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Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

DIREITO
ADMINISTRATIVO
SOFIA ALVES CUNHA

FDUL

2020/2021

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 1


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Universidade de Lisboa

Faculdade de Direito

Direito Administrativo II
2º Semestre 2020/2021

Docente: Paulo Otero

Sofia Alves da Cunha

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Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

PROGRAMA DA CADEIRA DE DIREITO ADMINISTRATIVO II

REGENTE PAULO OTERO

PARTE I
O PROCEDIMENTO DA ATIVIDADE ADMINISTRATIVA

Parte Geral

1. Noções introdutórias
1.1 Do Procedimento administrativo: generalidades
1.2 Dimensão normativa do procedimento administrativo
1.3 Âmbito aplicativo do Código do Procedimento Administrativo de 2015

2. Princípios fundamentais
2.1 Princípios procedimentais da atividade administrativa
2.1.1 Princípios-regra do procedimento administrativo
2.2.2 Princípio exceção do procedimento administrativo

2.2 Princípios materiais da atividade administrativa


2.2.1 Princípios gerais expressamente formulados pela Constituição
2.2.2 Princípios gerais sem expressa formulação constitucional

3. Formas de atividade administrativa e procedimento: delimitação de regime


3.1 Da atividade administrativa em geral: preliminares
3.2 Formas de atividade administrativa jurídica pública
3.3 Formas de atividade administrativa jurídica privada
3.4 Formas de atividade administrativa não jurídica
3.5 Excurso: a inatividade administrativa

4. Regime comum do Procedimento Administrativo


4.1 Estrutura e vícios das formas jurídicas de atividade administrativa
4.1.1 Competência
4.1.2 Vontade
4.1.3 Causa
4.1.4 Objeto
4.1.5 Formalidades e forma

4.2 Invalidade e desvalores das formas jurídicas de atividade administrativa


4.2.1 Invalidade do agir administrativo: esboço de uma teoria geral
4.2.2 Anulabilidade, nulidade e inexistência
4.2.3 Reabilitação dos efeitos inválidos

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Parte Especial

5. Procedimento dos regulamentos


5.1 Titularidade da competência regulamentar
5.2 Formalidades e forma dos regulamentos
5.3 Validade e eficácia dos regulamentos
5.4 Cessação de vigência dos regulamentos

6. Procedimento do ato administrativo


6.1 Principais espécies de atos administrativos
6.1.1 Atos constitutivos
6.1.1.1 Atos primários
6.1.1.1.1 Atos impositivos
6.1.1.1.2 Atos permissivos
6.1.1.1.3 Atos propulsores
6.1.1.2 Atos secundários
6.1.1.2.1 Atos integrativos
6.1.1.2.2 Atos desintegrativos: revogação e anulação
administrativa
6.1.1.2.3 Atos modificativos
6.1.1.3 Atos consensuais
6.1.1.4 Atos tácitos
6.1.2 Atos declarativos
6.1.2.1 Atos de verificação
6.1.2.2 Atos de valoração
6.1.2.3 Atos de transmissão

6.2 Marcha do procedimento


6.2.1 Procedimento declarativo típico
6.2.2 Procedimento dos recursos graciosos
6.2.3 Procedimento de execução do ato administrativo

7. Procedimento contratual
7.1 Procedimento dos contratos administrativos
7.1.1 Formação do contrato administrativo
7.1.2 Execução do contrato administrativo
7.1.3 Extinção do contrato administrativo
7.1.4 Invalidade dos contratos administrativos
7.1.5 Contencioso dos contratos administrativos

7.2 Procedimento dos contratos de direito privado da Administração Pública


7.2.1 A decisão de celebrar um contrato de direito privado
7.2.2 Regime dos contratos de direito privado da Administração Pública

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PARTE II
DAS GARANTIAS FACE AO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

8. Mecanismos de controlo da legalidade e do mérito


8.1 Controlo administrativo
8.1.1 Controlo administrativo do fundamento da conduta administrativa
8.1.2 Controlo administrativo do conteúdo da conduta administrativa

8.2 Controlo jurisdicional


8.2.1 Controlo da Administração pelos tribunais administrativos e fiscais
8.2.2 Controlo da Administração pelos outros tribunais do Estado
8.2.3 Controlo da Administração pelos tribunais arbitrais

8.3 Controlo político


8.3.1 Responsabilidade política da Administração Pública
8.3.2 Garantias políticas dos cidadãos

9. Titulação judicial da execução administrativa


9.1 O regime da lei a que se refere o artigo 8o, no 2, do Decreto-Lei no 4/2015,
de 7 de janeiro

10. Ressarcimento de danos


10.1 Conceito, origem e fundamento da responsabilidade civil da Administração
Pública
10.2 Tipologia das formas de responsabilidade civil
10.3 Idem: o regime da responsabilidade civil extracontratual por ato de gestão
pública

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NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO: GENERALIDADES

Procedimento para formação e expressão da vontade não é exclusivo do Direito Público,


pois também o encontramos no Direito Privado, como nas sociedades ou associações. Na
verdade, todas as pessoas coletivas necessitam de uma regulação do funcionamento da
ação dos órgãos para formar e exteriorizar a sua vontade, chama-se a estas regras
procedimentais. Tal como uma entidade patronal pode sancionar um empregado, o que é
um procedimento contudo não administrativo e sim da área do direito privado, do direito
do trabalho.

O procedimento é uma via/caminho pelo qual se chega a uma decisão administrativa,


expressando e executando uma vontade da Administração.

Cada função do Estado tem sempre para decidir um determinado procedimento:


• Procedimento para a elaboração das leis
• Procedimento para decretar sentença, processo judicial civil, crime, tributário
• Procedimento das relações políticas entre órgãos
O mesmo se passa com a Administração Pública que detêm um procedimento para
administrar, para exercer a função administrativa.

Existem duas exceções que levam à não exigência de observância do procedimento:


• Estado de necessidade administrativo CPA: 3º
• Atuação informal da Administração, é uma atuação à margem do procedimento,
à margem da forma mas sem violação da lei.

CPA: 1º/1 Conceito de Procedimento Administrativo. A atuação administrativa tem uma


• Dimensão Material, qual o conteúdo do regulamento
• Dimensão Procedimental, como se chegou aquele conteúdo

O procedimento tem as seguintes funções:


• Limitar a arbitrariedade
• Racionalizar a atuação da Administração
• Legítima a racionalização da decisão Administração
• Dá previsibilidade do agir administrativo ao privado
• Garantia dos particulares, caso não seja respeitado é ilegal e podemos levar a
tribunal com vícios procedimentais
• Local de exercício de direitos fundamentais, diversos direitos que podemos
exercer sob o procedimento
• Momento em que é determinada a matéria de facto, objeto da instrução, é o
prossuposto que alicerça à publicação do direito
• Local de participação dos cidadãos e palco das ponderações administrativas

No CPA apresenta-se o procedimento regra, mas existe uma panóplia de procedimentos


especiais (ex. expropriação, marcação de provas orais).
CPA: 2º/5 Dispõe que se aplicam as normas sobre o procedimento subsidiariamente
sempre que estejam em causa garantias dos administrados em outros procedimentos.

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DIMENSÃO NORMATIVA DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

CRP: 267º/5 Depõe que o procedimento tem dois propósitos: racionalização da atividade
administrativa e a garantia de um procedimento equitativo (= a procedimento justo= a
devido procedimento legal). Não é exequível por si mesma, sendo o CPA o conjunto de
normas exequendas, não podendo o CPA ser revogado simplesmente- há aqui uma
proibição de retrocesso na execução duma norma constitucional e de direito
fundamentais. Há que haver um procedimento equitativo, sendo este um princípio
subjetivo- hoje pode falar-se num direito fundamental a um procedimento justo e
equitativo.

Quais as fontes que regulam o procedimento?


• A CRP;
• DUE;
• DIP;
• CPA, mas também leis especiais que fixem normas procedimentais especiais;
• Normas informais- usos, precedentes, costumes;
• CPA: 57º/1 Discricionariedade procedimental perante os casos concretos.

Nem todas as normas do CPA são injuntivas.


CPA: 56º Podem existir além de normas jurídicas, normas extrajurídicas que rejam o
procedimento.

Quais os princípios de interpretação das normas do procedimento?


• CPA: 8º + 108º/2 Princípio da proibição/interdição do formalismo excessivo
• CPA: 108º + 109º/1 e 2 Princípio pro actione (por ação), deve dar-se prevalência
à decisão sobre o mérito em preterição da forma, prevalece a materialidade sobre
a forma
• CPA: 60º/2 Princípio da economia processual- está ligado ao princípio da
economicidade e significa que não se devem exigir passos inúteis e procurar
aproveitar o que já foi feito
• Princípio da segurança e da tutela da confiança;
• Princípio do processo equitativo- é a chave que permite justificar a existência do
próprio procedimento.

As normas procedimentais podem ser injuntivas ou dispositivas. Dentro das normas


injuntivas há umas que têm mais força jurídica que outras e isso comprova-se através do
desvalor jurídico associado à sua violação. Mesmo dentro das normas cuja violação gera
anulabilidade CPA: 163º/5 vem dizer que em certos casos os atos são anuláveis, mas a
anulabilidade não produz efeito- o ato passa de anulável a meramente irregular.

Todos somos destinatários, pelo que as normas devem ser claras. O CPA tem normas de
grande deficiência em termos de redação e clareza, como o CPA: 168º/7

É possível extrair um parâmetro normativo de conduta de uma situação particular.


Quando hoje decido um caso concreto num espaço de discricionariedade, vinculo-me a
num caso semelhante aplicar a mesma decisão. Devido ao princípio da imparcialidade,
igualdade e devido à relevância do precedente e da tutela da confiança.

A AP pode se for do interesse publico alterar justificadamente a decisão anterior.

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ÂMBITO APLICATIVO DO CÓDIGO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

Aplicação subjetiva do CPA

A quem se aplica o CPA?

Quem são os destinatários das normas do CPA?


• Os cidadãos;
• A Administração;
• Os tribunais

CPA: 2º Sendo qualquer entidade que faça parte da Administração Pública, bem como
autoridades públicas que embora não façam parte da Administração Pública sejam
reguladas em determinados aspetos pelo Direito Administrativo.

É também aplicável às entidades privadas que tenham atividade regulada pelo Direito
Administrativo.

Aplicação material do CPA

Que matérias estão reguladas pelo CPA?

Não há uma aplicação igual para toda a atuação administrativa, todavia existem 2 matérias
em que o CPA se aplica a toda a Administração pública:
• Os princípios gerais da atividade administrativa;
• As normas do CPA que concretizam preceitos da Constituição.
Isto abrange tanto a Administração que aplica direito privado, bem como toda a atividade
técnica.

As normas que se referem a princípios gerais, ao procedimento e à atividade


administrativa aplicam-se a todas as autoridades (públicas ou privadas) que exerçam
poderes públicos ou cuja regulação se faça pelo Direito Administrativo. Nem todas estas
normas se mostram aplicáveis à atividade administrativa técnica ou de gestão privada.

Existem normas que só se aplicam a órgãos da Administração Pública CPA: 20º - 52º
devendo, contudo, excluir-se a sua aplicação a:
• Órgãos do Estado e das regiões autónomas que não exercem funções
administrativas a título principal e, por maioria de razão, a todos os órgãos que
não exercem qualquer tipo de função administrativa
• Órgãos de entidades privadas que, apesar de exercerem funções administrativas,
não integrem a Administração Pública salvo e na medida em que exercerem
poderes de autoridade.

CPA: 2º/5 Aplica-se subsidiariamente a outros procedimentos especiais, sendo de


entender que as disposições que reconhecem garantias aos particulares apenas poderão
ser aplicadas se aumentarem essas mesmas garantias, nunca sendo líquido diminuir
aquelas que já decorrem dos procedimentos especiais.
Como é integrada uma lacuna do CPA? Na falta de norma do CPA, no que toca aos órgãos
colegiais, pode recorrer-se ao regimento da AR (isto é a regra no Direito Português).

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Aplicação temporal do CPA

O CPA aplica-se a partir de quando?

A regra está no CPA: 8º/1 do Decreto-Lei que aprovou o CPA, pois neste diploma não
há qualquer norma transitória.

CPA: 8º/1 Retira-se que:


• As disposições do CPA só serão aplicáveis aos procedimentos que se iniciem após
a entrada em vigor do novo CPA;
• Os artigos 53º a 76º e 82º a 134º não se aplicam aos procedimentos administrativos
em curso à data da entrada em vigor do CPA 2015, continuando a reger-se pelo
CPA de 1991.

Aplicação territorial do CPA

Qual o âmbito territorial do CPA?

Não há no CPA norma sobre esta matéria, ou seja, uma regulação das situações jurídico-
administrativas transnacionais; apenas o CPA: 116º/4 possui um afloramento.

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PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

PRINCÍPIOS QUE PAUTAM O PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

PRINCÍPIOS-REGRA

Regulam normalmente o procedimento, que quando violados fere o procedimento


administrativo, ainda que a decisão final seja a justa ou adequada.

Princípios justo procedimento/equitativo/devido

Em matérias passiveis de envolver efeitos negativos para os destinatários este princípio


implica vários corolários: audiência prévia dos visados (direito ao contraditório ou
participação defensiva); acesso dos interessados aos documentos (em tempo útil de
preparar a defesa); direito de acesso e conhecimento do conteúdo efetivo dos documentos
(é necessários que o acusado compreenda, tem de ser uma língua quer o permita); devo
poder ser acompanhado de um advogado, caso não seja.

Permite exigir que a decisão final seja pautada pelo respeito da igualdade e da
imparcialidade, o que leva à fundamentação da decisão administrativa que deve ser
emitida num prazo razoável de decisão. É necessário publicidade e acesso à justiça
administrativa para que se garanta a equitabilidade do procedimento.

O fundamento deste princípio encontra-se no artigo 6º da Convenção Europeia dos


Direito do Homem, com a exigência do procedimento equitativo, o direito a um processo
judicial efetivo e o direito à plena execução das sentenças, e ainda na Convenção
Europeia dos Direitos do Homem no artigo 41º que consagra o direito a que todas as
pessoas tenham direito a um processo equitativos.

Este preceito veio tornar o princípio como direito fundamental que não pode ser violado,
pelo que se for violado a decisão é nula, mesmo que seja uma decisão final justa, contudo
o procedimento preterido o meu direito ao contraditório.
A violação gera sempre invalidade, e consequentemente responsabilidade civil para a
Administração Pública, mas apenas gera nulidade caso atinja o conteúdo essencial do
direito fundamental.

Este princípio resulta em Portugal tanto do CRP: 266º/2, devido ao princípio da Justiça,
como da clausula aberta do CRP: 16º/2, que incorpora no nosso ordenamento jurídico os
artigos supre referidos.

Princípio da adequação procedimental

Decorre do princípio do procedimento equitativo, contudo vem formula no CPA: 56º.


Daqui decorre a necessidade de que a decisão deve provir de um procedimento
flexibilizado aos propósitos visado, o que dá efetividade ao princípio da proibição de
excesso de formalidades.

Este princípio leva a que os responsáveis pela direção do procedimento contenham


alguma discricionariedade na determinação do mesmo, contudo este é subordinado ao

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interesse público da participação e à celeridade na preparação da decisão, sempre tendo


em conta os princípios da atividade administrativa, assim como os direitos
procedimentais dos cidadãos.

Tendo em vista reforçar a imparcialidade administrativa e conjugar a mesma com este


princípio, o CPA:55º/2 teve a preocupação de determinar que o agente que conduz a
direção do procedimento é distinto do que toma a decisão final.

Considera-se que existe um erro no procedimento quando não seja adotado o que devia
ser legalmente utilizado. O erro do procedimento poderá conduzir a uma situação de
desvio de poder, ou seja quando se utiliza um meio para atingir um fim que não seria o
esperado e que esteja associado a outro procedimento.

Princípio Inquisitório

A Administração, como previsto no CPA: 58º deve por iniciativa própria (não necessita
de iniciativa dos privados) procurar encontrar a verdade, se a situação factual corresponde
à que lhe dão a conhecer. A judicial aguarda que as questões lhe sejam colocadas. Mas a
administração tem de agir, podendo e devendo desencadear os meios necessários tendo
em vista satisfazer as necessidades coletivas.

O CPA: 13º/3 diz que pode decidir para mais ou para mendo do pedido, contudo há
limites, o fim a adequação e a justiça.
Assim como o CPA: 117º/1 determina que se pode recorrer a todos os meios de prova
admitido em direito.

A instrução, onde se fixa a matéria de facto, tem efeito dominó porque uma vicissitude
na instrução, uma falsa representação ou ausência de tomada de ponderação de um
determinado elemento, pode contaminar a decisão final devido a um erro dos
pressupostos de facto.
Este princípio ganha particular relevância nos casos de discricionariedade decisória da
administração, pois a decisão dependerá em grande medida dos factos apurados na fase
de instrução.

Não estamos perante um princípio ilimitado, pois este encontra diversas limitações:
CPA: 58º Não pode ser uma atuação excessiva
CPA: 117º/2 Limites que não podem ser violados
CPA: 115º/1 Tem de seguir o propósito do procedimento justo, tomando uma decisão
legal e dentro de um prazo razoável
CPA: 116º/1 Deve os interessados provar os factos que tenham sido alegados
CPA: 115º/2 + 115º/3 Exceções em que perante factos notórios ou devido às funções que
exerce, o responsável do procedimento já tenha conhecimento

A articulação entre o princípio do inquisitório e o do dispositivo, que obriga a iniciativa


de terceiro.
Exemplo: Em concursos públicos onde a lei diz que os candidatos devem escolher os 5
trabalhos que acham representativos da carreira, havendo uma afirmação da autonomia
dos candidatos na escolha dos trabalhos. Poderá o júri utilizar conhecimento próprios
sobre candidatos quando esses omitiram esses dados no currículo?

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• A prova em procedimento administrativo


Prende-se com o apurar da matéria de facto, sendo um elemento nuclear. Tem o propósito
de demonstra a realidade factual sobre a qual a AP vai aplicar o Direito.

Temos o Direito de participar na produção da prova, estando os meios determinado no


CPA: 115º todos os meios lícitos de prova de Direito são admitidos no procedimento,
tendo em vista a descoberta da realidade.
Exemplo: Não é admitido o recurso á tortura para se obter o conhecimento de onde foi
colocada uma bomba atómica CRP: 32º/8

CPA: 117º Podem os meios de prova ser solicitados aos interessados.


Contudo se somos solicitados e não a fazemos, a AP pode retirar a conclusão do silêncio,
existindo o ônus para o particular CPA: 116º
Exemplo: Prove que é licenciado em direito, caso o particular nada diga a Administração
pode concluir que não existe uma licenciatura em direito.

Há uma livre apreciação da prova, ponderação de apreciação e fixação dos factos


vinculados apenas a uma decisão justa.

Uma coisa é a prova feita outra é por vezes a realidade real, podendo haver uma
dissociação, sendo relevante para o procedimento a realidade procedimental.
Exemplo: Alguém que não faz prova da licenciatura, apesar de a ter, porque a faculdade
onde estudou já não existe. A Administração Pública pode considerar que não existe
licenciatura, devido à realidade procedimental, apesar desta não corresponder com a
realidade.

As dificuldades que a Administração Pública tem com o Estado preventivo em matéria


de prova. O princípio de precaução determina que o grave risco de dano da incerteza
científica e de possam limitar o tema da prova. O problema do combate á pandemia é
prova desta incerteza que dificulta a tomada de decisões da Administração.
Muitas vezes o Estado preventivo tem de agir sem que haja uma base provatória firme ou
certa, tendo em conta evitar o agravamento da situação.

O apurar da verdade procedimental é relativa pois o que hoje temos como certa amanha
podemos ter como errado, dai a importância da modificação das decisões administrativas
tendo em conta os novos conhecimentos adquiridos sobre a realidade.

Princípio da colaboração

• Colaboração da Administração Pública com Particulares CPA: 11º


A Administração deverá estimular as iniciativas dos particulares, assim como ter em
contas as suas sugestões e informações. A administração deve ainda prestar todas as
informações que os particulares careçam e aos interessados CPA: 82º a 85º
• Colaboração dos Particulares com a Administração CPA: 60º
Existe o dever de lealdade, veracidade e eficiência dos particulares para com a
Administração.
• Colaboração dos órgãos administrativos entre si CPA: 66º

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Princípio da preferência

Princípio previsto no CPA: 61º/1 e reforçado pela pandemia onde houve a necessidade
de publicar a Lei nº 72/2020, de 16 de Novembro, que vem reforçar os meios
informáticos para o funcionamento dos órgãos colegiais e para o próprio procedimento.

A presente lei estabelece ainda um regime transitório de simplificação de procedimentos


administrativos comuns previstos na lei geral e de procedimentos administrativos
especiais previstos em legislação setorial, procedendo, ainda à primeira alteração ao
Código do Procedimento Administrativo.

Este desígnio de simplificação é materializado na instituição da obrigatoriedade de


realização de uma conferencia procedimental deliberativa, em todos os “procedimentos
em que haja lugar à emissão de pareceres ou outro tipo de pronúncias por parte de diversas
entidades ou noutros em que o grau de complexidade o justifique”.
A conferência deliberativa é, recordando o preceituado no CPA: 77º/3 a), uma
conferência que se destina “ao exercício conjunto das competências decisórias dos órgãos
participantes através de um único ato de conteúdo complexo, que substitui a prática, por
cada um deles, de atos administrativos autónomos”.
Nesta conferência participarão, assim, todas as entidades envolvidas no procedimento,
com vista à emissão concomitante dos pareceres ou pronúncias necessárias, bem como
da decisão final do procedimento.

Impõe-se notar, aludindo ao artigo 2º do presente diploma, que este regime aplicar-se-á́ a
toda a atividade adotada no exercício de poderes públicos ou regulada de modo específico
por disposições de direito administrativo, independentemente da natureza da entidade.
E tem por objeto todos os procedimentos administrativos, comuns e especiais, exceção
feita, unicamente, para os procedimentos de emissão de regulamentos administrativos e
para os procedimentos de avaliação de impacte ambiental e de avaliação ambiental
estratégica, especialmente regulados.
Estas conferencias de serviços ocorrerão também no quadro dos procedimentos que
envolvam autarquias locais e entidades da Administração Central, casos em que a CCDR
promoverá conferências procedimentais periódicas no âmbito das entidades
intermunicipais e áreas metropolitanas.
A aplicação das medidas de simplificação de procedimentos descritas será́ objeto de
monitorização pela Agência para a Modernização Administrativa, I.P (Direcção-Geral
das Autarquias Locais no caso das conferências procedimentais realizadas entre a
administração direta e indireta e as autarquias locais), sendo, inclusive, imposta uma
obrigação de reporte quanto ao número de conferências procedimentais realizadas e de
procedimentos administrativos concluídos.

O objetivo destas medidas foi amplamente divulgado:


«impulsionar uma maior articulação e cooperação entre serviços sempre que os
procedimentos apresentem vários intervenientes na sua tramitação, no intuito de recíproca
poupança de recursos e tempo disponibilizados na análise dos processos e na
conformação da decisão, incluindo em procedimentos nos quais estejam envolvidas as
autarquias locais» (Comunicado do Conselho de Ministros de 18/06/2020).

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Princípio da participação dos interessados

É um princípio que resulta do CRP: 267º/5 como garantia dos cidadãos que expressa o
modelo democrático da administração. Podendo a participação ser individual ou coletiva,
uma colaboração ou um ónus ou ainda um direito ao contraditório.

Como princípio geral do agir administrativo, a participação dos interessados, sujeita a


Administração Pública ao dever de garantir a efetiva participação e ao dever de audiência
prévia, como previsto no CPA: 12º/1

Princípio (procedimental) da boa administração

Pode tanto ter incidência no procedimento como no conteúdo das decisões, contudo
vamos analisar a vertente procedimental.
O fundamento do direito à boa administração encontra-se na Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia: 41º pois o CPA: 5º não o tem como direito.
Em termos práticos este princípio exige:
• Desburocratização, simplificado os atos da administração
• Economicidade, mínimo de recurso financeiros para alcançar o máximo
de vantagens
• Celeridade e eficácia, garantindo um procedimento rápido e a tempo útil
razoável
• Aproximação dos serviços à população

O princípio justifica ponderação de interesses e a valorização do fim.


CPA: 77º a 81º e Lei 72/2020, 16 Novembro: 3º a 7º Pretende-se que um único órgão
possa resolver, levando a uma melhor decisão do quando as competências decisórias estão
diluídas por vários órgãos.

Princípio da decisão

É um princípio consagrado na CRP: 286º/6 como Direito Fundamental

CPA: 13º/1 Toda a pretensão formulada pelo particular à Administração Pública tem de
obter uma resposta, a Administração não pode perante um pedido ignorar e não decidir.
Não necessita de decidir de acordo com o que é pedido, mas necessita de dar uma
respostas.

É uma consequência do respeito pelos cidadãos, pois de nada servida o princípio da


participação e a existência de uma administração democrática se esta tivesse a
possibilidade de não responder aos particulares.

O conteúdo possível da decisão:


• Rejeição liminar CPA: 108º/3 e 109º/1, por falta de legitimidade ou por
não respeito ao prazo para o pedido
• Solicitar o aperfeiçoamento CPA: 108º/1, melhor qualidade das provas
• Informar o particular que se dirigiu ao órgão incompetente CPA: 109º/2 e
41º/1

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• Informar que não existe o direito de decidir CPA: 13º/2 procurando


racionalizar o agir administrativo e evitar expedientes dilatórios

CPA: 127º A decisão administrativa nem sempre necessita de ser prestada de forma
expressa, podendo, por vezes, estar implícita noutras decisões expressas ou de forma
tácita do silêncio da Administração CPA: 129º + 130º

Princípio do caso decidido (ou julgado) Administrativo

Será que as decisões que colocam termo ao procedimento são imodificáveis? Haverá
semelhança entre as sentenças judiciais e as decisões que colocam termo? As decisões
Administrativas formam, à semelhança das sentenças jurídicas, casos julgados?
Deve prevalecer o princípio da segurança jurídica ou da prossecução do interesse publico?
Caso prevaleça o princípio da segurança jurídica, tendo em vista a previsibilidade das
decisões e a estabilidade das mesmas o processo seria imodificável e considerado caso
julgado. Caso se dê prioridade ao princípio da prossecução do interesse público a decisão
seria modificável conforme as circunstâncias se modificassem procurando o interesse.
Há ou não uma capacidade de resistência das decisões administrativas, pode todas ser
revogadas ou anuladas ou há algumas que não o podem? Atos constitutivo de direitos,
investindo os particulares de uma posição jurídica positiva podem ser livremente
revogáveis? Caso sim não há caso julgados, caso não há caso julgado.

A diferença esta em saber se a situação de facto é variável, por exemplo com progressos
da técnica e da ciência, nunca se forma um caso julgado, pois existe sempre a
possibilidade de ama se atualizar a factualidade que levou à toma da decisão. Contudo se
a base factual é invariável, como os atos declarativos, então existe uma decisão
administrativa imodificável.

Princípio da Administração Aberta

CPA: 17º/1 e CRP: 268º/2 Este princípio, procurando tornar a atividade administrativa
transparente e traduzindo a existência de uma ética constitucional, concretiza-se
maioritariamente pelo direito ao acesso e ao registo do arquivo da Administração.

Contudo este princípio não é ilimitado, pois não é permitido o acesso a documentos
essenciais como: segurança interna e externa, segredos de Estado, investigação criminal,
sigilo fiscal, invada a privacidade das pessoas, segredos comerciais ou industriais etc

Princípio da Gratuitidade

CPA: 15º/1 Estipula que o procedimento administrativo é gratuito, menos quando forem
estipuladas taxas por despesas, encargos ou outros custos suportados pela Administração.
Existindo ainda o princípio geral de reserva de lei para a derrogação do postulado da
gratuitidade sob pena de nulidade pelo CPA: 161º/2 k)

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Princípio do uso da língua portuguesa

CPA: 54º É uma expressão da identidade cultural tendo como efeito aos problemas.
Saber se é possível a existência de curso, aulas ou reuniões de órgãos públicos sem ser
em língua portuguesa, quando todos os destinatários. Saber se aulas administradas em
língua que não seja lecionado em língua estrangeira.

Princípio da cooperação leal com a União Europeia

CPA: 19º Nas relações procedimentais transnacionais e comunitárias o Estado deve


cooperar lealmente, não criando obstáculos à implementação ao direito da União
Europeia

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PRINCÍPIO-EXCEÇÃO

Conceito de Estado de Necessidade Administrativa

CPA: 3º/2 Estado de Necessidade Administrativa, a admissibilidade da sua utilização


está dependente de quatro pressupostos cumulativos:
• Circunstâncias de facto extraordinária, a importância da factualidade que permita
fundamentar que estamos perante factos fora do normal
• Ameaça ou perigo ou risco efetiva ou previsivelmente a curto prazo de dano a
bens ou interesses públicos essenciais
• Indispensabilidade e urgência da ação administrativa rápida e imediata para
limitar ou prevenir os efeitos do dano
• Necessidade de preterição de regras procedimentais para agir a tempo

No início existe uma ponderação, para perceber qual a necessidade e qual a possibilidade
de se seguirem os procedimentos. Existe ainda um juízo de prognose, onde pondera o que
irá acontecer caso não se atue. A quando a ponderação deve-se procurar perceber se o
meio que se pretende utilizar é o idóneo, tendo em conta o princípio da proporcionalidade,
para atingir aquele fim.

Espécies e regime

O estado de necessidade administrativa pode incidir sobre o procedimento, alterado ou


suprimindo alguns dos atos, ou pode justificar uma decisão final cujo conteúdo em
situações normais seria o ilegal, sendo neste caso substantivo.

O estado de necessidade administrativa pode ocorrer com ou sem estado de exceção


constitucional, sendo possível a existência de um sem o outro.
De 2020 a 2021 mesmo quando não estávamos em Estado de Emergência, devido À
pandemia, sempre se verificaram situações de estado de necessidade administrativa e
ainda estado de necessidade económica e financeira.

Se não existisse estado de necessidade os atos e atuações da administração seriam feridas


de vicio de forma ou de incompetência, assim o estado de necessidade administrativa
habilita casos de substituição extraordinária e de preterição das formalidades.

Existem limites, nomeadamente cinco:


• Respeito pelo procedimento equitativo
• Princípios gerais da atividade administrativa
• Normas que concretizem preceitos da Constituição, nomeadamente em casos de
Direitos Fundamentais
• Princípio da proporcionalidade, na necessidade, adequação e razoabilidade
• Controlo judicial

Natureza

É um princípio geral de direito que não é exclusivo do administrativo devido à sua origem
consuetudinária. Assim a natureza última é que não é uma exceção á ilegalidade mas é
ele uma legalidade excecional.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 17


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PRINCÍPIOS MATERIAIS DA ATIVIDADE

PRINCÍPIOS GERAIS FORMULADOS NA CONSTITUIÇÃO

Princípio da Juridicidade/Legalidade

CRP: 266º/2; 112º/5 + CPA: 3º/1

Toda a atuação está subordinada ao Direito, há lei entendida como expressão


intencional do legislador, e a princípios que transcendem a ação do legislador.
Caso viole o direito é ilegal, e para tal tem de ser passível de controlo judicial.
A Administração Pública deve acatar as decisões dos Tribunais CRP: 205º, pois caso
contrário de nada serve dizer que está subordinada ao Direito.

Subordinação da Administração ao Direito pode ter níveis mais ou menos intenso,


começando pela distinção que existe entre regras e princípios e dependendo do valor
que sanciona o desrespeito. Havendo ainda graus diferentes entre vinculação e
autonomia ou discricionariedade.

Por vezes também aparece como o princípio da legalidade. Significa fundamentalmente


duas ideias: a Administração está subordinada ao Direito: ao que a Administração cria,
ao que o legislador cria e ao que se impõe ao Estado mesmo contra a vontade do Estado.

O princípio do Estado de direito e o princípio democrático dizem-nos que a


Administração Pública se encontra submetida ao Direito:

CRP: 266º/2 Significa sujeição de toda a atividade administrativa à juridicidade,


entendida como obediência ao Direito como um todo e qualquer que seja a sua fonte.

CPA: 3º/1 Confirma um sentido omnicompreensivo do princípio da legalidade que se


reconduz à subordinação administrativa “à lei e ao direito”;

O Direito da UE permite configurar o postulado da legalidade ou juridicidade


administrativa como princípio geral de Direito Administrativo da União Europeia e ainda
como princípio geral comum aos direitos dos Estados-membros, integrante das tradições
constitucionais comuns dos Estados-membros.

O princípio da juridicidade dispõe que toda a atuação administrativa se encontra


submetida ao ordenamento jurídico no seu conjunto, sendo a lei apenas um dos
parâmetros vinculativos do agir administrativo, assim:

A lei funciona como garantia da liberdade e da propriedade dos cidadãos perante o poder
público, delineando a fronteira entre o proibido e o permitido por parte deste, servindo
também como mecanismo de tutela e respeito das posições jurídicas daqueles;

A lei traduz um mecanismo racionalizador do agir administrativo, definindo regras


procedimentais de conduta, identificando os elementos a ter em conta na ponderação e

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 18


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estabelecendo critérios materiais de decisão que asseguram a igualdade de tratamento de


todos perante a lei e reforçam a segurança jurídica.

A lei confere legitimação democrática à ação administrativa enquanto expressão da


vontade geral sujeita a um postulado de revisibilidade decisória, reconduzível ao conceito
constitucional de “legalidade democrática” facilitando a aceitabilidade social das
decisões da mesma.

A vinculação administrativa à lei compreende quatro princípios complementares:


supremacia da lei, preferência de lei, reserva de lei e precedência de lei.

O princípio da supremacia da lei obriga todos a submeterem-se à lei, a agir em


conformidade com a mesma (inclusive o autor da lei tem que o fazer), traduzindo assim
uma decorrência do princípio da hierarquia das normas:
• A supremacia da lei proíbe, por via de regra, a adoção de quaisquer condutas
administrativas contrárias à lei;
• A supremacia da lei mostra-se limitada pelos primados do DIP geral, da
Constituição e Direito da UE;
• A supremacia da lei pode ser ultrapassada por efeito da aplicabilidade direta das
normas constitucionais, de normas de DIP ou normas de Direito da UE;
• Pode mesmo a supremacia da lei ser neutralizada perante a falta de efetividade da
normatividade integrante da “legalidade oficial”, ocorrendo a sua
inaplicabilidade, por efeito informal de normas não escritas substitutivas e
integrantes de uma legalidade não oficial contra legem.

O princípio da preferência de lei parte da circunstância de a lei não se deixar revogar


ou modificar por atos de diferente natureza praticados pela Administração Pública.

As decisões administrativas que contrariam a lei são inválidas, salvo se as normas legais
foram suplantadas por uma normatividade dotada de força supralegal ou se acabaram por
ser substituídas por uma “legalidade não oficial” contrária;

A Administração tem o dever de agir perante uma conduta ilegal, procurando


reestabelecer ou repor a legalidade violada, sendo a sua omissão perante a ilegalidade
causa autónoma de uma ilegalidade derivada.

Nota importante a deixar é que a preferência de lei cede perante a preferência pelo Direito:
a juridicidade é sempre um valor prevalecente sobre a mera legalidade formal.

