da natureza deste mecanismo (dormência física e fisiológica).
Dormência simples e dupla: quando a semente está submetida a um
único mecanismo causador de dormência, esta se denomina dormência simples.
Quando dois mecanismos diferentes atuam de uma só vez sobre a semente,
causando dois tipos diferentes de dormência, esta se denomina dormência
dupla.
Dormência primária e secundária: a dormência cujo bloqueio se forma
durante a fase final de desenvolvimento da semente, e que parece ser
programada geneticamente (Sussex, 1978), é denominada dormência primária.
Um outro tipo de dormência, induzida por condições adversas do ambiente,
como temperatura elevada e falta de umidade ou de oxigênio, e que consiste na
criação de bloqueio à germinação de sementes que estavam aptas a germinar
antes de serem colocadas sob estas condições adversas, é denominada
dormência secundária.
Dormência física e fisiológica: a dormência física é causada pela
presença de envoltórios duros, mecanicamente resistentes à expansão do
embrião, ou então impermeáveis à água ou ao oxigênio, fatores estes
imprescindíveis ao processo de germinação. É muito comum entre as
leguminosas (Hess, 1968) e pode ser de três tipos:

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- Envoltórios mecanicamente resistentes: embora os embriões
intumescidos desenvolvam uma pressão enorme, capaz de romper envoltórios
muito resistentes, sementes de espécies como oliveira e outras, apresentam um
envoltório tão resistente que impede a expansão do embrião e,
conseqüentemente, a germinação;
- Envoltórios impermeáveis à água: plantas como alfafa, acácia e outras
leguminosas, solanáceas, convolvuláceas e geraniáceas, possuem sementes
com envoltório impermeável à água (Hartman e Kester, 1975), que impede a
embebição do embrião e, conseqüentemente, o estímulo ao início da atividade
enzimática necessária ao processo de germinação;
- Envoltórios impermeáveis ao oxigênio: embora a germinação de
sementes de plantas aquáticas seja inibida pelo oxigênio (Morinaga, 1926a;
1926b), suprimento adequado deste gás é imprescindível ao processo de
germinação das sementes de plantas terrestres. Nestas, a presença de um
envoltório impermeável ao oxigênio, em alguns casos mais raros (Kozlowski e
Gentile, 1959; Vegis, 1964), causa a dormência por meio da síntese de
inibidores (Roberts, 1964).
A dormência fisiológica é causada por fatores fisiológicos diversos,
desenvolvidos durante a formação da semente, ou, no caso de dormência
secundária, formados sob o estímulo de condições adversas do ambiente. As
principais causas de dormência fisiológica são: inibidores químicos, camadas
fisiologicamente ativas, embriões dormentes e embriões rudimentares:
Inibidores químicos: são hormônios e subprodutos do metabolismo da
planta com efeito inibidor da germinação, podendo se acumular na polpa do
fruto, nos envoltórios da semente ou mesmo no embrião, causando a dormência
(Amen, 1948). São comuns em polpa de frutos cítricos, pêra, maçã, tomate, uva
e outros frutos carnosos, ou mesmo secos (Hartman e Kester, 1975), bem como
no endosperma de sementes de Iris (Arditti e Pray, 1969). Há indicações de que
estes inibidores interferem com a atividade enzimática responsável pela hidrólise
das substâncias complexas de reserva, durante a germinação (Janick, 1968);

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Camadas fisiologicamente ativas: em muitas sementes, o integumento ou
o endosperma permanecem por algum tempo metabolicamente ativos, após a
maturação, afetando a germinação, aparentemente, por meio da modificação da
permeabilidade dos tecidos a gases ou regulando o balanço entre promotores e
inibidores de crescimento. Durante este período, tais sementes se caracterizam
por serem sensitivas a fatores do ambiente, como luz, (alface), temperatura,
gases e substâncias químicas, que influenciam o estado de dormência. Esta
atividade, porém, desaparece durante o armazenamento a seco (Toole et al.,
1956; Stearns e Olson, 1958);
Embriões dormentes: em pêssego, maçã e outras árvores de clima
temperado, o embrião completa o seu desenvolvimento morfológico juntamente
com as demais partes da semente. Todavia, permanece fisiologicamente
imaturo (dormente), incapaz de reiniciar o desenvolvimento quando submetido a
condições ambientais favoráveis à geminação (Weaver, 1972), a menos que
seja previamente submetido a um período de “pós-maturação”, para eliminação
do bloqueio. Resultados experimentais, com sementes de muitas espécies, têm
mostrado que a dormência do embrião está relacionada com balanço de
inibidores e promotores de crescimento (Lin e Boe, 1972; Mathur et al., 1971) e
que este balanço pode ser modificado por condições do ambiente, como
temperatura (Stewart e Semeniuk, 1965), umidade (Haut, 1932) e teor de
oxigênio (Vegis, 1964);
Embriões rudimentares: em certas palmáceas, magnoliáceas e
anonáceas, o embrião não atinge o desenvolvimento morfológico completo à
época em que a semente completa o seu amadurecimento (Hartman e Kester,
1975), necessitando um período úmido e de temperatura elevada para completar
o seu desenvolvimento (Giersbach e Crocker, 1929). Este período pode durar
meses ou anos, como no caso do dendê (Elaeis guineensis).

4.5.2. Pré-tratamento para quebra de dormência:


A evolução dos diferentes mecanismos de bloqueio à germinação
imediata das sementes não poderia ter ocorrido sem o desenvolvimento paralelo

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de diferentes mecanismos naturais para remoção destes bloqueios. Desta
forma, é sabido que, na natureza, os envoltórios de certas sementes
mecanicamente resistentes ou impermeáveis à água e oxigênio, perdem estas
propriedades devido a rachaduras que se formam nos mesmos, em
conseqüência das sucessivas contrações e dilatações sofridas por eles, como
resultado das diferenças de temperatura diurna e noturna. Além disso, o ataque
por microorganismos, a passagem através do tubo digestivo de pássaros e
outros animais, além da abrasão mecânica pelo atrito com pedras ou areia, ou
ainda a destruição pelo fogo das camadas superficiais do tegumento, levam ao
enfraquecimento e aumento da permeabilidade de envoltórios duros.
No caso de bloqueio à germinação, causado pela presença de inibidores
nas diferentes partes da semente, estes são eliminados por diferentes fatores do
ambiente, como temperatura, luz, gases ou lixiviação pela ação das chuvas,
dependendo do mecanismo que prevalece em cada espécie. No caso de
embriões sem endosperma, como ocorre com as orquídeas, é imprescindível a
simbiose com certos fungos micorrízicos que suprem a semente com os
nutrientes necessários à germinação.
Desse modo, cada mecanismo de dormência e sua posterior eliminação
desenvolveram-se em função das características da região onde a espécie
evoluiu, como mecanismo de defesa da planta contra a germinação da semente
em condições adversas à sobrevivência da plântula, o que deve ser levado em
conta sempre que se desejar estudar o problema de dormência em espécies
ainda não conhecidas.
Dentre as técnicas utilizadas para a quebra artificial de dormência em
sementes de plantas cultivadas, destacam-se as seguintes:
Remoção, escarificação mecânica ou quebra do envoltório: é utilizada
para o caso de sementes com envoltórios duros ou impermeáveis à água e ao
oxigênio. Envoltórios fibrosos, como nas sementes de manga, podem ser
cortados com tesoura de poda e removidos manualmente, enquanto envoltórios
duros, como o de pêssego, podem ser quebrados e removidos, manualmente,
com o auxílio de martelo ou torno. A remoção completa do envoltório pode ser

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substituída pela escarificação dos mesmos. Esta deve consistir apenas no
lixamento da superfície externa do envoltório, sem nenhuma necessidade de
penetração profunda, que pode causar danos ao embrião. Sementes grandes e
em pequenas quantidades, podem ser escarificadas manualmente, utilizando-se
lixa comum. Sementes pequenas e em maior quantidade, são vantajosamente
escarificadas por meios mecânicos. Para isto podem ser construídos
escarificadores mecânicos, constituídos de um cilindro fixo, na posição
horizontal, dentro do qual giram diversos discos, presos a um eixo central, a
500-900 rpm. Tanto os discos quanto a parte inferior interna do cilindro são
revestidos com lixa grossa, que faz a escarificação (Hartman e Kester, 1975).
Um simples cilindro, com a superfície interna revestida com lixa grossa, girando
a uma rotação tal que as sementes deslizem com certa rapidez sobre a lixa, faz
uma escarificação satisfatória. Na ausência de escarificadores apropriados, a
operação pode ser feita revolvendo as sementes misturadas à areia grossa ou a
pedregulho pequeno, em uma betoneira. Outra maneira satisfatória é socar as
sementes misturadas com areia, em almofariz ou recipiente similar, como feito
para soja perene e outras leguminosas.
Escarificação com ácido: é efetuada com ácido sulfúrico concentrado e
usada para sementes com envoltórios duros ou impermeáveis. Tem o
inconveniente de ser uma operação arriscada se não forem tomadas certas
precauções (Heit, 1957). O tempo de tratamento deve ser testado previamente,
pois varia com o tipo de semente e a concentração do ácido, podendo ir de 10
minutos a 8 horas. O ácido deve ser manuseado com cuidado, por ser altamente
corrosivo e reagir violentamente com a água, além de causar grande elevação
da temperatura. O vasilhame deve ser de plástico ou vidro e as sementes
revolvidas, sem agitação, a intervalos durante o tratamento. Usar duas partes da
solução, para cada parte de semente e lavar as sementes por 10 minutos em
água corrente, imediatamente após o fim do tratamento. A operação é
considerada eficiente quando os envoltórios se tornam extremamente finos,
sem, porém as partes internas da semente terem sido atingidas.

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Maceração em água: empregado para o amaciamento de envoltórios
mecanicamente resistentes, ou para remoção de inibidores localizados nos
envoltórios. As sementes são imersas em 4 a 5 vezes o seu volume em água, ou
colocadas sob água corrente. O tempo vai de alguns minutos a 24 horas. O
tratamento pode ser feito em água fria ou quente. Neste segundo caso, que dá
bom resultado para certas sementes, a água é aquecida a 77-100 0C, retirada do
fogo e as sementes nela imersas por 3 minutos a 24 horas. O êxito do
tratamento será indicado pelo intumescimento das sementes ao final da
operação.
Armazenamento a seco: consiste simplesmente em se manter as
sementes em armazém comum, à temperatura ambiente, sem nenhum
tratamento especial. Usado para sementes de muitos cereais, flores e hortaliças,
que apresentam camadas fisiologicamente ativas, por um período que pode ir de
alguns dias a meses, dependendo da espécie. A atividade dos tecidos
responsáveis pela dormência diminui gradativamente e desaparece com o
passar do tempo, sem necessidade de nenhum tratamento especial.
Estratificação a “frio-úmido”: usada para promover a pós-maturação de
embriões dormentes de muitas espécies perenes, originárias principalmente de
regiões de clima temperado. A pós-maturação do embrião só ocorrerá se ele for
submetido à ação conjunta de três fatores do ambiente: oxigênio, umidade e
temperatura pouco acima de zero grau centígrados, por certo período,
dependendo da espécie. A falta de qualquer destas condições impedirá que o
tratamento seja bem sucedido.
Temperaturas entre 2 e 7 0C são as mais recomendadas, variando com a
espécie. Diminuindo ou aumentado a temperatura fora deste intervalo, serão
atingidos um limite inferior e um superior além dos quais a pós-maturação do
embrião não mais ocorrerá e a semente entrará em dormência secundária
(Abbott, 1955; Semeniuk e Rom, 1962). Estas temperaturas, chamadas “de
0
compensação”, são consideradas como sendo em torno de -5 e 17 0C,
respectivamente, variando com a espécie (Stewart e Semeniuk, 1965). Da
mesma forma, a umidade e o arejamento adequados das sementes são

92
necessários à quebra da dormência. Se faltar umidade (Kamininski e Rom,
1973) ou oxigênio (Vegis, 1964) durante o período de tratamento a frio, as
sementes entram em dormência secundária.
Os fatores responsáveis pela dormência estão localizados em diversas
partes da semente e têm um efeito quantitativo. Se o tratamento não tiver
duração suficiente para a remoção completa do bloqueio, os embriões poderão
germinar precariamente e produzir plantas deformadas e com crescimento
limitado, sendo denominadas “plantas anãs fisiológicas”. Todavia, elas poderão
se tornar plantas normais, se voltarem à câmara fria pelo número de horas
necessário à complementação do tratamento.
A duração do tratamento das sementes está relacionada com a exigência
em frio hibernal da espécie ou cultivar (Westood e Bjornstad, 1948), podendo
durar de 1 a 2 meses em espécies ou cultivares pouco exigentes em frio, até 5 a
6 meses em espécies ou cultivares mais exigentes. Para as cultivares de
pêssego e caqui, mais adaptadas ao clima da região centro-sul do Brasil,
portanto pouco exigentes em frio para quebra do repouso hibernal, tem sido
usado com sucesso um período padrão de 2 meses de estratificação a 5 0C. No
final do tratamento, os embriões se apresentam volumosos, podendo alguns
deles iniciar a germinação ainda na câmara fria, principalmente se a temperatura
estiver no limite máximo recomendável ou ligeiramente acima.
Para atender aos três requisitos citados, as sementes devem ser
estratificadas em mistura com substrato bem arejado como areia lavada,
vermiculita, turfa, esfagno, serragem de madeira curtida (serragem fresca pode
conter substâncias tóxicas), ou os modernos substratos industriais de origem
orgânica. O substrato deve ser previamente umedecido, com cerca de 70 % de
água. Esta porcentagem corresponde àquela em que o substrato, espremido na
mão, não escorre água. Excesso de umidade resulta em falta de arejamento
para as sementes.
A estratificação pode ser feita em diversos tipos de recipientes,
especialmente sacos plásticos, dando-se preferência àqueles de parede
delgada, por serem relativamente permeáveis aos gases e impermeáveis ao

93
vapor dágua. Outros recipientes como caixas diversas, latas ou frascos de vidro
com tampa perfurada podem ser usados. Os recipientes não devem ser muito
grandes, devido à deficiência de arejamento. Grandes quantidades de sementes
devem ser divididas em pequenos lotes. Periodicamente, com intervalo de
semanas, variável com o tipo de recipiente, estes devem ser abertos, para
eliminação das sementes que porventura estejam deteriorando e para testar a
umidade; se necessário, reembalar com novo substrato umedecido. Deficiência
de umidade, da mesma forma que a de arejamento, pode resultar na indução de
dormência secundária (Stuke, 1960). Para evitar o ataque de fungos, as
sementes devem ser tratadas previamente com fungicida.
Sementes que apresentam dormência dupla devem ser submetidas aos
tratamentos apropriados a cada uma delas na sequência correta. Assim,
mecanismos relacionados com bloqueio à absorção de água ou de oxigênio,
devem ser removidos previamente ao tratamento a “frio-úmido”. De outra forma,
não ocorrerá nelas a penetração de água ou do oxigênio necessário ao
processo. É o caso das sementes de pêssego e ameixa, que apresentam
envoltório impermeável e mecanicamente resistente. A técnica normalmente
empregada para pequenas quantidades destas sementes é a quebra do
envoltório com martelo ou usando um pequeno torno de bancada e remoção
manual do embrião. Para grandes quantidades de sementes, torna-se mais
econômico estratificá-las previamente em terra rica em matéria orgânica, à
0
temperatura de 20-30 C, por algumas semanas ou meses, antes da
estratificação a “frio-úmido”, para que os microorganismos do solo promovam a
decomposição parcial do envoltório, tornando-o permeável e menos resistente.
Sementes que necessitam da estratificação a “frio-úmido” pertencem a
espécies naturais de climas frios, adaptadas a temperaturas mais baixas. Por
isto é aconselhável não germiná-las em ambiente com temperaturas muito
elevadas, como casa de vegetação, estufim, ou condições semelhantes. Isto
pode resultar em indução de dormência secundária.
Outros tratamentos: exposição a luz artificial, embebição com solução de
reguladores de crescimento, como giberelina, citocinina e etileno (Weaver,

94
1972), além de outros compostos químicos, como nitrato de potássio, tio uréia e
hipoclorito de sódio (Mikkelson e Sinah, 1961) têm dado bons resultados para a
quebra de dormência de sementes de algumas espécies de plantas cultivadas.

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5. Propagação vegetativa natural:

5.1. Características gerais das estruturas naturais de propagação.


5.2. Tipos e manejo das estruturas.

5.1. Características gerais das estruturas:


Denomina-se Propagação Vegetativa Natural ao método de propagação
que utiliza estruturas vegetativas especializadas (bulbos, tubérculos, rizomas,
estolões ou estolhos, pseudobulbos, rebentos, raízes tuberosas), que funcionam
como órgãos de regeneração natural.
As estruturas vegetativas especializadas são modificações de caule ou de
raiz, formadas por plantas herbáceas perenes. Quando são de natureza fibrosa,
estas estruturas apresentam elevada capacidade de tolerância à seca e se
formam em geral à superfície do solo. As estruturas de natureza suculenta são
adaptadas ao armazenamento de reservas nutritivas e normalmente se formam
no subsolo, no final do ciclo de crescimento da planta, onde permanecem
protegidas durante o período de condições adversas. Em todos os casos, estas
estruturas têm como característica comum a elevada capacidade de
regeneração de uma nova planta a partir de gemas dormentes. Constituem,
portanto, verdadeiros órgãos de resistência às condições climáticas adversas
que ocorrem no final do ciclo de crescimento da planta, com a finalidade de
darem origem a uma nova planta assim que as condições ambientais se
mostrarem novamente propícias ao crescimento.

5.2. Tipos e manejo das estruturas:


Bulbo:
É uma estrutura subterrânea produzida por monocotiledôneas, constituída
por um caule vertical extremamente curto e suculento, denominado prato e de

98
crescimento determinado, cuja gema apical cresce vegetativamente no início do
ciclo de crescimento e pode se transformar em reprodutiva no final do ciclo, após
um período de indução. O caule é circundado por folhas modificadas,
normalmente suculentas, contendo uma gema em cada axila. Estas podem
permanecer dormentes até o final do ciclo (cebola), ou formar novo bulbo ou
bulbilhos (alho, lírio, gladíolo, tulipa).
Os novos bulbos e bulbilhos podem ser separados e usados para a
produção de novas plantas. Nos casos em que as gemas axilares permanecem
dormentes até o final do ciclo da planta, as folhas, se destacadas, levam consigo
a gema axilar e podem ser usadas para a regeneração de novas plantas.
Todavia, por serem suculentas, estas folhas estão muito sujeitas a podridões e
exigem por isto um tratamento cuidadoso para esta finalidade, devendo ser
tratadas previamente com fungicida e plantadas em substrato permeável e
estéril. Por este motivo, este método não é utilizado para espécies como a
cebola, que se propaga por sementes, sem problemas. Exemplos: Cebola, alho,
tulipa, açucena, lírio, trevo, gladíolo.
Tipos de bulbo:
Bulbo tunicado: cebola, alho, tulipa, açucena. As folhas suculentas
envolvem umas às outras concentricamente e são envolvidas, externamente, por
outras secas e fibrosas, que formam a “túnica”. A propagação é feita através dos
novos bulbos que se formam a partir do bulbo inicial. A cebola constitui exceção,
sendo propagada por sementes. O alho possui bulbo composto, por apresentar
bulbilhos formados por escamas e túnica.
Bulbo escamoso: lírio, trevo. As folhas suculentas ou “escamas” são
separadas, não envolvendo individualmente as internas e não sendo protegidas
por uma túnica. A propagação é feita separando-se as escamas, que devem
trazer a gema axilar, de onde surgirá a nova planta.
Bulbo cheio: gladíolo. As reservas nutritivas se acumulam no “prato”, o
qual é circundado por folhas modificadas, secas e fibrosas, que formam a
“túnica”. A propagação é feita através dos novos bulbos, que se formam a partir
do bulbo original.

99
Tubérculo:
Desenvolve-se no subsolo e é formado pelo acúmulo de reservas e
conseqüente intumescimento do último entrenó de um estolão, apresentando
gema apical e gemas laterais (olhos) dispostas em espiral, e dominância apical
como em caules normais. A propagação é feita através dos tubérculos que se
formam na extremidade dos estolões. Os tubérculos muito grandes podem ser
divididos para plantio. Exemplo: batata-inglesa.
Rizoma:
Desenvolve-se ao nível do solo ou subterrâneo. O rizoma apresenta nós e
entrenós bem visíveis, com cicatrizes das folhas também visíveis. Nos nós
surgem gemas que emitem crescimentos eretos dotados de raízes adventícias.
A propagação é feita através dos novos rizomas que se formam a partir do
rizoma anterior. Exemplos: bananeira, inhame, taioba, cana-da-índia, alguns
bambus, grama, samambaia, orquídea.
Tipos de rizoma:
Rizoma paquimórfico: bananeira, inhame, taioba. Grosso, curto,
suculento, de crescimento determinado, continuado por gemas laterais. Cresce
horizontalmente, com raízes adventícias formando na parte basal. Quando muito
grandes, estes rizomas podem ser partidos, para serem usados na propagação.
Rizoma leptomórfico: cana-da-índia, bambu, grama, samambaia. Fino,
entrenós longos, crescimento indeterminado, com longas ramificações. Para uso
na propagação, eles são divididos em pedaços com dois ou mais nós.
Rizoma mesomórfico: orquídea. De características intermediárias aos
rizomas paquimórfico e leptomórfico. Para a propagação de orquídeas do grupo
Cattleya, estes rizomas são divididos em segmentos contendo três ou mais
pseudobulbos (Cattleya, Laelia, Sophronitis).
Estolão ou estolho:
Finos, longos, subterrâneos (batata inglesa) ou aéreos (morango, grama).
A gema apical do estolão aéreo forma crescimento ereto, dotado de raízes
adventícias; deste surgem outros estolões. Os estolões subterrâneos da batata
inglesa formam tubérculos na extremidade. A propagação é feita através dos

100
rebentos ou dos tubérculos deles originados. Exemplos: morango, grama, batata
inglesa.
Pseudobulbo:
O pseudobulbo constitui a parte terminal do caule que se desenvolve
verticalmente a partir do rizoma e onde se acumulam água e reservas nutritivas.
Em algumas orquídeas (Dendrobium), formam-se gemas nos nós do
pseudobulbo, de onde podem surgir brotações enraizadas, após o florescimento.
A propagação é feita através de divisão do pseudobulbo (Dendrobium) contendo
uma ou mais gemas, ou então através dos rebentos surgidos delas.
Rebentos ou filhotes:
São brotações enraizadas dotadas de primórdios radiculares adventícios,
surgidas em estruturas especializadas (rizomas, estolões, pseudobulbos) ou
lateralmente no caule (abacaxi), ou ainda na base do caule (diversas palmeiras,
abacaxi), ou mesmo nas raízes (citros, goiabeira), ou na extremidade do fruto
(abacaxi). A propagação é efetuada através destas brotações, que são
separadas da planta-matriz seccionando-se o ponto de ligação entre elas.
Exemplos: abacaxi e outras bromélias, diversas palmeiras, bananeira, bambu,
cana-de-açúcar, agave, hemerocales.
Raízes tuberosas:
Raízes intumescidas, com grande quantidade de reservas, aptas a
produzir gemas adventícias na extremidade proximal (batata-doce) ou não
(dália). Neste segundo caso, o órgão tem que ser dividido verticalmente e trazer,
em cada seção, pelo menos uma gema, que se forma na base do caule (coroa).
Após seccionadas, as partes são tratadas com fungicida e deixadas por quatro a
cinco dias à sombra, para cicatrização das superfícies; só depois disso serão
plantadas. Exemplo: batata-doce, dália.

101
6. Propagação vegetativa artificial:

Considerações gerais:
Entre os métodos utilizados pelo homem na propagação vegetativa de
plantas, um deles utiliza estruturas vegetativas especializadas, desenvolvidas
naturalmente pelas plantas ao longo dos milênios de evolução. Esse método é
denominado propagação vegetativa natural. Outros métodos foram
desenvolvidos pelo homem, utilizando estruturas vegetativas que não têm como
função a propagação e foram denominados de propagação vegetativa artificial.
Admite-se que o homem desenvolveu os métodos denominados de
propagação vegetativa artificial a partir da observação de fatos ‘acidentais’.
Desse modo, métodos de enraizamento adventício como mergulhia e estaquia
devem ter sido desenvolvidos a partir da observação de formação de raízes em
pontos de ramos acidentalmente cobertos pelo solo. Os métodos de encostia e
enxertia devem ter tido como origem a observação da soldadura de raízes ou
ramos casualmente encostados e pressionados um contra o outro. Com o
avanço do conhecimento nas áreas de anatomia, morfologia e fisiologia vegetal,
estes métodos se aperfeiçoaram a ponto de hoje ser possível a obtenção de
plantas sob condições controladas, em laboratório, o que possibilita a produção
de plantas em larga escala e curto espaço de tempo, a partir de uma única
célula.

Modificações clonais:
Os métodos de propagação vegetativa são denominados genericamente
de clonagem e toda população de plantas originada por clonagens sucessivas a
partir de uma mesma matriz constitui um clone daquela matriz.
Considerando-se que a clonagem consiste num processo assexual de
propagação, isto significa que todos os indivíduos de um mesmo clone são em
princípio geneticamente iguais entre si. Todavia, à medida que um clone é
multiplicado sucessivamente por décadas ou mesmo séculos, por meio da
clonagem repetida de membros componentes das gerações que se sucedem,

102
não só se observa uma modificação progressiva e generalizada nas
características dos descendentes, como também o aparecimento eventual de
indivíduos com características diferentes do restante da população. Estes, por
meio da clonagem, dão origem a novos indivíduos com aquela ou aquelas novas
características que os diferem da população original e passam a constituir novos
clones.
Estas modificações por que passam os clones, à medida que as
clonagens se sucedem, são da maior importância em propagação de plantas e
não podem passar despercebidas. As principais modificações são: variações
associadas à idade do clone, variações genéticas (mutações e quimeras) e
variações causadas por patógenos sistêmicos.

