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Zumé

Boletim Eletrônico do Núcleo de Pesquisa e Extensão em História, Filosofia e


Patrimônio (NATIMA), Juazeiro do Norte, vol. 3, nº 1, 2021.

ISSN 2675-0201

PATRIMÔNIO NATURAL E CIÊNCIA: A patrimônio natural e ciência a fim de defender uma “ecologia

DEFESA DE UMA ECOLOGIA INTEGRAL NA integral”, levando em consideração que ela nasceu pelas
inquietações de seu presente. Essa Encíclica se torna atual, pois
ENCÍCLICA “LAUDATO SI’: SOBRE O
tais questões ainda estão vivas em nosso cotidiano, nos discursos
CUIDADO DA CASA COMUM” DE PAPA
da imprensa local, nacional e internacional, nos embates
FRANCISCO políticos e sociais.
Para isso, olhar para a natureza de uma forma diferente
ASSIS DANIEL GOMES não é atrasar a ciência, mas dá-la elementos de uma ética
DOUTOR EM HISTÓRIA PELA UFC ecológica, em prol de sua valorização e manutenção.
Entendendo, assim, que vivemos em uma “sociedade do risco”
(BECK, 2010). Isso é uma posição política e social urgente, haja
INTRODUÇÃO vista que o “cuidado da casa comum” não se restringe a um
grupo, mas a humanidade tendo em vista o seu futuro. Segundo o
Neste trabalho problematizamos quais as relações Papa Francisco (2015), reconhecermos que somos criaturas, que
tecidas pelo papa Francisco na Encíclica “Laudato Si’”, entre fomos criados como a natureza, e que somos natureza, é um
patrimônio natural e ciência a fim de defender uma “ecologia passo importante para tomarmos outros rumos nas relações
integral”. Achamos pertinente pensar nas relações tecidas pelo entre cultura e natureza.
papa Francisco na Encíclica “Laudato Si’” em 2015, entre

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Portanto, consideramos pertinente esse estudo para autor e o seu texto (elementos internos), o seu contexto
pensarmos a ecoteologia do Papa Francisco e como essa sua (elementos externos) e a sua recepção (RICOEUR, 1978). Essa
posição vem agregar mais força aos grupos e movimentos que já abordagem (hermenêutica teológica) nos ajudou a situar o texto
se movimentavam para mudar a forma como o homem se historicamente, detectar as suas particularidades em relação ao
relaciona com a natureza, os seus discursos e suas práticas seu contexto de produção e ao seu consumo (recepção) naquele
predatórias. momento. A hermenêutica ricoeuriana nos possibilita
Em suma, objetivamos analisar as relações, tecidas pelo compreender os elementos existenciais humanos ligados tanto a
papa Francisco na Encíclica “Laudato Si’”, entre patrimônio um coletivo, eu sou no meio de um grupo, como a um indivíduo,
natural e ciência a fim de defender uma “ecologia integral”, como eu sou quando compreendo a mim mesmo. Essas duas vias se
também verificar os elementos da ecoteologia do Papa Francisco ligam e impulsionam pelas significações simbólicas que as dão
e analisar como dialoga com as ciências e as pautas dos sentido.
movimentos sócio-ecológicos. O papa Francisco é o arcebispo argentino Jorge Mario
Bergoglio. Primeiro sacerdote jesuíta que conseguiu chegar ao
Ecoteologia: um outro caminho a seguir grau mais alto da hierarquia da Igreja Católica: ser Papa. A
teologia e a espiritualidade de Santo Inácio (inaciana), fundador
Escolhemos realizar uma pesquisa qualitativa, cuja da Companhia de Jesus, orientam o seu papado, está presente
pesquisa fora de cunho bibliográfico. Para isso, buscamos em suas ações e em sua escrita teológica. Verificamos isso nas
analisar a encíclica Laudato Si’ do Papa Francisco, verificando o

