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O RITMO DA CELEBRAÇÃO

Tudo o que vive tem ritmo. Não se confunda com movimento ou andamento. O
ritmo é, antes, uma sucessão dinâmica e harmoniosa de elementos fortes e fracos
(como o claro e o escuro, a sístole e a diástole, a arsis e a tesis, o impulso e o
repouso, etc.), numa ampla variedade de cambiantes. Uma celebração litúrgica
dispõe de diversos elementos. A arte de bem celebrar sabe lançar mão de todos
eles e dar-lhes uma disposição dinâmica e harmoniosa.
Em primeiro lugar é preciso conhecer e respeitar as regras da celebração.
Houve tempo (cremos que já passou?!...) em que se valorizava de tal modo a
criatividade (mal compreendida...) e a espontaneidade que, tudo o que
“cheirasse” a rubrica, estava condenado a ser expurgado, como se fosse o maior
obstáculo a uma “celebração viva”.
Imaginemos que, num jogo de futebol, um jogador, em nome da criatividade ou
da espontaneidade, em vez de atirar à baliza do adversário, marcava na própria
baliza! Assim acontece com todos aqueles que são avessos a regras... Tudo o que
se pode e deve fazer pela celebração não pode ir contra as suas regras, sob pena
de se atingir a sua identidade e finalidade.
É, pois, absolutamente necessário que todos quantos intervêm na celebração,
particularmente ministros e, sobretudo, aquele que preside, tenham
conhecimento e sentido crítico dos limites que lhe são impostos...
Mas não basta conhecer e aplicar as rubricas. Se isso já não é pouco, não é,
todavia, tudo. As rubricas são como que o esqueleto da celebração que é preciso
encher com carne. E, de facto, contentar-se apenas com cumprimento das
rubricas é matar a celebração.
Felizmente que, hoje, as rubricas não são apenas impositivas, mas
frequentemente, indicativas (por estas ou por outras palavras semelhantes...
infelizmente muitos celebrantes ficam-se por estas...).
Hoje, cumprir as rubricas é mais difícil que no passado, porquanto são elas
próprias que promovem a criatividade. Certo espírito rubricista, aliado a certa
rotina, leva a que sejam usados sempre os mesmos esquemas, os mesmos textos
e as mesmas fórmulas, ritos e cantos, de forma que os missais e os rituais
poderiam, em muitos casos, reduzir-se a poucas páginas.
“O que acima de tudo interessa é não tornar a celebração rígida e artificial, nem
se preocupar com a observância meramente formalista de certas normas; mas
sim fazer dela qualquer coisa de autêntico. É nisto que, antes de mais, se há-de
concentrar todo o esforço, para que os espíritos se sintam possuídos do desejo da
genuína oração da Igreja e tenham gosto em celebrar os louvores de Deus”.
Fazer da celebração “qualquer coisa de autêntico”, diz a Instrução Geral sobre a
Liturgia das Horas, no n.º 279.
Para tal, apresentamos algumas sugestões:
– Importa valorizar cada palavra, cada gesto, cada atitude, cada movimento,
cada canto. A regra de ouro será sempre a sobriedade. A abundância de
palavra, desvaloriza a palavra. Têm razão aqueles que criticam as celebrações de
hoje serem palavrosas. Mas o vírus pode atingir também os outros elementos,
sobretudo nas celebrações de grupo, ou de movimentos de fervor. Quantas
repetições desnecessárias e prolixas, sobreposições parasitas, de palavra, canto e
rito, com boa intenção, é certo, mas que desvalorizam a palavra, o canto e o rito
e matam a celebração!
– Importa ter uma visão global da celebração e respeitar uma justa hierarquia
entre as partes. Muitas celebrações, nomeadamente eucarísticas, esgotam-se na
Liturgia da Palavra, ou melhor, na homilia. Outras nos ritos iniciais. Quando
assim é, já não resta fôlego para o Rito, para o coração da missa que é a liturgia
eucarística, nomeadamente a oração eucarística.
– Importa restituir ao silêncio o seu papel activo e construtivo na celebração.
A prolixidade da palavra e do canto faz-se, normalmente, à custa do silêncio.
Também aqui o ditado tem razão: a palavra é prata, mas o silêncio é ouro. Não
se trata de fazer celebrações silenciosas, nem de silêncio que seja sinal de vazio
ou de “buraco” na celebração. Como numa peça musical, as pausas são música
(não que o compositor ou o intérprete se tenha esquecido das notas...). Silêncio
para ouvir, para contemplar, para meditar, para assimilar, para preparar a
palavra, o canto e o rito. São sobretudo, importantes, os pequenos silêncios ao
longo da celebração, aliás propostos pelo Missal e pelos Rituais.

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