Variações associadas à idade do clone:


Toda planta oriunda de semente passa por duas fases distintas durante a
sua existência, denominadas fase juvenil e fase adulta, as quais apresentam
características próprias e são separadas pelo importante fenômeno do
florescimento. Enquanto a planta não floresce, diz-se que ela se encontra na
fase juvenil; após o florescimento ela passa à fase adulta. A fase juvenil das
plantas anuais é sempre muito curta, durando apenas alguns meses, mas nas
plantas perenes ela pode durar anos, desde um a dois anos na goiabeira, cinco
a seis anos nos citros, até 40 anos ou mais em certas espécies de bambu e
bromélia.
Além da capacidade para florescer, que constitui a linha divisória entre as
duas fases para todas as plantas, outras diferenças de natureza bioquímica,
fisiológica e morfológica acontecem. Em Eucalyptus ficifolia, por exemplo, as
folhas são arredondadas na fase juvenil e lanceoladas na fase adulta. Os citros
apresentam espinhos longos e vigorosos na fase juvenil, vigor este que se reduz
progressivamente, iniciando mesmo antes do florescimento, e continua na fase
adulta até desaparecer completamente. Da mesma forma como acontece com
os espinhos dos citros, outras características diferenciais entre as fases juvenil e
adulta não se modificam bruscamente, mas sim gradativamente, iniciando-se

103
mesmo antes do florescimento e continuando posteriormente. Os frutos, por
exemplo, melhoram progressivamente as suas qualidades organolépticas como
melhor relação acidez/sólidos solúveis, além de outros fatores responsáveis pelo
flavor. O melhor exemplo, neste caso, é a reconhecida qualidade superior dos
vinhos elaborados com frutos provenientes de videiras seculares, quando
comparados com aqueles provenientes de frutos produzidos por videiras mais
jovens.
Outra característica diferencial entre as duas fases, de grande
importância para a propagação, diz respeito à capacidade morfogênica da
planta, ou seja, à capacidade de exprimir a totipotência celular, que se traduz
pela capacidade para emitir gemas e raízes adventícias em órgãos vegetativos,
além da capacidade para responder aos tratamentos destinados a induzir a
formação de órgãos ou embriões ou ainda a multiplicação contínua de células in
vitro. A capacidade de exprimir a totipotência é sempre maior na fase juvenil.
Alguns exemplos de espécies que mantêm esta capacidade integral ou quase
integral na fase adulta são encontrados em geral entre as plantas herbáceas. As
plantas lenhosas, quase sempre, perdem parcial ou totalmente esta capacidade
na fase adulta e esta perda pode acontecer lentamente, no período de alguns
anos, ou então mais rapidamente, durante uns poucos meses, como no caso
dos eucaliptos, constituindo a causa da maior dificuldade apresentada por estas
plantas para serem clonadas na fase adulta, tanto pelas técnicas convencionais
quanto pelas modernas técnicas de biotecnologia. Todavia, hoje existem
procedimentos para reverter pelo menos em parte esta situação.
A existência das duas fases de crescimento constitui um fenômeno
importante entre os seres vivos, permitindo que o indivíduo utilize toda a sua
energia, na fase juvenil, para crescer vigorosamente, de maneira saudável, até
atingir a fase adulta, quando o organismo se torna apto a assumir a função da
reprodução, que envolve grande gasto de energia. A esta passagem da fase
juvenil para a adulta denomina-se mudança de fase, que consiste na perda
gradativa das características juvenis e aquisição das características adultas, à
medida que o embrião se desenvolve em direção à maturidade.

104
À época do florescimento, presumivelmente durante a gametogênese, um
fenômeno inverso ocorre, denominado reversão de fase, que consiste na
recuperação das características juvenis pelas células sexuais, de tal modo que,
ao se formarem os embriões, as suas células estão revertidas à completa
juvenilidade. O vigor juvenil original da espécie é uma das características
recuperadas pelo embrião durante a reversão de fase, e a esta recuperação do
vigor juvenil dá-se o nome de neofiose. Ao se iniciar a germinação da semente,
tem início novamente um novo ciclo de mudança de fase.
Desde muito tempo se vem especulando sobre a causa desta mudança e
reversão de fase, sem que se chegue a uma explicação aceitável, embora haja
consenso quanto ao fato de se tratar de um fenômeno genético. Embora não se
encontre na literatura informações que levem à explicação sobre como isto
ocorreria a nível genético, existem, porém, outras que nos permitem especular
aqui sobre o envolvimento do fenômeno de “metilação de DNA”, que já é bem
conhecido. Assim, a metilação progressiva de DNA, que ocorreria durante as
mitoses que se sucedem à medida que o organismo se desenvolve, resultaria
possivelmente na desativação gradativa dos genes responsáveis pelas
características juvenis, o que permitiria aos genes para características adultas
se expressarem, ocorrendo assim a mudança de fase. Tal hipótese deve admitir
também que os genes para características adultas seriam recessivos.
Aceitando-se esta hipótese, é fácil admitir ainda que, durante a meiose envolvida
na formação das células sexuais, algum processo enzimático aconteceria em
algum ponto do processo meiótico, resultando na desmetilação do DNA e os
genes para características juvenis voltariam a se expressar, o que resultaria na
reversão da fase adulta para a juvenil durante a gametogênese.
Um crescimento intenso e vigoroso é uma característica comum a todas
as plantas na fase juvenil, que coincide com a incapacidade para florescer –
vigor juvenil. Assim que a planta adquire esta capacidade, o crescimento deixa
de ser tão vigoroso como antes, porque a energia produzida na fotossíntese
deixa de ser utilizada completamente no crescimento vegetativo e passa a ser
dirigida em grande parte para a produção de frutos; conseqüentemente, a taxa

105
de crescimento anual é reduzida e os ramos formados nesta fase passam a ser
de menor vigor – vigor adulto. Com o avanço da idade da planta, esta queda de
vigor continua de maneira, em geral pouco perceptível, numa taxa que varia com
a espécie e culmina com a morte da planta. A esta queda progressiva do vigor
da planta dá-se o nome de envelhecimento. Um exemplo extremo de queda
rápida do vigor em plantas perenes é o que acontece com o mamoeiro, cujo
alongamento caulinar se reduz rapidamente já no segundo ano, bem como a sua
produtividade; a partir do terceiro ano este alongamento e produtividade são
mínimos.
A literatura científica não apresenta dados que possam explicar
claramente como ocorreria o fenômeno do envelhecimento. Novamente,
arriscamos aqui a apresentar uma hipótese sobre o fato, começando por
considerar o fenômeno do crescimento correlativo em plantas, em que copa e
sistema radicular controlam o seu crescimento mutuamente, por meio de sinais
enviados nos dois sentidos, sinais estes que podem ser de natureza hormonal
como auxina e citocinina. Estudos in vitro têm mostrado com clareza a existência
de uma relação direta entre a concentração destes dois fitorreguladores e a
intensidade da resposta de tecidos, bem como a natureza desta resposta quanto
à formação de raízes ou ramos, em função das concentrações relativas entre
eles. Outros dados comprovam a necessidade da presença de auxina para
estimular a atividade cambial e, conseqüentemente, o crescimento de ramos em
diâmetro. Aceitando, portanto, que os sinais responsáveis pelo controle do
crescimento de copa e sistema radicular sejam a auxina produzida pelos pontos
de crescimento da parte aérea e a citocinina produzida pelos pontos de
crescimento do sistema radicular, e ainda mais que estes hormônios sejam
destruídos por sistemas enzimáticos distribuídos por toda a planta, como é o
caso da AIA oxidase, seria aceitável imaginar que, à medida que a planta cresce
e as duas extremidades se distanciam uma da outra, a destruição destes
hormônios no percurso aumenta, mais fraco é o sinal que chega até as
extremidades e mais fraca também é a resposta em termos de crescimento. Isto
resultaria em enfraquecimento progressivo do organismo nos dois sentidos, com

106
a formação de ramos e raízes cada vez menos vigorosos, e culminaria com a
morte da planta.
Estas considerações nos permitem ainda defender aqui a idéia da
existência não de apenas duas fases de crescimento – juvenil e adulta – durante
a vida de plantas lenhosas, cujo crescimento é indeterminado, mas sim de três
fases, incluindo-se a “fase senil”, que se difere da fase adulta por evoluir
segundo o mecanismo fisiológico próprio aqui sugerido. Não se pode, todavia,
fazer as mesmas inferências para plantas anuais, cujo crescimento é
determinado e nas quais, por isto mesmo, a morte acontece imediatamente após
a produção de sementes, possivelmente por algum outro mecanismo.
Todavia, o fenômeno do envelhecimento descrito se refere a cada planta
individualmente, sendo errônea falar-se em envelhecimento clonal, pois toda vez
que uma planta é clonada, não importa se esteja na fase adulta ou senil, as
novas plantas dela originadas recuperam o vigor adulto da espécie, o que
significa que o clone retorna ao seu vigor original. Este vigor será máximo, se a
matriz utilizada não carregar algum patógeno sistêmico, que seguramente
reduzirá este vigor. Desde que ela tenha sido submetida previamente à limpeza
clonal, o vigor dos descendentes será máximo, de acordo com o vigor adulto
característico da espécie. Vale ressaltar aqui que, dentre as técnicas de limpeza
clonal, aquelas que envolvem o emprego de sementes, resultará na recuperação
não do vigor adulto, mas sim do vigor juvenil, porque neste caso, além da
eliminação dos patógenos sistêmicos porventura existentes, também ocorrerá a
neofiose. Desta forma, é importante notar a existência de dois fenômenos
diferentes envolvidos na discussão acima: o fenômeno do revigoramento clonal
e do rejuvenescimento clonal. O revigoramento clonal implica na recuperação do
vigor adulto quando a planta é propagada por processo vegetativo, o que
acontece sem reversão de fase; e o rejuvenescimento clonal implica na
recuperação do vigor juvenil (reversão de fase), o qual acontece quando a matriz
é propagada por semente. Uma situação intermediária pode acontecer, em que
se chega a um rejuvenescimento parcial utilizando algumas técnicas de
rejuvenescimento a serem discutidas adiante. Sabe-se que a clonagem de

107
plantas como videira, figueira, citros e várias outras plantas perenes, vem sendo
feita por séculos, sem que aconteça um envelhecimento progressivo e morte
destas plantas. Hoje está provado que os chamados “clones velhos” de citros,
relatados no passado, eram, na realidade, clones infectados por vírus e outros
patógenos sistêmicos. Estes clones recuperaram o vigor adulto característico da
espécie após serem submetidos à limpeza clonal, mesmo por meio de técnicas
que não levam ao rejuvenescimento, conforme será discutido mais adiante.
Portanto, a perda do vigor juvenil com a mudança de fase da planta, resulta no
vigor adulto e não em envelhecimento, fenômeno este que acontece numa fase
posterior. Sempre que uma planta é clonada, não importa qual seja o seu vigor,
os seus descendentes recuperam o vigor adulto, e a explicação poderia ser
encontrada na hipótese defendida anteriormente: toda vez que a planta é
clonada por qualquer técnica, as extremidades da copa e do sistema radicular
da nova planta ficam mais próximas, os sinais emitidos por estas extremidades
voltam a chegar mais fortes à outra extremidade e o crescimento resultante volta
a mostrar o vigor adulto característico da espécie. O crescimento vigoroso de
mudas no viveiro, sempre superior ao vigor do ramo de onde vieram os
propágulos, reforça esta hipótese.
Dentre os fenômenos que acontecem durante a reversão de fase, a
recuperação da capacidade perdida pela planta adulta em expressar a
totipotência celular é o mais importante, no que diz respeito à propagação. Com
a perda total ou parcial desta capacidade pelas plantas adultas, fica difícil ou
impossível a clonagem de matrizes valiosas pelos métodos de estaquia e
técnicas in vitro. O conhecimento deste mecanismo permitiu o desenvolvimento
de artifícios por meio dos quais se pode conseguir, ou o revigoramento clonal
(vigor adulto), ou o rejuvenescimento clonal (vigor juvenil) a partir de plantas
adultas, não importando o grau de envelhecimento em que se encontrem. As
plantas assim obtidas servirão de matrizes para o fornecimento de propágulos
para a clonagem comercial. Dentre as técnicas utilizadas com este propósito,
algumas são executadas ex vitro, como o rejuvenescimento por meio da
propagação por semente, a produção de clones nucelares, a recepa de planta

108
adulta proveniente de semente e a enxertia “em cascata”; outras constituem
técnicas in vitro, como a regeneração de plantas a partir de tecidos naturalmente
rejuvenescidos, o cultivo “em cascata” e a microenxertia “em cascata”. Segue-se
a descrição de cada uma delas:

Rejuvenescimento por meio da propagação seminífera:


Conforme já discutido, a propagação por semente é o método natural de
rejuvenescimento completo dos descendentes, através do fenômeno da
neofiose, que ocorre em qualquer que seja o tipo de embrião, tanto zigótico
quanto apomítico. A técnica consiste simplesmente em se propagar a planta
pela via seminífera e utilizar a planta, assim obtida, como matriz doadora de
propágulos vegetativos. É o artifício mais simples, porém que apresenta
restrições. Por exemplo, não pode ser usada para plantas que não produzem
sementes viáveis. Não pode também ser usada para plantas alógamas, já que
os embriões zigóticos destas espécies não reproduzem a identidade genética da
matriz nos descendentes. Mesmo no caso das espécies autógamas, as plantas
obtidas por este método precisam ser observadas até atingir a idade adulta,
antes da sua liberação como matriz, já que a identidade genética dos
descendentes não pode ser garantida, devido ao risco de mutações, que não
raramente acontecem durante a formação do embrião. Além disso, a ocorrência
da neofiose nos descendentes resulta em clones com excesso de vigor e um
longo período juvenil, o que seria indesejável para plantas lenhosas como as
fruteiras perenes, embora possa oferecer vantagem no caso de espécies de
pequeno porte e curto período juvenil, e de espécies florestais, ou ornamentais.

Rejuvenescimento através da produção de clones nucelares:


Em plantas poliembriônicas os embriões nucelares constituem uma
maneira relativamente segura de se obter matrizes rejuvenescidas, como no
caso dos citros, algumas mangueiras e algumas outras espécies, já que eles se
originam de um tecido somático rejuvenescido, o nucelo. Além de serem
rejuvenescidos, estes embriões reproduzem fielmente as características

109
genéticas da planta que os originou, a menos que ocorra alguma mutação
durante a sua formação. Para assegurar a identificação precoce dos embriões
nucelares e a eliminação dos zigóticos, é preciso lançar mão de um gene
marcador que possibilite a exibição precoce de uma característica macroscópica
diferencial entre eles. No caso dos citros, a técnica consiste em polinizar as
flores da matriz desejada com pólen do Poncirus trifoliata. Dessa forma, os
embriões zigóticos se diferenciam dos nucelares por apresentarem folhas com
três folíolos, que é uma característica dominante, podendo ser facilmente
eliminados ainda na sementeira. Todavia, os embriões nucelares nem sempre
reproduzem fielmente todas as características da matriz de onde provieram,
porque também estão sujeitos à ocorrência de mutações, que podem acontecer
durante a sua formação. Por isso, devem ser submetidos aos mesmos cuidados
e observações já citados para o caso de embriões zigóticos.

Recepa de planta adulta proveniente de semente:


Baseia-se no princípio de que a perda das características juvenis, como a
capacidade para expressar a totipotência celular, acontece de maneira
progressiva nas novas células formadas, à medida que as mitoses se sucedem
durante o crescimento da planta, desde a germinação da semente. Desta forma,
as células da região do “colo” da planta, que sofreram poucas mitoses com o
passar dos anos, permanecem com suas características juvenis quase originais.
Quanto mais próximas do colo da planta, mais juvenis elas permanecem. Ao se
recepar a planta próximo ao colo, gemas dormentes e gemas adventícias se
desenvolvem nesta região, dando origem a brotações com características não
completamente juvenis, mas com grau de juvenilidade suficiente para expressar
a totipotência celular em grau variável, dependendo da espécie e da maior ou
menor proximidade do colo da plante onde são obtidas. Assim, estes ramos
poderão ser usados como material propagativo para a clonagem ex vitro, ou
para o fornecimento de explantes para o cultivo in vitro. As plantas provenientes
destes propágulos são então usadas como matrizes para clonagem. Entretanto,
à medida que os ramos destas plantas se alongam, um novo ciclo de mudança

110
de fase se inicia, com perda progressiva da capacidade para expressar a
totipotência. Portanto, quanto mais próximo do colo da planta os propágulos
forem obtidos, tanto maior será a juvenilidade de suas células. Por isto, as
matrizes assim obtidas devem ser mantidas em plantios adensados, em jardins
clonais e podadas com freqüência, de modo a manter bem curtos os ramos
fornecedores de material propagativo.
Quando a planta adulta a ser clonada apresenta brotações basais, estas
podem ser usadas para a clonagem, na produção de novas matrizes, sem
necessidade de recepa da árvore original. Neste caso, como no anterior, deve
ser dada preferência aos ramos mais próximos do colo da planta, pelos motivos
já discutidos.

Enxertia “em cascata”:


A experiência tem mostrado que as plantas enxertadas sobre porta
enxertos provenientes de semente É uma técnica que explora a juvenilidade das
células do embrião, para indução do rejuvenescimento de tecidos adultos.
apresentam um crescimento inicial mais vigoroso e um período juvenil curto,
antes de reiniciarem o florescimento. Uma das hipóteses levantadas é a de que
supostos fatores translocáveis que presumivelmente se difunde, a partir das
células do embrião, induzem o rejuvenescimento parcial das células do enxerto.
Evidência da translocação de tais fatores é encontrada no fenômeno de
rejuvenescimento completo das células do nucelo, que se encontra na periferia
do saco embrionário e é um tecido somático.
A técnica da “enxertia em cascata” consiste em se enxertar
borbulhas ou garfos da planta que se deseja rejuvenescer, sobre porta-enxertos
provenientes de sementes, ainda no início do seu desenvolvimento. Após um
crescimento mínimo do enxerto, suficiente para se extrair dele nova borbulha ou
garfo, este será usado para nova enxertia sobre novos porta-enxertos
provenientes de semente. A cada crescimento do enxerto, acontecerá um
pequeno rejuvenescimento. Isto deve ser repetido tantas vezes quantas forem
necessárias para se obter o máximo de rejuvenescimento possível, o que

111
acontece em geral após a quinta enxertia consecutiva. As plantas assim obtidas
seriam usadas como matrizes, para o fornecimento de propágulos vegetativos
para clonagem ex vitro, ou explantes para clonagem in vitro.

Regeneração de plantas in vitro, a partir de tecidos naturalmente rejuvenescidos:


Durante a reversão de fase que acontece naturalmente com as células
sexuais por ocasião da gametogênese, tecidos somáticos vizinhos a elas sofrem
a influência de fatores de rejuvenescimento que, segundo se presume, se
difundem até certa distância a partir das células rejuvenescidas. Assim, tecidos
somáticos da semente em início de formação, como o nucelo, são
completamente rejuvenescidos. Também alguns tecidos florais e até mesmo da
inflorescência se rejuvenescem parcialmente e apresentam elevada capacidade
de expressar a totipotência celular por certo tempo. À medida que amadurecem,
eles perdem esta capacidade rapidamente. Portanto, quando usados ainda no
início de formação, estes tecidos constituem excelente material propagativo para
a regeneração de plantas in vitro e têm sido usados com muita freqüência, como
no caso de inflorescência, para palmeiras, e de nucelo, para citros. As plantas
assim regeneradas recuperam em parte (no caso do uso de inflorescência) ou
totalmente (no caso do nucelo) a capacidade de expressar a totipotência celular
e podem ser usadas como matrizes para a prática da estaquia e para o
fornecimento de explantes para a regeneração de plantas in vitro.

Cultivo de ramos in vitro “em cascata”:


Por algum motivo ainda não bem explicado, ramos desenvolvidos in vitro
apresentam um grau razoável de rejuvenescimento. É possível que a causa
deste fenômeno esteja ligada às condições suaves daquele ambiente, com
temperatura e intensidade luminosa constantes, UR do ar elevada, bem como
suprimento também constante e equilibrado de nutrientes e nível geralmente
elevado de nitrogênio, condições estas que induzem um crescimento rápido e
vigoroso dos ramos, praticamente sem formação de fibras vasculares, além de
outras características que lembram o efeito do estiolamento. O conhecimento

112
deste fato permitiu desenvolver uma metodologia que consiste em se cultivar in
vitro gemas, ápices caulinares ou segmentos nodais da planta que se deseja
rejuvenescer, transferindo-os a intervalos curtos, como por exemplo, a cada 15
ou 20 dias, para novo meio de cultura de mesma composição, por 5 ou mais
vezes consecutivas, até que se atinja o máximo de rejuvenescimento possível. É
um fenômeno que lembra o que acontece durante a neofiose, mas as
características juvenis adquiridas são perdidas em curto espaço de tempo,
assim que as novas plantas assim obtidas reiniciam o crescimento, durando
porém o suficiente para que as plantas regeneradas possam ser utilizadas como
matrizes para a clonagem. Este material, depois de enraizado e adaptado às
condições externas, poderá constituir boas matrizes para o fornecimento de
material vegetativo destinado à clonagem, ou então permanecerem in vitro,
como matrizes para o fornecimento de explantes para a prática da
“micropropagação”.

Microenxertia “em cascata”:


Esta técnica reúne características de duas das técnicas já discutidas: a
enxertia “em cascata” e o cultivo in vitro “em cascata”, de modo que o resultado
é um somatório dos resultados obtidos com as duas técnicas e, por isto mesmo,
a que se mostrou mais eficiente no sentido de recuperação da juvenilidade.
A técnica consiste em se germinar a semente do porta-enxerto in vitro e
no escuro, onde ele se desenvolverá por algumas semanas, até atingir um
diâmetro que permita a realização da microenxertia. Neste ponto ele será
retirado do tubo de ensaio e colocado em placa-de-Petri, em condições
assépticas, sendo podado a 2 cm acima e 2 cm abaixo do ponto de inserção dos
cotilédones. Um segmento apical de tamanho diminuto é retirado da planta a ser
rejuvenescida, e enxertado sobre o porta-enxerto, que volta para o tubo de
ensaio até atingir a altura conveniente para a extração de novo segmento apical
que será enxertado em outro porta-enxerto produzido da mesma forma. Esta
operação se repete por cinco ou mais vezes até que se atinja o máximo de
rejuvenescimento possível. Quando o segmento utilizado como enxerto é um

113
“’apice meristemático”, com 0,1 a 0,3mm de comprimento, além do
rejuvenescimento parcial do material, resulta também na limpeza clonal e,
portanto, de descendentes duplamente revigorados.
Com exceção do rejuvenescimento obtido por meio da semente, no qual
os embrões sofrem a neofiose, aquele obtido empregando-se outras técnicas, a
partir de partes vegetativas, é sempre parcial em maior ou menor grau, e os
novos crescimentos produzidos pela planta rejuvenescida por qualquer técnica
retornam progressivamente à fase adulta, conforme já discutido. Por isto,
matrizes rejuvenescidas, obtidas por qualquer das técnicas, devem receber
sempre poda curta, de modo a manter as extremidades dos seus ramos o mais
próximo possível do colo da planta e assim conservar a juvenilidade das estacas
obtidas. Contudo, podas curtas, aplicadas por vezes repetidas, levam ao
enfraquecimento das plantas. Por isto, as matrizes devem ser exploradas por um
máximo de dois a três anos e depois deixadas a se recuperar por um a dois
anos, para depois receberem nova poda e serem usadas novamente como
matrizes. Além disso, elas devem receber adubação criteriosa, especialmente
rica em nitrogênio.

Variações genéticas:
Sendo, a clonagem, um processo de propagação em que os
descendentes se originam a partir de divisões mitóticas de uma única célula ou
de células somáticas de um mesmo indivíduo, ela implica na idéia de
homogeneidade genética dos indivíduos resultantes, os quais devem ser,
portanto, geneticamente iguais à matriz original, o que é teoricamente correto.
Na prática, todavia, sabe-se que, durante as mitoses, podem ocorrer erros de
replicação cromossômica, e assim surgirem células geneticamente diferentes do
restante da população. Este fenômeno ocorre com mais freqüência em cultura
de células in vitro, mas também ocorre em tecidos organizados, tanto in vitro
quanto ex vitro. Ao indivíduo (célula, órgão ou planta) que apresenta a nova
característica surgida, dá-se o nome genérico de mutante. Quando o órgão ou
planta completa exibe a nova característica mutante em todas as suas células,

114
ele é denominado mutante sólido. Quando a mutação resulta em dois tecidos
geneticamente diferentes, que se desenvolvem lado a lado ao longo de todo o
indivíduo, o órgão ou planta se denomina quimera. Nas plantas lenhosas
perenes, um ramo que exiba alguma diferença genética em relação ao restante
da planta, é denominado mutação de gema.
As mutações surgidas in vitro ou ex vitro são provenientes de um mesmo
fenômeno morfogênico: variações genéticas ocorridas em células somáticas ou
reprodutivas. Se desta célula mutante surgirá um mutante sólido ou uma
quimera, vai depender da fase durante a ontogênese do órgão, em que a célula
sofreu a mutação. Se a mutação ocorrer cedo, na célula inicial que originou
todas as demais células do meristema apical que deu origem ao órgão ou
planta, resulta um mutante sólido, onde todas as células componentes do
indivíduo exibem a nova característica; de outra forma, se a mutação ocorrer
mais tarde, numa das células do meristema apical já formado, resulta uma
quimera, onde apenas parte dos tecidos do órgão ou planta proveniente deste
meristema exibe a nova característica.
A estrutura do tecido quimérico, quanto à profundidade de sua penetração
no sentido radial e a amplitude de sua distribuição em torno do órgão, é variável.
Algumas vezes, o tecido mutante e o original se justapõem de tal forma que um
deles forma uma faixa em torno de todo o órgão, sem penetrar desde a
superfície até o seu centro; a quimera assim formada denomina-se periclinal;
quando a faixa não envolve todo o órgão, mas penetra desde a superfície até o
seu centro, a quimera diz-se setorial; quando a faixa não envolve todo o órgão,
nem penetra até o seu centro, a quimera diz-se mericlinal e quando os dois
tecidos formam faixas de penetração e extensão limitadas e irregulares ao longo
do órgão, algumas vezes se sobrepondo mutuamente em algumas partes, a
quimera diz-se mista ou em mosaico.
Os diferentes tipos de quimera podem se interconverter uns nos outros,
ou dar origem a mutantes sólidos, dependendo da localização da célula ou
células que originaram o novo órgão. Desta forma, por meio da clonagem por
estaquia e borbulhia, surgiram muitos clones quiméricos ou mutantes sólidos de

115
valor comercial. Um bom exemplo é o das cultivares de pomelo (Citrus paradisi):
antes havia apenas cultivares de polpa e casca alaranjadas; depois surgiu uma
quimera periclinal com polpa alaranjada e casca cor-de-rosa; desta surgiram
mutantes sólidos com polpa e casca cor-de-rosa. Da mesma forma, um tecido
quimérico pode perder esta característica quando propagado por técnicas in
vitro.
Dois bons exemplos de cultivares comerciais, surgidos diretamente como
mutantes sólidos, são a macieira “Amarela deliciosa”, que surgiu como mutação
de gema da “Vermelha deliciosa” (“Red Delicious”), e a uva Ruby, proveniente
da uva Itália. Além disso, todas as cultivares de laranja doce surgiram em
cultivo, a partir de mutações naturais, constituindo, bom exemplo, a laranja
Bahia.
Devido à freqüência com que ocorrem variações genéticas in vitro, este
assunto tem merecido especial destaque na área de micropropagação, não só
visando explorar as suas vantagens como método alternativo de melhoramento
de plantas, como também para evitar os seus inconvenientes no caso da
clonagem. A nova característica surgida pode passar despercebida, se ela não
puder ser detectada macroscopicamente ou não se evidenciar de alguma outra
forma. Por isto, há necessidade de se estar atento a esta possibilidade, quando
se trabalha com material in vitro, já que o próprio explante pode constituir
material geneticamente diferente da matriz de onde proveio. Da mesma forma, o
material obtido em cultura de tecidos pode trazer alguma modificação genética
adquirida durante o manuseio in vitro e não detectada.