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encíclicas e nas cartas que escreveu desde sua ascensão ao trono mutuamente. Cultivar o amor fraterno não está associado ao ter e
de São Pedro em 2013. dar objetos, mas ao ter e dar amor.
O olhar de Mario Bergoglio se faz mediante um Um dos temas atuais que motivou a atenção do Papa
posicionamento que se direciona para o presente e não para o Francisco e o inquietou, impulsionando a dar luz e caminhos a
passado, de uma tentativa de abertura da Igreja ao mundo - ser seguido pelos católicos, foi a questão ambiental. O problema
objetivo esse firmado pelo Concílio Vaticano II, buscando ambiental é global e é um símbolo dos outros problemas sociais e
dialogar com ele e dar as indicações cristãos para uma vivência econômicos que afetam as várias comunidades espalhadas pelo
mais fraterna e humana. Dialogar com o mundo é reconhecer mundo, que também impactam a Igreja que é formada por ela.
que ele afetou o andamento da Igreja local e universal, haja vista Nesse intuito, a aproximação com os teólogos da libertação e de
que os que a pertence estão imersos em suas comunidades. sua leitura do mundo atual foi feita, pois tal olhar para as
Nessa época de distopia, onde os sonhos parecem ruir e realidades estava associado a uma ação-oração. Isso ajuda a
desmanchar em um pessimismo profundo, alimentando a cultura pensar, concretamente, nas ações pastorais e na diversidade de
da morte, o Papa Francisco nos convida a uma nova forma de cada Igreja diocesana.
viver a vida, a uma espiritualidade que esteja desligado da Para além da Igreja, a Encíclica Laudato Si’ se direciona
cultura do consumo, que retire a sua existência das amarras do para todos os homens de boa vontade, atingindo todo aquele ou
dinheiro e compreenda que ela é mais do que possuir algo. aquela aberta a ouvir sobre os problemas ambientais. Essa
Somos parte da criação, fazemos parte de uma comunidade viva encíclica foi escrita no momento de debate internacional que se
criada por Deus, somos irmãos e temos que nos proteger propunha a diminuição da poluição no planeta. Essa posição

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papal, nos convida a pensar nas futuras gerações, de que a A Encíclica do Papa Francisco Laudato Si’ entrou em
destruição desnecessária dos recursos tendo em vista um contato com uma teologia ecológica que está sendo produzida na
consumo exagerado não pode continuar. América Latina, por exemplo, pelo teólogo Leonardo Boff. Para
Esse hiperconsumismo nos faz esquecer que somos parte Boff (2012), é necessário uma mudança de posição em relação ao
da natureza e que a sua destruição também é a nossa. O uso da uso e abuso dos recursos naturais, respeitando, por exemplo, os
referência da obra do Padre Romano Guardini remete ao um seus limites. Essa mudança radical, “revolução”, permitiria a
cuidado do papa em se colocar no mundo atual, onde a tensão nossa sobrevivência e a preservação da natureza. Segundo ele, “é
entre direita e esquerda se afunilou radicalmente. O papa neste contexto de urgência que formulamos nossas reflexões
constrói o seu discurso por meio de uma terceira via, a que foi sobre a sustentabilidade. São apenas iniciais, sem a pretensão de
seguida por Guardini, um discurso democrático, defendendo o serem conclusivas, mas podem, quiçá, animar a discussão e
fim do autoritarismo e do totalitarismo que no século XXI tomou mobilizar a muitos para apagar o fogo que está consumindo a
novos rostos, faces e práticas. Rossi e Silva (2020) ponderam a Casa Comum” (2012, p.10).
partir de sua leitura da encíclica Laudato Si’ que o papa Enfim, a sustentabilidade está associada ao patrimônio
Francisco nos ajuda a compreender que a ciência e a teologia são cultural, particularmente ao chamado patrimônio natural. A
discursos complementares e não diferentes, que ambos podem educação patrimonial ligada a espiritualidade sobre a ecologia, a
dialogar e ser usados para a promoção do bem coletivo, sua preservação e o seu uso sustenta a revolução defendida pelo
resguardando um elemento fundamental da ética. teólogo Leonardo Boff.

