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Revista Ponto de Vista – Vol.

3 65

ENSINO DE FÍSICA NO NÍVEL MÉDIO:


TÓPICOS DE FÍSICA MODERNA E
EXPERIMENTAÇÃO

“Estudar Física sem ser através da experiência é


como fazer curso de natação por
correspondência”. (Rodolpho Caniato)
“A Física como modo de olhar e estudar o mundo
é parte integrante da cultura de hoje, e só isto já
justifica o seu estudo”. (Ernest Hamburger)

Denis Rafael de Oliveira Pereira e Oderli Aguiar


Departamento de Física
Universidade Federal de Viçosa
36570-000 Viçosa, MG – Campus Universitário
dropereira@yahoo.com.br; oaguiar@ufv.br

Resumo: O ensino fundamental e médio no Brasil, como se sabe, é de baixa


qualidade em muitas regiões. Muitos fatores concorrem para esse resultado. O
desinteresse dos alunos em relação às aulas e as dificuldades que muitos
professores enfrentam no exercício da docência são fatores determinantes desse
quadro. Este artigo discute o ensino da física no nível médio, ressaltando a
necessidade de abordagens experimentais e o estudo de tópicos de Física Moderna
e Contemporânea, nesse nível de ensino. Uma proposta de atividade prática, em
anexo, que envolve o efeito fotoelétrico, já experimentada no nível médio de
ensino, enfatiza uma estratégia pedagógica, de experimentação como forma de
inovar a prática docente e envolver efetivamente os alunos no processo ensino-
aprendizagem melhorando efetivamente a qualidade do ensino.

Palavras chaves: Educação, Física Moderna, Experimentação.

Abstract: The Elementary School and High School in Brazil have a low quality in
many brazilian regions. Many reasons contribute to that situation. The disinterest
of the students related to the classes and the difficulties of many professors to
teach are the main determining factors of this problem. This article discusses the
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education of Physics in High School, emphasizing the necessity of studying


contents of Modern and Contemporary Physics using an Experimental Approach.
A proposal for practical work that involves the photoelectric effect, which has
already been tested in High School, finalized the article emphasizing a
pedagogical strategy (the experimental strategy) as a way to involve effectively
the students in the learning-teaching process and improve the quality of the
education.

Key Words: Education, Modern Physics, Experimentation.

O objetivo deste artigo é promover uma reflexão sobre o


ensino de física no nível médio. Sabemos que a física é uma
disciplina escolar pouco atraente para a maioria dos alunos. O
desinteresse pelo estudo de física não resulta da falta de sua
aplicação no cotidiano do aluno, pois ela está presente, por exemplo,
no funcionamento de aparelhos eletrônicos existentes na maioria dos
lares brasileiros. Também não se pode alegar que é uma disciplina
cujo conteúdo seja difícil de se ensinar e aprender. O desinteresse
que se reflete na má qualidade do ensino brasileiro exige, portanto,
revisão das práticas pedagógicas.
Por outro lado, merece reflexão a conveniência da inclusão
de tópicos de física moderna no currículo. Com o ensino da física
moderna, de forma sistemática e experimental, desenvolver-se-ia no
aluno a capacidade de observação e de análise de questões
cotidianas relacionadas à física, e se promoveria neles uma
conscienciosa reflexão sobre fatos atuais e sua explicação por meio
de conceitos. Hoje, há uma série de desafios relacionados à
tecnologia, como, por exemplo, entender o funcionamento de
equipamentos eletrônicos modernos, utilizar programas de
computador, acessar recursos da internet, como ler jornais ou
revistas de divulgação científica e realizar pesquisas bibliográficas.
Abordar temas da física moderna e a aplicação tecnológica dessa
ciência, na escola, minimizaria os desafios, valendo-se deles para
otimizar o processo ensino-aprendizagem.
Existem ainda outros desafios, como: a falta de infra-
estrutura em muitas escolas para oferecer ambiente adequado às
aulas práticas de ciências; a carência de oportunidades para
treinamento de professores; a dificuldade ao acesso a novas
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tecnologias para a educação, que é um reflexo das desigualdades


