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Vôos - Giorgio Gasparro
Vôos - Giorgio Gasparro
VÔOS
GIORGIO GASPARRO
VÔOS
GIORGIO GASPARRO
VÔOS
1ª EDIÇÃO
GIORGIO GASPARRO
COPYRIGHT © 2002 BY GIORGIO GASPARRO
CRÉDITOS
PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO
Âmpel Produções Editoriais
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São Paulo - SP
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REVISÃO
Mônica Hamada
iEditora
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Site: www.ieditora.com.br
02910-000 São Paulo - SP - Brasil
SUMÁRIO
Capa ................................................................ 1
Introdução ......................................................... 7
Egito ............................................................... 12
Palestina .......................................................... 30
Itália ............................................................... 50
Mundo novo...................................................... 69
Quarta capa ...................................................... 79
O homem pode crer sem culpa em qualquer doutrina,
mas se nela um dia perceber confusões e contradições,
tem o dever de indagar para esclarecê-las. Assim dará o
primeiro passo no caminho da perfeição.
INTRODUÇÃO
Voltei a voar.
Enquanto ia pelos tempos, entre imagens fulgentes, atra-
vessando atmosferas diferentes, a percepção penetrava me-
andros da mente à procura de uma precisa explicação destas
muitas fugas.Assim como a pessoa se liberta de coisa inopor-
tuna, conclui que o desejo de evasão no desconhecido, era o
estímulo insistente. Mas o que é explicado de modo simples
causa sempre uma desilusão. Após instantes de branco mne-
mônico, lembrei-me das conclusões passadas ou seja, o por-
que dos “por quês”: as derradeiras deduções convergiam a
uma única inteligência dominante, origem de todas as expli-
cações. Naquela ocasião, pareceu-me pobre e forçada a con-
siderar esta inteligência motor imóvel produtor de efeitos.
Surpreendeu-me a afirmação peremptória de uma imaginá-
ria assembléia. “A explicação da realidade reside na persona-
lidade da inteligência superior”. Estudemo-la e deduzamos.
A afirmação freou o vôo. Desci da alta atmosfera da re-
flexão para uma realidade do tempo passado. Bamboleei como
um papagaio: comecei a distinguir, depois a sentir, enfim pa-
rei sobre a Palestina dos anos romanos.
Notei imediatamente o calor luminoso que queima a
epiderme, o ar denso como algodão nas narinas, entre o pala-
dar e a língua. Embora uma sensação incômoda, não me sur-
preendi: a percepção tinha escolhido bem a comparação, que
VÔOS 31
— Então, um inovador.
— Muito mais, um mestre... assim o chamavam alguns,
porque ensinava com o exemplo além da palavra que chegava
sempre clara na consciência dos ouvintes. Os fariseus o defi-
niram perturbador da ordem porque têm mentalidade limi-
tada pela ortodoxia imóvel dominados pela ignorância tradi-
cional. Os sacerdotes o odiavam e o condenaram pois temiam
a limitação dos seus privilégios e da sua autoridade. Procura
imaginar a impressão, Jehosciu gritar no meio da praça das
colunas com o dedo acusador em direção ao Sinédrio: “Vós
vos proclamais infalíveis e praticardes asneiras históricas; sois
amorosos, porém condenastes ao fogo perpétuo os vosso ir-
mãos; sois legisladores, mas ignorais as leis da natureza que
Deus imprimiu na criação... Todos a sapar o campo, a suar
para merecer o pão cotidiano”. Ele era um revolucionário
destinado ao patíbulo desde o princípio. Os sacerdotes o que-
riam morto, porém sem manchar as mãos de sangue. Em-
purraram a tarefa ao procurador Pôncio Pilatos, o qual não
reconheceu culpa nas respostas do maestro, embora este de-
monstrasse clara indolência em sua própria defesa. Jehosciu
pressentia o seu próximo fim e o aceitava como perfeita con-
clusão para sua vida. Enfim o procurador, habilmente pressi-
onado pelos sacerdotes, temendo o julgamento dos superio-
res, o condenou contra a sua convicção. Como prescrevem as
regras, foi despido, pendurado pelos pulsos, flagelado, escar-
necido, coroado de espinhos pelos algozes, depois vestido de
púrpura com os braços ligados ao “patibulum” (a travessa da
cruz). Sobre o Calvário, foi pregado aos pulsos sobre o
“patibulum”, aos pés sobre a haste. A agonia durou cerca de
três horas; a morte chegou solícita, dando fim aos tormentos
38 G I O R G I O G A S PA R R O
Tudo que ele tinha dito, a julgar das expressões dos vul-
tos, parecia não penetrar na mente dos dois. A flecha com
ponta aguda escorrega sobre o mármore levigado.
O jovem que seguramente tinha renunciado a compre-
ender, encurtou:
— ... E por que nunca aconteceu a um mutilado reaver
o membro perdido?
— Alguém invocou ou imaginou a graça?
Os dois se olharam surpresos: nunca ouviram falar de
uma invocação semelhante. Sabiam dos leprosos, cegos, invá-
lidos e deformados curados, mas de um amputado beneficia-
do pela graça junto à piscina de Siloé, nunca.