Variações causadas por patógenos sistêmicos:


As plantas no campo estão sujeitas a diversos infortúnios, dentre eles a
possibilidade de serem invadidas por patógenos sistêmicos, como vírus,
micoplasmas, bactérias e riquétsias, que aí permanecerão por toda a vida da
planta e serão transmitidos aos seus descendentes por meio da clonagem.
Estes microorganismos, passando a viver no interior das células da planta ou no
seu sistema vascular, conferem-lhe, em geral, características diferentes

116
daquelas inerentes ao clone. Assim, a cana-de-açúcar, quando afetada pela
bactéria Xantomonas spp., passa a produzir folhas com estrias amareladas.
Vários tipos de vírus causam modificações tais como tronco profundamente
sulcado, porte reduzido e frutos pequenos em citros, folhas manchadas em
certas plantas ornamentais, dentre outros. Estes patógenos acabam por fazer
parte intrínseca do organismo da planta, por toda a sua vida, mantendo para
sempre as novas características fenotípicas por eles induzidas, como manchas
descoloridas nas folhas e acentuada queda do vigor biológico natural que ocorre
com a idade cronológica da planta, podendo até levar ao seu completo
definhamento.
A clonagem de tais plantas produzirá novas populações que exibem estas
novas características em relação ao clone original e que são indesejáveis, por
estarem sempre associadas à queda no vigor e na produtividade. Mesmo
quando células, tecidos ou órgãos procedentes de tais plantas são usados como
propágulos para a regeneração de plantas in vitro, eles continuarão infectados e,
além das desvantagens citadas, a capacidade para responder a estímulos
morfogênicos fica prejudicada. Por este motivo, esta causa de degeneração
clonal não pode ser negligenciada ao se optar por clonar uma determinada
matriz, sendo imprescindível conhecerem-se os problemas que afligem a
espécie à qual pertence. Em alguns casos a avaliação da matriz pode ser feita
visualmente, mas na maioria deles há necessidade de testes específicos para se
detectar a existência do patógeno. No caso de não se conseguir uma matriz da
espécie desejada, livre do patógeno, resta proceder à eliminação do patógeno
da planta desejada, nos casos em que houver técnica de limpeza clonal
disponível.
Desde longa data existiu um consenso entre produtores e técnicos, de
que plantas provenientes de propagação vegetativa eram menos vigorosas e
menos longevas do que aquelas provenientes de propagação por semente.
Estas diferenças eram de fato marcantes, como por exemplo, em algumas
espécies do gênero Citrus, cujas plantas definhavam rapidamente e morriam em
poucos anos, mesmo antes de atingirem o auge da produção econômica.

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Apontava-se então, como causa para esta diferença de comportamento, a
técnica de propagação vegetativa por si só, que levaria supostamente ao
envelhecimento clonal. De fato, existe uma diferença de vigor entre as plantas
das duas categorias, devido à neofiose nas plantas provenientes de propagação
por semente. Mas, a diferença de vigor por este motivo é limitada e nada tem de
desvantajosa para as plantas de propagação vegetativa. Pelo contrário, resulta
em diversas vantagens, conforme já discutido anteriormente. O problema era
que, àquela época, ainda não se tinha noção da existência dos patógenos
sistêmicos, que vinham sendo transmitidos de geração em geração, por meio
das clonagens sucessivas, causando uma queda adicional e excessiva de vigor
e até mesmo a morte prematura das plantas. Este problema ainda existe e
continuará existindo, enquanto houver profissionais tecnicamente
desqualificados atuando na área de propagação de plantas. Todavia, a solução
já existe e consiste no uso de artifícios técnicos que visam obter propágulos
livres destes patógenos e, a partir deles, a regeneração de plantas que virão a
constituir novas matrizes saudáveis. A operação destinada à eliminação de
patógenos sistêmicos de plantas infectadas denomina-se limpeza clonal e as
principais técnicas utilizadas com esta finalidade são: propagação por meio da
semente, produção de clones nucelares, termoterapia, e as técnicas in vitro
como quimioterapia, produção de embrião nucelar, cultura de ápice caulinar e
microenxertia.

Propagação seminífera:
É a mesma técnica já descrita para a obtenção de rejuvenescimento
clonal. Contudo, para a finalidade de limpeza clonal, ela se baseia em outro
mecanismo apresentado pelas sementes em geral, que impede, parcial ou
totalmente, dependendo da espécie, a entrada no ambiente interno do óvulo, de
patógenos sistêmicos porventura existentes no sistema vascular, e que funciona
da seguinte forma: o sistema vascular que adentra pelo funículo se interrompe à
altura da chalaza, que é o tecido de ligação entre o óvulo e o funículo. A água e
nutrientes que chegam até a chalaza com destino ao interior do óvulo,

118
atravessam esta por difusão de célula a célula até o seu destino final, que é o
interior do saco embrionário. O mesmo não acontece com os patógenos
sistêmicos porventura existentes na solução, que não atravessam as células da
chalaza e são de alguma forma excluídos neste momento. Assim, tanto os
embriões zigóticos quanto os apomíticos se desenvolvem neste ambiente
protegido contra a penetração dos patógenos sistêmicos. É mais um belo
exemplo de um mecanismo desenvolvido pela natureza com a finalidade de
perpetuação da espécie.
Este método natural de limpeza clonal apresenta as mesmas restrições já
comentadas quando da discussão deste método com a finalidade de
rejuvenescimento clonal, mas trazem grandes benefícios a culturas autógamas,
principalmente aquelas de ciclo anual. Aliás, para estas espécies,
tradicionalmente propagadas por semente, os fenômenos de rejuvenescimento e
de limpeza clonal estão sempre envolvidos, sem que se perceba.

Produção de clones nucelares:


É a mesma técnica já descrita com a finalidade de rejuvenescimento
clonal, mas agora baseada no fenômeno da barreira criada pelos tecidos da
chalaza à penetração de patógenos sistêmicos no interior do óvulo, descrito no
item anterior.Ainda como na técnica anterior, apresenta a desvantagem da
neofiose para o caso de plantas lenhosas de porte elevado e de longo período
juvenil como citros e mangueira, mas oferece vantagem no caso de produção de
porta-enxertos vigorosos para estas ou outras espécies. Além disso, oferece a
vantagem da identidade genética entre as plantas obtidas e a matriz, embora a
garantia desta identidade não seja absoluta, devido ao risco da ocorrência de
mutação genética durante a formação do embrião, o que não é raro. Por este
motivo, as plantas deles originadas precisam também passar por longos anos de
observação, como no caso da técnica anterior. A falta deste cuidado, num dos
primeiros trabalhos de produção de clones nucelares de citros nos Estados
Unidos, resultou na liberação prematura de um clone com uma característica

119
altamente indesejável, que só foi descoberta depois que um grande número de
matrizes distribuídas entrou em produção.
A técnica de produção de clones nucelares de citros já foi muito usada no
passado, quando não havia outras alternativas para a limpeza clonal, mas hoje
existem outras técnicas, usando partes vegetais, por meio das quais as plantas
obtidas não sofrem o fenômeno da neofiose e, por isto mesmo, são mais
vantajosas, sendo hoje mais utilizadas para várias espécies.

Termoterapia:
Consiste em submeter a planta ou parte de uma planta a temperaturas
elevadas, por um certo período, que pode durar de alguns dias até meses. Há
evidências de que, determinadas temperaturas, normalmente elevadas e que
variam com o tipo de patógeno, atuam sobre algum sistema metabólico que resulta
na redução da taxa de síntese do DNA viral, enquanto a taxa de degradação
permanece normal, ou então que causa um desequilíbrio entre a taxa de divisão
celular do tecido vegetal e a taxa de multiplicação do vírus, de tal modo que a
concentração de partículas virais nos meristemas apicais, à medida que os ápices
se alongam, decresce gradativamente. Dessa forma, muitos destes ápices
meristemáticos estarão isentos de vírus no final do tratamento.
Na maioria dos casos, empregam-se temperaturas em torno de 37 oC,
mas há exemplos de temperaturas de até 52 oC. A duração do tratamento é em
geral de algumas semanas, mas há exemplos que vão de 10 minutos até meses.
Numa das recomendações para batata inglesa, a planta é mantida a 35oC, por 8 a
18 meses; para o cravo ornamental recomenda-se 38oC, por 2 meses. Todavia, há
um limite ótimo de tempo e de temperatura para cada caso, além do qual a
eficiência do tratamento decresce, podendo até mesmo resultar em aumento da
concentração de partículas virais na planta após o tratamento, talvez devido à
perda de algum fator de resistência da planta durante o tratamento. No caso da
necessidade de temperaturas muito elevadas, a alternância destas com
temperaturas mais baixas pode ser mais bem tolerada pela planta e resultar no
mesmo efeito inibitório sobre as partículas virais. Numa das recomendações para

120
batata inglesa, a planta é mantida a 40 oC por 4h e 16-20 oC por 20h diárias. No
caso do tabaco, a recomendação é de 40 oC por l6h e 22 oC para as 8h diárias
restantes. Da mesma forma, o calor seco é menos prejudicial à planta do que o
calor úmido, sendo por isto mesmo mais usado. O calor úmido é usado apenas
para órgãos de reserva, com gemas dormentes. Um dos poucos exemplos de uso
do calor úmido, é o tratamento de toletes de cana de açúcar, que utiliza água
quente a 50-52 oC, por 30min.
Outro fator de êxito no tratamento é a utilização de plantas bem nutridas,
no final de um período de crescimento, quando os ramos estão maduros e em
repouso vegetativo. Brotações novas, em crescimento, são menos tolerantes ao
tratamento.
A eliminação das partículas virais normalmente não ocorre em toda a
planta, conforme já explicado, mas apenas nas regiões apicais dos ramos, numa
extensão normalmente tão diminuta, que impossibilita a utilização de tais ápices
para a regeneração de plantas pelos métodos convencionais tanto de estaquia
quanto de enxertia. Por isto, a termoterapia, por si só, não apresenta nenhum
interesse como técnica de limpeza clonal, mas somente se conjugada com as
técnicas de cultura de tecidos, que permitem a regeneração de plantas a partir de
fragmentos de órgãos vegetais diminutos.

Quimioterapia:
Diversos produtos químicos, supostamente com efeito inibitório sobre a
síntese de RNA viral, como "adenine arabinoside", "ribavirin", "2-thiouracil" e
outros, têm-se mostrado eficientes na eliminação de alguns vírus em algumas
espécies vegetais, quando adicionados ao meio de cultura para a regeneração de
plantas in vitro, por via direta ou indireta. Todavia, o efeito deles tem sido limitado a
determinados vírus, o que torna o interesse sobre eles também limitado, já que, na
maioria dos casos, a planta abriga mais de um tipo de vírus, além de outros
patógenos sistêmicos, sendo ideal que todos, ou pelo menos alguns deles fossem
eliminados pelo mesmo tratamento. Por este motivo, a técnica não tem encontrado
muita aplicação prática.

121
Produção de embrião nucelar:
É uma técnica que permite produzir os embriões nucelares in vitro, a partir
de cultura de nucelo extraído de sementes em início de formação. Ela é útil no
caso de espécies que não produzem sementes devido ao aborto prematuro dos
embriões. Enquanto a técnica convencional de “produção de clones nucelares”
utiliza diretamente a semente ex vitro a técnica de “produção de embrião
nucelar” induz a formação de embriões a partir de cultura de nucelo in vitro. O
seu emprego se justifica no caso de haver dificuldade para resgate dos embriões
nucelares pela técnica convencional já descrita. Após a transferência das
plântulas para o ambiente externo ao laboratório, as duas técnicas são em tudo
iguais, inclusive nos cuidados, vantagens e desvantagens.

Cultura de ápice meristemático:


É uma técnica de laboratório, denominada erroneamente por alguns de
“cultura de meristema”. A técnica consiste em se cultivar in vitro ápices caulinares
de dimensões diminutas, constituído apenas pelo meristema apical e um a dois
primórdios foliares. As dimensões do ápice variam em geral entre 0,1 e 0,3 mm de
comprimento, o qual precisa ser extraído sob microscópio estereoscópico, com
aumento de 20 a 30 vezes. A eficiência da técnica na eliminação do patógeno
depende, além de outros fatores, do comprimento do ápice extraído: se muito
pequeno, pode não acontecer a regeneração da planta; se muito grande, ele pode
vir contaminado com o patógeno. Por isto, a sua eficiência depende muito da
habilidade do operador.
Baseia-se no fato de que os patógenos sistêmicos se distribuem pela
planta por meio do sistema vascular e que este sistema só começa a se diferenciar
a partir do terceiro primórdio foliar. Desta forma, a quantidade de partículas
invasoras que atingem o ápice meristemático é muito pequena ou nula em certos
casos. Desse modo, a extração destes ápices e o seu cultivo in vitro permitem a
regeneração de plantas livres de contaminação. É uma técnica que exige destreza
do operador para a excisão de segmentos tão diminutos; caso contrário não se
consegue a eliminação dos patógenos. Por isto a técnica é sempre combinada

122
com a termoterapia prévia dos ramos doadores dos ápices, o que permite
decrescer a concentração dos patógenos nas extremidades, possibilitando maior
sucesso na operação.
Esta técnica apresenta a grande vantagem de permitir que se efetue a
limpeza clonal a partir de ápices caulinares de ramos adultos, sem a sua reversão
à juvenilidade. Desta forma, as plantas obtidas não sofrem a neofiose e nem
apresentam as demais características juvenis indesejáveis. Por outro lado, as
plantas obtidas não recuperam a capacidade para expressar a totipotência celular,
se a tiverem perdido, uma vez que não ocorre rejuvenescimento. Portanto, ela não
é uma técnica de rejuvenescimento, mas de revigoramento da planta, pela
eliminação dos patógenos sistêmicos, com garantia de manutenção das
características genéticas da planta matriz, devido tratar-se de uma técnica de
propagação vegetativa. A única limitação para o uso desta técnica é resultante da
existência, até agora, de metodologia para regeneração de plantas a partir de
ápices meristemáticos apenas para um número limitado de espécies, precisando
ser pesquisada para as demais.
Mesmo a combinação desta técnica com a termoterapia prévia dos ramos,
não garante que todos os ápices extraídos estejam livres de patógenos sistêmicos.
Por isto, as plantas obtidas precisam passar por um período de testes que
comprovem estarem elas livres do patógeno ou patógenos de interesse, antes de
serem liberadas, ou seja, precisam ser indexadas.

Microenxertia:
É uma técnica que visa permitir a realização de limpeza clonal de plantas
para as quais ainda não exista metodologia desenvolvida para cultura de ápices
meristemáticos. Ela difere da técnica de “microenxertia em cascata” por dois
motivos: nesta última, a enxertia é repetida por certo número de vezes com o
mesmo material inicial, já que o objetivo é o revigoramento clonal; e sem que os
explantes tenham que ser microscópicos, já que o objetivo não é a limpeza clonal.
Na “microenxertia”, a operação é realizada apenas uma vez, já que não há
interesse pelo rejuvenescimento do material; e os ápices meristemáticos têm que

123
ser microscópicos (0,1 a 0,3 mm de comprimento), já que se procura a eliminação
de patógenos sistêmicos. Mas ela pode ser usada com as duas finalidades,
realizando-se a microenxertia em cascata, com explantes microscópicos.
Conforme visto, algumas das técnicas descritas permitem a realização da
limpeza clonal e a reversão completa à juvenilidade. Outras permitem obter o
rejuvenescimento temporário da planta e os benefícios que ele traz, com rápida
recuperação das características adultas, mas sem a limpeza clonal. Ainda
outras, permitem realizar a limpeza clonal, sem a ocorrência de
rejuvenescimento e suas conseqüências indesejáveis. A utilização de uma das
alternativas citadas vai depender, portanto, do objetivo desejado.
Um ponto que existe em comum entre todas estas técnicas é que todas
levam a um revigoramento do clone, quer seja pelo rejuvenescimento total (com
neofiose) ou parcial, quer seja pela limpeza clonal.

124
6.1. Propagação vegetativa artificial: estaquia:

6.1.1. Conceito.
6.1.2. Base anatômica e fisiológica da regeneração de órgãos adventícios.
6.1.3. Controle do enraizamento.
6.1.4. Auxinas e sua aplicação no enraizamento de estacas.

6.1.1. Conceito.
É o método de propagação vegetativa artificial que consiste em regenerar
plantas a partir de segmentos de órgãos vegetativos (ramos, raízes e folhas)
destacados da planta-matriz e submetidos a condições apropriadas. Ao
segmento de órgão vegetativo destacado da planta-matriz e utilizado para
regenerar uma nova planta denomina-se estaca. Quando as estacas usadas na
propagação ex vitro são de dimensões reduzidas e oriundas de matrizes
cultivadas em condições controladas, são denominadas mini-estacas; para a
propagação in vitro são denominadas micro-estacas.
As estacas se classificam, quanto ao órgão de onde se originaram, em:
estacas de caule, de raiz ou de folha.
Estaca de caule ou de ramo: É aquela constituída por um segmento de
ramo, contendo uma ou mais gemas. É o tipo de estaca mais utilizado, devido à
facilidade de obtenção e maior abundância na matriz.
Em função da forma que apresentam, as estacas de ramo se denominam:
simples, de gema, com talão e com cruzeta. O tipo mais comumente utilizado é
a estaca simples, por ser a mais fácil de se obter e por permitir maior rendimento
da matriz. Todavia, algumas espécies se propagam melhor através de outros
tipos de estacas.
A estaca simples é constituída por um segmento de ramo, contendo um
ou mais nós.
A estaca de gema é constituída por apenas um segmento nodal, formado
pela gema e uma pequena porção dos entrenós adjacentes.

125
A estaca com talão é um segmento de ramo contendo uma ou mais
gemas e trazendo na base um fragmento do ramo sobre o qual se formou o
ramo que originou a estaca. Neste caso, o ramo que dará origem à estaca é
arrancado, por tração, do ramo de onde ele se originou, trazendo na base um
fragmento (talão) do mesmo.
A estaca com cruzeta é um segmento de ramo contendo uma ou mais
gemas e trazendo na base um segmento (cruzeta) do ramo sobre o qual se
formou o ramo que originou a estaca.
Por algum motivo, o fragmento ou o segmento do ramo mais velho que é
levado na base dos dois últimos tipos de estaca enraíza melhor em certas
espécies.
Em função do grau de lignificação, as estacas de ramo são classificadas
como lenhosas, semi-lenhosas e herbáceas. A identificação do grau de
lignificação é feita empiricamente tentando-se quebrar a estaca com as mãos: se
ela se partir facilmente, quando apertada com a unha, será herbácea; se
apresentar apenas pequena resistência, quando dobrada com as mãos, mas as
duas partes se separarem totalmente, será semi-lenhosa; quando oferecer
grande resistência à flexão e mostrar as pontas das fibras no ponto de ruptura,
sem que as duas partes se separem facilmente, será lenhosa.
As estacas herbáceas são provenientes de plantas herbáceas, ou da
parte apical ainda não lignificada de ramos de plantas lenhosas em crescimento
intenso, com menos de um ano e com folhas. Entre as espécies herbáceas
podem ser citadas o gerânio, crisântemo, coleus, cravo, begônia e muitas outras
ornamentais e olerícolas. As estacas herbáceas são mais sujeitas à
desidratação e exigem alguns cuidados, como a coleta dos ramos de preferência
pela manhã, embalagem imediata em saco plástico ou tecido de aniagem,
algodão ou outro, úmido e limpo, bem como manutenção à sombra e uso de
nebulização durante o enraizamento. Em geral precisam ser mantidas com uma
a duas folhas e mantidas semi-sombreadas e sob nebulização durante o
enraizamento. Nem sempre precisam ser tratadas com auxina, enraizando com
certa facilidade durante o ano todo, desde que as condições do ambiente sejam

126
apropriadas ao crescimento vegetativo das matrizes. Quando se beneficiam com
a aplicação de auxina, a quantidade é em geral pequena.
As estacas semi-lenhosas são provenientes de ramos já parcialmente
lignificados, com menos de um ano e ainda com folhas, de plantas lenhosas em
crescimento vegetativo. Entre as espécies que enraízam bem por estacas semi-
lenhosas podem ser citadas a camélia, azaléia, café, eucalipto e várias
coníferas. São sujeitas à desidratação, embora menos do que as estacas
herbáceas, sendo também beneficiadas pelos cuidados citados para estas. Em
geral precisam também ser mantidas com uma a duas folhas, se beneficiando
pelo tratamento com auxina em concentrações intermediárias, enraizando com
certa facilidade desde o final do inverno até o verão. Algumas espécies, como o
eucalipto, enraízam bem até mesmo no inverno, em clima tropical, onde as
matrizes podem manter crescimento intenso com o uso de irrigação.
As estacas lenhosas são provenientes de ramos de plantas lenhosas em
repouso vegetativo, ou da parte já lignificada de ramos de plantas ainda em
crescimento, com idade de um ano ou mais e desprovido de folhas. Entre as
espécies lenhosas podem ser citadas a figueira, oliveira, certas ameixeiras,
roseira, marmeleiro, videira e romãzeira. Devido ao alto grau de lignificação e a
ausência de folhas, as estacas lenhosas são mais resistentes à desidratação,
sendo por isto de fácil preparo, conservação e transporte, e em geral não
exigem instalação especial para enraizar, mas são quase sempre de difícil
enraizamento e em geral precisam ser estimuladas com auxina em
concentrações elevadas. A melhor resposta destas estacas ao enraizamento é
conseguida em geral em meados a final do inverno, principalmente para
espécies de clima temperado e subtropical. Muitas das espécies tropicais
continuam enraizando bem durante a primavera e verão e algumas até enraízam
melhor neste período.
As estacas lenhosas também se beneficiam de um ambiente controlado
para o enraizamento, conforme explicado para as estacas herbáceas e
semilenhosas. Todavia, muitas espécies enraízam bem em leitos de
enraizamento instalados no campo, como a videira e figueira, desde que não se

127
descuide da manutenção da umidade adequada do leito, através de irrigações
freqüentes e cobertura com palha.
As estacas de ramos em geral são preparadas com comprimento variável
entre 10 e 80 cm; em geral, quanto mais herbácea, menor é o comprimento. Nos
casos mais raros, em que as estacas lenhosas são plantadas diretamente no
campo, como as estacas de mandioca, a posição no sulco é horizontal, ficando a
estaca toda coberta com o solo. Quando plantadas em recipientes, as estacas
ficam na posição vertical, com uma gema e as folhas (se houver) acima da
superfície do substrato; quando plantadas em leitos de enraizamento, as estacas
devem ficar na posição inclinada para diminuir a profundidade de plantio, ficando
também com uma gema e as folhas (se houver) acima da superfície do
substrato. O enraizamento de estacas muito compridas, de até 80 cm, pode ficar
prejudicado por falta de arejamento, se elas forem introduzidas totalmente no
solo, com apenas uma gema acima do substrato. Elas devem, de preferência,
ser plantadas na posição inclinada, mas apenas com cerca de 20 cm enterrados
num substrato bem arejado. As estacas de videira são plantadas na posição
vertical, em covas ou sulcos profundos, ficando com 3 gemas enterradas no
substrato e duas para fora.

Estaca de folha:
É aquela constituída por um segmento de limbo foliar, ou do limbo inteiro,
acompanhado ou não do pecíolo.
Em função da forma que apresentam, as estacas de folha podem ser de
quatro tipos: segmento de limbo, folha inteira, estaca de folha com talão e estaca
de folha com cruzeta. Em todos os casos a folha deve estar bem desenvolvida e
sadia. A propagação por estacas de folha pode ser efetuada em qualquer época
do ano, desde que as condições de crescimento sejam favoráveis.
A estaca de segmento de limbo é constituída apenas por um segmento do
limbo foliar. A “Espada de São Jorge” é uma monocotiledônea de folhas
suculentas e longas que podem ser divididas em segmentos de 5-7 cm de
comprimento e introduzidas verticalmente no substrato até cerca de 3/4 do seu
comprimento. Da extremidade proximal da estaca surgirão as novas plantas. A

128
fortuna é outra espécie que pode se multiplicar por segmento de limbo foliar;
neste caso a estaca é disposta na posição horizontal, em íntimo contato com o
substrato; as novas plantas se originam de embriões dormentes, previamente
formados nos bordos do limbo.
A estaca de folha inteira é constituída pelo limbo foliar e o pecíolo. A
violeta africana e a begônia são exemplos de espécies que se multiplicam por
estacas deste tipo. A folha é colocada na posição horizontal, com a face dorsal
para baixo e em íntimo contato com o substrato úmido. No caso da violeta
africana o pecíolo é introduzido no substrato e as novas plantas surgem da sua
extremidade. No caso da begônia as nervuras devem ser previamente
seccionadas em diversos pontos, de onde surgirão as plântulas.
A estaca de folha com talão é constituída pelo limbo, pecíolo e fragmento
do ramo de onde a folha se originou. As plantas surgirão do calo formado na
superfície injuriada do talão.
A estaca de folha com cruzeta é constituída pelo limbo, pecíolo, segmento
do ramo onde a folha se originou e gema axilar; esta dará origem ao novo ramo
e as raízes surgirão na região proximal da cruzeta. O guaraná se multiplica por
este tipo de estaca. A gema é colocada 1,5 cm abaixo da superfície do substrato
e deve estar desenvolvida e em crescimento.
Estaca de raiz:
É constituída unicamente por um segmento de raiz. É pouco utilizada para
a propagação, devido à dificuldade de obtenção, necessitando escavar o solo, o
que resulta em custo elevado. Mesmo assim é usada para a clonagem da fruta-
pão sem sementes e algumas outras espécies que não se propagam por outras
técnicas mais simples. Esta estaca exige os mesmos cuidados recomendados
para estacas de ramo herbáceas, devido se desidratar com grande facilidade. A
época mais apropriada é o final do inverno e início da primavera.
Quando plantadas na posição vertical, a extremidade proximal fica
ligeiramente acima da superfície do substrato; quando na posição horizontal, a
raiz deve ser coberta com 3,0 a 5,0 cm de substrato.

