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DIREITOS

DIFUSOS E COLETIVOS

Atualizado até janeiro de 2019

PICON DE CARVALHO
@ 2017-2019 by PICON DECARVALHO

DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS

CARVALHO, Rodrigo Cesar Picon, 1991-

2ª Edição

Janeiro de 2019

1. Direito Difusos e Coletivos. 2. Lei 7.347/85. 3. Código de Defesa do


Consumidor. 4. Lei de Ação Popular.

É proibida a reprodução desta obra, em parte ou totalmente, por meio


eletrônico, mecânico, fotocópia ou de outra forma, sem autorização expressa do
autor, conforme Lei 9610/98.

Copyright © 2017-2019 Rodrigo Cesar Picon de Carvalho


SOBRE O AUTOR

Mineiro da histórica São João del Rei, Rodrigo Cesar Picon de Carvalho
nasceu no ano de 1991. Formou-se em Direito pelo Centro Universitário
Presidente Tancredo de Almeida Neves (UNIPTAN) no ano de 2014, tornando-
se advogado pela Seccional Minas Gerais da Ordem dos Advogados do Brasil no
ano subsequente. É advogado no escritório Carvalho, Monteiro & Simões
Advocacia, sediado no centro histórico da cidade mineira, atuando na área do
Direito Penal, Direito Tributário, Direitos Difusos e Coletivos e nos Métodos
Extrajudiciais de Solução de Conflito (MESCs).

Atualmente, é membro das Comissões da OAB Jovem, de Direitos


Humanos, de Arbitragem e Presidente da Comissão de Esportes, todos da 37ª
Subseção da OAB Minas Gerais, tendo organizado a Delegação que representou
São João del Rei para os Jogos do Advogado Mineiro (JAM) nos anos de 2017 e
2018. É autor de inúmeros textos em sites de renome como o Jus.com.br e o
Canal Ciências Criminais, além de artigos acadêmicos publicados pela Editora
Bonijuris, voltados para o Direito Penal e a Arbitragem.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO

Conforme veremos, a matéria acerca dos Direitos Difusos e Coletivos está


tratada em diversas legislações brasileiras, especificamente na Lei de Ação Civil
Pública, na Ação Popular e no Código de Defesa do Consumidor. As demais
legislações, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei 7.853/89 e o
Estatuto do Idoso trazem redações parecidas consigo mesmas e com as leis
supramencionadas, apenas modificando de forma pontualum ou outro artigo
pontuais para se adequar ao direito difuso ou coletivo a proteção devida pela lei.

Dessa forma, o estudo principal deste trabalho será primordialmente as Leis


de Ação Civil Pública, Ação Popular e o Código de Defesa do Consumidor. As
demais leis existentes que versem sobre direitos difusos e coletivos
trabalharemos um estudo singelo a respeito das diferenças da redação de
proteção dos Direitos Difusos e Coletivos da referida lei com as demais normas
de proteção.

Por fim, é importante salientar que os direitos difusos e coletivos não


existem apenas nas legislações trazidas neste estudo, havendo outras como o
Estatuto do Torcedor (Lei 10.761/03), do Jovem (Lei 12.852/13) e da Igualdade
Racial (Lei 12.288/10) que tratam acerca de direitos transindividuais específicos
para torcedores, jovens e para promover a igualdade racial, por exemplo. Tais
leis, contudo, não trazem mecanismos de defesa de tais direitos, caindo na regra
geral do inciso IV do artigo 1º da Lei de Ação Civil Pública, que estudaremos
oportunamente. Assim, não há necessidade de estudar tais legislações aqui.

Já em relação à Lei de Improbidade Administrativa (LIA), ainda que a


mesma trata, de uma forma ou de outra, sobre direitos difusos e coletivos - uma
vez que o princípio primordial desta lei é defender a probidade administrativa,
direito de todos os cidadãos -, tal estudo é voltado para o campo do Direito
Administrativo, não sendo escopo dos Direitos Difusos e Coletivos.

O estudo das leis presentes no corpo deste trabalho não exaure, portanto, a
matéria Direitos Difusos e Coletivos, eis que a mesma se encontra espalhada por
diversos corpos legislativos distintos. Entretanto, traz (ou tenta trazer) aos
estudantes e operadores do Direito e aos que se interessem pela matéria uma
noção básica da matéria, em relação às normas processuais – e não ao direito
material em si.
MICROSSISTEMA PROCESSUAL
COLETIVO

Cada pessoa possui uma gama gigantesca de direitos previstos na Constituição


Federal ou em legislações esparsas, como a saúde, a educação, o lazer, a vida, a
liberdade e a segurança. Para a defesa de seus direitos, violados na iminência de
violação, a pessoa pode utilizar do Poder Judiciário ou de métodos extrajudiciais
de resolução de conflito.

Alguns direitos, entretanto, não pertencem somente a uma pessoa, e sim toda
a coletividade – sendo que a violação deste direito afeta, diretamente, uma gama
de pessoas. Por exemplo: o transporte público que deixa de passar em um
determinado bairro, ou um lote de uma mercadoria que vem estragada, a
degradação de um rio, dentre outros. Tais situações não afetam somente uma
única pessoa, mas toda a coletividade. Não se consegue, perante o órgão judicial
ou extrajudicial, a proteção integral ao direito da coletividade, uma vez que a
pessoa sozinha não pode defender o direito de terceiros (vedação do artigo 18 do
Código de Processo Civil).

Em outros casos, não há nem como se falar em pleitear a cessação da


violação do direito de forma individual, pois não há como mensurar o direito de
cada pessoa afetada. Imaginemos o exemplo acima, acerca do transporte público
que deixa de passar no bairro denominado “X”. Pode ser afetado não só os
moradores do bairro em questão, mas pessoas que sempre o visitam ou que
gostariam, em um dia qualquer, ir lá conhecê-lo. Da mesma forma, pessoas
moradoras do bairro podem não ser vítimas da violação do direito, pois podem
não usufruírem do transporte público.

Dessa forma, o legislador percebeu que para ter a proteção dos direitos de
uma gama de pessoas por completo era necessário mais que meramente permitir
que a pessoa com o direito violado pleiteasse judicialmente a cessação da
violação do mesmo, pois sabia que isso seria ineficiente. Era necessária uma
forma de defesa dos direitos de forma coletiva, que abarcasse todos aqueles que
tivessem o seu direito violado. Nascia assim a proteção aos chamados direitos
difusos e coletivosou transindividuais.

A proteção aos direitos transindividuais surgiu com a lei 7.347/85, que


delimitou quais eram os referidos direitos, como o patrimônio histórico e cultural
e o direito do consumidor. Ampliado pela Constituição de 1988, a proteção
pertinente aos direitos difusos e coletivos cresceu e consolidou com a edição do
Código de Defesa do Consumidor, que a modificou e consolidou o modelo atual
de proteção de tais direitos.

Após a Constituição de 1988, inúmeros textos legislativos trouxeram à


tona direitos transindividuais passíveis de proteção de uma classe, como o
Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei 7.853/89, o Estatuto do Idoso, o
Estatuto da Igualdade Racial, o Estatuto do Torcedor e o Estatuto do Jovem.

Contudo, a legislação de proteção aos direitos transindividuais acabou


ficando completamente dispersa em diversos textos legais distintos, sendo que
cada lei servia apenas para uma classe específica. Ao mesmo tempo, não existe
um texto que determina como funciona a proteção aos direitos transindividuais,
como um Código Processual. A Lei 13.105/05 até tentou determinar a conversão
da ação individual em coletiva (artigo 333), mas tal determinação foi vetada na
época.

Para evitar que cada processo pertinente a um tipo de ação coletiva tivesse
seu próprio regramento, criou-se o legislador a conexão entre as diversas
legislações, permitindo-se a aplicação de um dispositivo legal de uma legislação
em outro de outra legislação, desde que não seja contrário a este. É o que se
extrai da redação dos artigos 90 do Código de Processo Civil e 21 da Lei de
Ação Civil Pública:

Art. 90. Aplicam-se às ações previstas neste título as normas do Código


de Processo Civil e da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, inclusive no
que respeita ao inquérito civil, naquilo que não contrariar suas
disposições.

Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e
individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que
instituiu o Código de Defesa do Consumidor.

A título de exemplo, a doutrina nos dá o art. 19 da Lei de Ação Popular.


Tal dispositivo legal visa o reexame necessário da sentença de improcedência ou
de carência da ação popular. Nas outras legislações referentes à tutela de direitos
difusos e coletivos, não há tal dispositivo. Todavia, o magistrado poderá utilizar
o art. 19 da Lei de Ação Popular em ações que visam proteger o patrimônio
histórico e cultural (Lei 7.347/85), direitos do consumidor (Código de Defesa do
Consumidor) ou direitos da criança e do adolescente (Estatuto da Criança e do
Adolescente), por exemplo.

Neste sentido:

EMENTA: REMESSA NECESSÁRIA - AÇÃO CIVIL POR ATO DE


IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - ART. 19, DA LEI Nº 4.717/1965 -
APLICAÇÃO POR ANALOGIA - REALIZAÇÃO DE PROCEDIMENTO
LICITATÓRIO ANTES DA OBTENÇÃO DE RECURSOS PARA CUSTEIO
DA DESPESA - ART. 7º, § 2º, DA LEI Nº 8.666/93 - SITUAÇÃO NÃO
DEMONSTRADA - IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS - SENTENÇA
CONFIRMADA NA REMESSA NECESSÁRIA. 1. Em aplicação analógica
do art. 19 da Lei nº 4.717/65, sujeita-se à remessa necessária a sentença de
improcedência proferida em ação civil por ato de improbidade
administrativa. Precedentes do STJ. 2. Não restando comprovada a
realização de procedimento licitatório para aquisição de veículo antes da
obtenção de recursos para custeio da despesa (art. 7º, § 2º, da Lei
nº 8.666/93), tampouco que a receita empregada na aquisição tenha se
originado do convênio celebrado entre o Município de Mirabela e o Estado
de Minas Gerais, impõe-se a improcedência dos pedidos formulados. 3.
Sentença confirmada na remessa necessária.

A tal sistema damos o nome de microssistema processual coletivo. O


microssistema processual coletivo é de suma importância, tendo em vista que
une todas as legislações dispersas referentes à tutela de direitos difusos e
coletivos em uma só, como se fosse um Código próprio, até o legislador
infraconstitucional criar uma legislação que visa abarcar toda a legislação
processual referente aos direitos transindividuais.
Assim, para se estudar os direitos difusos e coletivos é imprescindível que se
tenha em mente o microssistema processual coletivo e a possibilidade de
aplicação de legislações distintas na defesa de qualquer dos direitos difusos ou
coletivos.
PRINCÍPIOS DO PROCESSO
COLETIVO

O processo coletivo possui uma gama de princípios que o norteiam. Tais


princípios são suportes para a construção de um grupo de princípios norteadores
do processo coletivo brasileiro, devido à naturea singular dos direitos
transindividuais. (LIRA, 2012). Tais princípios, contudo, que tais princípios não
invalidam os demais princípios processuais estampidos na Constituição Federal
como garantia fundamental, como o contraditório, a ampla defesa e o devido
processo legal.

Estudaremos, minuciosamente, os principais princípios do processo coletivo


brasileiro:

1) PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DA AÇÃO


COLETIVA

O objeto da ação coletiva não pertence ao autor, mas sim à


coletividade. Dessa forma, o autor não pode dispor da ação coletiva e, se o fizer,
não ocorrerá extinção do processo sem resolução do mérito (artigo 485 do CPC),
mas sim substituição da parte, à luz dos artigos 9º da Lei de Ação Popular e
artigo 5º, § 3º da Lei de Ação Civil Pública.

2) PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DA EXECUÇÃO


COLETIVA

Assim como a ação coletiva, a execução coletiva não pode ser disposta
pelo autor da ação. Uma vez ocorrida a condenação e a sentença não for
cumprida voluntariamente pelo réu, deve ocorrer a execução. Caso o autor da
ação não realize a execução no prazo de 60 (sessenta) dias, deverá fazer o
Ministério Público ou qualquer outro legitimado – este último, excetuando-se no
caso da Ação Popular. É o que determinam os artigos 15 da Lei de Ação Civil
Pública e artigo 16 da Lei de Ação Popular.

3) PRINCÍPIO DO BENEFÍCIO MÁXIMO DA TUTELA


JURISDICIONAL COLETIVA

Determina tal princípio que a coisa julgada coletiva nunca prejudica o


indivíduo, mas apenas o beneficia. Havendo sentença coletiva julgada
improcedente, não afetará as ações individuais, permitindo o seu ingresso com
mesmo pedido e causa de pedir. Entretanto, havendo procedência na ação
coletiva, será beneficiário a vítima e seus sucessores, conforme esculpe o § 3º do
artigo 103 do CDC.

4) PRINCÍPIO DA PRIORIDADE NA TRAMITAÇÃO

Deve o processo coletivo ter tratamento preferencial sobre as ações


individuais, devido à quantidade de pessoas afetadas por este tipo de relação
processual. Não possui previsão legal.

5) PRINCÍPIO DO INTERESSE JURISDICIONAL NO


CONHECIMENTO DO MÉRITO

Lira (2012) leciona que tal princípio aduz que “a extinção do processo
coletivo sem resolução do mérito deve ser evitada, dada a relevância
transindividual do litígio submetido à apreciação judicial.”

Já a jurisprudência pátria define este princípio como sendo:

PROCESSO PENAL. INCIDENTE DE EXCESSO DE EXECUÇÃO.


MICROSSISTEMA DOS DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS. PRINCÍPIO
DO INFORMALISMO E DA PREVALÊNCIA DO JULGAMENTO DO
MÉRITO. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DOS PROCEDIMENTOS
RELATIVOS AO SISTEMA DOS DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS. No
Microssistema Coletivo, já vigia o princípio da primazia do mérito, hoje
incorporado pelo Código de Processo Civil. Trata-se de diretriz que
enfatiza a suplantação da forma, em busca do enfrentamento do mérito.
Esse princípio visa que as formas do processo não sejam excessivas a
ponto de sufocar escopos jurídicos, sociais e políticos. Nesse ponto,
combate-se, claramente, o formalismo exacerbado e desmotivado que
venha a afetar direitos. Tudo isso porque a forma e a técnica devem estar a
serviço da jurisdição. 4.Em outros termos, resguardados o princípio do
devido processo legal e da ampla defesa, a presente ação deve prosseguir,
não sendo razoável que a ausência de qualquer ato processual
impossibilite sua realização, adaptando-se, portanto, ao rito da Ação Civil
Pública, suplantando-se, então, qualquer resquício de prejuízo às partes.

6) PRINCÍPIO DA NÃO TAXATIVIDADE DO PROCESSO


COLETIVO

A legislação processual coletiva permite a possibilidade de impetrar toda


e qualquer ação capaz de propiciar a adequada e efetiva tutela da defesa dos
direitos transindividuais. Apesar da impossibilidade de transformação da ação
individual em coletiva, dado o veto ao artigo 333 do CPC, pode-se impetrar ação
normalmente individual na modalidade coletiva, visando a devida proteção dos
direitos transindividuais.

A título de exemplo, podemos citar a reintegração de posse. Ainda que


tal modalidade de ação existe, em tese, somente na modalidade individual, nada
impede que os legitimados legais possam impetrar tal ação na modalidade
coletiva, pois há dispositivo legal que permite tal modalidade (artigo 83 do
CDC).

Vale mencionar, ao final, que tal princípio não se aplica à Ação Popular,
em virtude da impossibilidade de haver determinação legal que impede que o
particular impede ação coletiva, com exceção da Popular. Igualmente deve ser
aplicado com ressalva aos mandados de segurança e de injunção coletivos, haja
vista que somente o partido político com representação no Congresso Nacional e
o Ministério Público são legitimados para impetração de tais ações coletivas, não
se permitindo que os demais legitimados para impetração da ação coletiva
impetre tais modalidades de ação coletiva.

7) PRINCÍPIO DA MÁXIMA, OU AMPLA, DIVULGAÇÃO DA


DEMANDA COLETIVA

Uma vez impetrada a ação coletiva, deve ser dada ampla divulgação
editalícia, a fim de se tornar conhecido da coletividade acerca da presente ação e
possam intervir no processo como litisconsortes, na forma do artigo 94 do CDC.
8) PRINCÍPIO DA INTEGRAÇÃO DO MICROSSISTEMA
PROCESSUAL COLETIVO

Basicamente, é o princípio que determina a existência do chamado


Microssistema Processual Coletivo, a qual vimos acima. Permite-se tal princípio
que o Código de Defesa do Consumidor e a Lei 7.317/85 (Lei de Ação Civil
Pública) poderão ser aplicados a qualquer tipo de ação de proteção de direitos
transindividuais, desde que não contrarie disposições existentes dentro da
própria legislação.

Para maiores detalhes, vide nossa explanação acima.

9) PRINCÍPIO DA ADEQUADA REPRESENTAÇÃO DA


LEGITIMAÇÃO COLETIVA

A legislação brasileira determina que somente algumas pessoas podem


representar os direitos coletivos da sociedade. O mandado de segurança e de
injunção coletivos, conforme vistos, só podem ser impetrados por partido
político com representação no Congresso Nacional ou o Ministério Público. As
ações civis públicas serão impetradas somente pelos legitimados do artigo 5º da
Lei 7.317/85. A Ação Popular somente será impetrada pelo cidadão no gozo de
seus direitos políticos (artigo 1º, caput, 1ª parte da Lei 4.717/65), não sendo
permitida a sua impetração a órgãos como o Ministério Público. Outras
legislações determinam o seu próprio rol de legitimados, que pouco variam com
a regra geral da Lei 7.317/85 e que são abarcadas pelo microssistema processual
coletivo.

Discute-se, porém, se o Poder Judiciário pode controlar a adequada


representação, permitindo ao juiz o reconhecimento de eventual ilegitimidade
com base na ausência de representação. Há duas correntes, uma defendendo e
outra vedando a possibilidade de controle por parte do Judiciário. A nosso ver,
em virtude do controle da representação ser ope legis, não há que se falar em
controle judicial – com exceção das associações, por determinação legal (artigo
5º, caput, V c/c § 4º da Lei 7.347/85).

10) PRINCÍPIO DA MÁXIMA EFETIVIDADE

Por fim, o Princípio da Máxima Efetividade permite ao juiz a


possibilidade de realização de atos extraordinários na condução do processo
coletivo, em busca da tutela coletiva e não ferindo princípios e garantias
constitucionais e processuais existentes.

Lira (2012) nos explica que o juiz pode, visando a proteção da tutela
coletiva, “a) Instruir o processo de forma mais aguda, livre e ampla do que no
processo individual;b) Operar, quando necessário, flexibilização
procedimental;c) Desvincular-se do pedido ou da causa de pedir”, além de
“alteração do pedido e da causa de pedir garantindo ao réu o direito defesa,
contraditório, mesmo após o saneamento.”

Repita-se: deve o juiz sempre preservar princípios e garantias


constitucionais e processuais existentes. Deve o magistrado, a título de exemplo,
preservar a ampla defesa, o contraditório e o devido processo legal. Se o autor
modificar, p. ex., o pedido, deve o magistrado ouvir a parte contrária.
AÇÃO POPULAR

A Lei de Ação Popular trouxe à legislação brasileira uma nova modalidade de


direitos a se preservar. Antes, ninguém podia defender direitos da coletividade
no Judiciário, nem mesmo o Ministério Público. Na década de 60, para se
preservar os poderes que o cidadão possuem – muito mais do que meramente
votar e ser votado – nasceu a Lei 4.717/65, na qual permitia que o cidadão
questionasse perante o Poder Judiciário sobre atos praticados pela Administração
Pública Direta e Indireta que acabavam por lesionar o patrimônio público. (Vale
salientar acerca da curiosidade de que a Lei de Ação Popular foi promulgada no
ano de 1965, quando o Brasil já se encontrava sob as trevas da Ditadura Militar).
Dessa forma, nasceu a possibilidade de uma pessoa questionar judicialmente a
defesa de um direito da coletividade.

Entretanto, a defesa dos direitos da coletividade efetuados pela Ação Popular


eram mínguos em relação à quantidade de direitos existentes. Não podia o
cidadão questionar a violação de direitos como a saúde, segurança, educação,
dentre outros. O cidadão apenas poderia fiscalizar e questionar os atos da
Administração Pública – evitando, por exemplo, a corrupção -, mas não os
demais direitos existentes da coletividade.

Assim, na década de 80, o legislador infraconstitucional estipulou a Lei


7.347/85, a conhecida Lei de Ação Civil Pública, na qual permitiu que os entes
federados, associações criadas para este propósito, os membros da
Administração Pública Indireta e o Ministério Público – em especial este último
– impetrassem ações de defesa de direitos difusos e coletivos. A Ação Civil
Pública abrangia muito mais direitos que a Ação Popular, mas aquela não
revogou esta, podendo ainda o cidadão interessado pedir judicialmente a
anulação de qualquer ato lesivo contra o patrimônio público.

LEI Nº 4.717, DE 29 DE JUNHO DE 1965

Art. 1º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação


ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do
Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios, de entidades autárquicas, de
sociedades de economia mista (Constituição, art. 141, § 38), de sociedades
mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de
empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou
fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou
concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita
ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito
Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou
entidades subvencionadas pelos cofres públicos.

Ação Popular é um dos principais e maiores instrumentos de cidadania que o


brasileiro possui, eis que ele pode discutir judicialmente a legalidade de atos
praticados por agentes públicos e privados que causem lesão ao patrimônio
público. É um direito fundamental e inviolável, descrito no inciso LXXIII do art.
5º da Constituição Federal.

Qualquer cidadão pode impetrar Ação Popular visando anular atos lesivos ao
patrimônio das entidades dos entes federados (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios), de suas entidades autárquicas (suas autarquias, fundações,
empresas públicas e sociedades de economia mista) – descritas no art. 20 desta
Lei, a qual veremos oportunamente – além de sociedades mútuas de seguro nas
quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas, de
serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou
custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinquenta
por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao
patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de
quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos.
Dessa forma, existindo qualquer ato lesivo ao patrimônio de qualquer uma
dessas entidades poderá ser declarado nulo através da Ação Popular – vale
salientar que os atos que possam ser declarados nulos estão descritos nos art. 2º e
4º desta Lei.

A Constituição Federal, em 1988, aumentou o rol de atos lesivos que poderão


ser anulados através de Ação Popular, como a moralidade administrativa, o meio
ambiente e o patrimônio histórico e cultural. Dessa forma, após o advento da
Carta Magna, a Ação Popular passou a poder anular atos lesivos não só ao
patrimônio público, mas também à moralidade administrativa, o meio ambiente e
o patrimônio histórico e cultural. O patrimônio estético, artístico, histórico ou
cultural já é patrimônio público para efeitos dessa Lei, por ocasião do § 1º deste
artigo, a qual veremos oportunamente. Já a moralidade administrativa e o meio
ambiente não possuem dizeres de sua proteção pelas vias da Ação Popular
descritos nesta Lei, que fica adstrita somente ao patrimônio público – a qual
também ficaremos. Entretanto, vale salientar que desde a promulgação da Carta
Magna de 1988 pode impetrar Ação Popular para defesa da moralidade
administrativa e do meio ambiente também, ainda que a Lei 4.717/65 não tenha
sido modificada.

A Ação Popular, portanto, é uma possibilidade de defesa de direitos difusos e


coletivos (patrimônio público), sendo a primeira a ser criada (vinte anos antes da
Lei de Ação Civil Pública) e sendo a única possibilidade em que o cidadão
comum pode ingressar judicialmente para defesa de um direito difuso ou
coletivo (nas ações das demais leis, há um rol taxativo de legitimados e nenhum
se encontra o cidadão). Atualmente, após o advento da Lei 13.004/14, o
patrimônio público foi acrescentado ao rol de direitos difusos e coletivos do art.
1º da Lei 7.347/85, podendo, assim, ser defendido também por Ação Civil
Pública. Assim, além dos cidadãos, poderão ingressar judicialmente para defesa
do patrimônio público todos os legitimados do art. 5º daquela Lei, como o
Ministério Público, a Defensoria Pública, os entes federados e outros.

É importante ressaltar que pode existir uma Ação Popular e uma Ação Civil
Pública correndo simultaneamente perante o Poder Judiciário, sem que uma seja
declarada extinta sem resolução do mérito por força do art. 485, V do Código de
Processo Civil, por advento de litispendência. O advento de uma, portanto, não é
óbice ao andamento da outra.

É legitimado ativo da Ação Popular todo e qualquer cidadão, que estiver


insatisfeito com a prática de atos lesivos ao patrimônio público (ou aos demais
bens jurídicos descritos pela Constituição Federal). Há, entretanto, uma ressalva:
o art. 1º da Lei 4.717/65 determina ser legitimado ativo o cidadão. Cidadão é a
pessoa que está no gozo de seus direitos civis e políticos. Não é cidadão,
portanto, quem está com os direitos políticos suspensos ou não os possuem, por
ser impedido de votar (para mais detalhes acerca de perda ou suspensão de
direitos políticos, vide art. 15 da Constituição Federal). Da mesma forma, só
poderão impetrar Ação Popular a pessoa física cidadã. Pessoa jurídica não possui
direitos civis e políticos; não é, portanto, cidadã.Assim, não poderá a pessoa
jurídica impetrar Ação Popular – entretanto, o diretor, sócio ou administrador da
pessoa jurídica poderá adentrar normalmente, desde que sejam cidadãos. É o que
desprende da leitura da Súmula 365 do Supremo Tribunal Federal (STF).

A Ação Popular pode ter finalidade preventiva – ocorrida antes da


consumação do ato -, repressiva – depois da consumação do ato, visando a
reparar – e supletiva – quando o cidadão obriga a Administração Pública a atuar.
Nas duas primeiras, a ação dos agentes públicos ou particulares foi comissiva –
ou seja, agiram, e seus atos são lesivos ao patrimônio público. Já a finalidade
supletiva é de caráter omissivo, ou seja, os agentes públicos ou particulares
deixaram de agir quando deveriam e essa omissão é lesiva ao patrimônio
público.

Damos como exemplos os seguintes: a Prefeitura do Município X abre


licitação manifestamente fraudulenta, para que ganhe a empresa Y. Pode o
cidadão interessado impetrar Ação Popular visando a anulação do edital de
licitação, antes que a mesma ocorra, prevenindo o patrimônio público de um
futuro ato que o lesaria (finalidade preventiva). Da mesma forma, caso a
licitação fraudulenta já tenha ocorrido e a empresa Y sagrou-se vitoriosa, pode o
cidadão impetrar Ação Popular visando a anulação do contrato de prestação de
serviço assinado entre a Prefeitura e a empresa, devendo estes repararem o
patrimônio público dos danos ocasionados por seus atos lesivos (finalidade
repressiva). Por fim, seguindo o mesmo exemplo, caso a Prefeitura do Município
X não abra licitação, para que a empresa Y perpetue na prestação de serviços
junto ao Município, pode o cidadão interessado impetrar Ação Popular,
determinando a Prefeitura a abrir licitação.

Por fim, colhemos algumas jurisprudências dos Tribunais de Justiça dos


Estados e dos Tribunais Superiores que discutem o cabimento, ou não, da Ação
Popular.

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL


NO RECURSO ESPECIAL. CABIMENTO DA AÇÃOPOPULAR.
REVOGAÇÃO DA LEI MUNICIPAL QUE SE PRETENDIA ANULAR. NÃO
EXAURIMENTO DO OBJETO DO FEITO. POSSIBILIDADE DE
UTILIZAÇÃO DA AÇÃOPOPULAR PARA PROTEÇÃO DO MEIO
AMBIENTE. 1. "A Lei 4.717 /1965 deve ser interpretada de forma a
possibilitar, por meio de AçãoPopular, a mais ampla proteção aos bens e
direitos associados ao patrimônio público, em suas várias dimensões
(cofres públicos, meio ambiente, moralidade administrativa, patrimônio
artístico, estético, histórico e turístico)" (REsp 453.136/PR, Relator
Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 14/12/2009). Outro
precedente: REsp 849.297/DF, Relator Ministro Mauro Campbell Marques,
Segunda Turma, DJe 8/10/2012. 2. O fato de a Lei Municipal n. 4.437
/1996, logo após a sua edição, ter ido revogada pela Lei Municipal n. 4.466
/1996 não ostenta a propriedade de exaurir o objeto da açãopopular.
Deveras, o autor popular pretende a recomposição do dano ambiental e o
embargo definitivo da obra de terraplanagem, além da invalidação da Lei
Municipal posteriormente revogada. Logo, o processamento da
açãopopular é medida que se impõe. 3. Agravo regimental não provido.
(STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL AgRg no REsp
1151540 SP 2009/0191197-4, Data de publicação: 26/06/2013)

AÇÃO POPULAR PROPOSTA POR PESSOA FÍSICA PARA ANULAR


CLÁUSULAS DE ACORDO COLETIVO DE TRABALHO.
INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. EXTINÇÃO DO PROCESSO.
Consoante inteligência dos arts. 5º, LXXII, da CF e 1º da Lei 4.717/65, são
hipóteses de cabimento da açãopopular: 1) a anulação de ato lesivo ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe; 2) a anulação
de ato lesivo à moralidade administrativa; e 3) a anulação de ato lesivo ao
meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Observe-se que o art.
1º, caput, da Lei 4.717/65, exige como fundamento para a propositura da
açãopopular a ocorrência de lesividade ao patrimônio público; e o
parágrafo 1º do mesmo artigo define patrimônio público como " os bens e
direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico".
Denota-se, assim, que não cabe açãopopular para questionar cláusula de
acordo coletivo ou para combater direito individual e social de natureza
trabalhista criado por instrumento normativo autônomo. A açãopopular é
cabível apenas para combater atos lesivos ao patrimônio das entidades
estatais especificadas no art. 1º da Lei 4.717/65, nele encartados os bens e
direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. Ou
seja, o objeto mediato da açãopopular é sempre o patrimônio das entidades
públicas, não se confundindo com o patrimônio público genericamente
considerado, no qual se incluem os interesses coletivos e individuais
homogêneos de caráter trabalhista. Portanto, conclui-se que norma
coletiva autônoma que estabelece condição laboral, ainda que induza uma
possível violação de direito individual e social trabalhista, não pode ser
combatida pela açãopopular, que não é ferramenta hábil a tutelar qualquer
espécie de direito material coletivo, pois tem um objeto restrito e
legalmente previsto. Os interesses supostamente violados pelas cláusulas
negociadas podem ser questionados e eventualmente revertidos por outros
instrumentos jurídicos; porém não por meio de açãopopular. Em face do
exposto, e reconhecendo, de ofício, a inadequação da via jurídica utilizada,
extingue-se o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 267, IV,
combinado com o art. 295, V, do CPC .... (TST - AGRAVO REGIMENTAL
AgR-Pet 104889120135010038), Data de publicação: 19/06/2015

REEXAME NECESSÁRIO. AÇAOPOPULAR CONSTITUCIONAL.


EXTINÇAO DO PROCESSO SEM RESOLUÇAO DO MÉRITO. NAO
PRESTAÇAO DE CONTAS POR GESTOR PÚBLICO. NAO CABIMENTO
DA AÇAOPOPULAR PARA OBRIGÁ-LO A PRESTAR CONTAS.
MANUTENÇAO, IN TOTUM, DA SENTENÇA RECORRIDA. I- A
AçãoPopular objetiva invalidar comportamentos administrativos
vinculados e discricionários, em princípio ilegais e lesivos aos bens
jurídicos tutelados, não havendo atividade administrativa, não há
possibilidade de impugnar o ato através de AçãoPopular. II- Restaram
demonstradas nos autos a ilegalidade e a imoralidade da omissão do
Administrador, que deixou de prestar contas de sua gestão, relativas aos
períodos especificados, na forma da lei, contudo, este fato, por si só, não
demonstra que a AçãoPopular é o remédio jurídico admissível para obrigá-
lo a prestar contas e a entregar os documentos requeridos. III- Isto posto,
tem-se que o procedimento adotado pelos Requerentes não se amolda à
pretensão deduzida nestes autos. IV- Recurso conhecido e improvido. V-
Jurisprudência dominante dos tribunais superiores. VI- Decisão por
votação unânime. (TJ-PI - Reexame Necessário REEX 201000010019154
PI), Data de publicação: 12/12/2012

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POPULAR. O ATO ADMINISTRATIVO


LESIVO AO PATRIMÔNIO PÚBLICO É PRESSUPOSTO DE
CABIMENTO DA AÇÃOPOPULAR. O AUTOR É SUBSTITUTO
PROCESSUAL DE TODA A COLETIVIDADE. DESNECESSIDADE DE
MAJORAÇÃO DO VALOR DA CAUSA. 1. Impugnado o valor da causa de
R$ 25 milhões, o juiz podia rejeitar ou reduzir. Nunca majorar para R$
128.028.627,41, ainda que este último seja o crédito tributário devido pela
ré/Fundação Cesgranrio. O objetivo da açãopopular é anular ato
administrativo lesivo ao patrimônio público. Como substituto processual de
toda a sociedade, o autor nada vai receber, sendo assim desnecessária essa
majoração. 2. Requerida a nulidade da imunidade de impostos de que
usufruíra a ré/Cesgranrio no período de 2003 a 2007 ( Constituição , art.
150/VI, alínea c), não é extra petita a sentença que deferiu esse pedido e
autorizou o respectivo lançamento (fl. 20). Embora tenha afirmado que ré
"não goza da isenção de contribuições para a seguridade social (art. 195, §
7º)", o dispositivo do julgado autorizou apenas o lançamento dos impostos
naquele período. 3. Não tendo havido ato administrativo concessivo de
imunidade de impostos, a consequência natural disso é o correspondente
lançamento de créditos tributários. Não tem sentido a sentença anular
imunidade inexistente e autorizar o lançamento, porque isso é uma
atividade vinculada e obrigatória da autoridade competente (CTN, art.
142) 4. Provido o agravo retido da ré/Cesgranrio. Provida a apelação
dessa ré para reformar a sentença, ficando extinto o processo sem
resolução do mérito por falta de interesse de agir traduzido na inexistência
de ato administrativo lesivo ao patrimônio público. Não conhecida a
apelação da autora. (TRF-1 - APELAÇÃO CIVEL AC 200834000154772
DF 2008.34.00.015477-2), Data de publicação: 25/04/2014

PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃOPOPULAR.


AUMENTO DA TARIFA DE REPASSE DE POTÊNCIA DA EMPRESA
ITAIPU BINACIONAL. REAJUSTE EXTRAORDINÁRIO DE TARIFA. ATO
POTENCIALMENTE ILEGAL E LESIVO À MORALIDADE
ADMINISTRATIVA. CABIMENTO DA AÇÃOPOPULAR. INÉPCIA DA
INICIAL AFASTADA. 1. Na hipótese vertente, a Juíza a quo extinguiu o
processo sem resolução de mérito, por inépcia da inicial, nos seguintes
termos: "[...] São, portanto, pressupostos da açãopopular, a ilegalidade e a
lesividade do ato impugnado. In casu, o autor não conseguiu demonstrar
nenhum ato ilegal e tampouco lesão aos cofres da União. Os fatos narrados
na inicial demonstram que o autor popular insurge-se contra o aumento da
tarifa de repasse de potência de ITAIPU Binacional, de 12,10% (doze
vírgula dez por cento), autorizado pela Portaria nº 338, de 29.09.2005, do
Ministro da Fazenda, por entender que as distribuidoras de energia
elétrica, concessionárias do serviço público, terão que arcar com o
aumento e não poderão repassar ao consumidor antes do reajuste anual
das tarifas de energia elétrica. Assim, a lesividade do ato, portanto, se
existir, não atingirá o erário público, mas sim o patrimônio de empresas
privadas. O trecho de fl. 09 da inicial deixa claro a situação: ' Da forma
como se sucederam os acontecimentos, é possível inferir que o governo
federal pretendeu beneficiar a Eletrobrás ao autorizar o reajuste da tarifa
de repasse de potência cobrada das distribuidoras - reais prejudicadas pela
manobra da estatal - sob o fundamento de atualização do CUSE, que, frise-
se, foi determinado com o aval de seus conselheiros. [...]" 2. De acordo
com o art. 5º , LXXIII , da Constituição Federal /88, "qualquer cidadão é
parte legítima para propor açãopopular que vise a anular ato lesivo ao
patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural,
ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do
ônus... (TRF-1 - APELAÇÃO CIVEL AC 200534000321411 DF
2005.34.00.032141-1), Data de publicação: 02/08/2013

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO ORDINÁRIA DE


RESPONSABILIDADE PELA PRÁTICA DE ATOS DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA - PREFEITO ELEITO AINDA NÃO EMPOSSADO -
CIDADÃO COMUM - INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA - CABIMENTO
DE AÇÃOPOPULAR. - Nos termos do art. 5º , inc. LXIII , da Constituição
Federal , visando a parte autora, como simples cidadão, a anulação de
atos praticados por Prefeito Municipal em exercício, supostamente lesivos
ao patrimônio do Município, adequada se mostra a propositura da
competente açãopopular, e não de simples ação ordinária. (TJ-MG -
102490800272720011 MG 1.0249.08.002727-2/001(1)), Data de
publicação: 25/08/2009

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE


DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA
PROPOSTA PARA IMPUGNAR TODO E QUALQUER ATO DE
ASSESSORIA JURÍDICA PRESTADA POR MILITAR. AUSÊNCIA DE
LESÃO A INTERESSE INDIVIDUAL. TUTELA DE INTERESSE
COLETIVO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CABIMENTO DA
AÇÃOPOPULAR. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO
MÉRITO. MANUTENÇÃO. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA.
PREQUESTIONAMENTO. REDISCUSSÃO DE MATÉRIA. 1. A omissão,
uma das hipóteses de cabimento dos embargos declaratórios, somente se
configura quando o acórdão recorrido não aprecia ponto relevante sobre o
qual deveria ter se pronunciado. 2. Inexistência de qualquer omissão no
acórdão embargado. Apreciação da matéria pela E. 1ª Turma.
Manifestação expressa sobre o não cabimento da ação anulatória na
presente hipótese, entendendo ser o caso do manejo da açãopopular. 3.
Embargante que ao insistir no cabimento da ação em tela, ao argumento de
que não houve lesão ao patrimônio público a autorizar a açãopopular, visa,
apenas, rediscutir as questões já sobejamente decididas pela Turma
julgadora. 4. Embargos de declaração conhecidos e improvidos. (TRF-5 -
Embargos de Declaração na Apelação Civel AC 424839 CE
0011048172006405810001), Data de publicação: 27/05/2010

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO ANULATÓRIA
PROPOSTA PARA IMPUGNAR TODO E QUALQUER ATO DE
ASSESSORIA JURÍDICA PRESTADA POR MILITAR. AUSÊNCIA DE
LESÃO A INTERESSE INDIVIDUAL. TUTELA DE INTERESSE
COLETIVO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CABIMENTO DA AÇÃO
POPULAR. IMPOSSIBILIDADE DE FUNGIBILIDADE. EXTINÇÃO DO
PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO POR AUSÊNCIA DO
BINÔMIO INTERESSE-ADEQUAÇÃO. MANUTENÇÃO. 1. A açãopopular
é o meio processual a que tem direito qualquer cidadão que deseje
questionar judicialmente a validade de atos que considera lesivos ao
patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao
patrimônio histórico e cultural (art. 5º , LXXIII , da CF/88 ). 2. Hipótese
em que a autora ingressou com ação "declaratória" de nulidade, pugnando
pela anulação in abstrato de todo e qualquer ato de assessoria jurídica
praticado por militar. Pleito que, em verdade, se afeiçoa como tendo sido
formulado em defesa de interesses da coletividade. Ausência de qualquer
lesão a interesse pessoal da autora, passível de defesa pela via da ação
anulatória. 3. Existência no ordenamento jurídico da açãopopular, que visa
justamente assegurar ao cidadão seu direito subjetivo ao chamado
"governo honesto", que deve gerir a coisa pública, zelando pela estrita
observância dos princípios da legalidade e da moralidade. 4.
Impossibilidade de se admitir a fungibilidade entre as referidas ações, em
razão do rito diferenciado e dos requisitos específicos da açãopopular. 5.
Ainda que se tratasse de ação individual, haveria falta de interesse de agir,
posto que o propósito da autora, de puro inconformismo com a prestação
de assessoria jurídica por militares, não satisfaz o binômio necessidade-
adequação para a ação anulatória. 6. Apelação improvida. (TRF-5 -
Apelação Civel AC 424839 CE 0011048-17.2006.4.05.8100), Data de
publicação: 15/04/2010

§ 1º - Consideram-se patrimônio público para os fins referidos neste


artigo, os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou
turístico.

O § 1º do art. 1º desta Lei determina que o patrimônio público na qual há


menção no caput abrange, além dos bens de direito de valor econômico, os de
valor artístico, estético, histórico e turístico. Dessa forma, pode-se impetrar Ação
Popular questionando a nulidade de um ato lesivo não apenas ao patrimônio
econômico das entidades descritas no caput, mas também do patrimônio
artístico, estético, histórico ou turístico. Por exemplo, caso o chefe do Executivo
municipal, estadual ou federal resolva derrubar uma igreja histórica para
construção de uma escola, pode o cidadão interessado pedir a anulação desta
derrubada, tendo em vista que o patrimônio histórico está sendo violado.

§ 2º Em se tratando de instituições ou fundações, para cuja criação


ou custeio o tesouro público concorra com menos de cinquenta por cento do
patrimônio ou da receita ânua, bem como de pessoas jurídicas ou entidades
subvencionadas, as consequências patrimoniais da invalidez dos atos lesivos
terão por limite a repercussão deles sobre a contribuição dos cofres
públicos.

Determina o § 2º do art. 1º desta Lei que a Ação Popular que visa anular ato
lesivo praticado por instituição ou fundamento cuja criação ou custeio o Tesouro
Nacional só tenha concorrido para valor inferior a 50% (cinquenta por cento) do
patrimônio ou da receita anual – assim como as pessoas jurídicas ou entidades
subvencionadas – as consequências da anulação dos atos lesivos em seus
patrimônios terá como limite a repercussão destes sobre a contribuição dos
cofres públicos.

Damos o exemplo de uma fundação qualquer que o Estado A detenha 20%


(vinte por cento) do patrimônio ou arque com o mesmo percentual em receita
anual. Esta pratica um ato lesivo, a qual foi anulado pela Ação Popular. A
consequência da anulação deste ato deverá ser de 20% (vinte por cento), eis que
será o que recaiu sobre a contribuição vinda dos cofres públicos.