O princípio da reserva de lei define um espaço de regulação exclusiva do poder


legislativa envolvendo, necessariamente, o afastar de qualquer intervenção decisória
primária por parte da Administração e dos tribunais; à luz da Constituição à reserva de
lei correspondem matérias obrigatoriamente sujeitas à forma de lei, decreto-lei ou decreto
legislativo regional.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 19


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A reserva de lei não exclui, todavia, uma intervenção administrativa sobre tais matérias:
circunscrita à pormenorização e ao detalhe regulamentares, bem como à aplicação a casos
concretos.

A reserva de lei não impede a fiscalização, por parte dos tribunais, da validade das
soluções legislativas ou a interpretação e integração de lacunas das normas legais situadas
em matérias reservadas ao legislador.

A reserva de lei cria para a Administração, no entanto, uma presunção de


constitucionalidade relativamente à ponderação feita pelo legislador entre dignidade
humana e interesse público: só a título excecional podem as estruturas administrativas
afastar o princípio in dúbio pro dignitate secundum legem.

O princípio da precedência de lei diz-nos que todo o agir administrativo se tem fundar
ou basear numa norma legal habilitante, sendo a sua falta sinónimo de proibição de ação
ou permissão administrativa:
• A precedência de lei materializa o moderno entendimento da legalidade (ou
juridicidade) como fundamento (e não apenas limite) do agir administrativo;
• A precedência de lei legitima politicamente o agir administrativo, confere-lhe um
critério racional de decisão de aplicável por igual a todos definindo os termos de
intervenção sobre a liberdade e a propriedade dos cidadãos, e garante, por último,
a previsibilidade da conduta administrativa.

O princípio da precedência de lei, podendo dizer respeito a normas atributivas de


competência e normas disciplinadoras do exercício da competência mostra-se passível de
integrar no seu âmbito, em domínios fora de reserva de lei, normas constitucionais,
normas de DIP, de Direito da UE, princípios gerais de Direito não positivados, normas
consuetudinárias com valor e força de lei e ainda direito estrangeiro.

Deve, atualmente, entender-se o seguinte:

Toda a atividade administrativa (externa e interna) está subordinada, por força do


princípio do Estado de Direito democrático e do CRP: 266º/2, à exigência de precedência
de lei. Fala-se aqui em “precedência total de lei”, sem que tal precedência se identifique
com precedência de ato legislativo formal CRP: 112º/1

A precedência de lei formal apenas se regista em matérias que integram a reserva de lei,
podendo mesmo configurar-se com precedência de lei parlamentar (isto nos casos
tipificados na Constituição.

CRP: 112º/5 A atividade administrativa interna poderá encontrar-se sujeita a uma


legalidade especial

A precedência de lei apresenta como corolário a “exigência de densificação normativa”,


que obedece a um princípio de adequação em função da matéria a regular, razão pela qual
não se exclui a abertura normativa que permite margens de autonomia pública decisória
por parte da Administração:

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 20


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• A discricionariedade administrativa, a aplicação de conceitos indeterminados e a


derrogação administrativa ilustram a abertura de espaços de intervenção decisória
constitutiva a favor de órgãos administrativos.
• A autonomia decisória administrativa face ao poder legislativo constitui um
espaço de reserva de administração, encontrando-se o poder administrativo
investido de meios próprios de realização metodologicamente ativa do Direito,
insuscetíveis de um “controlo total” por parte dos tribunais.

A própria densidade do conteúdo das normas que integram a legalidade conhece limites,
não sendo o papel parametrizador da lei perante a Administração Pública ilimitado. Desta
forma, a precedência de lei tem de, sob pena de inadequação, ser flexível e adaptada às
circunstância:

O legislador não pode prever tudo, existindo sempre uma margem de situações da vida
real que se revelam fora do quadro da previsão normativa, determinando casos de lacuna
ou justificando que o legislador recorra, sistematicamente, a cláusulas gerais, conceitos
indeterminados, enumerações exemplificativas e ao uso de soluções baseadas em
princípios gerais ou dotadas de natureza experimental ou provisória;

O legislador pode encontrar dificuldades em generalizar e formular previsões e


estatuições, atendendo à pluralidade de valores, bens e interesses a ponderar, à
repercussão do risco de potenciais eventos e à utilização de normas extrajurídicas como
pauta de avaliação ou decisão. Remete aqui a lei para a margem de autonomia decisória
da Administração, num propósito de eficácia ou atendibilidade das especificidades das
circunstâncias particulares, bem como a construção de diversas soluções para os casos
concretos;

O legislador pode ainda deparar-se com dificuldade em traduzir a realidade e a


pluralidade de situações que a mesma contém a meras noções jurídicas abstratas.

A subordinação da Administração Pública ao Direito não se esgota, todavia, na lei ou em


atos normativos de valor igual ou superior à lei que exerçam uma função de
heterovinculação do agir administrativo:
• A própria Administração Pública pode gerar, por via formal, atos definidores de
critérios normativos reguladores da sua conduta futura face a situações concretas,
nos termos de um processo de autovinculação;
• Tal processo de autovinculação pode mesmo resultar, por via informal, da mera
conduta factual da Administração que, à luz dos princípios da igualdade e da
imparcialidade, poderá assumir natureza vinculativa face a situações semelhantes;
• O conjunto de todas as pautas normativas a que a Administração se encontra
vinculada, correspondendo ao conceito de juridicidade pode designar-se como
“bloco de legalidade”, como dispõe a tradição francesa.

Expressando a vontade da Administração Pública uma parcela da soberania do poder, a


sua vinculação à juridicidade, como forma de fornecer legitimidade democrática ao agir
administrativo, determina que tal agir se encontre “coberto” por uma presunção de
legalidade.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 21


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Se os atos anuláveis produzem efeitos jurídicos até serem anulados (art.º 163º/2 do CPA),
como se fossem válidos, significa que todas as decisões administrativas, salvo nulas ou
inexistentes, gozam de uma presunção de serem conformes à legalidade: até prova em
contrário efetuado por via de anulação, as decisões administrativas devem ser obedecidas
como se fossem sempre conformes à juridicidade;

A presunção de legalidade é, no entanto, uma presunção relativa, pois, admitindo-se prova


em contrário, encontra-se sujeita a uma verdadeira condição legal resolutiva: durante
certo prazo, por via administrativa ou judicial, essa presunção pode ser ilidida, anulando-
se o ato com fundamento na sua ilegalidade;

Decorrido o prazo permitido para a anulação do ato ou, em alternativa, tendo uma
sentença transitada em julgado determinado que o ato não padece de invalidade, a
presunção de legalidade torna-se absoluta- a presunção de conformidade do ato à
juridicidade ganha uma força jurídica reforçada, permitindo falar em força de caso
decidido administrativo;

Fora da presunção de legalidade encontram-se todas as decisões administrativas nulas e


inexistentes, sendo possível alicerçar uma presunção em sentido inverso;

A presunção de legalidade do agir administrativo mostra-se passível de sofrer uma


debilitação limitativa se, em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade ou da
ilegalidade, o fundamento normativo das decisões administrativas (ou a própria decisão)
foi julgado ilegal ou inconstitucional, sem, no entanto, ter existido qualquer declaração
judicial com força obrigatória geral.

A garantia do princípio da juridicidade perante a Administração Pública encontra-se na


invalidade que atinge as condutas que são desconformes com a juridicidade e no inerente
desvalor que lhes é atribuído pela ordem jurídica:

Se o desvalor jurídico da invalidade pode ser a inexistência, a nulidade ou a anulabilidade,


isto significa que a violação da juridicidade conhece diferentes respostas por parte do
Direito Administrativo;

Sabendo-se que o regime da anulabilidade é menos severo que, em termos comparativos,


o regime da nulidade, há aqui uma diferente intensidade vinculativa à juridicidade: as
normas cuja violação tem como desvalor a nulidade são dotadas de uma força jurídica de
grau superior, se comparadas com as normas cujo desvalor é a anulabilidade dos atos
desconformes;

CPA: 163º/1 Uma vez que a anulabilidade é o desvalor regra no ordenamento jurídico-
administrativo, isto traduz, implicitamente, uma certa fragilidade do carácter vinculativo
da juridicidade.

Contudo, nem sempre o agir administrativo em sentido desconforme à juridicidade


normalmente vinculativa acarreta um desvalor jurídico. Surgem casos em que os efeitos
típicos podem ser neutralizados pela própria ordem jurídica à luz de diferentes cenários:

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 22


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Pode verificar-se um enfraquecimento vinculativo da legalidade- é o que sucede em casos


de soft law, de atuação administrativa informal ou sempre que assumam relevância
operativa o direito à objeção de consciência e i direito de resistência;

Pode ocorrer uma inversão do sentido vinculativo da lei, numa manifestação do designado
princípio da contracorrente (ex. vinculação legislativa a regulamentos, vinculação do
legislador a contratos e a atos administrativos);

Pode a própria legalidade habilitar atuações contra legem (ex. invertendo a ordem jurídica
o princípio da invalidade, validando a atuação de funcionários de facto1, permitindo a
desaplicação administrativa da lei, ocorrendo uma situação de estado de necessidade
administrativa);

Pode o decurso do tempo produzir, nos termos do instituto da prescrição e da caducidade,


um efeito de consolidação na ordem jurídica de situações criadas à margem da
juridicidade e extinguir posições jurídicas válidas, invertendo o sentido e os efeitos
normais da legalidade administrativa.

O princípio da juridicidade implica ainda a submissão administrativa ao controlo judicial


que afere a observância da normatividade vinculativa do agir administrativo, podendo os
tribunais apenas aferir a legalidade e não o mérito do agir administrativo (art.º 3º do
CPTA)

Princípio da prossecução do interesse público

CRP: 266º/1 + CPA: 4º

Este princípio marca o fundamento, limite e critério da decisão administrativa.


E caso prosseguida fins que não são alem de ser invalidade pode incorrer em
responsabilidade criminal.

Princípio do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos cidadãos

CRP: 266º/1 + CPA: 4º

Pode ter mais ou menos intensidade, tendo mais intensidade quando estamos perante
direitos subjetivos, e menos intensidade quando estamos perante um interesse
legalmente protegido, havendo uma área de discricionariedade decisória

Princípio da igualdade

CRP: 266º/2; 13º + CPA: 6º

1
São aqueles que não tendo habilitação jurídica para determinado cargo exercem, de facto, o papel desse
cargo e as funções do mesmo.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 23


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Igualdade formal e material.


Haverá igualdade na ilegalidade? Tem a mesma força política que o da legalidade.
Se ambos tem a mesma força jurídica não é admissível que se possa dizer que a
legalidade prevalece sempre e absolutamente, pelo que é admissível que em
determinadas circunstâncias pode existir um direto à igualdade na ilegalidade.

Princípio da proporcionalidade

CRP: 266º/2

Fundamenta a ideia da necessidade e proibição do excesso, da adequação dos meios


ao fim. De todos os limites à discricionariedade é o que vai mais longe no controlo
judicial à Administração Pública.

Convenção Europeia dos Direitos do Homem 8º/2, 9º/2, 10º/2 e 11º/2


Direito da União Europeia TUE: 5º/4 CDUE: 49º/2 e 52º/1
Pode sintetizar-se nas ideias de adequação, necessidade e razoabilidade.

O princípio da proporcionalidade tem antecedentes ao Estado de Direito como se pode


encontrar em Platão, Aristóteles e São Tomás de Aquino.

O princípio da proporcionalidade envolve um juízo que pressupõe uma relação entre a


conduta administrativa tomada (ou a tomar) e as circunstâncias que a justificam, os
propósitos visados ou os efeitos que comporta, desdobrando-se em três exigências:
• A conduta não pode mostrar-se desadequada, inapta ou inapropriada face à
situação concretamente considerada- princípio da adequação;
• A conduta não pode revelar-se excessiva ou desnecessária perante o caso, de
acordo com um postulado que determina “um máximo de utilidade pública,
envolvendo um mínimo de sacrifícios do privado”- princípio da proibição do
excesso, princípio da necessidade ou princípio da indispensabilidade;
• A conduta não pode traduzir uma desrazoável ou desequilibrada ponderação de
interesses, custos e benefícios dela resultantes- princípio da proporcionalidade
stricto sensu, princípio da razoabilidade (de ponderação ou balanceamento),
princípio do “balanço custos/vantagens”, princípio do equilíbrio ou ainda
princípio da exigibilidade ou suportabilidade do sacrifício.

De forma complementar e sem expressa consagração no CPA, há quem sustente que a


proporcionalidade envolve ainda mais três vertentes:

A conduta administrativa não pode envolver uma proteção insuficiente, de ficar abaixo
ou aquém da tutela exigível face à situação- princípio da interdição da proteção
insuficiente ou princípio da proibição do defeito

A conduta administrativa deve inserir-se no âmbito daquelas que dentro da legalidade,


menor impacto lesivo tenha sobre os interesses privados opositivos e sobre os outros
interesses públicos passíveis de serem afetados- princípio da subsidiariedade;

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 24


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Estando em causa medidas que visem o restabelecimento da legalidade, a prevenção ou


o sancionamento da sua violação, devem aquelas ser adotadas contra quem, à luz de um
nexo de causalidade adequada, teve um comportamento ilícito ou tem a disponibilidade
de uma situação passível de gerar riscos ou perigo de dano, enquanto protagonista
causador da perturbação da ordem pública ou da ordem jurídica, nunca podendo tais
medidas ter como destinatários terceiros que não os perturbadores- princípio do
perturbador.

O princípio da proporcionalidade prossegue determinadas finalidades, de entre elas:

A proporcionalidade limita a intervenção administrativa a um postulado de necessidade


e submete-a a uma exigência de adaptabilidade às circunstâncias de facto;

A proporcionalidade diz-nos a medida em que a ponderação da prossecução do interesse


público juntos dos interesses privados exige que aquele tome em consideração o respeito
por estes ou, em alternativa, a medida em que estes podem sofrer uma legítima restrição
por efeito da prossecução do primeiro;

A proporcionalidade surge como critério de ponderação entre interesses (públicos ou


privados) insuscetíveis de satisfação integral, procurando uma harmonização ou
concordância prática em cenários de igual valia dos interesses em conflito.

O princípio da proporcionalidade, mostrando-se tão mais relevante quanto maior for a


margem de autonomia decisória da Administração Pública, encontra espaços
preferenciais de operatividade, se conjugado com a atividade administrativa em questão:
• As ideias de adequação e de necessidade têm especial aplicabilidade no âmbito da
Administração agressiva, envolvendo restrições a direitos e interesses dos
cidadãos;
• A utilização do balanço custos/vantagens faz especial sentido no domínio da
Administração prestadora e sempre que estejamos diante de atos ou repercussões
financeiras;
• A atividade discricionária não pode deixar de ter o mérito do seu conteúdo
decisório, à luz do princípio de uma boa administração, pautado por referenciais
limitativos de proporcionalidade.

A delimitação da atuação administrativa discricionário pelo princípio da


proporcionalidade confere ao juiz uma inevitável proeminência na definição das
fronteiras entre o hemisfério da legalidade e o hemisfério do mérito:

Competirá ao juiz, de acordo com as circunstâncias concretas, traçar a fronteira entre o


que é desproporcional e, por isso inválido, e aquilo que será oportunidade ou
conveniência do agir administrativo;

A proporcionalidade pode consubstanciar um “cavalo de Troia” que vai submeter o


mérito da atuação administrativa, aferido nos termos do postulado da boa administração,
a um progressivo controlo judicial.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 25


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

É ainda de notar que, além das decisões individuais e concretas, também a


proporcionalidade diz respeito ao conteúdo das normas jurídicas reguladoras da
Administração Pública:
• As normas das leis e dos regulamentos estão vinculadas a respeitar o princípio da
proporcionalidade, servindo de parâmetro constitucional de controlo judicial;
• O legislador está vinculado, de acordo com o princípio constitucional da
proporcionalidade, a conferir à Administração uma margem de autonomia
decisória, de forma a que esta possa adaptar as soluções concretas às
circunstâncias factuais existentes em cada momento- a predeterminação integral
da solução pela lei, num cenário de subsunção por parte da Administração, vai
contra a proporcionalidade;
• Num cenário de vinculação administrativa subsuntiva à lei, a existência de normas
legais violadoras da proporcionalidade determinará, face à impossibilidade de a
Administração as desaplicar, a prática de decisões aplicativas consequentemente
desconformes com o princípio da proporcionalidade.

A jurisprudência administrativa não se demonstra uniforme no que toca aos efeitos


decorrentes da violação do princípio da proporcionalidade:

A orientação mais recente, negando a subjectivização constitucional do princípio da


proporcionalidade, permitindo que se falasse num direito fundamental titulado pelos
interessados, conclui que a violação do princípio da proporcionalidade não gera nulidade
da atuação administrativa;

Outro entendimento, mais antigo, admitia que em casos de “ofensa grave e grosseira” da
garantia da proporcionalidade, a conduta administrativa fosse nula.

Princípio da imparcialidade

Origem histórica muito remota mas mantem-se como uma garantia de distância entre
os interesses de quem decide e os interesses do público.

Tem a vertente negativa que impõem a distância, havendo suspensos e impedimentos


no agir da Administração.
Exemplo: relações entre funcionário e particular

Tem a vertente positiva que determina que o princípio impõe que a Administração
quando toma uma decisão pondere todos os interesses envolvidos e apenas os que
sejam relevantes para a decisão, marginalizando os que em nada afetam a decisão.

Não exclui que a Administração Pública possa ter uma determinada opção política no
seu agir apenas conjuga a legitimidade com a imparcialidade
Exemplo: Governo é eleito para cumprir um conjunto de promessas

Princípio da boa fé

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 26


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Pauta a atuação administrativa, articulando-se com a proteção da confiança e com o


abuso do direito e a fraude à lei

Princípio da justiça

Relacionado com o conteúdo da decisão, pois esta só é valida se o seu conteúdo não
ferir materialmente o conceito de justiça

Princípios da responsabilidade civil da administração

Quem gera um dano cria o dever de indemnizar.


Estudar mais adiante

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 27


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PRINCÍPIOS GERAIS SEM FORMULAÇÃO CONSTITUCIONAL

Princípio da interdição do arbítrio

Violação grosseira do princípio da juridicidade, pois nas situações de arbítrio há um


desprezo pelo direito e pela justiça.

Nem sempre a violação do arbítrio se reconduz a uma violação da igualdade.


Exemplo: um professor que resolva dizer que são reprovados todos os alunos que não
venham à oral com gravata.

O fundamento da proibição do arbítrio é o princípio da justiça, tendo em atenção que nem


todas as ilegais são arbitrarias, apenas quando houver uma violação grosseira da
juriscidade.

Pode verificar-se na norma que a Administração for chamada a aplica, havendo uma
arbitrariedade derivada. Mas a arbitrariedade pode ser originária quando se prende com
o resultado autónomo da decisão. Assim pode estra na própria lei ou resultar da conduta
administrativa num espaço de discricionariedade.
Exemplo: Números de mortes por covid a disparar a Administração resolve aligeirar as
medidas, como retirar o confinamento ou não aconselhar uso de máscara.

Princípio da concorrência

Origem de natureza económica, baseado na ideia de liberdade de exercício numa


atividade e da não discriminação. Contudo atualmente tem uma dimensão que vai para
além da vertente económica. Toda a administração administrativa que envolva a
atribuição de uma vantagem num cenário de recurso escasso, ou seja, que haja um
problema de competição entre particulares.

A concorrência determina sempre um procedimento concursal, aberto e em condições de


igualdade em relação a todos os participantes.
Exemplo: na realização de provas para a aprovação numa cadeira cada um apresenta-se e
é analisado por si, obtendo ou não aprovação, sem haver concorrência pois não há um
número fechado para alunos que passam ou chumbam.
Por vezes a pessoa apresenta-se a provas sabendo que este procedimento conduz a
estarem abertas duas vagas para professor catedrático, pelo que a intervenção
administrativa envolve a atribuição de uma vantagem face a um recurso escasso, havendo
5 interessados na vaga.

A ideia base são os valores da igualdade justiça e imparcialidade o que faz com que o
procedimento de concurso tenha de ser aberto, publicitado, transparente, livre, condições
de acesso iguais, avaliação pelo mérito, acesso à informação relevante.

No âmbito do Direito da União Europeia implica a proibição de acordo entre empresas


excluindo o Estado.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 28


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Princípio da ponderação

Ideia de balanceamento de bens, interesses e valores que pautam a conduta administrativa,


sendo uma metodologia de decisão ou conteúdo e resultado final decisório, assim obriga
no âmbito do caminho mas também da decisão final. Temos uma CRP compromissória e
outras fontes que conduzem à necessidade dessas ponderações.

A ponderação pode conduzir a situações de vicissitudes:


• Recusa de ponderação, assumir que não quer tomar em consideração
determinados tipos de interesses, havendo uma violação intencional da legalidade,
caso os interesses sejam fundamentais.
• Omissão de ponderação, não tomar em consideração determinados interesses em
intenção de tal, sem consciência
• Erro de ponderação, ponderei mas dei relevância excessiva ou diminuta, havendo
erro relativo ou pode incidir sobre a ausência de ponderação ou realização da
ponderação. Podemos ter um erro de ponderação porque não tive em consideração
um interesse que devia ter tido, ou tomei em consideração ou realidade que não
era importante ser tomada em consideração. Podemos ainda ter erro ponderando
todos os interesses mas dar maior valor ao errado.

Exemplos de ponderação por parte do legislador:


CPA: 163º/5 Apesar destas situações gerarem anulação não vão gerar efeito anulatório
CPA: 162º/3 Devem-se reconhecer certos efeitos a atos que seriam nulos

Princípio da atendibilidade da situação fatual

A importância dos factos para a decisão da Administração, qualquer decisão tem uma
determinada realidade de facto que serve para fundamentar a decisão. A decisão pode
variar em função dos factos, pois estes condicionam o agir administrativo. Dai a
importância da instrução procedimental.

A alteração das circunstâncias é a evolução da factualidade, quando a decisão foi tomada


havia uma realidade que se alterou, alteração esta que deve ter projeção na decisão
jurídica, podendo levar à extinção ou alteração, atendendo à proporcionalidade.

A importância da realidade factual quando ao erro dos pressupostos, e o erro inquina a


respetiva decisão.
Projeta efeitos na própria decisão administrativa, pois a factualidade serve de parâmetro
e fundamento à decisão. A factualidade leva-nos a saber o que é igual e o que é diferente
para que se execute o princípio da igualdade. Quando se fala numa ausência de
correspondência entre a decisão e a realidade factual.

O precedente é a relevância da situação de facto, o agir da própria administração é um


facto com relevância porque condiciona as atuações futuras.

O fundamento deste princípio é a justiça material na decisão administrativa.

A atendibilidade da situação factual apesar de dar relevância aos factos é sempre uma
situação jurídica de direito.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 29


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Princípio da sustentabilidade

Faz apelo à ponderação de efeito futuros ao agir administrativo, tendo a sua consagração
legal no Código Contratos Públicos.
A preservação entre gerações dos recursos pode-se ver no CRP: 66º/2

O Juízo de prognose consiste em imaginar como é que aquilo que vou decidir tem empato
na realidade futura. Juízo realizado em regras técnico-científicas sobre a previsibilidade
da evolução da realidade.
Exemplo: aumentando agora as reformas qual vai ser o impacto na economia para as
gerações futuras.

A ideia da sustentabilidade é um pressuposto originário da decisão porque temos que ter


em consideração o impacto futuro mas também conduz a uma ideia superveniente.
Descobriu-se que determinada realidade tem vindo a funcionar na verdade provoca danos,
e é possível a revogação de decisões devido a novos conhecimentos que mostrem afetar
a sustentabilidade futura como vemos no CPA: 167º/2 c)

Princípio da Precaução

Administração de precaução é a que desenvolve uma atividade preventiva, procura evita


a difusão de problemas numa sociedade de risco, tendo de os antecipar.
CRP: 199 d) Clausula geral que habilita a administração a agir preventivamente

Tem efeitos ao nível do pressuposto do facto e da prova. Pode existir muita incerteza
factual devido as dificuldades da prova causadas a divergências técnicas e científicas.
Contudo a administração tem de agir, arriscando uma decisão, tendo em atenção os
conhecimentos à data da decisão.
Exemplo: suspeita se que um medicamento tem efeitos secundários graves, a
administração não deve ficara espera que se prove esses efeitos, deve agir
preventivamente. Invertendo o ónus de prova, pois deve ser o particular da patente a
provar que os efeitos não são tao graves para o fundamento da decisão administrativa.

Não há risco 0, há sempre situações em que a administração tem de decidir com margem
de risco, pelo que temos de ter presente o princípio da proporcionalidade.

Princípio da boa administração

Falamos de boa administração não apenas no procedimento mas também no conteúdo da


respetiva decisão, que seja eficiente visando a melhor solução.

Envolve juízos a priori à luz do balanço de custos e balanços à posteriori para saber se a
medida foi adequada ou não conforme o princípio da proporcionalidade.
A boa administração sujeita o mérito, a conveniência à proporcionalidade, na medida em
que a boa administração a utiliza, podendo os tribunais controlar a dimensão da boa
administração.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 30


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Princípio da moralidade administrativa

Significa a proibição de condutas ofensivas dos bons costumes, a vinculação do agir a


valores de honestidade, a sujeição dos titulares a padrões de ética, a ideia de que a conduta
não pode ser desonesta, pois neste caso gera invalidade da atuação e responsabilidade
disciplinar e criminal do decisor.

Situações de proibição da fraude à lei no âmbito da imparcialidade e da moralidade


administrativa com as nomeações cruzadas.
Exemplo: A é titular e que nomear B que é seu filho seu chefe de gabinete, não o pode
fazer à luz da imparcialidade. C quer fazer o mesmo com a sua mulher mas também não
pode. As nomeações cruzadas é A e C combinarem nomear os familiares do outro para
chefes de gabinete.

Outra situação que viola a moralidade é a traição administrativa, onde a administração


visa utilizar estratégias que apanham os particulares
Exemplo 1: colocação de radares sem aviso
Exemplo 2: Agentes provocadores, sendo alguém sem o propósito de cometer crime é
introduzido numa associação criminosa, procurando motivara e aliciar outros a cometer.

A violação deste princípio projeta-se igualmente ao nível de realização de despesas legais


mas inúteis para a situação concreta.
Exemplo: numa escola com carências alimentares à verbas para se realizar concertos de
musica.

A base ou o fundamento deste princípio encontra-se em vários princípios, justiça,


imparcialidade e ética republicada e constitucional

Princípio do estado de necessidade administrativo

Projeção da necessidade ao nível da própria decisão do conteúdo e não do procedimento.


Através deste princípio pode se tornar lícito e valido decisões que em cenário normal
seriam ilícitas e invalidas. Tem a particularidade de transformar o valido o que em
normalidade seria inválido.

O problema que se coloca é quais são os limites à necessidade administrativa


Num sistema CPA: 163º/5 onde casos de anulabilidade podem não provar efeitos,
admite-se portanto que no estado de necessidade administrativa habilita-se a prática de
atos anuláveis.

Praticar de atos nulo também é possível, segundo Paulo Otero, desde que se verifiquem
ponderosas razões de necessidade, dentro do princípio da proporcionalidade, sempre com
possibilidade de impugnação judicial o dever de indemnizar em caso de danos.
O caso em que nunca é possível a prática de atos nulos em estado de exceção de
necessidade administrativa são os da CRP: 19º/ 6 e 7, assim não se pode nunca violar
direito fundamentais e violar normas de competência que em estado de exceção
Constitucional também não podem.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 31


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

FORMAS DE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA E PROCEDIMENTO

ATIVIDADE ADMINISTRATIVA EM GERAL

Voluntariedade da conduta

A atividade administrativa é sempre em si uma atividade que expressa uma conduta


voluntaria contudo nem todos os efeitos jurídicos pressupõe a existência de condutas
voluntarias. Há condutas que não são voluntarias mas que existem devido a factos
jurídicos que produzem efeitos, como o tempo e a morte.

A conduta administrativa pode envolver uma ação ou omissão, ficando sempre


dependente da exteriorização.

As decisões administrativas podem ter como destinatários pessoas determinadas, ficando


designadas por atos não-normativos ou ter como destinatários uma pluralidade
indeterminada de sujeitos, ficando designadas de atos normativos.
Pode ainda ter uma natureza mista, sendo determinada quando a alguns destinatários e
indeterminada para outros.
Exemplo: a resolução através da qual foi aplicada a decisão ao Banco Espírito Santo,
sendo este o destinatário principal, tornando a decisão um ato não normativo, ou seja,
administrativo, mas também produziu efeitos num leque indeterminado de sujeitos, como
os investidores e nesta vertente a decisão assume-se como regulamento.

Nem sempre a vontade administrativa é suficiente por si para produzir os efeitos


desejados, ficando dependente da colaboração de outras pessoas, pelo que é necessária a
elaboração de um contrato de vontade.
Por vezes o ato fica dependente da aceitação do particular, para dar eficácia à vontade da
Administração.
Exemplo: A atribuição de uma condecoração de louvor
Por vezes não basta a vontade pois é necessária uma atuação, um ato material para dar
efetividade à vontade da Administração Pública
Exemplo: não bastava a administração ter criado um plano de vacinação, sendo necessário
existir alguém para administrar as vacinar para dar efetividade à vontade através de uma
atuação material

Quadro das formas de atividade administrativa

Podem existir atos jurídicos e atos não jurídicos, como o decreto que regula a vacinação
e a operação própria da vacinação.
Dentro dos jurídicos há os que são regidos pelo direito público dando azo a uma forma
de atividade administrativa pública, ou atos jurídicos regidos pelo direito privado, dando
lugar a uma administração que se enquadra na tradicional de gestão privada.

A inércia ou omissão administrativa tem sempre um significado procedimental.


Há condutas que são de facto, ou seja, um mero comportamento factual sem declaração
expressa de vontade pode permitir extrair uma declaração implícita ou tácita da vontade
da administração. Sendo este um problema discutido a diversos níveis como em termos
de inspeções fiscais.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 32


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

FORMAS DE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA JURÍDICA PÚBLICAS

Temos dois elementos ou requisitos no conceito de forma de atuação jurídico-


administrativa pública:

• Produção de atos jurídicos

Atividade que produz efeitos jurídico, seja através de manifestações de vontade seja
através de manifestações de ciência, podendo ser expressa em atos internos ou através de
atos externo, passando a fronteira dos órgãos administrativos
O ato jurídico interno pode ser dentro da mesma pessoa coletiva, sendo intrasubjetivo, ou
pode ser interno mas entre entidades públicas destintas

Podem ser simples ou não negociais, havendo uma vontade de conduta mas os efeitos
estão predeterminados na lei, pelo que queremos mas obedecemos as normas na lei para
os efeitos que queremos.
Atos intencionais ou negócio jurídicos, havendo vontade de celebrar e ainda liberdade de
estipulação, podendo-se estipular o s seus efeitos, dando mais margem de autonomia
pública.

• Regulação material de tais atos pelo Direito Público

Significa que ao agir neste âmbito tem de aplicar o direito administrativo, sem prejuízo
de outros ramos, mas age aplicando o direito administrativo.

Iremos estudar as diversas formas de expressão desta atuação pública por parte da
administração, contudo é de notar que podem existir casos de administração mista entre
regulamento e contrato; ato e contrato e ainda ato e regulamento.

Regulamento

É um ato normativo emanado pela Administração Pública no exercício da função


administrativa. Compreende assim três elementos: a natureza normativa, a inserção no
âmbito da função e a proveniência da administração

Existem regulamentos internos, os que esgotam os seus efeitos dentro da administração e


os externos quando os seus efeitos ultrapassam as fronteiras da administração, regulando
ou provocando efeitos nos particulares
CPA: 135º Contrariando a evolução dogmática que justifica os efeitos dos regulamentos
interno, vem determinar como regulamentos os que produzam efeitos jurídicos externos,
excluindo assim os regulamentos interno que vinham previstos no código de 1991.
O CRP: 267º/5 exige a disciplina legal de regulamentação, e impede a
desprocedimentalização, pelo que a exclusão dos regulamentos internos, segundo Paulo
Otero, foi inconstitucional.
Esta lacuna de regulação quanto aos regulamentos internos deve ser preenchida aplicando
analogicamente e com as devidas adaptações o regime dos regulamentos externos
previsto no CPA.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 33


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Podem ser de regulamento de execução quando está vocacionado para detalhar e


densificar uma determinada lei. Mas pode ser regulamentos independentes assumindo
duas configurações, pois pode ser independente no sentido de regular uma pluralidade de
leis ou fundado diretamente na Constituição.
CRP: 199º g) Permite ao Governo, como único órgão com competência fundada na lei,
emanar regulamentos independentes diretamente fundados na CRP, sendo uma
competência regulamentar especial do governo devendo ser exercida sobre a forma de
decreto-regulamentar, ficando sujeita a promulgação do presidente da república.
Existem ainda regulamentos de imperatividade imediata ou mediata.
Os primeiros produzem efeitos na esfera jurídica dos destinatários sem necessidade de
um ato administrativo que faça a ponte do geral para o concreto.
Exemplo: regulamento de avaliação
Os segundos só produzem efeitos na esfera jurídica dos destinatários se existir um ato
jurídico concreto que aplique ao caso.

Os regulamentos de base contratual ou bilateral é uma forma cruzada entre regulamento


e contrato, pois o fundamento da existência do regulamento é um contrato.
Exemplo: exploração das autoestradas, tendo por base um contrato, permite a entidades
regularem a utilização das autoestradas por regulamentos.

Ato Administrativo

Há uma profunda divergência entre Lisboa e Coimbra, no que se prende com a natureza
dos efeitos do ato administrativo:
• Escola Coimbra
Só era ato administrativo a estatuição autoritária, relativa a um caso individual pela qual
se produzem efeitos jurídicos externos
• Escola Lisboa
Acolhe um conceito mais amplo admitindo que é um ato jurídico unilateral praticado pela
Administração e que traduz a decisão de um caso visando efeitos jurídicos sobre situações
concretas.

Em 1991 no CPA: 120º encontrávamos uma aproximação ao conceito dado pela Escola
de Lisboa, nomeadamente Freitas do Amaral, contudo após a revisão de 2015 o CPA:
148º tende para o conceito da escola de Coimbra, devido à influência de Rogério Soares.

Para Paulo Otero, seguindo a escola de lisboa, o conceito de ato administrativo é mais
amplo do que o previsto no CPA: 148º, comportando 4 elementos:
1. Ato jurídico unilateral
2. Proveniente de estruturas que exercem poderes administrativos
3. Procura definir direta ou instrumentalmente o direito aplicável a uma situação
individual e concreta
O regulamento é caracterizado pela generalidade e abstração, assim é o terceiro elemento
que distingue ato administrativo de regulamento.
4. Visa produzir efeitos sem necessidade de assentimento dos destinatários
Com isto o ato distingue-se do contrato, pois este exige do assentimento e conjugação de
vontades, ou seja, concordância dos particulares para produzir efeitos

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 34


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

o Figuras Controvertidas
Figuras em que nos questionamos se podem ser consideradas atos administrativos

§ Atos Coletivos
Têm como destinatários uma estrutura colegial, e não um individuo concreto, contudo
são ainda atos administrativos porque os destinatários apesar de serem muitos são
determinados ou determináveis, sabe-se quais são os participantes do órgão colegial.