sociais brasileiras; entre outros. A despeito dos desafios, há
tentativas de enfatizar a experimentação e de inserir noções,
conceitos, modelos e aplicações da Física Moderna e
Contemporânea nos cursos introdutórios de física em todos os níveis
de escolarização. Mas, infelizmente, no nível médio, em muitas
escolas, a física vem sendo ensinada, ainda, conforme metodologias
estabelecidas no final do século XIX. Quando muito, os estudantes
aprendem a resolver problemas da física newtoniana. Numa escola
mais “exigente”, possivelmente aprenderão alguns princípios da
física dos séculos XX e XXI.
Em países desenvolvidos em que o estudo de física não é
obrigatório para todos os estudantes; os sistemas escolares
contemplam tópicos da física moderna nos currículos e, há algum
tempo, materiais didático-pedagógicos vêm sendo desenvolvidos sob
esse enfoque. No Brasil, no entanto, só recentemente, tem sido
estimulada a inclusão de conteúdos mais atuais nos currículos
escolares. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)
[1], propõe, por exemplo, para o ensino médio destaque à educação
tecnológica básica, compreensão do significado da ciência, domínio
dos princípios científicos que presidem a produção moderna. Em
“Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias”, em que se
insere a física, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) [2],
sem mencionar a tradicional lista de conteúdos a serem trabalhados
no Ensino Médio, ressaltam que a organização dos conteúdos devem
vincular-se ao cotidiano do aluno.
Além dos PCNs [2], outros textos subsidiarão essa reflexão
como os títulos: Uma Atividade Experimental Investigativa de
Roteiro Aberto Partindo de Situações do Cotidiano, de autoria de
TERRAZAN, HERNANDES e CLEMENT [3]; Ensinando física
moderna no segundo grau: efeito fotoelétrico, laser e emissão de
corpo negro, de VALADARES e MOREIRA [4]; Noções de Física
Moderna de VENTURA e FARIA [5], entre outros.
Os PCNs [2] explicitam os vínculos nos processos de ensino
e aprendizagem a serem desenvolvidos entre as disciplinas física,
química, biologia e matemática. Esse texto trata da organização do
trabalho escolar, discutindo as competências em física e de como
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elas se articulam com os diferentes conteúdos, de forma a estruturar


o conhecimento e os objetivos formativos, sugerindo estratégias de
ensino. Não traz, porém, soluções que, como sabemos, devem
necessariamente surgir de cada realidade escolar.
O objetivo da escola deve voltar-se para a formação do
jovem, independentemente de seus objetivos posteriores ao término
do ensino médio, instrumentalizando-o para a vida, para raciocinar,
compreender as causas e razões das coisas, exercer seus direitos de
cidadania, cuidar de sua saúde, participar das discussões em que
estão envolvidos seus destinos, atuar, transformar, enfim, para
realizar-se como sujeito da sua história e viver dignamente. Essa é
nossa compreensão do que seja uma educação para a cidadania e,
portanto, o objetivo do ensino.
Há publicações nacionais, dirigidas a professores, sobre a
inserção da física moderna e contemporânea no ensino médio, como
por exemplo, do efeito fotoelétrico, da teoria da relatividade restrita,
do espectro de um laser, da física quântica e nuclear. Nesse
contexto, artigos publicados na Revista Brasileira de Ensino de
Física têm estimulado pesquisadores, professores do nível médio e
superior e estudantes de pós-graduação a publicarem artigos que
discutam métodos de ensino de física moderna e contemporânea. É
preciso facilitar aos alunos a compreensão da física, produzindo
material instrucional de física moderna e contemporânea como texto
didático, para-didático, pôster, página na internet, experimento de
baixo custo. Sobre esse tema, podem-se citar algumas publicações
como “Laboratório Caseiro de Física Moderna” de autoria de S. M.
Arruda e D. O. Toginho Filho [6]; “Uma oficina de Física Moderna
que vise a sua inserção no ensino médio” de Marisa Almeida
Cavalcante e Cristiane R. C. Tavolaro [7]; “A Evolução do Ensino
de Física no Brasil” de João B. de A. Junior [8]; “A Inserção da
Física Moderna e Contemporânea no Ensino de Física na Escola de
2° Grau” de Eduardo A. Terrazan [9]; “Ensinando física moderna
no segundo grau: efeito fotoelétrico, laser e emissão de corpo
negro” de Eduardo de C. Valadares e Alysson M. Moreira [4].
O ensino de física no nível médio tem se limitado
principalmente a temas da física clássica: mecânica, eletricidade e
magnetismo, calor e óptica. Além disso, esse ensino caracteriza-se,
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na maioria das vezes, por aulas teóricas e descritivas, distantes da