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O teólogo Afonso Murad (2019; 2020) defendeu a América Latina tanto do ponto de vista teórico como
ecoteologia como a ciência da fé, cuja a base dessa mudança metodológico. Para Murad,
radical se associava à espiritualidade dos cristãos. Dessa forma, Podemos considerar a ecologia sob três
perspectivas diferentes e complementares:
não se reduz a um credo, Igreja e doutrina, mas na relação que o ciência, prática social e paradigma[...].
homem tem com a criação de Deus. A promoção de uma Enquanto ciência, a ecologia estuda como
interagem todos os seres que habitam a nossa
educação ecológica não deve ser feita visando apenas à mera Casa Comum (bióticos e abióticos), nas suas
múltiplas e complexas relações de
transmissão do saber científico sobre o meio ambiente, mas interdependência. Como prática e ética social,
construir uma nova forma de relacionamento com ela, no sob o nome de “ecologia” e “movimento
ecológico” se abrigam uma ampla gama de
desenvolvimento de uma espiritualidade que a veja de uma outra pessoas, grupos e instituições que
efetivamente assumem novas posturas em
maneira. Segundo Zwetsch (2008), lutar pela mudança de relação à nossa Casa Comum. Eles promovem
comportamento das pessoas em relação ao uso e abuso dos atitudes individuais, ações comunitárias e
políticas institucionais para reduzir o impacto
recursos naturais é mais complexo que os embates ideológicos do negativo sobre oambiente e estabelecer uma
século XX, por exemplo, entre socialismo e comunismo. nova forma de relação com a comunidade de
vida do planeta, a biosfera. (2019, p.80).
Essa espiritualidade ecológica, que é exemplificada pela
espiritualidade de São Francisco de Assis, nos ajudaria a ver com Na encíclica Laudato Si’ o papa Francisco buscou
mais clareza possíveis caminhos hoje para enfrentar tais esclarecer a sua compreensão de ecologia para ampliar e criar
impasses. Para ele, Leonardo Boff é o criador da ecoteologia na redes de diálogo. Para ele, a “ecologia estuda as relações entre os
organismos vivos e o meio ambiente onde se desenvolvem”

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(2015, p.85). Dessa forma, destaca que ao mencionar o meio nação. Pensando assim, a ecologia tem que destacar o seu caráter
ambiente está levando em consideração as relações entre patrimonial. Para o papa Francisco, “a ecologia envolve também
sociedade e natureza. Compreender dessa forma, ajuda-nos a o cuidado das riquezas culturais da humanidade, no seu sentido
verificar uma correlação entre elas, cujos problemas estão mais amplo” (2015, p.88).
interligados e não separados. Para ele, a crise que vivemos no Para clarificar o termo cultura, destaca que ao se referir a
mundo atual é ambiental e social ao mesmo tempo, ou seja, uma ele não o ligou somente à ideia de monumento do passado, mas
crise socioambiental. Por isso, se quisermos resolvê-la temos também ao dinâmico, ao sentido vivo, a sua ressignificação e ao
que construir uma “abordagem integral para combater a pobreza, seu uso no presente. Essa perspectiva retira o engessamento da
desenvolver a dignidade aos excluídos e, simultaneamente, cultura ligada a ideia de preservação para conectá-la a de
cuidar da natureza” (Papa Francisco, 2015, p.86). sustentabilidade, enfatizando a relação dos dois para construir
Dessa forma, os problemas ambientais, para o referido novos sentidos entre as comunidades e esses patrimônios
pontífice, não se entende isoladamente. Para a formulação de culturais, preservar elementos do passado e transformá-los em
ações que os tencionam resolver se deve analisar os vários meios de sustento para a comunidade que zela pela sua
contextos em que está imerso, por exemplo, os humanos, os permanência. Essa concepção está embasada pela experiência da
laborais e os urbanos. A ecologia não é meramente ambiental, Igreja de Roma que tem como sua responsabilidade vários
mas também social. A ecologia social e institucional impacta as patrimônios culturais e que a sua política patrimonial teve que se
várias dimensões, indo dos grupos sociais locais até as adaptar ao longo de séculos as questões econômicas e sociais,
organizações mais complexas que compõem a estrutura da reinventando-se (dinamicidade) para preservar os seus