129
As estacas de ramo são extraídas com pelo menos uma gema e a tarefa
consistirá em estimular na estaca o fenômeno da rizogênese adventícia, ou seja,
a formação de raízes adventícias, as quais formarão o sistema radicular da nova
planta, enquanto a gema, ou gemas, da estaca original formará a parte aérea.
Em estacas de raiz será necessário estimular o fenômeno da cauligênese
adventícia, ou seja, a formação de pelo menos uma gema adventícia, que
formará a parte aérea da nova planta, enquanto a estaca original constituirá o
sistema radicular. E em estacas de folha haverá necessidade do estímulo à
formação tanto de gemas quanto de raízes adventícias a partir de suas células,
para formar uma nova planta, a qual se destacará posteriormente da estaca
original, que será eliminada.

6.1.2. Base anatômica e fisiológica da regeneração de órgãos adventícios:

A planta, como todo organismo multicelular, é formada por tecidos


organizados, com funções diferentes, sendo formados por unidades básicas - as
células - que se diferenciam de várias maneiras, para atender a funções
específicas nos tecidos dos quais fazem parte.
Os estudos de fisiologia vegetal mostram que esta diversidade anatômica
resulta numa diversidade funcional de células, tecidos e órgãos nos diferentes
locais do organismo, imprescindível para o perfeito funcionamento de todo o
conjunto e para a sua perfeita interação com o ambiente.
Assim, os aspectos anatômicos e fisiológicos do organismo vegetal estão
intimamente associados e atuam em sincronia, para que todas as funções do
conjunto se desenvolvam harmonicamente. E sempre que esta harmonia é
quebrada em qualquer ponto, sinais são emitidos pelas células envolvidas, de
modo a acionar fatores locais ou distantes do ponto afetado, que passam a
interagir no sentido de restabelecer a situação original. Desta forma, sempre que
um órgão for danificado ou extirpado, ocorrerá uma reação anatômica e
fisiológica - reação morfogênica - imediata, no sentido de regenerar o tecido
injuriado, ou de gerar um novo órgão completo em substituição àquele perdido.

130
Para melhor entender a reação morfogênica que ocorre durante o
processo de estaquia serão discutidos os diferentes aspectos envolvidos
principalmente na formação de raízes adventícias, devido ser este o principal
problema enfrentado pelo propagador de plantas, já que estacas de ramo são
normalmente as mais empregadas com esta finalidade; mas, quando pertinente,
serão feitas também considerações sobre o fenômeno menos estudado da
formação de gemas adventícias, que difere da rizogênese em alguns aspectos,
mas cujo mecanismo geral é semelhante.

A. Polaridade:
Anatomicamente, a planta é uma estrutura gerada por dois pontos de
crescimento, denominados meristemas caulinar e radicular, que se alongam em
sentidos opostos a partir de um ponto inicial denominado colo ou coleto,
formando um eixo longitudinal com ramificações que em geral se distribuem
radialmente em torno do eixo. À porção deste eixo que cresce com geotropismo
negativo denomina-se caule; à outra porção que cresce com geotropismo
positivo denomina-se raiz. Este eixo apresenta características anatômicas e
fisiológicas diferentes nos dois sentidos, as quais se modificam ao longo do eixo,
à medida que a planta se desenvolve. Disto resulta uma estrutura dotada de dois
pólos opostos, que se comportam fisiologicamente de maneira diferente,
fenômeno a que se denomina polaridade.
Dentre os processos internos da planta ligados à polaridade e de
importância para a reação morfogênica na estaquia estão a circulação de sais
minerais e compostos orgânicos, dentre eles os hormônios. A circulação de
compostos minerais se inicia nas extremidades das raízes e se movimenta em
direção às extremidades dos ramos, enquanto os compostos orgânicos
produzidos nas extremidades dos ramos se movimentam em direção às
extremidades das raízes. No que diz respeito aos hormônios, a citocinina é
produzida pelos pontos de crescimento das raízes e se movimenta em direção
às extremidades dos ramos, enquanto a auxina, produzida pelos pontos de
crescimento dos ramos se movimenta em direção às extremidades das raízes.

131
Quando um ramo, raiz ou folha da planta é seccionado e um segmento
dele é extraído, a polaridade do órgão se mantém e, como conseqüência, a
estaca apresenta duas extremidades com características distintas, denominadas
extremidade distal e extremidade proximal. A extremidade distal da estaca é
aquela que se situava mais distante do colo da planta, quando o segmento fazia
parte integrante do órgão, e a extremidade proximal é aquela mais próxima do
colo da planta. Desta forma, após a extração da estaca, os sais minerais e
compostos orgânicos que transitavam naquela região continuam o seu percurso
e se acumulam na extremidade correspondente, ou seja: citocinina e sais
minerais, na extremidade distal de estacas de ramo e extremidade proximal de
estaca de raiz; e auxina e compostos orgânicos, na extremidade proximal de
estacas de ramo ou extremidade distal de estacas de raiz. Como a citocinina é o
hormônio responsável por induzir a quebra de dormência de gemas e a
formação de gemas adventícias, e a auxina o hormônio responsável por induzir
a quebra de dormência de raízes e a formação de raízes adventícias, elas
promovem a formação dos órgãos correspondentes nas extremidades onde se
acumulam. Além destes, outros fatores de crescimento existem e continuam o
seu percurso em direção às extremidades correspondentes da estaca. No caso
de estaca de folha, a formação de gemas e raízes adventícias ocorre nos pontos
que sofreram injúria, como, por exemplo a extremidade proximal do pecíolo da
violeta africana, os pontos seccionados da nervura da begônia, ou a
extremidade proximal do limbo da folha de espada de São Jorge e outras
semelhantes.

B. Tecidos envolvidos:
A estrutura anatômica de ramos de plantas herbáceas, lenhosas e de
diferentes grupos taxonômicos é basicamente a mesma. Com exceção das
monocotiledôneas, que não possuem um câmbio vascular definido, as demais
plantas apresentam este tecido separando a medula e o xilema dos demais
tecidos situados externamente a ele, ou seja, floema, parênquima interfascicular,
córtex e felogênio.

132
Em geral, as raízes adventícias em estacas de ramo se originam
externamente ao câmbio vascular, a partir das células do parênquima
interfascicular e nas proximidades dos raios vasculares. Dependendo, porém, da
natureza da planta, se herbácea, lenhosa, gimnosperma, monocotiledônea ou
dicotiledônea, a localização pode variar, sendo um pouco mais externa nas
plantas herbáceas do que nas lenhosas e podendo se originar também de
células dos raios vasculares, do câmbio vascular e até mesmo de células da
medula, em alguns casos. Em casos raros, como acontece em estacas de ramo
de Tamarix, as novas raízes surgem a partir das lenticelas, portanto a partir de
tecidos bem mais externos da estaca.
Na maioria das vezes, o primórdio radicular se forma no interior da estaca
e sempre na extremidade proximal de estacas de ramo, diretamente a partir de
células que se desdiferenciam e adquirem características meristemáticas tais
como paredes finas e ausência de vacúolos, tamanho reduzido e capacidade
para se multiplicar rapidamente. Essas células se agrupam para formar o
primórdio cuja parte distal se destaca dos demais tecidos e se alonga no sentido
radial, atravessando o córtex e rompendo finalmente através da epiderme.
Quando existe um anel de fibras vasculares contornando o floema, ou estas
degeneram na passagem da raiz ou a raiz se desvia na direção basípeta e
emerge na extremidade proximal da estaca.
Outras vezes, o primórdio radicular se forma a partir de células do calo,
um tecido formado por células de natureza parenquimática irregularmente
diferenciada e que se multiplicam desordenadamente nas extremidades da
estaca. As células que formam o calo emergem na extremidade da estaca,
provenientes da mesma região e a partir dos mesmos tecidos envolvidos na
formação dos primórdios radiculares, no caso anterior. O primórdio radicular,
neste caso, se forma a partir de células do calo que se tornam meristemáticas e
seguem o mesmo processo ontogênico já descrito, culminando com a
emergência da raiz à superfície do calo. Isto acontece, por exemplo, em estacas
provenientes de ramos adultos de Hedera helix, Sequoia sempervirens e Pinus
radiata (Teixeira, 1981).

133
Em qualquer dos casos, ao mesmo tempo em que o primórdio radicular
se alonga e emerge na superfície, o sistema vascular da nova raiz se diferencia,
conecta-se ao sistema vascular da estaca e a coifa é formada no ápice da raiz.
Talvez devido à dificuldade de obtenção e, conseqüentemente, ao menor
interesse na utilização de estacas de raiz para a clonagem de plantas, as
informações para estas estacas são mais escassas. Neste caso, o problema
consiste em se estimular a formação de gemas adventícias na extremidade
proximal da estaca e de raízes secundárias na extremidade distal. Gemas
adventícias são formadas próximo ao câmbio vascular em raízes novas. Em
raízes adultas, as gemas podem se originar externamente, a partir do felogênio,
ou internamente nas proximidades dos raios vasculares, ou ainda a partir de
calo formado à superfície da extremidade proximal da estaca.
Da mesma forma que em estacas de ramo, a habilidade das estacas de
raiz para formar gemas ou raízes adventícias é variável, sendo maior em
estacas obtidas de raízes na fase juvenil do que na fase adulta, bem como
variável com a espécie. Estacas de ramo de algumas espécies já trazem
primórdios de raízes secundárias latentes, desta forma enraizando com
facilidade, bastando que a estaca seja destacada da planta-matriz e colocada
em ambiente que favoreça o enraizamento. Em algumas poucas espécies,
gemas adventícias se formam mais prontamente em estacas de raiz do que
raízes adventícias em estacas de ramo.
Em estacas de folha, os tecidos que originam as novas plantas variam
com a espécie. Em espécies como a fortuna, embriões se formam durante o
desenvolvimento da folha, em áreas que permanecem meristemáticas nos
bordos do limbo e aí permanecem dormentes; quando a folha ou segmento de
limbo é extraído e colocado em condições apropriadas, eles se desenvolvem.
Em plantas como a violeta africana, em que a regeneração ocorre na base do
pecíolo, as raízes adventícias se formam nos tecidos internos, nas proximidades
dos feixes vasculares, enquanto as gemas adventícias se formam a partir de
tecidos mais externos, como epiderme e córtex. Em outras espécies, as gemas
e raízes adventícias se originam do calo formado na extremidade proximal do

134
segmento de limbo ou do pecíolo, ou ainda nos pontos seccionados das
nervuras. Nestes casos, a gema e a raiz adventícia se formam
independentemente uma da outra; depois se estabelece a conexão vascular
entre elas, a partir de diferenciação de células do calo situadas entre os dois
órgãos.
A formação das raízes adventícias em estacas de folhas em geral se
antecipa à formação das gemas adventícias.

C. Ontogênese da raiz adventícia:


Considera-se que a formação da raiz adventícia acontece em duas fases
distintas, a primeira correspondendo à formação do primórdio radicular e, a
segunda, ao alongamento da raiz. Isto se baseia no fato bem conhecido em
espécies onde os primórdios radiculares são formados durante o crescimento do
ramo, mas permanecem dormentes até que a estaca seja extraída e colocada
em ambiente apropriado para enraizar, como acontece no abacaxizeiro, Ficus
pumila e muitas outras espécies. Todavia, o fenômeno nem sempre acontece
desta forma, podendo a primeira fase consistir apenas na indução da célula
inicial que dará origem ao primórdio radicular, sem que nenhuma mudança
anatômica seja notada nos tecidos da estaca nesta fase. Posteriormente ocorre
a formação do primórdio e o seu alongamento, numa única fase, como
observado em Sequoia sempervirens cultivada in vitro (Teixeira, 1981). Estas
duas fases acontecem segundo exigências fisiológicas distintas, principalmente
quanto à presença de auxina, que é necessária na primeira fase e
desnecessária, ou mesmo inibitória ao prosseguimento do processo, na segunda
fase, conforme relatado por Teixeira (1981).
O conjunto de fenômenos que levam à formação da raiz adventícia em
estaca de ramo se inicia com um aumento da atividade da amilase e invertase e
consumo de carboidratos (Bhattacharya e Nanda, 1978; Sadhu e outros, 1978),
além de nutrientes minerais (Good e Tukey Jr., 1967), resultando em hidrólise do
amido depositado ao longo da estaca, que é convertido em glucose, a qual se
transloca basipetamente e deposita novamente sob a forma de amido na

135
extremidade proximal da estaca, enriquecendo as células locais com esta
reserva; em seguida, este amido novamente se converte em glucose e passa a
ser utilizado pelas células locais como energia para o processo. As modificações
anatômicas se iniciam com o aumento em volume e afrouxamento das células
do parênquima cortical em zonas potencialmente aptas à rizogênese (Firsanova
e Shmeleva, 1978), o que parece ser causado pelo aumento da capacidade de
retenção de água destas células (Yusufov e Movchan, 1977), as quais
apresentam núcleo e nucléolo aumentados e citoplasma denso (Chang e Chan,
1976), além de síntese intensa de RNA, DNA (Anzai, 1975) e proteínas (Jalouzot
e outros, 1975).

D. Fatores envolvidos na rizogênese adventícia:


A formação de raízes adventícias em estacas é controlada por diversos
fatores, alguns deles internos e outros externos à estaca, sendo os internos
divididos em dois grupos: translocáveis e localizados. Dentre estes fatores, há
os que estimulam o enraizamento, denominados promotores de enraizamento, e
outros que inibem o fenômeno, denominados inibidores de enraizamento.
Para que o enraizamento ocorra é preciso que os níveis dos fatores
envolvidos no fenômeno estejam dentro de certos limites; se o nível de um único
deles estiver fora do limite permissivo ao fenômeno, o enraizamento pode não
acontecer ou não se realizar em toda a sua plenitude, dependendo do grau de
limitação do fator. Logicamente que, para os promotores de enraizamento, existe
um nível mínimo e um máximo dentro de cujos limites o fenômeno pode se
realizar, bem como um nível ótimo dentro destes limites que permite o máximo
de enraizamento. Para os inibidores, o máximo de enraizamento ocorre na
ausência completa do fator e se reduz gradativamente à medida que a
concentração dele na estaca aumenta, até atingir uma concentração máxima a
partir da qual a rizogênese fica totalmente inibida.

Os fatores translocáveis são o grupo de fatores internos produzidos nas


diferentes partes da planta e se translocam nos dois sentidos, basípeto (auxina,
carboidratos, co-fatores e inibidores de enraizamento, além de outros) e

136
acrópeto (citocinina e sais minerais), os quais se acumulam nas extremidades
distal ou proximal da estaca, onde atuam na formação dos órgãos relacionados.

Dentre os fatores translocáveis, os co-fatores do enraizamento são


substâncias que atuam no processo de enraizamento como sinergistas das
auxinas, potencializando os seus efeitos rizogênicos. Geralmente são
substâncias fenólicas, tais como: ácido clorogênico, catecol, floroglucinol e
terpenóides oxigenados.
Outros fatores translocáveis, também de natureza fenólica, são
produzidos nas folhas e se translocam para a extremidade de enraizamento,
inibindo o processo, sendo denominados inibidores de enraizamento.
Os fatores localizados são os fatores internos compartimentalizados nas
células, não se movimentando pela planta. Supõe-se que sejam principalmente
enzimas, responsáveis pela catalização das reações químicas que levam a
célula a se transformar num primórdio radicular.
Os fatores externos são os fatores ambientais que podem afetar tanto a
planta matriz, quanto as estacas. São eles: luz, temperatura, umidade, oxigênio,
microorganismos do solo, pH do substrato e outros.

6.1.3.Controle do enraizamento:
Conforme foi discutido, a rizogênese adventícia é um fenômeno de
grande complexidade, governado por um grande número de fatores, uns
intrínsecos, outros extrínsecos à planta e que interagem entre si favorável ou
desfavoravelmente, cada um agindo dentro de limites mínimos e máximos, além
dos quais o fenômeno não acontece. O problema se torna ainda maior pelo fato
de ainda não se conhecer exatamente os níveis ótimos de cada um deles para
as diferentes espécies vegetais. Para o sucesso total da operação é preciso que
aqueles fatores inibitórios do processo estejam ausentes e aqueles indutores no
seu nível ótimo. Com estes últimos se afastando do seu nível ótimo, a eficiência
do processo se reduz, até se tornar nula, quando os limites permissivos, inferior
e superior, forem ultrapassados. Assim, mesmo na ausência de fatores
inibitórios, o processo pode não acontecer ou ter sua eficiência reduzida, se

137
apenas um dos fatores indutores estiver fora dos limites permissivos. E a
situação se complica ainda mais quando algum inibidor se encontra presente,
sem que existam meios para detectá-lo.
Quando não há informação sobre uma determinada espécie problema, o
melhor que se pode recomendar é montar inicialmente um teste com diferentes
níveis de auxina, mantendo-se os níveis recomendados como regra geral para
os demais fatores. A seguir são feitas algumas recomendações a serem
seguidas:
Fatores intrínsecos à planta:
Diversos aspectos ligados à planta matriz, como genótico, estado
nutricional, fase anual de crescimento, grau de lignificação e de juvenilidade do
ramo, afetam a reação rizogênica.
O genótipo é da maior importância. Sabe-se que há grande variabilidade
genética na propensão ao enraizamento adventício, mesmo entre cultivares de
uma mesma espécie, como acontece com eucalipto. Além disto, plantas em
estado nutricional adequado fornecem estacas propensas a enraizar melhor do
que plantas com alguma deficiência mineral.
Estacas extraídas na fase anual de crescimento vegetativo enraizam
melhor, em relação àquelas obtidas de plantas na fase reprodutiva.
Considerando as fases de crescimento anual das plantas nas diferentes
estações do ano, as espécies herbáceas em geral enraizam bem em qualquer
estação do ano, desde que as condições do ambiente de enraizamento sejam
adequadas. Já a reação das espécies lenhosas varia muito com relação a este
fator. Estas espécies acumulam reservas nutricionais e inibidores no outono,
precedendo a entrada no repouso hibernal. Por isto este é o período mais
impróprio para o enraizamento, sendo o final do inverno e início da primavera a
melhor época, principalmente para as espécies de clima temperado e muitas de
clima subtropical. Para as espécies tropicais, esta é também uma das melhores
épocas, mas muitas destas espécies continuam enraizando bem durante todo o
restante da primavera e verão.

138
Estacas extraídas na base do tronco de planta lenhosas enraizam melhor,
devido a estas plantas reterem aí características de juvenilidade. Da mesma
forma, estacas extraídas de plantas juvenis enraizam melhor do que as de
plantas adultas. Quanto ao grau de lignificação da estaca, a reação ao
enraizamento é variável com a espécie, algumas respondendo melhor com
estacas herbáceas, outras com estacas semi-lenhosas e ainda outras com
estacas lenhosas.
Controle do ambiente:
Desde que os demais fatores estejam no seu ótimo, o sucesso do
processo de enraizamento adventício dependerá do controle dos fatores
ambientais: temperatura, luz e umidade do ar e do substrato, bem como a
composição deste último, a qual se refletirá no seu arejamento, teor de umidade
e microflora. Quando o enraizamento é feito diretamente nos recipientes onde a
planta será mantida permanentemente, ou até que esteja em condições para ser
plantada no local definitivo, como no caso de ornamentais, a capacidade de
troca iônica e de retenção de umidade, o arejamento, bem como o teor de
nutrientes do substrato são da maior importância. Quando, porém, o substrato
será empregado apenas para promover o enraizamento de estacas, cujas
plântulas serão em seguida transferidas para outro local onde completarão a sua
formação ou se desenvolverão em definitivo, o aspecto nutricional deixa de ser
importante; haja vista que certas plantas enraizam melhor em substrato
constituído por areia pura ou casca de arroz carbonizada. Esta última tem sido
usada com sucesso e amplamente para o enraizamento de grande número de
espécies ornamentais e florestais. Além de permitirem um balanço adequado de
umidade e arejamento no ambiente enraizante, estes substrato são praticamente
isentos de microorganismos patogênicos.
Normalmente o controle de temperatura do ambiente enraizante não é
uma preocupação em climas tropicais, mas em climas mais amenos pode haver
vantagens em se aquecer o leito de enraizamento, de modo a manter sua
temperatura entre 24 e 27 0C, permanecendo a do ar mais baixa.

139
Existe um mínimo, um ótimo e um máximo de temperatura para cada
cultura. Para o processo de enraizamento, de modo geral, as plantas têm
respondido melhor a temperaturas da ordem de 24C. O ideal é que a
temperatura do meio enraizante seja em torno de 5C mais elevada do que a
temperatura do ar exterior, de modo a estimular, primeiramente, o enraizamento
e posteriormente o desenvolvimento das gemas e das brotações. Temperaturas
mais baixas no meio ambiente reduzem a transpiração e a respiração da estaca,
retardando a brotação das gemas. Temperaturas mais elevadas no substrato
estimulam a respiração das células da estaca e a formação dos primórdios
radiculares. Temperaturas diurnas entre 21 e 26C e noturnas entre 15 e 18C
otimizam o enraizamento na maioria das espécies. Em geral as temperaturas
noturnas devem ser inferiores às diurnas.
A luz influencia no processo de enraizamento, em função de sua
intensidade e do fotoperíodo.
A luz é necessária ao enraizamento de estacas herbáceas e semi-
lenhosas, uma vez que estas não possuem quantidades apreciáveis de reservas
nutritivas. Estas estacas são preparadas deixando-se pelo menos um par de
folhas permitindo a síntese de carboidratos e de outras substâncias úteis ao
enraizamento. As estacas lenhosas, por apresentarem bom acúmulo de
reservas, normalmente não necessitam de folhas e de iluminação para o seu
enraizamento. Aliás, a presença de luz até prejudica o enraizamento de estacas
lenhosas de algumas espécies lenhosas, por estimulares nestas a formação de
inibidores durante o período de enraizamento.
Ainda que a luz seja benéfica para o enraizamento de estacas herbáceas
e semi-lenhosas, uma radiação excessiva pode promover o seu dessecamento.
Assim sendo, as estacas devem ser colocadas para enraizar em instalações
(casa de vegetação, câmara de nebulização, telado ou ripado) que permitam um
melhor controle da irradiância, bem como de outros fatores ambientais.
À semelhança da intensidade da luz, também o fotoperíodo durante o
período de enraizamento pode afetar os resultados, mas a maioria das espécies

140
enraiza bem em fotoperíodo longo; algumas poucas espécies são indiferentes a
este fator.
Estudos de laboratório mostram que também o comprimento de onda
afeta a rizogênese, mas o seu controle não á viável comercialmente.
Outra preocupação inexistente em viveiros comerciais é com o controle
do fotoperíodo e do comprimento de onda no ambiente de enraizamento, já que
não afetam significativamente o process. Contudo, o controle do nível de
irradiância tem sido prática normal, já que estacas de muitas empécies,
enraizadas com folhas, precisam de iluminação, embora esta deva ser amena.
Para isto, as estacas são em geral enraizadas sob telados, que reduzem
parcialmente a intensidade luminosa, em níveis variáveis, de acordo com a
necessidade da espécie. Em alguns casos efetua-se até o sombreamento da
planta-matriz que fornecerá as estacas. Esta é posta a crescer por algumas
semanas em ambiente com baixa irradiância, como telado ou ripado, de modo
que os ramos assim formados apresentam um estiolamento parcial, onde a
característica mais importante é uma redução da formação de filbras vasculares,
que em geral mostra correlação com o aumento da capacidade de enraizamento
das estacas extraídas destes ramos. Estudos com macieira levaram à hipótese
de que o efeito da baixa luminosidade possa estar relacionado com uma
interferência na rota bioquímica que leva à formação de lignina e utiliza para isso
o floroglucinol, que é um conhecido co-fator de enraizamento, encontrado
naturalmente nas Rosaceae. Assim, a baixa luminosidade suprimiria esta rota,
inibindo ou reduzindo a formação de fibras, e deixando o referido fenol
disponível para interagir com a auxina, estimulando o enraizamento. A
supressão ou redução da formação de inibidores de enraizamento neste
ambiente é outra hipótese levantada.
Outro controle da maior importância é o da umidade relativa do ar (UR) e
do substrato no ambiente de enraizamento. O ideal é que a UR do ar não caia
abaixo de 95% e a do substrato se situe na sua capacidade de campo. O
excesso de água no substrato, além de prejudicar a respiração dos propágulos,
propicia também a proliferação de microrganismos fitopatogênicos que causam

141
o apodrecimento das estacas. A UR do ar é controlada eficientemente com o
uso de atomizadores e, a do substrato, com microaspersores comandados por
timer que regula as aspersões em quantidade e intervalo adequados.
É importante que o substrato apresente um balanço adequado de
componentes, de tal forma que suas características físicas, químicas e
biológicas se situem dentro dos limites desejados, tais como pH entre 6,5 e 6,8,
condutividade elétrica abaixo de 4,0 Siemens m-2 s-1, porosidade elevada, além
de outras características, como elevada capacidade de retenção de água e de
troca iônica. Isto se consegue, escolhendo adequadamente os componentes do
substrato e a proporção entre eles. As sementeiras e leitos de enraizamento
tradicionais usam simplesmente areia, ou esta em mistura com terra e resíduos
orgânicos diversos. Modernamente, a prática do enraizamento em recipientes
levou à necessidade do emprego de substrato leve e poroso, à base de
vermiculita, turfa e resíduos industriais diversos. Hoje em dia se vem preferindo
os substratos comerciais, produzidos pela mistura de vermiculita com composto
orgânico proveniente de casca de árvores, que têm dado os melhores
resultados, já que são produzidos dentro das especificações técnicas desejadas.
A assepsia do ambiente é outro cuidado de vital importância, pois os
patógenos de solo constituem causas freqüentes de insucessos. Por isso,
recomenda-se tratar as estacas com um fungicida apropriado, tal como o
Benlate ou Captan. Embora não muito usado, é vantajoso também tratar
estacas de espécies muito sensíveis a patógenos de solo, em solução de
hipoclorito de sódio a 0,1% (água sanitária diluída), por 15 minutos, o que
permite a completa eliminação de microorganismos superficiais indesejáveis.
Depois disso, trata-se com o fungicida. Torna-se importante também manter
limpo o local de trabalho, eliminando-se restos vegetais, além de outros
materiais sabidamente contaminados. O emprego de substrato contaminado
pode resultar em completo desastre. Por isto, é da maior importäncia que o
substrato seja esterilizado, ou pelo vapor, ou por alguma outra técnica disponível
e nunca reusar substrato ou recipientes já utilizados. A menos que estes últimos
sejam lavados e submetidos a uma sanitização rigorosa. Os substratos