§ Atos Plurais
Produzem uma pluralidade de efeitos a uma pluralidade de pessoas determinadas,
podemos dizer que são diversos atos administrativos agrupados num, ficando designado
de ato plural. Sendo este comporto por tantos atos quanto o número de destinatários.
Exemplo: os alunos da subturma x são suspensos por 2 dias, é um ato administrativo ou
regulamento? É ato administrativo porque o ato que suspende a subturma engloba tantos
atos como o número de alunos, ou seja, em vez de se notificar cada um deles.

§ Atos Gerais
Dizem respeito a uma decisão concreta e são da comunicação e aplicação imediata a um
conjunto inorgânico de um conjunto de pessoas determinadas.
Exemplo: uma ordem de ir despereçam ou identificação por parte da polícia de quem se
encontra a beber na esplanada de um bar em tempo de pandemia.

§ Sinais de trânsito
Situação muito discutida entre a doutrina, segundo Paulo Otero os sinais de trânsito são
regulamentos de operatividade imediata. A regra de um sinal de transito, como é proibido
estacionar aqui, tem implícita e transmite a mensagem aplicada a uma pluralidade
indeterminada de pessoas, pelo que não pode ser ato administrativos. É de aplicabilidade
imediata porque a pessoa mal veja o sinal este é aplicado.
Apesar de serem regulamento a decisão sobre a colocação de cada sinal de transito é um
ato administrativo para uma situação concreta.

§ Atos administrativos que são parcialmente regulamentados


Exemplo: Resolução do banco de Portugal. É um ato administrativo para a entidade
visada mas é um regulamento para todos os demais visados.

o Principais espécies

§ Atos administrativos Decisórios e Instrumentais


Os atos administrativos decisórios consubstanciam-se numa decisão de uma situação
jurídica. Os atos administrativos instrumentais preparam os decisórios, tem uma função
acessória, podendo ser simultâneos ou subsequentes

§ Atos administrativos Constitutivos e Declarativos


Os atos constitutivos, ao contrário dos declarativos, introduzem alterações na ordem
jurídica. Dentro dos atos constitutivos podemos distinguir entre os primários, se pela
primeira vez definem uma situação, e os secundários quando incidem sobre anteriores
atos, como a revogação.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 35


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

§ Atos administrativos Consensuais e não consensuais


Os atos administrativos não consensuais são normalmente atos de autoridade, ou seja,
uma manifestação da soberania decisória da administração.
Por sua vez os atos administrativos consensuais assentam num acordo prévio entre
administração e destinatário, pelo que consubstancia a execução do consenso. Tem por
base a ideia de que é mais fácil convencer o destinatário e fazer com que participe na
configuração da atuação, expressando a ideia de administração participada, tendo em
conta a opinião do particular na configuração da atuação.

§ Ato administrativo com objeto passível de contrato e os sem esse objeto


Os atos administrativos que tem um objeto passível de contrato administrativo, como a
concessão, normalmente por razoes de concorrência estão sujeitos às regras do código
dos contratos públicos.

§ Atos administrativos com autotutela executiva e sem autotutela executiva


Os atos que não tem autotutela não têm privilégio de execução previa, pelo que se a
administração quiser aplicar o ato perante resistência do particular, só pode ir a tribunal
para obter o título executivo para o efeito. Exemplo: não pagar imposto
Os atos administrativos revestidos de autotutela executiva, perante desobediência do
particular a administração pode recorre à força para obrigar o particular ou substituir-se
ao mesmo na prática do ato imputando ao particular as despesas.
Exemplo: prédio tem de ser demolido, particular é notificado e desinteressa-se, a AP pode
demolir o prédio com a particularidade de que as despesas ficam a cargo do particular.

Regime jurídico dos atos administrativos pode estar na Lei Geral Tributaria, no Código
de Contratos Públicos, mas em regra esta no CPA, contudo o conceito de ato
administrativo que se extrai, devido ao CPA: 148º é menos amplo, pois, tal como
verificamos nos regulamentos, só regula os atos que provoquem efeitos externos.

O CPA tem contradições porque regula situações como a ata, a convocatória, e a


delegação de poderes e isto são matérias que dizem respeito a de atos internos, contudo o
preceito só se refere a efeitos externo, porque regula os internos?
Apesar de existirem alguns atos internos regulados no CPA, essa não é a regra geral, pelo
que estamos numa situação de inconstitucionalidade, pois o de CPA de 1991 regulava
ambos e em 2015 com a exclusão dos internos há uma deprocidementalização e
consequentemente um recuo na execução do CRP: 267º/5.

Como integrar a lacuna? Segundo Paulo Otero é semelhante ao que acontece no


regulamento existindo uma aplicação analogias aos internos.

Meras declarações negocias

Correspondem a um agir individual da Administração Pública perante casos e situações


concretas mas que não se reconduzem a atos administrativos. A diferença está no facto
dos atos administrativos terem autotutela imperativa e em regra a Administração Pública
pode através da autotutela executiva usar a força para os executar.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 36


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Nas meras declarações negociais a Administração Pública limita-se a expressar uma


vontade, mas se o destinatário não concorda não esta obrigado a acatar nem a ir a tribunal
impugnar aquilo que lhe foi ordenado, ou melhor, sugerido pela Administração. Se quiser
impor a decisão tem de ir a Tribunal obter um título que legitima o particular a acatar.
Exemplo: Código dos Contratos Públicos: 307º/1 A AP pode definir o sentido das
clausulas contratuais mas a sua interpretação depende da concordância do particular.
Exemplo 2: O montante da RC da AP só produz efeitos se o particular concordar

Se a administração teimar em fixar as declarações como ato administrativos, sem a


legitimidade judicial, existe usurpação de poderes.

Podem existir comportamento factuais concludente, ou seja, nem todas as declarações


têm de ser expressas, podem ser tácitas extraídas de comportamento. O regime destes
comportamentos encontra-se no Código Civil, sem prejuízo do CPA: 2º/1 + 3

Contratos Administrativos

Ideia de que estamos perante uma forma bilateral do agir da administração, é anterior ao
século XIX mas intensifica-se com as ideologias Liberais, chamando os particulares a
participar. O neo-liberalismo e o propósito de privatização da administração que se
verifica no século XX veio reforçar. O mesmo acontece com o papel da União Europeia,
existindo regras comuns que facilitam a concorrência e circulação entre empresas.

Nota: Nem todos os contratos praticados pela Administração são contratos


administrativos, pois a AP pode no exercício da sua atividade utilizar contratos privados.

O contrato administrativo é um vínculo jurídico plurilateral envolvendo sempre um


contraente público e ficando regulado pelo direito publico, administrativo.

o Principais Espécies

Contratos podem ser entre uma entidade privada e uma entidade publica ou pode ser entre
duas entidades públicas, designando-se interadministrativos, porque relacionam
administrações publicas.

Podem ser de contratos administrativos de atribuição caso a prestação principal pertença


a uma entidade pública.
Exemplo: contrato de fornecimento de água, luz ou gás.
Podem ao invés ser contratos administrativos de colaboração quando a prestação principal
seja de um particular.
Exemplo: contrato de construção de uma barragem.
Podem ainda ser contratos de colaboração entre entidades públicas e privadas em termos
paritários.

Os contratos serão ativos quando visam a Administração arrecadar receitas


Exemplo: locação de bens públicos
São contratos administrativos passivos quando envolvam a realização de despesas por
parte da Administração
Exemplo: aquisição de serviços

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 37


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Podem ainda ser contratos mistos quando conjugam despesas e receitas para a AP
Exemplo: empréstimo público

Podem ainda ser contratos administrativos organizatórios, procedimentais, contenciosos


ou substantivos.

O regime geral encontra-se no CPA: 57º, contudo existe um regime substantivo que diria
que obedece a duas regras:
Se o contrato administrativo diz respeito a prestações submetida à concorrência o regime
processual é regulado pelo código dos contratos públicos CCP: 1º/6 + 16º/1
Caso o contrato não esteja submetido à concorrência o regime procedimental é do CPA:
201º/3 e o regime substantivo no CCP porque CPA: 202º/2
Podendo em todos os casos existir normas especial que afaste estes regimes.

Convénios interorgânicos

Há quem fale impropriamente em contratos internos, dentro da administração, contudo


os contratos exigem a existência de duas entidades distintas e neste caso falados de
acordos entre dois órgãos de uma mesma entidade. Visam regular a organização,
funcionamento e exercício de poderes dos órgãos da entidade em causa.

Não há um regime geral, por serem internos supostamente não estão sujeitos ao CPA e
como não são contratos não são regulados pelo Código Contratos Públicos.

Contudo o CPA regula trÊs tipos de acordos endoprocedimentais CPA: 57º Auxílio
administrativo CPA: 66º conferencias procedimentais CPA: 77º
Há contudo uma vinculação jurídica imperfeita

Atos processuais

Até agora tratamos da atuação perante os particulares ou ela própria, ou seja de natureza
substantiva, mas por vezes tem de agir junto dos tribunais, defendendo as duas posições
jurídicas ou contrariando as defendidas pelos particulares. A intervenção da ap junto dos
tribunais gera atos processuais.

Pode ser autora, desencadeando a ação, ou no caso da ação ser contra ela intentada aparece
na posição de reu, contudo eem ambos os cenários participa no processo.
Os atos processuais são praticados através de advogados, contudo esses continuam a ser
atos de processuais jurídico-públicos da administração, pois são eles que exprimem a
posição da AP perante um tribunal. Há os que exigem a intervenção do juiz e os que não
dependem.

O regime está nas leis processuais, na lei que respeita ao processo nos TA, no código do
processo civil e na lei da arbitragem voluntaria.

Estes atos necessitam sempre de ter anteriormente um título que permita que a AP
apresente e pratique aqueles atos, atribuindo competência

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 38


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

FORMAS DE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA JURÍDICA PRIVADAS

Há uma lógica neo-liberal que flexibiliza o agir administrativo chamando a


Administração Pública a aplicar o direito privado. No silêncio da lei presume-se que a
administração age através do Direito Público, pelo que a atuação privada exige título
expresso que habilite a aplicação do Direito Privado. Mesmo quando aplica o privado não
é igual ao que encontramos entre particulares, é um direito privado administrativizado
CPA: 2º/3, o que significa que a atividade administrativa produz atos jurídicos que são
regulados materialmente pelo direito privado.

São três os tipos de atos privados que a Administração pode praticar:

• Atos jurídicos simples, situações onde há vontade de ação mas não há relevância
da estipulação dos efeitos pois estes resultam da lei
Exemplo: interpelação feita por um devedor à administração CC: 295º

• Negócios jurídicos unilaterais


Exemplo: aceitação de uma herança por parte de um município

• Negócios jurídico plurilaterais, ou seja, contratos de direito privados que a


Administração Pública celebra
Mesmo os regidos materialmente pelo Direito Privado têm na sua base um procedimento
regulado pelo Direito Público, devido ao Código dos Contratos Públicos.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 39


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

FORMA DE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA NÃO JURÍDICA

São atuações por parte da Administração Pública que não produzem fatos jurídicos,
contudo alicerçam-se sempre numa norma jurídica e podem ainda produzir fatos jurídicos
colaterais, como responsabilidade caso a atuação provoque danos.

Operações materiais

Visam transformar a realidade, atuando. Uma coisa é a resolução que determina a


demissão do Conselho de Ministros da ação de recolhimento de pessoas no domicílio.
Exemplo: o médico quando realiza uma cirurgia.

O princípio de bem-estar nunca teria materialização se não existissem as operações


matérias, se as intenções ficassem nos atos jurídicos. Assim estas são as operações
essenciais para a satisfazer as necessidades coletivas.

Há em todas as operações o prossuposto de que não podem todas produzir efeitos


jurídicos, mas há uma norma habilitante, há uma atuação material pautada por princípios
jurídicos, pelo que a atuação não prescinde do Direito. Prova disso é que após a atuação
caso exista excessos ou danos pode incorrer a Administração Pública em responsabilidade

Pode as operações podem ter ou não relevância Constitucional, podem ser preparatórias
ou de execução de atos jurídicos, podem ser instantâneas ou continuadas.
Por último podem ser ou não atuações com título, ou seja serem habilitadas
Exemplo: AP anaça para demolir uma construção sem título. Não havendo título é uma
atuação de facto lesiva, pelo que é inválida.
Há dúvidas a quem se deve imputar a culpa nas situações de facto. É uma atuação da
administração e em caso de culpa é a entidade publica que responde com o sue património
ou deve se importar à pessoa do funcionário publico?

O regime está genericamente no CPA: 2º/3.

Atuação informal

Traduz a ideia de negociação e do consenso, excluindo atuações autoritárias por parte da


Administração Pública. Contudo continuam a existir normas que vinculam a atuação.

É uma atuação marginal, não ilegal, apenas lateral à norma procedimental, há uma
adaptação do direito à realidade.
Exemplo: Aulas gravadas

São atuações informais as recomendações e informações dadas pela Administração


Exemplo: quando um professor indica que uma matéria é importante.
A existência de tolerância de situações de facto por parte da Administração
Exemplo: não é permitido estacionar mas alguém para apenas para colocar a carta no
correio e o polícia deixa

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 40


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Pode se uma atuação que vai para além da lei ou pode ser ainda contrária à lei acabando
por dar origem a uma normatividade não oficial, devido à existência de um sentido de
obrigatoriedade.

Se é informal escapa a uma normatividade, contudo às atuações aplicam-se o CPA: 2º/3


pelo que estão vinculadas aos preceitos do CPA que concretizem normas constitucionais
e ao CRP: 266º. Pode gerar responsabilidade civil da administração, devido à importância
da tutela da confiança dos particulares.

Atuação de natureza política

Pode no seu agir praticar atos que tenha natureza jurídica.


Exemplo: resoluções do conselho de ministro que tem natureza política e administrativa,
sendo o seu cunho político expressão do programa que apresenta.

Podem ser unilaterais ou bilaterais.

Conformidade ao CPA e CRP e controlo judicial

Omissão administrativa

A administração pode não agir quando deveria, o silencia da administração pode ter
relevância jurídica, resultando historicamente da magna carta. A França no seculo 19
criou a ideia que quando não age deve-se presumir que negou a questão levantada pelo
particular. Contudo nem sempre o silencio é em resposta de um requerimento.

A inércia pode ser jurídica ou declarativa ou pode ainda ser factual ou material. A
declarativa pode ser pretenciva ou sem base pertenciva.
Pode ser escurente da recusa de executar uma decisão de um tribunal ou em termo
prestacionais.
pode ser contratual, regulamentar ou de atos administrativos, sendo que o regime comum
é que há uma violação de dever legal de agir

CPA 129 RG e 130 E

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 41


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REGIME COMUM DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

ESTRUTURA E VÍCIOS DAS FORMAS JURÍDICAS DA ATIVIDADE

COMPETÊNCIA

Determinação da competência administrativa

Tem que ver com a habilitação para agir: quem pode agir? A resposta a esta pergunta é
de diversos tipos, temos diversos níveis de competência.

O primeiro nível é aquele que separa o hemisfério público do privado: aqui a regra é que
se as entidades públicas agem sobre a área do hemisfério, sem uma lei habilitante dentro
do quadro de competências proscrito pela Constituição, da sociedade civil há violação de
direitos fundamentais e, consequentemente, um ato nulo.

No hemisfério público podemos diferenciar, à luz da separação de poderes, diversas


funções: quando uma das funções invade a área de competência de outra função do
Estado, além de uma inconstitucionalidade estamos perante uma violação da separação
de poderes que resulta no vício da usurpação de poderes e CPA: 161º/2 a) temos um
ato nulo.

Dentro do poder administrativo há repartição de poderes, competência e atribuições por


várias entidades públicas: quando um órgão de uma entidade pública pratica um ato que
é da competência de outra entidade pública, tal ato padece de incompetência absoluta e
é também um CPA: 161º/2 b) ato nulo.

No âmbito da atuação governamental o que se passa é que apesar de o governo ser um


órgão do ente coletivo público “Estado”, cada ministério tem atribuições próprias
Exemplo: os fins do ministério da Agricultura são distintos dos da Educação
Se um ministro A pratica um ato que é da competência do ministério B, apesar de serem
órgão do Governo e pertencerem ambos ao Estado, o ato está ferido de incompetência
absoluta, porque há invasão de atribuições (que dividem os ministérios) que não lhe estão
confiadas pela lei, pelo que o ato se reconduz à nulidade.

Pode haver incompetência absoluta interna, se a mesma se dá no âmbito da Administração


de um mesmo país, ou, em alternativa, incompetência absoluta externa.
Há incompetência absoluta externa quando uma entidade pública estrangeira intervém na
área de atuação de uma entidade pública internacional e vice-versa.
Exemplo: a admissibilidade ou não empresa municipal espanhola, do município de
Barcelona, poder concorrer ou não a uma concessão de transportes públicos em Portugal:
não o pode fazer, porque à luz da lei que cria esta empresa pública de Barcelona só pode
explorar serviços de transporte no âmbito do município de Barcelona

A competência também se pode ver no sentido rigoroso: conjunto de poderes, conjunto


de faculdades tendo em vista prosseguir os fins de uma entidade pública. Este conceito é
analisável dentro de uma mesma entidade pública: cada órgão tem os poderes necessários
para prosseguir tais fins; daí que se um órgão pratica um ato, cujos poderes para a prática

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 42


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

estão confiadas a um outro órgão da mesma entidade pública estamos perante um caso de
incompetência relativa, sendo o ato CPA: 163º meramente anulável.

Existem diversos graus de intensidade de incompetência relativa:


Incompetência relativa meramente parcial, quando a competência era conjunta contudo
apenas um deles teve intervenção.
Exemplo: esta portaria é para ser emanada pelo Ministro x e pelo Ministro Y e apenas o
X emenda e intervém.
Incompetência relativa delegada, ou seja, quando haja uma atuação no âmbito de uma
delegação de poderes inexistente, mas que poderia existir pois é possível, pois os poderes
são delegáveis. Segundo Paulo Otero é uma incompetência menos grave, pois existe uma
nula competência devido à falta de delegação de poderes delegáveis.

Pode existir erro sobre a competência, significa que um órgão pensava que tinha os
poderes e agiu ou pensa que não tem os poderes e não age quando a lei o impõe. Daqui
distingue-se os casos de erro da competência e a ilicitude da competência.

A ilicitude da competência são casos em que o órgão tem pleno conhecimento que não
tem competência, mas ainda assim pratica o ato deliberadamente, isto pode ser relevante
em sede de responsabilidade civil, especificamente pessoal do titular do órgão.
Quanto ao erro este pode ser desculpável devido a haver múltiplas normas sobre essa
matéria e por vezes até contraditórias. O erro é indesculpável quando alguém agiu uma e
várias vezes e os tribunais resolveram anular os atos tendo como fundamento a
incompetência do órgão para praticar tal ato: a partir de sentença deste género não pode
o titular vir invocar que o erro era desculpável.

A incompetência pode ser positiva ou negativa: há incompetência positiva quando decido


sobre uma matéria relativamente à qual não sou competente e há incompetência negativa
quando sou competente para decidir, mas não decidi quando deveria ter decidido.

A regras do CPA

CPA: 36º Define que a competência é irrenunciável e inalienável

CPA: 37º Dispõe quando deve ser fixada a competência no âmbito do procedimento
Devendo esta ser fixada no momento do início do procedimento
Regra Geral: irrelevantes alterações que ocorra durante o procedimento
Exceções: caso a competência se extinga ou caso o órgão se venha a tornar competente

CPA: 40º Aborda o controlo da competência.


O órgão incompetente tem sempre competência para anular o ato que praticou.
Exemplo: se o órgão A decide sob algo da competência do órgão B da mesma entidade
publica o ato é ferido de incompetência relativa, contudo tem competência para repor a
legalidade, para anular o ato que praticou, o fundamento disto é o autocontrolo da
legalidade por parte dos órgãos da Administração.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 43


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Tal atuação comporta, contudo, limites:


Se as dúvidas sobre a competência resultam de uma eventual invalidade da norma legal
habilitante, o órgão administrativo não possui normalmente competência para desaplicar
a lei- assim tem que a aplicar, considerando-se competente relativamente à questão que
lhe é suscitada;
No âmbito do relacionamento hierárquico, nenhum órgão subalterno pode recusar a
execução de um comando proveniente do seu superior em matéria de serviço, desde que
dentro do escopo das atribuições da pessoa coletiva em que se encontra inserido;
Em casos de delegação de poderes, o delegado não pode recusar o exercício da
competência com o argumento da indelegabilidade dos poderes em causa ou na
incompetência do delegante para emitir o ato de delegação;
Qualquer decisão de um órgão administrativo sobre a sua própria competência pode
sempre ser sujeita a controlo judicial.

Caso o órgão reconheça ser incompetente, independentemente de estar em causa uma


pretensão formulada por um interessado, CPA: 41º/1 formula um princípio geral: o órgão
incompetente está vinculado a enviar, oficiosamente, a documentação ao órgão que
entende ser competente e, se for o caso, notificar o particular dessa situação2.

CPA: 51º e 52º Tratam dos conflitos de competência.

Em situações de conflito de atribuições de competência, podendo a resolução ser


suscitada oficiosamente ou por parte dos interessados no procedimento,o CPA define que:

• A resolução dos conflitos de atribuições e competência encontra-se sujeita a


intervenção judicial;
• Integra a reserva decisória dos tribunais administrativos, a resolução de conflitos
entre órgãos de diferentes pessoas coletivas (desde que não se encontrem sujeitas
a superintendência) ou entre órgãos de autoridades administrativas independentes
CPA: 51º/1 a)
• São resolvidos pelo governo os conflitos de atribuições que envolvam pessoas
coletivas sujeitas a superintendência do Estado CPA: 51º/1 c) ou das regiões
autónomas CPA: 51º/1 e), assim como os conflitos entre órgãos de diferentes
ministérios CPA: 51º/1 b) ou, ao nível das regiões autónomas, entre diferentes
secretarias regionais CPA: 51º/1 d)
• Se o conflito de competência suceder entre órgãos hierarquizados da mesma
entidade pública, deverá a resolução ser feita pelo órgão de menor categoria
hierárquica que supervisione os órgãos conflituantes CPA: 51º/2

2
Podem existir, contudo, casos em que não é exigível que o órgão incompetente saiba quem é o órgão
competente ou a pessoa coletiva competente (caso o órgão competente pertença a outra pessoa coletiva) e
em que a documentação deve ser apenas devolvida ao interessado que iniciou o procedimento (ex. Não é
exigível, do ponto de vista do princípio da proporcionalidade, que um procedimento iniciado perante uma
Câmara Municipal seja competência de uma entidade administrativa independente (como seja a
ANACOM) e que o responsável de tal órgão tenha que remeter para tais entidades).

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 44


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Princípio da legalidade da competência

Toda a competência resulta de uma norma jurídica, em regra, com a CPA: 36º/1 força
jurídica de lei, devido ao princípio da legalidade, contudo também pode surgir
competência por via de regulamento.

A competência pode ainda ter normas constitucionais, normas da União Europeia e


normas consuetudinárias ou princípios gerias de Direito como habilitação do seu agir
administrativo.

O facto de a competência administrativa nem sempre envolver a definição de posições


jurídicas relacionadas com os particulares, leva ao afrouxamento da exigência liberal de
reserva de lei na definição das normas de competência; além disso, num modelo de Estado
social, nem sempre a atuação administrativa comporta propósitos ou efeitos ablativos da
liberdade e da propriedade privada.

o Irrenunciabilidade e Inalienabilidade da competência


CPA: 36º/1 A ideia de que a competência não corresponde a um direito subjetivo do seu
titular demanda a sua inerente irrenunciabilidade e inalienabilidade.

A competência traduz uma posição jurídica que, conferida por lei, tem o seu exercício
sempre vinculado exclusivamente a razões de interesse público.

A irrenunciabilidade e a inalienabilidade são mecanismos garantísticos do princípio da


legalidade da competência e do modelo de distribuição legal dos poderes administrativos
traçado pelo legislador, impedindo que esse modelo seja alterado por simples vontade dos
órgãos da Administração Pública.
Compreende-se, dentro desta lógica de preservação da ordem normativa definidora da
titularidade e do exercício da competência pelo legislador, que a lei CPA: 36º/2 sancione
com a nulidade todo o ato ou contrato que vise alterar ou subverter tal definição legal.

A irrenunciabilidade da competência não impede, todavia, que tendo um órgão o poder


discricionário de exercer ou não determinada competência, resolva não a exercer: tal não-
exercício da competência traduz antes uma forma de exercício legal da competência.

Princípio da flexibilização das regras da competência

Apesar dos princípios da irrenunciabilidade e inalienabilidade a lei pode criar


mecanismos que tornem moldável, flexível as normas definidoras de atribuições, tendo
em vista modernizar a Administração e adaptara mesma as necessidades da realidade.
Que mecanismos usa o legislador?

• Princípio da subsidiariedade
Tudo aquilo que a esfera decisória mais pequena possa decidir, não deve ser feito pela
esfera decisória de nível superior, contudo aquilo que não puder ser feito pela entidade
de âmbito mais restrito pode ser feito pela entidade de âmbito mais amplo.
Exemplo: relações de definição de competência entre a união europeia e os Estado
membros; CRP: 6º relação entre estado e entidades públicas

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 45


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• Princípio da supletividade do Direito do Estado


O Estado pode intervir sobre a esfera de competência das entidades menores com normas
que podem, todavia ser afastada pela vontade das entidades públicas menores.
Estado age, por exemplo, quando há inércia de tais entidades, entregar lacunas e tem
como base legal CRP: 228º

• Prevalência do Direito do Estado


Existem matéria de tal maneira importantes que o Estado pode, através do seu poder,
impor as soluções a adotar
Exemplo: as leis de bases são vinculativas para todos os entes públicos, aquelas dotadas
de autonomia administrativa e autonomia político-legislativa).

o Excecionalidade da existência de um só órgão competente

A flexibilidade das regras de competência também se afere ao nível da distribuição da


competência e aqui entra o segundo princípio.

Não existe órgão exclusivamente competente, em regra existem vários órgãos que podem
decidir, sendo excecional a existência de um único órgão competente.

Podemos verificar mobilidade das regras de distribuição do exercício da competência ou


de concorrência em algumas regras do Código do Procedimento Administrativo:
• Delegação de poderes CPA: 44º a 50º
• Substituição de órgãos CPA: 43º
• Competência sobre questões prejudiciais CPA: 38º
• Conferências procedimentais CPA: 77º a 81º
• Suplência CPA: 42º
• Competência anulatória entre superior hierárquico e subalterno CPA: 169º/3
• Cláusula de nulidade dos atos autoridade CPA: 162º/2

o Risco de colisão de exercício da mesma competência por diferentes órgãos

Se há vários órgãos com competência sobre a mesma matéria, não haverá o risco de
conflito decisório? Não há por várias razões:

Existem formas de competência de exercício sucessivo ou subsidiário: um só pode


exercer quando o outro não tem condições para poder exercer.

Efeito preclusivo significa que quando um decide o outro órgão competente não pode já
decidir. Caso decida podem surgir um de dois efeitos:
§ Destrói por revogação a anterior decisão de forma competente
§ Destrói a anterior decisão em termos inválidos porque não é competente
Exemplo: caso o delegado decida, pode sempre o delegante vir revogar a decisão daquele,
em termos completamente legais; já o contrário não se verifica: se o delegado vier revogar
uma decisão do delegante, tal ato estará ferido de incompetência pois o delegado deixou
de ter competência na matéria quando o delegante decidiu.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 46


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Competência e habilitação de intervenção do titular do órgão

A propósito da competência surgem ainda questões relativamente a títulos de habilitação


específica dos titulares de órgãos, que tipo de habilitação é essa?

O titular do órgão tem que ter um título de investidura, não basta ter a competência à que
ter um título que o habilite a ter esses poderes, esse título pode surgir através de um ato
de nomeação ou de um contrato de exercício de funções públicas.

Antes de ter investidura, os atos do titular ficam feridos por incompetência ratione
temporis. Caso a investidura venha a extinguir-se os atos são praticados numa situação
de acompetência ou de incompetência ratione temporis.

Pode suceder que, desde o início, se verifique o exercício de funções administrativas por
quem não tem título, havendo possibilidade de gerar a invalidade do agir administrativo,
surgindo em diversas situações jurídicas:

Pode tratar-se de um exercício consciente e doloso sem qualquer título habilitante,


hipótese que se reconduz ao crime de usurpação de funções (358º Código Penal).

Poderá, num cenário de estado de necessidade, justificar que alguém, sem título e em
termos transitórios, possa adotar certas providências, justificas à luz do princípio da
necessidade, caso em que estaremos diante de um “funcionário de facto”.

Poderá ainda existir o exercício de funções por parte de um titular que, apesar de gozar
da aparência de possuir um título válido, vê depois anulado ou declarado nulo esse título
ou ainda declarada a invalidade da norma legal que o fundamentava- em termo de pura
lógica, haverá aqui, relativamente à atuação desse superveniente “funcionário de facto”,
um caso de acompetência.

Poderá ainda, por último, a invalidade do título, por efeito do decurso do tempo,
consolidar-se na ordem jurídica, se o mesmo for anulável, ou, em casos de nulidade,
verificando-se a existência de boa-fé, gerar uma situação de prescrição aquisitiva ou
“usucapião” habilitante do exercício de poderes.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 47


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VONTADE

Formação e declaração da vontade nos órgãos administrativos

Ao invés das pessoas singulares que têm uma vontade natural, as pessoas coletivas têm
uma vontade expressa através dos seus órgãos. Há aqui uma dupla ficção:
• A expressão da vontade através dos órgãos;
• Os órgãos só podem manifestar vontade através dos seus titulares, que acabam
por ser pessoas singulares

A vontade é importante porque toda a Administração é composta por entidades coletivas


e porque toda a vontade aponta para uma intenção subjacente à conduta. No fundo, a
vontade torna presente o elemento psíquico, preparatório da decisão, contudo só tem
importância a vontade que é exteriorizada: a declaração é aqui de suma importância.

É o procedimento administrativo onde se prepara e executa a vontade da Administração.

Quais os requisitos de formação da vontade?


• Perfeição da formação da vontade passa pela liberdade de decidir e pela tomada
de uma decisão esclarecida, informada;
• A exteriorização da vontade: convergência entre a vontade real e a vontade
declarada. A motivação principalmente determinante da vontade deve ser
conforme a legalidade, pois pode levar a desvio de poder

A vontade é importante por três ordens de razões:


1. Saber se é livre e esclarecida;
2. Aferir a licitude dos motivos que levam à formação e subsequente da declaração;
3. Estudar a convergência entre a vontade real e a vontade declarada.

A vontade é muito mais relevante nas áreas de discricionariedade do que nas áreas de
vinculação: nestas a vontade da Administração é a do legislador, enquanto naquelas a
vontade é, verdadeiramente, a da Administração.

No âmbito dos poderes vinculados a vontade é dirigida pela lei, mas mesmo assim a
vontade é relevante porque, mesmo nestes casos, a coação física ou a violência sobre o
titular do órgão gera nulidade do ato praticado CPA: 161º/2 f)

Nem toda a vontade administrativa tem igual peso, pois à vontade administrativa que são
prevalecentes.
Exemplo: a vontade do delegante relativamente à do delegante

A vontade psicológica do titular do órgão tem importância, uma vez que a falta absoluta
de vontade determina a inexistência jurídica, segundo Paulo Otero, embora a lei disponha
que os atos praticados sob coação física ou violência são nulos, tais atos podem ser
reconduzidos à inexistência jurídica. Também tem relevância no caso da falta de intenção,
como por exemplo, declarações não-sérias.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 48


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A existência de um imperativo constitucional de fundamentação expressas das decisões


administrativas lesivas de posições jurídicas subjetivas mostra um claro indício da
relevância que a formação da vontade psicológica do decisor administrativo assume no
ordenamento jurídico:
Traduzindo a fundamentação um instrumento destinado a revelar o processo
psicológico da formação e expressão da vontade psicológica do autor da conduta
administrativa, o tratamento dogmático da vontade do decisor administrativo ganha uma
dimensão constitucional;
Compreende-se, neste sentido, que a jurisprudência diga que a falta de
fundamentação, traduzindo a ausência de enunciação dos pressupostos concretos da
formação da vontade administrativa, impeça que se aprecie essa vontade se formou de
acordo com o processo mental do autor do ato;
A fundamentação traduz um meio de seguir o processo psicológico do decisor
administrativa.

o A formação da vontade dos órgãos colegiais

A vontade dos órgãos colegiais é apurada nos termos do CPA: 21 a 35º

Preocupação central concerne à constituição do próprio órgão, exigindo a lei um número


mínimo de membros, correspondendo à noção de quórum, sem o qual não existe a
formação.
Esse quórum corresponde, por via de regra, à presença da maioria do número legal
dos seus membros com direito de vida CPA: 29º/1 não obstante, se em duas reuniões
consecutivas não for alcançado esse número, o quórum pode ser reduzido até um terço
dos seus membros com direito a voto CPA: 29º/3.
A ausência de quórum determina a nulidade das deliberações tomadas CPA:
161º/2 h), podendo discutir-se se não estando validamente constituído o órgão, a falta do
quórum não deveria determinar a inexistência da deliberação.

Uma segunda preocupação, após reunido o quórum necessário, prende-se com a maioria
necessária para a tomada de decisão que irá formular a vontade.
CC: 32º/1 A regra geral é a da maioria absoluta, existindo exceções estipuladas.

Existem ainda preocupações quanto às condições de perfeição do seu funcionamento:


Preocupações legais relativas ao momento anterior ao funcionamento do órgão
colegial, sem prejuízo de flexibilidade quanto à observância das soluções da lei
Exemplo: regras relativas à fixação do local, horas, termos de convocatória, ordem do dia
Preocupações respeitantes ao momento concreto de funcionamento do órgão
colegial, exigindo-se que a reunião decorra sempre de forma ordenada e pacífica, sob
pena de a sua tumultuosidade gerar a nulidade da vontade deliberativa CPA: 161º/2 h)
Preocupações face ao momento posterior à formação da vontade deliberativa,
exigindo-se que a mesma seja exarada em ata CPA: 34º, enquanto exigência de eficácia
das respetivas deliberações CPA: 34º/6

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 49


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O papel da vontade psicológica do titular do órgão

Em toda a atividade administrativa, vinculada ou discricionária, a falta absoluta de


vontade de ação do titular do órgão decisório torna qualquer “decisão” inexistente, bem
como as situações de ausência absoluta de exteriorização de uma vontade se reconduz à
inexistência: ao invés da nulidade o Prof. Paulo Otero defende que só a inexistência traduz
corretamente a figura em questão.

A falta de intenção ou de consciência da declaração gerando uma exteriorização


voluntária sem que o seu autor queira ou tenha a intenção de fazer o que a declaração
aparenta se reconduz a um exercício de poderes administrativos vinculados ou
discricionários que “não produz qualquer efeito”.

Em situações de incapacidade acidental do titular do órgão administrativo, afetando


pontualmente a respetiva capacidade intelectual de discernimento ou entendimento,
haverá também um caso de falta de vontade na declaração; deste modo deve entender-se
que, contrariamente ao regime algo benéfico da mera anulabilidade disposto no CC: 257º,
a atuação administrativa está ferida de inexistência jurídica.