§ 3º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o


título eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.
Determina o § 3º do art. 1º desta Lei que a prova da cidadania, para efeitos
do caput, ocorrerá com a demonstração do Título de Eleitor do autor, ou outro
documento correspondente a este. É a forma mais fácil de se comprovar que a
pessoa é cidadã, uma vez queo Título de Eleitor presume que o seu portador
possa votar – sendo, portanto, cidadão.

§ 4º Para instruir a inicial, o cidadão poderá requerer às entidades, a


que se refere este artigo, as certidões e informações que julgar necessárias,
bastando para isso indicar a finalidade das mesmas.

§ 5º As certidões e informações, a que se refere o parágrafo anterior,


deverão ser fornecidas dentro de 15 (quinze) dias da entrega, sob recibo, dos
respectivos requerimentos, e só poderão ser utilizadas para a instrução de
ação popular.

§ 6º Somente nos casos em que o interesse público, devidamente


justificado, impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informação.

§ 7º Ocorrendo a hipótese do parágrafo anterior, a ação poderá ser


proposta desacompanhada das certidões ou informações negadas, cabendo
ao juiz, após apreciar os motivos do indeferimento, e salvo em se tratando
de razão de segurança nacional, requisitar umas e outras; feita a requisição,
o processo correrá em segredo de justiça, que cessará com o trânsito em
julgado de sentença condenatória.

Para facilitar a comprovação do alegado na Ação Popular, permite o § 5º


do art. 1º desta Lei que o cidadão interessado poderá requerer acesso a todas as
certidões ou informações que entender ser necessárias existentes em órgãos
públicos ou particulares, que deverão prestar no prazo de quinze dias. Entretanto,
caso haja interesse público em haver sigilo de tal informação – devidamente
justificado e comprovado – poderá ser negada a certidão ou importada.

Neste caso, o cidadão impetrará Ação Popular sem que haja a certidão ou
informação, onde o juiz requisitará às autoridades competentes o devido acesso –
exceto se a negativa for por ocasião de segurança nacional. Neste caso, além de
requisitar o acesso às certidões e informações, o juiz decretará segredo de
justiça, na qual cessará no trânsito em julgado da sentença condenatória.

É importante salientar que somente a Lei 7853/89, em seu art. 3º, § 4º,
determina o segredo de justiça do processo onde o juiz requisitar certidões e
informações. Nas demais legislações que tratam da matéria Direitos Difusos e
Coletivos, tal situação é omissa – dessa forma, não se aplicam a estas
legislações.

Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades


mencionadas no artigo anterior, nos casos de:

a) incompetência;

b) vício de forma;

c) ilegalidade do objeto;

d) inexistência dos motivos;

e) desvio de finalidade.

Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade


observar-se-ão as seguintes normas:

a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas


atribuições legais do agente que o praticou;

b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta


ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do
ato;

c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa


em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo;

d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou


de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou
juridicamente inadequada ao resultado obtido;

e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato


visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra
de competência.

O art. 1º da Lei 4.717/65 determina quais as entidades que poderão ter seus
atos anulados pela Ação Popular quando estes forem lesivos aos cofres públicos.
Já o art. 2º especifica quais são os atos considerados lesivos, para que se possam
ser anulados pela dita ação.

Segundo o referido artigo, são nulos os atos quando houver: incompetência;


vício de forma; ilegalidade; inexistência dos motivos e desvio de finalidade. Já o
seu Parágrafo Único explica o que exatamente é cada uma das situações
descritas no caput. Para o referido parágrafo, ocorrerá a incompetência quando o
ato não se incluir nas atribuições dadas pela lei ao agente que o praticou. Por
exemplo: o Secretário de Turismo aumenta o valor da passagem de transporte
público municipal, quando a legislação do Município em questão determina que
a capacidade é privativa do Prefeito.

Já o vício de forma ocorre quando o agente que pratica o ato se omite ou


inobserva de praticar formalidade indispensável à existência ou validade daquele
ato. Utilizando como exemplo o descrito no parágrafo anterior, se a legislação
municipal determina que, para aumentar a tarifa do transporte público, o Prefeito
deve ter um pequeno processo iniciado pela companhia de ônibus, que passará
ao Conselho Municipal do Transporte e ao Secretário de Transporte que poderão
barrar o aumento, ou não, para enfim o Prefeito decidir se haverá o aumento,
caso o chefe do Executivo pule a oitiva do Conselho Municipal do Transporte,
houve a inobservância de formalidade indispensável à validade do ato, sendo o
mesmo, portanto, nulo.

A ilegalidade do objeto ocorrerá quando o resultado do ato importa em


violação de lei, regulamento ou ato normativo. Ocorre a ilegalidade do objeto,
por exemplo, quando o chefe do Executivo contrata com uma companhia privada
qualquer, para esta realizar um serviço público, sem observar a necessidade de
processo licitatório ou a dispensabilidade do mesmo.

Como sabemos, todos os atos da Administração Pública devem haver


motivos para o mesmo, sob pena de nulidade. Caso os motivos não se adequem à
realidade ou forem judicialmente inadequados à realidade será o ato nulo de
pleno direito. Por exemplo, o chefe do Executivo desapropria uma fazenda em
péssimas condições para preservação do patrimônio histórico e cultural;
entretanto, a fazenda não é considerada patrimônio histórico, tendo em vista ter
sido construída menos de vinte anos. Tal ato de desapropriação pode ser
decretado nulo pela Ação Popular.

Por fim, determina a última alínea deste Parágrafo Único que será nulo o ato
praticado quando o agente praticar um ato e visar um fim diverso daquele
previsto na regra de competência. Dado o exemplo acima, podemos citar o fato
de a fazenda em péssimas condições ser, de fato, patrimônio histórico e cultural
da região. Todavia, a intenção do chefe do Executivo ao desapropriar é construir
um hotel-fazenda e lucrar com o mesmo, angariando fundos para a Prefeitura
falida. Ainda que bem intencionado, não pode o Prefeito realizar tal conduta,
tendo em vista que a finalidade da desapropriação foi preservar o patrimônio
histórico, e não construir um hotel-fazenda.

Vale salientar a discussão sobre a necessidade do ato impugnado ser ilegal ou


não. Gonçalves (2012, p. 44) explica que:

Embora predomine o entendimento de que seja indispensável (arts. 2º e


3º da LAP), parece-nos que a Constituição Federal não o exige. O art. 5º,
LXXIII, protege não só o patrimônio público, mas a moralidade. Esta é
muito mais ampla que a legalidade. É possível que um ato administrativo
não ofenda diretamente a lei, mas seja incompatível com as regras gerais
que devem reger a Administração.

Contudo, entendemos que tal pensamento não deve prosperar. Ora, a


moralidade é um dos princípios basilares da Administração Pública (artigo 37,
caput, CF). Violá-la significa violar a lei. Assim, todo o ato impugnado viola
diretamente a lei ou os princípios básicos da Administração Pública – violando-
se indiretamente a lei.

Art. 3º Os atos lesivos ao patrimônio das pessoas de direito público ou


privado, ou das entidades mencionadas no art. 1º, cujos vícios não se
compreendam nas especificações do artigo anterior, serão anuláveis,
segundo as prescrições legais, enquanto compatíveis com a natureza deles.

O art. 2º da Lei 4.717/65, conforme vimos, delimita quais são os atos lesivos
ao patrimônio público que são nulos – ou seja, nunca produzem efeitos e não se
convalida com o tempo. Já o art. 3º determina que os atos lesivos não descritos
neste artigo são anuláveis – produzindo efeitos até a decretação da nulidade e
podendo se convalidar com o tempo, conforme a legislação brasileira e a
compatibilidade com a sua natureza. Portanto, todos os atos lesivos não descritos
no artigo precedente serão passíveis de anulabilidade, produzindo efeitos até a
decretação da nulidade – exceto se o magistrado decretar suspensão liminar, nos
fulcros do § 4º do art. 5º desta Lei - e podendo se convalidar no tempo.

Art. 4º São também nulos os seguintes atos ou contratos, praticados


ou celebrados por quaisquer das pessoas ou entidades referidas no art. 1º.

O art. 4º da Lei 4.717/65 delimita outros atos praticados ou contratos


celebrados pelas entidades descritas no primeiro artigo desta lei que, em
complemento ao art. 2º, também são nulos, igualmente não produzindo efeitos
quaisquer e não se convalidando no tempo – é, portanto, uma exceção ao artigo
precedente.

I - A admissão ao serviço público remunerado, com desobediência,


quanto às condições de habilitação, das normas legais, regulamentares ou
constantes de instruções gerais.

A Carta Magna de 1988 determinou, em seu art. 37, inciso II, que somente se
admitirá no serviço público aquele que tiver sido aprovado em um concurso de
provas e títulos, com exceção dos cargos ad nutum ou eletivos. Se alguém, não
aprovado no concurso de provas e títulos, adentrar no serviço público em cargo
remunerado que não seja de livre nomeação e exoneração ou eletivo, estará em
discordância com a lei. Da mesma forma, estará em discordância com a lei
aquele que nomear a pessoa não aprovada no concurso de provas e títulos. Tal
nomeação é, para os fins do inciso I do art. 4º da Lei 4.717/65 nula, não
produzindo efeitos quaisquer e podendo, tanto o agente público que nomeou
quanto o que adentrou no serviço público, serem réus em Ação Popular, que
decretará a anulação da nomeação indevida.

II - A operação bancária ou de crédito real, quando:

a) for realizada com desobediência a normas legais, regulamentares,


estatutárias, regimentais ou internas;

b) o valor real do bem dado em hipoteca ou penhor for inferior ao


constante de escritura, contrato ou avaliação.

Determina o inciso II do art. 4º desta Lei que será considerada nula quando
operação bancária ou de crédito real (hipoteca, penhor ou anticrese) quando
desobedecer a norma mandamental ou quando o valor dado em hipoteca ou
penhor for inferior à escrita, contrato ou avaliação. Assim, se um agente privado
dá em hipoteca uma casa no valor de R$ 100 mil para um empréstimo de R$ 1
milhão, será este contrato nulo de pleno direito.

III - A empreitada, a tarefa e a concessão do serviço público, quando:

a) o respectivo contrato houver sido celebrado sem prévia


concorrência pública ou administrativa, sem que essa condição seja
estabelecida em lei, regulamento ou norma geral;

b) no edital de concorrência forem incluídas cláusulas ou condições,


que comprometam o seu caráter competitivo;

c) a concorrência administrativa for processada em condições que


impliquem na limitação das possibilidades normais de competição.

Determina o inciso III do art. 4º que a empreitada, tarefa ou concessão de


serviço público será decretada nula quando o agente privado e a pessoa jurídica
de direito público assinarem um contrato sem prévia concorrência pública ou
administrativa, ou sem que a dispensa da licitação tenha ocorrido por fato
descrito em lei ou regulamento. Também será nula quando o edital de licitação
ou a concorrência administrativa ocorram em condições que impliquem na
limitação, ou que comprometa o caráter competitivo.

São exemplos de situações descritas no inciso III deste artigo: o Prefeito do


Município X assina um contrato com a empresa Y para transporte de passageiros
no município em questão. Entretanto, o Prefeito não abriu licitação para que
possa analisar se a empresa Y era a que prestaria o melhor serviço pelo melhor
preço; ou, aberta a licitação, colocou cláusulas de barreira de forma que somente
a empresa Y participasse da licitação – a título de exemplo, o uso de rodas A nos
ônibus; patrimônio de, no mínimo, R$ 1 milhão e frota de 10 mil ônibus;
requisitos estes que somente a empresa Y, na região, possui.

IV - As modificações ou vantagens, inclusive prorrogações que forem


admitidas, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos de
empreitada, tarefa e concessão de serviço público, sem que estejam previstas
em lei ou nos respectivos instrumentos;

Em consoância ao inciso precedente, ordena o inciso IV do art. 4º desta Lei


que, se o agente público conceder vantagens ou modificações contratuais, em
favor do adjudicatário sem a previsão legal ou contratual, será esta nula de pleno
direito. Podemos utilizar o exemplo do inciso anterior. Caso o Prefeito do
Município, vencido o prazo de licitação – de quinze anos, por exemplo -,
prorrogar o período por mais quinze anos sem previsão de prorrogação em lei ou
no contrato assinado entre as partes, estará cometendo ato lesivo, que poderá vir
a ser decretado nulo pela Ação Popular. Da mesma forma, caso o mesmo
Prefeito conceda, a título de exemplo, material para concessão do transporte
público municipal – rodas, motor, combustível, mão de obra – ou isenção de
impostos – sem ambos estarem sob a previsão legislativa ou contratual –,
também estará cometendo ato lesivo capaz de ser decretado nulo pela Ação
Popular.

V - A compra e venda de bens móveis ou imóveis, nos casos em que


não cabível concorrência pública ou administrativa, quando:

a) for realizada com desobediência a normas legais, regulamentares,


ou constantes de instruções gerais;

b) o preço de compra dos bens for superior ao corrente no mercado,


na época da operação;

c) o preço de venda dos bens for inferior ao corrente no mercado, na


época da operação.

O art. 17 da Lei 8.666/93 determina quando é possível a dispensa de licitação


para compra e venda de bens da Administração Pública. Caso o agente público
venda ou compra um bem móvel ou imóvel sem atentar às regras daquele artigo,
estará cometendo ato lesivo nulo de pleno direito, por força da alínea a do inciso
V do art. 4º desta Lei.

Da mesma forma, caso o agente público compre um bem com valor superior
ao mercado ou venda abaixo do mercado, também estará cometendo ato lesivo,
tendo em vista que está violando o patrimônio público em vantagem ilegal à
pessoa jurídica de direito privado.

VI - A concessão de licença de exportação ou importação, qualquer


que seja a sua modalidade, quando:

a) houver sido praticada com violação das normas legais e


regulamentares ou de instruções e ordens de serviço;

b) resultar em exceção ou privilégio, em favor de exportador ou


importador.

Atualmente, não se exige mais a licença prévia para exportação ou


importação de mercadorias ou serviços, excetuando-se os casos previstos na
Portaria CESEX 23/2011. Nestes casos, a licença para exportar ou importar não
pode contrariar a portaria supramencionada, nem outra norma do Direito
brasileiro, nem conceder nenhum tipo de privilégio ou exceção ao importador ou
exportador – a menos que seja por ocasião de regra geral, com efeitos erga
omnes, pois assim não viola a isonomia, a imparcialidade e a impessoabilidade.

VII - A operação de redesconto quando sob qualquer aspecto,


inclusive o limite de valor, desobedecer a normas legais, regulamentares ou
constantes de instruções gerais.

Operação de Redesconto é uma “operação de compra, com compromisso de


revenda de títulos públicos federais registrados no Selic. A operação de
redesconto é concedida a exclusivo critério do Banco Central do Brasil, por
solicitação das instituições financeiras. Essa modalidade de operação tem suas
características como prazo, taxas, etc. definidas na Resolução 2.949, de
4/4/2002”[1]. Caso esta operação estiver, sob qualquer aspecto, fora das normas
legais, regulamentares ou escritas em regras gerais, será nula de pleno direito,
podendo ser anulada por Ação Popular.

VIII - O empréstimo concedido pelo Banco Central da República,


quando:

a) concedido com desobediência de quaisquer normas legais,


regulamentares, regimentais ou constantes de instruções gerais:

b) o valor dos bens dados em garantia, na época da operação, for


inferior ao da avaliação.

Em consoância aos incisos precedentes, ordena o inciso VIII do art. 4º da Lei


4.717/65 que o empréstimo feito pelo Banco Central da República (Bacen)
quando concedido em desobediência às normas legais, regulamentares,
regimentares ou existentes em instrução geral; ou quando o bem dado em
garantia (anticrese, hipoteca ou penhor) for inferior ao da avaliação. Assim como
nos incisos precedentes, são formas de se anular atos lesivos ao patrimônio
público seja pela ilegalidade do ato, seja pelos danos patrimoniais causados pelo
mesmo.

IX - A emissão, quando efetuada sem observância das normas


constitucionais, legais e regulamentadoras que regem a espécie.

Em concordância aos artigos precedentes, determina o último do art. 4º que a


emissão, se estiver em desconformidade das normas constitucionais, legais ou
regulamentadoras, será nula de pleno direito, podendo ter a nulidade decretada
através da Ação Popular.

DA COMPETÊNCIA

Art. 5º Conforme a origem do ato impugnado, é competente para


conhecer da ação, processá-la e julgá-la o juiz que, de acordo com a
organização judiciária de cada Estado, o for para as causas que interessem
à União, ao Distrito Federal, ao Estado ou ao Município.

Determina o art. 5º da Lei 4.717/65 qual o foro competente para processar e


julgar a Ação Popular. Como todos sabemos, a competência primordialmente é
delitimada pela matéria da ação respectiva, em relação às Justiças especializadas
– Militar, Eleitoral e Trabalhista. Toda ação que pertencer a estas três matérias e
não for competência do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de
Justiça (arts. 102 e 105, respectivamente, da Constituição Federal), será
processada por estas Justiças.

O restante será processada pela chamada Justiça Residual, que se


divide em Justiça Federal e Justiça Estadual. Quem determina qual a
competência da Justiça Federal é o art. 109 da Carta Magna – incluindo as ações
em que tiver interesse da União. Assim, o que não for competência de nenhuma
das Justiças Especializadas nem da Justiça Federal é, automaticamente,
competência da Justiça Estadual, que processa ações de indenização, ações na
área de Família e Sucessões, processos criminais – exceto os de competência da
Justiça Militar ou Federal, dentre outros.

Já dentro das Justiças Especializadas ou Residual, será competente a


Comarca ou Subseção Judiciária conforme a regra de competência estipulada no
Código de Processo Civil, em seus art. 42 e ss., sendo que as Comarcas e
Subseções Judiciárias são divididas de acordo com a organização judiciária do
ente responsável (Estados e União, respectivamente).
Dessa forma, seguindo o parâmetro esculpido acima, determina o art. 5º
desta Lei que a Comarca competente para processar e julgar a Ação Popular será
aquela que a organização judiciária determinar que é competente para processar
e julgar ações da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios,
dependendo de qual deles for o réu ou em qual ente federado o mesmo estiver
vinculado.

§ 1º Para fins de competência, equiparam-se atos da União, do


Distrito Federal, do Estado ou dos Municípios os atos das pessoas criadas ou
mantidas por essas pessoas jurídicas de direito público, bem como os atos
das sociedades de que elas sejam acionistas e os das pessoas ou entidades
por elas subvencionadas ou em relação às quais tenham interesse
patrimonial.

Ordena o § 1º do art. 5º que as pessoas jurídicas criadas ou mantidas pelos


entes federados, assim como os atos das sociedades em que estas sejam
acionadas ou subvencionadas, ou que possuem interesse patrimonial, serão
equiparados aos entes federados para firmar a competência. Assim, uma Ação
Popular contra uma autarquia criada pela União, por exemplo, será processada e
julgada na Justiça Federal, como se a ação estivesse correndo contra a própria
União.

§ 2º Quando o pleito interessar simultaneamente à União e a


qualquer outra pessoas ou entidade, será competente o juiz das causas da
União, se houver; quando interessar simultaneamente ao Estado e ao
Município, será competente o juiz das causas do Estado, se houver.

Determina o § 2º do art. 5º da Lei de Ação Popular que, sendo réu


simultaneamente a União e outra pessoa ou entidade, será competente o juiz
responsável por julgar e processar as causas da União. Assim, se a União e o
Município “X” forem litisconsortes passivos de uma Ação Popular, será
competente a Justiça Federal – por esta processar e julgar ações envolvendo a
União (art. 109, I da Constituição Federal) – do domicílio do autor, da ocorrência
do ato ou fato que originou a demanda ou do Distrito Federal (art. 51, Parágrafo
Único do Código de Processo Civil).

Da mesma forma, determina a parte final do § 2º do referido art. 5º que,


sendo réu simultaneamente o Estado e algum Município, será competente o juiz
responsável por processar e julgar as causas do Estado, conforme a regra
esculpida no Parágrafo Único do art. 52, também do CPC: “Se Estado ou o
Distrito Federal for o demandado, a ação poderá ser proposta no foro de
domicílio do autor, no de ocorrência do ato ou fato que originou a demanda, no
de situação da coisa ou na capital do respectivo ente federado.”

§ 3º A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas


as ações, que forem posteriormente intentadas contra as mesmas partes e
sob os mesmos fundamentos.

Segundo o art. 83 do Código de Processo Penal, prevenção ocorre ”toda


vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com
jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos outros na prática de algum
ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento
da denúncia ou da queixa”. Ou seja, ainda que não tenha o autor ajuizado a ação,
se um dos juízes antecedeu aos demais na prática de qualquer ato do processo, se
tornará prevento, sendo o seu juízo aquele que processará e julgará a causa.

Segundo o § 3º do art. 5º desta Lei, o juiz se torna prevento para toda e


qualquer ação ajuizada posteriormente relativa à matéria discutida na Ação
Popular, ou que haja a mesma causa de pedir. Por exemplo, se o juízo da 7ª Vara
Cível da Comarca de São Paulo, capital, é o juiz que processará e julgará uma
Ação Popular contra o município em questão, se outro cidadão impetrar Ação
Popular visando a anulação de um ato lesivo ou se alguém lesionado por tal ato
impetrar judicialmente buscando a reparação de seu direito, o juízo que
processará e julgará tais causas será o 7ª Vara Cível, não havendo nova
distribuição.

§ 4º Na defesa do patrimônio público caberá a suspensão liminar do


ato lesivo impugnado.

Todos sabemos que os processos são demorados e que a resposta


jurisdicional pode vir anos depois do fato que motivou a ação. Para se evitar a
perda de um direito que não pode esperar até o trânsito em julgado da decisão, o
legislador criou formas de prevenir tal fato, sendo comuns as ações que pedem
julgamentos liminares ou tutelas antecipadas – ou seja, o juiz confere à parte
algo no curso do processo para precaver deste da perda de um direito. Por
exemplo, o juiz concede ao alimento prestação alimentícia provisionais, eis que
esperar até o trânsito em julgado da decisão pode fazê-lo morrer de fome.
Da mesma forma, determina o § 4º do art. 5º da Lei 4.717/65 que o juiz pode
conceder decisão liminar para suspender o ato lesivo impugnado pela Ação
Popular, quando estiver na defesa do patrimônio público. Tal parágrafo tem
como finalidade precaver que o ato lesivo corroa o patrimônio público enquanto
a Ação Popular está em curso perante o Judiciário, causando danos aos cofres ou
ao interesse público.

DOS SUJEITOS PASSIVOS DA AÇÃO E DOS ASSISTENTES

Art. 6º A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas


e as entidades referidas no art. 1º, contra as autoridades, funcionários ou
administradores que houverem autorizado, aprovado, ratificado ou
praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiverem dado
oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo.

O art. 6º da Lei 4.717/65 delitima quem será o polo passivo da Ação Popular,
ou seja, contra quem o cidadão deverá impetrar para anular o ato lesivo descrito
no art. 1º desta Lei. Segundo o referido parágrafo, o cidadão deverá impetrar a
ação contra as entidades descritas no primeiro artigo e contra as pessoas físicas
(autoridades, funcionários ou administradores) que tenham participado de
alguma forma o ato lesivo, seja praticando, seja autorizando, seja aprovando, ou
mesmo apenas o ratificando – ou ainda quando tais pessoas deram oportunidade
à ocorrêcia do ato lesivo, ainda que por omissão. Por fim, determina o referido
artigo que também deverá constar no polo passivo da ação os beneficiários
diretos do ato lesivo.

Dessa forma, estarão como réus da Ação Popular a pessoa jurídica entidade
descrita no art. 1º, as pessoas físicas que de alguma forma participaram da
ocorrência do ato lesivo e os beneficiários desta, ainda que pessoas jurídicas de
direito privado.

§ 1º Se não houver benefício direto do ato lesivo, ou se for ele


indeterminado ou desconhecido, a ação será proposta somente contra as
outras pessoas indicadas neste artigo.

Em complemento ao caput do art. 6º desta Lei, permite o seu parágrafo


primeiro que o cidadão impetre Ação Popular sem o beneficiário direto do ato
lesivo – como ordena o caput -, quando o mesmo é indeterminado e
desconhecido, podendo a ação ser impetrada contra as pessoas jurídicas e físicas
descritas no caput. Dessa forma, o desconhecimento do beneficiário direto não é
óbice à impetração da Ação Popular, devendo esta seguir normalmente contra os
demais indicados.

§ 2º No caso de que trata o inciso II, item "b", do art. 4º, quando o
valor real do bem for inferior ao da avaliação, citar-se-ão como réus, além
das pessoas públicas ou privadas e entidades referidas no art. 1º, apenas os
responsáveis pela avaliação inexata e os beneficiários da mesma.

Conforme vimos anteriormente, a alínea b do inciso II do art. 4º desta Lei


determina que será decretada nula o contrato ou ato que tiver como garantia real
um bem avaliado inferior ao que estiver em escritura, contrato ou avaliação
anterior. Quando isso ocorrer, deverá ser citado também como sujeito passivo da
Ação Popular o responsável pela avaliação inexata e quem se beneficiou dela,
além – claro – das pessoas físicas e jurídicas já descritas.

§ 3º A pessoas jurídicas de direito público ou de direito privado, cujo


ato seja objeto de impugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou
poderá atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse
público, a juízo do respectivo representante legal ou dirigente.

O § 3º do art. 6º desta Lei permite que as pessoas jurídicas, sejam elas de


direito público ou privado, rés da ação podem se abster de contestar o pedido ou
poderá atuar auxiliando o autor da ação – em uma evidente demonstração de
concordância com o pedido pelo mesmo -, caso isso seja de utilidade pública.
Dessa forma, caso a pessoa jurídica entenda que o ato impugnado está em
discordância com a lei, poderá reconhecer a ilegalidade, aceitar a sua anulação e
até mesmo auxiliar o seu autor, sem que seja necessário contestar a ação –
principalmente para as pessoas jurídicas de direito público, que não podem
transigir ou concordar com a parte contrária em uma ação.

§ 4º O Ministério Público acompanhará a ação, cabendo-lhe


apressar a produção da prova e promover a responsabilidade, civil ou
criminal, dos que nela incidirem, sendo-lhe vedado, em qualquer hipótese,
assumir a defesa do ato impugnado ou dos seus autores.

Conforme vastamente veremos ao longo do estudo acerca dos Direitos


Difusos e Coletivos, o Ministério Público possui como função constitucional a
fiscalização da lei, com o intuito de defender a ordem jurídica, o regime
democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis. Ele é conhecido
no meio jurídico como custus legis, ou fiscal da lei. Dessa forma, possui o
parquet o poder de fiscalizar o bom cumprimento da lei, principalmente em
ações onde uma das partes é vulnerável perante a outra.

Sob essa ótica, determina o § 4º do art. 6º desta Lei que o órgão ministerial
deverá acompanhar a ação, sendo intimado pelo juiz na forma do art. 7º, I, a
desta Lei, a qual terá poderes para apressar a produção de provas
(principalmente na forma do § 1º do mesmo art. 7º) e promover a
responsabilidade civil ou criminal quando o ato impugnado é ilícito ou
criminoso.

Por fim, determina o mesmo § 4º que não pode o Ministério Público, em


momento algum, assumir a defesa do ato impugnado ou de seus autores.
Entretanto, a legislação acerca da Ação Popular permite que o órgão ministerial
auxilie o autor da ação ou tome o seu lugar no processo, como nos casos de
desistência da ação (art. 9º) ou da execução (art. 16) ou quando proferida decisão
contra o autor (art. 19, §2º).

§ 5º É facultado a qualquer cidadão habilitar-se como litisconsorte


ou assistente do autor da ação popular.

No intuito de auxiliar o cidadão autor da Ação Popular, permite o § 5º do art.


6º que qualquer outro cidadão pode se habilitar como litisconsorte – tornando-se
também autor da ação – ou assistente – apenas auxiliando o autor – da Ação
Popular. Assim, poderá tal cidadão impetrar novos documentos, recorrer quando
o autor não o fizer, dentre outras ações. Deve-se salientar acerca dos poderes que
o assistente possui, sendo diversos do litisconsorte (vide art. 119 a 124 do
Código de Processo Civil).

DO PROCESSO

Art. 7º A ação obedecerá ao procedimento ordinário, previsto no


Código de Processo Civil, observadas as seguintes normas modificativas:

O art. 7º da Lei 4.717/65 determina como será o procedimento da Ação


Popular perante os órgãos jurisdicionais. O seu caput determina que a dita ação
seguirá o rito ordinário esculpido no Código de Processo Civil, ou seja,
começará com a petição inicial, seguirá para a audiência de conciliação e
mediação descrita no art. 334 do Código de Processo Civil; se não houver
conciliação, abrirá prazo para a contestação do réu, depois passará pelo despacho
saneador, seguirá para a Audiência de Instrução e Julgamento (se não for caso de
julgamento antecipado da lide, nos fulcros do art. 355 do CPC) e findará com a
sentença. Entretanto, o art. 7º desta Lei determina que exista algumas
modificações no rito ordinário quando se tratar de Ação Popular; modificações
estas que passaremos a ver agora, uma a uma.

I - Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:

a) além da citação dos réus, a intimação do representante do


Ministério Público;

b) a requisição, às entidades indicadas na petição inicial, dos


documentos que tiverem sido referidos pelo autor (art. 1º, § 6º), bem como a
de outros que se lhe afigurem necessários ao esclarecimento dos fatos,
ficando prazos de 15 (quinze) a 30 (trinta) dias para o atendimento.

Primeiramente, determina o inciso I do art. 7º que, quando o juiz citar o réu


da ação, para a audiência de conciliação e mediação, deverá ser intimado
também o representante do Ministério Público, que fará – conforme vimos no
estudo do artigo precedente – as vezes de custus legis, fiscalizando o bom
cumprimento da lei.

Além da intimação do órgão ministerial, o juiz também requisitará


documentos requeridos pelo autor e que foram negados, por o considerarem
sigilosos (conforme vimos no estudo do § 6º do art. 1º desta Lei), além de
qualquer documento que esclarecer os fatos. A autoridade oficiada terá o prazo
de quinze a trinta dias para o fiel cumprimento do acordado pelo juiz, sob pena
de crime de desobediência (art. 8º desta Lei c/c art. 330 do Código Penal).

§ 1º O representante do Ministério Público providenciará para que


as requisições, a que se refere o inciso anterior, sejam atendidas dentro dos
prazos fixados pelo juiz.

Em complemento à alínea b do inciso I deste artigo e em consoância ao § 4º


do art. 6º e alínea a deste inciso, ordena o seu § 1º que o Ministério Público
deverá providenciar atos necessários para o bom e fiel cumprimento das
requisições supramencionados nos prazos fixados pelo juiz.

§ 2º Se os documentos e informações não puderem ser oferecidos nos


prazos assinalados, o juiz poderá autorizar prorrogação dos mesmos, por
prazo razoável.

Ainda em complemento à alínea b deste inciso, determina o seu § 2º que,


caso a requisição ordenada pelo magistrado não puder ser cumprido dentro do
prazo que o mesmo assinalou, este poderá autorizar prorrogação, por tempo que
considerar razoável para o fiel cumprimento da ordem assinalada.

II - Quando o autor o preferir, a citação dos beneficiários far-se-á por


edital com o prazo de 30 (trinta) dias, afixado na sede do juízo e publicado
três vezes no jornal oficial do Distrito Federal, ou da Capital do Estado ou
Território em que seja ajuizada a ação. A publicação será gratuita e deverá
iniciar-se no máximo 3 (três) dias após a entrega, na repartição competente,
sob protocolo, de uma via autenticada do mandado.

Se os beneficiários do ato lesivo estiverem em local incerto ou


indeterminado, o autor poderá citá-los por edital, com prazo de trinta dias, que
será fixado na sede do juízo e publicado três vezes no jornal oficial do Distrito
Federal ou da capital do Estado onde estiver processando a ação. Neste edital
estará solicitando a todos que tiverem conhecimento do local onde o(s)
beneficiário(s) estiver(em) que o(s) informe(s) da citação, valendo-se válida a
mesma após o decurso do prazo de trinta dias. No caso, a citação por edital será
gratuita e se iniciará três dias após a entrega de uma via autenticada do mandado
na repartição competente.

III - Qualquer pessoa, beneficiada ou responsável pelo ato


impugnado, cuja existência ou identidade se torne conhecida no curso do
processo e antes de proferida a sentença final de primeira instância, deverá
ser citada para a integração do contraditório, sendo-lhe restituído o prazo
para contestação e produção de provas, salvo, quanto a beneficiário, se a
citação se houver feito na forma do inciso anterior.

Determina o inciso III do art. 7º desta Lei que qualquer pessoa beneficiada
ou responsável pelo ato lesivo deve ser réu da Ação Popular. Caso o beneficiário
ou responsável seja descoberto durante o curso do processo – e antes de
prolatada a sentença de primeira instância -, este deverá ser citado e integrado na
lide, restituindo a ele o prazo para contestação do artigo subsequente e de
produção de provas, voltando o processo ao curso normal logo após.
A parte final do inciso III deste artigo cria uma exceção à regra esculpida no
próprio inciso. Caso o beneficiário tenha sido citado pelo edital esculpido no
inciso precedente, não fará jus ao direito determinado neste inciso, devendo ser
nomeado curador especial (art. 72, II do CPC), a qual o defenderá normalmente
no curso do processo.

IV - O prazo de contestação é de 20 (vinte) dias, prorrogáveis por


mais 20 (vinte), a requerimento do interessado, se particularmente difícil a
produção de prova documental, e será comum a todos os interessados,
correndo da entrega em cartório do mandado cumprido, ou, quando for o
caso, do decurso do prazo assinado em edital.

Ao contrário do determinado no Código de Processo Civil, o inciso IV do art.


7º desta Lei determina que o prazo para contestar a ação será de vinte dias, e não
de quinze. Ademais, permite ainda o referido inciso que o prazo seja prorrogável
por mais vinte dias – totalizando, portanto, quarenta dias para apresentar a defesa
– quando for difícil a produção de provas documentais por parte dos réus. Deve-
se salientar da não aplicabilidade do art. 183 do Código de Processo Civil, por
força de seu próprio § 2º.

V - Caso não requerida, até o despacho saneador, a produção de


prova testemunhal ou pericial, o juiz ordenará vista às partes por 10 (dez)
dias, para alegações, sendo-lhe os autos conclusos, para sentença, 48
(quarenta e oito) horas após a expiração desse prazo; havendo
requerimento de prova, o processo tomará o rito ordinário.

Em consoância com o chamado julgamento antecipado da lide, prevista no


art. 355 do Código de Processo Civil, determina o inciso IV do art. 7º desta Lei
que não havendo pedido de prova testemunhal ou pericial pelas partes até o
despacho saneador, o juiz ordenará vista às partes pelo prazo de dez dias para
apresentação das alegações finais, por escrito e, em seguida, os autos irão
conclusos para sentença, que deverá ser dada (em tese) em quarenta e oito horas.

Caso haja pedido de prova testemunhal ou pericial por uma das partes e esta
for deferida pelo magistrado, o processo seguirá o rito ordinário previsto no
Código de Processo Civil, sendo obrigatória a Audiência de Instrução e
Julgamento.

VI - A sentença, quando não prolatada em audiência de instrução e


julgamento, deverá ser proferida dentro de 15 (quinze) dias do recebimento
dos autos pelo juiz.

Em complemento ao inciso precedente, ordena o último inciso do art. 7º


desta Lei que a sentença deverá ser proferida a priori na Audiência de Instrução
e Julgamento, quando esta for realizada, conforme determina a legislação
processual civil. Caso a sentença não for proferida na audiência, deverá
proferida no prazo de quinze dias – e não quarenta e oito horas, como no inciso
V – contados a partir do recebimento dos autos conclusos.

Parágrafo único. O proferimento da sentença além do prazo


estabelecido privará o juiz da inclusão em lista de merecimento para
promoção, durante 2 (dois) anos, e acarretará a perda, para efeito de
promoção por antiguidade, de tantos dias quantos forem os do
retardamento, salvo motivo justo, declinado nos autos e comprovado
perante o órgão disciplinar competente.

Determina o Parágrafo Único do art. 7º desta Lei que o juiz deverá prolatar a
sentença nos prazos indicados nos incisos V e VI do caput deste artigo, sob pena
de incorrer em perda do direito à promoção por antiguidade em dias iguais aos
do retardamento na prolação da sentença, da privação do nome do magistrado na
inclusão em listas de merecimento, no prazo de dois anos, caso seja comprovado
tal fato perante o órgão disciplinar competente. Entretanto, permite o referido
parágrafo que poderá o juiz deixar de sofrer tais sanções quando houver motivo
justo para o retardamento da prolação da sentença.

Art. 8º Ficará sujeita à pena de desobediência, salvo motivo justo


devidamente comprovado, a autoridade, o administrador ou o dirigente,
que deixar de fornecer, no prazo fixado no art. 1º, § 5º, ou naquele que tiver
sido estipulado pelo juiz (art. 7º, n. I, letra "b"), informações e certidão ou
fotocópia de documento necessários à instrução da causa.

Parágrafo único. O prazo contar-se-á do dia em que entregue, sob


recibo, o requerimento do interessado ou o ofício de requisição (art. 1º, § 5º,
e art. 7º, n. I, letra "b").

Em consoância com as demais legislações acerca dos Direitos Difusos e


Coletivos, determina o art. 8º da Lei de Ação Popular sobre a impossibilidade –
exceto motivo devidamente comprovado – de o administrativo ou dirigente
negar o pedido de informações ou certidões pedidas pela parte ou pelo juiz para
instruir a Ação Popular, ficando o agente que desobedecer incurso no crime de
desobediência (art. 330 do Código Penal). Deve-se salientar sobre a
possibilidade de negativa do pedido, quando feito pelo interessado, quando
ocorrer a hipótese do § 6º do art. 1º desta Lei.

Por fim, determina o Parágrafo Único do art. 8º desta Lei que o prazo para
entrega das certidões ou informações (vide acima) conta-se do dia em que
receber o requerimento do interessado ou do ofício do juiz.

Art. 9º Se o autor desistir da ação ou der motiva à absolvição da


instância, serão publicados editais nos prazos e condições previstos no art.
7º, inciso II, ficando assegurado a qualquer cidadão, bem como ao
representante do Ministério Público, dentro do prazo de 90 (noventa) dias
da última publicação feita, promover o prosseguimento da ação.

Imagina a seguinte situação: um cidadão qualquer impetra Ação Popular


visando anular um ato lesivo praticado por um agente público. Tão logo houve a
citação do agente público para se defender no processo verificou-se a
litispendência (vide art. 240 do Código de Processo Civil), impedindo novas
Ações Populares sobre a mesma matéria. A Ação Popular está anos correndo na
Justiça. No curso do processo, o cidadão entra em conluio com o agente público
e desiste da ação, pedindo a sua extinção sem julgamento de mérito. Outro
cidadão, inconformado, aciona novamente o Poder Judiciário, pedindo a
anulação do ato lesivo, voltando a correr do zero mais alguns anos para se ver,
finalmente, o ato anulado, fazendo com que o ato lesivo não seja anulado até
então – ainda que haja liminar suspendendo a eficácia do ato - e podendo até ter
o direito de anular prescrito (por ocasião do art. 21 desta Lei).

Para impedir tal situação, o legislador de 1965 criou o art. 9º, copiado
posteriormente pela Lei de Ação Civil Pública (§ 4º do art. 5º desta lei) e
legislações subsequentes, determinando que, caso o autor da ação desistir da
mesma ou der motivo para a improcedência do mesmo, abrir-se-á edital, no
prazo de trinta dias, avisando o ocorrido à população, para que qualquer
interessado – ou o Ministério Público – assuma a ação, prosseguindo com a
mesma, no prazo de noventa dias. Caso nenhum destes queira assumir tal ônus, a
ação será, enfim, extinta.

Art. 10. As partes só pagarão custas e preparo a final.


Tal artigo não foi recepcionado pela Constituição Federal, cujo artigo 5º,
inciso LXXIII, determina, na sua parte final, que ficará o autor, “salvo
comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência”. Dessa
forma, com a determinação constitucional, o autor da Ação Popular somente
arcará com as custas judiciais e ônus da sucumbência caso haja má-fé
comprovada do mesmo.

Art. 11. A sentença que, julgando procedente a ação popular,


decretar a invalidade do ato impugnado, condenará ao pagamento de
perdas e danos os responsáveis pela sua prática e os beneficiários dele,
ressalvada a ação regressiva contra os funcionários causadores de dano,
quando incorrerem em culpa.

Determina o art. 11 da Lei 4.717/65 que a sentença que julgar procedente a


Ação Popular terá os seguintes efeitos: 1º: a decretação da invalidade do ato
lesivo impugnado, como se nunca existisse; 2º: a condenação dos responsáveis
pela prática do ato lesivo e de todos que se beneficiaram com ele ao pagamento
das perdas e danos que causar a terceiro – ou seja, deverão os supramencionados
pagarem às vítimas o dano sofrido e o que razoavelmente deixarem de arrecadar
com o dano -, desde que tenha ocorrido com culpa ou dolo.

Art. 12. A sentença incluirá sempre, na condenação dos réus, o


pagamento, ao autor, das custas e demais despesas, judiciais e
extrajudiciais, diretamente relacionadas com a ação e comprovadas, bem
como o dos honorários de advogado.

Determina o art. 12 da Lei de Ação Popular que, caso a sentença seja julgada
procedente, o(s) réu(s) da ação deverá(ão) pagar ao autor todas as custas por este
pagas em relação àquela demanda, além dos honorários sucumbenciais. Assim,
caso o autor tenha pago, a título de exemplo, certidões no cartório local para
documentar o ato lesivo, o(s) réu(s) deverá(ão) ressarci-lo deste custo. Deve-se
salientar acerca do art. 10 desta Lei que previne o pagamento de custas e de
preparo antecipadamente.

Art. 13. A sentença que, apreciando o fundamento de direito do


pedido, julgar a lide manifestamente temerária, condenará o autor ao
pagamento do décuplo das custas.

Lide temerária é a impetração de um processo na Justiça havendo conluio


entre as partes ou entre as partes e o advogado para fraudar a lei, conseguir
objetivo ilícito; enfim, qualquer lide cujo objetivo seja algo ilícito ou ilegal. É
uma prática ilegal e que pode sujeitar as partes às penas cíveis, administrativas,
disciplinares e até mesmo criminais. Por exemplo, a parte que agir nos moldes
do art. 80 do Código de Processo Civil pode receber multa de um a dez por cento
do valor da causa; o advogado e o autor são obrigados a indenizar a parte
contrária nos danos que a este causarem (art. 32, Parágrafo Único da Lei
8906/94); e podem o autor e seu advogado incorrerem em crimes como fraude
processual (art. 347) ou patrocínio infiel, no caso deste último (art. 355, ambos
do Código Penal).