142
comerciais são produzidos com componentes estéreis e normalmente não
oferecem risco, se transportados, armazenados e manuseados com os devidos
cuidados.
Artifícios diversos:
A anelagem é um dos artifícios utilizados para favorecer o enraizamento
de estacas. Consiste em se fazer um anelamento do ramo algumas semanas
antes da coleta das estacas, removendo-se um anel de casca de 5cm ou mais
de comprimento, no ponto do ramo que virá constituir a extremidade proximal da
estaca, com a finalidade de interromper neste ponto o fluxo basípeto de
promotores do enraizamento, como auxina e carboidratos, além de outros. Ao se
extrair a estaca cortando-a no ponto anelado, os referidos promotores
acumulados na base da estaca estimularão o seu enraizamento. Dependendo
do tempo decorrido entre a anelagem e a extração da estaca, ocorrerá
regeneração do tecido cambial da área anelada e poderá ser necessário repetir
a anelagem no mesmo ponto.
Um artifício semelhante ao anterior, mas com base em outro princípio,
consiste em se cobrir o ponto do ramos que virá a constituir a extremidade
proximal da estaca, com fita preta de uns 3cm de largura, cerca de 3 meses
antes da extração da estaca, o que promove o estiolamento na área e estimula a
ação de algum fator localizado; talvez algum processo enzimático benéfico ao
enraizamento.
Outro artifício que em geral estimula o enraizamento consiste em causar
injúrias na extremidade proximal da estaca, tais como incisões, torção
esmagamento, ou descascamento, o que estimula a divisão celular na região do
câmbio vascular, passo inicial para a regeneração de raízes. As incisões
consistem em cortes longitudinais ascendentes, a partir da base da estaca, com
cerca de 3cm de comprimento, feitas com canivete, faca, ou tezoura de poda. A
torção é feita com a mão ou com um alicate, de modo a dilacerar a casca na
base da estaca. O esmagamento é feito com uma pancada de martelo ou outro
agente contundente, na base da estaca. E o descascamento é feito retirando-se

143
um anel de casca de uns 3cm de comprimento, na base da estaca. Quando se
aplica auxina na base da estaca, isto é feito após a realização da injúria.
A estratificação de estacas é outro artifício que traz benefício ao
enraizamento de estacas lenhosas de espécies problema, especialmente
aquelas que demoram várias semanas para enraizar e precisam ser
preservadas num ambiente com controle mais preciso principalmente de
umidade e temperatura, além de se beneficiarem de um ambiente ao abrigo da
luz. Aí elas ficarão pelo período necessário ao desenvolvimento das
modificações internas que levarão à formação dos primórdios radiculares, mas
só até este ponto, quando então deverão ser removidas para os vasos, bandejas
ou leitos de enraizamento, onde as raízes se alongarão e as gemas abrolharão,
completando o processo. A técnica consiste em se intercalar camadas de
estacas com camadas de substrato, formando estratos – daí o nome
estratificação. O substrato deve ser poroso, de modo a permitir bom arejamento,
quando na capacidade de campo, e assim evitar excesso de umidade. O
substrato deve envolver bem as estacas, sem a formação de espaços vazios, o
que permitiria o desenvolvimento de patógenos e deteriorização das estacas.
A estratificação pode ser efetuada em recipientes diversos, que permitam
bom arejamento, como caixas de madeira, com altura que permita acondicionar
no máximo três camadas de estacas. Mais do que isto resultará em arejamento
deficiente para as camadas inferiores. Começa-se a estratificação com a
deposição de uma camada de cerca de 5cm no fundo da caixa, sguindo-se a
intercalação das camadas de estacas e substrato, e terminando com uma
camada de substrato. Este deve ser umedecido previamente, até o ponto em
que, apertando-se-o fortemente na mão, escorram umas poucas gotas de água.
A caixa deve ser coberta com um pano, que deve ser mantido úmido. O
recipiente deve ser inspecionado com frequência, antes que o substrato
desidrate, desmontando-se as camadas e inspecionando as estacas; aquelas
com sinal de deterioração devem ser eliminadas. Em seguida, reacondiciona-se
o material da mesma forma já explicada, usando-se novo substrato, se forem
detectadas estacas deterioradas. Para minimizar o risco de deterioração de

144
estacas, deve-se usar substrato estéril e as estacas devem ser previamente
tratadas com fungicida. Quando se emprega qualquer dos outros artifícios
descritos, eles precederão a estratificação.

6.1.4. Auxinas e sua aplicação no enraizamento de estacas


Skoog e Miller (1957) mostraram que a natureza da regeração de órgãos
in vitro é regulada não apenas pela auxina, mas por um balanço entre auxina e
citocinina: um certo balanço entre estes dois hormônios resulta na formação de
gemas adventícias; quando a proporção da auxina aumenta em relação à
citocinina, formam-se raízes adventícias. Outros estudos mostram que a
exigência de auxina exógena para estimular o enraizamento de estacas pode
ser muito reduzida ou mesmo nula (estacas herbáceas), mas podendo ser
elevada para muitas espécies lenhosas, e que a aplicação de citocinina é em
geral prejudicial ao processo. Possivelmente a citocinina residual que ainda
permanece na estaca em quantidade infinitesimal, após a sua separação da
planta matriz, já seja suficiente. Como estes dois hormônios devem existir em
quantidades ínfimas translocando através da estaca no momento da sua
separação da planta matriz, cada um em direção à extremidade
correspondente, a quantidade de auxina aumentará e a de citocinina diminuirá
continuamente na extremidade proximal da estaca de ramo, até atingir um ponto
em que o balanço entre eles seja ideal para dar partida ao processo de
rizogênese adventícia, em estacas de espécies que enraizam facilmente; em
estacas de espécies de difícil enraizamento, possivelmente a quantidade de
auxina acumulada seja muito baixa e nunca atinja o mínimo necessário para
compor o balanço indutor auxina/citocinina, embora esta última, por ser
necessária em quantidade mínima, possa estar num nível permissivo ao
processo; daí o efeito benéfico de aplicação de auxina exógena em estacas de
muitas espécies problema. Contudo, a aplicação de auxina nem sempre resulta
no sucesso esperado, já que este é apenas o fator que dispara o processo
rizogênico; para que o processo prossiga é necessário que todos os demais
fatores envolvidos não estejam em desequilíbrio. Se apenas um deles estiver

145
inibindo o processo, o enraizamento pode não ocorrer. Daí a explicação para
uma das causas de insucesso.
Como a auxina é o fator que desencadeia o processo rizogênico, este é o
primeiro fator que se procura otimizar, visando estimular o enraizamento
adventício em estacas de ramo.
Além da auxina produzida naturalmente nas plantas, que é o ácido 3-indol
acético (AIA), existem ainda outras produzidas sinteticamente, como o ácido 3-
indol butírico (AIB), o ácido -naftaleno acético (ANA) e o ácido 2,4-
diclorofenoxiacético (2,4-D), além de outras menos utilizadas. Estas auxinas
diferem entre si em relação a algumas de suas características. A potência delas
para estimular o enraizamento e a estabilidade quanto à destruição por fatores
adversos, como temperatura e intensidade luminosa elevadas, além da
decomposição pelo Acetobacter acetii, aumenta na seguinte ordem: AIA < AIB <
ANA < 2,4-D. Quanto ao preço do produto, decresce mais ou menos na mesma
ordem. O AIB e o ANA são as duas auxinas mais utilizadas na prática da
propagação comercial. Isto se deve ao fato de serem ambos bastante estáveis,
sendo o AIB pouco afetado pelo ataque do Acetobacter e muito tolerante ao
efeito negativo da luz e de temperaturas elevadas, enquanto o ANA apresenta
elevada tolerância aos efeitos negativos de todos estes fatores. O AIA não é
utilizado, devido tanto ao seu preço muito elevado quanto à sua maior
vulnerabilidade à ação dos fatores destrutivos. Sabe-se que uma solução diluída
de AIA pode ser destruída em poucos minutos por luz intensa e em pouco mais
de duas semanas pelo Acetobacter. Todavia, apresenta tolerância razoável à
destruição por temperaturas elevadas. Quando autoclavado em laboratório, a
1210C, por 15 minutos, pode perder 10% de sua ação. O 2,4-D também é
raramente empregado. Apezar de ser o mais barato e praticamente imune aos
efeitos negativos dos fatores citados, ele é mais propenso a estimular
calejamento em detrimento da rizogênese. Todavia, algumas espécies de
plantas lenhosas, como a seringueira, enraizam bem com este fitorregulador.
A aplicação de auxina em estacas pode ser feita de três maneiras:
através de solução líquida diluida ou concentrada, e em pó, pela dispersão do

146
ingrediente ativo em talco. As formulações líquidas resultam em decomposição
do princípio ativo com o passar do tempo, o que não acontece com a dispersão
em talco; por isso, esta é a forma encontrada no comércio. As formulações
comerciais são preparadas em geral com AIB ou com uma mistura deste com
ANA, sendo encontradas em geral em três concentrações, que variam entre 200
ppm e 10.000 ppm (200 e 10.000 mg L-1); a menor concentração destinada a
estacas herbáceas, a intermediária para estacas semilenhosas e a maior para
estacas lenhosas. Contudo, esta indicação não corresponde à realidade, já que
a resposta das estacas é imprevisível, não sendo raro acontecer que estacas de
um grupo respondam à concentração recomendada para outro grupo, ou então
que não responda a nenhuma delas. É recomendavel sempre fazer um teste
com as três concentrações, para cada espécie a ser enraizada.
Quando se trabalha com um grande volume de estacas, é vantajoso
economicamente preparar a solução ou dispersão para o próprio uso. Mas isto
exige que se trabalhe em ambiente com nível elevado de assepsia, empregando
utensílios devidamente sanitizados, da mesma forma que os frascos de
embalagem, preservando assim o produto de contaminação por
microorganismos como o Acetobacter, que destroem a auxina. As soluções
concentradas, por terem como solvente uma solução hidroalcoólica a 50%,
permitem maior segurança neste sentido. Ainda por este motivo e pelo fato do
ingrediente ativo se decompor com o passar do tempo, quando em solução
líquida, não é aconselhável preparar quantidades elevadas de cada vez, que
precisem ser armazenadas por longo período. E as sobras do uso diário não
devem ser devolvidas ao recipiente original, mas mantidas em recipiente à parte,
para uso na aplicação seguinte. Além disso, o produto deve ser guardado em
local fresco e em ausência de luz, de preferência no refrigerador. Se a
embalagem for efetuada em recipientes transparentes, de vidro ou plástico, eles
devem ser de cor âmbar, para evitar a ação da luz.
Preparo de solução diluída:
A solução diluída é preparada tendo a água como solvente, em
concentrações que variam entre 20 e 200 ppm (entre 20 e 200 mg L-1). O

147
ingrediente ativo é adquirido de laboratórios especializados e vêm em forma de
cristais, que não se dissolvem diretamente em água, precisando ser previamente
dissolvidas com hidróxido de potássio ou de sódio, na proporção de 0,3 mL do
hidróxido para cada mg do produto, ou então com algumas gotas de etanol. Em
seguida, diluir em água até completar o volume. Quando a auxina em cristais
fica estocado por muito tempo, ela pode oferecer resistência à dissolução, tanto
com o hidróxido, quanto com o etanol. Neste caso, é recomendável manter a
mistura auxina/hidróxido, ou auxina/etanol, no refrigerador até o dia seguinte,
quando então a dissolução deve ter-se completado. Quado se sabe de antemão
que o produto disponível já se tornou resistente à dissolução com os solventes
citados, outra alternativa é dissolvê-la com algumas gotas de acetona, em
seguida adicionar algumas gotas de etanol; sem a adição do etanol, é comum o
produto se precipitar ao ser diluído com a água.
A solução diluída destina-se a ser absorvida pelas estacas, na qual
ficarão imersas pela base, por um período de 12 h ou mais, até que toda a
solução tenha sido absorvida. Normalmente, as estacas ficam em contato com a
solução de um dia para outro.
A embebição é feita acondicionando-se a solução em um recipiente de
fundo plano, de modo a formar uma lâmina líquida de 2 cm de altura, sendo as
estacas reunidas em feixes com as bases num mesmo nível, com as bases
mergulhadas na solução até absorção total do líquido. Esta técnica é de
aplicação mais demorada, apropriada para pequeno volume de estacas, mas
tem a vantagem de permitir que se adicione à solução outras substâncias, tais
como co-fatores de enraizamento, sais minerais, fungicida, vitaminas e outras
substâncias orgânicas, embora isto não seja normalmente usado. Completada a
embebição, as estacas podem ser plantadas imediatamente.
Preparo de solução concentrada:
Esta solução é preparada tendo como solvente uma solução
hidroalcoólica a 50% (água/etanol). É preparada em concentrações que variam
em geral, de 500 a 10.000 ppm (ou de 500 a 10.000 mg L-1). A solução
concentrada destina-se a ser aplicada por um contato rápido com a base da

148
estaca, apenas molhando-a até uma altura de cerca de 0,5 cm, por poucos
segundos. Como a concentração de auxina na solução é elevada e o etanol
presente na solução reduz a tensão superficial do líquido e estimula uma
penetração rápida, a quantidade de solução aderida à base da estaca, embora
sendo pequena, é suficiente para fornecer a quantidade de auxina necessária.
A aplicação se faz semelhantemente ao que foi explicado para a solução
diluída, ou seja, acondicionar a solução em um recipiente de fundo plano,
formando uma lâmina líquida de 0,5 cm, reunir as estacas em feixes com as
bases num mesmo nível, e mergulhá-las por cerca de 3 segundos. Esta técnica
é de execução rápida e vantajosa para grande número de estacas.
Logo após a aplicação, as estacas devem ser deixadas em repouso por
alguns minutos, para completar a penetração do produto, podendo em seguida
ser plantadas.
Preparo de dispersão em talco:
Neste caso, o ingrediente ativo é dispersado em talco, que pode ser do
tipo industrial ou mesno o comum, de toucador, adquirido em farmácia, cuja
diferença do industrial é apenas pelo fato de ser perfumado. O procedimento é
semelhante aos casos anteriores: dissolve-se o produto cristalizado em um dos
solventes já citados. Em seguida adiciona-se uma porção de talco suficiente
para absorver a solução. O restante do talco, para completar o volume, é
adicionado em pequenas quantidades, misturando-se-o bem com a porção
anterior, com um bastão de vidro ou de outra forma, por vários minutos, para
perfeita homogeneização do conteúdo. O tratamento das estacas é feito de
maneira semelhante aos casos anteriores, devendo as estacas apresentarem
um certo grau de umidade na base, para melhor adesão do pó. Se necessário,
elas devem ter a base molhada e deixadas em repouso pelo tempo necessário
para perderem o excesso de umidade, permanecendo a base úmida, mas não
molhada. Uma boa opção para se umidecer as estacas é mergulhá-las em
solução de fungicida, deixar em repouso para evaporação do excesso de água,
e em seguida tratá-las. Assim, as estacas estariam protegidas contra patógenos
do solo. Prosseguindo a operação, coloca-se o pó em um recipiente de fundo

149
plano, reunindo-se as estacas em feixes com as bases no mesmo nível,
pressionando-se-as ligeiramente sobre o pó. Em seguida, remove-se o excesso
de pó com pancadas leves do feixe de estacas sobre a borda do recipiente,
podendo-se plantar as estacas logo em seguida. O plantio deve ser feito em
covas, e não pela introdução da estaca no substrato, já que isto levaria à
remoção do pó no percurso, pelo atrito com as partículas do substrato.

6.2. Propagação vegetativa artificial: mergulhia


É o processo de propagação vegetativa artificial que consiste em se
enraizar um ramo, estando ele ainda ligado à planta matriz. Consegue-se isto,
efetuando uma anelagem no ponto do ramo a enraizar e cobrindo o local com
um substrato. Quando o ramo é recurvado em direção ao solo e o ponto a
enraizar é coberto com terra para obter o enraizamento, a mergulhia denomina-
se terrestre; quando o ramo permanece na posição original e o ponto a enraizar
é envolvido com um substrato, denomina-se aérea ou alporquia.
É um processo de propagação indicado para plantas que não enraizam bem
por outros métodos. Como o ramo permanece ligado à planta matriz e com o
xilema intacto, ele continua sendo suprido de água e sais minerais durante todo
o período de enraizamento, mantendo-se vivo por quanto tempo for necessário,
daí resultando a sua maior eficiência em relação à estaquia, principalmente para
plantas que demandam um tempo muito longo para enraizar. Além disto, é uma
técnica fácil de ser executada até por pessoas sem experiência, e não exige o
uso de qualquer ferramenta especial. Todavia, o seu uso fica limitado a casos
especiais, para a produção de mudas em pequena escala, devido demandar
maior tempo para ser executada, resultando em baixo rendimento da mão de
obra, além de baixo rendimento também da matriz; além disso, alguns tipos de
mergulhia produzem mudas com formato defeituoso, o que lhe confere mau
aspecto quando ainda nova.
A mergulhia terrestre pode ser de diversos tipos: simples, contínua,
chinesa, em trincheira e de cepa.

150
A mergulhia simples consiste em se curvar o ramo para baixo até tocar o
solo e recurvar a sua parte terminal de volta para cima, com o comprimento
desejável, fixando o ponto recurvado do ramo, com auxílio de gancho feito com
um ramo bifurcado, ou com arame, no fundo de uma cova ou pequeno sulco
raso, com cerca de 5 cm de profundidadelio. Antes de fixar o ramo ao solo,
efetua-se uma anelagem no ponto do ramo que ficará no fundo da cova,
retirando-se dele um anel de casca de no mínimo 5cm de largura. Esta
anelagem tem a finalidade de interromper o fluxo basípeto de fatores de
enraizamento, como auxina, carboidratos e co-fatores de enraizamento, que se
acumularão acima do ponto anelado. Pode-se ainda pincelar esta área com
solução de auxina, para aumentar a sua concentração no ponto de
enraizamento, o que funciona para algumas espécies. Logo após a realização
da anelagem, o câmbio inicia a regeração dos tecidos vasculares na região
injuriada, o que pode anular o efeito da operação. Por isso, a retirada de aneis
de casca mais largos retardam esta conexão e garantem que o enraizamento
aconteça antes disso.
Em seguida fixa-se um tutor ao lado da extremidade do ramo recurvada
para cima, ao qual será amarrada. Finalmente, cobre-se a cova com o solo local,
de modo a cobrir o ponto que sofreu anelagem. Quando o solo for muito
argiloso, será conveniente substituí-lo por um substrato mais poroso. O sistema
radicular desta muda se desenvolverá plenamente e ela poderá permanecer no
local até sua completa formação, quando será separada do ramo original e
arrancada. Este tipo de mergulhia permite a formação de uma única muda, a
qual apresenta uma curvatura na base, o que lhe confere aspecto desagradável
quando ainda nova, mas que desaparece à medida que a planta se desenvolve.
A mergulhia contínua consiste em se curvar um ramo da planta matriz até
o solo, estendendo toda sua extensão no fundo de um sulco raso, que começa
próximo da base do caule da matriz e se afasta dele em linha reta, do lado do
ramo que será utilizado, o qual será fixado no fundo do sulco com um gancho
localizado o mais próximo possível de sua base. Antes de fixar o ramo ao fundo
do sulco, eliminam-se as gemas que ficariam voltadas para baixo, para evitar a

151
formação de mudas muito tortuosas; em seguida efetuam-se anelagens logo
abaixo de cada gema, de modo a interromper o fluxo basípeto de fatores de
enraizamento produzidos pelos ramos surgidos a partir de cada uma delas.
Cada anelagem terá ainda a vantagem de quebrar a dominância aplical que
estes ramos viriam a exercer sobre cada gema localizada logo abaixo dele.
Desta forma, cada gema produzirá rebentos com raízes formadas logo acima do
ponto anelado. Antes do entumescimento das gemas, cobre-se todo o ramo com
2-3 cm de solo ou substrato poroso, de modo a promover o estiolamento das
bases dos ramos que se desenvolverão a partir delas. Depois serão feitas uma a
duas amontoas, acompanhando o alongamento dos ramos formados e sem
cobri-los, até encher completamente o sulco. Esta técnica permite obter mais de
uma muda a partir de um único ramo, além de mudas sem curvatura na base e
com sistema radicular igualmente bem desenvolvido.
A mergulhia chinesa é em tudo igual ao método anterior, com a diferença
de que o ramo, após ser recurvado para baixo, recebe uma primeira fixação no
fundo do sulco, sendo novamente recurvado para cima e para baixo em
diferentes pontos ao longo de sua extensão, sendo fixado no fundo do sulco
após cada curvatura para cima e para baixo, de modo que, após a cobertura do
sulco com o solo, haverá gemas expostas nos pontos elevados das curvas do
ramo e pontos anelados no fundo do sulco. A denominação de mergulhia
chinesa está relacionada com o aspecto apresentado pelo ramo com as várias
curvaturas, lembrando a figura do tradicional dragão chines. É uma técnica
viável apenas para espécies de ramos sarmentosos e bem flexíveis, além de
produzir mudas com uma curva na base ainda maior do que as provenientes de
mergulhia simples.
A mergulhia em trincheira se inicia plantando a matriz (estaca, barbado,
ou muda já formada) no início da primavera, fazendo um ângulo de 45 com a
superfície do solo. No início da primavera do ano seguinte, eliminam-se os
ramos mais fracos e deixam-se os mais vigorosos, sendo a planta forçada em
direção ao solo, fixando-se os ramos no fundo de uma trincheira rasa, aberta ao
lado da planta e na direção em que ela será recurvada. Daí em diante, as

152
operações serão as mesmas já detalhadas para a mergulhia contínua, sendo
cada ramo da planta tratado da forma já descrita.
Mergulhia de cepa:
As matrizes (estacas, barbados ou mudas já formadas) são plantadas no
início da primavera, no espaçamento recomendado para viveiro. No início da
primavera do ano seguinte elas são podadas ao nível do solo, para forçar a
emissão de ramos na sua base. Quando os ramos formados atingirem a altura
de 10 cm ou um pouco mais, eles são anelados, se necessário, e é feita a
amontoa. No final do inverno do ano seguinte, os rebentos já apresentarão um
sistema radicular bem desenvolvido e podem ser separados da matriz e ser
plantados no local definitivo.
Esta técnica tem sido usada na Inglaterra também para produzir ramos
rejuvenescidos de portaenxertos de macieira. Neste caso, as matrizes são
produzidas a partir de semente e não se fazem anelagens dos ramos surgidos
nas cepas, mas apenas amontoas, de modo a criar um ambiente úmido e escuro
na base dos ramos, o que as estiola, tornando-as propensas a formar raízes
adventícias. No fim da estação de crescimento seguinte, os ramos são cortados
pela base e postos a enraizar como estacas lenhosas comuns.
As matrizes empregadas na mergulhia de cepa, quando fertilizadas
convenientemente, podem ser usadas até por 20 anos, quando devem ser
substituídas. A técnica permite a formação de mudas praticamente sem
curvatura na base.
Mergulhia aérea:
Também chamada de alporquia, essa técnica consiste em se fazer
anelagem no ponto do ramo a enraizar e cobrir este local com um substrato
poroso e previamente umedecido, mas não molhado, de tal forma que, ao
pressionar uma porção dele fortemente na mão, apenas escorrerão umas
poucas gotas de água. Susbtratos comerciais apresentam características ideais
para uso com esta técnica.
O substrato, em quantidade correspondente a duas mãos cheias, deve
ser envolvido por um filme plástico, amarrado nas extremidades em torno do

153
ramo. Qualquer tipo de plástico pode ser utilizado, embora os filmes mais finos
em princípio permitam uma melhor troca gasosa. Quando a operação é efetuada
no início da primavera, a água das chuvas que escorre pelo ramo penetra no
substrato e o umidece periodicamente. Pode-se porém promover um
umidecimento adicional com o auxílio de seringa, se necessário. Talvez pelo
ambiente de volume reduzido que esta técnica proporciona para o
desenvolvimento das raízes formadas, bem como devido ao fato do ramo estar
recebendo água e nutrientes do sistema radicular da planta matriz, as raízes
formadas na alporquia não são estimuladas a se alongarem, ficando curtas e
necessitando que a muda seja separada da matriz e plantada no viveiro, ou
diretamente no solo, ou preferivelmente em recipiente apropriado, e mantida em
estrutura de proteção, de preferência sob nebulização, para completar o seu
desenvolvimento.
Muitas espécies enraízam bem pelas técnicas de mergulhia. Para muitas
espécies, nem é necessária a anelagem; apenas o estiolamento provocado pela
amontoa, nas mergulhias terrestres, é suficiente para estimular a rizogênese
adventícia. Mas é sempre necessário efetuar a eliminação da extremidade do
ramo, para quebra da dominância apical.

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6.3. Enxertia
6.3.1. Conceitos básicos.
6.3.2. Tipos de enxertia.
6.3.3. Usos da enxertia.
6.3.4. Base anatômica e fisiológica da enxertia.
6.3.5. Fatores que afetam o êxito da enxertia.
6.3.6. Relações enxerto/porta-enxerto.

6.3.1. Conceitos básicos:

É a técnica de propagação vegetativa artificial que consiste na união


física de partes de plantas, as quais passam a viver em harmonia, constituindo
um único indivíduo. É um artifício desenvolvido com a finalidade principal de se
colocar um sistema radicular vigoroso ou que apresente alguma outra qualidade
desejável, para sustentar uma copa também dotada de qualidades superiores,
ou para mudar, dentro de certos limites, alguma característica dela. Além disto, a
técnica da enxertia constitui um artifício que permite ao produtor e ao
pesquisador solucionarem outros problemas.