Também as declarações não sérias se devem reconduzir à inexistência jurídica, sem


prejuízo de, na medida em que a sua aparência induzir o seu destinatário a nela confiar,
haver possibilidade de responsabilidade civil.

Como é já sabido, independentemente da vontade psicológica do titular de um órgão


administrativo, sem que haja a respetiva declaração de vontade, enquanto elemento que
lhe dá materialidade no mundo real, nada se passa.

O processo da formação da vontade e da sua declaração pode ser sintetizado da seguinte


forma:
1. Os requisitos de validade podem dizer respeito à perfeição da formação da
vontade, incluindo às motivações geradoras da vontade, e à perfeição da
exteriorização da vontade;
2. Se o processo de formação da vontade sofre algum desvio, por efeito da
intervenção da intervenção de fatores que o afastam da normalidade, a vontade
administrativa encontrar-se-á viciada;
3. Uma vontade viciada mostra-se passível de, principalmente em zonas decisórias
dotadas de margem de autonomia administrativa, ser fonte geradora de efeitos
administrativos inválidos.

O erro na formação da vontade

Podem existir vícios na formação da vontade (coação moral, erro simples ou erro por
dolo) ou vícios na exteriorização da vontade (divergência intencional entre a vontade
declarada e a vontade exteriorizada ou divergência não intencional).

O erro na formação da vontade do decisor administrativo, conquanto configura como um


vício por ignorância ou falsa representação da realidade, acaba por traduzir uma

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 50


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manifestação da relevância do motivo subjacente à formação da vontade: há aqui uma


motivação anómala ou desviada.

A relevância jurídica do erro depende sempre da verificação de um requisito de


causalidade ou essencialidade:
• A ignorância ou a falsa representação da realidade tem de servir de condição ou
causa efetiva de formação da vontade do declarante;
• O erro tem de recair sobre os motivos que foram determinantes para os termos em
que se formou a vontade, razão pelo qual o erro sobre os motivos não
determinantes da vontade é irrelevante.

O erro pode ser sobre as circunstâncias de facto ou um erro de direito


Exemplo: Julgo que a norma me atribui competência, mas na verdade a norma não o faz

Pode ser simples ou qualificado de dolo: quando há intencionalidade própria ou induzida


por terceiro.

Podemos ainda encontrar outras tipologias de erro, quanto ao objeto em que incide:

Erro sobre a competência: abrange o erro sobre a existência e o sentido de norma


habilitante de competência, assim como do ato de delegação de poderes e dos poderes
delegados ou substitutivos e ainda o erro sobre a natureza vinculada ou discricionária dos
poderes a exercer;

Erro sobre o objeto: aqui temos presente o erro sobre a identidade do objeto, as
suas qualidades e características, bem como o erro sobre a configuração do conteúdo
decisório do ato tomado;

Erro sobre o destinatário: abarca o erro sobre a identidade, bem como sobre as
suas características e qualidades;

Erro sobre os pressupostos: inclui o erro sobre as circunstâncias ou base factual


do exercício dos poderes, assim como sobre os motivos determinantes da vontade.
Também se inscrevem aqui as figuras do “erro sobre a base do negócio” e o erro sobre os
pressupostos de direito;

Erro sobre a causa: nomeadamente, os casos de erro relativo aos pressupostos de


facto escolhidos para alicerçar uma decisão administrativa, num cenário de “divergência
entre a fundamentação e a realidade”;

Erro sobre o fim: compreende o erro sobre as atribuições a cargo da entidade


pública em que o órgão se encontra inserido, bem como o erro sobre o fum em concreto
associado ao exercício da competência em questão;

Erro sobre a forma e/ou formalidades: integra o erro sobre as exigências de


natureza procedimental, o erro sobre o sentido interpretativo dos atos que as definem e
ainda o erro sobre o seu já efetivo cumprimento.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 51


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O CPA é omisso quanto ao regime a aplicar ao erro: teremos então que aplicar o código
civil, mas com duas particularidades:
• Quanto ao Código dos Contratos Públicos, este remete para o CC a título
subsidiário.
• Mas o CPA permite extrair do CPA: 168º que o erro gera anulabilidade da
conduta.

O CPA: 168º/1 embora disponha que o erro é fonte de invalidade não toma posição
relativamente a saber se o mesmo se reconduz aos vícios da vontade ou se, diversamente,
constitui uma situação integrável no vício (residual) da violação de lei.
Para Paulo Otero a primeira solução, autonomizando os vícios da vontade como categoria
própria da invalidade administrativa é preferível.

Divergências entre a vontade real e a vontade declarada

Quando há divergência entre a vontade real e a vontade declarada, o princípio geral é o


da prevalência da vontade declarada, isto porque há que tutelar a confiança dos
destinatários das decisões jurídico administrativas.
Contudo, existem exceções, caso em que não prevalece a vontade declarada: se o
destinatário conhece a divergência não pode prevalecer-se da tutela da confiança; ou se
ele próprio induziu ou provocou a divergência.

A divergência pode ser intencional:


• Unilateral: reserva mental (aqui fala-se muitas vezes não em invalidade, mas sim
em responsabilidade civil)
• Bilateral: simulação (o ato simulado é nulo nos termos dos princípios gerais)

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 52


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CAUSA

Noção de causa

A causa é um termo, uma realidade controvertida.


Paulo Otero diria que a causa envolve uma relação entre uma conduta administrativa e
duas realidades anteriores à conduta administrativa: uma objetiva (razões de facto ou de
direito que funcionam como pressuposto objetivo da decisão administrativa) e uma
subjetiva (razões que determinam o sentido da vontade psicológica, o querer do titular do
órgão, as motivações da decisão).

A causa estabelece, por isso mesmo, uma relação entre os motivos e pressupostos da
conduta administrativa, o que levanta uma panóplia de interrogações:
Será que essa relação é adequada?
Será que são idóneos os pressupostos objetivos e subjetivos que alicerçaram tal conduta?
Qual foi o querer do decisor?
Como se relacionam os motivos da conduta com o fim da competência?

Em Direito Administrativo, a causa relaciona os “motivos-pressupostos” com uma


específica atuação administrativa, pois condicionam e determinam uma conduta concreta
da Administração Pública e ainda funcionam como origem justificativa, parametrizador
e legitimadora do agir administrativo.

No âmbito do agir administrativo, há ainda que assinalar a grande diferença entre os


pressupostos objetivos e os pressupostos subjetivos subjacente à causa.
Os pressupostos objetivos, apesar de subjetiváveis pela representação psíquica que deles
faz o decisor são sempre passíveis de controlo face à sua objetividade de partida;
Os pressupostos subjetivos, reconduzindo-se aos motivos do agir administrativo, apenas
se mostram controláveis face aos fins legais fixados para o exercício dos poderes em
causa.

o Delimitação conceitual

A causa não se reconduz, de forma exclusiva, a um nexo de adequação entre os


pressupostos e o objeto da atuação administrativa.

A causa envolve também um juízo sobre a existência, validade e idoneidade dos


pressupostos objetivos (situação de facto e de direito) e subjetivos (as motivações) do
conteúdo de uma determinada conduta- neste último domínio, a causa abrange os termos
da vinculação teleológica da atuação administrativa.
Antes de se proceder a um juízo de adequação (a posteriori) a causa impõe uma avaliação
jurídica dos pressupostos.
A causa não compreende as situações de falsa representação dos pressupostos objetivos
pelo decisor administrativo, assumindo-se como uma realidade jurídica diferente da
vontade.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 53


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A causa limita-se exigir e habilitar que os pressupostos objetivos e subjetivos de uma


determinada conduta administrativa existam, sejam válidos ou idóneos, por um lado, e
existindo que se assumam como parâmetros de conformidade da conduta específica;
Uma vez que a motivação do titular do órgão administrativo assume relevância no âmbito
da causa, pode dizer-se que a causa proporciona uma análise do momento psicológico do
decisor que vai para além das exigências de formação de uma vontade livre e esclarecida
e da necessidade de convergência entre a vontade real e a vontade declarada.

Ao nível dos pressupostos subjetivos do agir administrativo, a causa mostra-se passível


de compreender um juízo de conformidade ou adequação entre os motivos da conduta
administrativa e o fim que norteia o exercício da respetiva competência:
• A conduta administrativa, obrigatoriamente vinculada à prossecução do interesse
público definido pela lei para a ação em questão, traduz um imperativo a ter em
conta na validade da motivação do decisor: a ordem jurídica impõe, sob pena de
desvio de poder, que o motivo principalmente determinante da conduta coincida
com o fim legal para o exercício desse mesmo poder;
• Tal exigência de conformidade transforma o fim legal em critério de conformação
ou parametrização da intenção motivadora do agir administrativo: uma motivação
contrária ao fim legal inquina o pressuposto subjetivo da conduta administrativa,
atingindo a causa dessa mesmo conduta;
• O desvio de poder, espelhando uma disfunção do motivo principalmente
determinante da conduta administrativa, consubstancia uma questão de causa-
esta assume aqui um carácter teleológico;

No entanto, a análise da intenção do decisor pode ter operatividade além do motivo


principalmente determinante da ação, envolvendo a prossecução de finalidades que não
se circunscrevem ao fim que a lei teve em vista quando atribuiu a competência.

A causa mostra-se passível de gerar dois tipos de vicissitudes: divergência entre os


pressupostos fixados na lei e os pressupostos que existem na situação factual concreta e
divergência entre os pressupostos que são motivos do decisor e a sua intenção real.

A causa é relevante no âmbito do Direito Administrativo, uma vez que na base da conduta
administrativa está o princípio da exigência de coerência racional do agir administrativo:

Há uma exigência racional ou lógica do modo de agir que tem de pautar a ação da
Administração: uma disfunção entre os pressupostos-motivos e a conduta administrativa
determina a invalidade das decisões administrativas;

A própria Constituição impõe tal realidade a propósito do procedimento administrativo,


falando em “racionalização dos meios” CRP: 267º/5: a causa é o elemento do agir
administrativo que envolve a exigência de racionalidade no procedimento decisório.

O CPA ao impor a existência de uma justificação para os projetos de regulamento CPA:


99º, o modo como determina o dever de fundamentação, com a indicação dos
pressupostos de facto e de direito CPA: 153º/1 e determinando a proibição de contradição
entre razões fundamentadoras CPA: 153º/2, indiciam a importância dos pressupostos-
motivos do agir administrativo, à luz de regras lógicas de atuação procedimental.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 54


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Pressupostos objetivos da decisão

Os pressupostos objetivos sendo identificados por uma norma jurídica ou elencado pelo
decisor, consubstanciam a individualização da sua formulação abstrata perante um caso
concreto, servindo sempre de causa da conduta administrativa. Estes podem ser
pressupostos de direito ou pressupostos de facto, sendo que a sua qualificação é sempre
uma questão jurídica de interpretação- encontra-se assim excluída do âmbito da
discricionariedade.

o Pressupostos de direito

Os pressupostos de direito surgem identificados em normas ou demais atos jurídicos,


habilitando determinada conduta administrativa. Exercem uma função propulsora,
justificativa ou legitimadora do agir, servindo de sua base legal. A sua operatividade faz-
se sempre, todavia, tendo como referência uma determinada realidade factual.

§ Pressupostos de direito precisos


Exemplo: só se pode candidatar à universidade quem tem 18 anos; ter doutoramento há
mais de 5 anos para concorrer ao cargo de professor associado da faculdade

§ Pressupostos de direito assentes em conceitos indeterminados


Exemplo: urgência ou necessidade; ser uma personalidade de reconhecido mérito

§ Pressupostos de direito baseados em regras ou em princípios.

Os pressupostos de direito obedecem a requisitos de validade e de eficácia:

Têm de corresponder a situações alicerçadas num título jurídico que sirva de base legal:
caso não exista esse título, o princípio geral é a ausência de habilitação para a
Administração agir;

Se o título jurídico existir, não poderá estar ferido de invalidade que permita à
Administração proceder à sua desaplicação: se tal suceder, quer em termos materiais
como formais, não existe base legal habilitante;

Se o título existe e não padece de invalidade radical habilitadora da sua desaplicação


administrativa, é ainda necessário que já esteja em vigor ou ainda tenha vigência;

A ausência de base legal, a sua invalidade radical, ineficácia ou erro sobre a sua existência
determinam a invalidade da atuação administrativa.

A aplicação dos pressupostos de direito habilitantes do agir administrativo exige a


exatidão da base legal, ou seja:
A Administração deverá fundar o seu agir no exato título que lhe permite adotar a conduta
em causa: a determinação da base legal aplicável exige uma prévia operação de análise
da realidade factual em questão. A exatidão da base legal afere-se também em termos de
correção interpretativa e ponderativa e ainda de adequação aplicativa por parte da
Administração- fala-se em “justa aplicação da base legal pertinente”.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 55


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A inexatidão interpretativa, ponderativa ou aplicativa da base legal gera invalidade do


agir administrativo.

Em casos limite, a disfunção interpretativa, ponderativa ou aplicativa de uma base legal


clara e inequívoca, usando a Administração um fundamento do seu agir totalmente alheio
à letra da lei, haverá violação da proibição do arbítrio.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo entende, à luz do princípio do


aproveitamentos do atos, numa solução acolhido pelo CPA: 163º:
Em caso de erro sobre os pressupostos de direito usados pela Administração,
envolvendo a aplicação de um preceito já revogado, o juiz pode, desde que nova norma
vigente tenha exatamente o mesmo conteúdo, não proceder à anulação do ato, pois a
decisão a adotar teria o mesmo conteúdo;
Em sentido semelhante, admitindo o aproveitamento de atos vinculados feridos de
erro de direito, tornando irrelevante esse erro, se inclina também a jurisprudência.

o Pressupostos de facto

Por outro lado, os pressupostos objetivos de facto são realidades que existem no domínio
da realidade social e que são “capturados” pelo decisor e tomados como fundamento do
agir administrativo.
§ Podem ser factos passados ou presentes;
§ Podem ser previsões futuras de uma determinada realidade- é o que se
chama de um juízo de prognose
Exemplo: a idoneidade de algo ser um bom tema para tese de doutoramento);

Nem sempre os pressupostos de facto são determinados pela lei: nesses casos é a própria
Administração que é chamada, pela lei, ao abrigo da discricionariedade a definir esses
pressupostos de facto. Contudo, pode haver uma disfunção entre os pressupostos de facto
escolhidos e a conduta da Administração e nestes casos haverá invalidade da decisão,
uma vez que não existe coerência: daqui se retira que os factos têm que existir, ser exatos
e adequados quanto à decisão tomada.

Há contudo, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender


que, numa aplicação do princípio do aproveitamento dos atos, que o erro sobre os
pressupostos de facto nem sempre conduzirá à invalidação se erro diz apenas respeito a
alguns dos pressupostos e desde que os restantes sejam suficientes para justificar o
conteúdo decisório. Se, porém, colocado perante os pressupostos corretos, o decisor
tivesse decidido efetuar uma outra ponderação de interesses e, consequentemente,
decidido de forma diversa, o erro nos pressupostos de facto conduz à invalidade.

No âmbito dos pressupostos de facto, há ainda relevância da figura que conhecemos da


Teoria Geral do Direito Civil: a “base do negócio”- a circunstância da sua evolução
anormal ser passível de tutela por parte da figura da alteração das circunstâncias.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 56


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Pressupostos subjetivos

Nos pressupostos subjetivos estamos perante as razões que justificam a conduta decisória:
o que se visa aqui apurar é o que levou aquele decisor a tomar aquela decisão? O que o
conduziu a tomar tal decisão, o que está na base da formação da vontade?
É muito difícil saber quais as reais motivações, seja em Direito Administrativo, como em
qualquer outro ramo jurídico, como em Direito Penal.

As motivações subjetivas do agir podem ser:


• Critérios de motivação conformes à lei;
• Critérios alheios aos fins da competência em concreto
Exemplo: polícia que multa carro mal-estacionado, não com o intuito de sancionar o
desrespeito das regras de trânsito, mas sim para arrecadar dinheiro para o Tesouro do
Estado, para aumentar as receitas públicas.
• Critérios de motivação teleológicos concorrentes
Exemplo: quis ao mesmo tempo sancionar a violação das regras do Código da Estrada e
aumentar o montante da Tesouraria do Estado

Dentro destas qual é a que é principalmente determinante para a prática do ato? Só perante
esta é que se percebe se há ou não desvio de poder. Levando a uma situação de desvio de
poder pois o motivo da decisão não corresponde ao fim par que a lei atribui aquela
competência

o Motivações não reconduzíveis ao desvio de poder

As motivações, contudo, nem sempre se reconduzem ao desvio de poder: só se reconduz


ao desvio de poder aquela que é principalmente determinante e que vai contra o fim para
o qual a lei atribui tal competência.

E quando a motivação não é principalmente determinante? Quando o órgão que decidiu


é incompetente? O que sucede perante situações de motivações dolosas e negligentes?
Tem apenas relevância em sede de responsabilidade civil e disciplinar, ou pode também
inquinar a validade da decisão administrativa, mesmo que não se reconduza a situação de
desvio de poder? Há ou não, em Direito Administrativo, uma graduação da culpa?

A culpa em Direito Administrativo, tal como sucede em Direito Penal e em Direito Civil,
é um conceito que envolve elementos de base psicológica, traduzidos no dolo ou na
negligência que envolve a conduta de um decisor administrativo, compreendendo
também um juízo de censurabilidade ou reprovabilidade pessoal- sempre do ponto de
vista normativo

A motivação do decisor pode conduzir a uma graduação da culpabilidade, bem como à


sua exclusão, a censurabilidade da ilicitude da conduta revela vários graus de culpa:
• Pode suceder que o decisor tenha perfeito conhecimento ou consciência da
ilicitude, prevendo-a (momento intelectual) e querendo a sua realização
(momento volitivo), caso em que há dolo;

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 57


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• Pode, diversamente, o decisor limitar-se a violar um dever objetivo de cuidado,


criando com a leviandade ou imprudência da sua conduta riscos inadmissíveis de
ilicitude.

O dolo do decisor administrativo conhece diferentes tipos de intensidade:


Pode tratar-se de um dolo direto (ou de primeiro grau): o decisor tem como fim imediato
da sua conduta a realização do ilícito;
Pode existir um dolo necessário (ou de segundo grau): apesar de a realização do ilícito
não ser o propósito imediato, o decisor aceita-o como inevitabilidade da sua conduta;
Poderá ainda haver um dolo eventual: caso em que o decisor, representando o resultado
ilícito como um possível efeito da sua conduta, se conforma com a sua eventual
ocorrência.

Também a negligência traduz realidades diversificadas:


A negligência pode ser consciente ou inconsciente, consoante o decisor represente (ou
não) a possibilidade de ocorrência do ilícito, confinado por descuido que tal não sucederá,
pois se tivesse essa certeza não teria agido;
No âmbito da negligência pode ainda distinguir-se as situações de culpa grave (omissão
inadmissível ou flagrante de uma conduta que seria normalmente adotada pela
generalidade dos agentes), culpa leve (omissão de uma conduta própria ou normalmente
exigível aos agentes) e culpa levíssima (omissão de uma conduta que só seria exigível a
agentes extremamente escrupulosos ou prudentes).

Isto não só tem efeitos de responsabilidade civil da administração, uma vez que a ilicitude
dolosa da causa inquina a validade da conduta e é fonte de responsabilidade criminal do
autor.

o Motivações reconduzíveis ao desvio de poder

O desvio de poder apenas se refere à motivação principalmente determinante do agir


administrativo: se o decisor tem como motivação acessória a satisfação de um propósito
alheio ao fim legal subjacente ao exercício da competência em causa, desde que o motivo
principalmente determinante seja conforme ao fim legal, não há desvio de poder.

A invalidade do agir por desvio de poder não se circunscreve a uma motivação


principalmente determinante da expressão de uma vontade material distinta da finalidade
do concreto poder decisório definido por lei (desvio de poder substantivo): o desvio de
poder pode também dizer respeito a uma desconformidade ou inadequação teleológica
entre o procedimento adotado e aquele que deveria ter sido usado, tendo em conta o
propósito decisório visado- falamos aqui em desvio de poder procedimental.

Nas situações reconduzidas ao desvio de poder, podemos encontrar dois tipos:


• Desvio de poder para fins de interesse público
Exemplo: o polícia que multa o carro mal estacionado para arrecadar dinheiro para a
Tesouraria do Estado
• Desvio de poder para fins de interesse privado

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 58


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Exemplo: é concedida uma licença de construção porque, na base da atribuição de tal


licença, o motivo principalmente determinante é exigir ao empreiteiro a quem é concedida
a licença de construção uma posterior construção de uma piscina na casa do decisor
Independentemente da responsabilidade civil, CPA: 161º/2 e) estamos perante um caso
de nulidade

Sempre que o desvio de poder incidir sobre aspetos vinculados da decisão administrativa
mostra-se ambíguo que se deva entender não constituir causa de invalidade ou tornar
irrelevante essa invalidade:
Se é certo que o art.º 163º/5 al. a) e c) do CPA habilita tal solução deve entender-se que
a mesma apenas se mostra operativa para os casos em que o desvio de poder gera
anulabilidade da decisão (desvio de poder para fins de interesse público);
Assim, sempre que o desvio de poder se consubstanciar na prossecução de fins de
interesse privado, uma vez que está em causa uma situação geradora da sua nulidade (art.º
161º/2 al. e)), o desvio de poder será sempre fonte de invalidade operativa.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 59


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OBJETO

Caracterização

Todo o agir da Administração tem que ter um objeto. Tal objeto pode ser visto como
jurídico: entendido como imediato ou conteúdo da atuação, com os efeitos do agir; ou,
em alternativa, como mediato: é a realidade sobre a qual incidem esses mesmos efeitos.

O objeto jurídico pode ter efeitos de natureza constitutiva: são alterações, inovações
introduzidas na ordem jurídica ou de natureza declarativa: limita-se, no fundo a certificar
uma situação já existente, independentemente da intervenção administrativa.

No que respeita ao objeto mediato a ação administrativa pode incidir, em termos


separados ou conjuntos, sobre coisas, prestações ou pessoas.

O objeto poder ter zonas vinculadas e zonas discricionárias. Nestas podemos estar perante
diversas configurações do objeto do agir administrativo:
• Decidir, se for o caso de existir permissão para o efeito, entre agir e não agir;
• Em caso de agir, escolher a forma de atuação administrativa e adotar, se a lei não
impuser uma forma obrigatória de agir;
• Selecionar o direito regulador da forma de atividade escolhida, sem prejuízo do
respeito pelas determinações imperativas na matéria;
• Estipulação do conteúdo concreto da forma jurídica de atuação dentro dos limites
legais.

Nas zonas de discricionariedade é possível que, através da estipulação do conteúdo


concreto da atuação, de acordo com os limites legais, o decisor administrativo: afaste as
normas que não têm natureza injuntiva, mas apenas supletiva, substituindo-as por
soluções criadas pela Administração e incluir, além dos fatores legalmente necessários
(elementos essenciais), elementos acidentais ou acessórios: falamos aqui em cláusulas
acessórias (condição, termo, modo, reserva).

As cláusulas acessórias podem ser inseridas a favor de interesses titulados pelos


administrados ou, de forma alternativa, em função de interesses protagonizados pela
Administração, nos seguintes moldes:

A aposição das cláusulas acessórias, dependendo de previsão normativa, a qual pode


decorrer, tratando-se de atuações de natureza discricionária, de uma cláusula geral
habilitante CPA: 149º/1, assume clara excecionalidade no âmbito dos conteúdos
vinculados CPA: 149º/2: as cláusulas acessórias não podem alterar as situações de
tipicidade do conteúdo decisório administrativo.

A cláusula acessória deve ser conforme à lei: quer no seu conteúdo, quer na motivação
que justifica a sua introdução. As cláusulas acessórias têm que ser adequadas ao fim do
ato em que se integram.
Tem que existir uma relação direta com o conteúdo principal do ato. Têm que se
conformar com o princípio da proporcionalidade, designadamente não podem ser
excessivas relativamente ao objeto do próprio ato.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 60


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A possível essencialidade das cláusulas acessórias? Quer dizer que pode ocorrer que
certos atos sejam adotados porque a Administração lhes introduziu uma cláusula
acessória, em termos tais que, se não existisse a cláusula acessória o ato jamais seria
praticado, a cláusula acessória torna-se, assim, elemento essencial do ato.
O problema tem relevância se há uma invalidade na cláusula acessória: se a mesma não
é meramente acessória, mas sim fundamental para a prática do ato a invalidade da mesma
pode justificar a destruição do ato; em cada caso, há que verificar qual o nível da
essencialidade da cláusula acessória.

A contrariedade pelo conteúdo da ação administrativa das normas legais imperativas


determina uma ilegalidade reconduzível ao vício de violação de lei, assim como a falta
de mérito das soluções objeto do agir administrativo se traduzem em casos de
inconveniência ou inoportunidade decisórias, sem prejuízo dos seus reflexos legais no
princípio da boa administração.

Requisitos de validade

Os requisitos de validade, em Direito Administrativo, não são muito diferentes daqueles


que estudamos em TGDC:

o Possibilidade

A possibilidade de facto pode ter que ver com a pessoa envolvida na decisão, substrato
pessoal da decisão.
Exemplo: um regulamento que hoje resolvesse atribuir pensão de sangue às viúvas dos
militares que combateram em Aljubarrota é um regulamento cujo objeto é impossível em
termos factuais, uma vez que não há nenhuma, no século XXI, que haja sobrevivido de
tal batalha
Pode ainda ter que ver com o substrato material. A impossibilidade relativa ao substrato
material acarreta a nulidade da decisão administrativa CPA: 161º/2 c)
Exemplo: declarar como monumento nacional uma casa que foi totalmente destruída e já
não existe.

A possibilidade jurídica pode dizer respeito à viabilidade jurídica ou legal da prestação


ou da coisa, no sentido de esta ou aquela pode constituir objeto apropriado para a
intervenção administrativa.
Exemplo: a proibição de alienação um bem que é do domínio público
A possibilidade jurídica pode ter que ver com o conteúdo ser logicamente possível.
Exemplo: não é possível revogar um ato que foi anulado judicialmente, não há objeto para
a revogação.
Sem se confundir com a contrariedade à lei: esta limita-se a conformar o conteúdo de um
ato permitido e materialmente possível, enquanto a impossibilidade jurídica exclui a
admissibilidade lógica da prática do ato ou a idoneidade do seu objeto.

A impossibilidade pode ser objetiva, se é absoluta atingindo toda e qualquer pessoa, ou,
em alternativa, pode ser subjetiva- caso diga respeito àquela determinada pessoa.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 61


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A impossibilidade pode ser originária- se existia à data que a Administração decidiu- ou


superveniente- caso ocorra em momento posterior à decisão administrativa.
Quanto àquela vimos já que qualquer atuação administrativa que padeça de
impossibilidade originária é nula CPA: 161º/2 c), contudo no que toca à impossibilidade
superveniente não há solução uniforme:
• Por via de regra, salvo em situações de retroatividade válida, a impossibilidade
jurídica superveniente só produz efeitos para o futuro;
• Em qualquer caso, a impossibilidade jurídica superveniente mostra-se passível de
gerar um direito indemnizatório a favor dos lesados de boa-fé.

Pode ainda ser temporal ou definitiva, bem como total ou parcial.

Os casos em que, reconduzindo-se a situações de “impossibilidade de facto”, a execução


de uma prestação envolva um esforço excessivamente desproporcional face ao interesse
do credor dessa mesma prestação poderão ainda ser equiparados à impossibilidade; além
destes, também os casos em que nenhum credor razoável esperaria que a prestação fosse
ainda realizada são passíveis de equiparação à impossibilidade.

o Determinabilidade

Tem que ver com a sua compreensibilidade e inteligibilidade. Caso o objeto frustre a
inteligibilidade estaremos, novamente, perante um ato nulo CPA: 161º/2 c)

A determinabilidade exige clareza na determinação do objeto, bem como proíbe a


omissão de elementos suficientes para a determinação de um sentido declaratório
compreensível.

A declaração não pode ser omissa, contraditória ou obscura na sua formulação,


conduzindo a uma indeterminação do seu sentido.

A falta de certeza ou determinação do objeto, incluindo as situações de efeitos


indefinidos, conduz a uma atuação administrativa vazia de sentido e inútil, negando-lhe
a ordem jurídica valor.

Se, na sequência de interpretação, integração ou aplicação da regra interpretativa, se


chegar a um resultado ininteligível, a declaração administrativa é nula.

o Legalidade

O objeto da atuação administrativa nunca pode envolver a violação de regras ou


princípios de natureza injuntiva, sendo a regra no Direito português a anulabilidade do
ato cujo objeto seja ilegal.

A ilegalidade o objeto da conduta administrativa pode ser analisada de duas perspetivas:


Poderá dizer respeito à conduta em si, ao resultado a atingir, aos meios a usar;
Poderá referir-se à relação existente entre os meios usados e os resultados visados ou
desejados pela conduta, assim como envolver uma relação entre o objeto e o fim.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 62


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Contudo, surgem situações em que a ilegalidade do objeto comina em nulidade: CPA:


161º/2 d), c), j) e k. Além destes são ainda nulos os atos atentatórios dos bons costumes
e da ordem pública, por força do CC 280º, bem como os atos que sendo regidos pelo
Direito privado se mostrem contrários a norma imperativa CC: 280º/1 e 294º

A ilegalidade do objeto se é regulada pelo Direito privado gera nulidade como desvalor
regra, enquanto no Direito Administrativo o desvalor regra é a anulabilidade.

Existem diversos efeitos que podem surgir da atuação administrativa. Estes podem ser :
Permissivos: habilitam ou possibilitam a adoção de um comportamento (por ação ou
omissão) aos seus destinatários;
Imperativos: traduzem-se na imposição de uma conduta ou na sujeição do seu destinatário
a uma obrigação;
Propulsores: não são imposições, mas vão além da mera permissão, visando promover ou
estimular uma conduta;
Declarativos: verificam ou valoram uma situação existente através de uma declaração de
conhecimento ou de ciência.

Temos efeitos de dimensão positiva e de dimensão negativa: aqueles introduzem


alterações na ordem jurídica, enquanto estes não; efeitos de execução instantânea e de
execução continuada consoante se esgotem num determinado momento ou se
prolonguem no tempo; por fim temos efeitos internos e externos: a diferença verifica-se
no facto dos efeitos da conduta se projetarem ou não para fora das fronteiras da
Administração Pública.

Requisitos de eficácia

o Publicidade

Pode ser através do jornal oficial, local de estilo (exemplo: fixar numa vitrine da
faculdade ou fixar na porta de uma junta de freguesia), a notificação aos destinatários.

Sempre que nos encontremos perante atos constitutivos de deveres ou encargos há


obrigatoriedade de haver notificação dos interessados, ainda que já tenha havido
publicidade ou mera comunicação de tais atos.

Outra hipótese de publicidade é a disponibilização de documentos para consulta pública


por parte dos interessados.

E se não existir publicidade? A falta de publicação, desde que exigida por lei, conduz à
CPA: 139º + 158º/2 CRP: 119º/2 ineficácia do ato: o mesmo continua válido, mas
ineficaz. Nos casos em que a publicação não seja exigida por lei, teremos uma mera
CPTA: 60º/1 inoponibilidade aos interessados do conteúdo e efeitos do ato.

Os atos constitutivos de direitos são aqueles que atribuem posições jurídicas favoráveis,
ampliam posições favoráveis já existentes ou que restringem situações jurídicas
desfavoráveis. Quanto a estes, a regra no Direito português é que os mesmos produzem
efeitos, independentemente da via pela qual os particulares deles tomam conhecimento.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 63


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o Outros Requisitos

Ata- é um requisito de eficácia das decisões de órgãos colegiais. Contudo, a lei demanda,
muitas vezes, que tais atos tenham que ser aprovados por outro órgão para que gozem de
plena eficácia (art.º 157º al. a) CPA e 287º/1 do CCP);

A necessidade de intervenção do Tribunal de Contas, concedendo uma autorização


administrativa geradora de efeitos financeiros (art.º 157º al. c) CPA e 287º/1 CCP);

A lei pode, ainda, exigir a concordância do destinatário para que o ato seja eficaz (ex. a
nomeação);

A realização de um referendo local para aprovar determinada decisão.

A eficácia das decisões administrativas pode ser parada pela existência de uma cláusula
acessória: termo e condição suspensiva (art.º 157 al. b) CPA).

Caso estejamos perante um ato plurilateral a sua produção de efeitos perante terceiros,
desde que se encontrem em posições jurídicas passivas ou de modificação de posições
jurídicas ativas, depende sempre do seu consentimento (art.º 287º/3 CCP), salvo se se
tratar de cláusulas de efeito normativo- aqui exige-se publicação (art.º 287º/4 CCP e art.º
139 CPA).

o Dimensão temporal da eficácia

Ainda, quanto à eficácia, há que olhar à dimensão temporal da eficácia das decisões: em
regra a decisão administrativa vale a partir do momento em que foi tomada ou a partir de
momento posterior a essa data.
Contudo, a título excecional pode ser atribuída uma produção retroativa de efeitos se a
lei o impõe, ou se, num exercício da discricionariedade o permite CPA: 156º/2 d) só pode
acontecer caso os efeitos não sejam desfavoráveis ao destinatário da decisão.

O ordenamento jurídico diz-nos que a retroatividade do agir administrativo pode resultar


de 3 principais fatores:
• Ser uma imposição da lei (art.º 156º/1 al. b) CPA);
• Traduzir o resultado da natureza interpretativa da decisão face a uma anterior
conduta administrativa (art.º 156º/1 al. a) CPA);
• Expressar a vontade do autor da atuação administrativa em termos unilaterais
(art.º 156º/2 CPA) ou, conjugada com a vontade da outra parte, em termos
bilaterais (art.º 287º/2 CCP),

Interpretação e integração

A interpretação é uma forma de revelar o sentido da decisão e deve partir do enunciado


linguístico, embora não deva a tal enunciado cingir-se. A interpretação administrativa
está sujeita aos critérios CC: 9º, mas tem especificidades uma vez que está vinculada com
especial acuidade ao princípio da tutela da confiança e da importância do “destinatário
normal” para aferir do sentido da declaração; embora haja uma pluralidade de intérpretes

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 64


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(Administração e particulares), a última palavra quanto ao sentido a seguir na


interpretação está a cargo dos tribunais administrativos.