A Lei 4.717/65 delimita, além das supramencionadas, sanção própria àquele


que agir temeriamente em uma Ação Popular. Segundo o art. 13 desta Lei,
quando ocorrer lide temerária em uma Ação Popular, deverá o juiz, na sentença,
condenar o autor ao pagamento do décuplo (dez vezes) do valor das custas. Este
valor é, portanto, uma sanção ao autor que agir temeriamente em um processo.

Art. 14. Se o valor da lesão ficar provado no curso da causa, será


indicado na sentença; se depender de avaliação ou perícia, será apurado na
execução.

Determina o art. 14 da Lei 4.717/65 que, caso o valor do dano causado pelo
ato lesivo for descoberto no curso do processo, o juiz o indicará na sentença, a
qual será executada tão logo houver o trânsito em julgado. Caso não se consiga
determinado o dano causado pelo ato lesivo, ou a verificação necessita de
apuração por avaliação ou perícia, deverá se apurar não durante o curso do
processo, mas sim na fase de execução – atualmente, a fase correta para se
apurar tais fatos é a fase de liquidação (art. 509 e ss. do CPC).

Dessa forma, tão logo transitada em julgada a sentença, deverá o juiz liquidar
a sentença, dando-lhe valores, remetendo os autos a um perito ou avaliador para
se apurar o dano causado – ou se abrirá um novo processo para oitiva de
testemunhas e coleta de provas, sem que se discuta o mérito da questão; é a
chamada liquidação por procedimento comum(art. 511 do Código de Processo
Civil).

§ 1º Quando a lesão resultar da falta ou isenção de qualquer


pagamento, a condenação imporá o pagamento devido, com acréscimo de
juros de mora e multa legal ou contratual, se houver.
Em complemento ao caput do art. 14 da Lei 4.717/65, determina o seu § 1º
que, caso a lesão ocorra da inexistência de algum pagamento devido, ou a burla
da lei para isentar alguém de algum pagamento devido (por exemplo, de um
tributo), a sentença obrigará o(s) réu(s) a pagar(em) o montante devido, com
correção monetária, juros de mora e multa legal ou contratual, caso houver.

§ 2º Quando a lesão resultar da execução fraudulenta, simulada ou


irreal de contratos, a condenação versará sobre a reposição do débito, com
juros de mora.

Ainda em complemento ao caput do art. 14 da Lei 4.717/65, o seu § 2º


disserta acerca da condenação em caso de lesão de execução fraudulenta,
simulada ou irreal de contratos. Neste caso, o referido parágrafo delimita que
o(s) réu(s) deverá(ão) repor o débito, com juros e correção monetária.

§ 3º Quando o réu condenado perceber dos cofres públicos, a execução


far-se-á por desconto em folha até o integral ressarcimento do dano
causado, se assim mais convier ao interesse público.

Para se efetivar o pagamento do montante delimitado no caput deste artigo,


estabeleceu o legislador de 1965 que, se o réu condenado receber algum
montante pecuniário dos cofres públicos (por exemplo, salário ou soldo) – seja
ele municipal, estadual ou federal -, a execução do montante lesionado ocorrerá
por desconto em folha até o pagamento integral da dívida, caso assim for mais
conveniente ao interesse público. É uma forma que o legislador encontrou de
prevenir possíveis calotes por parte do réu, que pode ocultar seus bens e alegar
nada ter para o pagamento devido da dívida.

§ 4º A parte condenada a restituir bens ou valores ficará sujeita a


sequestro[2] e penhora, desde a prolação da sentença condenatória.

Por fim, determina o último parágrafo do art. 14 – em consoância à


efetivação do pagamento inscrito no parágrafo precedente – que o réu condenado
em sentença não transitada em julgada a restituir bens ou valores apropriados
indevidamente terá estes sequestrados e penhorados.

Art. 15. Se, no curso da ação, ficar provada a infringência da lei


penal ou a prática de falta disciplinar a que a lei comine a pena de demissão
ou a de rescisão de contrato de trabalho, o juiz, "ex-officio", determinará a
remessa de cópia autenticada das peças necessárias às autoridades ou aos
administradores a quem competir aplicar a sanção.

Tão logo, no curso de um processo, o juiz perceber que os atos lesivos do


caput do art. 1º se dá por violação de legislação penal (crime ou contravenção)
ou administrativa (falta disciplinar) sujeita à pena de demisão ou rescisão do
contrato de trabalho, deverá enviar à autoridade criminal ou administrativa
competente peças necessárias para comprovar a prática ilegal, a qual deverá
investigar e sancionar o agente público, se for o caso. Dessa forma, caso o
agente público, a título de exemplo, tenha se valido de prevaricação e corrupção
passiva (arts. 319 e 317, respectivamente, ambos do Código Penal) para permitir
uma licitação fraudulenta e desvio de remédios do Sistema Único de Saúde
(SUS) (peculato; art. 312, também do Código Penal) e o juiz percebe tal fato no
curso do processo, deverá enviar à autoridade competente para que esta abra
inquérito penal e investigue o supramencionado esquema de corrupção.

Art. 16. Caso decorridos 60 (sessenta) dias da publicação da sentença


condenatória de segunda instância, sem que o autor ou terceiro promova a
respectiva execução. o representante do Ministério Público a promoverá nos
30 (trinta) dias seguintes, sob pena de falta grave.

Em consoância com as legislações posteriores relativas à matéria Direitos


Difusos e Coletivos, determina o art. 16 da Lei de Ação Popular que tão logo
ocorrer a publicação da sentença condenatória de segunda instância – ainda que
a decisão tenha sido recorrida por Recurso Especial ou Extraordinário, que só
possuem efeito devolutivo– terão o autor ou terceiro interessado o prazo de
sessenta dias para executá-la, sob pena de o Ministério Público o fizer nos trinta
dias subsequente. Caso o parquet não o fizer, o seu representante incorrerá em
falta disciplinar grave.

Art. 17. É sempre permitida às pessoas ou entidades referidas no


art. 1º, ainda que hajam contestado a ação, promover, em qualquer tempo, e
no que as beneficiar a execução da sentença contra os demais réus.

Determina o confuso art. 17 – com redação horrível, diga-se de passagem –


que as entidades e pessoas referidas no art. 1º desta Lei - União, Distrito Federal,
Estados, Municípios, entidades autárquicas, sociedades de economia mista [...],
sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados
ausentes, empresas públicas, serviços sociais autônomos, instituições ou
fundações para cuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou
concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita ânua,
empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados
e dos Municípios, e quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas
pelos cofres públicos– poderão executar a sentença contra os demais réus do
processo ainda que tenham contestado a ação.

Assim, se um cidadão qualquer impetrar Ação Popular contra o município de


São Paulo, por exemplo, contra o prefeito da cidade e contra uma empresa
qualquer que assinou contrato de prestação de serviço sem houver licitação
anterior (art. 4º, III, a desta Lei), o município poderá executar a sentença
condenatória contra o prefeito e contra a empresa a sentença que anulou o
contrato, ainda que tenha o município contestado a ação – e ainda que tenham
sido derrotado na ação junto dos demais corréus.

Art. 18. A sentença terá eficácia de coisa julgada oponível "erga


omnes", exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por
deficiência de prova; neste caso, qualquer cidadão poderá intentar outra
ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

Conforme veremos posteriormente, para prevenir que um cidadão, em


conluio com o agente público, impetre uma Ação Popular sem qualquer
fundamento ou provas contra o ato lesivo praticado contra o referido agente
público e a ação seja julgada improcedente, produzindo efeitos da coisa julgada,
determina o art. 18 da Lei 4.717/65 que a sentença que julgar a Ação Popular
improcedente por deficiência de provas não sofrerá os efeitos da coisa julgada
erga omnes– ou seja, para todos e contra todos -, podendo outro cidadão
impetrar a Ação Popular para anulação do mesmo ato lesivo, desde que se valha
de novas provas. Para mais detalhes, vide art. 16 da Lei 7.347/85 e art. 103 do
Código de Defesa do Consumidor.

Art. 19. A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência


da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito
senão depois de confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente
caberá apelação, com efeito suspensivo.

Em determinadas ações, por ocasião dos direitos a serem preservados,


entendeu o legislador da necessidade de o Tribunal de Justiça analisar a sentença
de primeiro grau, ratificando o julgado pelo juiz a quo ou retificando a sua
decisão. Dessa forma, a sentença de primeiro grau não produz efeito algum,
ainda que as partes não tenham recorrido da mesma. Possui os mesmos efeitos
do recurso comum, com a exceção de que o mesmo ocorre por determinação da
lei, sem que haja a necessidade de as partes demonstrarem o desejo de
recorrerem da decisão. Por isso o nome recurso de ofício, eis que o juiz
“recorre”, de ofício, da própria decisão – ou o nome reexame necessário, mais
apropriado pelo fato de não ser tal situação propriamente um recurso.

O art. 496 do Código de Processo Civil e o art. 574 do Código de Processo


Penal determinam situações em que o chamado duplo de jurisdição deverá
ocorrer, ainda que as partes não tenham manifestado interesse em recorrer.
Segundo os referidos artigos, respectivamente, haverá o reexame necessário
quando a decisão for procedente contra os entes federados, suas autarquias e
fundações, ou quando julgar procedente embargos contra a Fazenda Pública – a
menos que o valor discutido na ação seja igual ou inferior a 1.000 (mil) salários-
mínimos para a União e suas autarquias e fundações; 500 (quinhentos) salários-
mínimos para os Estados, Distrito Federal, suas autarquias e fundações e os
Municípios que constituem capital de Estado, ou 100 (cem) salários-mínimos
para os demais Municípios e respectivas autarquias e fundações -, ou na que
conceder o habeas corpus.

Já o art. 19 da Lei de Ação Popular trouxe à legislação outro exemplo de


reexame necessário, já em matéria de Direitos Difusos e Coletivos. Segundo o
referido artigo, caso a sentença julgar improcedente a Ação Popular – seja por
carência de provas, seja por entender não haver ato lesivo algum – deverá
ocorrer o reexame necessário, sendo encaminhado diretamente ao juiz ad quem
para que este confirme a decisão de improcedência ou a reforme.

Tal artigo tem como condão proteger o cidadão que vai ao Judiciário buscar a
anulação de um ato lesivo de um possível conluio entre o juiz e as partes
envolvidas – que infelizmente ainda é uma verdade que ocorre neste país,
principalmente em grandes esquemas de corrupção -, na qual poderia julgar
improcedente o pedido e talvez impedir o recurso do autor por algum motivo
qualquer, transitando em julgado a decisão que não poderia ser impetrada
novamente (exceto pela proteção dada pelo artigo precedente).

No mais, determina a parte final do art. 19 da Lei de Ação Popular que o réu
da ação poderá recorrer da sentença que julgar procedente o pedido através do
recurso da apelação, a qual haverá efeito suspensivo (ou seja, não pode o autor
executar a decisão provisoriamente). Neste caso, não há reexame necessário
algum.

Por fim, é importante salientar que, por ocasião do microssistema processual


coletivo, o art. 19 desta Lei, que somente era aplicado às Ações Populares e o
art. 4º, §1 º da Lei 7.853/89, que era aplicado somente às ações coletivas ou
individuais indisponíveis de proteção dos direitos da pessoa com deficiência,
passaram a ser aplicados em todas as ações de defesa dos direitos difusos e
coletivos. Dessa forma, qualquer ação que visa proteger direitos difusos e
coletivos, caso seja julgada carente ou improcedente, deverá sofrer o reexame
necessário, ainda que a legislação específica sobre o assunto não determina –
exceto se expressamente determinar a sua não aplicação.

Ademais, é importante mencionar que, conforme jurisprudência do STJ, o


reexame necessário do artigo 19 da Lei de Ação Popular só se aplica no caso de
a sentença prejudicar o autor e não o réu – por exemplo, com uma sentença
procedente. Neste sentido:

Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público do


Estado do Paraná, com fundamento na alínea a do inciso III do
art. 105 da CF/1988, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do
Estado do Paraná, publicado na vigência do CPC/1973. [...] Alega o
recorrente violação do art. 19 da Lei n. 4.717/1965, pois o Tribunal de
origem não pode, em reexame necessário, reverter sentença de procedência
prolatada em ação civil pública por ato de improbidade administrativa.
Sustenta que o reexame necessário somente é cabível nas hipóteses de
carência ação ou improcedência. [...] A irresignação merece prosperar.
Com efeito, o Tribunal de origem, em reexame necessário, reformou
sentença de procedência do pedido prolatada em ação civil pública por
improbidade administrativa. Todavia, o acórdão daquela Corte destoa da
jurisprudência do STJ que, embora tenha se firmado no sentido de admitir
o reexame necessário nas ações de improbidade administrativa, restringe
tal entendimento às hipóteses em que a sentença tenha sido desfavorável ao
autor da ação, como nos casos de carência de ação ou improcedência do
pedido, não havendo falar em duplo grau de jurisdição obrigatório para
favorecer o réu. (Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial: REsp
1703262 PR 2017/0261574-1, Relator: Ministro Og Fernandes. Data: 08
de novembro de 2018).

§ 1º Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento.

Determina o § 1º do art. 19 desta Lei que as decisões interlocutórias –


aquelas proferidas no curso do processo – são recorridas através de agravo de
instrumento, devendo a parte encaminhar o recurso à instância superior que o
analisará, modificando ou não a decisão agravada – em mais um caso de
cabimento de agravo de instrumento, conforme determina o art. 1.015 do Código
de Processo Civil.

§ 2º Das sentenças e decisões proferidas contra o autor da ação e


suscetíveis de recurso, poderá recorrer qualquer cidadão e também o
Ministério Público.

Determina o § 2º do art. 19 da Lei de Ação Popular que, caso seja proferida


qualquer decisão – seja sentença ou interlocutória – contra o autor da ação e que
seja cabível recurso, poderá recorrer não somente o autor, mas também qualquer
cidadão e o próprio Ministério Público. Dessa forma, qualquer cidadão poderá
impetrar – através de advogado ou defensor público, que somente estes possuem
capacidade postulatória – um recurso, protolocando-o junto ao processo, sem
que haja anuência do juiz ou do autor da ação, ou que o primeiro seja parte no
processo. O autor do recurso somente precisará comprovar a sua cidadania, na
forma do § 3º do art. 1º desta Lei. Da mesma forma, o Mininistério Público
poderá impetrar normalmente um recurso em defesa do autor da ação, tendo em
vista que o mesmo já se encontra no processo como custus legis.

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 20. Para os fins desta lei, consideram-se entidades autárquicas:

a) o serviço estatal descentralizado com personalidade jurídica,


custeado mediante orçamento próprio, independente do orçamento geral;

b) as pessoas jurídicas especialmente instituídas por lei, para a


execução de serviços de interesse público ou social, custeados por tributos
de qualquer natureza ou por outros recursos oriundos do Tesouro Público;

c) as entidades de direito público ou privado a que a lei tiver


atribuído competência para receber e aplicar contribuições parafiscais.

Para fins do art. 1º, caput, o art. 20 desta Lei determina quais são as
entidades autárquicas naquele artigo citadas. Para este artigo, serão entidades
autárquicas: o serviço estatal descentralizado com personalidade jurídica e
orçamento próprios (por exemplo, a Caixa Econômica, o Banco do Brasil, os
Correios, autarquias e fundações); as pessoas jurídicas instituídas por lei, para
execução de serviços de interesse público ou social (por exemplo, INSS, Copasa,
etc.); e as entidades de direito público ou privado que tiver competência para
receber e aplicar contribuições parafiscais.

Contribuições parafiscais são tributos no interesse de categorias econômicas


ou profissionais, na qual sua arrecadação é destinada ao custeio de atividade
paraestatal, ou seja, atividade exercida por entidades privadas, mas com
conotação social ou de interesse público. Ocorre a parafiscalidade quando um
órgão institui um tributo (por exemplo, a União) que será destinada a outra (por
exemplo, o INSS). São exemplos de contribuição parafiscal, dado o exemplo
acima, o SAT – Contribuição para Seguro de Acidente de Trabalho – na qual
quem institui é a União e o beneficiário é o INSS.

Art. 21. A ação prevista nesta lei prescreve em 5 (cinco) anos.

Segundo a legislação civil brasileira, prescrição é a extinção do direito de


pretender a reparação de um direito violado, pelo decurso do tempo (art. 189 do
Código Civil). Após o decurso do prazo, não pode o autor ingressar
judicialmente para reparar o direito violado, por estar o mesmo prescrito – o juiz
pode, inclusive, extinguir ex officio o processo com resolução do mérito, fazendo
coisa julgada. (art. 487, II do Código de Processo Civil). A legislação brasileira
determina prazos variados para direitos variados, sendo o prazo comum de 10
(dez) anos.

Todavia, a título de exemplo, prescreve em dois anos a busca, por parte do


autor, da prestação da pensão alimentícia não paga (art. 206, § 2º), ou em cinco a
cobrança de dívida inscrita em documento público ou particular (art. 206, § 5º,
V, todos do Código Civil). Para mais detalhes, vide arts. 205 e 206 do Código
Civil.

Já a Lei de Ação Popular determina prazo próprio para estar prescrito as


ações de anulação dos atos lesivos descritos nessa lei. Segundo o art. 21 da
referida lei, após cinco anos dos atos lesivos, estará prescrita a Ação Popular.

É imprescindível dissertar que somente a Ação Popular e o Mandado de


Segurança Coletivo (artigo 23 da Lei 12.016/09) possuem prescrição. Nas
demais ações, conforme jurisprudência dos Tribunais Superiores, as ações
coletivas são imprescindíveis, dada a natureza coletiva das mesmas. Neste
sentido:

AGRAVO DE PETIÇÃO DA EXEQUENTE. ATUAÇÃO


CONSTITUCIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO COMO
PALADINO DA ORDEM JURÍDICA. TERMO DE AJUSTE DE CONDUTA.
DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS. IMPRESCRITIBILIDADE. A
prescrição é a perda da pretensão de reparação do direito violado em
virtude da inércia do seu titular. Trata-se de instituto voltado à
estabilização das relações, emergindo como concretizador da segurança
jurídica. A questão ganha novos contornos, contudo, nas ações coletivas
que visam a tutela de direitos transindividuais. Aqui, o direito de ação
passa do plano individual e atomizado para o plano coletivo,
molecularizado. Em tais casos, o Ministério Público busca em nome
próprio direito alheio, valendo-se de sua prerrogativa constitucional de
paladino dos direitos indisponíveis e metaindividuais (CF/88, art. 127 c/c
art. 83 LC 75/93), de titularidade indeterminada. Logo, para tais direitos, e
à luz da teoria da actio nata, não havendo titulares determinados, não há
que se falar em aplicação do instituto da prescrição. Recurso conhecido e
provido.

Art. 22. Aplicam-se à ação popular as regras do Código de Processo


Civil, naquilo em que não contrariem os dispositivos desta lei, nem a
natureza específica da ação.

Determina o art. 22 da Lei de Ação Popular que podem as partes e/ou o juiz
utilizarem das regras do Código de Processo Civil para dirimir questões não
resolvidas por esta legislação. A título de exemplo, damos os requisitos da
petição inicial ou da defesa do réu. Esta lei não determina quais os requisitos que
a petição inicial deve ter nem como deve se proceder a defesa do réu em juízo.
Dessa forma, aplica-se a tal lei as regras contidas no Código de Processo Civil,
que dirimem tal questão (art. 319 e 320; art. 335 e ss., todos da legislação
processual civil).
AÇÃO CIVIL PÚBLICA

Instituída como Lei 7.347, de 1985, a Lei de Ação Civil Pública é, atualmene, a
legislação mais importante dentro da matéria Direitos Difusos e Coletivos, ainda
que tenha sido a segunda a ser editada sobre o assunto (após a Lei de Ação
Popular).

Nesta lei existem os principais artigos a serem utilizados sobre o tema,


servindo como base para qualquer tipo de ação coletiva (com exceção da Ação
Popular). Por exemplo: o inquérito civil e o Termo de Ajustamento de Conduta
são dois institutos trazidos pela Lei de Ação Civil Pública e que podem ser
utilizados na defesa de qualquer direito difuso ou coletivo por ocasião do
microssistema processual coletivo. É muito comum, inclusive, os legitimados
para propor ação coletiva impetrarem Ações Civis Públicas para defesa de
direitos difusos ou coletivos de crianças ou adolescentes (Estatuto da Criança e
do Adolescente), de idosos (Estatuto do Idoso), dentre outros, ainda que nestas
leis não determinem qual o tipo e nome da ação coletiva que será proposta.

Todavia, é necessário salientar que é suma importância analisar os artigos do


Código de Defesa do Consumidor que tratam sobre o tema direitos difusos e
coletivos, pois este código complementa a Lei de Ação Civil Pública, não
podendo seus artigos serem excluídos de análise, em se tratando de direitos
difusos e coletivos.

LEI No 7.347, DE 24 DE JULHO DE 1985.

Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação


popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais
causados:

A Lei 7.347/85 possui como função a defesa dos direitos da coletividade,


tecnicamente denominados direitos difusos, coletivos ou individuais
homogêneos (para saber da diferenciação de cada um, vide estudo do Parágrafo
Único do art. 81 do Código de Defesa do Consumidor), ou direitos
transindividuais – por tais direitos passarem da pessoa individual e se tornam de
um grupo de pessoas, ou de toda a coletividade.

Dessa forma, a Lei de Ação Civil Pública tem como escopo a proteção de
todos os direitos que passam da pessoa individual. Mas, quais são esses direitos?
O seu art. 1º quem delimita, dissertando quais são os direitos transindividuais,
que serão protegidos por meio da Ação Civil Pública, conforme veremos no
estudo desta Lei.

Assim, poderão os legitimados do art. 5º desta Lei, a qual igualmente


veremos oportunamente, impetrar Ação Civil Pública para defesa e reparação – a
título de danos morais ou materiais – dos seguintes direitos transindividuais:

l - ao meio-ambiente;

O primeiro direito transindividual tratado pela Lei de Ação Civil Pública


é o meio ambiente. A Constituição Federal, em seu art. 225, determina que é
direito de todos “o meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”. Assim, é direito de todos
um meio ambiente equilibrado, sem que se consiga dividir qual a quota de cada
pessoa naquele direito – impedindo, assim, que a pessoa busque individualmente
a reparação do direito violado. Dessa forma, os legitimados do art. 5º poderão
buscar a reparação do meio ambiente desequilibrado através da Ação Civil
Pública.

ll - ao consumidor;

Nas relações de consumo, aquele que adquire o bem ou o serviço é


normalmente mais fraco e desprotegido que aquele que o vende ou presta.
Pensando nisso, a Constituição Federal determinou que o direito do consumidor
era direito humano, fundamental, indisponível e inviolável (art. 5º, XXXII). Dois
anos depois, nascia o Código de Defesa do Consumidor que, como o próprio
nome já diz, defende e protege a parte mais fraca na relação de consumo – o
consumidor.

Porém, anos antes, em 1985, já determinava a Lei 7.347/85 acerca da


proteção dos direitos transindividuais dos consumidores, através da Ação Civil
Pública – vale salientar que tal ação só serve para proteger os direitos
transindividuais do consumidor (por exemplo, um acidente aéreo, a colocação no
mercado de um produto nocivo, uma publicidade enganosa, etc.), não se
podendo proteger os direitos individuais do consumidor. Quando o direito do
consumidor é individual, o próprio quem deverá buscar sua reparação.

O Código de Defesa do Consumidor trouxe grandes modificações à


matéria Direitos Difusos e Coletivos, como o Termo de Ajustamento de Conduta
(TAC), o microssistema processual coletivo, a definição de direitos difusos,
coletivos e individuais homogêneos e novas normas de proteção de direitos
transindividuais, ficando as normas lá contidas para defesa dos direitos
individuais homogêneos e esta Lei para defesa dos direitos difusos e coletivos.

III – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e


paisagístico;

Por todo o país existem números bens que possuem incomensurável valor
histórico, turístico, paisagístico, estético ou artístico, como uma obra de Cândido
Portinari; as igrejas das cidades históricas mineiras, como São João del Rei,
Ouro Preto e Tiradentes; as Cataratas do Iguaçu; as pinturas rupestres, dentre
outros. É direito de cada um ter aquele bem de valor histórico, turístico, estético,
paisagístico ou artístico no local onde se encontra, de usufrui-lo quando bem lhe
aprouver, sem que ninguém o descaracterize ou o destrua. Não pode, por
exemplo, o dono de um casarão histórico derrubá-lo, porque a propriedade pode
ser privada, mas o vislumbre da beleza e da história daquele casarão certamente
é de todos.

Dessa forma, pensando acerca da proteção dos bens de valor artístico,


estético, histórico, turístico e paisagístico, que merecem e precisam, bem
determinou o legislador de 1985 que tais bens são passíveis de proteção por
meio da Ação Civil Pública.

IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.

O quarto inciso do art. 1º desta Lei abre margem para que a Ação Civil
Pública possa ser utilizada na defesa de todo e qualquer direito difuso, coletivo
ou individual homogêneo existente, fortalecendo o microssistema processual
coletivo. Dessa forma, pode-se aplicar a Ação Civil Pública, p.ex., para defesa
dos direitos das pessoas com deficiência – seja mental, seja física, das crianças e
dos adolescentes, dos idosos, dos jovens (Estatuto do Jovem; Lei 12.852/13), dos
torcedores (Lei 10.671/03); para defesa da igualdade racial (Estatuto da
Igualdade Racial; Lei 12.288/10), a moralidade administrativa e os princípios
basilares da Administração Pública e até os direitos humanos, quando a
coletividade ou um grupo contido dentro desta for vítima.

V - por infração da ordem econômica;

A Lei 12.529, de 2011, estruturou o Sistema Brasileiro de Direito da


Concorrência, além de instituir normas que são infrações da ordem econômica.
Segundo o seu art. 36, são infrações da ordem econômica atos que tenham como
objeto ou que podem acarretar como efeito a limitação, a falsificação ou, de
qualquer forma, prejuízos à livre concorrência ou à livre iniciativa; a dominação
de mercado relevante de bens ou serviços; o aumento arbitário de lucros; ou o
exercício abusivo de posição dominante.

O § 3º do supramencionado artigo delimita alguns exemplos de infração à


ordem econômica, como: acordar, combinar, manipular ou ajustar com
concorrente, sob qualquer forma os preços de bens ou serviços ofertados
individualmente; a produção ou a comercialização de uma quantidade restrita ou
limitada de bens ou a prestação de um número, volume ou frequência restrita ou
limitada de serviços; a divisão de partes ou segmentos de um mercado atual ou
potencial de bens ou serviços, mediante, dentre outros, a distribuição de clientes,
fornecedores, regiões ou períodos; promover, obter ou influenciar a adoção de
conduta comercial uniforme ou concertada entre concorrentes; limitar ou
impedir o acesso de novas empresas ao mercado, dentre outras condutas.

Caso ocorra alguma das condutas retromencionadas,poderão os


legitimados do art. 5º desta Lei impetrar Ação Civil Pública para anular e coibir
a prática, além da reparação dos danos morais e materiais sofridos pelas vítimas.

Neste sentido:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - TUTELA


DOS DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS - ABUSIVIDADE NO PREÇO
DA VENDA DE COMBUSTÍVEIS - LUCRO EXCESSIVO - INFRAÇÃO À
ORDEM ECONÔMICA - LIMITAÇÃO NA MARGEM DE LUCRO - DANO
PATRIMONIAL COLETIVO - CABIMENTO - QUANTUM - LIQUIDAÇÃO
DE SENTENÇA - FLUID RECOVERY - RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO.

O lucro excessivo na venda de combustíveis configura infração à ordem
econômica, gerando ao infrator o dever de indenizar pelos danos causados,
à luz das normas contidas no Código de Defesa do Consumidor. (Ap
105997/2016, DESA. MARIA APARECIDA RIBEIRO, PRIMEIRA CÂMARA
DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO. Julgado em 27/08/2018, Publicado
no DJE 31/08/2018)

VI - à ordem urbanística.

A Lei 10.257, de 2001 – chamada de Estatuto da Cidade – trouxe formas


de desenvolvimento urbano, por parte dos municípios, de forma a contemplar a
todos, respeitando o meio ambiente, o bem estar dos habitantes e as funções
sociais da cidade (na forma do art. 182 da Constituição Federal). Entretanto,
sabemos que a proliferação das cidades se dá com métodos informais de
desenvolvimento, acarretando graves consequências urbanísticas, ambientais e
socioeconômicas, afetando a população urbana como um todo. Podemos dar
como exemplo a população que constrói residências em encostas ou na beirada
de rios – em locais de alto risco na época das chuvas -, do prefeito e secretários
que asfaltam a torto e a direito sem estrutura adequada, faltando bueiros e bocas
de lodo, por exemplo; as favelas, dentre outros.

Para regulamentar o parcelamento e ocupação do solo urbano de forma


adequada e nos moldes do Estatuto da Cidade, o referido artigo implementou a
ordem urbanística como direito difuso e coletivo, permitindo aos legitimados do
art. 5º que utilizem da Ação Civil Pública para este fim.

VII – à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou


religiosos.

Como sabemos, enquanto o Brasil era colônia de Portugal, milhões de


negros africanos foram trazidos para estas terras para servirem de escravos aos
brancos. Dessa forma, criou-se a errônea sensação que os negros são pessoas
inferiores aos brancos – sensação esta que atravessou séculos e ultrapassou até
mesmo a Abolição da Escravatura de 1888. Para evitar o racismo, que ainda
perdurava (e infelizmente ainda perdura até hoje), foi criada a Lei 1390/51 (Lei
Afonso Arinos), marco da legislação brasileira, uma vez que foi a primeira
legislação brasileira a tratar sob a ótica criminal o racismo e a discriminação da
pessoa por sua raça ou cor.
Após a Lei Afonso Arinos, vieram as leis 7.437/85 e – após a Constituição
Federal de 1988 (art. 5º, XLII) – a Lei 7.716/89, que ampliou o rol de atos
considerados racistas, saindo da ótica da discriminação apenas da raça e da cor
para, também, da etnia, religião ou procedência nacional. Assim, é crime
discriminar alguém por motivo de raça, cor, etnia, religião ou procedência
nacional.

Em consoância à legislação brasileira de repressão ao racismo, a Lei


12.996, de 2014, determinou ser direito difuso ou coletivo a honra e a dignidade
de grupos raciais, étnicos ou religiosos. Dessa forma, podem os legitimados do
art. 5º desta Lei defenderem os interesses e direitos de grupos raciais, étnicos ou
religiosos de ataques, ofensas ou atos discriminatórios que visam prejudicar sua
honra ou sua dignidade – em um claro avanço na política brasileira de combate
ao racismo e à intolerância.

VIII – ao patrimônio público e social.

Incluído pela Lei 13.004, também de 2014, o último inciso do art. 1º da


Lei de Ação Civil Pública determina que o patrimônio público e social é um
direito difuso e coletivo a ser protegido por meio da Ação Civil Pública.

Patrimônio público é todo bem corpóreo ou incorpóreo, móvel ou imóvel


pertencente à Administração Pública Direta ou Indireta. É patrimônio público as
ruas, praças e avenidas; o prédio da Prefeitura, do Fórum, da Câmara Municipal
ou dos Deputados, o mar continental e as praias, dentre outros.

Já patrimônio social é o conjunto de bens jurídicos existentes em face dos


valores adotados pela Constituição Federal. Assim, é patrimônio social a
proteção às crianças, adolescentes, jovens, idosos e índios, a probidade e a
moralidade administrativa, dentre outros. Todo aquele bem protegido por um
valor esculpido e adotado pela Constituição Federal é patrimônio social.

Tanto o patrimônio público quanto o patrimônio social são, atualmente,


direitos difusos e coletivos, podendo os legitimados do art. 5º protegê-los por
meio da Ação Civil Pública. Vale salientar, primeiramente, que muitos
patrimônios sociais já podem ser preservados por meio da Ação Civil Pública
por ocasião de outros diplomas legislativos, como a proteção à criança e
adolescente (Estatuto da Criança e do Adolescente) e ao idoso (Estatuto do
Idoso) ou através desta mesma legislação, em seu inciso IV, como vimos acima.
Já o patrimônio público pode ser protegido contra atos lesivos praticados
pelos agentes públicos por qualquer cidadão desde 1965, através da Ação
Popular, como vimos. Para ampliar a proteção ao patrimônio público, a Lei
13.004/14 o colocou expressamente como no rol do artigo 1º desta Lei, para que
seja protegido também pelos legitimados do artigo 5º, além do cidadão. Seria
ilógico que o cidadão pudesse preservar o patrimônio público, mas o Ministério
Público ou a União, p.ex., não. Assim, a partir de 2014, tanto o cidadão quanto
os legitimados do artigo 5º, concorrentemente, podem impetrar ação coletiva
para preservar o patrimônio público.

Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular
pretensões que envolvam tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS ou outros fundos de natureza
institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados.

Impede o Parágrafo Único do art. 1º da Lei 7.347/85 – acrescido pela


Medida Provisória 2.180-35, 2001, ainda não convertida em lei - que se utilize
de Ações Civis Públicas para tratar judicialmente de questões onde cada
beneficiário pode ser individualmente determinado. O parágrafo trouxe alguns
exemplos como os tributos, as contribuições previdenciárias e o recolhimento do
FGTS. Se os beneficiários são individualmente determinados, deverá cada um
adentrar judicialmente para reparar o dano por ele sofrido.

Art. 2º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local


onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e
julgar a causa.

O art. 42 e ss. do Código de Processo Civil determina qual juízo será


competente para processar e julgar a causa. O art. 46 disserta que será
competente, em regra, o foro do domicílio do réu. Os demais artigos dão exceção
à regra geral, como no caso de ações relativas a imóveis, que é competente o
foro do lugar da coisa (art.47).

O art. 2º da Lei de Ação Civil Pública determina que será competente o


foro do local onde ocorrer o dano. Assim, se o dano ocorrer na cidade de São
Paulo, por exemplo, uma das varas cíveis da cidade que será competente para
processar e julgar a causa, ainda que, a título de exemplo, a empresa se localize
na cidade de Osasco/SP.
Todavia, deve-se salientar acerca da lacuna deixada por tal lei. E em
relação a danos regionais ou de âmbito nacional, como o famoso caso do
rompimento da barragem na cidade de Mariana/MG, que destruiu um de seus
distritos, Bento Rodrigues, e inundou o Rio Doce de lama, rio este que corta os
estados de Minas Gerais e Espírito Santo? Qual o foro competente? Devemos,
para responder a esta pergunta, utilizar o art. 93 do Código de Defesa do
Consumidor de forma análoga, por ser mais completo (tendo em vista que o
mesmo é utilizado para ações de defesa de interesses individuais homogêneos
apenas) e utilizando do microssistema processual coletivo.

Conforme veremos oportunamente, o art. 93 da legislação consumerista


determina que será competente o foro do local onde ocorreu o dano, se local; ou
o foro da capital do Estado ou do Distrito Federal, caso haja dano de âmbito
regional ou nacional, respectivamente. Dessa forma, como no caso
supramencionado, o foro competente para processar e julgar a causa relativa à
sujeira do Rio Doce será a capital do Distrito Federal, Brasília.

Parágrafo único. A propositura da ação prevenirá a jurisdição do


juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma
causa de pedir ou o mesmo objeto.

Conforme vimos no estudo do § 3º do art. 5º da Lei 4.717/65, ocorre a


prevenção quando, concorrentes dois ou mais juízes igualmente competentes ou
com jurisdição cumulativa, um deles anteceder aos demais na prática de algum
ato do processo ou de medida a ele relativa.

No caso do Parágrafo Único do art. 2º da Lei 7.347/85, o juiz será


prevento para toda e qualquer ação ajuizada posteriormente relativa ao fato
pertinente da Ação Civil Pública, ou que haja a mesma causa de pedir. Por
exemplo, se o juízo da 1ª Vara Cível da Comarca X é o juiz que processará e
julgará a Ação Civil Pública, caso as vítimas do dano acionem o réu para serem
indenizadas, o juízo que julgará a causa será o 1ª Vara Cível, não havendo nova
distribuição.

Por fim, deve-se salientar que as demais legislações que tratam sobre os
Direitos Difusos e Coletivos podem possuir outra regra acerca da competência,
na qual deverá ser aplicada em detrimento da regra geral. Podemos utilizar como
exemplo o Estatuto do Idoso, cujo art. 80 determina que o foro de competência
para processamento e julgamento da causas relativas a defesas difusos e
coletivos de idosos é o foro de domicílio do idoso.

Art. 3º A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou


o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.

Permite o art. 3º da Lei de Ação Civil Pública que as ações de proteção ou


reparação dos direitos difusos e coletivos tenham como objeto a condenação em
dinheiro ou o cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer. Damos dois
exemplos de violação de direitos difusos ou coletivos: a quebra de uma barragem
que destruiu o vilarejo de Bento Rodrigues, em Mariana, Minas Gerais, em
novembro de 2015; e o transporte público municipal da própria cidade de
Mariana que, hipoteticamente, não quer ir mais na zona rural da cidade, sob a
alegação de risco de novos rompimentos de barragem. Nos dois casos houve
violação de direitos da coletividade.

No primeiro caso, os legitimados do art. 5º desta lei, que veremos adiante,


entrará com uma Ação Civil Pública pedindo a reparação dos danos morais e
materiais ocorridos em virtude do acidente. Já no segundo caso, o interesse
primordial dos afetados não é a reparação dos danos morais e materiais sofridos
pela ausência de transporte público, mas sim pela volta do mesmo. Neste caso,
os legitimados do art. 5º entrarão com a Ação Civil Pública para restituir o
transporte público que foi indevidamente retirado – ou seja, compelir a empresa
de transporte público a fazer um ato a qual se obrigou por lei ou por contrato.

Por fim, deve-se salientar acerca do art. 83 do Código de Defesa do


Consumidor, reproduzido no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Estatuto
do Idoso como arts. 212 e 82, respectivamente, utilizado nas ações civis públicas
pelo microssistema processual coletivo, que permite entrar com qualquer tipo de
ação pertinente para defesa dos direitos difusos e coletivos – e não apenas ações
que visam reparação de danos morais ou materiais ou condenação em dinheiro e
obrigação de fazer ou não fazer.

Art. 4o Poderá ser ajuizada ação cautelar para os fins desta Lei,
objetivando, inclusive, evitar dano ao patrimônio público e social, ao meio
ambiente, ao consumidor, à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos
ou religiosos, à ordem urbanística ou aos bens e direitos de valor artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico.

Da mesma forma que qualquer pessoa pode requerer tutela provisória (art.
294 a 311 do Código de Processo Civil) para salvaguardar um direito que possui
risco de perecimento até o final da demanda, os legitimados do próximo artigo
poderão impetrar pedido de tutela de urgência (e não mais ação cautelar, uma
vez que a mesma foi extinta pela Lei 13105/15 e substituída pelas tutelas
antecipadas e cautelares de caráter antecedente; art. 303 a 310) para defesa dos
direitos difusos e coletivos elencados no art. 1º desta lei. Para maiores
informações sobre a tutela provisória, vide arts. 294 a 311 do novo CPC.

Art. 5o Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação


cautelar:

O art. 5º da Lei 7.347/85 tem como função determinar quais órgãos são
competentes para propor a Ação Civil Pública e as ações cautelares ditadas no
artigo precedente. Como tem como função a proteção de todos os envolvidos, a
vítima não pode adentrar com ação individual para proteção ou reparação de
direito de todos os envolvidos – apenas de seus direitos. Só poderão, assim,
adentrar com processos coletivos os elencados neste artigo - além da Ordem dos
Advogados do Brasil (art. 81, III do Estatuto do Idoso), por ocasião do
microsssitema processual coletivo -, a qual estudaremos individualmente.

I - o Ministério Público;

A Constituição Federal determina, em seu art. 127, que o Ministério


Público tem como função: “a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e
dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”. Portanto, cabe ao parquet a
proteção dos interesses da sociedade como um todo. Determina ainda a Carta
Magna, em seu art. 129, inciso III, que é função do Ministério Público:
“promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio
público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.
Ou seja, a própria Constituição Federal determina ser função ministerial a
proteção dos direitos difusos e coletivos. Possui o Ministério Público, portanto, a
função de “custus legis”, ou fiscal da lei, havendo o dever de fiscalizar a boa
aplicação das leis – principalmente em se tratanto de interesses sociais. Dessa
forma, detém tal órgão direito de adentrar com a ação coletiva para proteção dos
direitos difusos e coletivos[3].

II – a Defensoria Pública;

A Lei 11.488/07 instituiu a Defensoria Pública como legitimada para


propor Ação Civil Pública para defesa de direitos difusos e coletivos. O
entendimento era por ocasião de que o órgão é, por ocasião do art. 134 da
Constituição Federal, instituição essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a orientação jurídica e defesa, em todos os graus, dos
necessitados.

Todavia, a Conamp – Associação Nacional dos Membros do Ministério


Público acionou o Supremo Tribunal Federal com uma Ação Direta de
Inconsitucionalidade (ADIN), de nº 3.943, questionando a constitucionalidade
do novo inciso II do art. 5º desta Lei, tendo em vista que a parte final do art. 134
determina que a competência da Defensoria Pública é destinada aos
necessitados. Dessa forma, não poderia o órgão impetrar ação que defendesse
direitos transindividuais da coletividade.

Dessa forma, o Congresso Nacional editou, em 2014, a Emenda


Constitucional 80, que aumentou o rol de competência da Defensoria Pública. A
nova redação do art. 134 da Constituição Federal ficou da seguinte forma:

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à


função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e
instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação
jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus,
judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma
integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º
desta Constituição Federal.

Em 7 de maio de 2015, o Supremo Tribunal Federal julgou a ADIN nº


3.943 e, na unanimidade, julgou improcedente os pedidos, confirmando a
legitimidade da Defensoria Pública para propor Ação Civil Pública, não
podendo, inclusive, restringir a competência a apenas os necessitados.

III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

Assim como o Ministério Público e a Defensoria Pública, os entes federados


– União, Estados, Municípios e o Distrito Federal – possuem capacidade de
impetrarem ação coletiva para reparação dos direitos elencados no art. 1º desta
Lei, eis que um de seus deveres é a proteção dos direitos da população.

IV – a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de


economia mista;

São as autarquias, fundações ou empresas públicas e as sociedades de


economia mista membros da Administração Pública Indireta, na qual os entes
federados delegam a competência de determinada função sua a uma pessoa
jurídica pública criada especificamente para esse fim. Damos o exemplo do
INSS, as universidades federais, a Caixa Econômica Federal e o Banco do
Brasil.