À parte da planta destinada a se tornar a copa do conjunto, denomina-se


enxerto, cavaleiro, ou epibioto. Quando o enxerto é constituído por um
fragmento de casca contendo uma gema, acompanhada ou não de um
fragmento do lenho do ramo de onde ela se originou, ele se denomina borbulha.
Quando é constituído por um segmento de ramo, contendo uma ou mais gemas,
ele se denomina garfo. A palavra enxerto é ainda usada para designar a planta
obtida pelo processo de enxertia.
À parte da planta destinada a se tornar o sistema radicular do conjunto,
denomina-se porta-enxerto, cavalo, ou hipobioto.
A inserção do enxerto ou epibioto (borbulha ou garfo) no porta enxerto ou
hipobioto se faz a uma altura em torno de 20cm do solo. Em alguns casos, pode
ser usada uma terceira parte de outra planta, inserida entre o enxerto e o porta-
enxerto, à qual se denomina inter-enxerto. É um artifício pouco utilizado, mas
pode ser útil quando se deseja solucionar problema de incompatibilidade entre
enxerto e porta-enxerto, ou para reduzir o porte do conjunto através do uso de

155
inter-enxerto proveniente de planta nanicante. Já se demonstrou até a
viabilidade comercial de produzir uma seringueira constituída por um porta-
enxerto vigoroso, um painel de híbrido com elevada produtividade e uma copa
resistente ao “mal das folhas”. Todavia, estas idéias não têm encontrado
aplicação ampla, talvez devido ser a inter-enxertia uma técnica mais complicada
para executar.
Embora a estaquia seja a técnica de clonagem preferida, sempre que a
espécie apresente habilidade para o enraizamento adventício, devido à maior
facilidade de execução por pessoas não especializadas, a enxertia é também
amplamente utilizada comercialmente, mas só pode ser executada por operário
especializado na técnica. Enquanto a estaquia é empregada mais amplamente
para espécies herbáceas, a enxertia é mais empregada para espécies lenhosas,
bem como em alguns casos especiais com espécies herbáceas.

6.3.2. Tipos de enxertia:


Existem basicamente dois tipos de enxertia: quando se usa como epibioto
uma borbulha, a enxertia se denomina borbulhia; quando o epibioto é um garfo,
ela se denomina garfagem. Cada uma delas pode ser executada de diferentes
maneiras, recebendo nomes especiais de acordo com os detalhes envolvidos na
sua execução. O uso de uma ou de outra destas técnicas vai depender
basicamente da preferência da espécie a enxertar. Algumas espécies são mais
bem sucedidas com uma ou com outra, dependendo de características
fisiológicas, morfológicas e anatômicas próprias, não existindo contudo uma
maneira de se antever que técnica seria mais apropriada a uma determinada
espécie. As recomendações hoje existentes para as espécies conhecidas
provieram da experiência prática e da experimentação científica, que definiram
para cada espécie a técnica mais apropriada.

Tipos de borbulhia:
As diferentes características apresentadas pela borbulha, bem como as
diferentes maneiras com que ela pode ser inserida no porta-enxerto, permite que

156
a borbulhia receba diferentes nomes, os quais variam de acordo com a região e
até mesmo de acordo com os diferentes praticantes da técnica. Muitos dos tipos
de borbulhia idealizados são de difícil execução e não oferecem vantagem sobre
outros de mais fácil execução. Assim, dentre os tipos mais utilizados na prática,
destacam-se a borbulhia por escudagem com introdução sob casca, que pode
ser em T normal ou T invertido; borbulhia em placa embutida, que pode ser em
janela aberta ou janela fechada; borbulhia por anelagem, e borbulhia embutida
no alburno. A escolha de uma ou outra, para determinada espécie, vai depender,
em primeiro lugar, da resposta que a espécie apresenta em termos de
porcentagem de pegamento do enxerto, o que vai depender de características
intrínsecas a ela; em segundo lugar, em função da preferência do enxertador e
de condições que podem afetar o pegamento do enxerto, ou de impedir que a
enxertia seja realizada. Por exemplo, apenas a borbulhia embutida no alburno
não depende de estar o porta-enxerto soltando a casca, podendo assim ser
usada em qualquer época do ano, ou sob condição de estresse hídrico ou de
injúria do porta-enxerto, situações em que ele suspende a atividade cambial, não
sendo possível separar a casca do lenho, o que impede de ser enxertado pelas
demais técnicas de borbulhia. No caso do estresse hídrico, a situação pode ser
contornada pela irrigação dos porta-enxertos 1 a 2 semanas antes da operação.
Borbulhia por escudagem com introdução sob casca – o nome
escudagem provém do aspecto da borbulha, no formato oblongo-arredondado,
que lembra os escudos usados pelos gladiadores romanos e outros povos da
idade média. Dentre todas as modalidades de enxertia por borbulhia, esta é a
preferida, por ser a de mais rápida execução, sendo usada amplamente para a
enxertia principalmente de citros e de muitas outras espécies. Consiste em se
efetuarem dois cortes ao longo do entrenó do porta-enxerto, um longitudinal e
outro transversal, formando a figura de um T de 4-5cm no sentido longitudianal
por 3-4cm no sentido transversal, e pode ser em posição normal ou invertido. O
corte longitudinal é feito com a ponta do canivete de enxertia. O corte transversal
é feito com a lâmina do canivete inclinada para baixo em relação à haste do
porta-enxerto, o que resulta numa linha curva, e não reta, com as extremidades

157
voltadas para cima. Após completado o corte, volta-se com a lâmina do canivete,
deslizando-a dentro do corte, até o ponto de cruzamento entre os dois cortes e
inclina-se a lâmina para cima, de modo a levantar a casca neste ponto,
formando duas pequenas abas levantadas, que conduzirão a borbulha para
debaixo da casca, quando da sua introdução. Deve-se ter o cuidado para não
ferir o lenho do porta-enxerto, quando da execução do corte transversal, mas tão
somente aprofundar o corte até o câmbio. Se a lâmina penetrar até o lenho, a
extremidade superior da borbulha poderá penetrar no sulco feito pela lâmina e
não prosseguir deslizando sob a casca. No passado, quando se usava ráfia,
barbante ou outro material semelhante para amarrar o enxerto, era importante
fazerem-se os cortes em T invertido, o que resultava em duas abas de casca
que cobriam a borbulha e desviavam a água de chuva para fora do corte. A
penetração de água nos cortes poderia resultar na morte do enxerto. Hoje, com
o uso do plástico para amarrar os enxertos, este promove vedação completa da
lesão e não mais se justifica preocupar-se com a posição do T, se normal ou
invertido.
Tanto os ramos de onde serão retiradas as borbulhas, denominados
hastes de borbulha, quanto os porta-enxertos devem ter em torno de 1 ano de
idade, quando os seus diâmetros estarão em torno de 1 cm, o que corresponde
ao diâmetro de um lapis. Os porta-enxertos devem estar em franco crescimento,
portanto com o câmbio em atividade, de modo a permitir a separção fácil da
casca. Se estiverem com o crescimento paralizado devido a falta de água no
solo, mas estando a temperatura ambiente favorável ao crescimento, uma
irrigação entre 1 e 2 semanas antes da enxertia estimulará a atividade cambial.
A extração da borbulha deve ser feita após serem efetuados os cortes no
porta-enxerto, já que o tempo decorrido entre a retirada da borbulha e a sua
introdução nos cortes do porta-enxerto deve ser curto, para evitar desidratação
da mesma. A retirada da borbulha se inicia cerca de 1-2 cm acima da gema e
termina cerca de 1-2 cm abaixo da mesma, resultando num escudo com cerca
de 2,5 cm de comprimento e largura dependendo do diâmetro da haste. A
lâmina do canivete de enxertia deve penetrar alguns milímetros no lenho da

158
haste de borbulhas, sendo forçada continuamente para baixo, num corte
paralelo ao longo da haste, e puxada em movimento contínuo para traz,
começando o corte próximo à base da lâmina e terminando próximo à sua ponta,
de modo a efetuar a extração com um único corte. A realização do corte com
movimentos da lâmina para a frente e para traz, como no movimento de serrar,
resulta em reentrâncias e saliências na superfície cortada da borbulha, o que
pode prejudicar a soldadura do enxerto. Para a retirada da borbulha, a haste
deve ser segurada com a mão esquerda e a extremidade distal da haste dirigida
para a frente, de tal forma que, uma vez extraída a borbulha, ela repouse na
lâmina do canivete sob ligeira pressão do dedo polegar, numa posição já
preparada para ser inserida no corte do porta-enxerto com a polaridade correta.
Assim se evita o manuseio da borbulha, com perda de tempo e risco de se tocar
na sua superfície cortada, o que não é recomendado.
Uma vez retirada a borbulha, um movimento leve e delicado do dedo
polegar a deslizará, para cima ou para baixo, sobre a superfície da lâmina do
canivete, dependendo se o T é normal ou invertido, e introduzida sob a casca do
porta-enxerto através do corte transversal, iniciando a penetração sob as duas
pequenas abas levantadas no cruzamento entre os dois cortes, quando da
feitura das incisões no porta-enxerto. Sob pressão do dedo polegar, a borbulha
deslizará suavemente por sob a casca até se alojar totalmente sob ela, sendo
assim transferida, diretamente da lâmina do canivete para a região cambial do
porta-enxerto. Em seguida, procede-se ao amarrio do enxerto, o que é feito com
uma tira de filme plástico de 20 x 2 cm, de preferëncia liso e de cor branca ou
outra cor clara, para reduzir o aquecimento pelos raios solares, quando a
enxertia é feita a pleno sol. Quando feita sob estruturas que proprcionam
sombreamento, a cor do plástico não é importante. Mas é importante que ele
apresente a propriedade de se expandir, quando esticado, para permitir que seja
enrolado com pequena pressão em torno do caule do porta enxerto, de modo a
forçar íntimo contato entre as partes enxertadas. Filmes plásticos do tipo usado
para forro de mesa apresentam esta propriedade, o que não acontece com os
plásticos usados para sacos de leite e outros. A fita plástica é enrolada em

159
espiral em torno do porta enxerto, iniciando de baixo para cima, a cerca de 2 cm
abaixo da incisão, sobrepondo-se em cada volta como as telhas nos telhados,
de modo a proteger contra a penetração da água da chuva nos cortes, pelo
motivo já explicado; e terminando a cerca de 2 cm acima da incisão. Finalmente,
a fita é amarrada cerca de 2cm acima da incisão, fazendo-se passar a sua
extremidade por sob a última espira e puxando-se-a com pequeno esforço. Para
algumas espécies cujas gemas abrolham em poucos dias, como as da roseira, é
aconselhável deixar a gema descoberta, o que se faz passando-se uma espira
da fita logo abaixo da gema e a seguinte logo acima. Para outras, cujas gemas
abrolham após a decapitação do porta enxerto, como no caso dos citros, pode-
se cobrir a gema, já que o desamarrio do enxerto será feito antes. Duas a três
semanas após a operação, os enxertos são desamarrados. Se a borbulha
estiver verde significa que o enxerto pegou; após mais uma semana pode-se
decapitar o porta-enxerto cerca de 1 cm acima do ponto de enxertia. Se a
borbulha estiver marron, significa que falhou e deve ser feita nova enxertia
abaixo dela. Se a nova enxertia for feita acima da anterior, permanecerá uma
cicatriz de mau aspecto no local da falha, que perdurará até a época de
comercialização da muda, depreciando o seu valor, embora sem que a muda
possa ser por isto considerada de inferior qualidade. Com mais algum tempo a
cicatriz desaparecerá.
Borbulhia em placa embutida: neste caso, a borbulha consiste numa
placa de casca da planta matriz contendo a gema, mas desprovida do lenho. A
maneira mais simples de se executar esta borbulhia, quando de janela aberta, é
efetuar dois cortes paralelos longitudinais e dois transversais no entrenó do
caule do porta enxerto, aprofundando até o câmbio, e retirando-se a placa da
casca limitada pelos cortes, o que se faz facilmente com a lâmina do canivete.
Em seguida, retira-se outra placa contendo a gema, do ramo da planta matriz,
com o mesmo formato e dimensões, adaptando-a na “janela” que foi aberta no
caule do porta enxerto (daí o nome borbulhia em janela aberta). O ideal seria
extrair a placa do enxerto e do porta enxerto com o mesmo formato e
dimensões, para a perfeita adaptação da borbulha à janela, o que porém é

160
quase impossível, usando apenas o canivete de enxertia; mas isto não é
imprescindível. Se a placa da borbulha ficar com dimensões superiores às da
janela do porta enxerto, ela pode ser colocada sobre a referida janela, de modo
a coincidir dois dos seus lados, cortando-se o que exceder dos outros dois
lados. Se ficar menor, procura-se encaixar a borbulha na janela do porta
enxerto, fazendo coincidir dois dos seus lados, o que permitirá o pegamento do
enxerto sem nenhum problema. A regeneração da nova casca na área que
permanecer exposta será rápida. Uma maneira de se realizar este tipo de
borbulhia com maior perfeição e rapidez, seria extrair as placas utilizando um
furador de rolha ou furador de sola, o que resultaria na extração de placas
circulares perfeitamente ajustáveis uma à outra. Outra maneira, seria improvisar
uma ferramenta com duas lâminas de gilete ou outro tipo de lâmina, fixadas em
posição paralela, em um cabo de madeira ou outro material, e separadas por
uma distância compatível com o diâmetro do enxerto e porta enxerto a serem
trabalhados. Neste caso, as placas seriam quadradas e de iguais dimensões.
A diferença entre a borbulhia em janela fechada para a anterior é que,
nesta, não se retira a placa de casca do porta enxerto, mas fazem-se duas
incisões transversais no caule do porta enxerto, distanciadas em função do
comprimento da placa da borbulha a ser extraída; em seguida faz-se uma
incisão longitudinal no meio da janela, a partir da incisão superior e terminando
na inferior, formando uma figura como a de uma janela fechada; agora,
introduzindo-se a lâmina do canivete na incisão longitudinal, levantam-se as
duas abas formadas pelas incisões, como se abrissem as duas bandeiras de
uma janela; introduz-se a borbulha e fecham-se as duas abas sobre ela, também
como se fechassem as duas bandeiras de uma janela. Se a borbulha tiver
dimensões inferiores às da janela, ela deverá ficar adaptada à parte superior ou
inferior desta. Finaliza-se a operação amarrando-se o enxerto da mesma forma
já explicada para a borbulhia por escudagem.
Enquanto a borbulhia por escudagem exige que apenas o porta enxerto
esteja soltando casca, na borbulhia em placa embutida é preciso que ambos,
planta matriz e porta enxerto, apresentem esta condição.

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Borbulhia por anelagem: é o tipo de borbulhia na qual a borbulha
consiste num anel de casca extraído do ramo da planta matriz, contendo a
gema, o qual será justaposto ao câmbio do porta enxerto, do qual se tenha
extraído um anel de casca com a mesma largura. A operação se inicia pela
retirada do anel de casca no entrenó do porta enxerto, através de dois cortes
transversais, que se aprofundam até o câmbio e contornam todo o caule,
formando um anel de casca com cerca de 2-3cm de largura, seguido de outro
corte longitudinal que começa no corte transversal superior e termina no inferfior.
Levantando-se a casca a partir deste terceiro corte, retira-se o anel. Em seguida
procede-se da mesma forma para a retirada de um anel de casca da haste de
borbulha, contendo uma gema. Neste caso, o corte longitudinal é feito do lado
da haste oposto à gema. A largura do anel da borbulha deve ser igual ou inferior
ao do porta enxerto; quando inferior, procura-se adaptar a borbulha à parte
superior ou à inferior do anel do porta enxerto. O emprego da ferramenta
improvisada e citada anteriormente, formada por duas lâminas adaptadas
paralelamente a um cabo, permite que se retirem os dois aneis com maior
rapidez e com exatamente a mesma largura; mas isto não é importante. Quanto
ao comprimento do anel da borbulha, se for maior do que o do porta enxerto,
corta-se o excesso; se for menor, não há inconveniente. Completada a
operação, fecham-se as janelas sobre a borbulha e amarra-se, da forma já
detalhada para a borbulhia por escudagem sob casca. Semelhantemente ao
caso anterior, este tipo de borbulhia exige que tanto a planta matriz quanto o
porta enxerto estejam soltando casca.
Borbulhia embutida no alburno: é o tipo de borbulhia que consiste em
se efetuar um corte inclinado no entrenó do porta enxerto, fazendo a lâmina do
canivete deslizar de cima para baixo no caule, aprofundando-se gradativamente
nele, de preferência sem atingir o seu diâmetro. Quando visto de perfil, o corte
de cerca de 3cm de comprimento fica inclinado de aproximadamente 150 em
relação ao eixo da haste do porta enxerto. Em seguida procede-se a outro corte,
transversal ao primeiro e à altura da base do mesmo, até interceptá-la, de modo
a retirar-se uma porção de casca e lenho no formato aproximado de uma cunha.

162
Em seguida, retira-se uma cunha semelhante na haste de borbulha e preenche-
se com ela o espaço deixado no porta enxerto. As dimensões das duas cunhas
quase sempre não coincidem. Neste caso, ao encaixar a borbulha no espaço
deixado no caule do porta enxerto, encosta-se o dedo polegar do lado esquerdo
da lesão e encosta-se a ele a borbulha, de modo a coincidir casca com casca de
enxerto e porta enxerto deste lado. Em seguida, amarra-se da forma já
explicada. Para este tipo de borbulhia, não há a necessidade de enxerto e porta
enxerto estarem soltando casca.

Tipos de garfagem
Da mesma forma já explicada para a borbulhia, existem vários tipos de
garfagem, em função dos detalhes apresentados pelos diferentes tipos de garfos
e das diferentes maneiras com que eles são inseridos no porta enxerto. Assim, a
garfagem se diz no topo, quando o garfo é inserido na extremidade distal (no
topo), do porta enxerto; e lateral, quando inserido lateralmente no seu caule. A
garfagem no topo divide-se em: garfagem no topo em fenda simples, ou meia
fenda; em fenda cheia; à inglêsa simples, e com entalhe ou lingueta; e sob
casca. A garfagem lateral se divide em: garfagem lateral no alburno, em placa
embutida, e sob casca.
Garfagem no topo: consiste em se decapitar o porta enxerto e fazer-se
nele uma fenda longitudinal, descendente, a partir da extremidade decapitada,
de 4-5cm de comprimento. Em seguida, fazem-se dois cortes em ângulo na
base do garfo, formando uma cunha de comprimento igual ou pouco inferior à
fenda feita no porta enxerto, na qual ela será introduzida e adaptada de forma
que as linhas do câmbio de ambos, garfo e porta enxerto, se justaponham o
mais perfeitamente possível. Para isto, os cortes feitos têm que ser bem lisos,
sem reentrâncias e saliências e bem retilíneos, o que se consegue executando
os cortes da maneira explicada para a borbulhia por escudagem, com um
movimento único e contínuo da lâmina. Segue-se o amarrio do enxerto, com
uma fita de filme plástico de cerca de 20 x 2 cm, enrolando-a com pressão e em
espiral, em volta do caule do porta enxerto, de modo que cada espira se

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sobreponha à anterior, começando de baixo para cima, a 2cm abaixo do limite
inferior da fenda do porta enxerto, até 2cm acima do seu topo, dando uma ou
duas voltas exatamente na linha divisória entre o garfo e o topo do porta enxerto,
de modo a vedar as abertura alí localizadas, e retornando para baixo, onde a fita
será amarrada ao porta enxerto, com uma laçada simples, enfiando a sua
extremidade sob a última espira.
A garfagem no topo é denominada em fenda simples ou meia fenda,
quando o garfo apresenta diâmetro igual ou inferior à metade do diâmetro do
porta enxerto; e é denominada em fenda cheia quando estes diâmetros são
iguais ou pouco diferentes, com o garfo preenchendo toda ou quase toda a
fenda. A garfagem em fenda simples é mais usada para porta enxertos mais
velhos, com diâmetros muito grandes. Neste caso, são usados em geral dois
garfos, adaptados dos dois lados da fenda do porta enxerto, com a finalidade de
preencher mais rapidamente a fenda. Depois um deles é eliminado. A garfagem
em fenda cheia é usada para o caso de porta enxertos na idade adequada, em
torno de um ano, e o enxertador procura sempre escolher os garfos com
diâmetro o mais aproximado possível do diâmetro do porta enxerto; mas como
isto é raramente possível, o importante é fazer com que, durante a execução da
enxertia, haja boa justaposição entre as peças, de um dos lados do encaixe
entre o garfo e o porta enxerto, conforme já explicado para a borbulhia embutida
no alburno, de modo a colocar as linhas do câmbio das duas peças o mais
próximo possível uma da outra neste lado, o que é da maior importância para o
pegamento do enxerto.
Neste e nos demais tipos de garfagem descritos a seguir, o garfo fica
exposto ao ambiente e se desidratará, o que fatalmente resultará na sua morte
antes que se complete a conexão vascular com o porta enxerto. Para se evitar
isto, a parte exposta do garfo precisa ser protegida contra a desidratação, o que
tem sido feito tradicionalmente cobrindo-o com um saco plástico transparente,
amarrado frouxamente pela base à haste do porta enxerto, de modo a criar uma
câmara úmida em torno do garfo. Quando se iniciar a brotação do enxerto, o
saco plástico deve ser desamarrado, porém mantido sobre o garfo por mais

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algum tempo, até que as novas folhas se tornem adultas, para então serem
removidos. A necessidade desta proteção para os garfos leva à necessidade
também de ser a muda mantida sob condições de iluminação reduzida, em
estruturas de proteção. Se mantidas a pleno sol, o aquecimento excessivo no
interior do saco plástico pode resultar na morte do enxerto.
Uma maneira mais simples de se proteger o garfo contra a desidratação,
e mais usada modernamente, é enrolar todo o garfo com outra fita de plástico,
em espirais ascendentes, que se sobrepõem da maneira já explicada e
terminando numa laçada simples. Quando se enrola o enxerto com fita plástica
comum, a sua extremidade e espiras superiores devem ser afrouxadas logo que
a nova brotação se inicia, assim mantendo uma proteção parcial contra a
desidratação, mas permitindo livre saída da nova brotação e sua adaptação
gradativa ao ambiente externo. Quando se enrola o enxerto com plástico de
laboratório, tipo Parafilm, resulta a vantagem deste se deteriorar naturalmente
com o passar das semanas, permitindo que as brotações surgidas no garfo o
rompam aos poucos e se adptem gradativamente ao ambiente externo, sem a
necessidade de qualquer cuidado neste sentido e nem mesmo a necessidade de
se remover o plástico. Mas, como este plástico de laboratório é muito fino, ele
deve ser enrolado sem esticar; caso contrário, a proteção contra a perda de
umidade poderá ficar reduzida.
A câmara úmida criada em torno do garfo, pelo seu envolvimento com
plástico, cria um ambiente adequado ao desenvolvimento de doenças, que
podem vir a matar a nova brotação, no caso de espécies como a mangueira e o
abacateiro, muito sensíveis à antracnose, além de outras espécies. Por isto,
recomenda-se mergulhar os garfos previamente à enxertia, em solução fungicida
ou de hipoclorito de sódio (água sanitária diluida) a 0,5%, por 15 minutos, e
postos a enxugar à sombra, em local ventilado.
Garfagem à inglesa: consiste em se fazer um único corte em bizel, no
topo do porta enxerto, e outro na base do garfo, ambos com um mesmo ângulo
de inclinação em relação ao eixo das peças, formando em cada uma delas uma
superfície elíptica, de tal forma que elas se ajustem bem quando postas em

165
contato. Como é raro conseguir garfo e porta enxerto com o mesmo diâmetro, o
que resultaria na justaposição perfeita das linhas cambiais que circundam as
superfícies expostas em ambos, o importante é proceder como no caso do
enxerto no topo, procurando justapor as linhas do câmbio das duas peças de um
dos lados do ponto de união. Em seguida procede-se ao amarrio, tomando-se
cuidado para não haver deslocamento das peças neste momento, o que
resultaria no afastamento das linhas cambiais de ambas e o risco de falha no
pegamento..
Quando a operação é realizada efetuando apenas o corte em bizel nas
duas peças, a garfagem denomina-se à inglêsa simples. A outra variante da
técnica é denominada garfagem à inglêsa com entalhe, ou com lingueta, assim
denominada porque, após efetuado o corte em bizel simples em cada peça, faz-
se uma fenda partindo da superfície exposta do bizel, começando à meia
distância entre a extremidade da peça e o seu centro e penetrando até a
medula. Como enxerto e porta enxerto devem ter idade de aproximadamente 1
ano, eles são em geral bem flexíveis e se interpenetram facilmente quando as
suas superfícies bizeladas são postas em contato e pressionadas uma contra a
outra, de modo que a fenda de cada peça se abre e as superfícies bizeladas
deslizam uma sobre a outra se interpenetrando e formando um conjunto estável.
No momento em que as peças deslizam uma sobra a outra, promove-se a
justaposição das linhas cambiais delas, de um dos lados, com o auxílio de dedo
polegar, conforme já explicado. Em seguida procede-se ao amarrio, que não
exige os cuidados recomendados para o caso anterior, já que as duas peças
aqui formam um conjunto bem firme.
Garfagem no topo, sob casca: é um tipo de garfagem recomendado
para o caso de substituição de copas de plantas adultas, com caule de maior
diâmetro e casca espessa. Neste caso, a planta é recepada pela base, ou os
ramos grossos são podados, fazendo-se uma incisão na casca a partir do topo e
prosseguindo longitudinalmente por aproximadamente 4cm, penetrando até o
câmbio. Em seguida, introduz-se entre a casca e o lenho, um garfo preparado
com bizel simpes na extremidade proximal. Se o diâmetro do porta enxerto não

166
for muito grande, amarra-se o enxerto com fita plástica; se muito grande,
envolve-se a base do garfo com mastique. Em ambos os casos, deve-se vedar
todos os cortes, inclusive a superfície exposta no topo do porta enxerto.
Garfagem lateral no alburno: é semelhante à borbulhia embutida no
alburno, já que os cortes no porta enxerto são feitos da mesma forma que
naquela. O que varia é a inserção de um garfo no local, em vez da borbulha.
Neste caso, o garfo recebe na extremidade proximal um duplo bisel, que o deixa
também no formato aproximado de uma cunha, o que se consegue com um
corte mais longo e inclinado de um dos lados, igual ao comprimento do corte
feito no porta enxerto, e outro corte do outro lado, mais curto, de comprimento
aproximadamente igual ao corte inferior do porta enxerto. O ângulo entre estes
dois cortes deve ser igual ao ângulo entre os cortes do porta enxerto, de modo
que a base do garfo se encaixe o melhor possível ao espaço vazio limitado pelos
dois cortes do porta enxerto. O amarrio é feito de maneira semelhante aos casos
anteriores, procurando vedar todos os cortes contra a entrada de água de chuva.
Neste caso, a copa do porta enxerto permanece e só será eliminada após o
pegamento do enxerto.
Garfagem lateral sob casca: da mesma forma que a garfagem no topo
sob casca, este tipo de garfagem é indicado para porta enxertos de maiores
diâmetros e casca espessa, e consiste em se fazer duas incisões em forma de T
normal, com 4-5cm no sentido longitudinal, por 3-4cm no sentido transversal, na
casca do entrenó do porta enxerto, penetrando até o câmbio. Em seguida faz-se
um corte em bizel simples de um dos lados da extremidade proximal do garfo,
introduzindo-se-o sob a casca do porta enxerto através das incisões em T. O
amarrio é feito conforme detalhado para o tipo anterior.