No âmbito da Administração, embora tais máximas argumentativas não sejam exclusivas


do Direito Administrativo, são de salientar os seguintes postulados interpretativos:

• Se uma estipulação é ambígua, entre um sentido que conduz à invalidade e um


sentido que “salva” a respetiva validade, deve sempre preferir-se este último-
trata-se da aplicação do princípio da conservação dos atos e procedimentos;
• Sendo duvidosa a interpretação da liberdade dos cidadãos, entre um sentido que a
restringe e um sentido que a amplia, limitando este último a intervenção
administrativa, deve sempre decidir-se a favor da liberdade;
• Se existem dúvidas sobre o sentido de uma decisão que imponha sacrifícios ou
configure posições jurídicas passivas, deve sempre preferir-se o sentido que se
tenha como mais benigno;
• Na falta de indicação em sentido contrário, o acessório segue o regime aplicável
ao principal;
• As obrigações acessórias extinguem-se sempre que se extinguem as principais;
• Se um enunciado jurídico é ambíguo, deve adotar-se o sentido que é mais apto a
produzir os efeitos típicos ou próprios do ato em causa;
• A ambiguidade de enunciados favoráveis deve ser interpretada em sentido
ampliativo, desde que compreendido na sua letra e de acordo com a vontade do
seu autor;
• O decisor deve interpretar a dúvida contra quem, podendo explicitar melhor um
enunciado, o formulou de forma obscura;
• A obscuridade de uma conduta deve ser interpretada no sentido mais conforme ou
mais verosímil com o que geralmente acontece;
• Se alguém é libertado de uma obrigação ou de qualquer outra posição jurídica
passiva, deve entender-se que adquiriu algo;
• Tudo o que é proibido pela natureza das coisas nenhum ato de autoridade pode
confirmar ou validar, assim como nem tudo o que é lícito é honesto;
• O que foi admitido, sendo contrário à juridicidade, não deve estender-se a todas
as suas consequências, sendo duvidoso que apesar de ser fruto de um erro inicial,
depois transformado em costume, não possa ser aplicado em casos análogos;
• Presume-se que ninguém contrata sabendo que o objeto é impossível, pois o que
é impossível nunca pode alicerçar uma conduta decisória unilateral ou bilateral;
• Todo aquele que comete um delito não pode obter uma vantagem, sendo de justiça
natural que ninguém enriqueça à custa de outrem, por via tortuosa ou injusta,
designadamente através de injúria;
• Uma vez que toda a estipulação deve atender ao momento em que foi formulada,
a validade de uma decisão não pode ser aferida em função do Direito futuro, antes
deve tomar em consideração a normatividade presente.

Podem, ainda, surgir interpretações meramente internas (como se retira do art.º 112º/5
CRP a contrario) que permite até fixar a validade de uma interpretação contra legem
realizada pelos órgãos da Administração.
A interpretação feita pela Administração Pública só goza da força obrigatória proveniente
da sua autotutela declarativa se incidir sobre regulamentos e atos administrativos, desde
que assuma idênticas formas de expressão da decisão: a interpretação de quaisquer outras

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 65


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formas de atuação administrativa tem a natureza de mera declaração negocial, pelo que,
na falta de acordo dos destinatários, apenas goza de força obrigatória por via judicial, sob
pena de usurpação de poderes.

A integração de lacunas pressupõe a lacuna, levantando-se assim uma primeira questão:


quando é que há uma lacuna em Direito Administrativo?
Se o decisor, conscientemente, escolheu não regular determinada matéria não estamos
perante uma situação de lacuna; visto isto, a integração de lacuna é sempre resultado de
um processo interpretativo em dois momentos (1) verificar se há ou não lacuna e (2)
integrá-la de forma harmónica com a interpretação sistemática.

A integração das normas administrativas deve ser feita com recurso aos critérios CC: 10º
se a decisão administrativa não tem natureza normativa, em zonas de discricionariedade
há que apelar à vontade hipotética da Administração, quando seja um ato bilateral há que
apelar à vontade das partes envolvidas.

A integração de lacunas em normas administrativas, de acordo com o art.º 10º do CC, tem
presentes duas circunstâncias:
• A existência de lacunas em normas administrativas infraestaduais pressupõe a
inoperatividade do princípio da supletividade do Direito do Estado: a lacuna
começa quando termina a supletividade das normas estaduais;
• Nem todas as normas admitem a existência de lacunas, pois a tipicidade normativa
(expressa ou natural) afasta a ocorrência de lacunas: a ausência de previsão
normativa significa aqui proibição de agir administrativo.

Modificações do conteúdo

As modificações do conteúdo da atuação administrativa obedecem a uma regra que é a


da mutabilidade intencional: toda a atuação administrativa, por via de regra, pode mudar.
Essa mudança dá-se por três ordens de razões:
• Legalidade;
• Mérito;
• Conjugação de mérito e legalidade
• Mudança por erros de cálculo ou erros materiais de expressão da vontade.
Exemplo: queria dizer 161 e disse 162; fiz contas, mas errei no resultado).

Quem é que pode proceder a tais mudanças? Temos três vias possíveis:
• Vontade do próprio decisor;
• Imposição judicial;
• Vontade do legislador

Todo o objeto da atuação administrativa está sempre sujeito a uma cláusula implícita: a
alteração das circunstâncias, enquanto base factual que levou à tomada de uma decisão x,
ao invés de uma decisão y.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 66


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As alterações ao objeto da atuação administrativa, se envolverem um agravamento


especial, anormal da posição jurídica do particular permitem, a esse particular, caso não
haja qualquer regra que transfira para o mesmo o risco ou a responsabilidade por tal
alteração temos com princípio que a maior onerosidade gera um dever de repor o
equilíbrio financeiro que o vínculo tinha inicialmente: ideia de igualdade na repartição
dos encargos públicos.

Cessação dos efeitos

Como é que cessam os efeitos? Podem cessar por:


• Atuação da própria Administração- extingue o ato, que seja o decisor, o seu
superior hierárquico ou um seu delegante;
• Decisão judicial;
• Intervenção legislativa;
• Mecanismos informais- cessar efeitos por costume contrário, desuso, etc.

A cessação pode ser total ou parcial, pode decorrer de circunstâncias normais (ex.
caducidade pelo decorrer do prazo) ou por circunstâncias anormais (ex. alteração de
circunstâncias). A cessação de efeitos pode dar origem a uma nova solução ditada por
razões de interesse público ou pode, contrariamente, ser consequência de um novo juízo
de legalidade (ex. atuação até então havia sido desconforme com a legalidade).

A possibilidade de cessação de efeitos de anteriores decisões administrativas, por


alteração dos parâmetros densificadores do interesse público, sofre contudo restrições
decorrentes da tutela da segurança jurídica e da proteção da confiança dos destinatários
de efeitos favoráveis: a preterição de tais limitações conduz ao dever de indemnizar, por,
tratando-se de um ato gerador de sacrifícios a direitos de conteúdo patrimonial privado,
assumir uma natureza análoga a uma expropriação.

Tais limites se impõem também no caso de efeitos inválidos gerados por condutas
administrativas que se tenham solidificado na ordem jurídica.

A cessação de efeitos encontra-se subordinada ao seguinte regime jurídico:


Se a cessação de efeitos não teve eficácia retroativa, poderá ainda envolver uma posterior
intervenção decisória visando remover os efeitos pretéritos que tenham permanecido na
ordem jurídica, salvo se aquela primeira cessação resultou de intervenção judicial e
formou caso julgado;
Pelo contrário, se a cessação de efeitos teve uma eficácia ex tunc, resulta daqui a exclusão
da possibilidade de existir nova cessação de efeitos (art.º 166º/1 al. c)), uma vez que se
reconduziria a um ato sem objeto e, por isso, juridicamente nulo (art.º 161º/2 al. c));
A cessação de efeitos de uma determinada atuação administrativa pode, ela própria, ser
objeto de uma cessação de efeitos (: cessação de cessação), sendo discutíveis, em caso da
situação ser passível de reconstrução, os termos genéticos e operativos do efeito
repristinatório (art.º 171º/2 e 5 CPA).

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FORMALIDADES E FORMA

Formalidades

Fora a atuação informal da Administração, todo o agir administrativo está sujeito a


determinados trâmites e é esse conjunto de trâmites, que tem que ver com a preparação,
formulação e execução da decisão, que dá pelo nome de “formalidades”. Prendem-se
portanto com o processo de exteriorização da vontade administrativa.

O princípio do paralelismo das formalidades determina que, em regra geral, CPA: 170º/3
a modificação ou cessação administrativa de vigência de anteriores formas do seu agir
obedeça às formalidades legalmente exigidas para a prática do ato inicial, sem prejuízo
da dispensabilidade de todas aquelas formalidades cuja razão de ser deixe de se justificar.

As formalidades podem ser anteriores, contemporâneas ou posteriores à decisão, tendo


contudo atenção ao princípio da proibição do formalismo excessivo. Assim, as
formalidades podem diferenciar-se em:

• As formalidades são essenciais, se forem legalmente tidas como indispensáveis,


gerando a sua falta invalidade ou ineficácia da atuação delas carente;
• Em sentido contrário, as formalidades têm-se como não essenciais, se forem
dispensadas ou a sua omissão ou incumprimento parcial se reconduzir à mera
irregularidade, sem afetar a validade ou a eficácia da decisão administrativa.

O risco da existência de irregularidades que CPA: 163º/5 não produzem efeito anulatório,
por serem de pouca relevância, demonstram um nível de desvalorização das
formalidades: para que tal aconteça, tais formalidades são encaradas pelo legislador como
dispensáveis, segundo um juízo avaliativo de proporcionalidade e necessidade.

Há casos em que a preterição de formalidades (o não cumprimento) pode ser suprível


(pode-se, ao fim e ao cabo, repetir o ato) e outros em que é insuprível.

As formalidades não se justificam por si próprias, tendo sempre uma razão justificativa
baseada em objetivos ou propósitos que a extravasam, como sejam:
• A transparência administrativa
• A participação integrativa dos interessados no procedimento decisório
• A justificação da base factual ou de direito da decisão

Por outro lado, as formalidades podem, em determinados momentos, ser reveladoras da


implementação do princípio de um procedimento equitativo justo.
Nesses casos a preterição, mais do que gerar um vício de forma, gera violação de lei e
consubstancia a violação do núcleo essencial de um direito fundamental, gerando assim
CPA: 161º/2 d) nulidade.
Exemplo: violação da audição do interessado num procedimento sancionatório, devido à
violação direito ao inquisitório

Contudo, surgem casos em que se justifica a preterição de formalidades:


• Situações de estado de necessidade administrativa
• Quando são materialmente irrealizáveis

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 68


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Exemplo: a lei determina a consulta de um organismo público, mas se este se extinguiu e


a sua competência não foi atribuído a qualquer outro organismo é impossível a consulta
de tal organismo
• Obstrução prática/de facto à realização da formalidade
Exemplo: a lei demanda um parecer obrigatório, mas a entidade a quem compete emitir o
parecer recusa-se, numa situação de inércia administrativa. A resolução CPA: 92º/5 e 6

o Função dialógica da participação dos interessados

Participação dos interessados em diálogo com a Administração ou vice-versa, aqui as


formalidades visam satisfazer a participação estruturalmente justificativa/genética da
formação de um modo de atividade administrativa. Estamos aqui perante uma decisão
administrativa constitutiva, onde há paridade na manifestação da vontade entre os
particulares e a Administração, como a celebração de um contrato público; ou casos em
que há uma decisão unilateral da Administração, mas em que a produção de efeitos
depende do consentimento do particular, como é o ato de nomeação.

Pode a intervenção dos particulares ser meramente dialógica, como forma de colaboração
dos interessados.
Exemplo: audiência dos interessados CPA: 100º no âmbito dos regulamentos, CPA: 121º
a 124º no âmbito dos atos administrativos ou CPA: 101º e 124º/1 d) consulta pública.

No âmbito das decisões sancionatórias ou ablativas (que privam) da propriedade e lesivas


da liberdade a participação é um elemento inerente ao procedimento equitativo justo.
Aqui, a audiência prévia dos interessados, consubstanciando uma manifestação do
princípio do contraditório, integra o conceito de procedimento equitativo.

Segundo Paulo Otero assume-se hoje como um verdadeiro direito fundamental.

A audiência prévia é aqui um direito fundamental de defesa que, além das situações de
aplicabilidade direta nos procedimentos sancionatórios CRP: 16º/1 emergentes da
Constituição, assume uma natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias: a
audiência prévia concretiza o direito a um procedimento equitativo.

Por isso, salvo se a audiência prévia comprometer a urgência, a execução ou utilidade da


decisão CPA: 100º/3 a) e b) + 124º/1 a) e c), a sua violação, por omissão ou grave
deficiência equiparável à omissão, determina a ofensa do “conteúdo essencial” do direito
fundamental à audiência prévia (e ao procedimento equitativo). Pelo que o vício de forma
por preterição da formalidade da audiência prévia é consumido pela violação do núcleo
essencial do direito fundamental: o ato em vez de anulável, está manchado com nulidade.

Estando em causa (como é o caso) o exercício do contraditório para garantir um


procedimento equitativo, a dispensa da audiência prévia assume sempre natureza
excecional, apenas justificável de acordo com os postulados de necessidade, adequação e
proporcionalidade em sentido estrito.

À parte dos domínios sancionatórios, lesivos da propriedade privada e da liberdade


individual, a audiência prévia dos interessados fundando-se predominantemente no

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 69


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princípio participativo e não na garantia do contraditório nem no procedimento


equitativo, apesar de envolver a natureza de um direito fundamental, a sua violação não
colocará em causa, em regra, o “núcleo essencial” do direito fundamental.
Nestes casos estaremos perante um vício de forma, reconduzível à anulabilidade ou, em
alternativa, perante a violação de um direito fundamental que, por não consubstanciar
uma violação do seu “conteúdo essencial”, não gera a nulidade.

A convalidação da ilegalidade decorrente da preterição da audiência prévia dos


interessados tem sido admitida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo,
se acordo com o princípio do aproveitamento, nas seguintes coordenadas:
• A ilegalidade pode ser expurgada por via da realização da audiência ou, em
alternativa, pela revelação dos pressupostos de inexistência ou dispensa desse
dever de audiência, nos termos previstos na lei;
• Uma vez que a audiência prévia se localiza numa fase procedimental anterior ao
ato final, a sanação da sua falta pressupõe que se volte a essa fase procedimental,
motivo pelo qual apenas a opção pela anulação do ato, ordenando-se o
cumprimento da formalidade em falta, convalidaria a omissão.

A audiência prévia e a consulta pública pressupõem o acesso dos interessados à


informação e à fundamentação dos projetos de decisão administrativa sobre as quais
incidirá a sua participação. Assim, a ausência de informação suficiente e fornecida
atempadamente para um correto exercício da audiência prévia ou da consulta pública
inquina tais mecanismos participativos, podendo ser equiparada à sua falta, gerando
inerentes efeitos invalidantes, até por lesão da exigência de um procedimento equitativo
justo. Em igual sentido, a ausência ou insuficiência de justificação do desatendimento do
conteúdo da participação dos interessados determina uma situação de falta de
fundamentação.

Por outro lado Freitas do Amaral entende que o direito subjetivo público de audiência
prévia dos interessados, embora seja um direito de grande importância na ótica da
proteção dos particulares perante a Administração e dentro de um modelo de
Administração paritária, não se inclui no elenco dos direitos fundamentais que são “os
direitos mais diretamente ligados à proteção da dignidade da pessoa humana”.

Aroso de Almeida também propende para a inadmissibilidade do direito à audiência


prévia dos interessados figurar, na generalidade dos casos, como um direito fundamental.
O autor justifica-se dizendo que, embora CRP: 267º/5 atribua consagração constitucional
a este direito, tal disposição constitucional tem como objeto primário regular a estrutura
decisória da Administração Pública dela não decorrendo um direito à participação, e
muito menos a audiência prévia.
Não obstante admite que nos procedimentos sancionatórios estamos perante um
verdadeiro direito fundamental formal ou procedimental consagrado CRP: 32º e 269º,
sendo a consequência da falta de audiência prévia dos interessados a CPA: 161º/2 d)
nulidade nesse tipo de procedimentos.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 70


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o Fundamentação

A fundamentação das decisões envolve a exigência da indicação das razões de facto e de


direito que levaram a que a Administração decidisse de tal modo, correspondendo ao
porque dos motivos que levaram aquela decisão.

Há aqui um propósito argumentativo que procura conciliar o itinerário, o caminho que


levou o decisor àquela decisão com aquele conteúdo e, simultaneamente, atribuir aos
particulares uma garantia que passa pelo conhecimento desse itinerário decisório
percorrido pela Administração.

Assim, temos, simultaneamente, um dever por parte da Administração e um direito por


parte dos particulares: a Administração o dever de fundamentar, os particulares o direito
à fundamentação.
Através da fundamentação abre-se, assim, uma janela que permite aos particulares olhar
para dentro da Administração e, por isso, a fundamentação obedece a três requisitos:
Clareza: a fundamentação deve usar linguagem percetível ao cidadão comum, estando
vedadas justificações obscuras e que deixem por esclarecer as razões que ditaram a
solução proposta ou adotada pela Administração;
Regras lógicas: a fundamentação não se pode ser contraditória ou incongruente;
Princípio da necessidade e da adequação: a fundamentação tem que ser suficiente e
idónea para dar a conhecer as efetivas justificações ponderativas que estiveram
subjacentes à decisão.

Visto isto, uma fundamentação insuficiente, incongruente ou contraditória, uma


fundamentação que não esclareça as razões de facto e de direito equivale à falta de
fundamentação.
Quando a fundamentação não existe por completo ou existindo é insuficiente, estando em
causa aqui um procedimento administrativo que CPA: 152º envolva a aplicação de
sanções, lesão da propriedade privada ou da liberdade, a sua falta atinge o núcleo
essencial do direito a um procedimento equitativo CPA: 161º/2 d) gerando nulidade da
decisão administrativa.
Caso não estejamos em nenhum destes domínios, ou seja, caso a fundamentação se
consubstancie num imperativo legal, como CPA: 152º; 99º; 101º/3 há apenas vício de
forma, sendo o ato meramente anulável.

A fundamentação pode traduzir a expressão do exercício de um puro poder discricionário


do decisor, precisamente em todos os casos em que a mesma não é imposta pelo
ordenamento.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem admitido, todavia, por força


do princípio do aproveitamento dos atos, que:
• Tratando-se de um ato vinculado, e desde que tenham sido respeitados os seus
pressupostos legais, se torne irrelevante a existência de vícios de ilegalidade na
fundamentação concreta utilizada;
• No mesmo sentido, verificando-se o mesmo quadro, o juiz não se encontra
impedido de negar relevância invalidante à errada fundamentação.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 71


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o Publicidade

A publicidade é uma forma de submeter a Administração a escrutínio público,


permitindo-lhe que preste contas da sua atuação, ou seja, serve para responsabilizar a
Administração. Serve, assim, como um mecanismo ao serviço da transparência
administrativa e como meio de controlo dos atos do poder.

A publicidade impede o arbítrio, decisões secretas e confidenciais: mecanismo de garante


de uma Administração mais democrática e aberta aos particulares.

Podemos diferenciar duas situações:


O ato que confere a publicidade: ato exteriorizando uma declaração de vontade
administrativa (um ato de publicação, notificação);
O ato publicitado: aquele que é objeto de notificação, publicação, como sejam o
regulamento ou o ato administrativo, enquanto realidade decisória que é objeto da
comunicação ou transmissão por via da publicidade.

O ato de publicidade, expressando-se como um subprocedimento formalmente autónomo


daquele que esteve subjacente à formação do ato publicitado, mostra-se passível de ter
vicissitudes próprias que não se repercutem sobre a validade ou regularidade do ato
publicitado: a publicidade, sendo um ato autónomo, assume um papel instrumental para
a produção de efeitos de ato que lhe é anterior- o ato publicitado.

O ato que efetiva a publicidade, que é o que estamos a abordar neste tópico, pode ter
várias modalidades:
• Publicação no jornal oficial
Exemplo: Diário da República
• Publicação no site da respetiva entidade;
• Notificação
É uma comunicação dirigida a determinado destinatário.
Exemplo: carta registada, email, telefonema, fax
• Fixação em local público, em vitrine,
• Disponibilização do ato para consulta

CRP: 268º/3 Impõe que sejam notificados os atos administrativos que afetem direitos e
interesses legalmente protegidos. Há aqui um direito fundamental à notificação.

CPA: 160º A falta da mesma determina a inoponibilidade do ato relativamente aos


respetivos destinatários, inexistindo qualquer dever de obediência ou de sofrer os seus
efeitos: a Administração encontra-se proibida de proceder à sua execução.

CPA: 114º/1 A lei pode ampliar as situações de notificação obrigatória, passando a


compreender também decisões que não afetem direitos ou interesses legalmente
protegidos, incluindo até a notificação de terceiros face aos destinatários do ato objeto da
notificação, passando a existir aqui um direito fundamental, por via da cláusula aberta
CRP: 16º/1.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 72


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A notificação obrigatória nunca se reconduz, todavia, a um requisito de validade das


decisões administrativas, CPTA: 60º/2 podendo ser requerida judicialmente.

CPA: 114º/2 Requisitos de conteúdo da publicidade.

A regra é que a falta de publicidade em geral CPA: 139º + 158º/2 determina a ineficácia
do ato, com exceção dos atos constitutivos de direitos que produzem efeito
independentemente de como o destinatário deles toma conhecimento.

A publicação ou divulgação pela Internet de decisões administrativas sancionatórias de


natureza individual, em que se verifique a ausência de notificação ao destinatário, além
de nunca conferir eficácia ao ato sancionatório, se tiver o propósito de humilhação pública
do visado, revela uma intencionalidade administrativa alheia ao fim da publicidade: existe
aqui um desvio de poder no uso da forma de publicidade escolhida e crime contra a honra
do visado, agravado por eventual abuso de autoridade, por parte dos titulares do órgão
decisório.

Forma

A forma do agir da Administração tem que ver com a expressão da vontade, sendo
configuráveis várias possibilidades de o fazer:
• Forma escrita: em suporte de papel ou via eletrónica;
• Formas verbais: como sejam uma informação prestada num guichê, num serviço
da Administração;
• Formas luminosas ou usando símbolos sem texto: como sejam os semáforos e
sinais de trânsito;
• Formas gestuais: gestos do polícia sinaleiro;
• Formas acústicas: o apito policial a interditar determinada comportamento ou o
toque das aulas na escola.
• Comportamentos factuais concludentes de onde se extraia um determinado
sentido decisório.

A exigência de uma determinada forma especial de exteriorizar a vontade administrativa,


sem prejuízo das razões de interesse público, pode comportar vários propósitos. Garantia
de maior ponderação de interesses e de argumentos ao autor (ou autores), numa aplicação
atenta do direito; Assegurar um reforço da certeza de conteúdo e autoria aos destinatários;
Facilitar a prova da sua existência e efeitos; Tornar mais acessível.

CPA: 99º + 150º/1 Por regra, a expressão da vontade administrativa é feita sob forma
escrita, atendendo a razões de segurança, sendo possível hoje encontrar-se diversas
exceções a tal regra:

As deliberações dos órgãos colegiais, salvo preceito legal em sentido contrário, são
praticadas sob forma oral, tendo a sua eficácia dependente, todavia, de serem exaradas
em ata CPA: 150º/2

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 73


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Certos contratos que, expressamente por lei, se encontram dispensados de redução a


escrito;

As ordens de polícia, atendendo a exigências de imediata execução ou obediência;

Informações e esclarecimentos prestados pela Administração sem embargo de regra


contrária ao nível dos esclarecimentos no âmbito das peças no procedimento contratual-
sabendo-se, contudo, que as informações passadas sob forma escrita são sempre passíveis
de gerar responsabilidade administrativa CPA: 11º/2

A atuação informal, por natureza, não segue forma escrita;

O exercício do poder hierárquico mostra-se passível de assumir forma verbal, sem


prejuízo da possibilidade de o subalterno pedir a transmissão por escrito das ordens ou
instruções recebidas.

Atos orais praticados em estado de necessidade administrativa;

Os comportamentos factuais concludentes.

Quanto à forma, o princípio é o da identidade das formas: entre a forma adotada num
primeiro momento decisório e a forma adotada para modificar ou extinguir tal decisão;
caso haja disposição legal em contrário tal princípio não tem operatividade.

A lei disciplina, de forma imperativa, alguns aspetos de conteúdo a que a forma escrita,
enquanto instrumento de expressão de vontade da Administração Pública, tem de
obedecer:

CPA: 100º/4, 101º/3 e 136º/2 São menções que a lei exige que devem ser incluídas em
regulamentos CPA: 151º/1 atos administrativos e contratos.

Entre tais menções obrigatórias é de especial relevo a exigência de assinatura do autor


que se traduz num ato de responsabilidade: permite imputar a declaração, facilita a prova
da sua existência e autoria, contribuindo para a sua autenticação e consciencializa o
assinante.

As manifestações de vontade da Administração por escrito consubstancia um documento


autêntico, decorrendo diversos efeitos:

Os documentos autênticos gozam de prevalência hierárquica face aos documentos


autenticados ou particulares (art.º 364º/1 CC);
Tais documentos gozam de presunção de autenticidade que, apesar de poder ser ilidida,
garante que provêm da autoridade que os assina (art.º 370º/1 CC);
Esses documentos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pelo seu
autor e ainda dos factos que neles são atestados (art.º 371º/1 CC), verificando-se que a
sua força probatória só poderá ser ilidida através do incidente da falsidade (art.º 372º/1
CC), salvo anulação administrativa.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 74


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O desrespeito pela forma legalmente prevista, levando sempre à invalidade da vontade


declarada, por vício de forma, pode comportar diversos cenários:
A falta absoluta de forma legal determina a nulidade do agir administrativo (art.º 161º/2
al. g) e quanto aos regulamentos de forma implícita o art.º 144 in fine CPA);
As restantes situações, falando-se numa carência relativa de forma legal, reconduzem-se
a casos de anulabilidade (art.º 163º/1), salvo disposição legal em contrário;
Gera nulidade, todavia, a falta de certos elementos essenciais de natureza formal das
decisões administrativas.

À luz do princípio da boa-fé há que apreciar as situações em que se venham as partes


prevalecer de normas sobre a forma, em situações onde a Administração e o particular
acordaram forma menos solene, dum ponto de vista de adequação procedimental, isto em
terrenos alheios a norma de forma injuntiva: podemos estar perante um cenário de
inalegabilidade formal.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 75


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INVALIDADE E DESVALORES DAS FORMAS JURÍDICAS DA ATIVIDADE

INVALIDADE DO AGIR ADMINISTRATIVO: TEORIA GERAL

Força e Garantia da Juridicidade

A invalidade é o outro lado da vinculação à juridicidade. A administração está vinculada


ao Direito, mas o que acontece se ela não respeitar o Direito? As invalidades são a
resposta dada pela ordem jurídica às violações da juridicidade, sendo que se traduzem
num juízo de reprovação imposto pelo sistema jurídico.

É ainda de notar que, se a desconformidade da conduta administrativa relativamente à


juridicidade traduz uma situação de contrariedade, por outro lado é também verdade que
um ato incompleto não deixa de envolver uma contrariedade ao parâmetro normativo que
imponha a completude: a incompletude traduz a violação de uma norma, razão pela qual
a desconformidade e contrariedade da juridicidade se tornam expressões sinónimas,
compreendendo qualquer pretensa autonomia invalidante dos casos de incompletude.

Devido aso diferentes graus de vinculatividade da atuação à lei, temos que ter em atenção
dois tipos de juridicidade:
• Juridicidade dura/forte (hard law): a violação gera invalidade;
• Juridicidade debilitada/flexível (soft law): a desconformidade nem sempre
determina a invalidade. Por duas diferentes vias:
§ Pode surgir o desenvolvimento de uma atividade direta e objetiva que seja
contrária à legalidade, mas em que não haja sanção por via da invalidade
devido a uma ponderação de outros bens, interesses ou valores integrantes do
sistema jurídico
Exemplo: situações de irregularidade, execução de atos fundados em normas declaradas
nulas ou inconstitucionais, execução de sentença administrativa consubstanciada na
prática de um ato ilegal
§ Existem normas jurídicas que elas próprias habilitam agir contra a lei
Exemplo: Estado de necessidade ou de exceção constitucional, desaplicação
administrativa da lei

Visto isto, a invalidade não se resume a uma qualquer desconformidade da conduta


administrativa face à juridicidade, sempre importando as circunstâncias subjacentes de
facto ao agir administrativo, concretamente considerado, uma vez que em determinados
cenários tal agir se torna válido, ou pelo menos, justificável ou desculpável, aquilo que
em circunstâncias normais seria sempre inválido (juridicidade de segundo grau).

Da mesma maneira, por razões de segurança jurídica, tutela da confiança, bem como o
decurso do tempo podem consolidar-se na ordem jurídica situações administrativas
criadas à margem da juridicidade. A juridicidade revela-se, por isso, dotada de
elasticidade e permeabilidade à ponderação de diferentes valores ou interesses, sendo que
a sua violação nem sempre determina uma integral proscrição de efeitos: o decurso do
tempo pode levar à marginalização da invalidade dos efeitos resultantes da violação da
juridicidade. Há aqui o reconhecimento, pela ordem jurídica, de efeitos jurídicos que
inicialmente eram inválidos.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 76


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CRP: 282.º/4 Permite que, por razões de equidade, segurança jurídica, ou de interesse
público de excecional relevo, algumas atuações inválidas produzam efeitos (válvulas de
escape do sistema). Se a CRP permite que atos inconstitucionais produzam efeitos, por
maioria de razão, estendemos essa permissão aos atos ilegais.

Não obstante, a parametrização constitucional da legalidade vinculativa da


Administração Pública não habilita, de modo automático, os órgãos administrativos a
rejeitarem a aplicação das normas desconformes com a Constituição ou lei, motivo pelo
qual, sem uma competência equiparável à dos tribunais para recusar aplicar normas
inválidas, o agir administrativo se encontra vinculado, em regra, a aplicar normas
inconstitucionais e ilegais:
• Há aqui uma parametrização administrativa a uma juridicidade inválida,
encontrando-se a Administração obrigada a exercer uma atividade inválida: a
prática de atos inválidos é ainda uma vinculação ao sistema;
• Estamos perante uma contradição insanável em torno da garantia da juridicidade
que perturba a unidade e adequação valorativa de um estado de juridicidade: não
se pode dizer que a Administração Pública está vinculada a respeitar a juridicidade
e, simultaneamente, a impor-lhe o dever de aplicar normas inválidas e praticar
atos inválidos.
A regra é que a administração esteja obrigada a aplicar normas inconstitucionais.

Nem sempre a violação de juridicidade tem a mesma resposta por parte da ordem jurídica.
Há casos em que a ordem jurídica sanciona com inexistência jurídica, há casos em que
sanciona com nulidade e há casos que sanciona anulabilidade, sendo esta a regra.

A ordem jurídica não dá particular importância à violação da legalidade administrativa.


Isto porque, em regra, a violação da legalidade administrativa gera anulabilidade e a
anulabilidade pode consolidar-se na ordem jurídica por efeito do decurso do tempo. A
juridicidade vinculativa da administração tem dois tipos: a mais imperativa, cujo desvalor
jurídico é inexistência ou nulidade (exceção), e a menos imperativa, cujo desvalor é
anulabilidade (regra).

Tipos de invalidades

Temos condutas que são intencionalmente inválidas e condutas feridas de erro sobre a
invalidade. No erro não há intenção de agir de forma inválida, como quando se pensava
que estava a agir de forma válida, podendo o erro resultar da aplicação da norma incorreta
ou da interpretação errada de uma norma certa. Isto importa em sede de responsabilidade
civil e disciplinar.

A invalidade pode incidir sobre normas que conferem a competência, normas que
disciplinam o exercício da competência ou normas que regulam as regras de competência.

No âmbito das normas que disciplinam o exercício da competência, a sua violação, quer
ocorra por via ativa ou passiva, gera invalidade do agir administrativo sobre duas
realidades distintas:
• Invalidades Substantivas: invalidade diz respeito à substância ou conteúdo da
decisão, envolvendo a violação de normas materiais ou de fundo.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 77


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• Invalidades Formais: invalidade pode referir-se ao procedimento ou à forma,


num cenário de violação de normas adjetivas ou processuais.

A invalidade é total ou parcial, podendo dizer respeito à decisão principal ou, em


alternativa, ter objeto as cláusulas acessórias ou elementos acidentais da expressão de
vontade dos órgãos administrativos (condição, termo, modo, reserva).

A invalidade que incide sobre a decisão principal acarreta a invalidade de toda a


declaração de vontade administrativa.

A invalidade que atinge as cláusulas acessórias ou os elementos acidentais só gera efeitos


sobre toda a decisão se aqueles assumirem a natureza de condição sine qua non do sentido
subjacente à decisão principal. Presume-se que, sem tal cláusula, por razões de
conveniência ou de oportunidade, a Administração não teria decidido daquela forma.

Nos casos de invalidade da cláusula que funciona como condição sine qua non da decisão
principal, de acordo com a sua essencialidade, poderá suceder a caducidade desta ou
reconhecimento de uma fundamentação para cessação de vigência ou modificação do
conteúdo decisório principal.

A invalidade das cláusulas acessórias pode residir no seu conteúdo, na sua aposição a
uma decisão que, de acordo com a lei, é insuscetível de comportar tais cláusulas ou
elementos acessórios ou nos efeitos ou resultados a que conduz.

A invalidade pode ser originária, há data da prática do ato ou superveniente/sucessiva,


durante a vida do ato.

A invalidade pode resultar da conduta administrativa diretamente desconforme com a


juridicidade que lhe serve de parâmetro de conformação, sendo designada invalidade
própria ou direta.
Pode resultar da aplicação de um parâmetro inválido, sendo meramente consequente ou
derivada da atividade administrativa, invalidade consequente, derivada ou reflexa:
§ Aplicação de um pressuposto normativo inválido e relativamente ao qual a
Administração é totalmente alheia
Exemplo: Lei inconstitucional, trata-se de uma conduta administrativa que se limitou a
fazer aquilo que se encontrava obrigada a fazer.
§ Conduta administrativa cuja invalidade inquinou todas as decisões
consequenciais, executivas ou meramente confirmativas
§ Acolher uma invalidade decorrente do agir de um particular, inquinando esta
última atuação administrativa nela alicerçada

A invalidade pode ser presente ou pretérita: no primeiro caso respeita a condutas


administrativas que ainda produzem efeitos ou que já foram formalmente exteriorizadas;
já no segundo caso incide sobre condutas cujos efeitos já não se produzem, por ter cessado
a sua vigência, apesar de ainda se manterem na ordem jurídica os efeitos que antes foram
produzidos.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 78


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Níveis de garantia da juridicidade: a dimensão constitucional dos desvalores

A existência de diferentes desvalores jurídicos nas condutas administrativas que violam


a juridicidade revela que a ordem jurídica considera assumir graus diferentes de gravidade
a violação da juridicidade pela Administração Pública:
• As situações de nulidade e inexistência expressam um grau máximo de
intensidade vinculativa da juridicidade que foi violada,
• Os casos de anulabilidade, pelo contrário, traduzem áreas dotadas de menor
vinculação à juridicidade ou, pelo menos, de uma resposta enfraquecida em
cenários de violação.

A configuração da anulabilidade como forma de invalidade típica do agir administrativo


inválido permite extrair que a ordem jurídica consagra uma debilitação da juridicidade
vinculativa da Administração Público.

A benevolência do regime da anulabilidade diz-nos que a ordem jurídica não mostra


grande preocupação com o agir administrativo fora dos limites estabelecidos pela lei.

No âmbito aplicativo do Direito Administrativo existem razões de segurança jurídica ou


de tutela da confiança que justificam fazer da anulabilidade o desvalor-regra da violação
administrativa da juridicidade.

Irregularidade

Anulabilidade

Nulidade

Inexistência

O problema da Irregularidade

Existem condutas administrativas que não respeitam a juridicidade, mas nem sempre a
ordem jurídica entende que se devam produzir efeitos inválidos, determinando por vezes
a mera irregularidade.

