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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Número do 1.0407.16.001835-1/001 Númeração 0018351-


Relator: Des.(a) Henrique Abi-Ackel Torres
Relator do Acordão: Des.(a) Henrique Abi-Ackel Torres
Data do Julgamento: 16/12/2021
Data da Publicação: 24/01/2022

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO


DE USO PERMITIDO E TRÁFICO DE DROGAS - IRRESIGNAÇÃO
EXCLUSIVA DA DEFESA - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA
ESTATAL NA MODALIDADE RETROATIVA - ACOLHIMENTO - AGENTE
MENOR DE 21 ANOS NA DATA DO FATO - DECLARAÇÃO DE EXTINÇÃO
DA PUNIBILIDADE. Ausente inovação substancial dos fatos narrados no
aditamento à denúncia, o recebimento de tal peça processual não configura
marco interruptivo da prescrição. Decorrido o lapso prescricional entre a data
do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença
condenatória transitada em julgado para a acusação, aniquilado está o
exercício da pretensão punitiva estatal, em face da ocorrência da prescrição
na modalidade retroativa, devendo, portanto, ser declarada extinta a
punibilidade do réu.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.0407.16.001835-1/001 - COMARCA DE


MATEUS LEME - APELANTE(S): DARLAN HELENO VASCONSELOS -
APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de


Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos,
em ACOLHER A PRELIMINAR E DECLARAR EXTINTA A PUNIBILIDADE
PELA PRESCRIÇÃO RETROATIVA DA PRETENSÃO PUNITIVA.

DES. HENRIQUE ABI-ACKEL TORRES

RELATOR

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Tribunal de Justiça de Minas Gerais

DES. HENRIQUE ABI-ACKEL TORRES (RELATOR)

VOTO

Trata-se de Apelação Criminal interposta por DARLAN HELENO


VASCONCELOS contra a respeitável sentença de fls. 237/248v, proferida
pelo MM. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível, Criminal e de Execuções Penais
da Comarca de Mateus Leme/MG, que julgou procedente a pretensão
acusatória e condenou réu, pela prática dos crimes previstos no art. 14 da Lei
nº 10.826/03 e no art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, à pena total de 03 (três)
anos e 08 (oito) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial
semiaberto, e de 176 (cento e setenta e seis) dias-multa, no mínimo valor
unitário.

Nos termos do art. 44 do CP, a sanção corpórea foi substituída por duas
restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviço comunitário e
limitação de fim de semana. Foi concedido, ainda, o direito de recorrer em
liberdade.

A denúncia foi recebida em 11/10/2017 (fl. 79).

Em 24/05/2018 (fls. 138/140), o parquet procedeu ao aditamento à


denúncia, que foi recebido em 29/06/2018 (fl. 141).

De acordo com a aditada exordial acusatória, em 02/04/2016, por volta


de 21h11min, o denunciado portava 01 (um) revólver, marca Taurus, calibre
32, número de série 379159, além de 06 (seis) cartuchos intactos, calibre 32,
da marca CBC.

Ainda segundo o aditamento à inicial, na mesma data, horário e

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local, o denunciado trazia consigo, para fins de traficância, 01 (uma) porção


da substância conhecida como maconha, pesando 1,26g (um grama e vinte e
seis centigramas), sem autorização e em desacordo com determinação legal
ou regulamentar.

Concluída a instrução criminal, foi proferida a sentença de fls. 237/248v,


publicada em 01/06/2020.

Inconformado, o sentenciado interpôs Apelação à fl. 252 e, nas razões


recursais de fls. 267/273, a defesa pugna pelo reconhecimento da prescrição
da pretensão punitiva, pelas penas em concreto aplicadas.

Contrarrazões ministeriais às fls. 275/277, pelo conhecimento e


desprovimento do recurso defensivo. No mesmo sentido, opina a douta
Procuradoria-Geral de Justiça, conforme parecer de fls. 278/280.

É o breve relatório.

ADMISSIBILIDADE

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade e processamento,


conheço do recurso.

PRELIMINAR - DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA

A meu ver, merece acolhimento a preliminar suscitada pela defesa,


relativa à extinção da punibilidade de Darlan, pela prescrição retroativa da
pretensão punitiva.

Conforme se observa dos autos, a denúncia foi recebida em 11/10/2017


(fl. 79) e, mais tarde, o parquet procedeu ao aditamento,

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que foi recebido em 29/06/2018 (fl. 141). A discussão travada nos autos paira
sobre o recebimento do aditamento à inicial, se configura ou não marco
interruptivo da prescrição.

Não obstante os judiciosos argumentos estampados nas contrarrazões


ministeriais e no parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça, entendo
que o recebimento do aditamento à denúncia, in casu, não deve ser
considerado marco interruptivo da prescrição, porquanto ausente
modificação substancial dos fatos descritos.

Conforme se depreende dos autos, os fatos narrados na denúncia e no


aditamento são exatamente os mesmos, apenas se alterando a capitulação
jurídica do art. 28 para o art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, por o Ministério
Público entender que a droga apreendida, em verdade, destinava-se ao
comércio.