Tais pessoas jurídicas podem acionar judicialmente para defesa de direitos


difusos e coletivos. É importante salientar que o Código de Defesa do
Consumidor, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto do Idoso, que
vieram posteriormente à Lei de Ação Civil Pública não colocaram como
legitimados os membros da Administração Pública Indireta. Como não
declararam expressamente a impossibilidade de os mesmos acionarem
judicialmente para defesa de direitos difusos e coletivos do consumidor, da
criança e adolescente e dos idosos, respectivamente, estas podem fazer uso da
ação coletiva por ocasião do microssistema processual coletivo.

É importante mencionar, por fim, que a redação original da Lei 7.347/85


determinava que os legitimados do inciso IV deveriam possuir os requisitos
descritos atualmente para as associações (vide abaixo). Porém, com o advento da
Lei 11.448/07, os legitimados do inciso IV passaram a ter legitimidade ampla e
irrestrita para impetrar ação civil pública. Neste sentido:

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MICROSSISTEMA DE


TUTELA DE DIREITOS COLETIVOS (EM SENTIDO LATO).
ILEGITIMIDADE ATIVA. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DOS ARTS. 9º
DA LEI N. 4.717/65 e 5º, § 3º, DA LEI N. 7.347/85. POSSIBILIDADE.
ABERTURA PARA INGRESSO DE OUTRO LEGITIMADOS PARA
OCUPAR O PÓLO ATIVO DA DEMANDA. EXTINÇÃO SEM
RESOLUÇÃO DE MÉRITO. MEDIDA DE ULTIMA RATIO.
OBSERVAÇÃO COMPULSÓRIA DAS REGRAS DE DISTRIBUIÇÃO DE
COMPETÊNCIA ABSOLUTA. 1. Trata-se, na origem, de ação civil pública
ajuizada pelo Conselho Regional de Medicina da Seccional do Rio Grade
do Sul (CREMERS) contra o Estado do Rio Grande do Sul para discutir o
direito de pacientes que escolherem pelo atendimento do SUS à opção de
pagamento da chamada "diferença de classe" e à abstenção da exigência
prévia de que passem por triagem em posto de saúde a fim de que seja,
portanto, viabilizado o atendimento pelo médico escolhido pelos próprios
pacientes. 2. A sentença reconheceu a ilegitimidade ativa ad causam da
autarquia federal por considerar que, segundo a redação do art. 5º da Lei
n. 7.347/85 vigente à época da propositura da demanda, as autarquias que
intentassem ações como a presente deveriam comprovar a pertinência
temática entre seus objetivos institucionais e o objeto da demanda. O
acórdão recorrido reformou este entendimento, aplicando a nova redação
do referido dispositivo, que franqueia às autarquias, de forma ampla e
irrestrita - sem necessidade, pois, de pertinência temática -, a legitimidade
ativa para propor ações civis públicas. (STJ - REsp: 1177453 RS
2010/0014773-0, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data
de Julgamento: 24/08/2010, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação:
DJe 30/09/2010)

V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao


patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem
econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou
religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico.

O último inciso do art. 5º determina que as associações (união de pessoas


para o mesmo propósito) particulares cuja função seja a defesa e proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente, do consumidor, da ordem
econômica, da livre concorrência, dos direitos dos grupos raciais, étnicos ou
religiosos ou do patrimônio artístico, estético, histórico, turístico ou paisagístico
poderão impetrar ação coletiva. É o seguinte raciocínio: se a função principal de
tais associações é a proteção dos direitos supramencionados, por que não teriam
direito de adentrarem com ação visando a sua proteção judicial? Contudo, o
inciso V determina alguns requisitos para que as associações possuam
capacidade de adentrarem com tais ações. O primeiro é a pré-constituição de um
ano – ou seja, as associações devem existir há, pelo menos, um ano, para entrar
com a ação coletiva. O segundo é estar escrito, no estatuto que a cria, que a sua
função primordial seja a proteção dos interesses e direitos supramencionados.
Por fim, determina tal inciso que não precisa de autorização da assembleia da
associação para propositura da ação coletiva.

Vale salientar aqui o Parágrafo Único do art. 2º - A da Lei 9.494/97, que


determina que, “nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o
Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial
deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da assembléia da entidade
associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus
associados e indicação dos respectivos endereços.“. Assim, caso a associação
impetre ação coletiva contra os entes federados (União, Estados, Distrito
Federal, Municípios) e suas autarquias e fundações, deverá obrigatoriamente
juntar a ata da assembleia que autorizou a impetração da ação, relação nominal
dos associados e indicação dos respectivos endereços.

Entendemos haver uma superproteção legal aos entes federados


completamente desnecessária e que fere de morte a isonomia e a igualdade, eis
que não há motivos para requerer tal obrigatoriamente apenas aos entes
federados e deixar de fora as pessoas físicas e jurídicas de direito privado
(incluindo as empresas públicas e sociedades de economia mista), que não
necessitam tais documentos, sendo, portanto, inconstitucional, por tratar de
forma desigual os iguais.

§ 1º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte,


atuará obrigatoriamente como fiscal da lei.

Conforme visto no inciso I do art. 5º desta Lei, o Ministério Público é, por


força constitucional, o fiscal da lei (o chamado custus legis), possuindo como
devera defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais
e individuais indisponíveis. Assim, quando o Ministério Público não for parte no
processo, deverá atuar obrigatoriamente como fiscal da lei, devendo ser sua
intimação pedido pela parte.

§ 2º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas


nos termos deste artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das
partes.

Determina o § 2º do art. 5º desta Lei que o Poder Público e as associações


a que alude o inciso V do caput poderão se habilitar no processo como
litisconsortes – quando não são partes, logicamente – em qualquer Ação Civil
Pública de defesa dos direitos difusos e coletivos, de qualquer uma das partes.

§ 3º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por


associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a
titularidade ativa.

O legislador de 1985 temia que as grandes empresas criassem associações


de proteção de direitos transindividuais de fachada, para que estas acionassem a
empresa judicialmente de forma que não ganhasse a ação e coibisse outros
legitimados do caput deste artigo de acionar por força da coisa julgada, ou da
litispendência no caso de ação em curso. Preocupado, o legislador criou barreiras
para esse tipo de ação: primeiramente, os efeitos peculiares da coisa julgada, a
qual veremos no estudo do art. 16 desta Lei. Segundo, o referido no § 3º do art.
5º da mesma lei. Determina o referido parágrafo que, caso as associações
desistam ou abandonem uma Ação Civil Pública em curso, qualquer outro
legitimado do caput deste artigo assumirá como autor da ação e seguirá o seu
curso normalmente. Assim, evita-se que uma Ação Civil Pública que se encontre
durante anos no Judiciário seja abandonada sem motivo pelas associações de
fachada e obrigando os demais legitimados a retomarem a ação do começo.

Deve-se salientar que o § 3º do art. 5º desta Lei se aplica apenas as


associações legitimadas, sendo completamente silente aos demais legitimados do
caput; e diz “assumirá”, ao invés de “poderá assumir”, não sendo uma faculdade
dos legitimados do caput deste artigo assumirem a titularidade ativa, e sim uma
obrigação.

§ 4.° O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz,


quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou
característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

Determina o § 4º que as associações a que aludem o inciso V do caput


deste artigo, supramencionado, não precisarão do requisito da pré-constituição
(estarem formadas há, pelo menos, um ano) caso o interesse social ou relevância
do direito a ser protegido sejam enormes, devido a dimensão ou característica do
dano, a ser considerado pelo prudente critério do juiz. Por exemplo, determinado
modelo de veículo veio com sério defeito, na qual acaba por causar diversos
acidentes com seus motoristas, levando a amputação de membros e mortes, além
de inúmeros acidentes automobilísticos. Uma associação de proteção a direitos
consumeristas da cidade afetada, constituída há seis meses, poderá impetrar ação
coletiva para reparação dos danos sofridas – caso o juiz afaste o requisito da pré-
constituição -, devido a dimensão do dano causado.

§ 5.° Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios


Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos
interesses e direitos de que cuida esta lei.

Determina o § 5º do art. 5º da Lei 7.347/85 que poderão os órgãos do


Ministério Público se tornarem litisconsortes na defesa dos direitos difusos e
coletivos de que trata esta lei. Assim, o Ministério Público Federal poderá
auxiliar, por exemplo, o Ministério Público Estadual, sendo litisconsorte deste,
em uma Ação Civil Pública de defesa de direitos transindividuais relativos à
ordem econômica. Da mesma forma, o Ministério Público Estadual pode auxiliar
o Federal em uma Ação Civil Pública de defesa de direitos transindividuais de
esfera federal.

Deve-se salientar que o referido § 5º, assim como o parágrafo


subsequente, foi acrescido pelo art. 113 do Código de Defesa do Consumidor. Da
mesma forma, a legislação consumerista trazia a mesma redação no § 2º do art.
82. Entretanto, o então Presidente da República Fernando Collor de Melo vetou
o § 2º do art. 82 do Código de Defesa do Consumidor, sob a alegação de que o §
5º do art. 128 da Constituição Federal reserva à lei complementar a regulação
das atribuições e organização do Ministério Público, além do mesmo artigo
vedar o litisconsórcio entre os órgãos do parquet, esquecendo-se por completo
de vetar o art. 113, que acrescia na Lei 7.347/85 a mesma redação do então
vetado § 2º do art. 82 do Código de Defesa do Consumidor – ainda que tenha
mencionado o veto ao referido artigo no veto do Parágrafo Único do art. 92.
Como não há veto implícito (como bem decidiu o Superior Tribunal de Justiça,
no Recurso Especial 222582, de 2002), os §§ 5º e 6º do art. 5º da Lei 7.347/85
estão completamente válidos.

§ 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados


compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante
cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial.

O § 6º do art. 5º permite que os órgãos públicos legitimados pelo seu


caput – todos, com exceção das associações a que aludem o inciso V – podem
firmar uma espécie de contrato com os réus da Ação Civil Pública – ainda que
réus futuros – para que estes amoldam a sua conduta com a lei, sob pena de
cominações (multas diárias ou execução específica, por exemplo). Tais contratos
são os chamados Termos de Ajustamento de Conduta (TAC), de conhecimento
geral da população. As TAC, segundo a parte final do referido § 6º, possuem
força de título executivo extrajudicial, permitindo que o autor execute
diretamente o contrato na Justiça, sem precisar de uma ação de conhecimento
pretérita.

Deve-se salientar que, assim como o § 5º, o referido § 6º foi acrescido pelo
art. 113 do Código de Defesa do Consumidor. Da mesma forma, a legislação
consumerista trazia a mesma redação no § 3º do art. 82. Entretanto, o então
Presidente da República Fernando Collor de Melo vetou o § 3º do art. 82 do
Código de Defesa do Consumidor, sob a seguinte alegação, ipsislitteris: “É
juridicamente imprópria a equiparação de compromisso administrativo a título
executivo extrajudicial (C.P.C., art. 585, II). É que, no caso, o objetivo do
compromisso é a cessação ou a prática de determinada conduta, e não a entrega
de coisa certa ou pagamento de quantia fixada.”. O então Presidente, todavia,
esqueceu por completo de vetar o art. 113, que acrescia na Lei 7.347/85 a mesma
redação do então vetado § 3º do art. 82 do Código de Defesa do Consumidor –
ainda que tenha mencionado o veto ao referido artigo no veto do Parágrafo
Único do art. 92. Como não há veto implícito (como bem decidiu o Superior
Tribunal de Justiça, no Recurso Especial 222582, de 2002), os §§ 5º e 6º do art.
5º da Lei 7.347/85 estão completamente válidos.

Art. 6º Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá provocar


a iniciativa do Ministério Público, ministrando-lhe informações sobre fatos
que constituam objeto da ação civil e indicando-lhe os elementos de
convicção.

Para melhor proteção dos direitos difusos e coletivos contra danos de


ordem patrimonial ou moral, instituiu o art. 6º da Lei 7.347/85 que qualquer
pessoa poderá levar ao Ministério Público informações acerca de possível
violação de tais direitos. É uma oportunidade de a própria pessoa provocar a
iniciativa do parquet, não necessitando que a população espere, por livre e
espontânea vontade, que o órgão tome a iniciativa de investigar tais violações.
Entretanto, o art. 6º deu uma faculdade apenas à população em geral, que poderá
ou não utilizar. Os servidores públicos são OBRIGADOS a informar ao parquet
acerca de violações de direitos difusos e coletivos que tomarem ciência, podendo
sua recusa ser considerada infração administrativa e até criminal (prevaricação,
por exemplo).
Por fim, deve-se salientar que o art. 6º da Lei 7.347/85 determinou
apenas que o Ministério Público poderá ter sua iniciativa provocada, nada
dissertando acerca dos demais legitimados do artigo anterior. Tal situação se dá,
como vimos no estudo do § 1º do art. 5º desta lei, que o parquet tem como
função primordial a de proteção da lei, de custus legis. Dessa forma, incumbe a
ele a proteção dos direitos das pessoas, sendo, portanto, quem pode ter a sua
iniciativa provocada e o único legitimado para instaurar inquérito civil (art. 8º,
1º).

Art. 7º Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem


conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil,
remeterão peças ao Ministério Público para as providências cabíveis.

Complementando o art. 6º, determina o art. 7º da Lei de Ação Civil


Pública que os juízes e os desembargadores, caso fiquem sabendo de alguma
violação de direito difuso ou coletivo, por ocasião de seu mister, deverá remeter
peças ao Ministério Público, informando-lhe dos fatos. Como dito anteriormente,
é uma complementação do art. 6º, que determina a obrigatoriedade dos
servidores públicos de informar ao parquet sobre fatos que podem constituir
objeto de ação civil pública. Da mesma forma que o artigo precedente, não
poderão os juízes e desembargadores recusarem de remeter as peças, sob pena de
infração administrativa e criminal.

Art. 8º Para instruir a inicial, o interessado poderá requerer às


autoridades competentes as certidões e informações que julgar necessárias,
a serem fornecidas no prazo de 15 (quinze) dias.

Para facilitar a comprovação do alegado na Ação Civil Pública, permite o


art. 8º da Lei 7.347/85 que os legitimados do art. 5º poderão requerer acesso a
todas as certidões ou informações que entender ser necessárias existentes em
órgãos públicos ou particulares, que deverão prestar no prazo de quinze dias.
Somente nos casos do § 2º deste artigo poderão os órgãos negarem acesso a tais
informações ou certidões, as quais o juiz requisitará. Nos demais casos, não
poderão os órgãos públicos ou particulares negarem acesso, sob pena de infração
disciplinar ou, caso o solicitante for o Ministério Público, crime do art. 10 desta
Lei.

Tal possibilidade de pedido dos documentos e informações necessárias


para instruir a petição inicial adveio na Lei de Ação Popular (art. 1º, §§ 4º e 6º e
art. 7º, I, b), permitindo que os cidadãos que interpuserem tal ação tenham
acesso a documentos ou informações necessárias para esclarecimento da
verdade.

§ 1º O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência,


inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular,
certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual
não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis.

Em uma redação completamente autônoma do caput, determina o § 1º do


art. 8º da Lei de Ação Civil Pública que o Ministério Público pode instaurar
inquérito civil. Na segunda parte do mesmo parágrafo, disserta que o Ministério
Público possui poder para requisitar, de qualquer órgão público ou particular,
certidões, informações, exames ou perícias no prazo que assinalar, não inferior a
dez dias úteis.

Primeiramente, vamos visualizar acerca do inquérito civil. O que vem a


ser, primeiramente, um inquérito civil? Inquérito é um procedimento inquisitivo
que possui como função precípua buscar informações acerca de um fato para
imputar a responsabilidade a alguém. Há dois tipos de inquérito: o penal e o
civil. O inquérito penal tem como função buscar elementos que comprovam a
ocorrência de um crime e descobrem o seu autor, ou autores. Da mesma forma
funciona o inquérito civil, só que este tem como condão buscar a
responsabilidade civil de algum agente, por uma conduta praticada por este e que
feriu direito difuso ou coletivo.

O inquérito civil, ao contrário do inquérito penal, não é presidido pela


autoridade policial e sim pelo próprio Ministério Público, que é o único
competente para instaurar e presidir o inquérito civil – ou seja, os demais
legitimados do art. 5º não possuem poder para instaurar inquéritos civis. É o que
determina o inciso III do art. 129 da Constituição Federal, que diz que é
competência do parquet instaurar e presidir o inquérito civil.

Ademais, a segunda parte do § 1º do art. 8º desta Lei determina que o


Ministério Público possui competência para pedir certidões, informações,
exames ou perícias de qualquer órgão particular ou público, no prazo que
assinalar, não inferior a dez dias úteis. É uma diferenciação do caput deste
artigo, que permite a qualquer um solicitar informações ou certidões no prazo de
quinze dias. O prazo do Ministério Público é maior; entretanto, o parquet poderá
pedir, além das certidões e informações, exames ou perícias de qualquer órgão
público ou particular. Deve-se salientar também que a recusa do atendimento do
pedido do Ministério Público ou o retardamento ou omissão do mesmo é crime
previsto no art. 10 desta Lei.

Tal poder exacerbado e diferenciado dos demais legitimados do art. 5º se


dá por ocasião do fato de o Ministério Público ser custus legis. Dessa forma,
como custus legis, o Ministério Público possui poder diferenciado para agir, em
detrimento dos demais legitimados para propor a Ação Civil Pública.

§ 2º Somente nos casos em que a lei impuser sigilo, poderá ser negada
certidão ou informação, hipótese em que a ação poderá ser proposta
desacompanhada daqueles documentos, cabendo ao juiz requisitá-los.

Conforme mencionado no estudo do caput deste artigo, os legitimados do


art. 5º desta Lei podem requisitar nos órgãos públicos ou particulares certidões
ou informações necessárias para instruir a Ação Civil Pública, comprovando-se
o alegado nesta. Determina o § 2º do art. 8º a única situação em que os órgãos
podem negar acesso aos documentos: quando a lei impuser sigilo. Neste caso, os
legitimados do art. 5º entrarão com a ação desacompanhada desta(s)
certidão(ões) e/ou informação(ões) e o juiz as requisitará. Nos demais casos, não
podem os órgãos negarem o acesso, sob pena de infração disciplinar e crime do
art. 10 desta Lei, no caso de o solicitante ser o Ministério Público.

Art. 9º Se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas as


diligências, se convencer da inexistência de fundamento para a propositura
da ação civil, promoverá o arquivamento dos autos do inquérito civil ou das
peças informativas, fazendo-o fundamentadamente.

Pode o Ministério Público, ao final do inquérito civil, convencer de


inexistência de fundamentos para propor Ação Civil Pública – seja por ausência
de provas, seja por ausência de danos, seja por impossibilidade de descoberta do
autor dos fatos. Para tanto, deverá o Ministério Público fundamentar os motivos
do arquivamento, para que todos possam ter ciência dos mesmos.

§ 1º Os autos do inquérito civil ou das peças de informação


arquivadas serão remetidos, sob pena de se incorrer em falta grave, no
prazo de 3 (três) dias, ao Conselho Superior do Ministério Público.

Complementando o caput do art. 9º desta Lei, o seu § 1º determina que,


tão logo o Ministério Público arquive o inquérito civil, deverá enviar, no prazo
de três dias, ao Conselho Superior do Ministério Público (art. 130-A da
Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional 45, de 2004), para
que o mesmo homologue ou não o arquivamento, nos termos do § 3º deste
artigo.

§ 2º Até que, em sessão do Conselho Superior do Ministério Público,


seja homologada ou rejeitada a promoção de arquivamento, poderão as
associações legitimadas apresentar razões escritas ou documentos, que serão
juntados aos autos do inquérito ou anexados às peças de informação.

Determina o § 2º que, enquanto o Conselho Nacional do Ministério


Público não homologue ou rejeite o arquivamento, poderão as associações
legitimadas pelo inciso V do art. 5º desta Lei apresentar razões por escrito ou
documento, para ajudar na comprovação da homologação ou rejeitação do
pedido de arquivamento do inquérito civil.

§ 3º A promoção de arquivamento será submetida a exame e


deliberação do Conselho Superior do Ministério Público, conforme dispuser
o seu Regimento.

§ 4º Deixando o Conselho Superior de homologar a promoção de


arquivamento, designará, desde logo, outro órgão do Ministério Público
para o ajuizamento da ação.

Em complemento ao caput e ao § 1º deste artigo, o § 3º do art. 9º da Lei


7.347/85 determina que o Conselho Nacional do Ministério Público submeterá a
exame e deliberação o pedido de arquivamento, que poderá homologar ou
retificar o arquivamento. Caso homologue, o inquérito civil será, enfim,
arquivado. Caso o Conselho Nacional não homologue, designará outro órgão do
Ministério Público para ajuizar a Ação Civil Pública, afastando o órgão do
Ministério Público que pediu o arquivamento. É o que determina o § 4º do art.
9º.

Art. 10. Constitui crime, punido com pena de reclusão de 1 (um) a 3


(três) anos, mais multa de 10 (dez) a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do
Tesouro Nacional - ORTN, a recusa, o retardamento ou a omissão de dados
técnicos indispensáveis à propositura da ação civil, quando requisitados
pelo Ministério Público.
Para facilitar o acesso a dados indispensáveis à propositura da Ação Civil
Pública, determina o art. 10 da Lei 7.347/85 ser CRIME, com pena de reclusão
de um a três anos, mais multa no valor de 10 a 1000 ORTN[4] a recusa, o
retardamento ou a omissão da entrega de tais dados. Deve-se salientar que o
crime só ocorrerá quando os dados forem requisitados pelo Ministério Público,
conforme disserta a parte final do art. 10. Assim, se os demais legitimados do
art. 5º solicitarem tais dados e houver recusa, retardo ou omissão, aquele que
negou os dados não poderá responder por crime deste artigo. É um respeito ao
princípio do Direito Penal que só há fato típico quando todas as elementares do
tipo estiverem presentes. Todavia, podem os demais legitimados utilizarem dos
mecanismos a que aludem os art. 1º, §§ 4º e 6º e art. 7º, I, b da Lei de Ação
Popular, usando-os na Ação Civil Pública pelo microssistema processual
coletivo.

Tal crime também se encontra esculpido no art. 8º, VI da Lei 7853/89, a


qual veremos adiante. Neste tipo penal, entretanto, disserta apenas “quando
solicitados”, além de a pena ser de dois a cinco anos de reclusão. Dessa forma,
nas ações de proteção e defesa de direitos das pessoas com deficiência, poderá
incorrer em crime qualquer pessoa que recusar, retardar ou omitir dados
indispensáveis, ainda que quem solicitou não seja o Ministério Público.

Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de


fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da
atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução
específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou
compatível, independentemente de requerimento do autor.

Determina o art. 11 da Lei 7.347/85 que nas Ações Civis Públicas cuja
finalidade seja obrigar o réu a fazer ou deixar de fazer algo, o juiz determinará o
cumprimento do pedido na inicial. Caso o réu descumpra, poderá o juiz
determinar execução específica – podendo inclusive terceiro realizar a obrigação
de fazer, nos moldes do art. 249 do Código Civil e 817 do Código de Processo
Civil; ou determinar multa diária cuja finalidade seja obrigar o réu a cumprir a
decisão judicial, ainda que o autor não tenha requerido a imposição de multa.

Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem


justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.

Em consoância ao art. 4º da Lei de Ação Civil Pública, determina o art. 12


da mesma lei que o juiz pode conceder decisão liminar, para evitar dano
irreparável ou de difícil reparação se depender do findar do processo.

Justificação prévia, segundo o Código de Processo Civil, é uma audiência


na qual a parte produzirá provas – principalmente testemunhais – que servem
para comprovar o alegado no pedido cautelar. Segundo a legislação processual
civil, pode o juiz deferir uma liminar havendo ou não a audência de justificação
prévia, podendo ainda deferir a liminar sem oitiva da parte contrária, caso a sua
ciência poderá fazer com que a liminar se torne ineficaz – é a chamada liminar
inaudita altera pars (sem ouvir a parte contrária), da primeira parte do § 2º do
art. 300 do Código de Processo Civil

Por fim, determina ainda a legislação processual civil que as decisões


interlocutórias elencadas no art. 1.015 são suscetíveis de serem recorridas por
agravo de instrumento. Da mesma forma, a parte final do caput do art. 12, em
consoância com o Código de Processo Civil, determina que a decisão liminar
dada pelo juiz com base na primeira parte deste artigo e o art. 4º da mesma lei é
suscetível de ser recorrida por agravo. Para maiores informações acerca deste
recurso, vide o Código de Processo Civil, nos art. 1.015 e ss.

§ 1º A requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada,


e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia
pública, poderá o Presidente do Tribunal a que competir o conhecimento do
respectivo recurso suspender a execução da liminar, em decisão
fundamentada, da qual caberá agravo para uma das turmas julgadoras, no
prazo de 5 (cinco) dias a partir da publicação do ato.

Determina o § 1º do art. 12 que a pessoa jurídica de direito público


interessada (como ré da Ação Civil Pública) pode pedir ao Presidente do
Tribunal de Justiça para que este suspende a execução da liminar proferida pelo
juiz de primeira instância, quando houver lesão à ordem, saúde, segurança ou
economia pública. É uma forma diferenciada de tratamento dada às pessoas
jurídicas de direito público, pois as pessoas físicas ou jurídicas de direito privado
podem apenas solicitar ao relator do julgamento que suspenda a liminar – não a
execução da mesma. Por fim, determina a parte final do § 1º do art. 12 que a
decisão do Presidente do Tribunal é suscetível de recurso (no caso, agravo) para
uma das turmas julgadas, com prazo de cinco dias.

§ 2º A multa cominada liminarmente só será exigível do réu após o


trânsito em julgado da decisão favorável ao autor, mas será devida desde o
dia em que se houver configurado o descumprimento.

Conforme o Código de Processo Civil, o juiz pode, na decisão de liminar,


impor multa diária ao réu em caso de descumprimento de uma obrigação de
fazer, não fazer ou de entregar coisa. É uma forma de coagir o réu a cumprir a
liminar, sob pena de a mesma virar apenas um ordem escrita em um papel. O §
2º do art. 12 determina em qual momento essa multa poderá ser cobrada pela
parte autora. Segundo a redação do parágrafo, a multa poderá ser exigida
somente após o trânsito em julgado de uma decisão favorável ao autor, porém a
multa será devida desde o dia em que houver acontecido o descumprimento.

Por exemplo, o juiz determina que a empresa “X” limpe um rio poluído no
curso da Ação Civil Pública que cobra indenização por danos morais e materiais
em função da poluição do rio. A empresa é obrigada a limpar o rio a partir do dia
12 de março de 2015, por exemplo, sob pena de multa diária de R$ 1000,00 (mil
reais), mas descumpre a decisão. O trânsito em julgado da decisão que condena a
empresa a pagar a indenização supramencionada sai no dia 12 de abril. A multa
só poderá ser cobrada da empresa a partir do dia 12 de abril, mas o seu acúmulo
se faz desde o dia 12 de março (ou seja, a empresa deverá pagar R$ 1.000,00 por
dia do dia 12 de março em diante).

Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano


causado reverterá a um fundo gerido por um Conselho Federal ou por
Conselhos Estaduais de que participarão necessariamente o Ministério
Público e representantes da comunidade, sendo seus recursos destinados à
reconstituição dos bens lesados.

Como sabemos, aquele que comete ato ilícito (art. 186 e 187 do Código
Civil) é obrigado a indenizar a vítima pelo dano causado (art. 927 do Código
Civil). A indenização, conforme o art. 944, também do Código Civil, é em
dinheiro, em montante a ser determinado pelo juiz, pago à(s) vítima(s) do dano.
Nos casos das ações coletivas, para onde se vai este dinheiro, uma vez que as
vítimas normalmente são indeterminadas? No caso das ações de proteção dos
dinheiros individuais homogêneos (art. 81, Parágrafo Único, III do Código de
Defesa do Consumidor) o dinheiro irá para as vítimas, na forma do art. 97 a 100
da legislação consumerista. Já no caso dos direitos difusos e coletivos, de
vítimas ou danos indivisíveis (vide sobre os direitos difusos, coletivos e
individuais homogêneos no estudo do Parágrafo Único do art. 81 do Código de
Defesa do Consumidor), de difícil apuração, irá para um fundo gerido por um
Conselho Federal ou Estadual, que utilizará tal dinheiro para reconstituição dos
bens lesados.

§ 1o. Enquanto o fundo não for regulamentado, o dinheiro ficará


depositado em estabelecimento oficial de crédito, em conta com correção
monetária.

Determinou o art. 20 desta lei, a qual veremos adiante, que o Poder


Executivo teria 90 dias para regulamentar o fundo criado pelo caput do art. 13.
Entretanto, o fundo só foi criado e regulamentado em 1994, respectivamente,
pela Lei 9008 e Decreto 1306. Neste período, o dinheiro das condenações nas
ações civis públicas foi depositado em um estabelecimento oficial de crédito,
onde houve correção monetária (para que o dinheiro não perdesse o seu valor,
principalmente por ocasião da superinflação que assolou o Brasil do final da
década de 70 a 1994), por força do § 1º do art. 13.

§ 2o Havendo acordo ou condenação com fundamento em dano


causado por ato de discriminação étnica nos termos do disposto no art. 1o
desta Lei, a prestação em dinheiro reverterá diretamente ao fundo de que
trata o caput e será utilizada para ações de promoção da igualdade étnica,
conforme definição do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade
Racial, na hipótese de extensão nacional, ou dos Conselhos de Promoção de
Igualdade Racial estaduais ou locais, nas hipóteses de danos com extensão
regional ou local, respectivamente.

Instituído pela Lei 12.288, de 2010, o Estatuto da Igualdade Racial


modificou consubstancialmente a política brasileira de combate ao racismo e a
desigualdade originária da cor ou raça. Dentre várias formas de intensificar tal
política, a nova lei acresceu o § 2º no art. 13 da Lei de Ação Civil Pública,
determinando que nas ações coletivas, com indenização, em relação a ato de
discriminação ética, o dinheiro será recolhido ao Fundo estipulado pela Lei
9008/94, mas irá para ações de promoção da igualdade étnica, promovida pelo
Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racional ou pelos Conselhos
estaduais ou locais, de acordo com a extensão do dano.

Art. 14. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para
evitar dano irreparável à parte.
Em consoância ao art. 1.019, I do Código de Processo Civil, determina o
art. 14 da Lei 7.347/85 que, para se evitar dano irreparável ou de difícil
reparação a qualquer uma das partes da Ação Civil Pública, o juiz poderá
conferir efeito suspensivo aos recursos, não possibilitando o seu cumprimento
até o pronunciamento do julgador do recurso ou até o trânsito em julgado da
decisão.

Art. 15. Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da sentença


condenatória, sem que a associação autora lhe promova a execução, deverá
fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais
legitimados.

Determina o art. 15 que as associações a que aludem o inciso V do art. 5º


desta lei possuem o prazo de 60 dias para promover a execução da sentença que
condena alguém a reparar os danos patrimoniais e morais gerados de forma
coletiva. Caso não haja a execução, deverá fazer o Ministério Público, podendo a
Defensoria Pública, a Ordem dos Advogados do Brasil (por ocasião do
microssistema processual coletivo), os entes federados ou a Administração
Pública Indireta também executarem, caso queiram. Deve-se salientar que tal
execução se refere às ações de proteção de direitos difusos e coletivos, eis que os
art. 97 a 100 do Código de Defesa do Consumidor determina a forma como as
ações de proteção de direitos individuais homogêneos serão executadas.

Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da
competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado
improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer
legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se
de nova prova.

Determina o art. 16 da Lei 7.347/85 que a decisão da Ação Civil


Pública fará coisa julgada, impedindo novas ações sobre o mesmo tema, com
efeitos erga omnes, nos limites da competência territorial do órgão prolator.
Assim, se o juiz da cidade de Juiz de Fora/MG julgar uma Ação Civil Pública,
esta fará coisa julgada dentro da comarca de Juiz de Fora, não afetando, por
exemplo, a comarca do Rio de Janeiro ou de Belo Horizonte.

A parte final do art. 16, entretanto, traz uma ressalva: caso o pedido seja
improcedente por insuficiência de provas, qualquer outro legitimado do art. 5º
poderá intentar nova ação com mesmo fundamento, desde que se valendo de
novas provas. É uma tentativa do legislador de 1985 de evitar que grandes
empresas criem associações de fachada para que estas lhes acionem
judicialmente e percam por ausência de provas, impedindo que os demais
legitimados acionem a empresa para cobrar indenização pelos danos materiais e
morais cometidos, conforme explicamos anteriormente. Assim, se qualquer um
dos legitimados do art. 5º impetrar Ação Civil Pública e o pedido for julgado
improcedente por ausência de provas, ou por provas insuficientes, poderá
qualquer outro legitimado do art. 5º - não o que adentrou com a ação original –
impetrar nova ação, utilizando-se provas novas.

Deve-se salientar que o Código de Defesa do Consumidor definiu e


separou o que se tratava de direitos difusos e coletivos, além de criar os direitos
individuais homogêneos. Da mesma forma, criou-se novas regras acerca da coisa
julgada, diferentemente para cada um dos diferentes tipos de direitos
transindividuais. Assim, necessária é a leitura do art. 103 da legislação
consumerista, a qual estudaremos individualmente.

Por fim, é importante salientar a leitura dos art. 2º - A, caput e art. 2º - B


da Lei 9.494/97, que determinam efeitos da sentença em casos específicos.
Segundo o art. 2º - A, caput da Lei 9.494/97, a sentença prolatada em ação de
caráter coletivo proposta por entidade associativa, na defesa dos interesses e
direitos dos seus associados, abrangerá apenas os substituídos que tenham, na
data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do
órgão prolator, devendo ser aplicado em consoância ao inciso III do art. 103 do
Código de Defesa do Consumidor.

O próprio Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado no RE


612.043, julgado em 10 de maio de 2017, fixou a seguinte tese, aplicando-se o
referido art. 2º - A: “A eficácia subjetiva da coisa julgada, formada a partir de
ação coletiva de rito ordinário, ajuizada por associação civil na defesa de
interesses dos associados, somente alcança aos filiados residentes no âmbito da
jurisdição do órgão julgador que o fossem em momento anterior até a data da
propositura da demanda, constantes da relação juntada à inicial do processo de
conhecimento”, determinando que o resultado do julgamento só terá efeito aos
que eram filiados da associação autora ANTES da propositura da ação, não
afetando qualquer outra pessoa, seja os filiados posteriores, seja terceiros.

Já o art. 2º - B da mesma lei determina que a sentença que tenha por


objeto a liberação de recurso, inclusão em folha de pagamento, reclassificação,
equiparação, concessão de aumento ou extensão de vantagens a servidores da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive de suas
autarquias e fundações, somente poderá ser executada após seu trânsito em
julgado, protegendo-o os entes federados no espírito da referida lei.

Art. 17. Em caso de litigância de má-fé, a associação autora e os


diretores responsáveis pela propositura da ação serão solidariamente
condenados em honorários advocatícios e ao décuplo das custas, sem
prejuízo da responsabilidade por perdas e danos.

Segundo o art. 80 do Código de Processo Civil, ocorrerá litigância de má-


fé quando: deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato
incontroverso; alterar a verdade dos fatos; usar do processo para conseguir
objetivo ilegal;opuser resistência injustificada ao andamento do processo;
proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; provocar
incidente manifestamente infundado; interpuser recurso com intuito
manifestamente protelatório. Ou seja, são atos de má-fé praticados pela parte em
um processo. Nos processos individuais, determina o Código de Processo Civil
que há uma multa, com valor superior a um por cento e inferior a dez por cento
do valor da causa, mais indenizações e pagamento de despesas e honorários
advocatícios.

Já no processo coletivo, determina o art. 17 da Lei de Ação Civil Pública


que a associação de que trata o inciso V do art. 5º desta Lei que proceder com
litigância de má-fé será condenada solidariamente com os diretores responsáveis
nos honorários advocatícios e em uma multa equivalente ao déculo das custas,
além de possibilidade de condenação por perdas e danos, conforme determina o
art. 402 do Código Civil.

Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de
custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem
condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários
de advogado, custas e despesas processuais.

Como todos sabem, um processo é caro, com inúmeras custas, o que acaba
por inviabilizar que as pessoas com menos recursos tenham acesso ao Judiciário
para reaver os seus direitos violados. Para facilitar o acesso das pessoas mais
carentes ao Judiciário, em 1950 foi aprovada a Lei 1.060, que instituiu a
assistência jurídica gratuita, fazendo com que as pessoas carentes deixem de
arcar com os custos do processo – revogado posteriormente pela Lei 13.105/15,
que trata da matéria em seus art. 98 e a 102. Da mesma forma, o art. 18 da Lei de
Ação Civil Pública, para facilitar o acesso ao Judiciário, principalmente das
associações de defesa dos direitos difusos e coletivos, permitiu que não haverá
nenhum adiantamento de custas, nem de condenação da associação – exceto se
houver má-fé por parte desta, fartamente comprovada nos autos – em honorários
advocatícios, custas e despesas processuais, facilitando, pois, o ingresso das
associações perante o Judiciário para defesa dos direitos difusos e coletivos na
qual estas existem para defender.

Art. 19. Aplica-se à ação civil pública, prevista nesta Lei, o Código de
Processo Civil, aprovado pela Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, naquilo
em que não contrarie suas disposições.

Determina o art. 19 da Lei 7.347/85 que, para complementar acerca dos


requisitos processuais da Ação Civil Pública, pode-se utilizar subsidiriamente -
ou seja, há benefício de ordem entre uma e outra - o Código de Processo Civil
(aprovado pela Lei 13.105/15), complementando esta lei e não sendo
incompatível com esta. Vale salientar que a Lei 5.869/73 foi revogada pela Lei
13015/15 (Novo Código de Processo Civil), que entrou em vigor em março de
2016.

Art. 20. O fundo de que trata o art. 13 desta Lei será regulamentado
pelo Poder Executivo no prazo de 90 (noventa) dias.

Determina o art. 20 da Lei de Ação Civil Pública que o Fundo de Defesa dos
Direitos Difusos, tratado no art. 13 desta lei, deveria ser regulamentado pelo
Poder Executivo 90 (noventa) dias após a entrada em vigor desta lei. Apesar do
prazo dado pelo art. 20, o referido art. 13 só foi regulamentado em 9 de
novembro de 1994, pelo Decreto 1.306.

Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos


e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que
instituiu o Código de Defesa do Consumidor.

Determina o art. 21 da Lei 7.347/85 que as normas existentes no Código de


Defesa do Consumidor – como os art. 81 e 103 – poderão ser aplicadas nas ações
de defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, no que não
contrair suas disposições. Tal artigo, junto do art. 90 do CDC, criou o
microssistema processual coletivo, visto anteriormente.

Art. 22. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

A Lei de Ação Civil Pública entrou em vigor no dia que foi publicada (24
de julho de 1985), produzindo efeito a partir das 0hs do dia seguinte.

Art. 23. Revogam-se as disposições em contrário.

Tendo em vista a incompatibilidade da Lei de Ação Civil Pública com


outros dispositivos legais, o último artigo da lei revogou todas as disposições
legislativas até então em vigor que são contrários a seu texto – exceto a
Constituição Federal. Assim, qualquer lei anteriormente em vigor até a data que
a Lei de Ação Civil Pública entrou em vigor (vide artigo supramencionado), está
expressamente revogado.

Brasília, em 24 de julho de 1985; 164º da Independência e 97º da


República.
DEFESA DOS DIREITOS
TRANSINDIVIDUAIS DOS
CONSUMIDORES

Em se tratando de Direitos Difusos e Coletivos, a segunda legislação mais


importante é o Código de Defesa do Consumidor, ou CDC. Promulgado dois
anos após a Constituição de 1988 e por ordem desta (inciso XXXII do art. 5º e
inciso V do art. 170, além do art. 48 da ADCT), o Código de Defesa do
Consumidor inovou a legislação acerca dos direitos difusos e coletivos,
ampliando a Lei 7.347/85, a Lei de Ação Civil Pública, pequena e com inúmeras
lacunas.

O Código de Defesa do Consumidor inovou, primeiramente, em conceituar


os direitos difusos e coletivos, além de criar os individuais homogêneos
(Parágrafo Único do at. 81). Da mesma forma, o CDC trouxe matéria acerca das
ações de defesa dos direitos individuais homogêneos, nos art. 91 e ss. Pode-se
citar também o art. 103, que aumentou a forma como a legislação trata a coisa
julgada em ação coletiva, ao contrário da generalização ocorrida pelo art. 16 da
Lei 7.347/85.

Dessa forma, o CDC ampliou a legislação que trata sobre a matéria Direitos
Difusos e Coletivos, não se restrigindo mais à pequena Lei 7.347/85, inclusive
modificando esta e criando, em seus art. 90 e 117, o microssistema processual
coletivo. Muito do que existe acerca dos Direitos Difusos e Coletivos adveio do
Código de Defesa do Consumidor, por isso seu estudo é imprescindível.

E não só a matéria dos Direitos Difusos e Coletivos inovou o Código de


Defesa do Consumidor. A legislação consumerista modificou por completo a
forma de tratamento entre aquele que adquire um produto ou serviço (o
consumidor) daquele que o vende ou presta (o fornecedor), assegurando diversos
direitos do primeiro e barrando ações do segundo que podem prejudicar o
primeiro. O Código de Defesa do Consumidor, portanto, é uma ferramenta
indispensável no estudo não só dos Direitos Difusos e Coletivos mas também
dos direitos da pessoa humana – como consumidora.

Todavia, devido a dimensão do mesmo, o seu texto foi reduzido para os


assuntos pertinentes à matéria Direitos Difusos e Coletivos, dando maior
enfoque dos art. 81 ao 100, que trata exclusivamente da matéria, mas também
trazendo outros pontos do texto legislativo que trata dos direitos da pessoa como
consumidora ou dos deveres da pessoa como fornecedora, além do conceito legal
de quem é consumidor e de quem é fornecedor.

LEI Nº 8.078, DE 11 DE SETEMBRO DE 1990.

[...]