A irregularidade inverte o princípio da invalidade. Isto porque, se é certo que quando a


administração viola a juridicidade tal facto determina a invalidade, os casos de mera
irregularidade vêm dizer que isso não acontece sempre.

A irregularidade é, na senda de Manuel de Andrade, uma invalidade quanto à causa, mas


não quanto ao efeito.

A irregularidade assume-se como uma desconformidade entre a conduta administrativa e


uma norma, apesar de ser contrariada, não gera um efeito invalidante.

Na irregularidade estão em causa vícios que, sem envolverem invalidade, se referem


apenas a alguns efeitos puramente laterais.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 79


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A irregularidade traduz a resposta menos grave face a uma conduta administrativa


desconforme à juridicidade, assumindo, por isso, uma natureza excecional ou marginal
do Direito Administrativo.

A irregularidade diz-nos que estamos perante o soft law ou ius imperfectum, porque a sua
violação não acarreta invalidade e apenas irregularidade. O ato é contrário à lei mas não
pode ser anulado.
A irregularidade é uma reação do sistema que sanciona uma atuação administrativa
desconforme com a juridicidade sem privar tal atuação dos efeitos normais da conduta
válida:
• A conduta irregular mostra-se geneticamente idónea a produzir os mesmos efeitos
que a conduta válida;
• A atuação administrativa irregular pode ser corrigida, mas não pode ser anulada
(pela Administração ou pelos Tribunais) com fundamento na sua irregularidade:
a irregularidade elimina a valência destrutiva de efeitos que a invalidade acarreta;
• A irregularidade não envolve sanções sobre os atos em causa, sem prejuízo de não
excluir que o seu autor seja responsabilizado;
• A irregularidade torna-se mera doente de eventual responsabilidade para quem o
emanou, violando o dever de agir regularmente.

A irregularidade tem como fundamentos o princípio da proporcionalidade (o legislador


faz um juízo e diz que houve violação, mas à luz do princípio da proporcionalidade, basta
a irregularidade), princípio da proibição do excesso de formalismo (se a irregularidade
basta para alcançar os fins pretendidos, não devemos ser excessivos nas formalidades),
princípio do aproveitamento das condutas (sendo possível aproveitar uma conduta que
produziu os efeitos pretendidos, à luz da economia procedimental, mesmo que ela tenha
preterido uma formalidade, devemos fazê-lo).

A irregularidade faz nascer uma norma no ordenamento jurídico que, diante outra que foi
preterida pela Administração, considera o cumprimento daquela outra (primeira)
dispensável ou não essencial relativamente aos valores e interesses envolvidos: a
irregularidade diz que o cumprimento da primeira norma, aquela que impunha a conduta,
é dispensável.

Assim, a irregularidade afasta a norma que invalida a conduta desconforme com a


primeira norma. Ou seja: há uma norma A que impõe uma conduta; mas se a
administração não se sentir motivada a acatar essa norma, há uma norma B que diz que a
conduta é meramente irregular, embora tenha violado a norma A. Coloca-se a questão de
saber se essa norma B não está a habilitar a administração a deixar de cumprir a norma
A, pois o seu cumprimento torna-se facultativo. A norma B afasta o efeito anulatório ou
dispensa a formalidade da norma A, derrogando o seu sentido imperativo?

A irregularidade, no confronto com a invalidade, mostra-nos que a ordem jurídica


estabelece dois tipos de elementos vinculativos do agir da Administração:

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• Se se trata de elementos que assumam uma natureza essencial, a sua preterição


gera a invalidade da conduta desconforme;
• Se, em sentido diverso, tais elementos não são essenciais a sua violação importa
apenas a irregularidade da conduta que deles se apartou.

A irregularidade pode incidir sobre a forma ou o procedimento (irregularidade formal),


bem como sobre o conteúdo decisório (irregularidade material), por ação ou omissão.

Questão que se coloca no Direito Administrativo moderno é se a constituição de situações


de irregularidade é uma reserva do legislador (numa espécie de reserva de lei derrogatória
do efeito invalidante que decorre da preterição da lei) ou se, em termos complementares,
os tribunais podem autonomizar novas situações de irregularidade sem qualquer base
jurídico-positiva habilitante:
• A prática seguida tem sido no sentido de os tribunais assumirem tal faculdade,
degradando a invalidade em irregularidade, numa valorização do princípio do
aproveitamento dos atos jurídicos;
• Hoje, CPA: 163º/5 e os CCP: 283º/4 , 283º-A/2 e 5, 285º/1, os tribunais passaram
a ter cláusulas gerais habilitantes para negar o efeito anulatório face a vícios do
procedimento e a vícios de fundo, transformando invalidades em irregularidade;
• CPA: 163º/5, também a Administração Pública goza da faculdade de negar o
efeito anulatório a condutas administrativas inválidas.

A transformação legal da invalidade em irregularidade, deixando a conduta


administrativa de sofrer de ilegalidade, comporta dois efeitos paralelos:
• Exclui uma intervenção judicial anulatória da conduta administrativa em causa: a
normas que, substituindo a invalidade da conduta desconforme com a
juridicidade, cria uma situação de irregularidade limita a tutela jurisdicional: aqui
reforça-se a exigência de reserva de lei para a criação de situações de
irregularidade;
• Exclui a competência para anular as condutas irregulares: afastada a existência de
uma invalidade, a Administração Pública poderá corrigir, regularizar ou retificar
essa sua anterior conduta; não poderá, todavia, anulá-la.

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ANULABILIDADE, NULIDADE E INEXISTÊNCIA

Anulabilidade

A anulabilidade exprime-se como o desvalor menos grave da conduta administrativa


violadora da juridicidade, assim, excetuando os casos de irregularidade, a anulabilidade
ocupa o primeiro patamar da resposta sancionatória da ordem jurídica ao agir
administrativo inválido.

CPA: 163º/1 + CCP: 283º/2, 285º É o desvalor jurídico regra/normal, sempre que a
administração age de forma contrário à juridicidade.

Este desvalor jurídico é residual, pelo que a sua utilização deva ser antecedida da procura
de diferente desvalor jurídico aplicável à situação concreta de invalidade.
Ou seja, só perante a ausência de solução jurídica diferente se torna admissível a
recondução da invalidade a uma situação de anulabilidade.

Vantagem para cidadão Desvantagem para cidadão


Poderá conferir vantagens ou posições
jurídicas ativas a quem, de acordo com a
Se a administração agiu em termos ilegais,
lei, não tem suporte legal para delas
e essa atuação for desfavorável ao
beneficiar, violando-se assim o princípio
particular, e o desvalor jurídico desses
da igualdade, o interesse público ou até o
atos for a anulabilidade, os atos podem
erário público.
consolidar-se na ordem jurídica através do
decurso do tempo. O particular tem que ir
CPA: 168º/2, 4, 5 e 6 A ordem jurídica
ao tribunal desencadear uma ação de
criou um regime especial para as condutas
anulação dos atos, porém, tem que
administrativas unilaterais que, numa
respeitar o prazo legal.
situação concreta, envolvam a
constituição (anulável) de direitos

o Regime jurídico

Este ato, apesar de inválido, produz efeitos. Os atos anuláveis produzem efeitos como se
fossem atos válidos. Isto significa que são obrigatórios e que gozam da presunção de
legalidade (até prova em contrário, são válidos), pelo que se o particular não cumprir a
administração pode utilizar a força para aplicá-los.

As condutas anuláveis podem ser objeto de destruição judicial ou administrativa,


cessando a produção de todos os efeitos, falando-se assim em eficácia precária.
A remoção da anulabilidade só poderá ser feita pelos tribunais administrativos ou, em
alternativa, por certos órgãos administrativos: não há, por isso, uma genérica ou
indiscriminada competência judicial ou administrativa para conhecer ou proceder à
destruição da anulabilidade. Ao contrário do que acontece na nulidade CPA: 162º/2

O ato jurídico que destrói os efeitos de uma conduta anulável tem natureza constitutiva,
pois introduz inovações na ordem jurídica, desde logo privar de existência jurídica os
efeitos da conduta ferida de anulabilidade.

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CPA: 163º/2 A destruição dos efeitos tem, por via de regra, natureza retroativa, havendo
o dever de reconstituir a situação atual que existiria se tal ato não tivesse sido praticado.
Existindo a possibilidade de modelação judicial de certos efeitos das condutas anuláveis.

CPA: 163º/5 e CCP: 283º/4 e 285º/4 Um ato anulável nem sempre produz efeito
anulatório, pois a própria lei pode desvalorizar a invalidade e tratar como uma mera
irregularidade, o que tornas ilegal a anulação.

CPA: 163º/3 A anulação judicial, contrariamente à anulação administrativa, encontra-se


dependente de impulso dos interessados, numa dupla aceção:
• Há que desencadear uma ação judicial junto dos tribunais administrativos,
impugnando a conduta administrativa inválida;
• Há ainda que arguir a anulabilidade que vicia a conduta administrativa
impugnada, pois não é de conhecimento oficioso pelo juiz.

A anulação judicial ou administrativa das condutas anuláveis só poderá dar-se dentro de


um determinado prazo CPA: 163º/3 e 4 e 168º; CCP: 285º; CPTA: 58º/1 e 77º-B

Precludido esse prazo, tais efeitos, apesar de inválidos, já não podem ser removidos da
ordem jurídica tendo como fundamento a sua invalidade geradora de anulabilidade.

A precariedade estrutural dos efeitos feridos de anulabilidade não obsta a que, decorrido
esse prazo sem que tenham sido destruídos ou impugnados judicialmente, se consolidem
na ordem jurídica, sendo contudo controverso que formem sempre “caso decidido
administrativo”.

Passa a existir, a partir da preclusão do prazo de destruição administrativa ou de


impugnação judicial da conduta administrativa, uma presunção inilidível de legalidade.

Acontece aqui uma conversão da anulabilidade em irregularidade, passando essa conduta


administrativa consolidada sem nunca se livrar do pecado original, a ter um fundamento
autónomo de vigência e sendo intocável pelos tribunais.

CPA: 164º A anulabilidade pode ser sanada por intervenção administrativa retroativa,
consubstanciada na ratificação, reforma ou conversão da decisão inválida.
CCP: 283º/3 Sem prejuízo das situações de unilateralidade decisória administrativa,
tratando-se da sanação de contratos administrativos anuláveis, a natureza plurilateral do
ato impõe específicas exigências procedimentais.

De acordo com o princípio da juridicidade a Administração tem o dever de repor a


legalidade perante uma sua atuação inválida, nunca podendo estar vinculada a nada fazer
perante a sua invalidade; contudo não deixa de se verificar que a opção por uma
intervenção anulatória ou de sanação é deixada à margem de discricionariedade,
atendendo às situações concretas.

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Nulidade

Excetuando a inexistência jurídica, a nulidade é o desvalor jurídico que visa sancionar as


violações mais graves da juridicidade pela Administração Pública, o legislador procura
preservar a integridade dos valores, bens e interesses que reputa essenciais no
ordenamento jurídico. Por isso, a nulidade configura-se como “tipo-matriz” das situações
de ineficácia decorrentes da invalidade: a nulidade traduz a intolerabilidade da ordem
jurídica face a uma conduta inválida.

Tradicionalmente, devido à nulidade ser o desvalor-excecional, as situações de nulidade


era apenas as tipificadas na lei, contudo atualmente verificamos uma abertura e
indeterminação dos casos de nulidade.

Sem prejuízo dos eventuais casos de nulidade por natureza, a criação de situações de
invalidade do agir administrativo que gerem nulidade integram o domínio de reserva de
lei, assim regulamento, o contrato ou qualquer outra forma do agir administrativo nunca
podem criar novo casos de nulidade, transformando situações que, nos termos da lei,
seriam de anulabilidade ou introduzir alterações do regime legal da nulidade.

A opção entre os desvalores da anulabilidade e da nulidade face à invalidade do agir


administrativo, envolvendo a ponderação de interesses dos cidadãos e da Administração,
e ainda a modelação de efeitos factuais emergentes de atos nulos são domínio da esfera
do legislador.

A nulidade como desvalor jurídico de condutas administrativas revela neutralidade face


à defesa ou garantia de posições jurídicas dos cidadãos. A nulidade pode beneficiar ou
prejudicar posições jurídicas individuais alicerçadas em condutas administrativas
inválidas, sendo até possível que, em relações multipolares ou poligonais, a mesma
conduta administrativa nula possa ser favorável para uns e desfavorável para outros.
São sempre razões de interesses público, atendendo à necessidade de preservação dos
bens ou valores em causa, que, por efeito de uma lesão resultante de conduta
administrativa deles violadora, levam o legislador a escolher como resposta sancionatório
o desvalor da nulidade.

o Casos de nulidade

CPA: 161º/1 A nulidade obedece ao princípio da tipicidade e da reserva de lei: só os atos


referidos na lei é que podem ser nulos.

Hoje, temos casos de nulidade por natureza: significa que certos atos que não podem
deixar de ser nulos, ainda que o legislador não diga que o são.

Exemplo: Atos administrativos que aplicam normas inconstitucionais

Isto, uma vez que as normas inconstitucionais podem ser declaradas inconstitucionais a
qualquer momento porque não há prazo, o que significa que os atos que aplicam estas
normas podem ser destruídos em qualquer momento. A violação da normatividade

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constitucional não pode ter como desvalor jurídico a anulabilidade, algo que seria
excessivamente benéfico.

Exemplo: se o legislador não pode violar o DUE, a administração não o pode fazer, por
maioria de razão, pelo que os seus atos só podem ser nulos.

No âmbito da atuação administrativa sem natureza normativa e que é regida pelo Direito
Administrativo, a nulidade assume natureza excecional como desvalor das condutas
contrárias ao previsto pelo ordenamento jurídico:

Os atos administrativos são nulos sempre que a lei o diga, existe uma CPA: 161º/2
enumeração genérica de casos de nulidade que compreende vícios incidindo sobre todos
os elementos da estrutura dos atos administrativos vistos anteriormente. Este elenco não
esgota todas as situações de nulidade administrativa CPA: 36º/2 e outros diplomas
especiais. A nulidade pode ter por base uma desconformidade:
• Competência A) e B)
• Vontade F)
• Causa E)
• Objeto C), D), I), J) e K)
• Formalidades e forma G), H) e L)

Os contratos administrativos serão nulos se:


1. CCP: 283º/1 Os atos administrativos procedimentais em que se baseou a sua
celebração também o forem
2. CCP: 285º/1 Tiverem um objeto passível de ato administrativo e o sistema
jurídico cominar a nulidade como desvalor de um ato administrativo com esse mesmo
objeto
3. CCP: 284º/3 A falta e os vícios da vontade tiverem, nos termos do CC, a
nulidade como desvalor jurídico
4. CCP: 284º/2 -> CPA: 161º/2 e 36º/2 se o contrato preencher algum dos casos
geradores de nulidade presentes no CPA
5. CCP: 284º/2 caso o vício determine a nulidade por aplicação de princípios
gerais de Direito Administrativo

Na atividade normativa da Administração, por via do regulamento, a nulidade assume-


se como desvalor-regra CPA: 144º, bem como nos casos em que a atividade
administrativa pautada pelo Direito Privado viole de forma imperativa CC: 294º

o Regime Jurídico

Ao contrário dos casos de anulabilidade, a nulidade determina a CPA: 162º/1 ausência


de produção de efeitos jurídicos, desde o início, não são obrigatórios pelo que não há
autotutela administrativa.

O ato nulo não tem força jurídica, assumindo-se apenas como uma realidade de facto: a
nulidade, sem existir no plano do Direito, apenas existe no domínio dos factos.

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Estamos perante uma “invalidade completa”, visto que perante a gravidade da violação
da juridicidade o sistema reage, negando total e integral eficácia ao ato: tudo se passa
como se o ato nunca tivesse existido.

CPA: 166º/1 a) Devido a não produzirem efeitos jurídicos, os atos nulos não são passíveis
de anulação ou revogação.

As condutas administrativas nulas, que não revistam carácter normativo, não geram
qualquer obrigação de acatamento por parte das estruturas da Administração, bem como
como pelos cidadãos:
• CRP: 271º Os funcionários administrativos não devem obediência a atos nulos,
não podendo, por isso, ser sancionados a nível disciplinar;
• Sem qualquer dever de conformação com o conteúdo de tais atos, a falta de
cumprimento pelos particulares de atos nulos nunca habilita o recurso à autotutela
executiva, antes existindo aqui uma possibilidade de exercício do direito de
resistência por parte dos cidadãos;
• Qualquer medida sancionatória do não acatamento de atos nulos estará ferida de
invalidade.

Todavia, caso situações nulas sejam objeto de execução ou acatamento, num cenário em
que os “efeitos” devem ter-se como nunca produzidos, a nulidade pode envolver
responsabilidade administrativa, civil, disciplinar, política ou financeira criminal.

Deverá existir a reconstituição da situação atual hipotética, como se não tivesse existido
a conduta nula, que gerou obrigações para o seu destinatário e foram por ele cumpridas;

Se os efeitos de facto da nulidade forem irreversíveis e desfavoráveis para o seu


destinatário, a Administração tem o dever de proceder à sua reparação pecuniária.

CPA: 162º/2 Não existe prazo para se declarar a nulidade, ao contrário da anulabilidade.
Com a revisão de 2015 a lei distingue a nulidade invocada (pode ser feita por todas as
pessoas), a conhecida e a declarada (existe uma reserva de declaração de nulidade pelos
tribunais administrativos e pelos órgãos administrativos competentes para o efeito).

Na reserva de declaração de nulidade a favor dos tribunais administrativos e dos órgãos


competentes para a anulação estamos diante de uma área de competência concorrencial
entre o poder administrativo e o poder judicial: trata-se de uma competência paralela e
independente.

Todos os tribunais que não sejam tribunais administrativos devem conhecer e recusar a
aplicação de atos nulos, sem contudo terem possibilidade de proceder à declaração de
nulidade. Duas exceções:
1. Tribunal Constitucional no âmbito da fiscalização sucessiva abstrata da
inconstitucionalidade ou da “ilegalidade equiparada ao regime da
inconstitucionalidade”
2. 2. Tribunais Judiciais, tratando-se de atuação administrativa regida pelo Direito
Privado e que seja nula

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Os órgãos competentes para a declaração de nulidade são:


• Próprio autor do ato, sujeita a condicionamentos e limites provenientes do
princípio da boa-fé
• Seu superior hierárquico
• Órgãos delegante, sendo o ato nulo praticado sob a égide de delegação de poderes
• Órgãos que exerçam poderes de superintendência ou tutela

A declaração de nulidade de contratos, na falta de acordo do outro contratante, assume a


natureza de mera declaração negocial, sendo apenas operativa por via judicial.

A declaração de nulidade tem eficácia retroativa e natureza declarativa, uma vez que vem
apenas reconhecer o desvalor jurídico existente ab initio. Caso a declaração de nulidade
seja emitida por uma autoridade administrativa, mostra-se sempre possível o recurso a
impugnação judicial.

Tradicionalmente, tem-se afirmado que a nulidade é insanável por via de ratificação,


reforma ou conversão; porém, nos últimos anos, veio a admitir-se que a nulidade não
impede a reabilitação de efeitos:
• CPA: 164º/2 Os atos administrativos nulos ser objeto de reforma ou conversão
• CCP: 285º/4 Os contratos administrativos nulos ser objeto de redução ou
conversão
Deve entender-se, todavia que a reforma, a conversão ou a redução apenas operam
perante casos de nulidade parcial, sob pena de estarmos perante uma falsa nulidade.

Não obstante os traços gerais de regime, existem formas atípicas de nulidade, sujeitas a
regimes especiais, que em parte derrogam o enunciado.

O legislador pode sujeitar a invocação da nulidade a determinado prazo, findo o qual a


impugnação judicial ou declaração administrativa de nulidade do ato deixam de ser
possíveis:

• CPA: 144º/2 + CPTA: 74º/2 Regulamentos que, sem serem inconstitucionais,


estão feridos de ilegalidade formal ou procedimental (salvo casos de carência
absoluta de forma legal ou de preterição de consulta pública) encontram-se
sujeitos a um prazo de 6 meses

• CCP: 285º/3 + CPTA: 77º-B/3 Contratos administrativos feridos de falta ou vício


da vontade gerador de nulidade, a sua anulação judicial só pode ser acionada no
prazo de 6 meses, desde a data de cessação do vício

• A natureza atípica pode ainda decorrer de, ao invés de se considerar que o ato é
ineficaz na sua totalidade, se reconhecer que o ato nulo acaba por produzir alguns
efeitos: CPA: 144º/4 é o que sucede em matéria de declaração de invalidade de
regulamentos face a atos que nele tiveram o seu fundamento.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 87


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o Juridificação da nulidade

CPA: 162º/3 Admite, com base na doutrina e na jurisprudência, que atos nulos produzam
efeitos, à luz dos princípios da boa-fé, proteção da confiança, da proporcionalidade e
outros princípios gerais, dando-se relevância ao decurso do tempo.
Isto significa que o ato juridicamente não produziu efeitos, mas de facto, devido a ter
aparência de ser válido produziu efeitos, pelo que o decurso do tempo, a boa fé dos
destinatários e a tutela da confiança podem justificar.

A decisão que reconhece estes efeitos é uma decisão constitutiva, pois introduz alterações
na ordem jurídica e que nos permite tirar conclusões:
• Há uma competência concorrencial entre os tribunais administrativos e as
estruturas decisórias competentes da Administração Pública;
• Além de vinculada aos parâmetros princípio lógicos do procedimento, comporta
limites de conteúdo: nem todas as situações de facto provenientes de atos nulos
são passíveis de atribuição de efeitos jurídicos;
• A existência de relações multipolares ou poligonais implica exigências adicionais
de ponderação de interesses, limitando ou alargando a atribuição de efeitos
jurídicos;
• Em todo o caso, a decisão administrativa de atribuição de efeitos jurídicos a atos
nulos pode sempre ser alvo de impugnação judicial ou de anulação administrativa.

Estes cenários levantam o problema de saber se existe um direito à igualdade na


juridificação (leia-se “atribuição de efeitos”) da nulidade: se a administração reconheceu
efeitos jurídicos a um ato nulo ao senhor A, deve reconhecer os mesmos efeitos ao senhor
B? Paulo Otero diz que sim, por respeito ao princípio da igualdade e ao princípio da
imparcialidade. Havendo lugar ao direito à igualdade na ilegalidade

o Reconstrução operativa da nulidade

Não obstante as reflexões empregues, não se poderá excluir que, num cenário de
impossibilidade ou grave prejuízo de reconstituição da situação atual hipotética
proveniente da produção de efeitos de facto do ato nulo (tornando-se excessivamente
onerosa a situação de facto criada), à luz dos princípios da proteção da confiança e da
proporcionalidade haja fundamento para manter na ordem jurídica os efeitos já
produzidos pelo ato nulo: a declaração de nulidade terá, nesta hipótese, eficácia ex nunc
(apenas para o futuro) assumindo natureza constitutiva.

Equaciona-se se o juiz pode proceder à modelação para o futuro de efeitos de condutas


administrativas nulas.

Por saber fica, caso se responda afirmativamente à interrogação equacionada, se também


os órgãos administrativos gozarão de tal competência modeladora de efeitos de condutas
nulas, CPA: 162º/3 possuem competência para, verificados os respetivos pressupostos,
atribuir efeitos jurídicos a atos nulos;

A decisão administrativa que modelasse tais efeitos, limitando a retroatividade ou


projetando a sua eficácia para o futuro seria sempre passível de controlo judicial.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 88


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Inexistência Jurídica

Historicamente a inexistência jurídica serviu para ultrapassar uma dificuldade: a de não


haver nulidade sem lei, pelo que surge como forma de ultrapassar o princípio da
taxatividade das causas geradoras de nulidade.

A inexistência surge à margem da lei, visando atingir as situações de invalidade ou de


imperfeição que não tinham sanção legal explícita.

Não existe um elenco legal de causas geradoras de inexistência ou um regime legal


específico para este tipo de desvalor.

A inexistência jurídica é um conceito fundamental, permitindo ao juiz opor-se a certos


resultados de condutas administrativas que, por via da nulidade, não encontravam tutela
suficiente ou adequada.

Apesar de não existir um conjunto de requisito, consideramos que a inexistência jurídica


é uma realidade fáctica que o dinheiro não reconhece e nega os efeitos normais, tratando-
se de uma mera aparência de ato.

A inexistência jurídica mostra-se como o desvalor jurídico mais severo que o


ordenamento tem como resposta a violações da juridicidade com maior gravidade:
• A gravidade das situações de inexistência jurídica não se basta com colocar em
causa a validade dos efeitos do ato, atingindo a própria existência dos atos em
causa no mundo do Direito
• Em casos de inexistência jurídica estamos perante o âmbito mais essencial de
valores, bens e interesses que são protegidos pelo sistema jurídico, motivo pelo
qual tais situações assumem quase sempre dimensão constitucional

Autores como Marcelo Rebelo de Sousa, Mário Aroso de Almeida e Vieira de Andrade
afastam a inexistência como um tipo de invalidade mais grave do que a nulidade sob o
argumento de que para que algo seja válido ou inválido tem que existir, cominando a
inexistência a “não existência” de determinado ato não pode haver qualquer juízo de
invalidade.

Outro setor da doutrina composto pelos professores Freitas do Amaral e Paulo Otero
defendem a inexistência como figura autónoma da nulidade, figurando como um desvalor
mais grave- o prof. Paulo Otero diz que existe um imperativo constitucional que justifica
a aplicação da inexistência enquanto desvalor da atuação administrativa.

o Tipologia

O CPA de 2015, embora não faça referência à inexistência, certo é que, abandonou o
entendimento anteriormente perfilhado pelo artigo 133º/1 do CPA de 1991 que cominava
a nulidade a atos “a que falte qualquer dos elementos essenciais”.

Desta forma, “abre-se uma porta” para que situações em que faltem “elementos
essenciais” de determinada atuação administrativa sejam fonte geradora de inexistência
jurídica, ao invés da simples nulidade.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 89


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A indeterminação do que sejam “elementos essenciais” nunca poderá impedir o intérprete


de qualificar a situação e, se for o caso, de a reconduzir a uma situação de inexistência- o
juiz será o último decisor da qualificação.

A falta de elementos mínimos de essencialidade orgânica de um ato provenientes de uma


estrutura da Administração Pública reconduz-se à inexistência jurídica, tal como a falta
absoluta de vontade do decisor é uma situação de inexistência.
Exemplo: o regulamento, o ato administrativo ou contrato celebrado em usurpação de
funções públicas, proveniente de organismos sem existência legal ou praticado por mero
agente administrativo sem habilitação para o efeito.

No mesmo sentido, podem surgir situações tão graves de violação da juridicidade, em


cenários radicais de total carência de elementos mínimos de essencialidade material de
um ato, que se reconduzam à inexistência.
Exemplo: extermínio de seres humano ou o uso de tortura.

o Regime jurídico

Em sentido convergente com esta abertura do CPA de 2015 à inexistência, a legislação


do contencioso administrativo veio, na sequência da reforma de 2015, admitir a existência
de CPTA: 2º/2 a) + 50º/4 ações de declaração de inexistência de ato administrativo e, em
situações idênticas relativas a contratos administrativos, de declaração de invalidade
destes se tiverem objeto passível de ato administrativo e idêntica regulação da situação
concreta CPTA: 77º-B/1

Podemos conduzir a inexistência jurídica a dois casos:


1. Quando a ordem jurídica não reconhece um mínimo de identificabilidade das
situações enquanto deliberações de um órgão administrativo;
2. Quando a administração pratica atos, aplicando uma lei que está ferida de
inexistência jurídica.

A ausência de um regime legal para a inexistência jurídica faz com que, às condutas
administrativas feridas de inexistência jurídica, se aplique o regime da nulidade:

Semelhanças Diferenças
Atos inexistentes não produzem efeitos jurídicos Não são passiveis de
Não há presunção de legalidade, nem dever de obediência reforma ou conversão
Não são objeto de execução especifica Não podem reconduzir à
É invocável a todo o tempo e declarada pelos tribunais produção de efeitos
Podem surgir efeitos jurídicos atípicos como a possibilidade tendo em vista a boa-fé,
de responsabilidade civil, política, disciplinar e financeira tutela de confiança etc
pela prática de atos inexistentes

Os casos de inexistência nunca podem levar à atribuição de efeitos jurídicos, por força
dos princípios da boa-fé, proteção da confiança e proporcionalidade, tendo em conta o
decurso do tempo: CPA: 162º/3 seria assim inaplicável a estas situações.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 90


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Paulo Otero considera que não se pode negar a possibilidade de atribuição de efeitos
jurídicos à luza dos princípios já referidos.

Desta forma, as mesmas razões podem ser invocadas perante situações de facto
constituída sob a égide de condutas administrativas inexistentes:
• Especialmente, em situações de inexistência derivada ou consequente, apesar da
ausência do dever de obediência administrativa a normas feridas de inexistência,
se tais normas “habilitantes” tiverem sido alvo de uma aplicação reiterada e
pacífica, a sujeição a atos emanados ao seu abrigo aos princípios gerais
emergentes do 162º/3 pode tornar-se imperativo de justiça e da igualdade inerente
à unidade do sistema jurídico;
• Haverá aqui um possível espaço de modelação de efeitos de situações de
inexistência, falando-se em “inexistência atípica”.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 91


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REABILITAÇÃO DOS EFEITOS INVÁLIDOS

Qual o fundamento que leva a que atos cujos efeitos são inválidos podem ser
aproveitados pelos atos jurídicos?

A possibilidade de destruição retroativa de condutas administrativas inválidas mostra-se


suscetível de lesar a segurança jurídica e a proteção da confiança, bem como por vezes
ser de todo em todo irrealizável sem que se viole o princípio da proporcionalidade:
• As ideias de estabilidade das relações constituídas e o preservar da ordem poderá
justificar, de acordo com juízos de proporcionalidade, a reabilitação de efeitos
inválidos.
• A reabilitação de efeitos de condutas administrativas ilegais, combatendo a
rigidez dos desvalores jurídicos das situações de invalidade, ilustra uma
suavização das regras de regime da invalidade.

A reabilitação de efeitos administrativos inválidos é a expressão de valores alicerçados


na Constituição.

CRP: 282º/4 figura como uma manifestação de conservação ou aproveitamento de efeitos


inválidos, traduzindo a importância da segurança jurídica, equidade e interesse público
de excecional relevo na ressalva ou modelação de efeitos decorrentes da aplicação de
normas inconstitucionais.

Se assim é nos casos de violações da constituição o mesmo tinha de acontecer no mero


direito ordinários

Noutro sentido, a existência de um princípio de economia dos atos jurídicos impede a


inutilização de tudo o que se possa aproveitar de condutas inválidas, conjuntamente com
a aplicação do princípio da proporcionalidade nas vertentes da adequação e proibição do
excesso, permitindo-se a reabilitação de efeitos inválidos das condutas administrativas.

Através da reabilitação de efeitos inválidos, a ordem jurídica “chama a si” (assimila) os


efeitos inválidos, por via de conversão, sanação ou modulação, num procedimento de
transformação de uma atuação administrativa inicialmente desconforme, mas que
posteriormente passará a produzir efeitos permitidos e “aceites” pelo ordenamento: a
reabilitação permite que condutas inválidas possam manter-se na ordem jurídica, sem
poderem ver questionada a sua desconformidade com a legalidade administrativa.

A reabilitação de efeitos administrativos inválidos pode ter, no plano temporal, dois tipos
de incidência:
Eficácia ex nunc: a partir de um determinado momento para o futuro, os efeitos das
condutas desconformes passam a estar reabilitados;
Eficácia ex tunc: determina que, desde o início, em termos retroativos, se dá a
reabilitação dos efeitos inicialmente inválidos.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 92


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Intervenção do legislador
Validação superveniente ou sucessiva

Dá-se quando a lei vem remover retroativamente o obstáculo que invalidava a conduta
administrativa ou os efeitos decorrentes de tal invalidade, tudo se passando como tais
efeitos nunca tivessem existido, havendo aqui uma validação superveniente de efeitos
inicialmente inválidos.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo admite, atualmente, de forma
expressa a possibilidade de regularização de situações criadas na sequência de atos nulos.
A lei que procede à validação retroativa de efeitos inválidos da conduta administrativa
pode assumir dupla operatividade:
• A convalidação dos efeitos da conduta administrativa;
• A sanação dos vícios dos atos praticados ou, pelo menos, o restabelecimento da
presunção de legalidade desses mesmos atos.

A lei pode proceder a tal validação por via direta, ou seja, a própria lei dispor de forma
expressa sobre o ato, a competência do órgão, etc. ou pode fazê-lo por via indireta:
• Por via de lei interpretativa, o legislador pode proceder a uma interpretação da lei
anterior, num sentido conforme ao adotado pelo agir administrativo, afastando,
deste modo, um sentido diferente acolhido pelos tribunais e invalidante da
conduta administrativa3;
• A lei estabelecer uma vinculação para os órgãos administrativos converterem,
reformarem ou ratificarem anteriores atos inválidos, excluindo a possibilidade da
sua anulação administrativa;
• A lei impor aos tribunais a salvaguarda dos efeitos favoráveis já produzidos pelas
condutas inválidas submetidas à sua apreciação ou através do pagamento de justa
indemnização, ser compensada a manutenção de efeitos inválidos (esta solução é
de constitucionalidade duvidosa).

A admissibilidade deste tipo de intervenção encontra limites:


1. A validação nunca pode ser feita com sacrifício das normas constitucionais e
internacionais relativas a direitos fundamentais, à separação de poderes e às
reservas de competência legislativa fixadas na mesma;
2. A validação não pode dar-se se estivermos perante a violação de atos de Direito
da União Europeia vinculativos para os Estados-membros ou, especificamente,
Portugal;
3. Caso sejam leis de validação com eficácia retroativa, está vedada a retroatividade
das normas que traduzam a restrição do exercício de direitos fundamentais, bem
como aquelas que imponham sacrifícios de natureza pessoal ou patrimonial, além
das normas em que a retroatividade se mostre arbitrária ou desproporcionalmente
onerosa da segurança e proteção da confiança;
4. A retroatividade nunca pode pôr em causa do direito de acesso aos tribunais contra
as condutas administrativas ilegais, de acordo com a tutela jurisdicional efetiva,
nem impedir ações de indemnização decorrentes das lesões ocorridas por efeito
da invalidade da conduta objeto de convalidação.

3
Caso suceda estar em curso um determinado processo judicial envolvendo a aplicação de certa norma, a
criação de uma lei interpretativa com o propósito de resolver essa situação concreta poderá haver aqui uma
situação de desvio de poder legislativo ou inconstitucionalidade finalística quanto ao exercício do poder,
sem prejuízo dos efeitos da separação de poderes.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 93


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Intervenção administrativa
Sanação de efeitos ilegais

A Administração perante uma conduta sua da qual resulte ilegalidade ou que seja ilegal
tem, de acordo com o princípio da juridicidade, um dever de repor a legalidade.

Para tal pode optar por uma de duas vias:


• Anular ou declarar a nulidade (ou inexistência) de anterior conduta
• Proceder a um aproveitamento parcial da conduta viciada, desencadeando a
sanação da invalidade dos seus efeitos.