realidade dos alunos. Faz-se necessário somar itens de física
moderna a esses temas clássicos, bem como desenvolver uma
metodologia fundamentada também na experimentação. Vejamos no
seguinte recorte dos PCNs [9], (p.230), sugestão que ilustra a
necessidade de diversificação de temas e de inovação pedagógica:
“Não se trata (...) de elaborar novas listas de tópicos de conteúdo,
mas, sobretudo de dar ao ensino de Física novas dimensões.” Para
os PCNs, o ensino deve ser contextualizado e integrado à vida do
aluno. Segundo os Programas o ensino deve “Apresentar uma física
que explique a queda dos corpos, o movimento da lua ou das
estrelas no céu, o arco-íris e também os raios laser, as imagens da
televisão e as formas de comunicação.”, por exemplo.
O ensino de física de qualidade requer atualização do
professor para que ele, com recursos alternativos, articule teoria e
prática bem como temas diversos (clássicos e modernos),
contextualizando o ensino e, conseqüentemente, tornando-o
significativo para o aluno. São evidentes as dificuldades dos
professores da área de ciências da natureza, em particular da física,
para se atualizarem, tanto em sua área de conhecimento quanto em
questões gerais, relativas à educação acadêmica. O MEC, contudo,
com o apoio de organizações científicas, tem desenvolvido um
conjunto de ações para ampliar as oportunidades de
desenvolvimento profissional dos professores da Educação Básica.
Ainda assim é necessário produzir textos sobre o desenvolvimento
da física, montar laboratórios como recurso de aprendizagem,
utilizar simulação em computadores e estratégias para revitalizar o
ensino dessa disciplina na escola. Recursos diversificados
subsidiariam práticas de ensino mais producentes.
Além dos recursos pedagógicos, a inserção de física moderna
e contemporânea no Ensino Médio seria um expediente a favor de
um ensino de qualidade. Embora haja consenso na comunidade de
professores e pesquisadores da área sobre a importância da física
moderna no nível médio de ensino, existe limitado material didático-
pedagógico para apoiar o professor nesta empreitada.
ALVARENGA [10], afirma que “... ainda há constantes queixas
referentes à quase inexistência de textos escritos, em português,
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sobre Física Moderna experimental, principalmente por parte dos