TÍTULO III
Da Defesa do Consumidor em Juízo

CAPÍTULO I
Disposições Gerais

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das


vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

O Título III do Código de Defesa do Consumidor trata acerca da proteção e


defesa dos direitos consumeristas em juízo e a forma que as mesmas irão ocorrer.
Determina o seu primeiro artigo que a defesa dos interesses e direitos dos
consumidores – propriamente ditos, ou equiparados, na forma dos art. 2º,
Parágrafo Único, 17 e 29 – poderão ocorrer invididual ou coletivamente.
Individualmente ocorrerá quando o próprio consumidor adentrará com uma ação
judicial visando a defesa ou reparação de seus direitos. Dá-se, por exemplo,
quando o fornecedor não aceita a escolha do consumidor que adquiriu produto
ou serviço defeituoso (art. 18, § 1º, 19, caput e 20, caput) ou o direito de
arrependimento do mesmo (art. 49). O próprio consumidor adentra com um
pedido na Justiça para que aja a defesa ou reparação de seus direitos. Entretanto,
em determinados casos, pode ocorrer violação aos direitos dos consumidores
não apenas a um ou dois consumidores, mas sim a uma grande gama deles – por
exemplo, de um bairro ou de uma cidade inteira, ou de um número impossível de
se calcular. Nestes casos, poderá a defesa ou reparação dos direitos dos
consumidores ser de forma coletiva.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

O Parágrafo Único do art. 81 do Código de Defesa do Consumidor


complementa o seu caput, ao determinar em quais momentos poderá ocorrer a
proteção ou reparação coletiva. Segundo o supramencionado parágrafo, poderá
ocorrer a defesa coletiva dos direitos consumeristas quando se tratar de direitos
difusos, coletivos ou individuais homogêneos. Porém, o que vem a ser tais
direitos? São direitos transindividuais, em que um grupo ou a coletividade possui
aquele direito, sem que o consiga dividi-lo. Entretanto, cada um dos direitos
supramencionados possui peculiaridades, que diferenciam um do outro, a qual
passaremos a trabalhar agora.

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste


código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares
pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;

São interesses ou direitos difusos aqueles que não se consegue diferenciar o


consumidor prejudicado daquele que não o é; são pessoas indeterminadas,
ligadas a uma circunstância de fato. Damos o exemplo do transporte público
municipal. Se o serviço for interrompido para determinado bairro, não se pode
determinar quais pessoas serão as prejudicadas – não se podendo, inclusive,
determinar que somente as pessoas daquele bairro serão prejudicadas -, eis que
não se pode mensurar quais pessoas poderão utilizar aquele transporte – ainda
que eventualmente. Pode ser uma pessoa que queira visitar um parente que ali
reside, outro que quer ir a uma festa na localidade. Não se tem como precisar
qual consumidor está sendo prejudicado pelo corte do transporte público
municipal àquele determinado bairro.

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos


deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular
grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte
contrária por uma relação jurídica base;

São interesses ou direitos coletivos aqueles transindividuais a qual um grupo,


categoria ou classe de pessoas são ligadas entre si e/ou com a parte contrária por
uma relação jurídica base. São sujeitos determináveis (ou seja, se consegue
determinar), ainda que sejam, a primeiro momento, indeterminados. Damos o
exemplo de uma escola particular, que aumenta abusivamente as mensalidades.
Os consumidores são os alunos e/ou seus responsáveis (pertencentes a uma
categoria de pessoas, ligadas com a parte contrária pelo contrato de prestação de
serviços educacionais). A defesa do direito patrimonial destes consumidores
pode ser tutelada a título coletivo, eis se tratar de direito coletivo.

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos


os decorrentes de origem comum.

São interesses ou direitos individuais homogêneos os que são individuais,


com consumidores e danos determinados, porém de origem comum. Diferencia-
se dos direitos difusos e coletivos devido a facilidade de determinação dos
consumidores e dos danos a estes causados. Damos o exemplo de um acidente
aéreo, onde faleceu os duzentos passageiros e destruiu doze residências. Há uma
extrema facilidade de se mensurar o dano sofrido por cada consumidor (morte;
destruição – parcial ou total – das residências), e a origem do dano é comum a
todos (acidente áereo). Pode cada consumidor – ou familiar, no caso dos
falecidos – adentrar com ação judicial individual pleitando a reparação dos
danos sofridos; ou pode ser impetrada ação coletiva pleiteando a reparação dos
danos sofridos por todos. Tal direito tem como condão evitar uma enxurrada de
processos judiciais, além da unificação do caso. Imagina se cada consumidor
adentra com uma ação individual e tem uma resposta do Judiciário distinta – um
dizendo que não possui direito, outro que possui, etc.? Para evitar tal caso, pode
os direitos destes consumidores serem tutelados de forma coletiva.

Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados
concorrentemente:

O art. 82 tem como condão complementar o art. 81, caput e Parágrafo Único,
no tocante à proteção de forma coletiva dos direitos consumeristas. O Parágrafo
Único do art. 81 determina em quais momentos poderão ser impetradas as ações
coletivas; o art. 82 determina quem é competente para adentrar com tais ações.
Como tem como função a proteção de todos os consumidores envolvidos, o
consumidor lesado não pode adentrar com ação individual para proteção ou
reparação de todos os consumidores – apenas de seus direitos. Só poderão
adentrar com processos coletivos os elencados no art. 82, a qual estudaremos
individualmente – com exceção da Defensoria Pública. Tal instituição recebeu
permissão legislativa para propositura de ação coletiva pela Lei 11488/07, que
modificou o rol do art. 5º da Lei de Ação Civil Pública (rol idêntico ao do art. 82
do Código de Defesa do Consumidor), podendo ser aplicada a este Código por
seu art. 90, a qual veremos oportunamente.
I - o Ministério Público;

A Constituição Federal determina, em seu art. 127, que o Ministério


Público tem como função: “a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e
dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”. Portanto, cabe ao parquet a
proteção dos interesses da sociedade como um todo. Determina ainda a Carta
Magna, em seu art. 129, inciso III, que é função do Ministério Público:
“promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio
público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.
Ou seja, a própria Constituição Federal determina ser função ministerial a
proteção dos direitos difusos e coletivos – como os direitos consumeristas.
Possui o Ministério Público, portanto, a função de “custus legis”, ou seja, fiscal
da lei, havendo o dever de fiscalizar a boa aplicação das leis – principalmente
em se tratanto de interesses sociais. Dessa forma, detém tal órgão direito de
adentrar com a ação coletiva para proteção dos direitos transindividuais dos
consumidores.

Por fim, é mister mencionar que, de acordo com a jurisprudência do Superior


Tribunal de Justiça, "o Ministério Público, no âmbito de ação consumerista, faz
jus à inversão do ônus da prova, a considerar que o mecanismo previsto no
art. 6º, inc. VIII, do CDC busca concretizar a melhor tutela processual possível
dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos e de seus titulares - na
espécie, os consumidores -, independentemente daqueles que figurem como
autores ou réus na ação" (REsp 1.253.672/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell
Marques, Segunda Turma, DJe 9/8/2011).

II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;

Assim como o Ministério Público, os entes federados – União, Estados,


Municípios e o Distrito Federal – possuem capacidade de impetrarem ação
coletiva para reparação dos direitos dos consumidores, eis que um de seus
deveres é a proteção dos direitos da população. É dever salientar, entretanto, que
os órgãos descentralizados (que possuem personalidade jurídica distinta, como
as autarquias) não possuem capacidade de adentrarem com tais ações – a menos
que estejam encaixadas no inciso III, a qual veremos adiante -, por efeito deste
inciso. Todavia, o art. 5º, IV da Lei 7.347/85 permite às autarquias, empresas
públicas, fundações e sociedades de economia mista impetrarem Ação Civil
Pública, podendo ser utilizada neste Código por causa do art. 90.
III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou
indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados
à defesa dos interesses e direitos protegidos por este código;

Determina o inciso III do art. 82 do Código de Defesa do Consumidor que


possui capacidade de impetrar ação coletiva os órgãos e entidades públicas cuja
função principal seja a proteção dos direitos e interesses consumeristas. Afinal,
se tais órgãos e entidades possuem como função a proteção dos direitos
consumeristas, por que não poderia ter direito de adentrar com ação visando a
proteção judicial de tais direitos? Seria completamente ilógico. Portanto, tais
órgãos e entidades possuem capacidade de adentrar com ação coletiva.

IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e


que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos
protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear.

O último inciso do art. 82 determina que as associações (união de pessoas


para o mesmo propósito) particulares cuja função seja a defesa dos interesses e
direitos consumeristas podem impetrar ação coletiva. É o mesmo raciocínio do
inciso III: se a função principal de tais associações é a proteção dos direitos
consumeristas, por que não teriam direito de adentrarem com ação visando a
proteção judicial?

Contudo, o inciso IV determina alguns requisitos – não existentes no


inciso III – para que as associações possuem capacidade de adentrarem com tais
ações. O primeiro é a pré-constituição de um ano – ou seja, as associações
devem existir há, pelo menos, um ano, para entrar com a ação coletiva. O
segundo é estar escrito, no estatuto que a cria, que a sua função primordial seja a
proteção dos direitos e interesses consumeristas dos associados. Em
contrapartida, não há necessidade de autorização da assembleia da associação
para propositura da ação coletiva.

É importante mencionar, ao final, que a Lei 9.870/99, ao esculpir regras


pertinentes ao valor da mensalidade, determina que a associação de alunos, pais
de alunos e responsáveis são legitimados para propor a ação que trata o Código
de Defesa do Consumidor,desde que haja, no mínimo, 20% (vinte por cento) dos
pais ou responsáveis dos alunos do estabelecimento de ensino ou dos alunos, no
caso de ensino superior (artigo 7º).
§ 1° O requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz,
nas ações previstas nos arts. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse
social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela
relevância do bem jurídico a ser protegido.

Determina o § 1º que as associações a que aludem o inciso IV do caput deste


artigo, supramencionado, não precisarão do requisito da pré-constituição
(estarem formadas há, pelo menos, um ano) caso o interesse social ou relevância
do direito a ser protegido sejam enormes, devido a dimensão ou característica do
dano, a ser considerado pelo prudente critério do juiz. Por exemplo, determinado
modelo de veículo veio com sério defeito, na qual acaba por causar diversos
acidentes com seus motoristas, levando a amputação de membros e mortes, além
de inúmeros acidentes automobilísticos. Uma associação de proteção a direitos
consumeristas da cidade afetada, constituída há seis meses, poderá impetrar ação
coletiva para reparação dos danos sofridas – caso o juiz afaste o requisito da pré-
constituição -, devido a dimensão do dano causado. Por fim, é importante
salientar que tal dispensa do requisito da pré-constituição só poderá ocorrer nas
ações de defesa dos interesses individuais homogêneos (Parágrafo Único, inciso
III do art. 81) – nunca nas ações de proteção de direitos difusos ou coletivos -,
tendo em vista estas estarem elencadas no art. 91 e ss. deste Código, a qual
veremos oportunamente.

§§ 2° e 3º VETADOS.

Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este
código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua
adequada e efetiva tutela.

O art. 83 complementa o caput do art. 82 e o Parágrafo Único do art. 81,


todos do Código de Defesa do Consumidor. Este primeiro tem como função
determinar quais ações podem ser impetradas para proteção e reparação dos
direitos dos consumidores, no tocante às tutelas coletivas. Segundo o referido
artigo, é admitido qualquer tipo de ação capaz de defender, de forma adequada e
efetiva, os direitos transindividuais dos consumidores.

Vale salientar acerca da principal delas, a ação civil pública, estipulada


no art. 1º da Lei 7.347/85, que visa a reparação dos danos morais e materiais
causados ao meio ambiente; ao consumidor; aos bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; por infração da ordem
econômica; à ordem urbanística; à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos
ou religiosos; ao patrimônio público e social e a qualquer outro interesse difuso
ou coletivo. Apesar de tal ação se encontrar determinada na Lei 7.347/85, esta
possui permissão do art. 90 para o seu uso na proteção e reparação dos direitos
consumeristas, nos moldes e nas regras do Código de Defesa do Consumidor.

Parágrafo único. VETADO.

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação


de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou
determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao
do adimplemento.

O caput do art. 84 determina que nas ações de obrigação de fazer ou não


fazer o juiz poderá determinar que haja a tutela específica da obrigação (que o
fornecedor faça ou não faça, como pedido na ação) ou medidas capazes de
chegar ao resultado equivalente ao adimplemento (por exemplo, que o oficial de
justiça adentre no estabelecimento comercial do fornecedor e troque o produto
viciado, como deveria fazer o fornecedor, no caso do § 1º do art. 18). Esta norma
tem como função abrir uma possibilidade ao Poder Judiciário de cumprir a
sentença quando o fornecedor, mesmo com a decisão determinando que o
mesmo aja ou deixe de agir, se recuse a cumpri-la.

§ 1° A conversão da obrigação em perdas e danos somente será


admissível se por elas optar o autor ou se impossível a tutela específica ou a
obtenção do resultado prático correspondente.

Só poderá o Poder Judiciário converter a obrigação de fazer ou não fazer a


que alude o caput deste artigo em perdas e danos caso o consumidor queira ou
seja impossível a tutela específica ou resultado prático equivalente. Por exemplo,
o consumidor ajuiza ação pedindo a troca de produto viciado (§ 1º do art. 18);
porém, o fornecedor fechou, não comercializando mais produtos – não podendo,
assim, trocar o produto viciado por outro. Assim, poderá o juiz converter a
obrigação de fazer em perdas e danos, determinando o pagamento, por parte do
fornecedor, ao consumidor do que este perdeu e do que razoavelmente deixou de
ganhar. Da mesma forma, poderá ainda o magistrado converter, na forma deste
parágrafo, caso o consumidor queira – ele comprou um ventilador para se
refrescar no verão; o ventilador não liga. O fornecedor não o conserta no prazo
de trinta dias, obrigando o consumidor a obrigá-lo judicialmente. Neste meio
tempo, o consumidor adquiriu outro ventilador, tendo em vista não suportar o
forte verão que assola sua região. Não precisará, portanto, de dois; pode, assim,
pedir a conversão da obrigação em perdas e danos.

§ 2° A indenização por perdas e danos se fará sem prejuízo da


multa (art. 287, do Código de Processo Civil).

Determina o § 2º, em complemento ao § 1º, que, além de o fornecedor pagar


pelo o que consumidor perdeu e o que razoavelmente deixou de ganhar, poderá
ainda ser compelido a pagar multa por ter descumprido a obrigação de fazer ou
não fazer; ou por não ter cumprido a sentença que o condenou a agir, ou se
abster de agir. Tal dispositivo tem como condão punir o fornecedor que
descumpriu a decisão judicial a ele imposta.

§ 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo


justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder
a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.

É permitido ao juiz, caso haja fundamento relevante da demanda (por


exemplo, comprovante técnico do vício do produto e da negação do fornecedor
em trocá-lo por outro) e receio de ineficácia do provimento final (por exemplo, o
fornecedor está fechando suas portas, podendo, assim, impedir o cumprimento
da sentença ao final), conceder os pedidos do processo no curso do mesmo,
citando o réu. É o que determina o § 3º do art. 84 deste Código, em consoância
ao art. 300 e ss. do Código de Processo Civil. Assim, o magistrado poderá, no
exemplo supramencionado, determinar a troca do produto viciado antes da
sentença final do processo, através de uma liminar, podendo deferi-la após uma
audiência prévia, na qual o autor justificará ao juiz da importância da
antecipação do pedido final.

§ 4° O juiz poderá, na hipótese do § 3° ou na sentença, impor multa


diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou
compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento
do preceito.

Para o bom cumprimento da sentença ou da liminar a que alude o parágrafo


antecedente, pode o juiz determinar multa diária ao fornecedor, para compeli-lo
a cumprir a obrigação de fazer ou não fazer. Assim, quanto mais o fornecedor
demorar para cumprir com a sentença ou liminar, maior será a multa – até um
limite máximo, estipulado pelo próprio magistrado. Tal multa só não poderá ser
exigida se for insuficiente ou incompatível com a obrigação, por qualquer
motivo.

§ 5° Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático


equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como
busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra,
impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial.

Para que haja o cumprimento da sentença que determina a obrigação de fazer


ou não fazer por parte do fornecedor, pode o juiz determinar qualquer medida
necessária – assim como a multa estipulada no parágrafo antecedente -, como
remover publicidade julgada enganosa ou abusiva, remoção de produtos (deve
salientar acerca da diferença deste parágrafo para a sanção administrativa a que
alude o art. 56, II deste Código, que ocorre como sanção por uma infração
administrativa nos moldes do art. 58), força policial (para, por exemplo, adentrar
na loja e trocar o produto viciado), dentre outros. Qualquer coisa – exceto o que
for contrário à lei, como matar o fornecedor, por exemplo - que o juiz julgue
necessário para o cumprimento da sentença, poderá ordenar que aconteça.

Art. 85 e 86. VETADOS.

Art. 87. Nas ações coletivas de que trata este código não haverá
adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer
outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada
má-fé, em honorários de advogados, custas e despesas processuais.

Artigo com redação idêntica ao art. 18 da Lei 7.347/85, determina o caput do


art. 87 do Código de Defesa do Consumidor que nas ações coletivas para
proteção dos direitos transindividuais a que alude o Parágrafo Único do art. 81,
não haverá adiantamento de custas processuais (somente ao final, pela parte que
sucumbir, ou seja, perder o processo), honorários do perito e qualquer outra
despesa, além de condenção da associação autora em honorários de advogados
(honorários sucumbenciais apenas) e custas processuais, em caso de
sucumbência, a menos que seja comprovada a má-fé da parte.

Parágrafo único. Em caso de litigância de má-fé, a associação


autora e os diretores responsáveis pela propositura da ação serão
solidariamente condenados em honorários advocatícios e ao décuplo das
custas, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos.

Texto com a mesma redação do art. 17 da Lei 7.347/85, a qual vimos no


estudo da referida lei, disserta o Parágrafo Único do art. 87 que caso haja
litigância de má-fé por parte das associações autoras, esta e seus diretores serão
solidariamente responsáveis pelo pagamento dos honorários sucumbenciais do
advogado e multa no valor do décuplo das custas, além do pagamento de
eventuais perdas e danos.

Art. 88. Na hipótese do art. 13, parágrafo único deste código, a ação
de regresso poderá ser ajuizada em processo autônomo, facultada a
possibilidade de prosseguir-se nos mesmos autos, vedada a denunciação da
lide.

Determina o art. 13 deste Código sobre a responsabilidade do comerciante


nos casos de fato do produto, sendo que seu Parágrafo Único determinou a
possibilidade de o mesmo cobrar – em ação de regresso – o que pagou contra o
verdadeiro responsável pelo dano causado pelo produto. O art. 88 determina que
tal cobrança poderá vir a ser utilizada em processo autônomo ou nos próprios
autos, após o pagamento total ao consumidor lesado. Todavia, tal artigo veda a
denunciação à lide, impedindo o comerciante chamar ao processo o fabricante, o
importador ou construtor, por exemplo. É uma uma forma de a legislação
proteger o consumidor - afinal, imagina o mesmo contra uma loja de varejo
gigantesco e uma fábrica multinacional, em um mesmo processo? O poderio
econômico de ambas poderia fazer com que a balança pesasse ao seu lado – fora
que ambas poderiam segurar o processo por anos, impedindo o consumidor de
receber a devida reparação pelos danos a ele causados.

Art. 89. VETADO.

Art. 90. Aplicam-se às ações previstas neste título as normas do


Código de Processo Civil e da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, inclusive
no que respeita ao inquérito civil, naquilo que não contrariar suas
disposições.

O Código de Defesa do Consumidor determina, em seu art. 90, que as


normas existentes no Código de Processo Civil (Lei 13.105/15) e naLei 7.347/85
– como a respeito do inquérito civil e da ação civil pública – poderão ser
aplicadas nas ações previstas neste Código, no que não contrariar suas
disposições. Tal artigo criou, junto do art. 21 da Lei de Ação Civil Pública o
microssistema processual coletivo, na qual adentraram outros dispositivos legais,
como o ECA (art. 208 a 224) e o Estatuto do Idoso (art. 78 a 92), dentre outros.

CAPÍTULO II
Das Ações Coletivas Para a Defesa de Interesses Individuais Homogêneos

Art. 91. Os legitimados de que trata o art. 82 poderão propor, em


nome próprio e no interesse das vítimas ou seus sucessores, ação civil
coletiva de responsabilidade pelos danos individualmente sofridos, de
acordo com o disposto nos artigos seguintes.

O Capítulo II do Título III do Código de Defesa do Consumidor determina


acerca das ações coletivas para proteção ou reparação dos direitos individuais
homogêneos a que alude o inciso III do Parágrafo Único do art. 81. Tais regras,
portanto, não são aplicadas às ações coletivas de defesa de direitos difusos ou
coletivos, devendo, nestes casos, aplicar a Lei 7.347/85 por ocasião do
microssistema processual coletivo. É o que determina o art. 91 deste Código.

Art. 92. O Ministério Público, se não ajuizar a ação, atuará sempre


como fiscal da lei.

Como vimos no estudo do art. 82, no tocante ao Ministério Público, o


referido órgão possui como competência constitucional a fiscalização da lei. O
art. 92 aplica exatamente tal preceito, ao determinar que o órgão ministerial agirá
como custus legis toda vez que não for parte – ou seja, não ajuizar a ação
coletiva. E tal regra não se restringe apenas às ações de proteção de direitos
individuais homogênicos, mas também aos direitos difusos e coletivos, por força
do § 1º do art. 5º da Lei 7.347/85. O autor, portanto, deve pedir a intimação do
Ministério Público para todos os atos.

Parágrafo único. VETADO.

Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente


para a causa a justiça local:

I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de


âmbito local;

II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os


danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de
Processo Civil aos casos de competência concorrente.

O art. 93 do Código de Defesa do Consumidor determina a comarca


competente para o processamento e julgamento da ação coletiva. Não segue,
portanto, tal ação a regra geral esculpida no art. 42 e ss. do Código de Processo
Civil, que determinam as regras ordinárias de competência. No caso das ações
visando proteção ou reparação dos direitos individuais homogêneos, será
competente a comarca do local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, se este for
de âmbito local. Assim, se um avião cair em São Paulo, matando os passageiros
e destruindo residências, a comarca da capital será competente para o
processamento e julgamento da causa. Entretanto, caso esta seja de âmbito
nacional ou regional, a comarca competente será a da capital do Estado ou do
Distrito Federal. Assim, se houver, por exemplo, vendas de veículos danificados
para toda Minas Gerais, o foro competente para a reparação dos danos causados
será Belo Horizonte, capital do Estado.

Deve salientar, primeiramente, que tal regra será exigida apenas no caso de
ações coletivas visando reparação de danos individuais homogêneos. No caso de
ações individuais, em que o consumidor ajuiza contra o fornecedor pedindo a
reparação de fato do produto, por exemplo, o foro competente será o dele,
conforme estipulado no inciso I do art. 101 deste Código, que veremos
oportunamente. Segundo, é importante salientar que, haja caso competência da
Justiça Federal (vide art. 109 da Constituição Federal) - quando há interesse da
União -, será esta a competente para o processamento da causa – e não a Justiça
Estadual, utilizando, entretanto, a regra do art. 93 para a competência territorial –
ou seja, em qual comarca será processada e julgada.

Art. 94. Proposta a ação, será publicado edital no órgão oficial, a fim
de que os interessados possam intervir no processo como litisconsortes, sem
prejuízo de ampla divulgação pelos meios de comunicação social por parte
dos órgãos de defesa do consumidor.

Edital é uma ordem, aviso, postura, citação, dentre outros, que se prende em
um local visível ao público, para conhecimento geral ou dos interessados. A
título de exemplo, damos o caso da citação por edital a que alude o art. 256 do
Código de Processo Civil. Caso o réu, citado para responder a ação movida
contra ele, não seja encontrado, o juiz mandará afixar em local visível um edital
explicando a ação e a citação do mesmo, para que todos possam ler e ficar
cientes do mesmo – e, caso alguém tenha contato com o réu, possa avisá-lo da
citação; ou mesmo, se o próprio réu ler o edital, ficará ciente do processo. No
caso do art. 94 do Código de Defesa do Consumidor, o edital será afixado com o
intuito de que os interessados – por exemplo, os consumidores propriamente
ditos e os equiparados lesados – possam intervir no processo como litisconsortes,
auxiliando os legitimados do art. 82 na busca da proteção ou reparação dos
direitos individuais homogêneos. Ademais, determina a parte final do referido
artigo que pode a ação ser divulgada aos órgãos de defesa do consumidor, para
ciência dos mesmos.

Art. 95. Em caso de procedência do pedido, a condenação será


genérica, fixando a responsabilidade do réu pelos danos causados.

O art. 95 determina que a sentença que porventura condenar o fornecedor


ditará apenas a sua responsabilidade pelos danos causados aos consumidores,
não fixando o quanto de dano cada consumidor sofreu. Após o trânsito em
julgado da sentença (quando não couber mais recurso), o processo adentrará na
sua fase de liquidação, a qual se dará valores à sentença outrora genérica. Nesta
fase, explicada pelo Código de Processo Civil, em seus art. 509 a 512, será
montado um novo processo (na chamada liquidação por pelo procedimento
comum, a que alude o art. 511), no qual se analisará o dano sofrido por cada
consumidor. Ao final, a sentença terá valor pecuniário, na qual poderá, enfim,
ser cobrado do fornecedor.

Art. 96. VETADO.

Art. 97. A liquidação e a execução de sentença poderão ser promovidas


pela vítima e seus sucessores, assim como pelos legitimados de que trata o
art. 82.

A liquidação de sentença se dá após o trânsito em julgado da decisão,


em uma fase processual que tem como objetivo dar valor à sentença genérica. Já
execução é o cumprimento da sentença (art. 513 a 519 do Código de Processo
Civil), em que obriga o réu a pagar montante certo, a cumprir obrigação de fazer
ou não fazer, ou de dar um bem, dando-lhe o prazo de 15 (quinze) dias (art. 523,
caput) para pagamento, sob pena de penhora e venda de seus bens, além de
acréscimo no valor total e nos honorários advocatícios no montante de 10% (dez
por cento). Determina o Código de Processo Civil que será o próprio autor da
ação que irá liquidar e executar a sentença. Já no caso das ações coletivas de
proteção ou reparação de direitos individuais homogêneos, determina o art. 97
que será promovida pela vítima ou seus sucessores, ou pelos legitimados do art.
82.

Parágrafo único. VETADO.

Art. 98. A execução poderá ser coletiva, sendo promovida pelos


legitimados de que trata o art. 82, abrangendo as vítimas cujas indenizações
já tiveram sido fixadas em sentença de liquidação, sem prejuízo do
ajuizamento de outras execuções.

Determina o art. 98 do Código de Defesa do Consumidor que a execução


poderá ser de forma coletiva, abrangendo todas as vítimas cujas indenizações já
foram fixadas na fase de liquidação, devendo ser promovida pelos legitimados
do art. 82. É uma forma da legislação consumerista auxiliar o consumidor,
facilitando o seu recebimento das reparações dos danos sofridos, além de
desafogar o Judiciário de diversas demandas de execução promovidas por cada
vítima ou sucessor. É importante salientar, entretanto, que somente abrangerá a
execução coletiva às vítimas cujas indenizações já foram fixadas na fase de
liquidação, não abrangendo outras pessoas, ainda que vítimas do evento. Neste
caso, deverão tais vítimas adentrarem com processo de execução autônomo.

Gajardoni (2012, p. 162), por fim, disserta sobre a desnecessidade de o


legitimado para promover a execução seja o mesmo que promoveu a ação
coletiva. Para o autor,

importante destacar que, não necessariamente, a execução coletiva da


pretensão individual correspondente deverá ser ajuizada pelo mesmo
legitimado que propôs a ação coletiva. Embora isto ocorra no mais das
vezes, nada impede que determinado legitimado (v.g., MP) ajuíze a ação
coletiva para a tutela dos direitos individuais homogêneos, sagre-se
vencedor, as vítimas e sucessores liquidem individualmente seus danos e,
após, outro legitimado coletivo (v.g., associação de consumidores)
proponha a execução coletiva.

§ 1° A execução coletiva far-se-á com base em certidão das sentenças


de liquidação, da qual deverá constar a ocorrência ou não do trânsito em
julgado.
O § 1º do art. 98 do Código de Defesa do Consumidor tem como condão
complementar o seu caput, determinando haver no processo de execução
certidão da existência de decisão de liquidação e se já houve, ou não, o trânsito
em julgado da mesma – eis que a decisão que encerra a fase de liquidação pode
ser atacada por qualquer das partes por agravo de instrumento (art. 1.015,
Parágrafo Único do Código de Processo Civil).

§ 2° É competente para a execução o juízo:

I - da liquidação da sentença ou da ação condenatória, no caso de


execução individual;

I - da ação condenatória, quando coletiva a execução.

Complementando o caput do art. 98, determina o seu § 2º qual a comarca


competente para processar a execução das ações que visam proteger ou reparar
direitos individuais homogêneos. Determina o referido parágrafo que, em caso
de execução individual, será competente a comarca da liquidação da sentença ou
da ação condenatória (inciso I), enquanto que, se for execução coletiva, da ação
condenatória apenas – não podendo, portanto, ser na comarca da liquidação da
sentença (inciso II).

Art. 99. Em caso de concurso de créditos decorrentes de


condenação prevista na Lei n.° 7.347, de 24 de julho de 1985 e de
indenizações pelos prejuízos individuais resultantes do mesmo evento
danoso, estas terão preferência no pagamento.

A Lei de Ação Civil Pública determina o recolhimento das indenizações


pagas ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos de que trata o art. 13. Caso
ocorra montante para ser recolhido ao Fundo e montante para reparar prejuízos
individuais dos consumidores, este terá preferência no pagamento, só recolhendo
ao fundo se os prejuízos individuais já forem pagos. Esta norma tem como
condão assegurar a reparação dos danos causados aos consumidores.

Parágrafo único. Para efeito do disposto neste artigo, a destinação


da importância recolhida ao fundo criado pela Lei n°7.347 de 24 de julho de
1985, ficará sustada enquanto pendentes de decisão de segundo grau as
ações de indenização pelos danos individuais, salvo na hipótese de o
patrimônio do devedor ser manifestamente suficiente para responder pela
integralidade das dívidas.
O Parágrafo Único do art. 99 do Código de Defesa do Consumidor
complementa o seu caput, determinando a sustação do montante recolhido ao
Fundo supramencionado se houver pendência de recurso em ação individual de
indenização, ajuizada pelo próprio consumidor – exceto se o patrimônio do
fornecedor for tamanho que assegure o pagamento integral das dívidas. Assim
como o caput, tal norma tem como função assegurar a reparação dos danos
causados aos consumidores.

Art. 100. Decorrido o prazo de um ano sem habilitação de


interessados em número compatível com a gravidade do dano, poderão os
legitimados do art. 82 promover a liquidação e execução da indenização
devida.

Parágrafo único. O produto da indenização devida reverterá para o


fundo criado pela Lei n.° 7.347, de 24 de julho de 1985.

Determina o art. 100 do Código de Defesa do Consumidor que, caso


nenhuma vítima ou sucessor se habilite no prazo de um ano para liquidar e
executar a sentença coletiva – ou não haver sentenciados suficientes compatíveis
com a gravidade do dano -, deverão os legitimados do art. 82 promovê-la. No
caso, toda a indenização arrecadada será enviada ao Fundo de Defesa dos
Direitos Difusos de que trata o art. 13 da Lei 7.347/85, como acontece com o
produto da indenizaçõe proveniente em ações de interesses ou direitos difusos ou
coletivos.

[...]

CAPÍTULO IV
Da Coisa Julgada

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença
fará coisa julgada:

Coisa julgada ocorre quando a sentença se torna imutável e indiscutível, não


mais podendo ser modificada por recurso – quando ocorre o chamado trânsito
em julgado. É o que determina os art. 337, § 4º e 502 do Código de Processo
Civil e o § 3º do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
Assim, ocorrendo a coisa julgada no processo, não poderá o mérito do mesmo
ser novamente discutido, no mesmo ou em outro processo; a sentença será
imutável e deverá, apenas, ser executada – ou liquidada, quando necessário.
Conforme determina o art. 506 do diploma processual civil, a sentença faz coisa
julgada entre as partes, não beneficiando, nem prejudicando terceiros.
Entretanto, como se verifica a coisa julgada nas ações coletivas, tendo em vista
que os interessados no processo – os consumidores – não são partes – apenas os
legitimados do art. 82 e os fornecedores? É o que determina os incisos I a III do
art. 103 do Código de Defesa do Consumidor, a qual passaremos a estudar.

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por


insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá
intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na
hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

O inciso I do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor determina a


eficácia da coisa julgada nas ações de proteção ou reparação de direitos difusos.
Conforme visto no estudo do Parágrafo Único, inciso I do art. 81 deste Código,
direitos difusos são aqueles em que não se consegue distinguir qual é
consumidor e qual não o é; são pessoas indeterminadas, ligadas a uma
circunstância de fato. Assim, tendo em vista a indeterminação das pessoas a qual
a sentença favorável lhe beneficiarão ou prejudicarão, determina o primeiro
inciso do art. 103 que a sentença fará coisa julgada erga omnes, ou seja, para
todos e contra todos, afetando todas as pessoas, ainda que não consumidoras.

É importante ressalvar que, caso a sentença seja improcedente por


insuficiência de provas, pode qualquer legitimado do art. 82 impetrar nova ação,
com idêntico fundamento, valendo-se de novas provas. É o que determina a parte
final do inciso I do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor e o art. 16 da
Lei de Ação Civil Pública, aplicada às ações deste Código pelo microssistema
processual coletivo a que alude o art. 90. Esta norma tem como função ressalvar
a possibilidade de o fornecedor criar associações de proteção aos direitos
consumeristas, controlada por ele, e impetrar ação civil pública sem provas
bastantes, sendo julgada improcedente e gerando coisa julgada erga omnes –
saindo o fornecedor, assim, impune. Assim, caso haja a sentença improcedente
por ausência de provas, pode qualquer outro legitimado do art. 82 impetrar nova
ação, ainda que com fundamentos idênticos, desde que se valendo de novas
provas.

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe,


salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso
anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo
único do art. 81;

Já o inciso II do art. 103 deste Código determina os efeitos da coisa julgada


nas ações coletivas de proteção aos direitos coletivos. Conforme visto no estudo
do Parágrafo Único, inciso II do art. 81, direitos coletivos são a qual um grupo,
categoria ou classe de pessoas são ligadas entre si e/ou com a parte contrária por
uma relação jurídica base. Assim, tendo em vista que os direitos coletivos são
referentes a um grupo, categoria ou classe, a sentença só fará coisa julgada a este
grupo, categoria ou classe, não afetando os direitos de outros grupos, categorias
ou classes.

É importante salientar que, caso o processo seja julgado improcedente por


insuficiência de provas, poderão os legitimados do art. 82 ingressarem com nova
ação, ainda que pelos mesmos fundamentos, desde que valendo de novas provas.
Tal possibilidade se dá pelos motivos especificados no inciso antecedente.

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para


beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do
parágrafo único do art. 81.

Já o inciso III do art. 103 do Código de Defesa do Consumidor determina os


efeitos da coisa julgada nas ações de proteção e reparação dos direitos
individuais homogêneos. Conforme visto no estudo do Parágrafo Único, inciso
III do art. 81, direitos individuais homogêneos são os direitos individuais, com
pessoas e danos determinados, porém originários da mesma causa. Como os
direitos individuais homogêneos são diferentes dos difusos difusos e coletivos,
os efeitos da coisa julgada também o são. No caso de tais direitos, a sentença
fará coisa julgada erga omnes apenas no caso de procedência do pedido,
beneficiando-se vítimas e sucessores. Assim, caso haja procedência do pedido
coletivo, não pode o consumidor, individualmente, ingressar nova ação, sob pena
de a mesma ser extinguida sem que se decida o mérito, por força do inciso V do
art. 485 do Código de Processo Civil. Entretanto, caso haja improcedência do
pedido coletivo, poderão os consumidores ingressarem individualmente novas
ações, buscando a reparação de seus direitos.

Deve-se salientar aqui o art. 2º - A, caput da Lei 9.494/97, a qual já


estudamos na leitura do art. 16 da Lei 7.347/85 e deve ser aplicado em
consoância ao referido inciso.
§ 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não
prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da
coletividade, do grupo, categoria ou classe.

Determina o § 1º do art. 103 que os efeitos da coisa julgada dos direitos


difusos e coletivos não prejudicarão interesses e direitos individuais da
sociedade ou do grupo, categoria ou classe. Assim, caso haja improcedência do
pedido – ainda que por motivo distinto da insuficiência de provas -, poderá o
consumidor, individualmente, demandar acerca da reparação ou proteção de seus
direitos. Tal regra, contudo, não ocorre nos direitos individuais homogêneos, por
haver regramento próprio.

§ 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do


pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como
litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual.

Determina o § 2º do art. 103, em consoância ao inciso III de seu caput que,


caso haja improcedência do pedido, só poderão propor indenização a título
individidual os consumidores e sucessores que não tiverem intervindo no
processo como litisconsortes, na forma do art. 94 – afinal, estes já interviram no
processo coletivo, produzindo provas e teses, arguindo testemunhas, dentre
outros. Estes não poderão, portanto, impetrar nova ação, eis que já participaram
do primeiro.

§ 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado


com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as
ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas
individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o
pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à
liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

Determina o § 3º do art. 103 que os efeitos da coisa julgada erga omnes a


que alude o art. 16 da Lei de Ação Civil Pública não prejudicarão as ações
individuais de reparação de danos sofridos pelos consumidores, propostas de
forma individual ou coletiva de proteção de direitos individuais homogêneos.
Entretanto, caso haja procedência do pedido – e apenas procedência -, a coisa
julgada beneficiará as vítimas e seus sucessores, que poderão liquidar e executar
a sentença na forma estipulada nos art. 96 a 99 deste Código (lembrando-se que
o artigo 96 foi vetado). Assim, caso haja alguma sentença coletiva de efeitos
erga omnes, poderá ainda o consumidor impetrar ação individual para reparar
direito seu. Se a primeira sentença for procedente, entretanto, esta beneficiará as
vítimas e sucessores, exceto no caso do art. 104, a qual veremos adiante.

§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal


condenatória.

Determina o § 4º do art. 103 acerca da possibilidade de o consumidor


ingressar com liquidação e executação de sentença penal que condena em um
crime o fornecedor, na forma estipulada nos art. 63 a 68 do Código de Processo
Penal, nos moldes do parágrafo antecedente.

Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do


parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações
individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que
aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das
ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta
dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.

O consumidor pode adentrar com ação individual visando a proteção ou


reparação de direito seu, ainda que o direito tutelado seja coletivo ou difuso. A
título de exemplo, uma determinada escola aumentou abusivamente a sua
matrícula. O pai de um aluno, se sentindo lesado, pode adentrar com uma ação
individual visando a anulação do valor abusivo da matrícula. É uma ramificação
do direito fundamental do ser humano de buscar o Judiciário para reparar lesão a
direito seu (art. 5º, XXXV da Constituição Federal). Porém, caso haja ação
coletiva conjuntamente à sua individual, não haverá litispendência entre estas. É
o que determina o art. 104 do Código de Defesa do Consumidor. Litispendência
ocorre quando uma ação reproduz outra anteriormente juizada, ainda em curso
(art. 337, §§ 1º e 3º do Código de Processo Civil), devendo esta ser julgada
improcedente, sem que resolva o seu mérito (art. 485, V do diploma processual
civil).

Entretanto, o art. 104 determina que a coisa julgada das ações de defesa dos
direitos coletivos e individuais homogêneos só produzirá efeito à ação individual
do consumidor lesado se este pedir a suspensão de seu processo individual no
prazo de trinta dias da tomada da ciência do ajuizamento da ação coletiva.
Portanto, se o consumidor pedir a suspensão do seu processo no prazo
supramencionado, os efeitos da ação coletiva afetarão também o seu processo –
por exemplo, se o Ministério Público ajuiza ação coletiva visando a anulação do
aumento abusivo da matrícula e o pai pede a suspensão de seu processo, a
decisão da ação coletiva afetará também o seu processo individual. Caso não
peça tal suspensão, o processo terá seguimento normal, sendo normalmente
julgado, com as provas ali colhidas, podendo ter sentença diferenciada da ação
coletiva (por exemplo, o pai não juntou documentos que demonstram, de forma
cabal, o aumento abusivo da matrícula, entendendo o juiz que houve o aumento,
mas não foi abusivo; ao contrário da ação coletiva, que foi julgada procedente).

[...]
DEFESA DOS DIREITOS
TRANSINDIVIDUAIS DA PESSOA COM
DEFICIÊNCIA

A Carta Magna de 1988 – a chamada Carta Cidadã – e as legislações


subsequentes ficaram preocupadas em defender direitos das pessoas
consideradas vulneráveis perante as outras. Damos o exemplo do trabalhador em
relação ao empregador; o consumidor, em relação ao fornecedor; os idosos,
crianças, adolescentes, jovens, índios e também a pessoa com deficiência.

Assim, em 24 de outubro de 1989 foi sancionada pelo então Presidente


da República José Sarney a Lei 7853, que tinha como função dispor “sobre o
apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a
Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência -
Corde, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas
pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras
providências.” (Ementa da referida lei). Dessa forma, trouxe a referida legislação
normas de proteção à pessoa portadora de deficiência – seja ela física, seja ela
mental. Primeiramente, trouxe possibilidade de defesa dos interesses e direitos
coletivos da pessoa com deficiência. Depois, trouxe alguns crimes (art. 8º)
cometidos contra a pessoa portadora de deficiência. Por fim, instituiu a
Coordenadora Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, o
Corde.

Já no ano de 2015, foi sancionada a Lei 13.146 – o chamado Estatuto da


Pessoa com Deficiência – que modificou consbustancialmente a legislação
brasileira acerca das pessoas deficientes, trazendo uma gama nova de direitos a
tais pessoas – não modificando, entretanto, a legislação processual acerca do
processo de defesa de direitos difusos e coletivos das pessoas com deficiência.
Assim, mister é salientar acerca da necessidade de leitura da referida norma, para
que se entenda quais são os direitos e interesses a qual a Lei 7853/89 buscar
proteger.

LEI Nº 7.853, DE 24 DE OUTUBRO DE 1989.


[...]

Art. 3o As medidas judiciais destinadas à proteção de interesses


coletivos, difusos, individuais homogêneos e individuais indisponíveis da
pessoa com deficiência poderão ser propostas pelo Ministério Público, pela
Defensoria Pública, pela União, pelos Estados, pelos Municípios, pelo
Distrito Federal, por associação constituída há mais de 1 (um) ano, nos
termos da lei civil, por autarquia, por empresa pública e por fundação ou
sociedade de economia mista que inclua, entre suas finalidades
institucionais, a proteção dos interesses e a promoção de direitos da pessoa
com deficiência.