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patrimônios e contribuir para a melhoria da renda da população progresso levando em consideração os princípios éticos e
local. humanitários, bem como orientá-lo para a promoção de um bem
Dois elementos são combatidos no texto: o consumismo coletivo e não individual: “a ecologia humana é inseparável da
e o imperialismo cultural. Essa postura não é uma negação da noção de bem comum, princípio este que desempenha um papel
ideia de progresso, mas a compreensão que o progresso está central e unificador na ética social” (Papa Francisco, 2015, p.94).
ligado à ideia de desenvolvimento: “melhoria global na qualidade A ideia de bem comum usada pelo Papa Francisco é uma
de vida humana” (Papa Francisco, 2015, p.89). Tal questão se expectativa para o porvir a partir de sua experiência do presente.
fundamenta na doutrina social da Igreja e na defesa da dignidade Por isso, enfatizou que “não se pode falar de desenvolvimento
da pessoa humana, a ênfase nessa linha teológica se faz devido sustentável sem uma solidariedade intergeracional” (Papa
aos problemas sociais ligados a um progresso desumano, onde Francisco, 2015, p.94). Dessa forma, o estilo de vida atual deve
falta habitação e comida para muitos, por exemplo. O abandono ser repensado se quisermos sonhar em um futuro. Para ele,
desses grupos vuneráveis pelo estado afetam tanto a área urbana O homem e a mulher deste mundo pós-
moderno correm o risco permanente de se
e rural, os serviços essenciais não chegam a esses grupos tornar profundamente individualistas, e muitos
introjetando-os em um mundo do trabalho ilegal, cujo trabalho problemas sociais de hoje estão relacionados
com a busca egoísta de uma satisfação
escravo, a precarização das condições de trabalho e a falta de imediata, com as crises dos laços familiares e
sociais, com as dificuldades em reconhecer o
direito trabalhista destroem a dignidade da pessoa humana. outro. (Papa Francisco, 2015, p.97).
A ecologia deve estar relacionada ao direito à vida, às leis
morais e à natureza. Esses elementos favorecem limitar o

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Dessa forma, pensar a sustentabilidade ecológica se faz nessas questões, destruir as falsas imagens divulgadas sobre o
urgente, mas ligada a uma conversão de perspectiva de vida, a tema, criar uma esfera pública que discuta e defenda essas
saída de um mundo individualista para um mais fraterno e mudanças. Isso se faz necessário pois, “riscos globais criam
coletivo. A sustentabilidade entendida como nutrir e alimentar públicos globalizados; públicos globalizados tornam riscos
nos ajuda a compreender o nascedouro desse conceito ligado ao globais visíveis e políticos” (BECK, 2018, p.167).
campo, ou seja, veio da silvicultura. Essa perspectiva é uma Segundo Boff (2012), não podemos querer um progresso
forma de responder às necessidades do presente olhando para o no presente que impactará a sobrevivência da humanidade no
futuro e preservando a sobrevivência das novas gerações. futuro, essa cultura do imediatismo destrói os recursos existentes
Segundo o sociólogo Beck (2018), para mudarmos tal por meio da ideia de um consumismo exagerado e da cultura do
situação temos que substituir o “nacionalismo metodológico” descarte. Os princípios éticos são descartados tendo como base o
pelo “cosmopolitismo metodológico”, ou seja, o fio condutor que relativismo cultural, a pobreza se aprofunda quando poucos
deveria mover nossas ações, práticas e atitudes é a seguinte embargam poder e dinheiro. Essa postura é uma crise do projeto
premissa: “a nação gira em torno do “mundo em risco”” (BECK, moderno e representa um desvio de seus objetivos primeiros: “os
2018, p.57). Para ele, a metamorfose da sociedade e as mudanças modernos imaginavam que a vocação do ser humano é o
concretas para sairmos de um “mundo em risco” é que os riscos desenvolvimento, em todas as áreas, e que isso se traduz por um
globais, sejam climáticos ou financeiros, fossem manejados pela projeto de progresso ilimitado” (BOFF, 2012, p.70).
comunicação pública. Portanto, dar visibilidade aos riscos A defesa de uma sustentabilidade integradora é um
globais é construir uma sociedade e uma política mais engajada caminho a ser seguido. E o papa Francisco desenvolveu um