professores que desejam introduzir atividades experimentais ao
abordarem a Física Moderna”.
Os textos de física moderna para nível superior surgiram na
primeira metade da década de trinta, com a publicação de algumas
obras, hoje, consideradas clássicas. Segundo VENTURA e FARIA
[4], os livros-textos adotados nas escolas de ensino médio,
normalmente, não abordam com destaque esse tema. Faltam, pois,
livros de apoio ao trabalho do professor, oferecendo-lhe material
científico-pedagógico adequado.
Nos últimos anos, as editoras têm lançado livros didáticos de
física para o nível médio que enfatizam o conteúdo de física
moderna, como o de autoria de ALBERTO GASPAR [11],
intitulado FÍSICA, que traz temas como dualidade onda – partícula,
teoria da relatividade restrita, a dilatação do tempo, massa e energia
relativística, nascimento da mecânica quântica, do átomo de
Rutherford ao átomo de Bohr, entre outros. Pode-se citar também o
caderno didático “Noções de Física Moderna para o Ensino Médio”
[5], cujos autores, VENTURA e FARIA, possuem experiência em
ensino médio, no Colégio de Aplicação-COLUNI da UFV. Esses
trabalhos somam-se a outros como o livro didático que, mesmo
considerado bom e atenda aos requisitos básicos, deve ser um entre
outros instrumentos que promovem o ensino de qualidade. Assim,
potenciais autores devem contribuir com métodos e técnicas de
ensino que subsidiem o trabalho docente.
Obviamente, a inclusão de conteúdos modernos precisa ser
conscienciosa, pois, segundo MENEZES [12], novos conteúdos
impõem desafios didáticos e devem levar professores a estudos de
atualização. Há muitas razões para inclusão da física moderna no
currículo do nível médio; mas destacar que os textos escolares são
defasados e que as universidades, além dos conteúdos mais
clássicos, vêm intensificando a cobrança, em seus vestibulares, de
temas modernos são motivações suficientes para inovar os
conteúdos da física. A pesquisa bibliográfica realizada por
OSTERMANN e MOREIRA [13], destaca algumas justificativas
importantes como as necessidades: 1ª) de os estudantes terem
contato com o excitante mundo da pesquisa atual em física; 2ª) de
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reformulação do currículo de física do ensino médio, conforme


apontam os PCN's; 3ª) de inserção da física moderna e
contemporânea nos currículos; 4ª) de atrair jovens para a carreira
científica; 5ª) de disseminar os conhecimentos que a ciência a
tecnologia propiciam à população; 6ª) de esclarecer o estudante
quanto às pseudo-ciências. Os autores também concluem que as
pesquisas desenvolvidas sobre Física estão mais concentradas na
"apresentação de um tema de Física Moderna e Contemporânea'' em
comparação com as pesquisas sobre "concepções alternativas'' e
“propostas testadas em sala de aula”.
GASPAR [14], afirma que o ensino de física nas escolas
brasileiras vem recebendo, há anos, a crítica por não se realizarem
atividades experimentais; o único recurso do professor, segundo esse
autor, tem sido ‘saliva e giz’. O autor ressalta, ainda, que ao aluno
cabe apenas ouvir, copiar e memorizar. Essa prática nada contribui
para um ensino eficaz da ciência física na qual se insere a física
moderna e contemporânea: o ensino deve estimular idéias,
permitindo aos alunos pensar e interpretar o mundo que os cerca. O
cotidiano vivenciado pelos estudantes é fundamental na definição da
forma de abordagem dos conteúdos previamente definidos como
relevantes. Nesse contexto, atividades experimentais ganham
importância.
No atual ensino de física, as atividades experimentais, na
maioria das escolas, raramente fazem parte das aulas, e quando
ocorrem, estão associadas à manipulação de materiais/aparatos,
limitando-se à observação superficial de fenômenos físicos, não
viabilizando a necessária reflexão e as condições para desenvolver o
processo investigativo.
A investigação experimental e científica deve ser estimulada,
não a partir de manuais ou roteiros auto-explicativos, estruturados
segundo uma rígida seqüência de passos, mas a partir de roteiros
abertos, alterando significativamente o papel do professor e do aluno
no processo educativo. O saber do professor deve ser superior ao
que se exige sobre a matéria que se ensina; além disso, ele é o
responsável por lançar desafios, promover debates, provocar no
aluno a insatisfação e o desejo de querer buscar explicações. O
professor é o mediador entre o tranqüilo e a inquietude, entre o senso
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comum e o conhecimento científico. O aluno deve sair da postura