6.3.2.1. Encostia
É a técnica de propagação que consiste em se unir partes de duas
plantas por enxertia, estando o enxerto ainda ligado à planta matriz e dela só se
separando após completada a união. Assim, a encostia apresenta com a
enxertia a mesma relação que existe entre a mergulhia e a estaquia. A união

167
entre as duas partes é efetuada encostando - daí o nome encostia -
intimamente as partes a serem unidas, após uma operação cirúrgica que expõe
os tecidos cambiais no local da união. Diferentemente das técnicas de enxertia,
na encostia o epibioto não é uma borbulha e nem pode ser considerado um
garfo, mas sim um ramo, já que ele permanecerá ligado à planta matriz até que
a união se complete.
Existem diferentes alternativas para se executar a encostia, segundo o
objetivo. Uma delas consiste em se utilizar, como enxerto, o ramo de uma planta
adulta. Neste caso, a planta que virá a constituir o porta enxerto pode ser
plantada ao lado da outra cujo ramo será usado como enxerto. Quando ela
atingir a altura do ramo, raliza-se a encostia. Outra alternativa é plantar o futuro
porta enxerto em vaso, o qual será depois alçado à altura do ramo da planta
matriz do enxerto, para se efetuar a encostia. Outra alternativa ainda seria o
plantio, tanto da matriz do enxerto, quanto do porta enxerto, num mesmo vaso
ou em vasos separados; neste segundo caso, os vasos seriam postos em
contato, no momento da união.
O processo de enxertia a ser empregado para promover a união, vai
depender da idade dos componentes. Para plantas jóvens, com hastes bem
flexíveis, usa-se a enxertia em placa simples ou com entalhe. A placa simples
consiste em se curvar a haste e fazer nela um corte tangencial do lado externo
da curva, de modo a extrair uma placa de tecido e expor uma placa eliptica
semelhante àquela da garfagem à inglêsa. Em seguida, as placas dos dois
componentes são adaptadas uma à outra, fazendo coincidir as suas linhas
cambiais de um dos lados do ponto de união, e amarradas firmemente, da
mesma forma como feito nos demais tipos de enxertia. A placa com entalhe, ou
com ligueta, é preparada da maneira descrita para as demais garfagens com
entalhe. Quando os ramos são herbáceos, como no caso de plantas bem jóvens
ainda no estágio cotiledonar, não é necessário o corte em placa, mas apenas o
entalhe ou lingueta, que é feito com um único corte em ângulo na haste,
inclinando-se a lâmina e fazendo-a penetrar até próximo ao centro dela; em
seguida, as duas hastes assim preparadas são recurvadas ligeiramente em

168
sentidos opostos e aproximadas uma da outra pelo lado externo da curva,
deslizando uma sobre a outra, de modo que as duas linguetas se interpenetram.
Em seguida procede-se ao amarrio. Esta técnica tem sido usada para a
propagação de cucurbitáceas, solanáceas e outras plantas sensíveis à
fusariose, sobre porta enxertos resistentes. Devido à delicadeza das hastes
destas plantas, a operação precisa ser feita com lâmina de gilete ou bisturi, e o
amarrio e manuseio das hastes feito com muito cuidado. Quando as plântulas
são mantidas em ambiente com umidade relativa elevada e cobertas com saco
plático, as hastes podem ser apenas levemente pressionadas de alguma forma,
uma contra a outra, sem a necessidade de serem amarradas no ponto de
enxertia. Os porta enxertos, neste caso, são plantados cerca de 5-15 dias antes
do plantio das plantas matrizes dos enxertos. O intervalo de plantio entre elas
vai depender da época do ano e das características delas. Quando as primeiras
estão com 10-15cm de altura e as segundas com 7-10cm, elas são enxertadas.
Cerca de duas semanas após, a união já estará completada.
Quando a planta que virá a constituir o porta enxerto já é mais velha, com
caule de maior diâmetro, a técnica de enxertia consiste em se fazer uma placa
plana, da forma detalhada anteriormente, na haste que virá a constituir o
enxerto, e abrir uma janela no porta enxerto, com quatro cortes de comprimento
e largura iguais às da placa, retirando-se a casca e expondo o câmbio. Em
seguida, a haste é recurvada ligeiramente, de modo a obter um bom encaixe da
placa à janela do porta enxerto. Segue-se o amarrio, ou cobertura dos cortes
com mastique ou outra massa apropriada. Há ainda outras maneiras de se
realizar esta enxertia. A que acaba de ser descrita se assemelha, em parte, à de
borbulhia em janela aberta descrita anteriormente, mas pode ser também em
janela fechada, ou então a placa ser feita com dois cortes em ângulo e
encaixada em abertura também feita com dois cortes em ângulo no porta
enxerto.
A fita plástica de amarrio será retirada somente após completada a união
entre as partes, o que acontecerá mais cedo entre plantas na fase cotiledonar,

169
devendo-se cuidar para que a demora na retirada não venha a causar danos ao
dibioto, pela constrição dos tecidos vasculares no ponto de enxertia.
As copas e os sistemas radiculares das duas plantas envolvidas são
mantidos intactos até o fim do processo, vivendo elas independetemente uma da
outra e somente sendo eliminada a copa de uma e o sistema radicular da outra
após completar a soldadura e a conexão vascular entre as partes, quando então
o dibioto formado se torna apto a ter vida independente. Aí está a vantagem da
encostia, na sua aplicação à união de partes de plantas que apresentam
dificuldade para se unirem pelas técnicas de enxertia. Outra vantagem é a de
poder ser executada em qualquer época do ano e de se poder esperar o tempo
que for necessário para que a união se complete. Por outro lado, é preciso que
ambos os componentes a serem unidos sejam bem flexíveis, para permitir uma
boa adaptação entre eles no ponto de união. Além disto, semelhantemente à
mergulhia, a encostia é uma técnica demorada, trabalhosa e com baixo
rendimento da matriz, com o agravante de exigir o concurso de operário
especializado para executá-la.

6.3.3. Usos da enxertia.


Além de constituir uma técnica eficiente de propagação vegetativa, a
enxertia, por permitir a reunião em uma só planta, de partes de plantas
diferentes, é uma técnica que oferece a possibilidade de se solucionar
problemas que outras técnicas de propagação não permitem, tais como:

1. Para propagação de plantas que não se multiplicam por outros métodos:


- Para plantas que não enraízam pelos processos da estaquia ou da mergulhia;
- Para plantas que não produzem sementes viáveis;
- Para plantas que apresentam alto grau de heterozigose.
2. Para obter benefícios do hipobioto:
- Sistema radicular mais vigoroso, mais adaptado às condições do meio e
melhor distribuído. Dentro de uma mesma espécie pode haver diferentes
variedades apresentando diferentes padrões de sistema radicular, podendo

170
cada qual se ajustar melhor a determinadas características climáticas e
edáficas (propriedades físicas e químicas do solo). Por exemplo, existem
hipobiotos de macieira com maior tolerância às condições de seca; existem
espécies cítricas com maior tolerância às geadas, ao déficit hídrico do solo e
às baixas temperaturas.
- Sistema radicular resistente ou com alta tolerância a problemas fitossanitário.
Existem hipobiotos cítricos resistentes ou com alta tolerância à virose
Tristeza, da mesma forma que hipobiotos de videira resistentes à cochonilha
de solo Filoxera vinifera.
- Redução do porte da planta. Esse fato é facultado à chamada dominância
fisiológica de uma planta sobre a outra. Um bom exemplo é a macieira, onde
variedades que atingem 7 metros de altura, quando enxertadas em certos
hipobiotos, reduzem o porte para 2 a 3 m. Fato similar ocorre com citros
enxertados sobre Poncirus trifoliata.
- Promover melhoria na qualidade do fruto ou produto. Por exemplo, Poncirus
trifoliata usado como hipobioto, propicia a produção de frutos cítricos com
melhor relação acidez/sólidos solúveis, portanto, melhor sabor, melhor
coloração da casca, da polpa e do suco.
- Para antecipar o início da produção. Os hipobiotos nanicantes induzem um
desvio mais cedo da energia da planta para a reprodução induzindo, por
conseguinte, uma precocidade no início de produção da planta. É bom
relembrar, conforme discutido em capítulos anteriores, que clonagens
sucessivas aceleram a fase adulta da planta, acelerando o início de produção
daquelas plantas obtidas pelo processo seminífero.
- Para antecipar ou retardar a colheita. O hipobioto pode proporcionar colheitas
mais precoces ou mais tardias, o que é de grande importância no âmbito
comercial.
- Para transpor barreiras fisiológicas. O exemplo que melhor ilustra este fato é o
não florescimento da batata-doce em condições normais na Luisiânia (EUA),
mas, quando enxertada numa determinada convolvulácea daquele estado
americano, passa a florescer regularmente.

171
3. Para substituição de copas (epibiotos) indesejáveis, já estabelecidas, através
do uso da sobre-enxertia.
4. Para substituição de hipobiotos já estabelecidos que se tornaram
indesejáveis, devido sua susceptibilidade a fitoparasitos de solo, através do uso
da sub-enxertia.
5. Para recuperação de partes danificadas (cirurgia vegetal).
6. Para obtenção de plantas com características especiais.
Em um mesmo hipobioto pode-se realizar enxertias de diversos cultivares
diferentes da mesma espécie vegetal. Para se conseguir tais plantas, deve-se
deixar que o hipobioto atinja um metro ou mais de altura, conduzido em fuste
único; (a) quando se faz uma poda a 20-30 cm abaixo; (b) tirada a dominância
apical, um número variável de gemas laterais irão desenvolver em ramos; (c)
quando estes alcançarem aproximadamente 20 cm de comprimento, faz-se um
desbaste, de modo a deixar os mais vigorosos e melhor distribuídos, distantes
cerca de 20 cm; (d) quando estes atingirem o diâmetro de um lápis ou caneta, à
distancia de 15 a 20 cm de suas bases, receberão enxertia por borbulhia ou por
garfagem, sendo enxertada uma variedade diferente em cada um dos ramos do
hipobioto; quando o enxerto pegar e começar seu desenvolvimento, o ramo do
hipobioto será podado imediatamente acima (mais ou menos 1 cm) do ponto da
enxertia; (e) como consequência, há o estímulo ao desenvolvimento do enxerto
que receberá a primeira poda aos 30 cm, estimulando, assim, o
desenvolvimento de suas gemas laterais em ramos. Um possível aspecto
negativo poderá ser o surgimento de um gradiente de dominância de um
epibioto sobre os demais.
7. Para estudos diversos, tais como compatibilidade/incompatibilidade entre as
partes dibióticas, estudos de hipobiotos, estudos de florescimento, estudos de
doenças sistêmicas, principalmente viroses.
É importante salientar que não se realiza enxertia em plantas monocotiledôneas,
devido ao fato da descontinuidade do câmbio, o qual apenas não é disperso na
região nodal.
8. Para restauração de plantas: sobre-enxertia; subenxertia e enxerto-ponte.

172
Sobre-enxertia. É uma técnica da enxertia que tem por finalidade substituir a
variedade copa de uma planta. A sobre-enxertia consiste em se podar
drasticamente a copa da planta, geralmente, à altura das pernadas
intermediárias, devendo ser realizada no final do inverno e início da primavera.
Realiza-se a enxertia, logo em seguida, na extremidade das referidas pernadas.
Tendo elas casca grossa, preferencialmente, deve-se usar a modalidade
garfagem; e, se a casca apresentar espessura conveniente e "soltar" com
facilidade, pode-se empregar a borbulhia. Toda e qualquer brotação que surgir
do hipobioto ou no interenxerto (se a sobre-enxertia for realizada numa planta
enxertada, o epibioto passará à condição de interenxerto) precisa ser eliminada.

Poder-se-ia enumerar as seguintes finalidades da sobre-enxertia.


1. Para substituição de copas cujo produto por elas fornecido já não mais atende
a preferência do consumidor. O gosto e preferência dos consumidores por
determinado produto podem mudar, de modo que uma planta de grande valor
econômico hoje, poderá não o ser amanhã, havendo necessidade de substituí-la
para o que a sobre-enxertia poderá ser útil.
2. Para substituição de copas que se tornaram susceptíveis a determinado
fitoparasito e/ou que passaram a apresentar problemas de incompatibilidade na
enxertia. Um caso típico ocorre com a seringueira. Para esta planta, existem
hipobiotos apropriados e epibiotos que exibem maior produção de látex, todavia,
estes epibiotos se mostram altamente susceptíveis à doença fúngica, chamada
de Mal das Folhas, que promove a derriça destas. A conseqüente redução ou
paralisação da fotossíntese, dentre todos os aspectos nefastos, resulta na
indução da incompatibilidade entre o hipobioto e o epibioto. Uma forma de
solucionar o problema é a sobre-enxertia de uma variedade cuja folhagem seja
resistente ou com alta tolerância àquele fungo. Desafortunadamente, as
variedades de seringueira com esse atributo se têm mostrado pouco produtoras
de látex.

173
3. A sobre-enxertia permite, ainda, dependendo do objetivo, que se enxerte em
cada uma das pernadas recém-podadas ou das brotações nelas selecionadas
uma cultivar diferente, de modo que numa única planta ter-se-á ramos
produzindo um produto diferente.
4. Outra utilidade da sobre-enxertia estaria nos estudos de interação entre
hipobioto e epibioto, pois, geralmente, nos casos de sobre-enxertia se trabalha,
efetuando várias enxertias em uma única planta. Entretanto, como se pode
observar, a sobre-enxertia é uma técnica bastante dispendiosa. Por esta razão,
ela parece exeqüível apenas para aquelas finalidades abordadas nos dois
subitens anteriormente citados; nas demais finalidades, a sobre-enxertia só
pareceria econômica e viável para pequenos hortos ou pomares onde, nesse
caso, parece preferível ao horticultor executá-la à substituir uma planta por
completo, reduzindo assim o tempo para que esta planta venha exibir
produtividade plena.

Subenxertia. É uma técnica aplicada a uma planta enxertada e já estabelecida,


cuja finalidade é substituir seu sistema radicular, o qual por alguma razão
passou a mostrar sinais de intolerância a algum fator que opera a nível de solo,
como, por exemplo, presença de fitoparasitos (patógenos, pragas), salinidade,
etc. Verifica-se que a subenxertia é uma técnica muito importante para sanar
incompatibilidade induzida ao dibioto em razão de fatores de solo que venham
afetar negativamente o desempenho do sistema radicular do hipobioto. Um bom
exemplo foi o que ocorreu com a citricultura brasileira a partir de 1940. A quase
totalidade de nossa citricultura estava alicerçada na laranja Azeda a qual se
mostrou extremamente susceptível a uma raça nova de vírus, que se chamou de
vírus da Tristeza, nome esse que se deveu à sintomatologia da doença. A
destruição completa dos pomares cítricos só não ocorreu devido ao trabalho
acelerado de seleção de novos hipobiotos resistentes ou com alta tolerância a
este patógeno, destacando-se aí o limoeiro Cravo. Escolhendo o hipobioto, uma
alternativa empregada para salvar plantas dibióticas com o sistema radicular
ameaçado de morte pela Tristeza foi a subenxertia. Esta técnica foi empregada

174
com sucesso no Brasil e, também, em outros países, como nos Estados Unidos,
técnica que permitiu salvar uma laranjeira Bahia enxertada em laranja azeda.
A operação da sub-enxertia consiste em se plantar ao lado da planta
afetada de 3 a 4 hipobiotos novos, resistentes ou com alta tolerância ao fator de
solo que se pretende superar. Estes devem ser plantados de modo inclinado,
para facilitar a operação da subenxertia. Quando esses hipobiotos atingirem
tamanho e conformação ideais, o que geralmente ocorre aos 10 a 12 meses de
idade, procede-se a subenxertia. Esta consiste em se unir ao tronco da
variedade copa, isto é, acima do ponto de união da enxertia antiga, os hipobiotos
novos. À altura ideal para enxertia, estes hipobiotos são decapitados e recebem
nas suas extremidades um duplo bisel, sendo aquele que vai ficar voltado para a
face interna, mais longo, e aquele que vai ficar voltado para a face externa, mais
curto. Estas dimensões são, em média de 6 a 8 cm e de 4 a 5 cm,
respectivamente. Incisões de iguais dimensões são executadas no epibioto
(acima do ponto da enxertia antiga). Após isto, insere-se o duplo bisel do
hipobioto na incisão. Outra maneira de se proceder a subenxertia seria talhar um
bisel simples e longo nos hipobiotos e inserí-los ou numa incisão, conforme
descrita anteriormente, ou numa janela fechada. Em todos os casos, não se
pode esquecer de fazer coincidir as cascas dos tecidos dibióticos em pelo
menos um dos lados. Verificado isto, fixar os dibiotos mediante o uso de pregos
ou tachinha e depois recobrir os ferimentos face aos longos e profundos cortes
efetuados, por onde poderia haver perda de umidade e servir de porta de
entrada para fitoparasitos. Deve-se ter o cuidado de sempre eliminar qualquer
brotação que por ventura venha surgir nos hipobiotos.

Enxerto-ponte. É uma técnica da enxertia que tem por finalidade a recuperação


de uma planta cujo tecido cambial tenha sido parcial ou totalmente destruído
devido ao ataque de pragas, de moléstias ou agentes mecânicos.
Os ramos que vão ser empregados na execução da enxertia-ponte devem
ser, preferencialmente, retirados da própria copa da planta. No preparo dos
enxertos pontes, talha-se um duplo bisel em ambas as extremidades, de modo

175
que o bisel externo seja mais curto do que o interno, à semelhança do que foi
visto para garfagem lateral ao alburno e para subenxertia.
O número de enxertos-ponte a serem empregados na cirurgia dependerá
da extensão da lesão cambial. Os cuidados ao executar tal operação seguem,
basicamente, o mesmo recomendado para subenxertia. Após o pegamento dos
enxertos-ponte, o sistema de transporte da planta se dará por eles.

Outras cirurgias. Refere-se a cirurgias que são empregadas para recuperação


de plantas que tenham tido seus caules profundamente afetados no lenho por
microrganismos ou insetos. Como exemplo, podemos usar uma árvore de
grande valor histórico em determinada localidade que tenha sido acometida por
broca do tronco, cujas galerias serviram de porta de entrada para
microrganismos, cujos estragos proporcionaram o aparecimento de grandes
câmaras internas no caule.
Pode-se recuperar a árvore da seguinte maneira:
1. raspar e remover todo o material necrosado, inclusive uma leve camada
de tecido intacto.
2. aplicar uma solução de fungicida ou inseticida ou ambos, conforme o
caso.
3. em seguida, aplicar um anti-oxidante.
4. preencher as câmaras com mastique, se estas forem pequenas; se
grandes, preenchê-las com uma massa bem fina de concreto, retendo-o
mediante uso de finas taliscas (de bambu, por exemplo).
5. por último, realiza-se tantas enxertias-ponte quantas forem necessárias,
realizadas na parte sadia, abaixo e acima da região lesionada, de modo
que, após o pegamento dos enxertos, a própria planta se incumbiria do
recobrimento da lacuna aberta e preenchida com mastique ou concreto. E
os enxertos pontes iriam reconstituir o sistema vascular da planta.

6.3.4. Base anatômica e fisiológica da enxertia.

176
A enxertia é possível graças ao fenômeno da totipotência celular, ou seja,
a capacidade que tem qualquer célula dos seres multicelulares de, por si só, dar
origem a um indivíduo completo, o que significa a capacidade de dar origem a
qualquer tecido do organismo. Na enxertia, esta capacidade leva à formação de
novos tecidos nas superfícies das partes postas em contato e resulta na união
entre elas.
A união na enxertia acontece em fases distintas. A primeira fase se inicia
com o reconhecimento entre os tecidos das partes postas em contato, por meio
de troca de sinais entre as células, indicando se há compatibilidade entre os
tecidos; em caso positivo, inicia-se o processo de multiplicação celular e
formação de calo, que é definido como uma massa de células de natureza
parenquimática, irregularmente diferenciadas e que se multiplicam de maneira
desorganizada. O calejamento se inicia a partir das células dos parênquimas
situados próximos do câmbio vascular e sob a sua influência. Por este motivo, a
união na enxertia só é possível nas dicotiledôneas, que possuem um câmbio
bem definido e não nas monocotiledôneas, cujo câmbio é disperso.
A segunda fase consiste no preenchimento completo dos espaços vazios
entre as partes postas em contato. Nesta fase, as células dos dois tecidos se
multiplicam, se entrelaçam e preenchem os espaços vazios entre as partes.
A terceira fase consiste na desdiferenciação das células parenquimáticas
em células cambiais, na linha de contato das células do calo com as células dos
câmbios originais das duas partes. Isto acontece devido a sinais emitidos pelas
células dos câmbios originais, que induzem as células do calo, em contato com
elas, a se desdiferenciarem, desta forma estabelecendo o câmbio contínuo entre
as duas partes.
A quarta fase consiste na formação de novo xilema e novo floema,
respectivamente do lado interno e externo do novo câmbio. Desta forma, fica
estabelecida a conexão vascular entre as duas partes e a união entre elas fica
restabelecida.
Ao encerrar o processo de união, a planta fica, portanto, constituída por
duas ou três partes distintas, em geral geneticamente diferentes entre si, cada

177
uma destas partes mantendo a sua individualidade genética, ou seja, não
ocorrendo fusão entre suas células, mesmo no ponto de enxertia, onde ocorre
apenas mistura de células e entrelaçamento de tecidos.
O ideal na enxertia é que haja perfeita coincidência de toda a camada
geratriz do hipobioto com a do epibioto, o que na prática é muito difícil de
ocorrer. Sendo assim, procura-se coincidir a camada geratriz de ambos os
dibiotos em pelo menos um dos lados, para que haja união dos tecidos, induzida
pelas modificações anatômicas ocorridas.

6.3.5. Fatores que afetam o êxito da enxertia.


A capacidade que as plantas apresentam para se unirem na enxertia não
é ilimitada, estando sujeita basicamente aos limites genéticos. À medida que o
parentesco botânico entre duas plantas se distancia, a sua habilidade de união
na enxertia se reduz e deixa de existir a partir de certo limite. Assim, variedades
ou cultivares dentro de uma mesma espécie em geral podem ser enxertadas
entre si sem nenhum problema. Semelhantemente, espécies de um mesmo
gênero raramente oferecem dificuldade para se unirem na enxertia. Um bom
exemplo nesta categoria é a das espécies do gênero Citrus, que normalmente
não apresentam problemas neste sentido. Entre gêneros de uma mesma família,
a união bem sucedida já é menos frequente. Um dos casos mais raros de união
bem sucedida a este nível é entre o gênero Citrus e outros da família Rutaceae,
como Poncirus e Severinia. Já, entre plantas de famílias diferentes, a união só
acontece em casos raros.
Além dos limites genéticos, outros fatores podem interferir no sucesso da
enxertia, tais como o processo de enxertia (borbulhia ou garfagem nos seus
diversos tipos).

A habilidade e a experiência do operador podem afetar, já que o êxito


dependerá da rapidez da operação, da execução de cortes que resultem em
superfícies bem regulares e da boa justaposição das partes, de modo a não
deixar grandes espaços vazios entre elas e promover boa justaposição dos seus
câmbios.

178
Diferenças bioquímicas e fisiológicas podem também afetar o êxito da
operação. Um bom exemplo é o dos marmeleiros; enquanto algumas cultivares
constituem bons porta-enxerto para pereira, outras produzem compostos
prejudiciais aos tecidos da copa.

O estado fisiológico do porta-enxerto pode constituir um fator importante,


como no caso de porta-enxertos de videira que tenham recebido adubação
nitrogenada seguida de irrigação antes da enxertia; isto resulta no chamado
“choro da videira”, que consiste em exsudação excessiva de seiva pelos cortes
no ponto de enxertia, resultando na morte do enxerto.

As condições ambientais também podem afetar, como no caso de plantas


cítricas e outras que se enxertam bem pelo processo de borbulhia por
escudagem com introdução sob casca, a qual só será possível se o porta-
enxerto estiver “soltando casca”, ou seja, em plena atividade vegetativa. No
período de estiagem, a paralisação do crescimento resulta em interrupção da
atividade cambial e, como conseqüência, a casca fica presa, não podendo ser
levantada para introdução da borbulha. Em tal situação ou se opta por outro
processo de enxertia, ou se procede à irrigação, com uma a duas semanas de
antecedência, para estimular a atividade vegetativa, desde que haja temperatura
suficientemente elevada para estimular a atividade celular.

Outro fator importante é a adequação e o estado do material de enxertia,


como canivete de enxertia de bom aço e bem afiado, material de proteção
adequado ao processo de enxertia utilizado (fita plástica). A higiene da operação
e o estado sanitário do propágulo são da maior importância. Neste caso, fitas
plásticas, tesoura de poda e canivete de enxertia devem estar limpos, bem como
as hastes de borbulha devem estar livres de infecções ou contaminantes
superficiais. Um exemplo importante, neste caso, é o da mangueira e do
abacateiro, que são muito sensíveis à antracnose. Se as hastes de borbulha
estiverem contaminadas, a doença se desenvolverá no interior da câmara úmida
formada pela cobertura plástica com a qual se protege o enxerto nas primeiras
semanas e matará as brotações surgidas. Por isto é aconselhável que hastes de

179
borbulhas destas e outras plantas igualmente sensíveis a algum tipo de doença,
sejam desinfestadas antes da enxertia, em solução de água sanitária a 0,5% do
princípio ativo (hipoclorito de sódio), por 15 minutos.