O art. 3º da Lei 7853/89 determina quais são os competentes para


impetrar ação de interesses coletivos ou individuais indisponíveis da pessoa com
deficiência. Segundo o referido artigo, podem impetrar a ação o Ministério
Público, a Defensoria Pública, os entes federados (União, Estados, Municípios e
Distrito Federal), os membros da Administração Pública Indireta e as
associações. É a mesma redação do art. 5º da Lei 7.347/85, que determina os
legitimados para propor Ação Civil Pública.

Assim como a lei supramencionada e as demais leis de proteção de


direitos difusos e coletivos, as associações só poderão impetrar ação de defesa de
direitos da pessoa com deficiência se tiver um ano constituída e tiver como
finalidade institucional a proteção de direitos e interesses da pessoa com
deficiência.

Ao contrário das demais legislações que tratam sobre o tema Direitos


Difusos e Coletivos – com exceção ao Estatuto do Idoso -, preconiza o art. 3º da
Lei 7853/89 que os legitimdos supramencionados podem impetrar ação de
defesa de direitos individuais indisponíveis da pessoa com deficiência. Dessa
forma, o Ministério Público ou a Defensoria Pública podem impetrar ação para
que um hospital garanta vaga de uma pessoa deficiente que precisa ser internada,
uma vez que a não internação acarreta riscos à sua vida. Para mais detalhes
acerca da possibilidade de impetrar ações para defesa de tais direitos, vide caput
do art. 81 do Estatuto do Idoso.

O art. 3º da Lei 7853/89 foi recentemente modificada pela Lei 13146/15,


o chamado Estatuto da Pessoa com Deficiência, na qual incluiu a Defensoria
Pública como legitimada para propor a ação de defesa de interesses
transindividuais ou individuais indisponíveis. Tal órgão foi instituída como
legitimado para propor ação coletiva primeiramente pela Lei 11488/07, incluindo
o inciso II no art. 5º da Lei 7.347/85. Por ocasião do microssistema processual
coletivo, poderia a Defensoria Pública impetrar ação coletiva de defesa de
interesses da pessoa com deficiência, ainda que não havesse permissivo legal –
da mesma forma como ocorre com a Ordem dos Advogados do Brasil. Todavia,
para não deixar dúvidas ou abrir brechas para discussão, a Lei 13146/15
acrescentou, no rol do art. 3º desta Lei, a Defensoria Pública como legitimada.

Da mesma forma, a lei supramencionada modificou o art. 3º da Lei


7853/89 no sentido de retirar a expressão “ação civil pública” e substitui-la por
“medidas judiciais”, ampliando o rol de ações na qual os legitimados poderão
impetrar – podendo impetrar outras ações além da Ação Civil Pública.

§ 1º Para instruir a inicial, o interessado poderá requerer às


autoridades competentes as certidões e informações que julgar necessárias.

§ 2º As certidões e informações a que se refere o parágrafo anterior


deverão ser fornecidas dentro de 15 (quinze) dias da entrega, sob recibo, dos
respectivos requerimentos, e só poderão se utilizadas para a instrução da
ação civil.

§ 3º Somente nos casos em que o interesse público, devidamente


justificado, impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informação.

§ 4º Ocorrendo a hipótese do parágrafo anterior, a ação poderá ser


proposta desacompanhada das certidões ou informações negadas, cabendo
ao juiz, após apreciar os motivos do indeferimento, e, salvo quando se tratar
de razão de segurança nacional, requisitar umas e outras; feita a requisição,
o processo correrá em segredo de justiça, que cessará com o trânsito em
julgado da sentença.

Para facilitar a comprovação do alegado na ação a que alude o caput


deste artigo, permite o seu §1º que os legitimados supramencionados poderão
requerer acesso a todas as certidões ou informações que entender ser necessárias
existentes em órgãos públicos ou particulares, que deverão prestar no prazo de
quinze dias e com entrega de recibo do requerimento (§ 2º).

Somente nos casos do § 3º deste artigo – quando o interesse público impor


sigilo - poderão os órgãos negarem acesso a tais informações ou certidões. Neste
caso, a ação deverá ser proposta normalmente, pedindo ao juiz para requisitar as
certidões ou informações, que analisará o pedido e o deferirá se não colocar em
risco a segurança nacional. Neste caso, não podem os órgãos públicos ou
particulares negarem acesso, sob pena de infração disciplinar ou, caso o
solicitante for o Ministério Público, de crime do art. 8º, VI desta Lei.

Caso o juiz defira o pedido de acesso às certidões ou infroamções, o


processo correrá em segredo de justiça, que só acessará no trânsito em julgado
da decisão. É uma regra diferente das regras contidas nas demais legislações
sobre direitos difusos e coletivos – exceto a Lei de Ação Popular -, que mantém
a regra geral da publicidade dos atos judiciais (art. 189, caput do Código de
Processo Civil).

§ 5º Fica facultado aos demais legitimados ativos habilitarem-se como


litisconsortes nas ações propostas por qualquer deles.

Com redação parecida com o § 2º do art. 5º da Lei 7.347/85, determina o §


5º do art. 3º desta Lei que os legitimados do caput poderão habilitar como
litisconsortes em ação para defesa dos direitos transindividuais proposta por
qualquer um dos legitimados. É uma diferenciação do § 2º do referido art. 5º
tendo em vista que este permite apenas que o Poder Público e as associações
legitimadas se habilitem como litisconsortes, além de poder adentrar no processo
tanto do lado do autor quanto do réu, enquanto o § 5º deste artigo permite que
qualquer legitimado do caput adentre como litisconsorte, mas apenas da parte
autora.

§ 6º Em caso de desistência ou abandono da ação, qualquer dos co-


legitimados pode assumir a titularidade ativa.

Com redação parecida com o § 3º do art. 5º da Lei 7.347/85, permite o §


6º do art. 3º desta Lei que caso algum dos legitimados desista ou abandone a
ação, qualquer um dos legitimados pode assumir a titularidade ativa, assumindo
como autor da ação e seguindo o curso do processo. A diferenciação do § 3º
supramencionado é que este apenas permite a substituição do autor quando a
associação legitimada desista ou abandone a ação. Já o § 6º deste artigo permite
a substituição quando qualquer legitimado desista ou abandone a assumir. Além
do mais, diz o referido parágrafo que os legitimados “podem assumir” e não
“devem assumir”, como no Estatuto do Idoso e da Lei de Ação Civil Pública.

Art. 4º A sentença terá eficácia de coisa julgada oponível erga omnes,


exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por deficiência de
prova, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com
idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

Determina o art. 4º da Lei 7853/89 – com redação parecida com a do art.


16 da Lei 7.347/85 - que a decisão da Ação Civil Pública fará coisa julgada,
impedindo novas ações sobre o mesmo tema, com efeito erga omnes. Ao
contrário do artigo supramencionado, o art. 4º desta Lei não restringe a coisa
julgada nos limites do órgão prolator, como ocorre no art. 16 da Lei de Ação
Civil Pública.

Há, todavia, uma ressalva: caso o pedido seja improcedente por


insuficiência de provas, qualquer outro legitimado do artigo precedente poderá
intentar nova ação com mesmo fundamento, desde que se valendo de novas
provas. É uma tentativa do legislador de 1989 de evitar que grandes empresas
criem associações de fachada para que estas lhes acionem judicialmente e
percam por ausência de provas, impedindo que os demais legitimados acionem a
empresa para cobrar indenização pelos danos materiais e morais cometidos,
conforme explicamos anteriormente. Assim, se qualquer um dos legitimados do
art. 3º impetrar Ação Civil Pública e o pedido for julgado improcedente por
ausência de provas, ou por provas insuficientes, poderá qualquer outro
legitimado do art. 3º - não o que adentrou com a ação original – impetrar nova
ação, utilizando-se de provas novas.

Deve-se salientar que o Código de Defesa do Consumidor definiu e separou


o que se tratava de direitos difusos e coletivos, além de criar os direitos
individuais homogêneos. Da mesma forma, criou-se novas regras acerca da coisa
julgada, diferentemente para cada um dos diferentes tipos de direitos
transindividuais. Assim, necessária é a leitura do art. 103 da legislação
consumerista.

§ 1º A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da


ação fica sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão
depois de confirmada pelo tribunal.

Em redação praticamente idêntica ao caput do art. 19 da Lei 4.717/65,


determina o § 1º do art. 4º desta Lei que uma sentença que julgue a ação carente
de provas ou improcedente deverá sofrer o chamado reexame necessário, só
podendo produzir efeitos quando confirmada pelo Tribunal respectivo. Para
maiores detalhes, vide nota acerca do reexame necessário no estudo do art. 19 da
Lei de Ação Popular.

§ 2º Das sentenças e decisões proferidas contra o autor da ação e


suscetíveis de recurso, poderá recorrer qualquer legitimado ativo, inclusive
o Ministério Público.

Determina o § 2º do 4º desta Lei, com redação parecida com o § 2º do art.


19 da Lei de Ação Popular que, caso seja proferida qualquer decisão – seja
sentença ou interlocutória – contra o autor da ação e que seja cabível recurso,
poderá recorrer não somente o autor, mas também qualquer legitimado do caput
do artigo precedente e o próprio Ministério Público. Dessa forma, qualquer
legitimado poderá impetrar o devido recurso, protolocando-o junto ao processo,
sem que haja anuência do juiz ou do autor da ação, ou que seja parte no
processo. Da mesma forma, o Mininistério Público poderá impetrar
normalmente um recurso em defesa do autor da ação, tendo em vista que o
mesmo já se encontra no processo como custus legis.

Ao contrário do § 2º do art. 19 da Lei 4.717/65, no § 2º do art. 4º desta Lei


somente poderá impetrar recurso os legitimados ativos do art. 3º desta Lei e não
qualquer cidadão, como no caso das ações populares. Assim, um cidadão comum
não poderá recorrer de uma decisão que seja contrária ao autor da ação que visa
proteger direitos da pessoa com deficiência – e tal artigo não pode ser utilizado
analogicamente por ocasião do microssistema processual coletivo, uma vez que
há redação específica determinando o contrário.

Art. 5º O Ministério Público intervirá obrigatoriamente nas ações


públicas, coletivas ou individuais, em que se discutam interesses
relacionados à deficiência das pessoas.

Conforme vastamente visto anteriormente, o Ministério Público possui


como função primordial a fiscalização da lei (é o chamado custus legis), além da
função constitucional de “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos
interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 127). Dessa forma, sob tais
moldes, determina o art. 5º da Lei 7853/89 que, nas ações (sejam elas coletivas,
públicas ou individiuais) que buscam discutir interesses ou direitos de pessoas
com deficiência, deverão participar, obrigatoriamente – sob pena de nulidade – o
Ministério Público.

Art. 6º O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência,


inquérito civil, ou requisitar, de qualquer pessoa física ou jurídica, pública
ou particular, certidões, informações, exame ou perícias, no prazo que
assinalar, não inferior a 10 (dez) dias úteis.

Em redação idêntica ao § 1º do art. 8º da Lei de Ação Civil Pública,


determina o caput do art. 6º da Lei 7853/89 que o Ministério Público poderá
instaurar inquérito civil ou requisitar, de qualquer órgão público ou particular,
certidões, informações, exames ou perícias no prazo que assinalar, não inferior a
dez dias úteis.

Conforme visto anteriormente, inquérito civil é um procedimento


administrativo inquisitivo, de natureza cível, que possui como função precípua
buscar informações acerca de um fato para imputar a responsabilidade a alguém
por uma conduta praticada por este e que feriu direito difuso ou coletivo. No
mais, vide nota acerca do inquérito civil no estudo do § 1º do art. 8º da Lei
7.347/85.

O caput do art. 6º desta Lei determina que o Ministério Público possui


competência para pedir certidões, informações, exames ou perícias de qualquer
órgão particular ou público, no prazo que assinalar, não inferior a dez dias úteis.
O parquet pode pedir, além das certidões e informações, exames ou perícias de
qualquer órgão público ou particular. Deve-se salientar que a recusa ao
atendimento do pedido do Ministério Público ou o retardamento ou omissão do
mesmo não configura crime previsto no art. 10 da Lei 7.347/85, mas configura o
crime do art. 8º, VI desta Lei, com penas entre dois e cinco anos de reclusão,
mais multa.

§ 1º Esgotadas as diligências, caso se convença o órgão do Ministério


Público da inexistência de elementos para a propositura de ação civil,
promoverá fundamentadamente o arquivamento do inquérito civil, ou das
peças informativas. Neste caso, deverá remeter a reexame os autos ou as
respectivas peças, em 3 (três) dias, ao Conselho Superior do Ministério
Público, que os examinará, deliberando a respeito, conforme dispuser seu
Regimento.

Determina o § 1º do art. 6º da Lei 7853/89 que o Ministério Público


pode, ao final do inquérito civil, convencer de inexistência de fundamentos para
propor a ação coletiva do art. 3º desta Lei - seja por ausência de provas, seja por
ausência de danos, seja por impossibilidade de descoberta do autor dos fatos.
Para tanto, deverá o Ministério Público fundamentar os motivos do
arquivamento, para que todos possam ter ciência dos mesmos.

Já a parte final do § 1º do referido art. 6º determina que, tão logo o


Ministério Público arquive o inquérito civil, deverá enviar, no prazo de três dias,
ao Conselho Superior do Ministério Público para que o mesmo homologue ou
não o arquivamento, examinando e deliberando a respeito conforme o
Regimento Interno do referido Conselho.

§ 2º Se a promoção do arquivamento for reformada, o Conselho


Superior do Ministério Público designará desde logo outro órgão do
Ministério Público para o ajuizamento da ação.

O § 2º do art. 6º da Lei 7853/89 determina que o Conselho Nacional do


Ministério Público, caso reforme o arquivamento, deverá designar outro órgão
do Ministério Público para ajuizar a ação de que trata do art. 3º desta Lei,
afastando o órgão do Ministério Público que pediu o arquivamento.

Art. 7º Aplicam-se à ação civil pública prevista nesta Lei, no que


couber, os dispositivos da Lei 7.347, de 24 de julho de 1985.

Determina o art. 7º da Lei 7853/89 que, nas ações coletivas de que trata o art.
3º desta Lei, deve-se aplicar subsidiariamente a Lei 7.347/85 naquilo que couber.
Assim, qualquer norma da Lei de Ação Civil Pública que não for contrária às
normas desta Lei poderão ser utilizados por esta. Atualmente, entretanto, o
microssistema processual coletivo permite que a Lei 7853/89 pode utilizar de
qualquer norma relativa à matéria naquilo que não contrariar suas normas.
DEFESA DOS DIREITOS
TRANSINDIVIDUAIS DOS
INVESTIDORES

A Lei 7.913, de 7 de dezembro de 1989, permite a utilização da ação coletiva


para defesa dos direitos transindividuais dos investidores no mercado de valores
mobiliários.

Art. 1º Sem prejuízo da ação de indenização do prejudicado, o


Ministério Público, de ofício ou por solicitação da Comissão de Valores
Mobiliários — CVM, adotará as medidas judiciais necessárias para evitar
prejuízos ou obter ressarcimento de danos causados aos titulares de valores
mobiliários e aos investidores do mercado, especialmente quando
decorrerem de:

O artigo 1º da Lei 7.913/89 permite expressamente a utilização da ação


coletiva para defesa dos direitos transindividuais de titulares de valores
mobiliários e os investidores do mercado financeiro. A ação coletiva, conforme a
primeira parte da redação do artigo, não impede a ação individual daquele que se
sentir lesado ou prejudicado – uma vez se tratar de direitos individuais
homogêneos.

Somente o Ministério Público poderá ser autor da ação coletiva que


trata esta lei. O artigo 1º não legitima outros órgãos públicos ou privados para
impetrar a ação coletiva que trata esta lei, conferindo somente ao Ministério
Público. Apenas permite a referida lei que haja solicitação da Comissão de
Valores Mobiliários – CVM, mas esta não possui legitimidade para impetrar a
ação, somente solicitar ao parquet.

E não se pode utilizar o artigo 3º desta lei para permitir a legitimidade


ativa dos órgãos elencados no artigo 5º da Lei de Ação Civil Pública. Isso se dá
porque a aplicação da última é subsidiária à primeira. E, conforme nos explica
Zaclis (2007, p. 173), o objetivo de uma lei, ao permitir a aplicação subsidiária
dos dispositivos de outra, é regular situações não contempladas expressamente
na primeira. Assim, o artigo 1º da Lei 7.913/89, ao disciplinar diretamente a
legitimidade ativa, atribuindo-a exclusivamente ao Ministério Público, impediu a
aplicabilidade do artigo 5 da Lei 7.347/85 à ação coletiva para defesa dos
investidores ou titulares de valores mobiliários.

Há autores, contudo, que entendem que a legitimidade ativa para


propositura da ação coletiva de que trata esta lei deve ser ampliada aos elencados
no artigo 5º, em virtude do microssistema processual coletivo. É o que nos
explana Vieira (2017):

A partir de uma interpretação conjunta e sistemática dos dois diplomas


legais, que junto ao Código de Defesa do Consumidor, compõem um
microssistema de processo coletivo, conclui-se que todos os órgãos e
entidades elencados no art. 5º da Lei nº 7.347/85 são legitimados a propor
a Ação Civil Pública para a defesa dos interesses de investidores. Em todo
caso, devem ser observados os pressupostos processuais da
representatividade adequada e da pertinência temática entre a atuação do
suposto legitimado e o objeto da ação.

O ato que viola direitos para legitimar a ação coletiva baseado nesta lei
deve ser sempre transindividual cometido contra titulares de valores mobiliários
ou investidores do mercado. Do contrário, obviamente, não será aplicada a Lei
7.913/89.

Valor mobiliário pode ser entendido como o título de uma propriedade


ou crédito, com características e direitos padronizados, emitidos por um ente
público ou privado. A Lei 6.385/76 determina quais são os valores mobiliários e
quais devem ser fiscalizados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Segundo seu artigo 2º, são valores mobiliários fiscalizados pela CVM:

I - as ações, debêntures e bônus de subscrição;

II - os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de


desdobramento relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II;
III - os certificados de depósito de valores mobiliários;

IV - as cédulas de debêntures;

V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes


de investimento em quaisquer ativos;

VI - as notas comerciais;

VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos


subjacentes sejam valores mobiliários;

VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos


subjacentes; e

IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos


de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de
remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos
advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.

A ação coletiva pode ser utilizada de forma preventiva, tentando evitar


prejuízos iminentes ou reparativa, quando o dano já ocorreu e terá como réu
qualquer pessoa física, ou jurídica, de direito público ou privado, que lesionar os
direitos transindividuais dos titulares de valores mobiliários ou investidores do
mercado.

Por fim, os incisos I, II e III do artigo 1º da Lei 7.913/89 elencam algumas


situações nas quais podem ser consideradas como atos que prejudiquem ou
possam prejudicar direitos transindividuais dos titulares de valores mobiliários e
investidores do mercado. Vale salientar que o caput determina expressamente
que é um rol exemplificativo, ao dissertar que “especialmente quando
decorrerem de:”.

I — operação fraudulenta, prática não equitativa, manipulação de


preços ou criação de condições artificiais de procura, oferta ou preço de
valores mobiliários;

A Instrução nº 8 da CVM, de 8 de outubro de 1979, elenca expressamente


o que são operação fraudulenta, prática não equitativa, manipulação de preços
e criação de condições artificiais de procura, oferta ou preço de valores
mobiliários. Vide abaixo:

a) condições artificiais de demanda, oferta ou preço de valores


mobiliários aquelas criadas em decorrência de negociações pelas quais
seus participantes ou intermediários, por ação ou omissão dolosa
provocarem, direta ou indiretamente, alterações no fluxo de ordens de
compra ou venda de valores mobiliários;

b) manipulação de preços no mercado de valores mobiliários, a


utilização de qualquer processo ou artifício destinado, direta ou
indiretamente, a elevar, manter ou baixar a cotação de um valor
mobiliário, induzindo, terceiros à sua compra e venda;

c) operação fraudulenta no mercado de valores mobiliários, aquela em


que se utilize ardil ou artifício destinado a induzir ou manter terceiros em
erro, com a finalidade de se obter vantagem ilícita de natureza patrimonial
para as partes na operação, para o intermediário ou para terceiros;

d) prática não equitativa no mercado de valores mobiliários, aquela de
que resulte, direta ou indiretamente, efetiva ou potencialmente, um
tratamento para qualquer das partes, em negociações com valores
mobiliários, que a coloque em uma indevida posição de desequilíbrio ou
desigualdade em face dos demais participantes da operação.

II — compra ou venda de valores mobiliários, por parte dos


administradores e acionistas controladores de companhia aberta,
utilizando-se de informação relevante, ainda não divulgada para
conhecimento do mercado ou a mesma operação realizada por quem a
detenha em razão de sua profissão ou função, ou por quem quer que a tenha
obtido por intermédio dessas pessoas;

Utilizar de uma informação relevante, que tem condições de afetar


diretamente o mercado de valores, ainda não revelada ao público, faz com que o
lucro auferido seja incrivelmente maior que o comum, podendo causar sérios
prejuízos a terceiro.

Imaginemos o seguinte exemplo, comumente utilizado pela doutrina. João


trabalha na empresa A. Ele participou das reuniões confidenciais na qual decidiu
que A fundiria com a empresa B. A notícia da fusão de A e B deixaria de ser
sigilosa no dia 05 de maio. No dia anterior, João adquire várias ações da empresa
A, por R$ 10 (dez reais) cada.

Divulgada a notícia da fusão de A e B, as ações da primeira aumentam


vertiginosamente, fazendo com que cada um passe a ser R$100 (cem reais) cada.
Naquele dia, João aufere somas inestimáveis de dinheiro, utilizando da
informação sigilosa que possuía.

A atitude de João é chamada de insider trading. No mercado de valores, a


atitude de João não é correta, pois ele não estava em paridade com os demais –
que só souberam da notícia no dia 06 de maio.

Sendo João administrador ou acionista controlador de companheira


aberta e causando dano coletivo aos investidores, poderá impetrar contra ele a
ação coletiva de que trata o caput.

É importante frisar, terminando, que a utilização de informação relevante


para auferir ganho pessoal é considerada tão incorreta no mercado de valores que
a Lei 10.303/01 modificou a Lei que cria a Comissão de Valores Mobiliários
(Lei 6.385/76), tipificando como crime a conduta:

Art. 27-D. Utilizar informação relevante de que tenha conhecimento,


ainda não divulgada ao mercado, que seja capaz de propiciar, para si ou
para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio
ou de terceiros, de valores mobiliários:Pena – reclusão, de 1 (um) a 5
(cinco) anos, e multa de até 3 (três) vezes o montante da vantagem ilícita
obtida em decorrência do crime.

III — omissão de informação relevante por parte de quem estava


obrigado a divulgá-la, bem como sua prestação de forma incompleta, falsa
ou tendenciosa.

Aqui, pode-se entender como a informação equivocada que leva os


investidores ou titulares de valor mobiliário a prejuízo real ou iminente. A
informação pode ser omitida, incompleta, falsa ou tendenciosa, no sentido de
influenciar erroneamente a decisão dos titulares e investidores. Imaginemos que
uma sociedade anônima qualquer deixa de divulgar à sociedade de modo geral
uma situação importante que pode refletir diretamente o mercado de ações – por
exemplo, uma barragem de rejeitos que se encontra deterioriada ou em mau
estado de conservação, apresentando risco iminente de desastre ambiental.

Omitindo esta informação e ocorrendo o desastre, o preço da ação da


empresa despenca, causando intensos prejuízos aos acionistas e investidores.
Neste caso, pode impetrar ação coletiva para reparação dos danos causados, em
virtude do fato de a omissão da informação de risco iminente ser fator relevante
para o dano causado aos acionistas e investidores, pois, se estes soubessem da
informação, poderiam ter agido a fim de minimizar ou evitar o dano ao seu
patrimônio particular.

Art. 2º As importâncias decorrentes da condenação, na ação de que


trata esta Lei, reverterão aos investidores lesados, na proporção de seu
prejuízo.

§ 1º As importâncias a que se refere este artigo ficarão depositadas em


conta remunerada, à disposição do juízo, até que o investidor, convocado
mediante edital, habilite-se ao recebimento da parcela que lhe couber.

§ 2º Decairá do direito à habilitação o investidor que não o exercer


no prazo de dois anos, contado da data da publicação do edital a que alude o
parágrafo anterior, devendo a quantia correspondente ser recolhida ao
Fundo a que se refere o art. 13 da Lei 7.347, de 24 de julho de 1985.

O artigo 13 da Lei 7.347/85 esculpe que as condenações por violação de


direitos difusos e coletivos será remetida para um fundo que sirva para
reconstruir os bens lesados. Já o Código de Defesa do Consumidor, nos artigos
97 a 100, determina que a condenação por violação de direitos individiuais
homogêneos serão pagos às vítimas ou seus familiares.

O artigo 2º da Lei 7.913/89 caminha na mesma linha do Código de Defesa


do Consumidor, esculpindo que o valor da condenação será utilizado para quitar
a lesão causada no investidor.

Para tanto, o montante da condenação ficará depositado em juízo,


devendo o investidor lesado se habilitar nos autos do processo, após convocação
de edital, para receber o montante que cubra a lesão causada contra si.

O investidor possui o prazo de 02 (dois) anos – contados da publicação do


edital - para se habilitar nos autos do processo; ultrapassado este prazo, decairá
do direito de se habilitar, sendo que a quantia será recolhida ao Fundo do artigo
13 da Lei 7.347/85.

Art. 3º À ação de que trata esta Lei aplica-se, no que couber, o


disposto na Lei 7.347, de 24 de julho de 1985.

O artigo 3º da Lei 7.913/89 determina expressamente a utlização da Ação


Civil Pública, descrita na Lei 7.347/85, para preservação dos direitos
transindividuais dos investidores no mercado de valores mobiliários. Dessa
forma, deverá ser utilizada a Lei 7.347/85, naquilo que não contrariar os
regramentos próprios da Lei 7.913/89.

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.

Não há comentários relevantes.


DEFESA DOS DIREITOS
TRANSINDIVIDUAIS DAS CRIANÇAS E
DOS ADOLESCENTES

Em 1988, a nova Constituição Federal trouxe, em seu art. 227, a proteção da


criança e do adolescente, tendo em vista a vulnerabilidade destes perante a
sociedade. Segundo a redação do artigo, in verbis, modificada posteriormente
pela Emenda Constitucional 65, de 2010 – que acrescentou a expressão jovem -,
a sociedade deveria proteger a criança e o adolescente de mazelas como o abuso
e a exploração sexual.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à


criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da


criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades
não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos
seguintes preceitos:

§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:

I - idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho,
observado o disposto no art. 7º, XXXIII;

II - garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;

III - garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola;



IV - garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato
infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por
profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica;

V - obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito


à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação
de qualquer medida privativa da liberdade;

VI - estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica,


incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a
forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado;

VII - programas de prevenção e atendimento especializado à criança,


ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins.

§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração


sexual da criança e do adolescente.

Apenas dois anos depois da promulgação da Constituição, em 13 de
julho de 1990, entrou em vigor a Lei 8069, que instituiu uma nova legislação de
proteção dos direitos difusos e coletivos, revogando-se o antigo Código de
Menores de 1979 (Lei 6.697). Tal lei possui como função principal defender, de
forma eficiente, a criança e o adolescente, por serem pessoas vulneráveis e em
formação.

Cuidou a nova legislação, denominada Estatuto da Criança e do


Adolescente – ou somente ECA -, que as crianças (pessoas menores de 12 anos)
e os adolescentes (pessoas entre 12 e 17 anos) possuíam uma gama de direitos,
como a vida, a saúde e a liberdade. Alguns destes direitos eram individuais do
menor, como a saúde, enquanto outros eram coletivos, como os elencados no art.
208 da lei. E a legislação não trouxe apenas quais os direitos da criança e do
adolescente, mas também quais os mecanismos de proteção destes direitos, não
apenas dos individuais, mas também dos coletivos (art. 208 a 224), ampliando os
artigos sobre esta matéria.

Tais artigos são demasiadamente parecidos com os demais dispositivos


que tratam da matéria Direitos Difusos e Coletivos, sendo alguns mera repetição
– como o art. 213, que é mera repetição do art. 84 do CDC. O Estatuto da
Criança e do Adolescente, ao contrário dos demais dispostivos que dissertam
acerca dos direitos difusos e coletivos, não inovou a matéria, praticamente
copiando os dispositivos existentes em outros ordenamentos jurídicos e
colocando-o dentro da matéria Proteção dos Direitos Difusos e Coletivos das
Crianças e dos Adolescentes.

Para melhor entender o assunto, trouxemos à tona a redação parcial da


Lei 8.069/90, focando-se apenas no Capítulo VII do Título VI, denominado Da
Proteção dos Interesses Individuais, Difusos, Coletivos, que vai do art. 208 ao
224. Tendo em vista que o Estatuto da Criança e do Adolescente inteiro ocuparia
grande número de páginas, optamos por trazer apenas a parte da legislação que
disserta acerca de quais são os direitos difusos e coletivos da criança e do
adolescente, além da parte introdutória e dos crimes. Por fim, salientamos
também sobre a importância da leitura da legislação, em especial dos art. 7º ao
38 e 53 ao 69, que trata dos direitos individuais e coletivos da criança e do
adolescente, como a tutela, vida, saúde, direito à família substituta, ao trabalho,
dentre outros.

LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990.

[...]

Capítulo VII

Da Proteção Judicial dos Interesses Individuais, Difusos e Coletivos

Art. 208. Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de


responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados à criança e ao
adolescente, referentes ao não oferecimento ou oferta irregular:
I - do ensino obrigatório;

II - de atendimento educacional especializado aos portadores de


deficiência;

III - de atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a


cinco anos de idade;

IV - de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

V - de programas suplementares de oferta de material didático-


escolar, transporte e assistência à saúde do educando do ensino
fundamental;

VI - de serviço de assistência social visando à proteção à família, à


maternidade, à infância e à adolescência, bem como ao amparo às crianças e
adolescentes que dele necessitem;

VII - de acesso às ações e serviços de saúde;

VIII - de escolarização e profissionalização dos adolescentes privados


de liberdade.

IX - de ações, serviços e programas de orientação, apoio e promoção


social de famílias e destinados ao pleno exercício do direito à convivência
familiar por crianças e adolescentes.

X - de programas de atendimento para a execução das medidas


socioeducativas e aplicação de medidas de proteção.

XI - de políticas e programas integrados de atendimento à criança e


ao adolescente vítima ou testemunha de violência.

§ 1o As hipóteses previstas neste artigo não excluem da proteção


judicial outros interesses individuais, difusos ou coletivos, próprios da
infância e da adolescência, protegidos pela Constituição e pela Lei.

O art. 208 do Estatuto da Criança e do Adolescente determina quais são


os direitos assegurados a todas as crianças e adolescentes cuja violação implica
em possibilidade de impetrar a ação coletiva que trata o art. 212. Determina o
referido artigo que, caso algum órgão público ou particular negue o direito ao
ensino obrigatório; ao atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, ou à creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos – sendo que
anteriormente era até seis anos, mas tal texto foi recém modificado pela Lei
13.306/16; o direito ao ensino noturno regular, adequado às condições do
estudante; o direito aos programas suplementares de oferta de material didático,
transporte e assistência à saúde do estudante no ensino fundamental; ao direito
aos serviços de assistência social, de proteção à família, à maternidade, à
infância e à adolescência, além do amparo dos menores que deles necessitam; do
acesso à saúde; da escolarização e da profissionalidade dos adolescentes
privados de liberdade; do direito a ações, serviços e programas de orientação,
apoio e promoção social das famílias, destinadas ao convívio familiar daos
menores; ou do direito ao acesso a programas de atendimento de execução das
medidas socioeducativas e aplicação de medidas de proteção ao adolescente
infrator, ou os ofereça insatisfatoriamente, poderão os legitimados do art. 210
impetrarem ação de defesa e proteção destes direitos.

É um rol imensamente maior que o rol do Estatuto do Idoso, que visa


pouco mais que quatro direitos. Entretanto, assim como acontece naquele
dispositivo legal, o rol do art. 208 do ECA é meramente exemplificativo,
permitindo que os legitimados do art. 210 impetrem ação coletiva para defesa de
qualquer direito transindividual ou individual indisponível das crianças e dos
adolescentes acobertados por esta ou qualquer outra lei. Tal possibilidade é uma
consolidação do inciso IV do art. 1º da Lei de Ação Civil Pública, que determina
que a referida ação poderá ser utilizada para defesa de qualquer direito difuso ou
coletivo – utilizado nesta lei pelo microssistema processual coletivo.

§ 2o A investigação do desaparecimento de crianças ou adolescentes


será realizada imediatamente após notificação aos órgãos competentes, que
deverão comunicar o fato aos portos, aeroportos, Polícia Rodoviária e
companhias de transporte interestaduais e internacionais, fornecendo-lhes
todos os dados necessários à identificação do desaparecido.

Determina o § 2º do art. 208 que, no caso de haver desaparecimento de


criança ou adolescente, tão logo os órgãos competentes forem notificados do dito
desaparecimento (por exemplo, através de Boletim de Ocorrência), deverão
iniciar a investigação, sem esperar nenhum prazo, já comunicando aos portos,
aeroportos, Polícia Rodoviária e companhias de transporte interestaduais e
internacionais, para que estes, com os dados do menor desaparecido, possam
realizar buscas e impedir que o mesmo saia da localidade pelas vias áreas,
pluviais ou marítimas, pelas ferrovias e rodovias, possibilitando uma maior
chance de encontro do menor desaparecido.

Art. 209. As ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro


do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo juízo terá
competência absoluta para processar a causa, ressalvadas a competência da
Justiça Federal e a competência originária dos tribunais superiores.

Determina o art. 209 do Estatuto da Criança e do Adolescente que o


foro competente para processar e julgar as ações do art. 212 desta Lei é o do
local onde ocorrer o dano. Assim, se o dano ocorrer no Rio de Janeiro, a título de
exemplo, uma de suas varas cíveis será competente para processar e julgar a
causa, ainda que, a título de exemplo, o réu ou a criança se localizem em Santos
ou São Paulo.

Conforme estudamos no art. 2º da Lei de Ação Civil Pública, caso o


dano seja regional ou nacional, o foro competente será determinado pelo art. 93
do Código de Defesa do Consumidor de forma análoga, utilizando-se do
microssistema processual coletivo. Assim, será competente o foro da capital do
Estado ou do Distrito Federal, caso o dano seja âmbito regional ou nacional,
respectivamente.

Por fim, é importante salientar que a competência descrita no art. 209


do ECA é absoluta, não podendo ser prorrogada por vontade ou inércia das
partes. Assim, se um processo correr inteiramente por uma vara incompetente –
por exemplo, Santos, no caso acima -, deverá ser considerado nulo – ainda que
transitado em julgado, utilizando-se da ação rescisória para tanto (art. 966, II do
Código de Processo Civil) e retomado do começo. A nosso ver, conforme
veremos no estudo do art. 80 do Estatuto do Idoso, é uma grande falha
legislativa, pois pode acabar prejudicando direito das crianças e dos adolescentes
quando queriam protegê-lo.

Art. 210. Para as ações cíveis fundadas em interesses coletivos ou


difusos, consideram-se legitimados concorrentemente:

Em consoância ao art. 5º da Lei 7.347/85 e art. 82 do Código de Defesa


do Consumidor, determina o art. 210 do Estatuto da Criança e do Adolescente
quais são os legitimados ativos para propor a ação coletiva. O rol de legitimados
é demasiadamente pequeno em relação às demais legislações, só abrangendo o
Ministério Público, os entes federados e as associações. Entretanto, os membros
da Administração Pública Indireta, a Defensoria Pública e a Ordem dos
Advogados do Brasil podem impetrar a ação a que alude o art. 212 desta Lei por
ocasião do microssistema processual coletivo.

Por fim, é importante salientar que o caput do art. 210 do Estatuto da


Criança e do Adolescente não faz menção aos interesses individuais
homogêneos, tendo em vista que o mesmo só foi criado no Código de Defesa do
Consumidor, sancionado dois meses após o ECA. Todavia, os legitimados desta
Lei poderão impetrar normalmente ação de defesa dos direitos individuais
homogêneos por ocasião do microssistema processual coletivo.

I - o Ministério Público;

A Constituição Federal determina, em seu art. 127, conforme vimos


anteriormente, que o Ministério Público tem como função: “a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.”. Portanto, cabe ao parquet a proteção dos interesses da sociedade
como um todo. Determina ainda a Carta Magna, em seu art. 129, inciso III, que é
função do Ministério Público: “promover o inquérito civil e a ação civil pública,
para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros
interesses difusos e coletivos”. Ou seja, a própria Constituição Federal determina
ser função ministerial a proteção dos direitos difusos e coletivos. Possui o
Ministério Público, portanto, a função de “custus legis”, ou fiscal da lei, havendo
o dever de fiscalizar a boa aplicação das leis – principalmente em se tratanto de
interesses sociais. Dessa forma, detém tal órgão direito de adentrar com a ação
coletiva para proteção dos direitos difusos e coletivos.

II - a União, os estados, os municípios, o Distrito Federal e os


territórios;

Assim como o Ministério Público, os entes federados – União, Estados,


Municípios, o Distrito Federal e os territórios – possuem capacidade de
impetrarem ação coletiva para reparação dos direitos transindividuais, eis que
um de seus deveres é a proteção dos direitos da população. É importante
salientar que o Estatudo da Criança e do Adolescente é a única legislação que faz
menção aos territórios, sendo os demais completamente silentes. Atualmente não
existe nenhum território no Brasil, mas antigamente estados como Rondônia,
Roraima e Amapá eram territórios, existindo sua possibilidade no art. 33 da
Constituição Federal.

III - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e


que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos
protegidos por esta Lei, dispensada a autorização da assembléia, se houver
prévia autorização estatutária.

O terceiro e último inciso do art. 210 determina que as associações


particulares cuja função seja a defesa e proteção dos direitos das crianças e
adolescentes poderão impetrar ação coletiva. Contudo, tais associações só
poderão ingressar com a referida ação se possuírem alguns requisitos
determinados pelo próprio inciso III do art. 210. O primeiro é a pré-constituição
de um ano – ou seja, as associações devem existir há, pelo menos, um ano, para
entrar com a ação coletiva. O segundo é estar escrito, no estatuto que a cria, que
a sua função primordial seja a proteção dos interesses e direitos
supramencionados. Por fim, determina tal inciso que não precisa de autorização
da assembleia da associação para propositura da ação coletiva, desde que haja
prévia autorização no Estatuto.

§ 1º Admitir-se-á litisconsórcio facultativo entre os Ministérios


Públicos da União e dos estados na defesa dos interesses e direitos de que
cuida esta Lei.

Determina o § 1º do art. 210 do Estatuto da Criança e do Adolescente que


poderão os órgãos do Ministério Público se tornarem litisconsortes na defesa dos
direitos difusos e coletivos de que trata esta lei. Assim, o Ministério Público
Federal poderá auxiliar, por exemplo, o Ministério Público Estadual, sendo
litisconsorte deste, em uma Ação Civil Pública de defesa de direitos
transindividuais relativos à ordem econômica. Da mesma forma, o Ministério
Público Estadual pode auxiliar o Federal em uma Ação Civil Pública de defesa
de direitos transindividuais de esfera federal.

Importante a leitura, no estudo do § 5º do art. 5º da Lei 7.347/85, acerca


da confusão criada pelo então Presidente da República Fernando Collor de Melo
ao esquecer de vetar o art. 113 do Código de Defesa do Consumidor, que
acrescentou os §§ 5º e 6º do referido art. 5º.

§ 2º Em caso de desistência ou abandono da ação por associação


legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado poderá assumir a
titularidade ativa.

Conforme relatado no estudo do § 3º do art. 5º da Lei 7.347/85, o


legislador sempre temeu que as grandes empresas criassem associações de
proteção de direitos transindividuais de fachada, para que estas acionassem a
empresa judicialmente de forma que não ganhasse a ação e coibisse outros
legitimados do caput deste artigo de acionarem por força da coisa julgada, ou da
litispendência no caso de ação em curso. Preocupado, o legislador criou barreiras
para esse tipo de ação: primeiramente, em relação aos efeitos da coisa julgada
(art. 16 da Lei 7.347/85 e art. 103 do Código de Defesa do Consumidor).

Segundo, o referido no § 2º do art. 210 desta Lei, com redação idêntica


ao § 3º do art. 5º da Lei de Ação Civil Pública. Determina o referido parágrafo
que, caso as associações desistam ou abandonem uma ação coletiva em curso,
qualquer outro legitimado do caput deste artigo poderá assumir como autor da
ação e seguirá o seu curso normalmente. Assim, evita-se que uma ação coletiva
que se encontre durante anos no Judiciário seja abandonada sem motivo pelas
associações de fachada e obrigando os demais legitimados a retomarem a ação
do começo.

É importante frisar que o § 2º do art. 210 desta Lei se aplica apenas as


associações legitimadas, sendo completamente silente aos demais legitimados do
caput; e diz “poderá assumir”, ao invés de “deverá assumir” ou “assumirá” das
Leis de Ação Civil Pública e Estatuto do Idoso, respectivamente, sendo uma
faculdade dos legitimados do caput deste artigo assumirem ou não a titularidade
ativa, e não uma obrigação como nos demais casos.

Art. 211. Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos


interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências
legais, o qual terá eficácia de título executivo extrajudicial.

O art. 211 do Estatuto da Criança e do Adolescente – em redação


idêntica ao § 6º do art. 5º da Lei 7.347/85 - permite que os órgãos públicos
legitimados pelo seu caput – todos, com exceção das associações a que aludem o
inciso III – podem firmar um Termo de Ajustamento de Conduta – as chamadas
TAC – com os réus, ainda que futuros, na qual os últimos se obrigam a
amoldarem sua conduta à lei, sob pena de cominações (multas diárias ou
execução específica, por exemplo). As TAC, segundo a parte final do referido
art. 211, possuem força de título executivo extrajudicial, permitindo que o autor
execute diretamente o contrato na Justiça, sem precisar de uma ação de
conhecimento pretérita.

Para maiores detalhes acerca dos Termos de Ajustamento de Conduta e


sobre a curiosidade acerca do equívoco do então Presidente da República
Fernando Collor de Melo sobre o veto do art. 113 do Código de Defesa do
Consumidor, vide nota acerca dos assuntos no estudo do § 6º do art. 5º da Lei de
Ação Civil Pública.

Art. 212. Para defesa dos direitos e interesses protegidos por esta
Lei, são admissíveis todas as espécies de ações pertinentes.