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desses caminhos a partir do elo entre sustentabilidade, doutrina olhando como criação de Deus, como uma irmão, já que o
social da Igreja e teologia pastoral. Para ele, homem e ela (natureza) foram criadas pelo mesmo Deus.
Sustentabilidade é toda ação destinada a Isso foi uma forma de lembrar aos cristãos de sua
manter as condições energéticas,
informacionais, físico-químicos que sustentam espiritualidade e que ela o ajudaria a não ficar obcecado pelo
todos os seres, especialmente a Terra viva, a consumo, ou seja, “a espiritualidade cristã propõe um
comunidade de vida e a vida humana, visando
sua continuidade e ainda atender as crescimento na sobriedade e uma capacidade de se alegrar com
necessidades da geração presente e das futuras,
de tal forma que o capital natural seja mantido pouco” (Papa Francisco, 2015, p.128). Para ele, esse caminho nos
e enriquecido em sua capacidade de levaria a uma fraternidade universal, nos conduziria à prática do
regeneração, reprodução e coevolução. (BOFF,
2012, p.107). pequeno caminho do amor como ensinou Santa Teresa de
Lisieux.
Essa definição de sustentabilidade foi incorporada pelo
papa Francisco na encíclica Laudato Si’ que destaca desde o Considerações finais
início que somos parte da criação de Deus, somos parte da
natureza. A posição de São Francisco de Assis, destacada nessa O elo na encíclica do papa Francisco entre patrimônio
encíclica papal, se faz pertinente quando olha para o presente, natural e ciência se faz pela defesa de uma ecologia integral e da
para a natureza - não a vendo como um mero instrumento que promoção de uma educação das novas gerações no uso e para a
pode conseguir satisfazer as suas necessidades materiais, mas a proteção desses recursos. Essa educação, contudo, deve ser

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carregada pela espiritualidade cristã que nos move para olhar o Enfim, consideramos essa encíclica um marco
meio ambiente como criação de Deus, como irmão. importante na Igreja Católica que se coloca em relação a essa
Essa postura não proibiu o seu uso ou discussão propondo uma reflexão para além de credos e posições
instrumentalização para a sobrevivência humana, mas o limita - políticas, isso se fez por meio de um objetivo comum: a
levando em consideração a ética e os valores de respeito e sobrevivência de todos e todas. Esse elemento deve construir
sobrevivência. Limitar a ambição e o hiperconsumismo humano uma solidariedade e fraternidade que promova uma união em
é respeitar e entender que a natureza tem a sua dinâmica, o seu prol do bem comum e de uma espiritualidade ecológica.
ciclo, e quando esse é interrompido toda a harmonia do universo
é prejudicada. Referências
Somos parte dessa natureza, romper e destruir com ela
sem necessidade, visando apenas lucro e ambições pessoais, BECK, Ulrich. Sociedade de risco rumo a uma outra
coloca em risco a sociedade do presente e do futuro. O papa modernidade. São Paulo: Ed.34, 2010.
Francisco nos chama a uma conversão de vida, a uma postura e BECK, Ulrich. A metamorfose do mundo: novos conceitos para
um olhar de amor e cuidado com a casa comum. Essa se faz de uma nova realidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2018.
forma micro, em sua casa, em sua família e em sua comunidade, BECK, Ulrich; GIDDENS, A; LASH, S. Modernização reflexiva:
mas também macro - por meio de políticas públicas (municipais, política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo:
estaduais, nacionais e internacionais) que favorecem um uso Unesp, 1997.
sustentável do meio ambiente.

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BOFF, Leonardo. Sustentabilidade: o que é; o que não é. ZWETSCH, Roberto. Ecologia e espiritualidade: uma reflexão
Petrópolis: Vozes, 2012. missiológica. Estudos Teológicos, ano 48, n.1, 2008, p.64-82.
BOFF, Leonardo. Ecologia, mundialização, espiritualidade. Rio
de Janeiro; Record, 2008.
FOLLMANN, José Ivo (org). Ecologia integral: abordagens
(im)pertinentes. São Leopoldo: Casa Leiria, 2020.
MURAD, Afonso. Da ecologia à ecoteologia: Uma visão
panorâmica. Fronteiras, Recife, v.2, n.1, p.65-97, 2019.
MURAD, Afonso. Ecoteologia: ciência da fé e espiritualidade.
Rev.Pistis Prax. Teol.Pastor, Curitiba, v.12, n.3, 2020, p.519-540.
MURAD, Afonso. O núcleo da ecoteologia e a unidade da
experiência salvífica. Rev.Pistis Prax. Teol.Pastor, Curitiba, v.1,
n.3, 2009, p.277-297.
ROSSI, Luiz Alexandre Solano; SILVA, Alessandra de Fátima.
Diálogos ambientais a partir da Laudato Si’. Caderno
Intersaberes, v.9, n.19, 2020, p.39-46.
RICOEUR, P. O conflito das interpretações: ensaios de
hermenêutica. Rio de Janeiro: Imago, 1978.

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