A escolha da via da sanação de efeitos inválidos, sem prejuízo de poder resultar de uma
pretensão formulada pelos cidadãos, deve envolver à luz do princípio da
proporcionalidade:
• A sanação considera-se excluída se, atendendo aos interesses em presença, as suas
desvantagens são superiores às que resultariam da anulação (ou declaração de
nulidade) do ato;
• A sanação pressupõe uma valoração e ponderação do interesse público em manter
e reabilitar os efeitos de condutas originariamente inválidas.

Não é possível a anulação ou sanação de atos que já tenham sido objeto de anulação
contenciosa: qualquer um daqueles mecanismos pressupõe a persistência de efeitos na
ordem jurídica.

CPA: 164º/5 Em princípio, a intervenção administrativa que reabilita efeitos inválidos


tem eficácia retroativa, retroagindo à data da conduta sobre a qual incide, com as
seguintes limitações:
1. É necessário que não tenha ocorrido alteração do regime jurídico, caso em que se
admite limitar a retroatividade;
2. Todavia, existe a possibilidade de destruição dos efeitos lesivos anteriores,
independentemente de alteração legislativa, se se encontrar um processo
impugnatório pendente e os atos forem constitutivos de posições jurídicas
passivas ou sancionatórios.

A reabilitação administrativa com o intuito de sanar uma anterior conduta pode dar-se
através das seguintes formas de expressão: Ratificação, Reforma, Conversão, Anulação
ex nunc.

A ratificação encontra-se circunscrita às condutas feridas de anulabilidade CPA: 164º/2


a contrario) e pode visar a reabilitação em dois cenários distintos.

Em casos de incompetência relativa, permitindo ao órgão competente sobre determinada


matéria, anteriormente objeto de decisão por um órgão incompetente, confirmar e adotar
essa conduta como sua;

Em casos de vício de forma que não se reconduzam à nulidade ou inexistência, a repetição


do ato respeitando-se agora a formalidade preterida ou invertendo-se a sequência da sua
ordem procedimental, fazendo o órgão cujo ato autorizativo preterido venha a intervir a
posteriori, sana a conduta inválida.
Exemplo: não ter a deliberação sido tomada por escrutínio secreto

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 94


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

A reforma, consubstanciando uma redução da conduta inválida, devido ao efeito de lhe


expurgar a parte anulável ou nula pressupõe a divisibilidade da conduta e a viabilidade
sólida da sua parte válida.
Traduz-se num sacrificar parcial do conteúdo ou objeto, que permite conservar a parte
sem ilegalidade, reconstruir com eficácia ex tunc uma nova solução decisória,
Exemplo: supressão de cláusulas acessórias contrários à legalidade

A conversão evidencia-se como um aproveitamento da parte não viciada de uma anterior


conduta administrativa, que permite através desses elementos já existentes e válidos
construir um novo tipo de decisão administrativa, há aqui um conteúdo novo.
Exemplo: transformação de uma nomeação definitiva em provimento interino ou de uma
concessão ilegal numa licença precária

A conversão está, no entanto, sujeita a limites:


• É necessário que a conversão vise o mesmo fim e tenha um resultado análogo ao
ato convertido, podendo afirmar-se que o novo ato deverá estar implicitamente
contido no ato originário ou haver fungibilidade entre a função de ambos;
• Se o novo ato se relacionar com um procedimento decisório distinto ou se o ato
convertido for a expressão de um poder vinculado e o ato de conversão
manifestação do exercício de um poder discricionário, não será possível a
conversão.

CPA: 171º/3 2ª parte A anulação administrativa ex nunc possibilita a cessação de


efeitos de uma anterior conduta administrativa inválida não tenha carácter retroativa.
Desta forma, habilita que o seu autor apenas lhe atribua eficácia para o futuro, de forma
a salvaguardar direitos adquiridos, consubstancia uma forma de modulação
administrativa dos efeitos da anulação.

O CPA absteve-se de traçar um regime próprio da ratificação, reforma e conversão,


remetendo parcialmente para o regime da anulação administrativa CPA: 164º/1

Não obstante a centralidade do regime da anulação administrativa, a verdade é que a


remissão legal se circunscreve às normas que regulam a competência e a tempestividade.

Em situações de vinculação bilateral, haverá que se proceder a uma ponderação aplicativa


dos princípios emergentes do CCP.

Em qualquer dos casos, o regime do aproveitamento de efeitos inválidos de condutas


administrativas nunca poderá deixar de ter presentes os princípios gerais do CC em
matéria de redução e conversão dos negócios jurídicos.

A “ratificação” de um ato nulo ou inexistente, bem como a “reforma” ou “conversão” de


um ato integralmente nulo ou inexistente poderá ser interpretada no sentido como a
conclusão de uma nova decisão com igual objeto ou conteúdo:
1. Salvo se essa nova conduta se encontrar também ferida de nulidade ou de
inexistência integral, o aproveitamento dessa reconstrução alicerçar-se-á no
princípio da conservação;

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 95


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

2. O erro sobre os pressupostos (: pensar que estava perante um ato anulável) ou na


qualificação da intervenção administrativa (: pensar que eram uma ratificação,
reforma ou conversão genuínas) não impedirá o aproveitamento dos seus efeitos;
3. O princípio do aproveitamento ou da conservação dos atos tem, neste sentido,
prevalência operatória face ao erro nos pressupostos ou erro na qualificação do
agir administrativo sobre a invalidade.

Intervenção judicial
Modulação de efeitos

Uma forma clássica de modulação de efeitos inválidos encontra-se nas figuras da redução
e da conversão dos atos jurídicos, enquanto mecanismos destinados ao aproveitamento
de atuações ilegais.

O juiz tem como base para tal os princípios gerais CC: 292º e 293º, podendo reduzir ou
converter condutas administrativas anuláveis ou nulas, sejam elas pautadas pelo Direito
Privado ou pelo Direito Administrativo.
Desta forma as figuras da conversão e da redução (ou reforma) não se mostram de índole
exclusivamente administrativa.

Além destas situações, a intervenção judicial, por via de regra, assume uma função
destrutiva dotada de efeitos retroativos perante situações de invalidade da atuação
administrativa, não sendo, todavia, de afastar que os tribunais possam modular os efeitos
destrutivos da retroatividade.

Trata-se de uma solução que se fundamenta num princípio geral CRP: 282º/4 e que, por
maioria de razão, se estende também às situações de nulidade e anulabilidade
administrativas: há valores do sistema jurídico que permitem ao juiz reabilitar efeitos
inválidos do agir administrativo.

O Direito ordinário positivou, entretanto, diversas normas que, quanto às principais


formas de atuação administrativa, conferem ao juiz poderes de modulação de efeitos
inválidos:
• Regulamentos CPTA: 76º/2
• Atos administrativos CPA: 162º/3 e 163º/5
• Contratos administrativos CCP 284º/4 e 283º-A/ 2 a 5

Já antes destas consagrações o STA havia ensaiado o efeito modulador de atos inválidos,
por via do princípio do aproveitamento dos atos.

Nem se poderá excluir que, à semelhança do que já foi feito pelo TC ao protelar os efeitos
da inconstitucionalidade de disposições legais para o futuro numa declaração com força
obrigatória geral4, que também a modelação de efeitos de situações administrativas
geradoras de anulabilidade ou nulidade administrativa possa ser remetida para o futuro.

4
Acórdão do TC nº 353º/12, de 5 de julho de 2012

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 96


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Decurso do tempo

Numa primeira aproximação, em conjugação com expressa disposição legal, verifica-se


que o decurso do tempo pode suprir a falta de algumas formalidades, como a CPA: 92º/5
exigência de pareceres obrigatórios ou mesmo vinculativos CPA: 92º/6

Num sentido mais profundo, a simples passagem do tempo pode reabilitar efeitos
inválidos de conduta administrativa em três diferentes cenários:
• Anulabilidade, por efeito da preclusão do prazo para a sua invocação judicial ou
para a anulação administrativa das condutas em causa;
• Nulidade, se existir um prazo para a sua arguição num cenário de “nulidade
atípica”, ou permitindo até que, conjugado com outros princípios do ordenamento,
se possam atribuir efeitos jurídicos a condutas nulas, justificando-as;
• Inexistência derivada ou consequente, o decurso do tempo pode conduzir à
atribuição de certos efeitos jurídicos.

O decurso do tempo não tem, todavia, como efeito fazer sanar a invalidade em causa,
tornando as condutas e os seus efeitos válidas.

Observa-se que o poder judicial deixa de poder controlar os efeitos da anulação, bem
como a Administração deixa de poder proceder à sua anulação (nunca se tornando a
conduta ou os efeitos válidos).

A atribuição, a título excecional, de efeitos aos casos de nulidade ou de inexistência


derivada, por decurso do tempo, sempre em acordo com outros princípios do
ordenamento, não elimina a invalidade das condutas, antes habilitando a tutela da
aparência e proteção da confiança.

Visto isto, mostra-se possível recortar, no interior do sistema jurídico, tendo como
referência os efeitos do decurso do tempo sobre os efeitos das condutas administrativas
inválidas, dois modelos de juridicidade administrativa:

Há uma juridicidade aplicável nos limites de um prazo de tempo por ela fixado
(“juridicidade típica”) e haverá, em termos sucessivos, uma juridicidade que surge por
efeito do decurso do tempo, afastando-se a aplicação dessa primeira juridicidade- fala-se
agora em “juridicidade atípica”;

A “juridicidade típica” e “juridicidade atípica” são ambas partes integrantes do sistema


jurídico, relacionando-se através da ideia de eficácia temporal sucessiva.

Estes tipos de juridicidade não esgotam a totalidade do sistema jurídico, uma vez que
existe uma parcela do mesmo cuja violação se mostra imune à passagem do tempo,
falando-se uma “juridicidade atemporal”: são zonas de essencialidade normativa dentro
do sistema jurídico, preservada da intervenção “corrosiva” da passagem do tempo e cuja
invalidade é sancionável com a nulidade ou a inexistência jurídica e nunca passível de
atribuição de quaisquer efeitos jurídicos- aqui reside o “núcleo duro” da juridicidade
administrativa, que vincula o seu agir, sendo o ius cogens administrativo.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 97


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

PROCEDIMENTO DOS REGULAMENTOS5

TITULARIDADE
Quem pode emanar regulamentos

No Direito Administrativo do século XXI, um dos grandes problemas que se coloca é


saber quem são os titulares do poder regulamentar: a complexidade inerente à estrutura
de uma Administração multiforme e multifacetada, a emergência de uma panóplia de
novos entes administrativos e o movimento de atribuição de poderes de autoridade a
entidades privadas com funções administrativas implicam um cenário de grande
dificuldade e que tem que ser aproximado com as devidas cautelas.

CPA: 142º/1 O princípio do paralelismo da competência diz-nos que quem tem


competência para emanar um regulamento tem competência para o interpretar, modificar
e suspender estes atos estes que devem ser feitos por um outro regulamento.

Podemos, assim, começar por abordar de que forma é conferida a titularidade de


competência regulamentar, quais as suas fontes?

Competência regulamentar fundada na Constituição da República

Esta competência delimita o poder legislativo, pois este não pode invadir os espaços
designados pela Constituição para as entidades públicas menores. E caso o Estado o faça
por via legislativa, haverá usurpação de poderes.

o Governo

CRP: 199º b) para executar as leis

CRP: 199º g) Independente, tem o poder de fazer regulamentos que visam implementar,
dar expressão a um conjunto de matérias, dando origem aos decretos regulamentares do
Governo em vez de Decreto lei.

Existem requisitos para que se possa fazer o decreto regulamentar:


1. Não existir reserva de lei
2. A matéria não ter sido objeto de ato legislativo anterior, pois o regulamento não
poderá modificar

Nestas áreas fora da reserva de lei as vantagens de optar por decreto regulamentar em vez
de decreto lei são três:
• Não estar sujeito a fiscalização preventiva
• Não pode ser objeto de apreciação parlamentar
• Se for um Governo de coligação não precisa de ir a Conselho de Ministro,
sendo suficiente para a sua aprovação a assinatura de Primeiro-Ministro e
dos ministros competentes em função da matéria.
5
Apontamentos realizados maioritariamente com base nas aulas teóricas, usando como manual de apoio Diogo
Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, 4ª edição, Almedina, Páginas 177 a 192

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 98


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

o Regiões Autónomas

A competência legislativa das Regiões Autónomas divide-se entre o Governo Regional e


a Assembleia Legislativa Regional, o estatuto político administrativo determina qual tem
competência em que circunstâncias e sobre que matérias.

CRP: 227º/1 d) Regulamentar as leis da república caso o poder regulamentar não seja
reservado ao Governo pela Assembleia. Esta regulamentação é competência exclusiva da
Assembleia da RA e a regulamentação reveste a forma de decreto legislativo regional
para permitir pela forma o representante da república possa suscitar a fiscalização
preventiva, prevalecendo a forma sob o conteúdo

CRP: 227º/1 d) Nas leis que não reservem a competência regulamentar ao Governo a
regiões podem regulamentar, falamos da própria legislação regional. As regiões
autónomas têm exclusividade para regular os decretos legislativos regionais.

CRP: 231º/6 O Governo regional tem competência regulamentar exclusiva quanto à sua
organização e funcionamento, nesta matéria o diploma tem de ser assinado pelo
Representante da República, se este o vetar politicamente o veto é absoluto. O Governo
nunca poderá converter o diploma em proposta de decreto legislativo regional a
apresentar à Assembleia, procurando superar o veto, devido a ser sua competência
exclusiva.

o CRP: 241º Autarquias Locais

A competência é conferida pela constituição mas só pode ser exercida se a lei atribuir e
nos termos em que a lei em concreto atribuir ou seja, a autarquia não pode invocar a CRP
para elaborar um regulamento, pois a sua competência tem de ser mediada por um ato
legislativo.

Os municípios têm competência e tanto pode ser excedia pela Assembleia Municipal
como pela Câmara municipal. As freguesias têm competência regulamentar da
Assembleia e da Junta consoante a matéria nos termos da lei que define as atribuições das
autarquias locais.

o CRP: 76º/2 Universidades Publicas

A Universidades privadas também tem mas não fazem parte da Administração Pública.
Esta competência limita o poder legislativo, pois este não pode esgotar a competência
regulamentar das universidades que tanto no plano estatutário, pedagógico,
administrativo como financeiro é um direito fundamental das próprias universidades.

o CRP: 267º Associações Públicas

As Associações Públicas que são profissionais como a ordem dos advogados tem
competência regulamentar exclusiva em matéria deontológicas, pelo que as regras éticas
do exercício daquela profissão é reservada à ordem.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 99


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Competência regulamentar conferida pela lei ordinária

Será admissível a transferência legal / delegação do poder regulamentar conferido pela


constituição a outras estruturas que não aquelas?
CRP: 111º/2 Consagra o princípio da imodificabilidade da competência constitucional
pelo que nenhuma lei pode alterar as regras que a constituição define em matéria de
atribuição de competências, nomeadamente a competência regulamentar.

Por vezes verifica-se, sobretudo nas autoridades administrativas independentes, que nas
respetivas leis orgânicas, que instituem as autoridades, se atribui diretamente o poder de
executar a lei. Paulo Otero considera inconstitucional pois CRP: 199º/b) atribui ao
Governo o poder de proceder à boa execução das leis por via regulamentar e esta só pode,
nos termos da constituição, ser exercida pelas Assembleia Legislativas das Regiões
Autónomas caso a lei em causa não reserve o poder regulamentar ao Governo

Assim, para Paulo Otero não é possível uma autoridade administrativa independente
recorrer a uma execução regulamentar direta com exclusão do Governo, pois este tem
sempre a possibilidade de sobre a matéria de uma lei emanar uma norma regulamentar,
nem que seja a norma que defina quando poderá a entidade administrativa independente
exercer o poder regulamentar.

Todas as estruturas decisórias da Administração indireta, periférica e autónoma, que não


sejam autarquias locais, Universidade nem Associações Publicas, ou seja, desde que a
competência não emane diretamente da Constituição da República portuguesa tem
competência regulamentar conferida pela lei ordinária. Podemos ir mais longe dizendo
que todas as entidades publicas tem sempre competência regulamentar.

Competência alicerçada em normas de base consuetudinária

o Competência regulamentar interna no âmbito da estrutura hierárquica

Todos os superiores hierárquicos têm o poder de emanar instruções/circulares sobre a


atividade a desenvolver pelos subalternos, sendo um poder típico do poder de direção.
As ordens não mas as instruções ou circulares são regulamentos.
Está baseado que na ausência da lei há a hierarquia interna

o Poder de auto-organização interna dos órgãos colegiais

Traduz-se na possibilidade que os órgãos colegiais tem de emanar regulamentos que


estruturem o seu funcionamento e atuação.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 100


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

FORMALIDADE E FORMA
Que caminho e designação podem ter os regulamentos

Especificidades do procedimento de elaboração de um regulamento

CPA: 97º/1 É possível que a feitura de um regulamento seja resultado da vontade dos
interessados, estes podem desencadear o procedimento.

CPA: 98º Publicitar que foi iniciado um processo de elaboração de um regulamento.

CPA: a 101º É publicitado para que os interessados, tanto na aprovação como


reprovação, poderem vir ao procedimento. Pode ser feito por duas vias:
CPA: 100º Audiência
CPA: 101º

CPA: 99º O projeto deve ser publicitado com uma nota justificativa que explica o porque
da necessidade do regulamento e quais as inovações que este pretende trazer

CPA: 139º

Pode revestir vários tipos de forma, no que toca aos regulamentos do Governo pode ter:
• Decreto-regulamentar
Sendo a mais solene pois trata as matérias mais importantes e porque são objeto de
promulgação do Presidente da República, ficando com solenidade semelhante aos
decretos-leis.
• Resoluções do Conselho de Ministros
O Governo CRP: 182º é simultaneamente um órgão politico mas também superior da
administração publica.
• Decreto Simples
• Portarias
• Despachos

No caso das regiões autónomas o Decreto Legislativo Regional é a forma mais solene
que as Regiões têm para exercer a sua competência regulamentar, sendo a forma utilizada
para regulamentar as leis da república.

Outras formas que podem existir do exercício da competência regulamentar são as


Posturas Municipais, emanadas pela Câmara, os Estatutos Universitários e ainda as
instruções ou diretivas.

CPA: 144º/2 A ilegalidade só pode ser impugnada ou declarada com preterição de


formalidade ou procedimento no prazo de 6 meses a contar da publicação.
Exceção 1: Não se aplica se for situação de inconstitucionalidade pois a impugnação neste
caso pode ser feita a todo o tempo.
Exceção 2: Se a violação da norma corresponder a uma carência absoluta de forma legal
ou existir a preterição da consulta publica não há prazo para a ilegalidade ser impugnada.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 101


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

VALIDADE E EFICÁCIA
O que é preciso para o regulamento produzir efeitos

CPA: 143º determina duas exigências de conformidade dos regulamentos com a


legalidade, o Direito Internacional, Constituição da República Portuguesa, etc.
Mas tem ainda de ser compatíveis com a própria normatividade resultante da
Administração Pública, criando-se uma hierarquia entre os regulamentos, os subalternos
devem-se subornar aos superiores, os da administração autónoma devem estar
subordinadas aos de natureza estatutária.

CPA: 138º Nem todas as normas têm o mesmo caracter, estabelecendo-se uma hierarquia
entre os regulamentos que estipula certas prevalências:
• Em matéria concorrencial prevalecem os regulamentos do Governo sobre os das
autarquias ou das regiões.
• O regulamente proveniente do município prevalece aos das freguesias

CPA: 138º/3 Regras de prevalência entre os regulamentos do Governo.


1. Decretos regulamentares
2. Resoluções do conselho
3. Portarias
4. Despachos
Esta relação de prevalência não faz esquecer a relevância do conceito das normas
especiais que podem derrogar relações de prevalência.

CPA: 142º/2 Regra com larga tradição que diz que há sempre dos regulamentos sobre os
atos administrativos, traduzindo-se no princípio da inderrogabilidade singular (no caso
concreto) dos regulamentos.
Exemplo: Existe o regulamento A, posteriormente é emanado o ato administrativo B e
este tem um conteúdo incompatível com o regulamento A, o B apesar de ser posterior não
derroga o que for estatuído pelo A, sendo o B inválido e ilegal.

CPA: 146º/2 Diz que se uma lei está a ser executada por um regulamento, este não pode
ser objeto de revogação simples, pois significaria que a lei que estava a ser executada
deixa de poder continuar a ser executa, assim a lei deixaria de poder ser aplica aos casos
concretos pois desaparece o regulamento que viabilizava a execução da lei.

Contudo não é proibida a revogação substitutiva do regulamento.


Exemplo: A lei Y está a ser executada pelo regulamento A, este não pode ser revogado
pelo regulamento B que diz apenas “o regulamento A é revogado” o regulamento b seria
ilegal, contudo pode existir o regulamento B que tenha uma nova disciplina da matéria,
substituindo o conteúdo dispositivo do regulamento A, este é válido pois permite
continuar a dar execução à lei.

CPA: 137º Quando uma lei não fixa um prazo para ser executada, quando não determina
um prazo para ser emanado um regulamento de execução, considera-se que o prazo é de
90 dias, e se após esse tempo não for emanado o regulamento a Administração entra numa
situação de omissão regulamentar ilegal e inválida. Caso o cidadão se sinta prejudicado
pela omissão do regulamento pode dirigir-se à Administração solicitando a execução ou
a um Tribunal para que este condene a AP à execução do regulamento.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 102


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Invalidades do regulamento

Invalidade por ação distingue-se da invalidade por omissão, correspondendo à situação


anteriormente descrita de inexistência do regulamento.

Nos casos de invalidade por ação, à invalidade sempre que se desrespeitam as proibições,
ou seja casos as normas de natureza imperativa sejam afastadas pela administração a
quando a emanação de um regulamento.

Regra Geral: CPA: 144º/1 A invalidade é invocável a todo o tempo, podendo igualmente
ser declarada a todo o tempo.
Exceção: CPA: 144º/2 A Ilegalidade formal ou procedimento que se reconduza a
uma situação de inconstitucionalidade é invocável a todo o tempo, contudo nos casos de
invalidade que não seja ilegal o prazo é de 6 meses após publicação do regulamento. Após
estes 6 meses a ilegalidade consolida-se na ordem jurídica.
Exceção da exceção: pode a todo o tempo ser invocável a ilegalidade
formal ou processual se esta disser respeito à carência absoluta de forma legal ou
se não tiver existido consulta pública no procedimento de feitura.

CPA: 144º/3 e 4 Trata dos efeitos da declaração de invalidade, tendo um regime


decalcado da Constituição da República Portuguesa.

A declaração administrativa da invalidade de um regulamento tem natureza retroativa


conduzindo à repristinação do regulamento que tenha sido revogado, sendo esta possível
apenas se também ele não for ilegal, evitando-se que a emenda seja pior.
Exemplo: Regulamento A é revogado pelo regulamento B, este vem a ser declarado
inválido, pelo que o regulamento A se for válido volta a produzir efeitos.

A retroatividade da declaração de invalidade do regulamento não prejudica, não lesa, os


casos julgados que aplicaram esse regulamento, nem os atos administrativos que
praticados ao abrigo desse regulamento se consolidaram na ordem jurídica.
Execção: se o ato administrativo for mais favorável ao particular também os atos
administrativos que estariam consolidados podem ser destruídos.

CPA: 139º Exige a publicação do regulamento para a sua eficácia

CPA: 141º Estabelece o princípio geral da proibição da eficácia retroativa

A eficácia do regulamento ode ser suspensa devido a uma clausula acessória

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 103


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

CESSAÇÃO DE VIGÊNCIA
Como é que um regulamento deixa de produzir efeitos

Revogação

CPA: 146º A revogação do regulamento pode ocorrer de acordo com o princípio geral de
que os regulamentos são revogáveis.
Contudo há casos em que não é admissível a revogação, nomeadamente a revogação
simples caso esta determina a impossibilidade de execução da lei.

Quem tem competência para revogar?


Em princípio compete ao autor do auto, devido à competência dispositiva, existindo a
exceção de que entre o período de elaboração e revogação o órgão tenha perdido os
poderes sobre a matéria.
Exemplo: era um órgão delegado sendo que o delegante revogou a delegação

É possível a revogação por um terceiro órgão desde que esse exerça poderes revogatórios
sobre o órgão que foi autor do regulamento.
Exemplo: um superior hierárquico pode revogar o regulamento do subalterno.

Declaração administrativa da invalidade

CPA: 144º/ 1 a 4 Significa que a administração olha para o regulamento e considera que
afinal não é conforme pela ordem jurídica, chegando a essa conclusão sozinha ou devido
a uma constatação dos particulares, seguida de uma ponderação da Administração.

Permite que a administração em vez de revogar, ou seja cessar os efeitos, por uma questão
de ilegalidade e não de mérito.

Caducidade

CPA: 145º/1 Verificando-se o termo final ou condição resolutiva

Caso desapareça a situação material objeto do mesmo, havendo esgotamento do objeto.


Exemplo: o regulamento trata de pensões a viúvas da primeira regra mundial, quando
morrer a última viúva esgota-se o objeto do regulamento.

CPA: 145º/3 O regulamento de exceção de uma lei depara-se com a revogação da lei que
executa, não sendo substituída por outra, o regulamento caduca.

Intervenção do legislador

Casos haja uma revogação simples da lei que fundamenta o regulamento de execução

Quando haja uma revogação substitutiva da lei que fundamenta o regulamento.


Exemplo: A lei A é executada pelo regulamento B, contudo é revogada pela lei C, o que
acontece ao regulamento B?

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 104


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Regra Geral: cessa a sua vigência no caso de incompatibilidade superveniente, ou seja


caso o regulamento b seja desconforme com a lei C.
Exceção: se não se verificar incompatibilidade o regulamento B mantém-se em
vigor à luz do princípio de economia processual sob pena de deixar sem execução
imediata a lei C, sendo possível a qualquer momento a substituição do regulamento B.

Poderá o legislador proceder a uma revogação exclusiva e direta do regulamento? Não é


invalidade, não é caducidade mas sim um propósito imediato do ato legislativo em colocar
termo à vigência do regulamento.

Se o órgão que emanou a lei de cessação é a Assembleia da República, Paulo Otero


considera que não pode ocorrer uma lei que tenha como objetivo exclusivo revogar um
regulamento, devido à violação da separação de poderes, sendo a lei inconstitucional.

Se o órgão que emanou o decreto-lei de cessação é o Governo, Paulo Otero acha que pode
ocorrer, contudo apenas relativamente às matérias em que tem competência regulamentar,
no caso de emanar um decreto que cesse a vigência de um regulamento que não seja sobre
matéria da sua competência o ato está ferido de incompetência absoluta.
Exemplo: O Governo não pode fazer cessara vigência de um regulamento do Governo
Regional que execute uma lei da Assembleia Regional, pois iria invadir a esfera das
atribuições das Regiões Autónomas

Intervenção Judicial

o A declaração de ilegalidade pelos Tribunais Administrativos

CPTA: 73º/ 1 e 2 Os regulamentos de operatividade imediata, que não depende de ato


administrativo para serem executados, podem ser objeto de cessação imediata.
CPTA: 73º/4 Se um ato administrativo praticado ao abrigo de um regulamento de
operatividade mediata for declarado ilegal em três casos concreto, após isso é possível
que esse regulamento seja objeto de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral.

Quais os efeitos?
CPTA: 76º São semelhante ao CRP: 282º
A declaração é retroativa e determina a repristinação mas salvaguarda os casos julgados,
os atos administrativos inimpugnáveis e as situações em que se permite que por razoes de
interesse público, segurança jurídica ou equidade os Tribunais Administrativos possam
restringir a repristinação. Quanto às decisões que se mantêm na ordem jurídicas permite-
se que as soluções mais favoráveis aos particulares possam prevalecer ou ser destruídas.

o A declaração de inconstitucionalidade ou ilegalidade pelo Tribunal Constitucional

CRP: 281º no caso da fiscalização sucessiva abstrata das leis.

Os efeitos são os do CRP: 282º

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ATO ADMINISTRATIVO

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PRINCIPAIS ESPÉCIES DE ATOS ADMINISTRATIVOS

Atos Constitutivos

Os atos constitutivos, em oposição aos declarativos, introduzem alterações na ordem


jurídica. Podem reportar-se a uma primeira decisão sobre determinada decisão, sendo
estes os primários ou ter como objeto alterar, ou seja, incidem sobre anteriores relações
jurídicas concretas, tendo por objeto um ato anterior ficando designados por atos
secundários.

o Atos Primários

Reportar-se a uma primeira decisão sobre determinada decisão.

• Atos impositivos

O conteúdo determina imperativamente uma conduta ou a sujeição do seu destinatário a


determinados efeitos. Podem configurar três categorias: ablativos, obrigacionais e
sancionatórios.

Os ablativos prendem-se com a imposição de um sacrifício a alguém em benefício da


coletividade. Podendo incidir sobre direito reais ou sobre direito que não dizem respeito
a coisas, como os de crédito. No âmbito das ablações reais podemos ter os atos que
extinguem o direito real, como a expropriação, confisco (a expropriação envolve sempre
o pagamento de uma justa indeminização no confisco há transferência mas não há
indeminização, sendo ilícito por violar o direito da propriedade privada) ou pela
destruição do bem pela utilidade publica. Existem ainda as abolições d e natureza real
que modificam o conteúdo do direito real, como a requisição que incide sobre coisas
móveis e determina o aproveitamento dobem a favor de uma causa de utilidade publica.

Os obrigacionais há a criação de uma obrigação que a Administração Pública impõe ao


particular em benefício da coletividade. Pode ser uma obrigação de fazer, obrigando o
particular a adotar uma conduta, como a ordem interna do superior hierárquico ao
subalterno, ou pode prender-se com a ordem de um terceiro ao particular, quando uma
autoridade policial diz para circularmos em determinada faixa. Existem ordens que
envolvem proibições, ou seja um comando por omissão. Há atos que impõem obrigações
de dar, como a prestação de uma quantia monetária (ato tributário), ou não pecuniária
como ceder determinado bem, como uma pintura relativamente à qual fico condicionado
na sua alienação dando preferência ao Estado.

Os sancionatórios aplicam uma sanção, podendo ser pecuniária, como uma multa, ou de
natureza não pecuniária, como o médico que cometendo uma falta de natureza
deontológica pode ser objeto de sanção pela ordem de suspensão ou expulsão.
São importantes porque tem um procedimento administrativo especialmente importante
pois é dominado pela ideia de devido processo legal (equitativo), traduzido no direito ao
contraditório. Em matéria de inconstitucionalidade, a eficácia erga omnes da decisão com
força obrigatória geral tende a ser retroativa, com algumas exceções, no caso dos atos de
natureza sancionatório pode se destruir o ato administrativo consolidado caso a lei
inconstitucional fosse mais desfavorável ao particular.

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• Atos permissivos

Não impõem mas habilitam a adoção de determinada conduta, facultam que o destinatário
possa adotar uma conduta por ação ou omissão, num comportamento que sem essa
habitação não seria admissível. Assim, são um ato tendencialmente favorável ao seu
destinatário principal.

O facto de se permitir que alguém adote uma conduta favorável para si, não impede a
criação de efeitos colaterais a terceiro, produzem então uma pluralidade de efeitos, sendo
designados atos poligonais.
Exemplo: Permissões de contruir: ela está ou não englobada do direito de propriedade?
Para quem entenda que sim, verdadeiramente o que há aqui é apenas a permissão para se
poder exercer uma faculdade que já integra o direito de propriedade privada.
Para quem entende que não, este ato investe o particular de uma posição jurídicas própria.
Em qualquer dos casos, quem adquire a possibilidade de construção tem uma posição
jurídicas para ele favorável, contudo pode haver terceiros que se sentiam lesados com
essa mesma construção.

Autorização é a permissão que alguém tem em adotar uma conduta licita que já tinha
mas precisa de ser removido um obstáculo para exercer essa atividade

Licença tem na base o entendimento que a conduta antes da licença seria ilícita.
Exemplo: licença de porte de arma

Concessão é o ato em que a Administração Púbica confere a um sujeito um conjunto de


novas posições jurídicas ativas, podendo ser atribuída sob forma de ato administrativo ou
de contrato administrativo.

Admissão investe alguém de uma posição jurídica.

Dispensa exonera/liberta alguém

Renúncia alguém voluntariamente decidi não praticar uma conduta, havendo como limite
a irrenunciabilidade de situações jurídicas não atribuídas.

• Atos propulsores

Através destes atos a administração visa incentivar a ação de outros órgãos da


Administração Pública ou dos particulares.

O pedido uma autoridade solicita um comportamento, podendo ser intraadministrativo


ou exteriores à administração

Através da proposta solicita-se um comportamento decisório a outro órgão


administrativo, exprimindo-se uma base do que se pensa poder ser a melhor solução. Esta
não são vinculativas, e quando o sejam o decisor não está obrigado a emanar o ato mas
deve fundamentaras razoes pelas quais recusa e solicitar uma nova proposta.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 109


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A diretiva uma autoridade instiga um órgão a realizar determinado comportamento,


dando se uma liberdade de meios para atingir o fim estabelecido

Na recomendação o órgão que emite apela para que uma outra estrutura decisória adote
um determinado sentido decisório, sem que seja obrigatório para o destinatário.

Na advertência apela-se para que se adote determinada conduta, mas expressa ou


implicitamente, há a ideia de que se não se adotar aquele comportamento resulta um efeito
não positivo. Vem acompanhada dos efeitos negativos da não adoção da conduta e ainda
por vezes de um prazo para o acolhimento voluntário.

A distinção entre recomendação e advertência não é clara.


Exemplo: os raios UV são prejudiciais à saúde.
Há a propósito da incidência dos raios duas formulações: evite a exposição solar às horas
de maior calor (recomendação); A exposição de solar à horas de maior calor é prejudicial
à saúde (advertência, pois dá a conhecer um efeito negativo do não acatamento).

o Atos Secundários

Incidem sobre anteriores relações jurídicas concretas, tendo por objeto um ato anterior
ficando designados por atos secundários.

• Atos integrativos

São so que tendo por objeto outros atos visam completar, acrescentar qualquer coisa mais
que o ato anterior tinha em falta, assim atribui algo de novo que o ato integrado não tem

Aprovação exprime-se um juízo de conformidade de um órgão relativamente à


legalidade ou conveniência de um ato jurídico praticado por outro órgão ou pelo
particular. Existe sempre o ato de aprovação e o ato aprovado, pelo que há dois atos
distintos.

Homologação um ato com poder decisório aceita a sugestão, fazendo sua a proposta
apresentada por outro órgão. Existem dois atos mas o ato de homologação apropria-se da
proposta, passando esta a não ter existência autónoma. Se a proposta tiver vícios, o ato de
homologado irá ter igualmente esses vícios.

Confirmação exprime u juízo de concordância com o conteúdo de um anterior ato, sendo


este juízo no fundo uma transferência da responsabilidade do autor do ato confirmado
para o autor do ato confirmativo.

Ratificação confirmativa aqui o ato objeto de ratificação padece de uma situação em


que o seu autor agiu ao abrigo de uma competência extraordinária, não sendo órgão
normalmente competente como vemos na confirmação. Sendo a ratificação confirmativa
praticada pelo órgão normalmente competente.

• Atos modificativos
São os que visam introduzir modificações nos atos anteriores.