— Mas se vocês querem mais, digo-vos: quando acon-
tecerá o milagre do membro mutilado, não aparecerá logo,
mas renascerá lentamente como o rabo à lagartixa. A nature-
za tem as suas exigências...
O jovem, demonstrando impaciência, interveio:
— Convicção, comoção, não explicam o milagre. Este
deve ser anunciado e acontecer na frente dos olhos dos incré-
dulos!
O ancião observou com ostentada ingenuidade:
— Milagre... Por que o mistério? Talvez o pai dos mor-
tais queira-nos curiosos? Como nós podemos entendê-lo e
amá-lo se ele é misterioso?
— O pai ama o filho, deseja que ele cresça em sabedo-
ria, com o exercício da inteligência, todos os dias. O filho, no
empenho diário de acumular experiência, acabará desven-
dando fatos e sentidos ocultos nas profundezas dos tempos,
nos lugares mais distantes. A verdade acaba, como bolha, su-
bindo à tona.
44 G I O R G I O G A S PA R R O
Retornei a voar.
A sensibilidade percebeu um toque indistinto na parte
superior da cabeça. Fiz como o professor de literatura costu-
mava fazer durante a lição: passei e repassei a unha do indica-
dor para afastar a estranha sensação, depois recompus os ca-
belos com a palma da mão.
Todavia, sentir-me livre, suspenso no tempo e no espa-
ço, causa-me sempre uma satisfação semelhante a do aviador
que conduz a sua aeronave dentro ou acima das nuvens e es-
quece-se por momentos de seus limites e de sua máquina.
Bendita semelhança à personalidade divina!
Voando, com os braços abertos, acompanhava os cimos
dos Apeninos. Deixado atrás o Lazio antigo, mantinha à mi-
nha esquerda a ubertosa e ondulada campanha toscana, já dis-
tante da Maremma, espalhada de casas e olivais; à minha di-
reita, a região umbra, montanhosa e recolhida, aqui e acolá
manchada de aldeias coloridas e de traços brancos de riachos
espumosos. Então lembrei o que disse o professor da unha,
um florentino arguto e zombeteiro: “Nestas regiões o povo
cultiva as piores virtudes e os defeitos mais agradáveis, assim
geram santos batalhadores, navegantes visionários, artistas
extravagantes depois ‘capiscuola’ geniais”. Assim porque a
originalidade genial não é somente um produto da combina-
ção genética, mas da magia sugestiva dos lugares. Aqui a
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— Qual é?
— A luxúria violenta, o meu prazer imposto com a for-
ça. Fui estuprador de jovens virgens.
— Que horror!
— Que prazer! — Seguiu a exclamação uma risada hor-
rível.
— Mas tu estás aqui para...
O bárbaro o calou com um vozeirão guerreiro.
— Imagina prostrar a virgem sobre a enxerga, arrancar
a vestimenta como se descasca um fruto tenro, afundar o ros-
to ríspido de barba no vale dos seios, abrir com o joelho
prepotente entre choro e arquejos, o caminho até penetrar a
porta da cidadela, enfim arrancar-lhe o grito da rendição e
daí dominar a submissa...
Então frade Caliga assumiu a antiga postura do centurião
corajoso e tempestou:
— Bárbaro infame, tu estás aqui para purgar a tua besti-
alidade e tu te vanglorias de gestos desonrosos? — Ergueu-
lhe o punho direito como se segurasse um gládio vingativo
— Andarás errante no mundo e nos milênios até quando a
tua mente resplandecer pureza. — Recompôs-se na modés-
tia penitencial. Abaixou a voz:
— Agora sabemos porque vais a Assis: aí terá à tua fren-
te um raro exemplo de amor imaculado entre o Pobrinho e a
jovem Clara. Deles aprenderá o gesto puro e expressivo, as
doces palavras de um límpido sentimento. Por comparação,
terás repugnância do teu passado.
Horst deixou cair a cabeça entre os joelhos, talvez para
não mostrar as lágrimas silenciosas do adulto, agora criança.
Enfim, disse com voz quérula:
VÔOS 57
Próximo livro:
ENTREVISTA
QUARTA CAPA
Vôos
Neste trabalho, o autor manifesta discordância
de alguns eventos julgados históricos e de
crenças religiosas, e deles revela as contradições.
Ele propõe esclarecimentos. Quando isto lhe é
impossível, prova a mortificação, mas não perde
a esperança!
Possui uma fé cerebral que se manifesta sem
formalismos laudativos à Divindade e que tem
como premissa: “Tudo o que existe faz parte de
uma seqüência programada pela Mente superior
movida pelos sentimentos”.
O autor afasta interpretações proféticas ditadas
por mestres fanáticos. Segue o caminho indicado
pelo bom senso para conciliar-se com a razão;
razão que foi dada ao ser quando a Mente
decretou: “... Façamos o homem a nossa
imagem e semelhança.”
Vôos pode ser o princípio de uma explicação
universal que daria início a uma compreensão da
realidade e de seu motivo de ser.