Com redação parecida com o art. 83 do Código de Defesa do


Consumidor, determina o art. 212 do Estatuto da Criança e do Adolescente que é
aceito qualquer tipo de ação para proteção e reparação dos direitos das crianças e
dos adolescentes no tocante às tutelas coletivas. Segundo o referido artigo, é
admitido qualquer tipo de ação capaz de defender, de forma adequada e efetiva,
os direitos transindividuais das ações e dos adolescentes.

Vale salientar acerca da principal delas, a ação civil pública, estipulada


no art. 1º da Lei 7.347/85, que visa a reparação dos danos morais e materiais
causados ao meio ambiente; ao consumidor; aos bens e direitos de valor
artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; por infração da ordem
econômica; à ordem urbanística; à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos
ou religiosos; ao patrimônio público e social e a qualquer outro interesse difuso
ou coletivo.

Apesar de tal ação se encontrar determinada na Lei 7.347/85, por causa


do microssistema processual coletivo se pode usá-la para proteger e reparar
direitos das crianças e dos adolescentes, nos moldes e nas regras deste Código.

§ 1º Aplicam-se às ações previstas neste Capítulo as normas do


Código de Processo Civil.

Determina o art. § 1º do art. 212 do Estatuto da Criança e do Adolescente


que, nas ações coletivas do caput, aplica-se o Código de Processo Civil em
relação às normas processuais, eis que esta Lei não possui nenhum regramento
acerca de processos. Assim, serão utilizadas as normas do CPC para os
requisitos da petição inicial, da defesa, dos recursos, dentre outros.
Já em relação ao direito material, deverá o Estatuto da Criança e do
Adolescente utilizar das normas existentes na Lei 7.347/85, por ocasião do art.
224 desta Lei – ou de qualquer outra norma existente em matéria de Direitos
Difusos e Coletivos, por força do microssistema processual coletivo -, na qual
veremos oportunamente.

§ 2º Contra atos ilegais ou abusivos de autoridade pública ou agente


de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público, que lesem
direito líquido e certo previsto nesta Lei, caberá ação mandamental, que se
regerá pelas normas da lei do mandado de segurança.

Permite o § 2º do art. 212 que a criança ou adolescente que tiver seu direito
líquido e certo violado por ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou agente
privado com atribuição de Poder Público poder ingressar com uma ação
denominada ação mandamental, que tem como regra a Lei do Mandado de
Segurança (Lei 12016/09), seguindo as regras do mesmo.

Assim, se a um adolescente em idade escolar for negado o direito à matrícula


na escola, poderá ingressar com a ação mandamental para compelir o Estado ou
Município que controla a escola – ou a própria escola, se particular - a agir
conforme a lei.

É importante salientar que o Código de Defesa do Consumidor, sancionado


dois meses depois da sanção do ECA, trouxe uma norma parecida com a
estipulada neste § 2º. Segundo o seu art. 85, “contra atos ilegais ou abusivos de
pessoas físicas ou jurídicas que lesem direito líquido e certo, individual, coletivo
ou difuso, previsto neste Código, caberá ação mandamental, que se regerá pelas
normas da lei do mandado de segurança.”. Entretanto, o então Presidente da
República Fernando Collor de Melo vetou o referido artigo, alegando que o
mandado de segurança possui como objetivo principal a defesa de direitos contra
atos de órgãos o Poder Público, não privados, sendo incompatível com o inciso
LXXI do art. 5º da Carta Magna.

Já o § 2º do art. 212 desta Lei não foi vetado – sendo que o Presidente
da República era o mesmo – por fazer menção a atos ilegais ou abusivos de
autoridade pública ou privada no exercício de atividade pública. Dessa forma, tal
parágrafo não se encontra sob o vício da inconstitucionalidade – uma vez que
não abrangiam as pessoas jurídicas de direito privado. Da mesma forma, o
Parágrafo Único do art. 82 do Estatuto do Idoso, sancionado em 2003 pelo então
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva possui redação idêntica a este §2º, não
sendo também vetado. Por fim, é importante perceber que o art. 1º da Lei
12.016/09, a nova Lei do Mandado de Segurança, abriu espaço para que se use
mandado de segurança contra violação de direito líquido e certo por causa de
autoridade particular, ao dizer: “[...] por parte de autoridade, seja de que
categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.” (grifo nosso)

Art. 213. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação


de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou
determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao
do adimplemento.

O caput do art. 213 do Estatuto da Criança e do Adolescente determina que,


nas ações de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz poderá determinar que haja a
tutela específica da obrigação ou medidas capazes de chegar ao resultado
equivalente ao adimplemento. Esta norma tem como função abrir uma
possibilidade ao Poder Judiciário de cumprir a sentença quando o réu, mesmo
com a decisão determinando que o mesmo aja ou deixe de agir, se recuse a
cumpri-la. Dessa forma, poderá o juiz determinar providências que assegurem o
resultado equivalente ao cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer (por
exemplo, um terceiro realizando a conduta).

§ 1º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado


receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela
liminarmente ou após justificação prévia, citando o réu.

É permitido ao juiz, caso haja fundamento relevante da demanda, conceder


os pedidos do processo no curso do mesmo, quando tiver fundamentado receio
de que esperar até o final do processo pode levar à ineficácia da sentença. É o
que determina o § 1º do art. 213 deste Estatuto. Assim, o magistrado poderá
conceder o pedido final da demanda no curso dela, quando estiver comprovado
fundamentalmente o direito do autor (fumus boni juris) e o perigo da espera do
final do processo (periculum in mora), podendo deferi-lo após uma audiência
prévia, na qual o autor justificará ao juiz da importância da antecipação do
pedido final.

§ 2º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença,


impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for
suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o
cumprimento do preceito.

Para o bom cumprimento da sentença ou da tutela antecipada a que


alude o parágrafo antecedente, pode o juiz determinar multa diária ao réu, para
compeli-lo a cumprir a obrigação de fazer ou não fazer. Assim, quanto mais o
réu demorar para cumprir com a sentença ou tutela antecipada, maior será a
multa – até um limite máximo, estipulado pelo próprio magistrado. Tal multa só
não poderá ser exigida se for insuficiente ou incompatível com a obrigação, por
qualquer motivo.

§ 3º A multa só será exigível do réu após o trânsito em julgado da


sentença favorável ao autor, mas será devida desde o dia em que se houver
configurado o descumprimento.

Conforme visto no estudo do § 2º do art. 12 da Lei 7.347/85 – de igual


redação ao § 3º do art. 213 desta Lei, o Código de Processo Civil permite que o
juiz, em decisão liminar, imponha multa diária ao réu em caso de
descumprimento de uma obrigação de fazer, não fazer ou de entregar coisa. É
uma forma de coagir o réu a cumprir a liminar, sob pena de a mesma virar
apenas um ordem escrita em um papel. O § 3º do art. 213 desta Lei determina
em qual momento essa multa poderá ser cobrada pela parte autora. Segundo a
redação do parágrafo, a multa poderá ser exigida somente após o trânsito em
julgado de uma decisão favorável ao autor, porém a multa será devida desde o
dia em que houver acontecido o descumprimento.

Art. 214. Os valores das multas reverterão ao fundo gerido pelo


Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente do respectivo município.

O Estatuto da Criança e do Adolescente determina que aquele de deixar de


descumprir algumas imposições criadas pela lei (como a hospedagem de criança
ou adolescente em hotéis, motéis, pousadas desacompanhados dos pais, ou a
omissão do aviso de informação destinada à natureza da diversão e a faixa etária
especificada no certificado de classificação; arts. 250 e 252 do ECA,
respectivamente) deverá pagar uma sanção pecuniária a ele imposta. Da mesma
forma, aqueles que cometeram alguns crimes estipulados nesta Lei, como os
crimes de pedofilia (art. 240 a 241-D) ou dos art. 237 a 239, deverá pagar uma
multa, além da pena privativa de liberdade. Porém, para onde vai essa multa?

Determina o art. 214 desta Lei que todas as multas previstas na referida
lei – seja de infração administrativa ou criminal – terá destino o fundo criado
pelo Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente. Assim, as multas pagas
por violação ao direito das crianças e dos adolescentes irão para um fundo que
utilizará deste dinheiro para benefício dos mesmos.

§ 1º As multas não recolhidas até trinta dias após o trânsito em


julgado da decisão serão exigidas através de execução promovida pelo
Ministério Público, nos mesmos autos, facultada igual iniciativa aos demais
legitimados.

Em complemento ao caput deste artigo, determina o seu § 1º que as multas


deverão ser pagas pelos infratores no prazo de trinta dias do trânsito em julgado
das decisões que os condenaram ao seu pagamento. Caso não haja o devido
recolhimento, deverá o Ministério Público ou os demais legitimados do art. 210
executá-la, nos autos do mesmo processo que condenou o pagamento.

§ 2º Enquanto o fundo não for regulamentado, o dinheiro ficará


depositado em estabelecimento oficial de crédito, em conta com correção
monetária.

Com redação idêntica ao § 1º do art. 13 da Lei 7.347/85, determinou o § 1º


do art. 214 do Estatuto da Criança e do Adolescente que, enquanto não for criado
o fundo do caput deste artigo, o dinheiro será recolhido por um estabelecimento
oficial de crédito, em conta com correção monetária (para não perder o valor
econômico).

Art. 215. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para
evitar dano irreparável à parte.

Em consoância ao art. 1.019, I do Código de Processo Civil, determina


o art. 215 do Estatuto da Criança e do Adolescente, com redação idêntica à do
art. 14 da Lei 7.347/85 que, para se evitar dano irreparável ou de difícil
reparação a qualquer uma das partes da ação de que trata o art. 212 desta Lei, o
juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, não possibilitando o seu
cumprimento até o pronunciamento do julgador do recurso ou até o trânsito em
julgado da decisão.

Art. 216. Transitada em julgado a sentença que impuser condenação


ao poder público, o juiz determinará a remessa de peças à autoridade
competente, para apuração da responsabilidade civil e administrativa do
agente a que se atribua a ação ou omissão.

Inovando a legislação a respeito dos direitos difusos e coletivos – tendo


em vista não haver nenhuma lei anterior com redação idêntica, nem o Código de
Defesa do Consumidor, que foi sancionado dois meses depois -, determina o art.
216 do Estatuto da Criança e do Adolescente que, uma vez que qualquer
processo em que o réu for o Poder Público e o autor vencer, transitando em
julgado esta decisão, o juiz enviará à autoridade competente os autos para que
este analise o possível cometimento de infração administrativa ou criminal por
parte do servidor público que agiu ou deixou de agir e acabou por cometer a
violação do direito das crianças e dos adolescentes.

Art. 217. Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da


sentença condenatória sem que a associação autora lhe promova a execução,
deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada igual iniciativa aos demais
legitimados.

De redação idêntica ao art. 15 da Lei de Ação Civil Pública, o art. 217


desta Lei determina que as associações a que aludem o inciso III do art. 210
deste código possuem o prazo de 60 dias para promover a execução da sentença
que condenar alguém a reparar os danos patrimoniais e morais gerados de forma
coletiva contra crianças e adolescentes. Caso não haja a execução, deverá fazer o
Ministério Público, podendo a Defensoria Pública, a Ordem dos Advogados do
Brasil (ambos por ocasião do microssistema processual coletivo), os entes
federados ou a Administração Pública Indireta (também por ocasião do
microssistema processual coletivo) também executarem, caso queiram.

Art. 218. O juiz condenará a associação autora a pagar ao réu os


honorários advocatícios arbitrados na conformidade do § 4º do art. 20 da
Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil), quando
reconhecer que a pretensão é manifestamente infundada.

Determina o caput do art. 218 desta Lei que o juiz condenará a associação
legitimada pelo inciso III do art. 210 a pagar honorários sucumbenciais ao réu –
conforme o § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil -, quando comprovar de
forma efetiva que a ação coletiva é manifestamente infundada. É uma forma de
se punir as associações que se utiliza do Judiciário para ações sem fundamento
algum, que se utilize da má-fé (vide Parágrafo Único deste artigo), dentre outros.
O Judiciário é caro e lotado de processos; enchê-lo com mais processos sem
fundamentação é errado e, portanto, deve-se punir aquele que o fizer.

Mister é salientar que o caput do art. 218 desta Lei determina apenas que as
associações legitimadas poderão ser punidas por ação manifestamente infudada,
silenciando-se quanto aos demais. Tal motivo ocorre pelo fato de os demais
legitimados são do Poder Público, a qual sempre possuem tratamento
diferenciado dado pela lei.

A nosso ver, tal artigo não tem aplicação na atualidade, haja vista que o
artigo 115 do Codigo de Defesa do Consumidor suprimiu expressamente a
redação contida no caput do artigo 17 da Lei de Ação Civil Pública, redação esta
que era exatamente a contida no caput do artigo 218 do ECA. Dessa forma, pelo
microssistema processual coletivo, entendemos não ser mais aplicado o caput do
artigo 218 do ECA somente às ações envolvendo direitos transindividuais de
crianças e adolescentes e não sendo mais aplicado em nenhuma outra
modalidade de ação, nem mesmo na Ação Civil Pública de modo geral.

Parágrafo único. Em caso de litigância de má-fé, a associação autora


e os diretores responsáveis pela propositura da ação serão solidariamente
condenados ao décuplo das custas, sem prejuízo de responsabilidade por
perdas e danos.

Com redação idêntica ao art. 17 da Lei 7.347/85, determina o Parágrafo


Único do art. 218 do ECA que a associação de que trata o inciso III do art. 210
desta Lei que proceder com litigância de má-fé (vide nota acerca da litigância de
má-fé no estudo do art. 17 supramencionado) será condenada solidariamente
(vide nota acerca da responsabilidade solidária no estudo do referido art. 17)
com os diretores responsáveis nos honorários advocatícios e em uma multa
equivalente ao déculo das custas, além de possibilidade de condenação por
perdas e danos.

Art. 219. Nas ações de que trata este Capítulo, não haverá
adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer
outras despesas.

Conforme visto no estudo do art. 18 da Lei 7.347/85 – cujo art. 219 do


Estatuto da Criança e do Adolescente é praticamente idêntico, embora mais
simples – que não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários
periciais e quaisquer outras despesas no curso do processo. Ao contrário do
artigo supramencionado, não há aqui ausência de condenação da associação
autora em honorários de advogado, custas e despesas processuais, exceto má-fé
desta.

Art. 220. Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá


provocar a iniciativa do Ministério Público, prestando-lhe informações
sobre fatos que constituam objeto de ação civil, e indicando-lhe os elementos
de convicção.

Para melhor proteção dos direitos difusos e coletivos de crianças e


adolescentes, instituiu o art. 220 do ECA – com redação idêntica ao art. 6º da Lei
7.347/85 - que qualquer pessoa poderá levar ao Ministério Público informações
acerca de possível violação de tais direitos. É uma oportunidade de a própria
pessoa provocar a iniciativa do parquet, não necessitando que a população
espere, por livre e espontânea vontade, que o órgão tome a iniciativa de
investigar tais violações. Entretanto, o art. 220 deu uma faculdade apenas à
população em geral, que poderá ou não utilizar. Os servidores públicos são
OBRIGADOS a informar ao parquet acerca de violações de direitos difusos e
coletivos que tomarem ciência, podendo sua recusa ser considerada infração
administrativa e até criminal (prevaricação, por exemplo).

Por fim, deve-se salientar que o art. 220 do Estatuto da Criança e do


Adolescente determinou apenas que o Ministério Público poderá ter sua
iniciativa provocada, nada dissertando acerca dos demais legitimados do artigo
anterior. Tal situação se dá, como vimos anteriormente, que o parquet tem como
função primordial a de proteção da lei, de custus legis. Dessa forma, incumbe a
ele a proteção dos direitos das pessoas, sendo, portanto, quem pode ter a sua
iniciativa provocada e o único legitimado para instaurar inquérito civil.

Art. 221. Se, no exercício de suas funções, os juízos e tribunais


tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura de ação
civil, remeterão peças ao Ministério Público para as providências cabíveis.

Complementando o artigo precedente, determina o art. 221 do Estatuto da


Criança e do Adolescente – com redação idêntica ao art. 7º da Lei de Ação Civil
Pública - que os juízes e os desembargadores, caso fiquem sabendo de alguma
violação de direito difuso ou coletivo, por ocasião de seu mister, deverá remeter
peças ao Ministério Público, informando-lhe dos fatos. Como dito anteriormente,
é uma complementação do art. 220 desta Lei, que determina a obrigatoriedade
dos servidores públicos de informar ao parquet sobre fatos que podem constituir
objeto de ação civil pública. Da mesma forma que o artigo precedente, não
poderão os juízes e desembargadores recusarem de remeter as peças, sob pena de
infração administrativa e criminal.

Art. 222. Para instruir a petição inicial, o interessado poderá requerer


às autoridades competentes as certidões e informações que julgar
necessárias, que serão fornecidas no prazo de quinze dias.

Para facilitar a comprovação do alegado na ação que trata o art. 212 desta
Lei, permite o art. 222 do Estatuto da Criança e do Adolescente, com redação
idêntica com a do art. 8º da Lei 7.347/85, que os legitimados do art. 210 poderão
requerer acesso a todas as certidões ou informações que entender ser necessárias
existentes em órgãos públicos ou particulares, que deverão prestar no prazo de
quinze dias. Ao contrário da legislação supramencionada, o Estatuto da Criança
e do Adolescente é omisso em relatar possibilidade de negativa do pedido, assim
como punições em caso de descumprimento.

Art. 223. O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência,


inquérito civil, ou requisitar, de qualquer pessoa, organismo público ou
particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que
assinalar, o qual não poderá ser inferior a dez dias úteis.

Em redação praticamente idêntica ao § 1º do art. 8º da Lei de Ação Civil


Pública, determina o caput do art. 223 do Estatuto da Criança e do Adolescente
que o Ministério Público poderá instaurar inquérito civil ou requisitar, de
qualquer órgão público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias
no prazo que assinalar, não inferior a dez dias úteis.

Sobre o inquérito civil, vide art. 6º da Lei 7853/89 e art. 8º, § 1º da Lei
7.347/85.

Já a segunda parte do art. 223 desta Lei determina que o Ministério


Público possui competência para pedir certidões, informações, exames ou
perícias de qualquer órgão particular ou público, no prazo que assinalar, não
inferior a dez dias úteis. O Ministério Público pode pedir, além das certidões e
informações, exames ou perícias de qualquer órgão público ou particular. Deve-
se salientar que a recusa ao atendimento do pedido do Ministério Público ou o
retardamento ou omissão do mesmo não configura crime previsto no art. 10 da
Lei 7.347/85, por ausência legislativa.

Tal poder exacerbado e diferenciado em relação aos demais legitimados


do art. 210 se dá, como vastamente visto, por ocasião do fato de o Ministério
Público ser custus legis. Dessa forma, como custus legis, o parquet possui poder
diferenciado para agir, em detrimento dos demais legitimados para propor a
Ação Civil Pública.

§ 1º Se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas as diligências,


se convencer da inexistência de fundamento para a propositura da ação
cível, promoverá o arquivamento dos autos do inquérito civil ou das peças
informativas, fazendo-o fundamentadamente.

Com redação idêntica ao caput do art. 9º da Lei 7.347/85, determina o §


1º do art. 223 do Estatuto da Criança e do Adolescente que o Ministério Público
pode, ao final do inquérito civil, convencer de inexistência de fundamentos para
propor a ação coletiva de defesa dos direitos difusos e coletivos da criança e do
adolescente, pelo motivo que for, desde que fundamente os motivos do
arquivamento, para que todos possam ter ciência dos mesmos.

§ 2º Os autos do inquérito civil ou as peças de informação arquivados


serão remetidos, sob pena de se incorrer em falta grave, no prazo de três
dias, ao Conselho Superior do Ministério Público.

Complementando o caput, o § 2º do art. 223 do ECA determina que, tão


logo o Ministério Público arquivou o inquérito civil, deverá enviar, no prazo de
três dias, ao Conselho Superior do Ministério Público, onde o mesmo
homologará ou não o arquivamento. Tal parágrafo possui redação idêntica à do §
1º do art. 9º da Lei 7.347/85.

§ 3º Até que seja homologada ou rejeitada a promoção de


arquivamento, em sessão do Conselho Superior do Ministério público,
poderão as associações legitimadas apresentar razões escritas ou
documentos, que serão juntados aos autos do inquérito ou anexados às
peças de informação.

Determina o § 3º do art. 223 do ECA que, enquanto o Conselho


Nacional do Ministério Público não homologue ou rejeite o arquivamento,
poderão as associações legitimadas pelo inciso III do art. 210 desta Lei
apresentar razões por escrito ou documento, para ajudar na comprovação da
homologação ou rejeitação do pedido de arquivamento do inquérito
civil.

§ 4º A promoção de arquivamento será submetida a exame e deliberação


do Conselho Superior do Ministério Público, conforme dispuser o seu
regimento.

§ 5º Deixando o Conselho Superior de homologar a promoção de


arquivamento, designará, desde logo, outro órgão do Ministério Público
para o ajuizamento da ação.

Os §§ 4º e 5º do art. 223 do Estatuto da Criança e do Adolescente


determinam que, caso o Conselho Nacional do Ministério Público, após exame e
deliberação, deixe de homologar o arquivamento feito pelo órgão do Ministério
Público, deverá designar outro órgão, que ajuizará a ação de que trata o art. 212
desta Lei, afastando o primeiro órgão, que pediu o arquivamento.

Art. 224. Aplicam-se subsidiariamente, no que couber, as


disposições da Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985.

Determina o art. 224 do Estatuto da Criança e do Adolescente que, nas ações


coletivas de que trata o art. 212 desta Lei, deve-se aplicar subsidiariamente a Lei
7.347/85 naquilo que couber. Assim, qualquer norma da Lei de Ação Civil
Pública que não for contrária às normas do ECA poderá ser utilizados por esta.
Atualmente, o microssistema processual coletivo permite que o Estatuto da
Criança e do Adolescente utiliza de qualquer norma relativa à matéria Direitos
Difusos e Coletivos naquilo que não contrariar suas normas.

Por fim, deve-se salientar que o § 1º do art. 212 desta Lei determina que as
normas do Código de Processo Civil são utilizados pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente de forma suplementar, sem qualquer subsidiariamente como ocorre
com a Lei 7.347/85, uma vez que esta lei não possui nenhum regramento acerca
dos processos. Dessa forma, o ECA utilizará das normas deste Capítulo e do
Código de Processo Civil – para recurso, petição inicial e defesa, dentre outros -
para as ações coletivas do caput do art. 212. Já em relação às normas materiais,
aplica-se a Lei 7.347/85 naquilo que não contrariar o ECA – por exemplo, os
membros da Administração Pública Indireta (art. 5º, IV da Lei de Ação Civil
Pública) podem impetrar ação coletiva do art. 212 do ECA, eis que tal norma
não entra em colisão com nenhuma norma desta Lei.
DEFESA DOS DIREITOS
TRANSINDIVIDUAIS DOS IDOSOS

Quinze anos após a promulgação da Constituição Federal de 1988, em 1º de


outubro de 2003 o então Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva
sancionou a Lei 10.741, que instituiu uma legislação cuja função precípua é
defender e garantir a defesa dos direitos das pessoas idosas, em consoância ao
art. 230 da Constituição Federal.

Esta norma possui como condão dissertar acerca de quais são os direitos das
pessoas como idosas (pessoas com idade igual ou superior a 60 anos) e quais os
mecanismos de defesa destes direitos. Da mesma forma, a legislação determinou
direitos individuais do idoso, como os alimentos (art. 11 e ss.), e direitos
coletivos dos idosos em geral, como o transporte gratuito (art. 39 e ss., em
consoância ao § 2º do art. 230 da Constituição Federal). E tão logo dissertou
acerca da existência de direitos coletivos das pessoas idosas, a Lei 10.741/03
determinou os mecanismos de proteção de tais direitos, ampliando os artigos
sobre a matéria Direitos Difusos e Coletivos.

Os art. 78 a 92, que tratam da matéria, são demasiadamente parecidos com os


demais dispositivos que tratam da matéria Direitos Difusos e Coletivos, sendo
alguns mera repetição – como o art. 83, que é idêntico ao art. 84 do CDC; ou o
art. 92, mera repetição do art. 223 do ECA. Porém, outros dispositivos legais do
Estatuto do Idoso inovaram, podendo ser utilizados em defesa de outros direitos
difusos e coletivos por ocasião do microssistema processual coletivo.

Uma destas inovações é o inciso III do art. 81, que determina os


legitimados para propor as ações coletivas esculpidas no art. 82. Dentre o rol de
legimitados, estarão os mesmos que se encontram em outros diplomas
legislativos, como a Lei de Ação Civil Pública (art. 5º), Código de Defesa do
Consumidor (art. 82) e Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 210), como o
Ministério Público, os entes federados (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios) e as associações. Entretanto, no rol dos legitimados, adveio a
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), inovando-se completamente em relação
às legislações anteriores.

E, por ocasião do microssistema processual coletivo, pode a OAB impetrar


ação coletiva para defesa de quaisquer direitos difusos e coletivos. Da mesma
forma, a Defensoria Pública, só legalmente legitimada para impetrar Ação Civil
Pública (art. 5º, II da Lei 7.347/85) e ação para proteção de direitos da pessoa
com deficiência (art. 3º da Lei 7853/89), pode impetrar ação de defesa dos
direitos dos idosos, por ocasião também do microssistema processual coletivo.

LEI No 10.741, DE 1º DE OUTUBRO DE 2003.

[...]

CAPÍTULO III
Da Proteção Judicial dos Interesses Difusos, Coletivos e Individuais
Indisponíveis ou Homogêneos

Art. 78. As manifestações processuais do representante do Ministério


Público deverão ser fundamentadas.

Determina o art. 78 do Estatuto do Idoso que todas as manifestações do


Ministério Público, em qualquer processo que ele se encontra, como parte ou
custus legis, deverão ser fundamentadas. É o que determina o art. 129, § 4º c/c
art. 93, IX da Constituição Federal. Assim, não pode o parquet denunciar
alguém, pedir absolvição, impetrar ação a que alude o art. 82 desta Lei – que
veremos oportunamente – dentre outros atos sem explicar os motivos que o
levou a agir daquela maneira.

Art. 79.Regem-se pelas disposições desta Lei as ações de


responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados ao idoso, referentes à
omissão ou ao oferecimento insatisfatório de:

I – acesso às ações e serviços de saúde;

II – atendimento especializado ao idoso portador de deficiência ou


com limitação incapacitante;

III – atendimento especializado ao idoso portador de doença infecto-


contagiosa;

IV – serviço de assistência social visando ao amparo do idoso.

Parágrafo único. As hipóteses previstas neste artigo não excluem da


proteção judicial outros interesses difusos, coletivos, individuais
indisponíveis ou homogêneos, próprios do idoso, protegidos em lei.

O art. 79 do Estatuto do Idoso determina quais são os direitos assegurados a


todos os idosos cuja violação implica em possibilidade de impetrar a ação
coletiva que trata o art. 82. Determina o referido artigo que, caso algum órgão
público ou particular negue atendimento relativo à saúde, ou de assistência
social, ou quando o idoso é portador de deficiência, de limitação incapacitante
ou de doença infectocontangiosa, ou os ofereça insatisfatoriamente, poderão os
legitimados do art. 81 impetrarem ação de defesa e proteção destes direitos.

Por fim, disserta o Parágrafo Único do mesmo artigo que o rol do caput não
é taxativo, permitindo que os legitimados do art. 81 impetrem ação coletiva para
defesa de qualquer direito transindividual ou individual indisponível dos idosos
acobertados por esta ou qualquer outra lei. Assim, pode o Ministério Público,
por exemplo, impetrar ação coletiva para defesa do direito dos idosos ao
transporte público gratuito a partir dos sessenta e cinco anos de idade. Tal
possibilidade é uma consolidação do inciso IV do art. 1º da Lei de Ação Civil
Pública, que determina que a referida ação poderá ser utilizada para defesa de
qualquer direito difuso ou coletivo – utilizado nesta lei pelo microssistema
processual coletivo.

Art. 80. As ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro


do domicílio do idoso, cujo juízo terá competência absoluta para processar a
causa, ressalvadas as competências da Justiça Federal e a competência
originária dos Tribunais Superiores.

Determina o art. 80 do Estatuto do Idoso que todas as ações coletivas de


proteção à defesa de direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos
deverão ser propostas no foro do domicílio do idoso que teve o direito violado.
Tal competência será absoluta, não podendo ser prorrogada para outra
competência por conveniência das partes ou por desejo até mesmo do idoso –
por exemplo, se o processo corresse em outra comarca andaria mais rapidamente
por lá estarem todas as provas. A única exceção para tal competência é em
relação a competência da Justiça Federal e dos Tribunais Superiores (STJ, STF,
TST, STM e TSE).

Essa regra tem como função facilitar (em tese) o idoso que teve o seu direito
violado, facilitando-o buscar no Judiciário a reparação devida, eis que não
precisa se locomover para outra comarca para buscar o seu direito devido.

Tendo em vista que o Estatuto do Idoso traz regra própria acerca da


competência, não se aplicam os art. 2º da Lei 7.347/85 e 93 do Código de Defesa
do Consumidor, nem os art. 42 e ss. do Código de Processo Civil, por serem
contrários ao instituído neste artigo. Dessa forma, ainda que haja determinação
em outra legislação acerca de competência, deve-se valer a regra instituída no
art. 80 do Estatuto do Idoso.

Por fim, vale ressaltar a estranha redação dada pelo art. 80 do Estatuto
do Idoso. Segundo o referido artigo, as ações previstas neste Capítulo III serão
propostas no foro do domicílio do idoso. O Capítulo III trata das ações coletivas
de proteção à defesa de direitos transindividuais dos idosos. Portanto, as vitimas
são vários idosos. Em alguns casos, as vítimas são indeterminados (no caso dos
direitos difusos). Como saber qual a competência correta se os idosos são vários,
muitos até indeterminados? Deve-se lembrar que a competência é absoluta, não
se prorrogando caso as partes não arguirem no tempo correto – ou seja, caso o
Supremo Tribunal Federal, por exemplo, entender que a competência daquele
processo é outro que não o original, todo o processo é anulado, voltando-se ao
início, após anos correndo na Justiça; o que, certamente, atrasa e muito a
proteção dos direitos transindividuais dos idosos.

Alguns doutrinadores defendem a tese de que o art. 80 também se aplica


nos casos de ações que visam proteger direitos individuais do idoso, acionados
pelo mesmo, ou quando os mesmos são réus de processos. Entendemos que não
é cabível tal alegação, tendo em vista que o art. 80 do Estatuto do Idoso é claro
em dissertar acerca das ações a quais ele é aplicado – ações do art. 82 desta Lei,
que visa proteger direitos transindividuais do idoso, não podendo, assim, ser
aplicado em ações distintas daquelas mencionadas.

Art. 81. Para as ações cíveis fundadas em interesses difusos,


coletivos, individuais indisponíveis ou homogêneos, consideram-se
legitimados, concorrentemente:
Em consoância ao art. 5º da Lei 7.347/85 e art. 82 do Código de Defesa do
Consumidor, determina o art. 81 do Estatuto do Idoso quais são os legitimados
ativos para propor a ação a que alude o art. 82, que veremos oportunamente. O
rol de legitimados é praticamente idêntico ao das demais leis, mantendo-se
sempre os entes federados, o Ministério Público e as associações de defesa de
direitos transindividuais. Não trouxe este rol a Defensoria Pública (acrescida na
legislação pertinente à Ação Civil Pública pela Lei 11488/07) e as pessoas
jurídicas pertencentes à Administração Pública Indireta (autarquias, fundações,
empresas públicas e sociedades de economia mista), porém estas poderão
impetrar as ações coletivas por força do microssistema processual coletivo.

A grande novidade do Estatuto do Idoso é legitimar a Ordem dos Advogados


do Brasil a impetrar ação coletiva, sendo que a mesma não é legitimada em
nenhuma outra legislação que trata sobre a matéria Direitos Difusos e Coletivos.
Entretanto, conforme vimos anteriormente e veremos adiante, por ocasião do
microssistema processual coletivo, a OAB se torna automaticamente legitimada
para propor toda e qualquer ação coletiva de defesa de direitos transindividuais.

Ao contrário das demais legislações que versam sobre o assunto – com


exceção da Lei 7853/89 -, o art. 81 do Estatuto do Idoso determina a
legitimidade de alguns órgãos para propor, além das ações de defesa a direitos
transindividuais, também para ações de interesses individuais indisponíveis – ou
seja, ações que visam proteger direitos individuais do idoso que o mesmo não
pode consentir em perdê-lo, como a vida ou a saúde. Assim, o Ministério
Público ou a OAB, por exemplo, podem impetrar ação contra um hospital para
defender o direito de um idoso ser internado na UTI onde supostamente não tem
vaga, tendo em vista que a ausência da internação pode acarretar a sua morte.

Durante anos, criou-se a discussão se a expressão “direito individual


indisponível” violaria, ou não, o ordenamento jurídico pátrio, uma vez que
órgãos como o Ministério Público possuiria, em tese, competência apenas para
defender direitos transindividuais e que para direitos individuais caberia à
própria parte– assistida pela Defensoria Pública ou por advogado dativo ou
particular - promover a sua defesa. Atualmente, a jurisprudência pátria,
principalmente o Superior Tribunal de Justiça, defende a tese da possibilidade de
o parquet defender direitos individuais indisponíveis, tendo em vista o art. 127
da Carta Magna, que determina a função do órgão ministerial como “defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis” (grifo nosso), além do art. 74 do próprio Estatuto do Idoso, cujo
inciso I disserta que compete ao parquet “instaurar o inquérito civil e a ação civil
pública para a proteção dos direitos e interesses difusos ou coletivos, individuais
indisponíveis e individuais homogêneos do idoso”. Assim, podem os legitimados
deste artigo defenderem direitos individiduais do idoso, desde que sejam
indisponíveis.

I – o Ministério Público;

A Constituição Federal determina, em seu art. 127, conforme vimos


anteriormente, que o Ministério Público tem como função: “a defesa da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis.”. Portanto, cabe ao parquet a proteção dos interesses da sociedade
como um todo. Determina ainda a Carta Magna, em seu art. 129, inciso III, que é
função do Ministério Público: “promover o inquérito civil e a ação civil pública,
para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros
interesses difusos e coletivos”. Ou seja, a própria Constituição Federal determina
ser função ministerial a proteção dos direitos difusos e coletivos. Possui o
Ministério Público, portanto, a função de “custus legis”, ou fiscal da lei, havendo
o dever de fiscalizar a boa aplicação das leis – principalmente em se tratanto de
interesses sociais. Dessa forma, detém tal órgão direito de adentrar com a ação
coletiva para proteção dos direitos difusos e coletivos.

II – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

Assim como o Ministério Público, os entes federados – União, Estados,


Municípios e o Distrito Federal – possuem capacidade de impetrarem ação
coletiva para reparação dos direitos transindividuais, eis que um de seus deveres
é a proteção dos direitos da população.

III – a Ordem dos Advogados do Brasil;

Permite o inciso III do art. 81 do Estatuto do Idoso que a Ordem dos


Advogados do Brasil, a OAB, ingresse com as ações descritas no artigo
subsequente para defesa dos direitos transindividuais ou individuais indisponível
dos idosos. Determinou o legislador de 2003 que a OAB possui tal poder, tendo
em vista a importância da mesma para a defesa não só das prerrogativas dos
advogados, mas também do regime democrático. É pelo mesmo motivo que a
OAB possui poder para ajuizar Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) e a
Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) (art. 103, VII) e é necessária a
sua participação em concurso público para juiz (art. 93, caput, I), membro do
Ministério Público (art. 129, § 3º) e para procuradores dos Estados e do Distrito
Federal (art. 132, caput), além de o Presidente da OAB poder oficiar junto ao
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) (art. 103-B, § 6º) e ao Conselho Nacional
do Ministério Público (CNMP) (art. 130-A, § 4º, todos da Constituição Federal).

O Estatuto do Idoso inovou em relação às demais legislações que tratam


da matéria Direitos Difusos e Coletivos, como a Lei 7.347/85, o Código de
Defesa do Consumidor e o Estatuto da Criança e do Adolescente, tendo em vista
que nestas leis não vêm determinando a possibilidade de a OAB ingressar com a
ação coletiva. Entretanto, devido ao microssistema processual coletivo, pode a
Ordem dos Advogados do Brasil ingressar com a ação coletiva para defesa de
quaisquer difusos e coletivos, não se restringindo apenas aos pertencentes aos
idosos.

IV – as associações legalmente constituídas há pelo menos 1 (um) ano


e que incluam entre os fins institucionais a defesa dos interesses e direitos da
pessoa idosa, dispensada a autorização da assembléia, se houver prévia
autorização estatutária.

O último inciso do art. 81 determina que as associações particulares cuja


função seja a defesa e proteção dos direitos dos idosos poderão impetrar ação
coletiva. Contudo, tais associações só poderão ingressar com a referida ação se
possuírem alguns requisitos determinados pelo próprio inciso IV do art. 81. O
primeiro é a pré-constituição de um ano – ou seja, as associações devem existir
há, pelo menos, um ano, para entrar com a ação coletiva. O segundo é estar
escrito, no estatuto que a cria, que a sua função primordial seja a proteção dos
interesses e direitos supramencionados. Por fim, determina tal inciso que não
precisa de autorização da assembleia da associação para propositura da ação
coletiva, desde que haja prévia autorização.

§ 1o Admitir-se-á litisconsórcio facultativo entre os Ministérios


Públicos da União e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que
cuida esta Lei.

Determina o § 1º do art. 81 do Estatuto do Idoso que poderão os órgãos


do Ministério Público se tornarem litisconsortes na defesa dos direitos difusos e
coletivos de que trata esta lei. Assim, o Ministério Público Federal poderá
auxiliar, por exemplo, o Ministério Público Estadual, sendo litisconsorte deste,
em uma Ação Civil Pública de defesa de direitos transindividuais relativos à
ordem econômica. Da mesma forma, o Ministério Público Estadual pode auxiliar
o Federal em uma Ação Civil Pública de defesa de direitos transindividuais de
esfera federal.

Importante a leitura, no estudo do § 5º do art. 5º da Lei 7.347/85, acerca


da confusão criada pelo então Presidente da República Fernando Collor de Melo
ao esquecer de vetar o art. 113 do Código de Defesa do Consumidor, que
acrescentou os §§ 5º e 6º do referido art. 5º.

§ 2o Em caso de desistência ou abandono da ação por associação


legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado deverá assumir a
titularidade ativa.

Conforme relatado no estudo do § 3º do art. 5º da Lei 7.347/85, o


legislador sempre temeu que as grandes empresas criassem associações de
proteção de direitos transindividuais de fachada, para que estas acionassem a
empresa judicialmente de forma que não ganhasse a ação e coibisse outros
legitimados do caput deste artigo de acionarem por força da coisa julgada, ou da
litispendência no caso de ação em curso. Preocupado, o legislador criou barreiras
para esse tipo de ação: primeiramente, em relação aos efeitos da coisa julgada
(art. 16 da Lei 7.347/85 e art. 103 do Código de Defesa do Consumidor).

Segundo, o referido no § 2º do art. 81 desta Lei, com redação idêntica ao §


3º do art. 5º da Lei de Ação Civil Pública. Determina o referido parágrafo que,
caso as associações desistam ou abandonem uma ação coletiva em curso,
qualquer outro legitimado do caput deste artigo assumirá como autor da ação e
seguirá o seu curso normalmente. Assim, evita-se que uma ação coletiva que se
encontre durante anos no Judiciário seja abandonada sem motivo pelas
associações de fachada e obrigando os demais legitimados a retomarem a ação
do começo.

É importante frisar que o § 2º do art. 81 desta Lei se aplica apenas as


associações legitimadas, sendo completamente silente aos demais legitimados do
caput; e diz “deverá assumir”, ao invés de “poderá assumir”, não sendo uma
faculdade dos legitimados do caput deste artigo assumirem a titularidade ativa, e
sim uma obrigação.

Art. 82. Para defesa dos interesses e direitos protegidos por esta Lei,
são admissíveis todas as espécies de ação pertinentes.

Com redação parecida com o art. 83 do Código de Defesa do


Consumidor, determina o art. 82 do Estatuto do Idoso que é aceito qualquer tipo
de ação para proteção e reparação dos direitos dos idosos no tocante às tutelas
coletivas. Segundo o referido artigo, é admitido qualquer tipo de ação capaz de
defender, de forma adequada e efetiva, os direitos transindividuais dos idosos.
Vale salientar acerca da principal delas, a ação civil pública, estipulada no art. 1º
da Lei 7.347/85, que visa a reparação dos danos morais e materiais causados ao
meio ambiente; ao consumidor; aos bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico; por infração da ordem econômica; à ordem
urbanística; à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos; ao
patrimônio público e social e a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
Apesar de tal ação se encontrar determinada na Lei 7.347/85, por causa do
microssistema processual coletivo, pode-se usá-la para proteger e reparar direitos
dos idosos, nos moldes e nas regras deste Código.

Parágrafo único. Contra atos ilegais ou abusivos de autoridade


pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições de Poder
Público, que lesem direito líquido e certo previsto nesta Lei, caberá ação
mandamental, que se regerá pelas normas da lei do mandado de segurança.

Permite o Parágrafo Único do art. 82 que o idoso que tiver seu direito líquido
e certo violado por ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou agente privado
com atribuição de Poder Público poder ingressar com a chamada ação
mandamental, que tem como regra a Lei do Mandado de Segurança (Lei
12016/09), seguindo as regras do mesmo.

Assim, se o transporte público municipal deixar de transportar gratuitamente


idosos com mais de sessenta e cinco anos de idade (art. 230, § 2º da Constituição
Federal e art. 39, caput desta Lei), poderá o idoso que se sentir violado ingressar
com a ação mandamental para compelir o transporte público municipal a agir
conforme a lei. Para maiores detalhes sobre a ação mandamental, vide § 2º do
art. 212 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Art. 83. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de


fazer ou não-fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou
determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao
adimplemento.
O caput do art. 83 do Estatuto do Idoso determina que nas ações de
obrigação de fazer ou não fazer o juiz poderá determinar que haja a tutela
específica da obrigação ou medidas capazes de chegar ao resultado equivalente
ao adimplemento. Esta norma tem como função abrir uma possibilidade ao
Poder Judiciário de cumprir a sentença quando o réu, mesmo com a decisão
determinando que o mesmo aja ou deixe de agir, se recuse a cumpri-la. Dessa
forma, poderá o juiz determinar providências que assegurem o resultado
equivalente ao cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer (por exemplo,
um terceiro realizando a conduta).

§ 1o Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo


justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder
a tutela liminarmente ou após justificação prévia, na forma do art. 273 do
Código de Processo Civil.