Nesses casos, o recebimento do aditamento à exordial não configura


marco interruptivo da prescrição, conforme o sedimentado entendimento do
augusto Superior Tribunal de Justiça:

"[...] 3. Não tendo sido apresentada inovação factual de expressiva monta por
força do aditamento à denúncia - na qual, inclusive, o Parquet estadual,
textualmente, afirmou que "[...] os fatos em nada tenham sido alterados [...]" -
, nos termos da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, o
recebimento daquela peça processual pelo Juízo primevo não representou
marco interruptivo da prescrição. [...]" (STJ - REsp 1.794.147, Rel.(a): Min.(a)
Laurita Vaz, SEXTA TURMA, julgamento em 05/12/2019, publicação da
súmula em 17/12/2019).

"[...] 1. O aditamento da denúncia sem inovação da acusação não interrompe


o prazo prescricional. [...]" (STJ - AgRg no HC 462.206, Rel.(a): Min.(a)
Rogerio Schietti Cruz, SEXTA TURMA, julgamento em 07/05/2019,
publicação da súmula em 06/06/2019).

"[...] 2. O recebimento do aditamento é o marco interruptivo da prescrição


quando há alteração substancial dos fatos anteriormente narrados denúncia,
passando a descrever novo fato criminoso. [...]"

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(STJ - HC 273.811, Rel.(a): Min.(a) Nefi Cordeiro, SEXTA TURMA,


julgamento em 05/04/2016, publicação da súmula em 18/04/2016).

No mesmo sentido, lecionam Alberto Silva Franco e Rui Stoco (2007, p.


608):

"Se o aditamento descrever ilícito novo, o respectivo despacho de


recebimento interrompe a prescrição, mas não altera a prescrição dos fatos
anteriores. Se o aditamento tiver por objetivo apenas corrigir ou esclarecer a
capitulação do crime, sem atribuir ao acusado qualquer novo delito, seu
recebimento não importa em interromper a prescrição. Na hipótese de
aditamento para incluir novo réu, dá-se efeito interruptivo do despacho do
recebimento. (...)" (FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui (Coord). Código
Penal e sua Interpretação: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2007, p. 608).

Logo, ausente descrição de nova conduta criminosa no aditamento à


inicial, narrando-se os mesmos fatos e atribuindo-lhes nova definição jurídica,
não há que se falar em interrupção do prazo prescricional.

Esclarecido tal ponto, como não foi interposto recurso pelo Ministério
Público, aplica-se, ao caso, a disposição do art. 110, §1º, do CP, segundo o
qual, após a sentença condenatória com trânsito em julgado para a
acusação, a prescrição regula-se pela pena aplicada.

Repisa-se que o apelante foi condenado pela prática dos crimes previstos
no art. 14 da Lei nº 10.826/03 e no art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, sendo-
lhe aplicadas as respectivas sanções de 02 (dois) anos de reclusão e 10
(dez) dias-multa e 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão e 166 (cento e
sessenta e seis) dias-multa.

De acordo com o art. 119 do CP, "no caso de concurso de crimes, a


extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente".

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Diante das mencionadas penas privativas de liberdade, vigora o prazo


prescricional comum de 04 (quatro) anos, nos termos do art. 109, V c/c o art.
110, caput, ambos do CP. Contudo, o citado prazo, conforme o art. 115 do
mesmo diploma legal, deve ser reduzido pela metade, na medida em que o
autor era menor de 21 (vinte e um) anos na data do fato.

É certo, pois, que a pretensão punitiva, no caso em apreço, prescreve em


02 (dois) anos.

Tendo em vista o teor do art. 117 do CP e superada a tese de o


aditamento à inicial, in casu, configurar marco interruptivo da prescrição,
percebo que, entre a data do recebimento da denúncia (11/10/2017) e a data
da publicação da sentença condenatória (01/06/2020), transcorreu período
de tempo superior a 02 (dois) anos, razão pela qual deve ser reconhecida a
prescrição retroativa, em relação a ambos os crimes.

Registra-se, por fim, que as penas de multa também estão prescritas,


pois sujeitas ao mesmo prazo das privativas de liberdade, de acordo com o
art. 114, II, do CP.

DISPOSITIVO

Diante do exposto, ACOLHO A PRELIMINAR SUSCITADA e DECLARO


EXTINTA A PUNIBILIDADE de Darlan Heleno Vasconcelos em relação a
ambos os crimes que lhe são imputados, pela ocorrência da prescrição
retroativa da pretensão punitiva estatal, nos termos do art. 107, IV, do CP.

Não há necessidade de expedição de alvará de soltura em favor do


apelante, uma vez que foi reconhecido, na respeitável sentença, o seu direito
de recorrer em liberdade, encontrando-se, portanto, solto nestes autos.

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Sem custas, ante o resultado do julgamento.

É como voto.

DESA. MÁRCIA MILANEZ (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. DIRCEU WALACE BARONI - De acordo com o(a) Relator(a).

SÚMULA: "ACOLHERAM A PRELIMINAR E DECLARARAM


EXTINTA A PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO RETROATIVA DA
PRETENSÃO PUNITIVA"

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