passiva de ouvinte e participar ativamente das aulas, perguntando,
expondo suas idéias, apresentando sugestões para a solução de
problemas.
A idéia não é fazer do aluno um “cientista”, mas
proporcionar-lhe condições de contestar as idéias de senso comum e
construir noções de conhecimento científico. Para isso ele precisa
aprender a planejar e a conduzir suas ações, conforme o
planejamento da atividade. Assim, aluno e professor participam
ativamente de todas as fases do experimento, desde o planejamento e
levantamento de hipóteses, até a elaboração das conclusões. As
atividades experimentais, ainda que demonstrativas, contribuem
significativamente para a motivação do aluno, que é uma das
principais dificuldades enfrentados pelo professor de ciências
físicas.
Os programas de física, em muitas escolas brasileiras,
estruturam-se em blocos tradicionais de conteúdo: mecânica, física
térmica, ondas, óptica e eletromagnetismo que seguem, basicamente,
a seqüência dos capítulos nos livros didáticos. A física desenvolvida
a partir século XX está, pois, de certa forma, excluída. O que se
espera de um ensino que não dialoga com o cotidiano dos alunos?
Para que serve esse ensino? Insistimos: é importante somar aos
conteúdos clássicos, também importantes, o que há de moderno nas
ciências físicas.
PIETROCOLA [15], em relação ao ensino tradicional,
afirma não se estranhar que os alunos esqueçam, após as avaliações,
tudo o que foi aprendido. Para esse autor o que é significativamente
aprendido não é esquecido. O ensino, infelizmente, tem servido
somente para ‘passar de ano’, ou seja, para fazer cumprir os rituais
da escola. As idéias desse autor nos levam a pensar sobre a
quantidade de aparelhos e artefatos atuais, bem como fenômenos
cotidianos que somente são compreendidos à luz de alguns conceitos
da física. Por exemplo, estudo do efeito fotoelétrico a partir da
análise do funcionamento do controle remoto de TV e de aparelhos
de som.
VALADARES e MOREIRA [4], reforçam a necessidade de
se articular a física que se ensina na escola à física do cotidiano
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social do aluno afirmando ser “... imprescindível que o estudante do


segundo grau conheça os fundamentos da tecnologia atual, já que
ela atua diretamente em sua vida e certamente definirá o seu futuro
profissional. (p.359)”, E os autores enfatizam concluindo: “Daí a
importância de se introduzir conceitos básicos da Física Moderna e,
em especial, de se fazer uma ponte entre a física da sala de aula e a
física do cotidiano (p.359-360)”. A importância da física moderna
para entendimento do mundo contemporâneo, bem como a sua
contribuição para a formação do cidadão consciente, participativo, e
modificador da realidade acentuam a necessidade de tais conteúdos
na escola de nível médio.
Há vários tópicos de física moderna que podem ser
abordados no ensino médio como o efeito fotoelétrico, pela sua
importância histórica na ciência do século XX, e pela sua associação
ao funcionamento de vários dispositivos eletrônicos presentes na
sociedade. Os conhecimentos da física moderna são, pois, essenciais
para o cidadão compreender e discutir seu papel na sociedade atual.
Apresenta-se, em anexo, como contribuição para a inovação
do ensino da física, uma adaptação de uma atividade experimental
(possível para o nível médio de ensino) sobre esse conteúdo,
proposta por VALADARES e MOREIRA [4] bem como por
TERRAZAN, HERNANDES e CLEMENT [12]. A fundamentação
teórica dessa prática pode por exemplo parecer difícil de se ensinar,
entretanto, utilizando-se o experimento, o professor poderá levar o
aluno a compreendê-la. Se, no século XX, um dos fatores
responsáveis pela má qualidade do ensino da física foi a falta de
professores com habilitação nessa disciplina, conforme apontam
alguns estudiosos; hoje, podemos dizer que a formação continuada é
uma necessidade para o bom desempenho do professor. Em cursos
de curta duração, por exemplo, que é uma forma de atualização
profissional, o professor poderá encontrar motivação e subsídio
teórico para inovar suas práticas pedagógicas, criando atividades
experimentais que ilustrem a teoria e a tornem clara e
compreensível.
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ANEXO
ROTEIRO BÁSICO PARA ATIVIDADE
EXPERIMENTAL:O EFEITO FOTOELÉTRICO
Objetivos