O fenômeno da polaridade é outro fator que pode determinar o êxito ou o


insucesso da enxertia, sendo a sua influência maior na “garfagem”. Neste caso,
a colocação invertida do “garfo” sobre o porta-enxerto resulta em movimento
acrópeto e basípeto de fatores de crescimento em direção inversa à normal,
resultando em morte do enxerto. No caso da “borbulhia”, a inversão da
polaridade não chega a ser vital, já que ocorre uma diferenciação de células na
área, no sentido de restabelecer a polaridade.

6.3.6. Relações enxerto e porta-enxerto:


Apesar de na enxertia os dibiotos manterem suas individualidades, com
certeza um exercerá sobre o outro algum tipo de influência de ordem fisiológica,
morfológica (anatômica), bioquímica e, muito provavelmente, outras influências
não regidas geneticamente.
Didaticamente, pode-se dizer que existem dois tipos de interação: uma
compatível e outra incompatível. Na interação incompatível, pode-se constatar
que um dos componentes causa algum dano ao outro de modo a afetar
negativamente o conjunto. Já na interação compatível, aparentemente, os
componentes não afetam um ao outro, mas haverá, indubitavelmente, alguma
influência apesar de não constatada macroscopicamente. Um dos componentes,
com certeza, modifica as características do outro, mas sem prejudicar o
desempenho do conjunto.
Na interação compatível, verifica-se produção de calo na região cambial
dos dibiotos, proliferação e entrelaçamento das células daqueles componentes,
resultando em uma união mecanicamente forte no ponto de união, com
formação de um novo câmbio contínuo o qual, por sua vez, vai formar um novo
sistema vascular, também contínuo, e com o dibioto não sintetizando fatores que

180
possam promover incompatibilidade retardada durante toda a vida reprodutiva
econômica do dibioto.
Muito embora seja uma interação compatível o hipobioto, o epibioto e o
interenxerto e mesmo a região de união influem mutuamente sobre o conjunto e
determinam o comportamento geral da planta. Cada membro específico exerce
sua própria influência, não importando a parte do conjunto que possa formar.
Assim, se um dos componentes mencionados portar um caráter nanicante, ele
exercerá influência sobre toda a planta não importando se ele está como
hipobioto, epibioto ou como inter-enxerto.

1. Influência do hipobioto sobre o epibioto:


À semelhança do que ocorre nos citros, o hipobioto induz alterações no
crescimento, no tamanho e no formato da copa, na precocidade de produção, no
volume de produção, na época de maturação, no peso dos frutos, na coloração
da casca, da poupa e do suco, nos teores dos componentes químicos do fruto:
açúcares, ácidos, sólidos solúveis, etc., na permanência dos frutos na planta, na
conservação dos frutos após a colheita, na transpiração das folhas, na fertilidade
do grão de pólen, na composição química das folhas, na capacidade de
absorção, na síntese e utilização de nutrientes, na tolerância à salinidade, na
tolerância à seca e ao frio, na tolerância a fitoparasitos e na resposta a produtos
de abscisão.
1.1. Hábitos de crescimento:
Com relação a estes aspectos, o hipobioto pode conferir diferentes
formatos de copa bem como maior ou menor tamanho desta. Por exemplo, a
macieira Malling Merton 109 (MM-109) confere um tamanho natural de 5 a 7 m
de altura à copa, enquanto a macieira Malling 27 (M-27) confere uma altura de
copa de apenas 1,2 m. Nesse contexto, a Inglaterra tem produzido hipobiotos de
macieira com diferentes graus de nanificação. Estes estudos de enxertia de
macieira realizados na Inglaterra mostraram ser possível predizer o caráter
nanicante de certos hipobiotos de macieira. É que constataram que nestes
hipobiotos as raízes laterais apresentam maior proporção de córtex em relação

181
ao lenho, enquanto no hipobiotos que induzem maior vigor à copa esta relação é
menor. Também naqueles hipobiotos que induzem o caráter nanicante à copa, o
tecido lenhoso funcional das raízes apresenta maior proporção de células vivas,
comparado com o hipobioto que induz maior vigor ao epibioto onde este tecido
está mais lignificado e com menor proporção de células vivas.
Pode-se ainda citar outros exemplos tais como: cerejeira (Prunus avium)
doce/cerejeira Mazzard obtida por via seminífera induz epibiotos vigorosos, de
maior tamanho e maior longevidade do que esta mesma cerejeira doce/Prunus
mahaleb que induz copas pequenas e menos longevas. Semelhantemente se
comporta a macieira "Mc Intosh"/hipobioto apomítico semi-anão de Malus
sitekimensis, que induz copa baixa e esparramada. Também citros enxertados
sobre laranja Azeda ou da Terra e citros/P. trifoliata apresentam,
respectivamente, copas de porte alto e baixo.
1.2. Precocidade, longevidade e produtividade:
Na verdade, estes fatores estão intrinsecamente relacionados com o
vigor. Hipobiotos vigorosos e de crescimento exuberante conferem ao epibioto
maior vigor e maiores colheitas por um período de tempo maior. O contrário
ocorre com os hipobiotos nanicantes que conferem maior produtividade por área
de copa e por um período de tempo menor. Todavia, neste caso, se os dibiotos
forem plantados em espaçamentos reduzidos, apresentarão maior produtividade
por área, principalmente nos primeiros anos. Experimentos mostraram que
plantas enxertadas em hipobiotos nanicantes produziram mais nos 20 primeiros
anos, enquanto aquelas enxertadas em hipobiotos vigorosos produziram mais
nos 20 anos subseqüentes, o que equivale dizer que nos primeiros anos, o
nanismo do hipobioto proporciona maiores vantagens econômicas ao horticultor.
O próprio processo de enxertia em si, conforme verificado nos citros,
pode estimular uma produção mais cedo. Também, uma incompatibilidade
parcial, motivada por uma redução na translocação no ponto de união, poderá
exercer o efeito que teria a anelagem e conduzir com ele a um incremento na
frutificação.
1.3. Produção de flores e vingamento de frutos:

182
Um exemplo em que o hipobioto exerce efeito direto sobre a produção de
flores e vingamento de frutos é o caquizeiro. Quando se enxerta a cultivar
Hachiya sobre Dispyros lotus verifica-se maior produção de flores, do que sobre
D. kaki. Quando o caqui Hachiya foi enxertado sobre D. virginiana, a produção
de flores foi tão pequena que foi considerada desprezível.
Sabe-se que o rendimento da videira está intrinsecamente relacionado
com o vigor do ramo do crescimento do ano; assim, enxertias de videiras
americanas (Vitis labrusca) sobre hipobiotos vigorosos exibiram maior
rendimento em comparação com V. labrusca de pé franco. Por um período de 6
anos, a videira "Concord" enxertada sobre certos hipobiotos, aumentou de 30 a
150 seu rendimento em comparação com essa planta sob pé franco. Todavia,
Vitis vinifera sobre hipobiotos extremamente vigorosos e em solos férteis pode
redundar em um dibioto improdutivo.
1.4. Tamanho, qualidade e maturidade do fruto:
Experimentos mostram que laranjas doces enxertadas sobre si mesmas
induzem produção de frutos de tamanho e qualidade normais, todavia, quando
enxertadas sobre Poncirus trifoliata os frutos são maiores, de melhor qualidade,
melhor sabor e melhor relação sólidos solúveis/acidez. Apesar disto, a
combinação laranja doce/P. trifoliata é pouco utilizada no Brasil.
A tangerina Satsuma sobre P. trifoliata, além de ter induzida sua
precocidade em áreas mais quentes, experimenta também uma melhoria na
qualidade do fruto em face do aumento da relação sólidos solúveis/acidez. Esta
tangerina normalmente produz pouca semente, o que é uma vantagem mas
apresenta sabor inferior devido a sua baixa relação sólidos solúveis/acidez. Fato
semelhante se verifica com relação a Pyrus comunis, como as cultivares Bartlet,
Anjon e outras enxertadas sobre Pyrus comunis o qual induz a produção de
frutos normais. Entretanto Pyrus comunis/Pyrus pyrifolia induz a produção de
frutos apresentando podridão estilar possivelmente devido a uma deficiência na
absorção de cálcio e boro.
Pode-se, ainda, citar a enxertia do tomateiro sobre o fumo cuja
combinação resulta na produção de frutos de tomateiro contendo teores

183
significativos de nicotina. Esta é produzida no sistema radicular do fumo e
translocada para o tomate. Também nos estados sulinos dos EUA, para evitar
ataque dos nematóides das raízes, tentaram enxertar o tomateiro (Lycopersicon
esculentum) sobre o toloache (Datura stramonium) que era resistente a esses
nematóides, todavia, verificou-se que o tomate apresentava teores muito altos
de alcalóides venenosos.
1.5. Resistência ou tolerância ao frio, à seca, às doenças e às pragas:
O Poncirus trifoliata, como hipobioto, confere aos citros maior tolerância
ao frio. Tem-se que esse promove o enrijecimento mais cedo dos tecidos dos
citros, isto é, os ramos amadurecem mais cedo.
Trabalhos desenvolvidos pelo Departamento de Engenharia Florestal da
UFV demonstraram que as meliáceas (Cedrella spp.) quando enxertadas no
cedro australiano (Teona ciliata var. australis) passaram a exibir resistência ou
alta tolerância ao ataque da broca do cedro (Hypsipyla grandella).

2. Influência do epibioto sobre o hipobioto:


Dentre as influências que o epibioto exerce sobre o hipobioto, as mais
evidentes são quanto ao desenvolvimento do sistema radicular, resistência ao
frio, à seca e moléstias.
2.1. Efeito sobre o vigor:
Epibiotos mais vigorosos induzem maior vigor ao hipobioto, impondo a
este maior crescimento e, por conseguinte, maior tamanho final do dibioto. A
macieira "Red Astrachan" induz um sistema radicular mais fibroso e com poucas
raízes principais. Por outro lado, as macieiras "Oldenburg" e "Famense" induzem
um sistema radicular menos fibroso e com apenas uma raiz principal, que
alcança maiores profundidade e que apresenta apenas 2 ou 3 ramificações. Já a
macieira "Granadero" induz no hipobioto "Newton Wonder" um sistema radicular
mais desenvolvido e raízes mais fibrosas. Verifica-se, também, que laranjas
doces enxertadas sobre P. trifoliata estimulam o aumento do diâmetro deste
hipobioto da mesma forma que os citros/P. trifoliata induzem maior volume de
sistema radicular neste hipobioto.

184
2.2. Efeito sobre a tolerância ao frio:
Tem se verificado que enxertos que amadurecem mais cedo induzem aos
hipobiotos maior tolerância ao frio porque, possivelmente, estes se vêem
forçados a antecipar a maturação também de seus tecidos de modo que passam
a tolerar melhor as temperaturas mais baixas.

3. Influência do interenxerto:
Interenxerto é um terceiro componente biótico que, pela técnica da
interenxertia, é colocado entre o hipobioto e o epibioto, cujas finalidades são:
- Redução das dimensões da copa: A interenxertia pode ser usada visando
reduzir o porte da copa da planta quando se usa hipobiotos vigorosos. Assim,
pode-se obter uma planta com características nanicantes. Um bom exemplo
desse fato é a macieira M-27, usada como interenxerto a qual reduz a altura de
copa, aumenta a produtividade por área e por planta e proporciona frutos
grandes e com melhores qualidades.
- Para evitar incompatibilidade localizada entre hipobioto e epibioto: As
incompatibilidades localizadas podem ser sanadas pelo emprego de
interenxertos desde que estes sejam mutuamente compatíveis com o hipobioto e
o epibioto. É o que acontece, por exemplo, com o limoeiro Eureka enxertado
sobre Poncirus trifoliata, cuja incompatibilidade provocada pela deposição de
amido na superfície de união pode ser resolvida pelo emprego do interenxerto
laranja Valência. Outro exemplo é a ameixeira "Gran Duke" que, enxertada
sobre certos pessegueiros, forma uma união incompatível a qual pode ser
sanada pelo uso do pessegueiro "Clymann" como interenxerto.
- Para prevenir contra a sensibilidade da planta a um microrganismo patogênico:
É o que acontece com a seringueira onde os troncos das principais variedades
produtoras de látex têm se mostrado susceptível ao Mal das Folhas. Esta
anomalia pode ser corrigida, transformando a variedade produtora de látex em
interenxerto.
- Para prevenir contra a sensibilidade da planta a uma praga.

185
A interenxertia pode ser realizada por meio das seguintes técnicas:

1. Justaposição. Remove-se, inicialmente, uma placa no hipobioto e, em


seguida, uma placa no interenxerto de modo a suprimir-lhe as gemas e sobre
esta placa do interenxerto justapõe-se uma placa da variedade copa.
2. Operações sucessivas. Com o hipobioto na idade e na conformação ideais e
na época correta, efetua-se a enxertia do interenxerto e, sobre este, enxerta-se
a variedade copa desejada.
Por meio desta técnica, o interenxerto geralmente apresenta comprimento
de 20 cm. Mas isto não pode ser uma regra fixa. Na seringueira, por exemplo, o
interenxerto deve constituir todo o tronco da planta.

4. Possíveis mecanismos da influência recíproca entre hipobioto e epibioto:


Muito embora a natureza das relações estabelecidas em uma interação
compatível seja extremamente complexa e diferente de caso para caso, assim
como o mecanismo fundamental que mede tais relações não esteja
adequadamente entendido, várias teorias sobre o assunto são propostas. Elas
levam em consideração três fatores: absorção e utilização de nutrientes e água,
translocação de nutrientes e alterações nos fatores endógenos de crescimento
(hormônios, proteínas, vitaminas, etc.).

Finalmente, serão discutidas as causas de incompatibilidade entre o


epibioto e o hipobioto.

Incompatibilidade é a incapacidade de duas plantas formarem uma


combinação bem sucedida na enxertia. Por exemplo, duas plantas de ordens
botânicas diferentes podem até unir seus tecidos, todavia por fatores físico-
químicos e morfo-fisiológicos, elas estão distantes e haverá incompatibilidade
entre elas. O baixo índice ou o não pegamento do enxerto, ou sua posterior
morte, poderão se dever à incompatibilidade se os demais fatores estiverem em
seus ótimos.

186
Tipos de incompatibilidade:
1. Quanto ao local de ocorrência da causa:
1.1. Incompatibilidade localizada:
É aquela cujo fator responsável e efeito ocorrem no ponto de união e
dependem do contato direto entre os tecidos incompatíveis. A incompatibilidade
localizada pode ser evitada mediante o uso do interenxerto, desde que este seja
mutuamente compatível com os dois tecidos.
1.2. Incompatibilidade translocável:
É aquela causada por um fator móvel que atravessa o ponto de união e
vai causar a degenerescência (dano) do outro componente. Não há como filtrar
esse fator. Portanto, esse tipo de incompatibilidade não pode ser evitado pelo
emprego de um interenxerto que seja mutuamente compatível com o hipobioto e
o epibioto.
2. Quanto ao tempo decorrido entre a execução da enxertia e o aparecimento da
incompatibilidade:
2.1. Incompatibilidade imediata. É aquela cuja causa aparece e o dano se
concretiza durante a fase de regeneração dos tecidos na enxertia. Portanto, a
enxertia não chega a se concretizar ou a se completar.
2.2. Incompatibilidade retardada. É aquela cujo dano se concretiza
posteriormente à regeneração dos tecidos na enxertia a qual pode ter ocorrido
normalmente. Esse tipo de incompatibilidade poderá se manifestar anos mais
tarde como ocorre com a pereira Conference, quando enxertada sobre
marmeleiro havendo, inicialmente, uma união mecanicamente forte e uma planta
vigorosa mas vindo a apresentar sintomas de incompatibilidade 20 anos mais
tarde.

Sintomas de incompatibilidade:
Para se concluir sobre a veracidade dos sintomas de incompatibilidade é
necessário analisar meticulosamente os demais fatores responsáveis pelo êxito
da enxertia. Estando estes nos seus ótimos, poderá se concluir tratar de
incompatibilidade se:

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1. Houver grande percentagem de insucesso na enxertia, isto é, o não
pegamento do enxerto.
2. Houver amarelecimento, principalmente ao final da estação de
crescimento, queda precoce de folhas, redução do crescimento vegetativo
e perda de vigor do dibioto, estando ajustadas as condições
edafoclimáticas.
3. Houver morte de tecidos periféricos do epibioto.
4. Houver morte prematura do dibioto, o que se dá normalmente 1 a 2 anos
após a instalação da muda no viveiro mas, pode ocorrer depois de
passado mais tempo. Um exemplo para este caso seria citros/laranja da
Terra. O hipobioto laranja da Terra tem seu sistema radicular susceptível
ao vírus da Tristeza, que é tão comum às cultivares copa. Se os vetores
desta doença como pulgões (que são largamente disseminados na
natureza) sugarem uma planta cítrica infectada e, em seguida, picarem o
referido dibioto, sem dúvida, induzirá o aparecimento de uma
incompatibilidade em razão do sistema radicular passar a não atender a
demanda do conjunto referido.
5. Ocorrer diferenças marcantes de vigor entre os tecidos dibióticos e/ou no
final da estação de crescimento. É o que ocorre, por exemplo, com
citros/Poncirus trifoliata. Este aumenta seu diâmetro de tronco e procura
reduzir o diâmetro do tronco do epibioto, sem, contudo interferir no
processo produtivo deste, cujos frutos exibem grande tamanho, cor,
aroma e sabor agradáveis, alto teor de sólidos solúveis, etc..
6. Ocorrer intumescimento abaixo, acima ou no ponto de união. Isto ocorre
devido a massa de tecido parenquimatoso (calo) interromper a conexão
vascular no ponto de união, resultando no intumescimento. É o que
acontece, por exemplo, quando se enxerta pereira Bartlet sobre
marmeleiro;
7. Ocorrer quebra do enxerto no ponto de união, quando submetido a
pequeno esforço.Exceto esse último caso, a ocorrência isolada de apenas
um dos sintomas acima mencionados pode não ser suficiente para

188
Características da união incompatível:
As características de incompatibilidade podem ser confirmadas pelo não
funcionamento do conjunto (dibioto) como, por exemplo:
1. Em alguns casos, os tecidos dibióticos podem apresentar suas
respectivas células com tamanho e formatos diferentes e padrões de
divisão celular, também, diferentes, proporcionando um crescimento um
tanto quanto desordenado, de modo a redundar em uma falta de
entrelaçamento das células e, resultando em uma união anatomicamente
fraca.
2. Os tecidos calosos produzidos pelos respectivos câmbios originais do
hipobioto e do epibioto são incapazes de diferenciar e formar,
perfeitamente, o novo câmbio e conectá-lo aos câmbios já existentes no
hipobioto e no epibioto. Com isto, formará o intumescimento como
consequência da descontinuidade cambial, e será incapaz de produzir os
tecidos vasculares no ponto de união.
3. O novo câmbio chega a se formar com aspecto perfeito e se conectar aos
câmbios dos dibiotos, todavia é incapaz de se diferenciar e de formar o
novo tecido vascular.
4. Pode-se verificar que não se formam camadas radiais contínuas no ponto
de união. O crescimento secundário dos dibiotos se dá de forma
independente de modo a provocar a compressão do xilema e a propiciar a
inclusão de casca no ponto de união não havendo entrelaçamento de
células nos dibiotos. O dibioto torna-se quebradiço nesta região. Um
exemplo é a pereira Bartlet/marmeleiro. Esta incompatibilidade poderia
ser resolvida mediante o uso do interenxerto "Old Home". Outros
exemplos seriam macieira/pereira e Amnistiar/cerejeira.

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Grau de incompatibilidade:
1. Falta completa de união. Neste caso, a enxertia não é possível devido a
incompatibilidade imediata. Ex.: enxertia efetuada entre plantas
botanicamente distantes.
2. União mecanicamente fraca e com tecidos destorcidos. Neste caso,
poderia ocorrer descontinuidade cambial e/ou imperfeição na formação
do novo sistema vascular. Um exemplo seria a inclusão de casca.
3. União mecanicamente forte e com conexão vascular normal. Apesar
disto, mais tarde, a união se torna incompatível por algum fator.
Provavelmente, um dos dibiotos produz uma determinada substância
maléfica ao outro componente.

Causas da incompatibilidade:
1. Diferenças nas características vegetativas do epibioto e do hipobioto
como, por exemplo, início e final do período vegetativo, taxa de
crescimento, presença e amplitude do período de dormência ou repouso
vegetativo, podem redundar no aparecimento de incompatibilidade.
2. Diferenças fisiológicas como, por exemplo, plantas caducifólias
enxertadas sobre hipobiotos perenifólios. Plantas que apresentam
repouso vegetativo não podem ser enxertadas sobre hipobiotos
perenifólios, por promoverem distúrbios fisiológicos nestes. Mas a
recíproca não é verdadeira, isto é, perenifólia/caducifólia.
3. Diferenças bioquímicas. Este aspecto tem sido detectado em estudos de
enxertia relacionados a várias plantas. Mas ele é melhor compreendido
por meio dos estudos de enxertia da pereira sobre o marmeleiro.
Estudos mostram que o marmeleiro sintetiza um glucosídeo
cianogênico hidrossolúvel chamado de Prunasin, o qual não é produzido
pela pereira. Quando se enxerta pereira sobre marmeleiro, o Prunasin é
translocado para o floema da pereira promovendo a degenerescência dos
tecidos, na região de união.

190
O que se verifica é que esse glucosídeo, pela ação de certas enzimas
da pereira, sofre decomposição onde um dos subprodutos é o ácido
cianídrico que passa a bloquear a atividade cambial na região de união
causando profundas defecções anatômicas que vão redundar em um
xilema e floema inaptos no processo condutivo. Isto, dentre outras coisas,
promove uma redução nas concentrações de açúcar que chegam às
raízes do marmeleiro promovendo, assim, uma maior taxa de
decomposição do Prunasin, com o conseqüente aumento na liberação de
ácido cianídrico que vai culminar na morte do dibioto.
As cultivares de pereira diferem entre si com relação à capacidade
intrínseca de decompor o Prunasin. Por outro lado, cultivares dessa
frutífera apresentam graus diferenciados de capacidade de síntese de um
inibidor hidrossolúvel e facilmente difusível que decompõe o Prunasin.
Possivelmente isto explica porque certas cultivares de pereira são
compatíveis com o marmeleiro.
Ainda com relação aos estudos da enxertia de pereira sobre
marmeleiro, detectou-se haver um grupo de marmeleiros que sintetizam
um outro glucosídeo denominado de Arbutin, o qual impede a deposição
de lignina nos tecidos da pereira, na altura da linha de união. O Arbutin
hidrolisa a lignina produzindo hidroquinonas as quais, por sua vez, sofrem
oxidação transformando-se em um pigmento de cor marrom que impede a
deposição de lignina. Esses mesmos estudos mostraram haver
combinações compatíveis, presumindo-se haver cultivares de pereira
capazes de decompor o Arbutin;
4. Presença de viroses. Estando um dos tecidos dibióticos infectado, este é
passível de transmitir esse agente etiológico ao outro componente. É o
que ocorre com a virose Tristeza. Se enxertar um epibioto cítrico
infectado sobre laranja da Terra (imune), o referido vírus, por
translocação floemática, vai alcançar o sistema radicular desse hipobioto,
depauperando-o e promovendo a indução de uma união incompatível.

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Fato semelhante ocorre com pereiras (Pyrus comunis) enxertadas
sobre pereiras orientais (Pyrus pyrifolia). Estes hipobiotos são altamente
susceptíveis a vírus e micoplasmas que são comuns naqueles epibiotos
(Pyrus comunis) os quais são geralmente tolerantes. Os referidos
patógenos são transmitidos pelo inseto vetor Psylla pyricola, de forma
que, apesar de P. comunis/P. pyrifolia formar uma união compatível,
estando aquele epibioto infectado ou se o dibioto em pleno
desenvolvimento sofrer o ataque do Psylla pyricola, inapelavelmente,
haverá indução de incompatibilidade;
5. É fácil concluir que diferenças genéticas e anatômicas e outros fatores
além daqueles acima mencionados operam no estabelecimento de
incompatibilidade.

Exemplos de incompatibilidade:
Além dos exemplos já mencionados, outros poderiam ser citados, tais como:
1. Laranjas Pera e Seleta de Itaboraí, quando enxertadas em P. trifoliata
e/ou em limão rugoso da Flórida.
2. Limões Eureka e Siciliano, quando sobre P. trifoliata e/ou citranges.
3. Limão Siciliano e laranja Pera, quando sobre citrumelo Swingle.
4. Tangor Murcott, quando sobre P. Trifoliata.
5. Laranja Pera, quando sobre limão Volkameriano.
Pessegueiro 'Hale's Early', quando enxertado sobre ameixeira
Mirabolão, que acumula uma quantidade anormal de amido na base do
referido epibioto.
6. Macieira, quando enxertada sobre pereira, demonstra um crescimento
inicial vigoroso, mas passa a exibir os sintomas de incompatibilidade
algum tempo depois.
7. Fato semelhante ocorre com a pereira Conference, quando sobre
marmeleiro, onde se verifica uma união mecanicamente forte e um dibioto
vigoroso mas com os sintomas de incompatibilidade aparecendo 20 anos

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Prevenção de incompatibilidade:
Quando, por experimentação prévia, se passa a conhecer as causas da
incompatibilidade como, por exemplo, os conteúdos de Prunasin ou de Arbutin
do marmeleiro, os quais tornam a pereira/marmeleiro uma combinação
incompatível; ou o mecanismo de ação da degenerescência da ameixeira
Mirabolão, quando sobre ela é enxertado o pessegueiro 'Hale's Early', deve se
evitar, quando da enxertia, estas combinações incompatíveis já caracterizadas.
Outra medida seria a utilização de interenxertos mutuamente compatíveis
com o epibioto e o hipobioto, quando se tratar de incompatibilidade localizada.
Quando se desejar realizar enxertia de plantas pouco conhecidas, deve-
se consultar a literatura, procurando levantar o histórico desta família botânica
procurando identificar casos comprovados de incompatibilidade de modo a
formar uma idéia do que possivelmente poderia vir a ocorrer.

Correção de incompatibilidade:
A correção pode ser feita mediante emprego da sobre-enxertia, da
subenxertia e do enxerto ponte.

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