É permitido ao juiz, caso haja fundamento relevante da demanda, conceder


os pedidos do processo no curso do mesmo, quando tiver fundamentado receio
de que esperar até o final do processo pode levar à ineficácia da sentença. É o
que determina o § 1º do art. 83 desta Lei, em consoância ao art. 300 do Código
de Processo Civil – que substiuiu o art. 273 do antigo CPC. Assim, o magistrado
poderá conceder o pedido final da demanda no curso dela, quando estiver
comprovado fundamentalmente o direito do autor (fumus boni juris) e o perigo
da espera do final do processo (periculum in mora), podendo deferi-lo após uma
audiência prévia, na qual o autor justificará ao juiz da importância da
antecipação do pedido final.

§ 2o O juiz poderá, na hipótese do § 1o ou na sentença, impor multa


diária ao réu, independentemente do pedido do autor, se for suficiente ou
compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento
do preceito.

Para o bom cumprimento da sentença ou da tutela antecipada a que alude o


parágrafo antecedente, pode o juiz determinar multa diária ao réu, para compeli-
lo a cumprir a obrigação de fazer ou não fazer. Assim, quanto mais o réu
demorar para cumprir com a sentença ou tutela antecipada, maior será a multa –
até um limite máximo, estipulado pelo próprio magistrado. Tal multa só não
poderá ser exigida se for insuficiente ou incompatível com a obrigação, por
qualquer motivo.
§ 3o A multa só será exigível do réu após o trânsito em julgado da
sentença favorável ao autor, mas será devida desde o dia em que se houver
configurado.

Conforme visto no estudo do § 2º do art. 12 da Lei 7.347/85 e do § 3º do art.


213 do ECA – de iguais redações ao § 3º do art. 83 desta Lei, o Código de
Processo Civil permite que o juiz, em decisão liminar, imponha multa diária ao
réu em caso de descumprimento de uma obrigação de fazer, não fazer ou de
entregar coisa. É uma forma de coagir o réu a cumprir a liminar, sob pena de a
mesma virar apenas um ordem escrita em um papel. O § 3º do art. 83 desta Lei
determina em qual momento essa multa poderá ser cobrada pela parte autora.
Segundo a redação do parágrafo, a multa poderá ser exigida somente após o
trânsito em julgado de uma decisão favorável ao autor, porém a multa será
devida desde o dia em que houver acontecido o descumprimento.

Por exemplo, o juiz determina que a empresa “X” atenda idosos com
doença infectocontagiosa (art. 79, III desta Lei) no curso de uma Ação Civil
Pública que determina que a referida empresa passe a cuidar de idosos com a
referida doença. A empresa é obrigada a cuidar dos idosos a partir do dia 20 de
dezembro de 2015, por exemplo, sob pena de multa diária de R$ 3000,00 (três
reais), mas descumpre a decisão. O trânsito em julgado da decisão que condena a
empresa a cumprir a obrigação supramencionada sai no dia 20 de janeiro de
2016. A multa só poderá ser cobrada da empresa a partir do dia 20 de janeiro,
mas o seu acúmulo se faz desde o dia 20 de dezembro (ou seja, a empresa deverá
pagar R$ 3.000,00 por dia a partir do dia 20 de dezembro).

Art. 84. Os valores das multas previstas nesta Lei reverterão ao


Fundo do Idoso, onde houver, ou na falta deste, ao Fundo Municipal de
Assistência Social, ficando vinculados ao atendimento ao idoso.

O Estatuto do Idoso determina que aquele de deixar de cumprir algumas


imposições criadas pela lei (como o atendimento prioritário ao idoso, ou a
entidade de atendimento ao idoso de não cumprir com as obrigações estipuladas
no art. 50 desta Lei) deverá pagar uma sanção pecuniária a ele imposta (vide
arts. 56 a 58). Da mesma forma, aqueles que cometeram alguns crimes
estipulados nesta Lei, como os art. 96 ao 105, deverá pagar uma multa, além da
pena privativa de liberdade. Porém, para onde vai essa multa?

Determina o art. 84 da Lei 10741/03 que todas as multas previstas na


referida lei – seja de infração administrativa ou criminal – terá destino o Fundo
do Idoso, onde houver, ou o Fundo Municipal da Assistência Social, ficando a
multa vinculada ao atendimento ao idoso, na falta daquele. Assim, as multas
pagas por violação ao direito dos idosos irá para um fundo que utilizará deste
dinheiro para benefício dos idosos.

Vale salientar que, a priori, a regra do art. 84 do Estatuto do Idoso é


parecida com a do art. 13 da Lei 7.347/85; entretanto, não o é. O referido art. 13
estipula o destino das indenizações obtidos através das Ações Civis Públicas,
enquanto o art. 84 supramencionado determina acerca das multas estipuladas
nesta Lei. E, como não há nenhuma referência para o destino das indenizações
obtidas através das ações que aludem o art. 82 desta Lei, estas irão para o fundo
criado pelo art. 13 retromencionado, por ocasião do microssistema processual
coletivo.

Parágrafo único. As multas não recolhidas até 30 (trinta) dias após o


trânsito em julgado da decisão serão exigidas por meio de execução
promovida pelo Ministério Público, nos mesmos autos, facultada igual
iniciativa aos demais legitimados em caso de inércia daquele.

Em complemento ao caput deste artigo, determina o seu Parágrafo Único que


as multas deverão ser pagas pelos infratores no prazo de trinta dias do trânsito
em julgado das decisões que os condenaram ao seu pagamento. Caso não haja o
devido recolhimento, deverá o Ministério Público executá-la, nos autos do
mesmo processo que condenou o pagamento. Se o parquet ficar inerte e não
executar a multa, poderão fazer os demais legitimados do art. 81 – porém,
quanto a estes, é uma faculdade a execução, e não uma obrigatoriedade, como no
caso do Ministério Público.

Art. 85. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para
evitar dano irreparável à parte.

Em consoância ao art. 1019, I do Código de Processo Civil, determina o


art. 85 do Estatuto do Idoso, com redação idêntica à do art. 14 da Lei 7.347/85,
que, para se evitar dano irreparável ou de difícil reparação a qualquer uma das
partes da ação de que trata o art. 82 desta Lei, o juiz poderá conferir efeito
suspensivo aos recursos, não possibilitando o seu cumprimento até o
pronunciamento do julgador do recurso ou até o trânsito em julgado da decisão.
Art. 86. Transitada em julgado a sentença que impuser condenação
ao Poder Público, o juiz determinará a remessa de peças à autoridade
competente, para apuração da responsabilidade civil e administrativa do
agente a que se atribua a ação ou omissão.

Sem artigo de redação parecida ou idêntica na Lei 7.347/85 e no Código de


Defesa do Consumidor (apenas no ECA; art. 216), determina o art. 86 do
Estatuto do Idoso que, em processos em que o réu for o Poder Público e o autor
vencer, transitando em julgado esta decisão, o juiz enviará à autoridade
competente os autos para que este analise o possível cometimento de infração
administrativa ou criminal por parte do servidor público que agiu ou deixou de
agir e violou direito dos idosos.

Art. 87. Decorridos 60 (sessenta) dias do trânsito em julgado da


sentença condenatória favorável ao idoso sem que o autor lhe promova a
execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultada, igual iniciativa aos
demais legitimados, como assistentes ou assumindo o pólo ativo, em caso de
inércia desse órgão.

Com redação parecida à do art. 15 da Lei de Ação Civil Pública, determina o


art. 87 do Estatuto do Idoso que o autor da ação – e não apenas aqui a associação
autora – possui o prazo de 60 dias para promovor a execução da sentença da
ação a que alude o art. 82 desta Lei. Caso não haja execução, deverá fazer o
Ministério Público, podendo a Defensoria Pública (por ocasião do microssistema
processual coletivo), a Ordem dos Advogados do Brasil, os entes federados ou a
Administração Pública Indireta (também por ocasião do microssistema
processual coletivo) adentrarem como assistentes, caso queiram. Deve-se
salientar que, ao contrário do art. 15 da Lei 7.347/85, os demais legitimados do
art. 81 desta Lei só poderão executar a sentença caso haja inércia do Ministério
Público. Do contrário, poderão ser apenas assistentes do parquet.

Art. 88. Nas ações de que trata este Capítulo, não haverá
adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer
outras despesas.

Parágrafo único. Não se imporá sucumbência ao Ministério Público.

Conforme visto no estudo do art. 18 da Lei 7.347/85 – cujo art. 88 do


Estatuto do Idoso é praticamente idêntico, embora mais simples –, não haverá
adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras
despesas no curso do processo. Ao contrário do artigo supramencionado – assim
como ocorre no art. 219 do ECA - não há aqui ausência de condenação da
associação autora em honorários de advogado, custas e despesas processuais,
exceto má-fé desta. O Parágrafo Único do art. 88 apenas ressalta que o
Ministério Público não deverá pagar sucumbência caso seja vencido – inclusive
sendo completamente silente quanto aos demais legitimados do art. 81 desta Lei.

Art. 89. Qualquer pessoa poderá, e o servidor deverá, provocar a


iniciativa do Ministério Público, prestando-lhe informações sobre os fatos
que constituam objeto de ação civil e indicando-lhe os elementos de
convicção.

Para melhor proteção dos direitos difusos e coletivos contra idosos,


instituiu o art. 89 do Estatuto do Idoso, com redação idêntica à do art. 6º da Lei
7.347/85 que qualquer pessoa poderá levar ao Ministério Público informações
acerca de possível violação de tais direitos. É uma oportunidade de a própria
pessoa provocar a iniciativa do parquet, não necessitando que a população
espere, por livre e espontânea vontade, que o órgão tome a iniciativa de
investigar tais violações. Entretanto, o art. 89 deu uma faculdade apenas à
população em geral, que poderá ou não utilizar. Os servidores públicos são
OBRIGADOS a informar ao parquet acerca de violações de direitos difusos e
coletivos que tomarem ciência, podendo sua recusa ser considerada infração
administrativa e até criminal (prevaricação, por exemplo).

Por fim, deve-se salientar que a o art. 89 do Estatuto do Idoso


determinou apenas que o Ministério Público poderá ter sua iniciativa provocada,
nada dissertando acerca dos demais legitimados do art. 81. Tal situação se dá,
como vimos no estudo do § 1º do art. 5º da Lei 7.347/85, que o parquet tem
como função primordial a de proteção da lei, de custus legis. Dessa forma,
incumbe a ele a proteção dos direitos das pessoas, sendo, portanto, quem pode
ter a sua iniciativa provocada e o único legitimado para instaurar inquérito civil.

Art. 90. Os agentes públicos em geral, os juízes e tribunais, no


exercício de suas funções, quando tiverem conhecimento de fatos que
possam configurar crime de ação pública contra idoso ou ensejar a
propositura de ação para sua defesa, devem encaminhar as peças
pertinentes ao Ministério Público, para as providências cabíveis.
Em redação parecida com o art. 7º da Lei de Ação Civil Pública,
determina o art. 90 que os agentes públicos, juízes e desembargadores, caso
fiquem sabendo de alguma violação de direito difuso ou coletivo contra idoso ou
crime de ação penal pública (incondicionada ou condicionada), por ocasião de
seu mister, deverá remeter peças ao Ministério Público, informando-lhe os fatos.
Os agentes públicos, juízes e tribunais não podem ser recusar de remeter as
peças, sob pena de infração administrativa e criminal.

A grande diferença entre o art. 90 do Estatuto do Idoso e o art. 7º da Lei


7.347/85 é que o primeiro determina a obrigatoriedade de informação por parte
dos agentes públicos, juízes e tribunais de qualquer crime de ação pública contra
idoso, desta lei ou de qualquer outra, que tomar conhecimento por causa de sua
profissão, enquanto a Lei de Ação Civil Pública é omissa neste ponto.

Art. 91. Para instruir a petição inicial, o interessado poderá requerer


às autoridades competentes as certidões e informações que julgar
necessárias, que serão fornecidas no prazo de 10 (dez) dias.

Para facilitar a comprovação do alegado na ação que trata o art. 82 desta


Lei, permite o art. 91 do Estatuto do Idoso, com redação parecida com a do art.
8º da Lei 7.347/85, que os legitimados do art. 81 poderão requerer acesso a todas
as certidões ou informações que entender ser necessárias existentes em órgãos
públicos ou particulares, que deverão prestar no prazo de dez dias – e não
quinze, como determina a Lei de Ação Civil Pública. Ao contrário da legislação
supramencionada, o Estatuto do Idoso é omisso em relatar possibilidade de
negativa do pedido, assim como punições em caso de descumprimento.

Entretanto, sabemos que a Lei de Ação Civil Pública, mais


precisamente o seu art. 8º, é mais completo que o Estatuto do Idoso e não bate de
frente com este, podendo utilizar, portanto, o § 2º do artigo acima citado como
regra de possibilidade de negativa do pedido de certidões e informações – até
porque tal regra é necessária, por ocasião da segurança jurídica -, por ocasião do
microssistema processual coletivo. Todavia, tendo em vista o citado no estudo do
art. 10 da Lei 7.347/85, não se pode punir nos fulcros do crime previsto neste
artigo para aquele que omitir, retardar ou recusar informação acerca do pedido
de certidões ou informações com base no art. 91 do Estatuto do Idoso, tendo em
vista a ausência de previsão legislativa do crime no referido estatuto.

Art. 92. O Ministério Público poderá instaurar sob sua presidência,


inquérito civil, ou requisitar, de qualquer pessoa, organismo público ou
particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que
assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias.

Em redação praticamente idêntica ao § 1º do art. 8º da Lei de Ação


Civil Pública, determina o caput do art. 92 do Estatuto do Idoso que o Ministério
Público poderá instaurar inquérito civil ou requisitar, de qualquer órgão público
ou particular, certidões, informações, exames ou perícias no prazo que assinalar,
não inferior a dez dias – e não dez dias úteis, como no caso da Lei 7.347/85.

Sobre o inquérito civil, vide art. 6º da Lei 7853/89 e art. 8º, § 1º da Lei
7.347/85.

Já a segunda parte do art. 92 desta Lei determina que o Ministério


Público possui competência para pedir certidões, informações, exames ou
perícias de qualquer órgão particular ou público, no prazo que assinalar, não
inferior a dez dias. É uma diferenciação do artigo precedente, que permite a
qualquer um solicitar informações ou certidões no prazo de dez dias. O
Ministério Público pode pedir, além das certidões e informações, exames ou
perícias de qualquer órgão público ou particular. Deve-se salientar que a recusa
ao atendimento do pedido do Ministério Público ou o retardamento ou omissão
do mesmo não configura crime previsto no art. 10 da Lei 7.347/85, por ausência
legislativa.

Tal poder exacerbado e diferenciado dos demais legitimados do art. 81


se dá, como vastamente visto, por ocasião do fato de o Ministério Público ser
custus legis. Dessa forma, como custus legis, o parquet possui poder
diferenciado para agir, em detrimento dos demais legitimados para propor a
Ação Civil Pública.

§ 1o Se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas as


diligências, se convencer da inexistência de fundamento para a propositura
da ação civil ou de peças informativas, determinará o seu arquivamento,
fazendo-o fundamentadamente.

Redação idêntica ao caput do art. 9º da Lei 7.347/85, determina o § 1º


do art. 92 do Estatuto do Idoso que o Ministério Público pode, ao final do
inquérito civil, convencer de inexistência de fundamentos para propor a ação
coletiva do art. 82 desta Lei – seja por ausência de provas, seja por ausência de
danos, seja por impossibilidade de descoberta do autor dos fatos. Para tanto,
deverá o Ministério Público fundamentar os motivos do arquivamento, para que
todos possam ter ciência dos mesmos.

§ 2o Os autos do inquérito civil ou as peças de informação


arquivados serão remetidos, sob pena de se incorrer em falta grave, no
prazo de 3 (três) dias, ao Conselho Superior do Ministério Público ou à
Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público.

Complementando o caput do art. 92 desta Lei, o seu § 2º determina que,


tão logo o Ministério Público arquive o inquérito civil, deverá enviar, no prazo
de três dias, ao Conselho Superior do Ministério Público ou à Câmara de
Coordenação e Revisão do Ministério Público, para que o mesmo homologue ou
não o arquivamento. Tal parágrafo possui redação praticamente idêntica à do §
1º do art. 9º da Lei 7.347/85; entretanto, o mesmo não faz mesmo à Câmara de
Coordenação e Revisão do Ministério Público e sim apenas ao Conselho
Nacional do Ministério Público.

§ 3o Até que seja homologado ou rejeitado o arquivamento, pelo


Conselho Superior do Ministério Público ou por Câmara de Coordenação e
Revisão do Ministério Público, as associações legitimadas poderão
apresentar razões escritas ou documentos, que serão juntados ou anexados
às peças de informação.

Determina o § 3º que, enquanto o Conselho Nacional do Ministério


Público ou a Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público não
homologue ou rejeite o arquivamento, poderão as associações legitimadas
apresentar razões por escrito ou documento, para ajudar na comprovação da
homologação ou rejeitação do pedido de arquivamento do inquérito civil.

§ 4o Deixando o Conselho Superior ou a Câmara de Coordenação e


Revisão do Ministério Público de homologar a promoção de arquivamento,
será designado outro membro do Ministério Público para o ajuizamento da
ação.

O § 4º do art. 92 do Estatuto do Idoso determina que o Conselho


Nacional do Ministério Público ou a Câmara de Coordenação e Revisão do
Ministério Público, após exame e deliberação o pedido de arquivamento e no
caso de retificação do mesmo, deverá designar outro órgão do Ministério Público
para ajuizar a ação de que trata do art. 82 desta Lei, afastando o órgão do
Ministério Público que pediu o arquivamento.

[...]
MANDADO DE SEGURANÇA
COLETIVO

O mandado de segurança é um remédio constitucional, junto da Ação Popular,


do habeas corpus, do habas data e do mandado de injunção, que permite defesa
de direito líquido e certo não amparado pelo habeas corpus (liberdade de ir e
vir), nem pelohabeas data (informações acerca da pessoa). A Constituição
Federal, em seu art. 5º, inciso LXIX determina que o responsável pelo ato ilegal
ou abusivo que ofende o direito líquido e certo deve ser autoridade pública ou
agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Já o art.
1º da Nova Lei do Mandado de Segurança (Lei 12016/09) permite que seja
contra qualquer autoridade, “seja de que categoria for e sejam quais forem as
funções que exerça”, nas palavras do próprio artigo.

A Constituição Federal de 1988 criou o chamado mandado de


segurança coletivo, que permite que alguns legitimados ingressem perante
o Poder Judiciário com o dito remédio constitucional para defesa de direito
líquido e certo de todos os seus associados – quando a violação do direito é
transindividual, atingindo, normalmente, todos os associados. É uma forma
diferenciada de defesa de direito líquido e certo, criado pela Carta Magna.

Ao contrário das demais legislações acerca dos Direitos Difusos e Coletivos,
os legitimados para impetrar mandado de segurança coletivo não são o
Ministério Público, Defensoria Pública, Ordem dos Advogados do Brasil, entes
federados e seus membros da Administração Pública Indireta e as associações
legitimadas (Lei de Ação Civil Pública, Código de Defesa do Consumidor, Lei
7853/89, Estatuto da Criança e do Adolescente e Estatuto do Idoso), ou os
cidadãos (Lei de Ação Popular). Conforme especifica o inciso LXX do art. 5º da
Carta Magna de 1988, são legitimados para propor mandado de segurança
coletivo:
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

a) partido político com representação no Congresso Nacional;



b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente
constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos
interesses de seus membros ou associados;

Somente estes podem impetrar mandado de segurança coletivo, visando


derrubar ato ilegal ou abusivo que viola direitos transindividuais de seus
associados.

Por fim, em consoância com os demais mandamentos acerca da proteção dos


Direitos Difusos e Coletivos, o mandado de segurança coletivo também é
abarcado pelo microssistema processual coletivo, utilizando as regras dos demais
ramos do Direito naquilo em que for compatível.

LEI Nº 12.016, DE 7 DE AGOSTO DE 2009.

[...]

Art. 21. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por


partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de
seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade
partidária, ou por organização sindical, entidade de classe ou associação
legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em
defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus
membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes
às suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial.

Em consoância ao inciso LXX do art. 5º da Constituição Federal de


1988, determina o art. 21 da Lei do Mandado de Segurança que os legitimados
para propor mandado de segurança coletivo são: os partidos políticos com
representação no Congresso Nacional (ou seja, partidos políticos que possuem
deputados federais e/ou senadores no Congresso); organização sindical
(sindicatos); entidades de classe ou associações legalmente constituídas. Estas,
assim como nas demais legislações acerca do tema Direitos Difusos e Coletivos,
somente poderão impetrar mandado de segurança coletivo com, pelo menos, um
ano de funcionamento.

Ademais, determina o art. 21 da referida lei que os partidos políticos


poderão impetrar mandado de segurança coletivo para defesa de direito
transindividual líquido e certo de seus integrantes ou à finalidade partidiária. Da
mesma forma, as organizações sindicais, entidades de classe e as associações
legitimadas só poderão impetrar mandado de segurança coletivo para defesa de
direitos transindividuais líquidos e certos de seus membros ou associados. É uma
possibilidade de defesa judicial de direitos violados de toda a classe em uma só
demanda, sem que lote o Judiciário com centenas ou até milhares de demandas
individuais na busca do mesmo direito.

Restringe-se, entretanto, a atuação de tais entidades, ao permitir a defesa


coletiva de direitos líquidos e certos violados apenas de seus associados, eis que
os mesmos não possuem legitimidade para defender direitos violados da
coletividade, como possuem os entes federados, a Defensoria Pública e o
Ministério Público, por exemplo – deve-se salientar que as associações são
exceção, uma vez que podem propor Ações Civis Públicas se sua função é
defesa dos direitos arrolados no art. 1º da Lei 7.347/85, da criança e do
adolescente, da pessoa com deficiência ou dos idosos.

Parágrafo único. Os direitos protegidos pelo mandado de


segurança coletivo podem ser:

I - coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os


transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou
categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma
relação jurídica básica;

II - individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito desta Lei,


os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da
totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante.

Determina o Parágrafo Único do art. 21 da Lei 12016/09 que os


mandados de segurança coletivos poderão defender direitos coletivos ou
individuais homogêneos. Conforme vimos no estudo do Parágrafo Único, incisos
II e III do art. 81 do Código de Defesa do Consumidor, direitos coletivos são
aqueles transindividuais a qual um grupo, categoria ou classe de pessoas são
ligadas entre si e/ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. Já
direitos individuais homogêneos são aqueles em que são individuais, com
vítimas e danos determinados, porém de origem comum.

Ao contrário do Parágrafo Único do art. 81 do CDC e as demais


legislações acerca de Direitos Difusos e Coletivos, o Parágrafo Único do art. 21
desta Lei não faz menção à defesa de direitos difusos por parte do mandado de
segurança. Tal regra ocorre porque os direitos difusos são aqueles de toda a
coletividade, sem que se consiga diferenciar quem é titular ou não do direito, e
em qual montante. O mandado de segurança coletivo visa defender os direitos
transindividuais dos associados ou membros dos legitimados do caput deste
artigo, sendo, portanto, pessoas determináveis – em completo contrassenso com
os direitos difusos.

Todavia, é dever informar que existem jurisprudências que pensam ao


contrário, permitindo que os legitimados do caput ingressem mandado de
segurança coletivo em defesa de direitos difusos da coletividade. Vejamos:

"...expresso meu entendimento no sentido de que o mandado de


segurança coletivo protege tanto os interesses coletivos e difusos, quanto os
direitos subjetivos." (RE 181.438-1/SP, STF, Tribunal Pleno Min.Carlos
Velloso).

"À agremiação partidária, não pode ser vedado o uso do mandado de


segurança coletivo em hipóteses concretas em que estejam em risco, por
exemplo, o patrimônio histórico, cultural ou ambiental de determinada
comunidade. Assim, se o partido político entender que determinado direito
difuso se encontra ameaçado ou lesado por qualquer ato da administração,
poderá fazer uso do mandado de segurança coletivo, que não se restringirá
apenas aos assuntos relativos a direitos políticos e nem a seus integrantes."
(Min. Ellen Gracie, no STF, Pleno, RE n. 196.184, j. em 27.10.2004, RE
196.184, transcrições, Bol.Inf. do STF nº. 372).

Data maxima venia, discordamos. Não foi o interesse do legislador
utilizar o mandado de segurança coletivo para defesa de direitos líquidos e certos
transindividuais da coletividade e sim de somente dos associados ou membros
dos legitimados do caput. Do contrário, legitimariam o Ministério Público – cuja
função precípua é a defesa de direitos transindividuais -, os entes federados e a
Defensoria Pública, por exemplo. Mandado de segurança coletivo não é Ação
Civil Pública para defender direitos transindividuais da coletividade e não pode
ser tratado dessa forma.

Art. 22. No mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa


julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo
impetrante.

A coisa julgada nos Direitos Difusos e Coletivos possui como regra


geral os art. 16 da Lei 7.347/85 e art. 103 do CDC, de leituras obrigatórias. Tais
regras são utilizadas em todas as legislações de defesa dos direitos
transindividuais, por ocasião do microssistema processual coletivo – com
exceção do Mandado de Segurança Coletivo. A Lei 12016/09 trouxe regra
distinta acerca da coisa julgada nos mandados de segurança coletivo, embora
muito se pareça com as regras constantes no art. 103 supramencionado.

Regra tal artigo que a coisa julgada será ultra partes, limitadamente aos
associados ou membros dos legitimados do caput do artigo precedente. Dessa
forma, a coisa julgada não afetará qualquer pessoa que não esteja associada ou
não seja membra da entidade autora do mandado de segurança. Tal regra se
aplicará ainda à defesa de direitos individuais homogêneos, ainda que o inciso
III do art. 103 do CDC determine regra distinta à coisa julgada de tais direitos.

Por fim, é importante mencionar acerca da ausência legislativa acerca


da não aplicabilidade da coisa julgada quando da improcedência do pedido por
ausência de provas – grande marco na defesa dos Direitos Difusos e Coletivos.
Como não há nada escrito em relação à exceção, a mesma não poderá ser
aplicada ao mandado de segurança coletivo. A nosso ver, pecou o legislador em
ausentar tal exceção à coisa julgada.

§ 1o O mandado de segurança coletivo não induz litispendência


para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o
impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado
de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada
da impetração da segurança coletiva.

Pode a entidade legitimada do caput do artigo precedente impetrar


mandado de segurança coletivo ainda que haja vários mandados de segurança
individuais – ou ações ordinárias - correndo simultaneamente pelo Poder
Judiciário e o ingresso da ação coletiva não obrigará a extinção por
litispendência das ações individuais. Entretanto, assim como determina o art.
104 do Código de Defesa do Consumidor, a coisa julgada só aprovará a parte –
ou seja, a decisão do mandado de segurança coletivo só fará efeito à parte que
impetrou mandado de segurança individual, ou mesmo ação ordinária – se este
desistir da ação individual dentro de trinta dias do dia em que tomou ciência
acerca da impetração do mandado de segurança coletivo.

Ao contrário do art. 104 do CDC, o § 1º do art. 22 desta Lei não


determina a suspensão do processo individual, e sim a sua desistência. Assim, se
o mandado de segurança coletivo for julgado improcedente, o processo
individual não volta a correr de novo e não poderá ingressar, eis se encontrar sob
o efeito da coisa julgada. Há enorme crítica por parte dos doutrinadores – a nós,
inclusos – sobre tal determinação deste artigo, a qual pelo correto deveria estar
escrito suspensão e não desistência – até para entrar em consoância com as
demais legislações acerca dos Direitos Difusos e Coletivos e não ir de encontro
ao microssistema processual coletivo.

§ 2o No mandado de segurança coletivo, a liminar só poderá ser


concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de
direito público, que deverá se pronunciar no prazo de 72 (setenta e duas)
horas.

Em regra autônoma ao caput e § 1º deste artigo, determina o § 2º do art.


22 da Lei 12.016/09 que o mandado de segurança coletivo só terá sua liminar
deferida após audiência com o representante judicial da pessoa jurídica de direito
público, que terá o prazo improrrogável de 72 (setenta e duas) horas para se
pronunciar. Dessa forma, é vedada a concessão de liminar inaudita altera pars
em sede de mandado de segurança coletivo.

Art. 23. O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á


decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do
ato impugnado.

Decai do direito de impetrar Mandado de Segurança – individual ou


coletivo, se o autor não o impetrar no prazo de 120 (cento e vinte) dias corridos.
A partir do referido prazo, poderá o agente impetrar normalmente ação
individual ou até mesmo coletiva para defesa do direito ofendido, mas não
Mandado de Segurança.
O termo inicial para contagem do prazo supramencionado é a data da
ciência inequívoca, do interessado, do ato impugnado. Assim, se o ato
impugnado ocorreu em 17 de agosto e o agente tomar conhecimento em 30 de
setembro do mesmo ano, p.ex., o prazo do artigo 23 será contado a partir do dia
30 de setembro e não do dia 17 de agosto.

Por fim, aqui não há o instituto da prescrição, mas sim da decadência. O


autor perde o direito de impetrar Mandado de Segurança, mas pode buscar seus
direitos através de outras modalidades de ação. Em contrapartida, não se aplica a
decadência os institutos que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição,
salvo relativamente aos absolutamente incapazes (artigos 207 e 208, parte final,
do Código Civil).

[...]
MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO

O mandado de injunção, assim como o mandado de segurança, a Ação Popular,


o habeas corpus e o habeas data, é um remédio constitucional. Tem como
função, conforme o artigo 5º, inciso LXXI da Constituição Federal, quando a
falta de norma regulamentadora inviabiliza o exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à
cidadania.

Por ironia do destino, o mandado de injunção só foi devidamente


regulamentado em 2016, com o advento da Lei 13.300/16. Até então, utilizava-
se subsidiariamente a lei do habeas data (Lei 9507/97).

Um exemplo famoso da utilização do mandado de injunção foi em relação ao


direito de greve dos servidores públicos, que o possuem, mas não está
regulamentado por lei infraconstitucional (art. 9º c/c art. 37, VII da Constituição
Federal), a qual o Supremo Tribunal Federal mandou o Congresso Nacional criar
a lei que regulamentasse tal direito – embora até a presente data não tenha feito –
e mandou utilizar subsidiariamente a Lei de Greve (Lei 7.783/89), com as
devidas particularidades (Mis 670, 708 e 712, julgados em 25 de outubro de
2007).

Imitando a Lei do Mandado de Segurança, a qual vimos anteriormente, o


Congresso Nacional criou a figura do Mandado de Injunção Coletivo, não
trazido pela Carta de 1988, permitindo-se que alguns legitimados ingressem
perante o Poder Judiciário com o dito remédio constitucional para criação de lei
regulamentadora de direito coletivo, a qual estudaremos a partir de agora.

Por fim, em consoância com os demais mandamentos acerca da proteção dos


Direitos Difusos e Coletivos, o mandado de injunção coletivo também é
abarcado pelo microssistema processual coletivo, utilizando as regras dos demais
ramos do Direito naquilo em que for compatível.
LEI Nº 13.300, DE 23 DE JUNHO DE 2016.

[...]

Art. 12. O mandado de injunção coletivo pode ser promovido:

I - pelo Ministério Público, quando a tutela requerida for


especialmente relevante para a defesa da ordem jurídica, do regime
democrático ou dos interesses sociais ou individuais indisponíveis;

Assim como todas as demais legislações preceituam, não é qualquer


pessoa que pode impetrar um Mandado de Injunção Coletivo. O art. 12 da Lei do
Mandado de Injunção determina quais são os que a lei permite a impetração da
presente ação, que defenderá direito difuso ou coletivo.

Segundo o inciso I do referido art. 12, o primeiro legitimado é o


Ministério Público, que poderá impetrar Mandado de Injunção Coletivo quando
a tutela requerida pelo mesmo for relevante para: a) a defesa da ordem jurídica;
b) regime democrático; c) interesses sociais; d) interesses individuais
indisponíveis.

Tal incumbência se dá devido ao art. 127 da Constituição Federal, que


determina que o Ministério Público é “instituição permanente, essencial à função
jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”, nas palavras da
Carta Magna.

Assim, caso a ausência de norma regulamentadora se dá em relação a


direitos não usufruídos relativos à defesa da ordem jurídica, ao regime
democrático, aos interesses sociais – difusos, coletivos ou individuais
homogêneos – ou aos direitos individuais indisponíveis, poderá o Ministério
Público tutelar judicialmente impetrando um Mandado de Injunção Coletivo.

Deve-se atentar ao fato que, embora haja ausência de norma


regulamentadora que tem como função defeder a ordem jurídica e o regime
democrático, só caberá Mandado de Injunção Coletivo se a dita ausência tornar
inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania, conforme o art. 2º da Lei
13.300/16.
II - por partido político com representação no Congresso
Nacional, para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas
de seus integrantes ou relacionados com a finalidade partidária;

Assim como o Mandado de Segurança Coletivo, os partidos políticos com


representação no Congresso Nacional pode impetrar Mandado de Injunção
Coletivo, a qual deverá ter como tutela a segurança do exercício de direitos,
liberdades e prerrogativas de seus integrantes ou relacionados à finalidade
partidária, desde que presentes, também, os requisitos do Mandado de Injunção
(art. 2º, retromencionado).

III - por organização sindical, entidade de classe ou associação


legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, para
assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas em favor da
totalidade ou de parte de seus membros ou associados, na forma de seus
estatutos e desde que pertinentes a suas finalidades, dispensada, para tanto,
autorização especial;

O inciso III do art. 12 da Lei 13.300/16 permite que os sindicatos,


entidades de classe ou associações possam defender coletivamente os direitos,
liberdades e exercícios da totalidade ou de parte de seus membros ou associados,
utilizando-se, para tanto, do Mandado de Injunção Coletivo, desde que
funcionem há, pelo menos, 01 (um) ano e que tenha, dentre as suas finalidades, a
proteção e o resguardo de tais direitos e prerrogativas.

Podemos utilizar como exemplo o adicional de penosidade, descrito


constitucionalmente no art. 7º, inciso XXIII, ao lado dos adicionais de
insalubridade e periculosidade. Todavia, conforme sabemos, tal adicional jamais
foi implementado pelo legislador infraconstitucional.

Assim, podem os sindicatos de categoria de trabalhadores de atividades


que julgam ser penosas impetrar o Mandado de Injunção Coletivo para que o
Judiciário regulamente tal adicional, ou obrigue o Congresso Nacional a fazê-lo.
Porém, somente os sindicatos, ou Ministério Público ou a Defensoria Pública (a
qual veremos adiante) podem utilizar o Mandado de Injunção Coletivo para
regulamentação do adicional de penosidade – ou o trabalhador, com o Mandado
Individual, conforme art. 3º da mesma lei -, não se permitindo aos partidos
políticos, uma vez que não há relação alguma com seus integrantes, tampouco
com a finalidade partidária.
Ao contrário das demais legislações referentes aos Direitos Difusos e
Coletivos – com exceção do Mandado de Segurança Coletivo -, no Mandado de
Injunção Coletivo as associações só poderão impetrar ação coletiva
relativamente a direitos pertinentes a seus membros ou associados.

IV - pela Defensoria Pública, quando a tutela requerida for


especialmente relevante para a promoção dos direitos humanos e a defesa
dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, na forma do inciso
LXXIV do art. 5o da Constituição Federal.

Por fim, a Defensoria Pública igualmente possui permissão legislativa


para impetrar Mandado de Injunção Coletivo, como já possui para as demais
ações envolvendo direitos difusos e coletivos.Entretanto, aqui, a Defensoria
Pública só pode impetrar ação coletiva visando a promoção dos direitos
humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados – ou
seja, pessoas que são pobres, que não conseguem arcar com os custos da
demanda e do pagamento de advogado particular, sem prejuízo próprio ou de sua
família.

A nosso ver, a Defensoria Pública deveria ter legitimidade ativa plena,


assim como é o Ministério Público e assim como a mesma é nas demais ações de
tutela de direitos difusos e coletivos. Os próprios Tribunais já entenderam que o
direito de a Defensoria Pública propor ações coletivas é amplo, não se
restringindo apenas à defesa de direitos dos necessitados, conforme destacamos
de uma decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, in verbis:

APELAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. PROCESSO COLETIVO. AÇÃO


CIVIL PÚBLICA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS DE CONTAS
POUPANÇA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. DEFENSORIA
PÚBLICA DA UNIÃO. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. PRAZO
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. 1. Cuida-se de ação civil pública proposta
pela DefensoriaPública da União em face da Caixa Econômica Federal,
objetivando a condenação dessa empresa pública a "atualizar o saldo das
contas poupanças de todos os titulares de cadernetas de poupanças
atindidos pelo plano Collor I" e demais consectários legais. 2. A
DefensoriaPública, instituição essencial à função jurisdicional do Estado,
possui legitimidade ativa ad causam para propor ação civil pública em que
se pretende a defesa de direitos individuais homogêneos, não sendo
necessária a comprovação de hipossuficiência daqueles processualmente
substituídos, pena de se negar a máxima efetividade conferida a tal órgão
pela nossa Lei Fundamental e, também, pelas demais normas que lhe são
hierarquicamente inferiores. [...] 5. Recurso parcialmente provido. TRF-2 -
AC APELAÇÃO CIVEL AC 201050010023861 (TRF-2) Data de
publicação: 09/08/2011 (grifo nosso)

Todavia, uma vez que há norma expressa tolhendo os poderes da


Defensoria Pública, mantendo sua atuação a par da descrita constitucionalmente
(art. 134 da CF/88), entendemos que a Defensoria Pública fica adstrita aos
requisitos descritos no inciso IV do art. 12 da Lei 13.300/16.

Parágrafo único. Os direitos, as liberdades e as prerrogativas


protegidos por mandado de injunção coletivo são os pertencentes,
indistintamente, a uma coletividade indeterminada de pessoas ou
determinada por grupo, classe ou categoria.

Corroborando com o pensamento trazido pelos incisos do caput do art.


12, o seu Parágrafo Único disserta sobre os direitos tutelados pelo Mandado de
Injunção Coletiva, que deverá ser os pertencentes à determinada pelo grupo,
classe ou categoria elencados nos incisos II a IV ou a coletividade, no caso do
inciso I.

Art. 13. No mandado de injunção coletivo, a sentença fará coisa


julgada limitadamente às pessoas integrantes da coletividade, do grupo, da
classe ou da categoria substituídos pelo impetrante, sem prejuízo do
disposto nos §§ 1o e 2o do art. 9o.

Assim como o art. 103 do CDC determina, em relação aos direitos


coletivos, a sentença do Mandado de Injunção Coletivo fará coisa julgada ultra
partes, mas limitadamente às pessoas integrantes da coletividade, do grupo,
classe ou categoria substituídos pelo impetrante.

Dessa forma, se um sindicato, a título de exemplo, impetra Mandado de


Injunção Coletivo visando a criação de norma regulamentadora do adicional de
penosidade para a categoria da construção civil do município de São Paulo/SP,
somente os associados do Sindicato da Construção Civil do município de São
Paulo/SP, impetrante da ação, serão beneficiados pela decisão, não afetando
outros membros da construção civil, nem tampouco outros lugares.
Vale ressaltar que a parte final do art. 13 da Lei 13.300/16 permite a
aplicação dos §§ 1º e 2º do art. 9º da mesma lei, que determinam,
respectivamente:

“§ 1o Poderá ser conferida eficácia ultra partesou erga omnesà


decisão, quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito,
da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração.

§ 2o Transitada em julgado a decisão, seus efeitos poderão ser


estendidos aos casos análogos por decisão monocrática do relator.”

Pode-se, portanto, permitir a aplicação de eficácia erga omnes à


sentença caso tal situação seja indispensável ou inerente ao exercício do direito,
liberdade ou prerrogativa objeto da impetração ou, ainda, pode o relator do
Mandado de Injunção individual aplicar os efeitos da decisão do Mandado de
Injunção Coletivo a casos análogos, visando a uniformidade da jurisprudência,
um dos principais pilares do Código de Processo Civil de 2015.

Parágrafo único. O mandado de injunção coletivo não induz


litispendência em relação aos individuais, mas os efeitos da coisa julgada
não beneficiarão o impetrante que não requerer a desistência da demanda
individual no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da
impetração coletiva.

Assim como funciona as demais ações coletivas, em balisa ao art. 104


do CDC, o Mandado de Injunção Coletivo não faz litispendência aos Mandados
de Injunção individuais, impetrados pela pessoa interessada (art. 3º); todavia, ao
mesmo tempo, a coisa julgada não o afetará caso o mesmo não desista do seu
processo individual no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência da impetração
do respectivo Mandado de Injunção Coletivo.

[...]
BIBLIOGRAFIA
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Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>.

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Disciplina o mandado de segurança individual e coletivo e dá outras
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2010/2009/lei/l12016.htm>.

____________. (2016). Lei 13.300, de


23 de junho de 2016. Disciplia o processo e o julgamento dos mandados de
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ZACLIS, Lionel. Proteção Coletiva dos Investidores no Mercado de


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[1]Retirado do site: <http://www.bcb.gov.br/glossario.asp?


Definicao=488&idioma=P&idpai= GLOSSARIO>. Acessado em: janeiro de
2016.
[2]O sequestro era uma modalidade de restrição dos bens por parte do
devedor existente no Código de Processo Civil de 1973, não possuindo
correspondente no Novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/15). Segundo o
artigo 822 do Código de 1973, o sequestro ocorrerá nos seguintes casos, por
ordem do juiz: “de bens móveis, semoventes ou imóveis, quando Ihes for
disputada a propriedade ou a posse, havendo fundado receio de rixas ou
danificações; dos frutos e rendimentos do imóvel reivindicando, se o réu, depois
de condenado por sentença ainda sujeita a recurso, os dissipar; dos bens do casal,
nas ações de separação judicial e de anulação de casamento, se o cônjuge os
estiver dilapidando; nos demais casos expressos em lei”.
[3]Vale salientar aqui a novíssima Súmula 601 do STJ, que determina que: “o
Ministério Público tem legitimidade ativa pra atuar na defesa de direitos difusos,
coletivos e individuais homogêneos dos consumidores, ainda que decorrente da
prestação de serviço público”.
[4]Modalidade de título público federal que foi emitida entre 1964 e 1986
com a característica de pagar uma remuneração corrigida e evitar a corrosão da
inflação sobre as aplicações futuras, que por conta do recrudescimento
inflacionário da década de 1960, haviam caído a níveis muito baixos, obrigando
o governo a emitir papel-moeda no intento de cobrir as suas obrigações.

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