1. Abordar a Física Moderna no Ensino Médio, num roteiro aberto,


para estimular o envolvimento dos alunos, levando-os a relacionar
conteúdo da física a sua vivência cotidiana.
2. Levantar questões sobre dispositivos eletrônicos de nosso dia-a-
dia, construindo conhecimento sobre o funcionamento das lâmpadas
da iluminação pública (acendimento automático).
3. Articular o mecanismo de acendimento automático das lâmpadas
ao processo de funcionamento das esteiras de supermercados, do
controle remoto de TV, de aparelho de som e do portão eletrônico.
Fundamentação Teórica
1ª Parte
O Efeito Fotoelétrico é observado no processo de iluminação
de uma superfície metálica ou semicondutora com um feixe
luminoso cujos fótons nele presentes estão numa faixa de
freqüência. Assim, parte da energia do fóton incidente emite
elétrons da superfície do metal com uma determinada energia
cinética, ou seja, a radiação incidente possui uma energia mínima,
que depende de cada material, conhecida como função trabalho.
A energia (E) de cada fóton que constitui um feixe de luz é
dada pela relação:
E=hf (Eq. 1)
onde h é a constante de Planck, associada aos fenômenos atômicos e
f a freqüência.
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Figura1 – As faixas do espectro em termos do comprimento de onda λ=c/f, no


qual f é a freqüência, c é a velocidade da luz, aproximadamente 3,0 x108 m/s no
vácuo.

2ª Parte
O dispositivo LDR (resistência dependente da luz) tem um
funcionamento baseado no efeito fotoelétrico. Esse material, quando
exposto ao sol, passa a ter uma resistência elétrica menor, uma vez
que ele passa a se dispor de elétrons livres, devido à ação da luz
incidente. Já na ausência de luz, por exemplo, à noite, a resistência
elétrica desse dispositivo (LDR) aumenta enormemente, uma vez
que faltam elétrons livres.
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Figura 2 – Sensibilidade de um LDR para vários comprimentos de onda da luz


incidente (λ), em que a sensibilidade máxima da resistência do LDR se encontra
na faixa da luz visível (4000 a 7000 Å).

O material base do LDR é o sulfeto de cádmio (CdS), que é


sensível à luz na faixa visível. Para outras aplicações, por exemplo,
na faixa do infravermelho, como no caso do controle remoto de
televisão, é necessário utilizar outros materiais como o arseneto de
gálio.
Podemos verificar a aplicação desse princípio no
funcionamento do sistema de iluminação pública.
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Figura 3 – Esquema da réplica de uma lâmpada de rua durante o dia, onde


a luz solar promove no LDR elétrons ligados a elétrons livres, conforme
indicado. A resistência elétrica do LDR se torna mais baixa e a corrente
elétrica atravessa a bobina, gerando um campo magnético, como se ela
fosse um imã. A chave do relé é então atraída para a posição 2, impedindo
que a corrente elétrica passe pelo filamento da lâmpada.
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Figura 4 – Esquema da réplica de uma lâmpada de rua durante a noite, na


qual a resistência elétrica do LDR é alta, pois a ausência da luz solar
impede a corrente elétrica de atravessar a bobina, que deixa de atuar como
imã. A mola obriga então a chave do relé a retornar para a posição 1,
acionando a lâmpada, que se apagará automaticamente no dia seguinte,
uma vez que o circuito volta à situação mostrada na Fig. 3.

Outras aplicações do efeito fotoelétrico são o controle


automático de portas de elevadores e o de esteira de supermercados.
Nesses casos, um feixe de luz, ao ser interrompido, aciona um
sistema automático que abre a porta do elevador ou movimenta a
esteira.
Material:
Uma réplica de iluminação de rua: lâmpada acoplada a um
relé fotoelétrico (dispositivo LDR, bobina, mola e chave). Ver
figuras 3 e 4.
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Procedimentos:

Observando o funcionamento das lâmpadas da iluminação


pública (acendimento automático):
1. verifique o aparato experimental (réplica de uma lâmpada de
rua) e identifique quais as variáveis/propriedades envolvidas.
2. levante hipóteses sobre os fenômenos físicos envolvidos no
sistema de iluminação.
3. faça um relatório da atividade, descrevendo os fenômenos físicos
observados na atividade experimental e organizando seus
conhecimentos.
A teoria abordada na proposta acima parece difícil de se
ensinar. Por meio de atividade experimental, no entanto, ela torna-se
não apenas mais acessível, mas também mais atraente, envolvendo,
efetiva e sistematicamente, os alunos com os estudos da física
relacionados com seu cotidiano.
A qualidade do ensino depende de muitos fatores. Se alguns
deles fogem da alçada do professor, outros, como a criatividade e
disposição para inovar estão em suas mãos.
O roteiro apresentado, por ser básico e aberto, estimula
professor e aluno a enriquecê-lo com conhecimentos sobre a física,
experiências cotidianas e leituras de mundo que, somados e
repensados em grupo, geram novos conhecimentos. Como se vê, o
professor poderá montar atividades experimentais, a partir de
roteiros básicos, possíveis de serem desenvolvidos conforme a
realidade social e o desenvolvimento acadêmico dos alunos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. BRASIL. LDB : Lei de diretrizes e bases da educação: lei


n. 9.394/96. Apresentação Esther Grossi. 3a. ed. Brasília:
DP&A, 2000.

2. Parâmetros Curriculares Nacionais – Língua Portuguesa:


Ensino Médio. Brasília: MEC, Secretaria do Ensino Médio,
2002. 364p.
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3. TERRAZAN, Eduardo A. A Inserção da Física Moderna e


Contemporânea no Ensino de Física na Escola de 2°
Grau. Caderno Catarinense do Ensino de Física,
Florianópolis, v.9, n.3: p.209-214, dez.1992.

4. VALADARES, Eduardo de C.; MOREIRA, Alysson M.


Ensinando física moderna no segundo grau: efeito
fotoelétrico, laser e emissão de corpo negro. Caderno
Catarinense de Ensino de Física, Florianópolis, v. 21, ed.
especial: p. 359-371, nov.2004.

5. VENTURA, D. R.; FARIA, J. A. Noções de Física


Moderna. Editora UFV, CD-45, 2002.

6. ARRUDA S. M. e FILHO, D. O. T. Laboratório Caseiro de


Física Moderna. Caderno Catarinense de Ensino de Física,
Florianópolis, v. 21, edição especial: p. 390-394, nov.2004.

7. CAVALCANTE M. A. e TAVOLARO C. R. C. Uma


oficina de Física Moderna que vise a sua inserção no
ensino médio. Caderno Catarinense de Ensino de Física,
Florianópolis, v. 21, edição especial: p. 372-389, nov.2004.

8. JUNIOR, João B. de A., A Evolução do Ensino de Física


no Brasil. Revista de Ensino de Física, v.2, n° 1: p. 55-73,
São Paulo, fev.1980.

9. TERRAZAN, Eduardo A.; HERNANDES, C. L.;


CLEMENT, L. Uma Atividade Experimental Investigativa
de Roteiro Aberto Partindo de Situações do Cotidiano. In:
ENCONTRO DE PESQUISA EM ENSINO DE FÍSCA –
EPEF, VIII, 2002, Águas de Lindóia, São Paulo: SBF, junho
2002.
10. http://www.sbfisica.org.br/fne/Vol4/Num2/v4n2a12.pdf#sear
ch=%22Nelson%20Studart%20%22fisica%20moderna%20e
xperimental%22%22
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11. GASPAR, A. Física. Volume único, 1° edição, 2° impressão.


Editora Ática, 2003.

12. MENESES, L.C., Uma Física para o Novo Ensino Médio.


Física na Escola. v. 1, n.1, p.7, out. 2000.

13. OSTERMANN, F.; MOREIRA, M. A. Uma revisão


bibliográfica sobre a área de pesquisa "física moderna e
contemporânea no ensino médio". Investigações em
Ensino de Ciências, v. 5, n. 1, mar. 2001.

14. GASPAR, A. Experiência no ensino da física, 4° edição.


Editora Ática, 1996, 232p.

15. PIETROCOLA, M. Ensino de Física. Florianópolis, UFSC,


2001.

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