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CPA: 164º + 173º/2 e 3 Os atos modificativos com caracter saneador, pretendem


corrigir uma invalidade, esse vicio é o que gera a modificação.
Em todas as figuras elimina-se a ilegalidade para o futuro mas não impedem que possam
ser objeto de impugnação judicial os efeitos dos atos antes da alteração, ou seja, não
impede responsabilidade da Administração.
A retificação saneadora o órgão competente faz seu o ato praticado por um órgão
incompetente, pretendendo eliminar a incompetência relativa do ato praticado
anteriormente, só sendo possível nos casos de anulabilidade.
Existe ainda a reforma e a conversão

CPA: 173º/1 Os atos modificativos podem não ter caracter saneador, correspondendo
à alteração em sentido estrito, suspensão e CPA: 174º retificação, pois não visam superar
nenhuma invalidade, as modificações justificam-se por razões de mérito.
Na suspensão visa-se paralisar os efeitos de um ato anteriormente praticado,
diferenciando-se da revogação pois neste há a extinção definitiva dos efeitos. Utiliza-se
argumentos de invalidade ou demérito para de forma, temporária, paralisar os efeitos. O
ato sujeito a condição suspensiva a sua suspensão é automática verificando-se o ato
futuro, aqui não encontramos um facto, mas um novo ato.
A retificação tem haver com situações de erros materiais ou de calculo que justificam a
correção do ato.

• Atos desintegrativos: revogação (mérito) e anulação (ilegalidade)

CPA: 165º - 172º Dizem respeito às situações de revogação e anulação administrativa.

Antes de 2015 a revogação podia ser efetuada com fundamento em razões de mérito ou
de legalidade, após 2015, acolhendo a escola de Coimbra, sempre que se cessam efeitos,
distingue-se os casos de fundamento em ilegalidade ou mérito.

A revogação traduz a cessão de efeitos de um ato administrativo anterior com


fundamento em razões de mérito, de conveniência e de oportunidade que justificam a
cessação de efeitos, CPA: 171º/1 sendo por regra não retroativa.

Permite diferenciar duas realidades, o ato revogado, o ato cujos efeitos cessaram, e o ato
de revogação, o ato que fez cessar os efeitos do anterior ato. Em bom rigor jurídico não
há revogação de atos, mas sim de efeitos, o ato em si, mesmo que os efeitos cessem em
termos retroativos, o ato em si é um facto que existiu pelo que não se pode apagar, apenas
se pode fazer cessar os efeitos que o ato gerou.

Existem algumas figuras afim, como a suspensão, pois nesta há uma paralisia dos efeitos
e não cessação.

Quanto há iniciativa pode oficiosa ou por iniciativa dos interessados


No que toca à iniciativa oficiosa esta pode ser desencadear pelo autor do ato, sendo
designada retratação, ou por um órgão distinto do que praticou o ato, como nos casos do
superior hierárquico. O particular pode requerer diretamente ao autor do ato, estando o
interessado a reclamar CPA: 191º - 192º, ou perante quem exerce poderes de supremacia
face ao ator do ato, sendo neste caso CPA: 193º - 199º um recurso administrativo.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 111


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Quanto ao conteúdo pode se diferenciar da simples e da substitutiva.


Na simples há apenas o propósito de extinguir os efeitos do anterior ato. Na substitutiva
extingue-se mas substitui-se o regime, modificando-se o conteúdo da solução.

Quanto aos efeitos pode dizer que pode ser ab-rogatória ou retroativa
CPA: 171º/1 é regra geral que a revogação seja ab-rogatória, ou seja, tendo eficácia
revogatória apenas deste momento para o futuro. Contudo os efeitos da revogação podem
ser retroativos, destruindo-se todos os efeitos do passado do ato revogado, mantendo-se
este apenas como realidade histórica sem qualquer efeito emanado.

Há cinco situações de competência revogatória.


Nota: quem pode o mais pode o menos, pelo que quem pode revogar pode suspender.

CPA: 169º/2 Tem competência para revogar o ato, o seu autor desde que mantenha a
titularidade da respetiva competência.
CPA: 169º/4 Se há uma delegação de poderes o delegado pode delegar o ato salvo se
tiver caducado ou sido revogada revogação de poderes.

O superior hierárquico tem competência revogatória quanto aos atos praticados pelo seu
subalterno pois o superior hierárquico presta contas pelos atos que os subalternos
praticam, pelo que além de ter o direito de fiscalização tem o poder de revogar. Dentro
do poder hierárquico há ainda o poder de supervisão que habilita o superior a revogar os
atos do superior. CPA: 169º/2 Retira a competência para o superior hierárquico revogar
os atos praticados pelo subalterno no âmbito de competência exclusiva. Paulo Otero
questiona a constitucionalidade desta solução à luz do princípio da responsabilidade
política pela totalidade da atuação, acha estranho como alguém pode ser responsável se
ter a possibilidade de revogar efeitos. Os particulares podem apresentar um recurso da
atuação do subalterno dirigido ao superior hierárquico de acordo com o direito
fundamental de petição, mas a entidade aquém se dirige a petição não terá o poder de
revogar. Paulo Otero considera que a competência é exclusiva para garantir que a primeira
intervenção do ato é do subalternos mas não para retirar da alçada do superior. O superior
continua ao abrigo do poder de direção a faculdade de ordenar a revogação do ato e até
de ditar um novo conteúdo, pelo que a competência nunca é verdadeiramente exclusiva.
Através da avocação o superior hierárquico chama a si o ato para ver se deve revogar.

CPA: 169º/4 O órgão delegante tem competência revogatória em relação aos atos
praticados pelo delegado, com fundamento na própria delegação de poderes. Se o
delegante pode CPA: 49º/2 a toda a altura revogar o ato de delegação de poderes,
retirando a competência ao delegado, pode igualmente revogar os atos praticados. O s
atos do delgado tem um valor jurídico CPA: 44º/5 como se tivessem sido praticados pelo
delegante então este pode revogar os atos que tem valor jurídico como seus.

CPA: 169º/5 Reflete a solução tradicional onde a entidade superentendida pode ver os
seus atos revogados pela entidade de superintendência nos casos expressamente previstos
na lei, mas Paulo Otero considera que pode ocorrer ainda em casos não previstos na lei.
Se o particular tem o direito de petição a entidade de superentendia passa a ter poder
revogatório nos casos de recurso administrativo.

CPA: 169º/6 Tem competência revogatória o órgão competente preterido, ou seja, nos
casos de incompetência relativa, o órgão que viu os seus poderes invadidos não pode

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 112


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perder a competência sobre a matéria, pelo que pode revogar. Na incompetência absoluta
o ato é nulo, pelo que não pode ser revogado, por não chegara produzir efeitos. Pode-se
destituir se este artigo não é a prova de que não é correto a distinção entre revogação e
anulação.

O regime da revogação dos atos decorre dos artigos CPA: 166º - 168º
CPA: 166º/1 Existem atos de revogação impossível, atos que nunca podem ser objeto de
revogação pois não há efeitos a cessar, nomeadamente os nulos, os anulados
contenciosamente e ainda os atos revogados anteriormente com eficácia retroativa. Em
todas estas situações, caso haja revogação ocorra o objeto impossível pelo que é nula.

A regra é que os atos válidos são livremente revogáveis com fundamento em questões de
mérito, podendo sempre ser revogados, contudo há exceções:
CPA: 167º/1 Os atos que resultam de vinculação legal; Atos que criam obrigações legais
ou direitos irrenunciáveis para administração e os atos constitutivos de direitos.

CPA:167º/3 Um ato constitutivo de direito pode o ser em três cenários: quando atribui
uma posição jurídica favorável, quando atribui uma situação jurídica de vantagem,
quando exonera o particular de uma obrigação ou quando amplia uma situação jurídica.

CPA: 167º/2 d) Ato precário é aquele que investe o particular de uma posição
jurídica ativa mas não definitiva, como a atribuição de um direito com condição
resolutiva. Aqui apesar de ser ato constitutivo de posição jurídica favorável não se rege
pelo regime destes.
Atos verificativos não são estruturalmente constitutivos de direito mas limitam-se
por ser ato declarativo a verificar determinada situação, como um diploma de curso.

Está em causa atos constitutivos de direito válidos, pois os inválidos não são revogados
mas anulados, CPA: 167º/2 contudo a regra geral é que os atos constitutivos de direito
válidos não podem ser revogados. Existem claro exceções, pode ser revogado na parte
desfavorável aos interesses do beneficiário, ou quando todos os beneficiários do ato
manifestem a sua concordância sem estar em causa situações indisponíveis ou ainda com
fundamento na alteração das circunstâncias de facto ou da superveniência de novos
conhecimentos, mas apenas se o ato não pudesse ser praticado pois no momento em que
foi praticado já existiam estas situações e só pode ser no prazo de 1 ano a contar do
conhecimento da causa. Se o beneficiário estava de boa fé aquando da alteração das
circunstâncias ou da superveniência de novos conhecimentos à luz do CPA: 167º/6 a
revogação confere-lhe uma indeminização.

CPA: 170º/1 Em regra existe um paralelismo das formas, ou seja, o ato de revogação
deve seguir a forma usada no ato revogado, sendo exceção CPA: 170º/2
CPA: 170º/3 Nas formalidades também existe o princípio do paralelismo.

CPA: 171º/1 Em regra a revogação apenas produz efeitos para o futuro


Exceções: CPA: 171º/1 Pode haver retroatividade caso seja favorável aos interessados
ou se estes concordarem expressamente, não estando em causa direitos indisponíveis.

O mesmo ato pode para uns ser constitutivo de direitos e para outros não.
Exemplo: Alguém que num concurso público obtém vencimento, mas apenas essa pessoa
o ato é constitutivo de direitos.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 113


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A anulação trata dos casos com fundamento de ilegalidade, sendo tendencialmente


retroativa. CPA: 165º/2

O fundamento último é o dever que a Administração tem de repor a ilegalidade, ou seja,


quando pratica um ato que reconhece que é ilegal não pode fazer nada, ficando apenas a
contemplar o ato. Repõe-se a ilegalidade caso não seja possível a sua sanação através de
fazer desaparecer os efeitos produzidos pelos atos, dai a anulação ser retroativa.

É uma forma de simplificar a vida aos tribunais, pois caso a Administração se aperceba
que o ato é ilegal pode anulá-lo sem necessitar de aprovação dos Tribunais.
O pressuposto de base é a ilegalidade que se reconduz á anulabilidade e nunca nulidade,
pois caso contrário não havia efeitos para cessar.

A anulação administrativa é um ato praticado pela administração, a anulação judicial é


uma sentença, praticada por um tribunal, no exercício da função jurisdicional.
A declaração administrativa é um ato administrativo constitutivo, pois o ato anulável
produz efeitos até ao momento de declaração de nulidade. Na declaração de nulidade está
na base um ato nulo que não produziu efeitos na ordem jurídica, pelo que a declaração de
nulidade apenas verifica a ausência de efeitos produzidos, pelo que é apenas declarativo.

Quanto há iniciativa pode oficiosa ou por iniciativa dos interessados.


CPA: 169º Na iniciativa oficiosa é a própria Administração que decide anular o ato. No
caso da iniciativa dos interessados pode, à semelhança da revogação, ser uma reclamação
ou um recurso hierárquico.

CPA: 163º/2 + 171º/3 Quantos aos efeitos em princípio a anulação vem eliminar todos
os efeitos que o ato tinha produzido. Contudo há exceções, em que quando o ato é anulado
se reconhece a permanência na ordem jurídica de alguns efeitos:
CPA: 168º/4 b) + 171º/3 2ª parte Quando é anulação ex nunc (efeitos só para futuro)
CPA: 163º/5 Quando envolve a possibilidade de serem modelados os efeitos
CPA: 168º/6 Quando envolve o dever de indemnizar os destinatários

Na competência para anular, em regra, aplica-se as mesmas soluções da revogação,


contudo existem algumas exceções:
O órgão incompetente tem todavia competência para anular o ato que praticou. Há um
princípio de autocontrolo da legalidade que fundamenta uma competência anulatória.
CPA: 169º/3 Pode anular o ato o órgão competente pela matéria, pois não faz sentir a
atuação de um órgão incompetente vir invalidar a intervenção do órgão com competência.
Exemplo: O Presidente da Câmara Municipal X pratica um ato que era da competência
da Assembleia Municipal, o ato é ferido de incompetência relativa.

CPA: 169º/3 O superior hierárquico pode anular todos os atos do subalterno, não há
competência exclusiva para aprática de atos inválidos.

Quem exerce funções de superintendência e tutela pode na sequência de pedido


formulado pelo interessado, anular os atos feridos de ilegalidade.

O regime a que está sujeita a anulação administrativa é complexo e suscita algumas


dúvidas de constitucionalidade.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 114


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CPA: 166º/1 Existem atos de anulação administrativa impossível, nos mesmo caso onde
é impossível a revogação.

CPA: 168º/1 A invalidade só fundamente a anulação dentro de certo prazo, ao contrário


da declaração de nulidade que pode ocorrer a todo o tempo, contudo o ato anulável tem
prazo, tendo em vista garantir a segurança jurídica.
Regra Geral: A anulação só pode ocorrer dentro dos 5 anos subsequentes à prática do
ato inválido.
Exceção 1: Se o órgão competente para anular tinha conhecimento da causa da
ilegalidade só tem 6 meses após esse conhecimento. Caso o ato seja constitutivo de
direitos o prazo regra é menor.
Exceção da exceção: Se há uma situação de erro do decisor esses 6 meses
não se conta da data do conhecimento da invalidade mas sim do momento em que
se soube o erro.
Exceção 2: Todos estes prazos podem ser encortados se o ato inválido for
impugnado em tribunal a anulação só pode ocorrer até ao fim do processo. Esta
impugnação torna apenas possível a anulação oficiosa.
Se a anulação ocorrer fora do prazo legal a anulação passa a ser inválida, ou violação de
lei ou incompetência em razão de tempo.

Os atos constitutivos de direitos há um regime especial no que toca à anulação. Estes só


podem ser anulados dentro dos seguintes prazos:
Regra Geral: A anulação só pode até 1 ano a contar da emissão do ato.
Exceção 1: Nos casos previstos no CPA: 168º/4 os atos podem ser anulados no
prazo de 5 anos apesar de ser constitutivo de direitos.
Exceção 2: Pode ser anulado a qualquer momento CPA: 168º/7 se tiverem causa
uma diferente interpretação do direito da união europeia. Paulo Otero considera esta
solução inconstitucional violando o CRP: 282º/3, garantia do caso julgado.
Exceção 3: CPA: 167º/3 O ano pode ser encorado se tiver sido impugnado
judicialmente, havendo lugar à anulação até ao fim do processo judicial.

Consolidada a invalidade por decurso de tempo, não podendo a tao ser anulado pelo órgão
competente ter deixado passar o prazo. A partir de se ter consolidado na ordem jurídica
passa a estar sujeito às regras de revogação dos atos válidos. Se um ato válido pode ser
revogado, um ato inválido mas que se consolidou não pode ter mais proteção pela ordem
jurídica pelo que pode igualmente ser revogado. Aqui o fundamento não seria a sua
ilegalidade mas sim razões de mérito.

O novo regime de 2015 suscita a Paulo Otero dúvidas de constitucionalidade, além do


artigo 168º/5, no que toca à segurança jurídica e tutela de confiança que saem lesadas
porque não há norma transitória que permita impedir que este novo regime mais
desfavorável para a anulação dos atos constitutivos de direito entre em vigorem relação a
atos que foram praticados durante a vigência do CPA de 1991.

CPA: 170º Quando à forma e formalidade é igual ao regime da revogação

CPA: 171º/3 A Regra Geral quanto aos efeitos temporais é que a anulação é retroativa.
Exceção 1: CPA: 168º/4 b) Não há efeito retroativo se o ato anulado era
constitutivo de direitos e envolvia prestações periódicas pecuniárias.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 115


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Exceção 2: CPA: 171º/3 2ª parte Se por decisão discricionária pelo autor do ato
este se tenha tornado inimpugnável por via judicial.

A aplicação do CRP: 282º/4 ao controlo da legalidade: se é possível modelar efeitos de


atos inconstitucionais deve ser possível, com fundamento na segurança jurídica, equidade
e interesse públicos de especial relevo, modelar os efeitos de ilegalidade.

CPA: 171º/4 Há em regra repristinação salvo estipulação em contrário.

Os efeitos materiais da anulação:


CPA: 172º/1 Anulado o ato a administração tem o dever de reconstruir a situação atual
hipotética, ou seja, a que existiria se o atol anulado não tivesse sido praticado.
A reconstituição da situação atual hipotética pode gerar efeitos complexos.
Exemplo: um aluno do 3º ano de medicina é objeto de uma sanção disciplinar de exclusão,
pelo que não termina o 3º ano, nem consegue concluir o curso. Após 2 anos a
administração percebe que o ato é invalido pelo que resolve anulado. Dois anos depois os
efeitos seriam que o aluno teria concluído a licenciatura. Será logico que a reconstituição
seja concederem-lhe a licenciatura? Paulo Otero considera que não se pode reconstituir
mas que surge a possibilidade de responsabilidade da administração e eventual
indeminização.

CPA: 172º/2 Não há prazo para anular, reformar os atos que surgem do ato anulável.

Os efeitos para os particulares envolvidos:


CPA: 172º/3 Os destinatários dos efeitos de um ato praticado na sequência do ato
anulável desde que estejam de boa fé podem ser investidos de uma especial proteção.
CPA: 172º/4 Quando está em causa a reintegração de um trabalhado no âmbito de uma
relação de emprego público a lei tutela a posição.
Exemplo: Havia um concurso público para uma determinada vaga na Administração
Pública, a esse concurso concorreu o A e o B, ganhou o A, foi provido no exercício das
funções e o B veio impugnar perante um tribunal ou a Administração e passado alguns
anos foi dada razão a B, ou seja que este devia ter ganho. Não podemos prejudicar nenhum
deles, o A deve continuar a exercer as funções, o B deve ter uma função que também o
favoreça. Esta situação é frequente nos concursos à Universidade.

o Atos Consensuais

Estamos perante atos unilaterais da Administração Pública mas que assentam no consenso
entre a Administração e o destinatário, havendo a participação destes, uma
autovinculação da administração ao vincular-se a praticar aquele ato e ainda a
contratualização da decisão administrativa. A ideia é de que é mais fácil de convencer o
particular caso antes do ato administrativo unilateral haja um consenso

CPA: 57º/1 e 2 + 98º/2 Natureza Procedimental


CPA: 57º/3 + 77º/4 Natureza Substantiva

Há limites ao conteúdo dos atos consensuais, pois a Administração não pode usar estes
atos em matérias que não são disponíveis por ela, nem pode por via destes atos fazer o
que a lei lhe proíbe, o consenso do particular não possibilita a adoção de condutas ilegais.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 116


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

O Ministério Publico pode impugnar condutas que através de atos consensuais violem a
lei.
O ato consensual funcionando como pressuposto do ato final suscita problemas jurídicos:
Entre o ato consensual e o ato final ocorrendo uma alteração radical das circunstâncias
será isto justa causa para que a administração deixe de cumprir? Pode o particular deixar
de cumprir com o argumento de que Administração não cumpriu? Os acordos que estão
na base podem ser objeto de controlo judicial de legalidade? Poderá a administração
exercer poderes exorbitantes que reconfigurem o acordo e deste modo a decisão final?
Poderá haver Responsabilidade Civil por não cumprimento do acordo?

o Atos Tácitos

CPA: 129º e 130º Dizem respeito ao valor do silêncio da atuação administrativa.

Podem existir atos tácito cujos significado seja de deferimento, concebendo o que o
particular requereu, mas também de indeferimento, recusando o pedido.
A atuação administrativa através do silêncio pode dar origem a ações judiciais onde a
Administração Pública é condenada a agir porque não tendo decidido incumpriu o dever
legal de decisão ou ainda ações de responsabilidade civil pela omissão em não ter
decidido em tempo oportuno.

Atos Declarativos

Não introduzem qualquer alteração na ordem jurídica limitam-se a verificar ou emitir um


juízo de valor ou em comunicar o facto.
Os atos declarativos podem introduzir um elemento importante na ordem jurídica, a
certeza e a segurança, o que não se conhecia passou-se a conhecer, o que não se tinha
valorado passou-se a valorar, tendo de algum modo uma realidade de inovação.
Pode acontecer que os atos declarativos não tenham esta natureza e sejam no fundo atos
constitutivos, como quando nos atos certificativos ou nos comprovativos exista um erro.
Exemplo 1: na delimitação de um terreno há um engano no registo e em vez de e ter a
delimitação X passa a ter X+1.
Exemplo 2: a classificação obtida pelo aluno em vez deter sido 12 valores há um erro e
aparece 15 valores.

Se este erro não for objeto de retificação durante o período determinado poder-se-á
reconhecer efeitos jurídicos a este erro? Caso se defender que o erro tem um prazo para
poder ser objeto de retificação, decorrido o prazo o erro consolida-se o que era declarativo
passou a ser constitutivo.
Exemplo: aluna que vai ao exame por ter recebido uma classificação negativa e o Paulo
Otero lembra-se de corrigir o exame e de lhe ter dado positiva. Em vez da classificação
que saiu na pauta a aluna estava aprovada. Sucedeu que havia duas alunas com os dois
primeiros nomes iguais e as classificações foram trocadas. Como resolver? A aluna
necessita de ter a nota corrigida para ficar aprovada, mas a outra aluna que
involuntariamente quando viu a nota ficou de férias e não parecia admissível que lhe
diminuísse a classificação. Apesar de haver uma injustiça mas não parecia justo a
retificação, pelo que o ato passou a ter natureza constitutiva.
Para Paulo Otero se um caso julgado determinado inconstitucional continua na ordem
jurídica por ser mais favorável ao particular se mantém na ordem jurídica, no erro é igual.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 117


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

o Atos de verificação

Podem ser atos de comprovação onde há a apreensão de facto e uma declaração de


ciência, como no caso do registo, das inscrições, das CPA: 34º atas, ou reconhecimento
notariais
A certificação como as certidões, declarações, vistos e as autentificações
Os de aclaração visam tornas mais claras anteriores decisões

Verificação constitutiva

o Atos de valoração

Apreendem-se factos mas não há declaração de ciência ou de conhecimento, procede-se


a uma valoração, um juízo de natureza técnica ou de conveniência tendo como base os
factos.

Juízos qualificativos, quando se classifica um exame com bom

CPA: 91º e 92º Pareceres


No Direito Português, em regra geral, os pareceres são obrigatórios mas não são
vinculativos, ou seja, tem de existir estando o órgão com competência obrigado a emanar
o parecer, contudo o órgão que vai decidir não está obrigada a acolher o parecer. Apesar
de não ser vinculativo há o dever de fundamentar as razões pelas quais não se acolheu.
Excecionalmente há pareceres vinculativos, pelo que o decisor não é quem decidi pro fim,
sendo o decisor verdadeiro quem emitiu o parecer pois o decisor final tem de acatar o
conteúdo do parecer, sob pena de ilegalidade. Há que verificar-se o parecer é válido, caso
seja nulo não produz efeitos pelo que não pode ter caracter vinculativo. Se o órgão decisor
decide acolhendo um parecer nulo a decisão final também é nula. Quando não há um
prazo específico CPA: 92º/3 o parecer é emitido em 30 dias. O órgão decisor não pode
estar eternamente à espera de um parecer obrigatório, permitindo-se que decorrendo um
prazo e voltando a ser avisado o órgão pode decidir sem o parecer

As informações e os relatórios entram igualmente neste tipo de atos administrativos

o Atos de transmissão

Estes atos verdadeiramente não introduzem nenhuma alteração na ordem jurídica


limitando-se a comunicar, o que introduz alterações é o ato de notificação. No primeiro
momento foi determinado que seria objeto de inspeção e na segunda realidade notificou-
me. Um vício no ato de transmissão não inquina o ato praticado em momento anterior,
apenas me torna inoponível a atuação administrativa, ou seja, não posso entra em situação
de incumprimento. Temos que ser notificados para ter a obrigação de praticar. Não podem
ser exigidos juros de mora por incumprimento caso não se tenha sido notificado.

CPA: 139º + 158º e 159º Temos a publicação


CPA: 140 + 114º + 160º Notificação
Uma coisa é a notificação que comunica outra é o ato que é objeto de notificação.
Exemplo: eu recebo um email que me notifica que estou a ser objeto de uma inspeção
tributária outra é estar a ser objeto da intervenção fiscalizador.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 118


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

Qual é a sucessão de momento que conduzem à prática do ato administrativo? Como é


que a administração emite uma decisão?

Há três tipos gerais de procedimento administrativo:


• Procedimento Declarativo Típico
Definição de direitos para casos concretos
• Procedimento de Recursos Graciosos
Apreciação pela administração de recursos graciosos, através do qual se impugna a
decisão de uma autoridade perante outra
• Procedimento de Execução do Ato Administrativo
Num primeiro momento define um direito no caso concreto, contudo isto exige que ele
adote determinada conduta e caos ele não adote voluntariamente a conduta a
administração pode proceder à execução do ato.

Procedimento Declarativo Típico

Como é que se inicia? Em que termos pode ser desencadeado?

CPA: 53º Pode ser desencadeado de forma oficiosa e neste caso ela deve CPA: 110º
comunicar aos interessados que contra eles foi desencadeado um procedimento.
CPA: 110º/2 Exceção: não é necessária a comunicação, caso prejudique a natureza
secreta da matéria
Exemplo: Administração suspeita que há contrabando num local pelo que não pode
comunicar que está a pensar ir lá devido à necessidade da surpresa.

CPA: 53º Pode ser a requerimento do interessado que deve obedecer aos requisitos do
CPA: 102º desde designação do órgão a quem se destina à identificação do que formula
o requerimento, a formulação do objeto etc.

CPA: 108º/3 Os requisitos formais se não forem cumpridos podem levar a deferimento,
contudo a administração pode convidar o particular a suprir as deficiências. Mas pode a
Administração ter o dever se suprir a deficiência.
Exemplo: o particular não indicou data mas ao enviar email eles têm a data.

Como é que o requerimento chega à Administração?

CPA: 102º + 103º + 104º + 105º +106º


Deve existir o registo do requerimento e o particular deve receber um recibo de entrega
que é fundamental por servir de prova da entrega do requerimento, e pode ser útil no que
toca à revogação.

Quais as condições para que a Administração se possa pronunciar (pressuposto proce


dimentais)?

CPA: 109º a contrario

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 119


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Competência do órgão quem é dirigido o requerimento. Caso não o seja tem o dever de
reencaminhar para o órgão que é competente.

Legitimidade do requerente, pois este tem de ter um interesse direto na matéria com
exceção nas situações de vínculo de representação (advogado) ou a título de gestão de
negócios.

Tempestividade do pedido, há que respeitar o prazo legal para poder desencadear o


requerimento.

A não caducidade do direito que se pretende exercer, o direito subjetivo não pode ter um
prazo para se reivindicar o exercício do direito. Caso tenha caducado assenta numa base
substantiva que já não se tem, pelo que é ilegal.

A falta destes pressupostos CPA: 109º

CPA: 89º Podem-se adotar medidas provisórias que impeçam prejuízos de difícil
reparação. Podem cessar através de revogação ou caducidade.

Podem não ser necessária medidas provisórias, passando-se para a fase de instrução.
CPA: 115º/1 É neste momento que é identificado o quadro material na base da situação
em que a Administração é chamada a decidir, visa determinar a veracidade dos factos
sobre os quais posteriormente é pedida a decisão.
A factualidade deve ser adequada e necessária

CPA: 58º Princípio do Inquisitório


Na determinação dos factos a Administração pode por iniciativa própria averiguar factos,
mesmo que não tenha sido apresentado pelos interessados. A função administrativa não
esta restrita ao que os interessados levam, ao contrário da função judicial.

CPA: 55º Direção da instrução é da competência da estrutura competente para a decisão.

Quais os meios da administração para determinação do quadro factual?

CPA: 115º Pode solicitar junto de peritos que verifique se os factos são verídicos. Pode
solicitar outros pareceres técnicos como médicos.
CPA: 66º Pode solicitar informações a outras estruturas administrativas,
CPA: 117º Pode pedir informações aos administrados, pode pedir provas aos particulares
ou solicitar apresentação de documentos ou coisas de prova.

Podem existir diligências instrutórias por parte dos particulares?

CPA: 116º São as diligências típicas que se podem consubstanciar na reuni\ao de


documentos, pareceres médicos, jurídicos etc.
CPA: 120º Pode haver uma situação de prova antecipada, quando esta não seja possível
ou seja difícil

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 120


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Após a recolha de todos os elementos probatórios a Administração está apta a prepara a


decisão final, com base nos elementos probatórios tem uma ideia da decisão final, após a
ponderação dos factos que recolheu, dando origem a uma decisão provisória.

CPA: 121º a 124º Deve proceder agora à audiência prévia dos interessados.
A participação é um imperativo resultante da CRP: 267º e da ideia que Portugal é uma
democracia participativa CRP: 2º.
O direito de audiência prévia é por vezes uma manifestação do princípio do contraditório
enquanto elemento de um procedimento equitativo, nos casos sancionatórios e ablativos.
Com a audiência prévia dos interessados a administração pertente com a apresentação da
decisão provisória saber qual a posição do particular, pelo que a audiência do interessado
deve ser acompanhada da comunicação da futura decisão e dos fundamentos de tal.

CPA: 124º/1 Há situações de dispensa de audiência prévia.

CPA: 123º a contrario A audiência prévia pode ser por escrito, oral.

Pode ser preterida e neste caso o desvalor jurídico suscita divergência


Para uns gera vicio de forma e o ato é anulável. Para outros traduz-se na violação de um
Direito Fundamental pelo que o ato é nulo.
Paulo Otero considera que nenhuma esta correta. Se a audiência previa é justificada por
um princípio de contraditório inerente a um direito aqui a falta leva a violação de um
núcleo essencial de um Direito Fundamental de um procedimento equitativo pelo que
gera nulidade. Nos demais casos nãos não está em causa a violação do núcleo essencial,
pelo que gera apenas anulabilidade.

A Administração não só deve fundamentar o projeto de decisão que comunica ao


particular como depois do particular se pronunciar deve acolher as razoes do particular
ou expor na decisão final os fundamentos pelos quais rejeita a intervenção.

CPA: 125º Pode existir diligências complementares

Quais os tipos de decisões?

CPA: 93º e 94º Pode ocorrer a extinção do procedimento através de decisão expressa
CPA: 131º + 132º + 95º + 133º Extinção do pedido
Administração pode praticar um ato CPA: 57º/3 consensuais, CPA: 126º administrativo
típico ou contratual.
CPA: 129º e 130º a decisão tácita
CPA: 77º/4 Acordo que substituía o ato administrativo

Procedimento de Recursos Graciosos


CPA: 184º a 199º

O particular já tem uma decisão administrativa ou formulou uma pretensão e há um


silêncio decisório. Caso o particular entenda que a conduta por ação ou omissão é ilegal
ou inoportuna pode impugnar junto da Administração a conduta:

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 121


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

• Reclamação: pode fazer perante o próprio autor do ato


• Recuso: pode fazer junto de uma estrutura distinta da que adotou o
comportamento

CPA: 185º Há mecanismo de recurso necessários e facultativos.


Se temos uma decisão passível de impugnação imediata perante um tribunal a via
administrativa é uma reclamação facultativa, contudo se a lei estipula que aquela decisão
não é passível de impugnação judicial diretamente, a lei impõem que para chegar a
tribunal tem de percorrer a hierarquia da Administração. Paulo Otero coloca duvidas
sobre a constitucionalidade desta condição.

o Procedimento do recurso hierárquico

Este é o procedimento típico em relação aos recursos administrativos.


Há casos específicos, como das estruturas colegiais para o colégio em geral ou do
subalterno para o superior hierárquico.

CPA: 184º/3 O particular que está insatisfeito tem de formular um pedido/requerimento


à estrutura decisória superior à que tomou a decisão. Tem de se identificar o requerente,
CPA: 184º/1 objeto do recurso (ato ou omissão), CPA: 185º/2 o fundamento do recurso
(ilegalidade ou oportunidade).

Formular o pedido pode ser impugnar um ato solicitando a anulação, modificação,


substituição ou revogação mas pode não se reagir contra um ato mas contra uma omissão
solicitando-se que se pratique o ato omitido.

CPA: 194º/1 Quando haja hierarquia o destinatário do recurso é o superior hierárquico,


mas caso não haja hierarquia o destinatário será CPA: 199º uma das entidades previstas.

Quais os efeitos da interposição do recurso?

Gera o dever legal de decisão para a autoridade para quem foi dirigido o recurso.

Se os particulares interpõem um recurso administrativo suspende-se a eficácia do ato?


Nota: Problema de saber se com a interposição do recurso de um ato tem efeito
suspensivo: sabes que a autotutela declarativa (poder de definir o direito no caso concreto)
é acompanhado de autotutela executiva (força para fazer cumprir).
CPA: 189º Nos casso de impugnação administrativa necessária há efeito suspensivo, o
particular não está obrigado a cumprir. Nos casos da facultativa não há condição
suspensiva.

Pressupostos para impugnar ser válida resultam do CPA: 196º a contrario: Competência
do órgão, Recorribilidade do ato, Legitimidade dos recorrentes segundo o CPA: 186º/2 e
Tempestividade do recurso

Qual o prazo para ser impugnado o recurso?

CPA: 194º Perante a impugnação de atos expressos (ações) há que diferenciar a


necessária que tem 30 dias e a facultativa que segue o prazo do contencioso, 3 meses.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 122


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CPA: 187º No caso das omissões pode ser impugnado no prazo de 1 ano, para coincidir
com a impugnação judicial

CPA: 196º A falta dos pressupostos conduz á rejeição


D) Clausula aberta sobre a fundamentação da rejeição do recurso

Há dois momentos para se rejeitar o recurso: imediatamente ou remetida para o momento


da decisão final.

CPA: 195º Há necessidade de notificar e ouvir os contra-interessados.


Ao impugnar uma decisão que me é desfavorável ao recorrer dessa decisão ela pode ser
favorável para outras pessoas que devem ser notificadas, para garantir o princípio do
contraditório e do procedimento justo e equitativo.
Exemplo: Concurso publico, quem fica com o cargo e quem não fica.

CPA: 195º/2 Eu vou impugnar perante uma diferente que impugnou o ato mas o superior
hierárquico deve pedir a intervenção do autor do ato praticado para que este se justifique.
Não haveria boa administração se o autor não se pronunciasse.

Agora é a altura da Administração formular uma decisão.

CPA: 197º Conteúdo possível da decisão

Decisão de improcedência do recurso: a administração determinada a improcedência, é


desfavorável ao recorrente mas por vezes favorável a contra-interessados.
A improcedência significa a confirmação do ato recorrido, ou seja, há um efeito
confirmativo do ato recorrido.
Reformation imperis significa reformar para pior, será possível que a Administração
indeferir que a decisão se torna mais gravosa e eu necessito de recorrer da decisão.
CPA: 195º/4 Não é possível que a decisão que vem do recurso seja mais desfavorável
CPA: 197º/1 Contudo em sede de parece apontar-se para uma solução diferente

Decisão de procedência do recurso: a Administração acolhe as razões que o particular


invoca, anulando ou revogando, fazendo cessar os efeitos jurídicos do ato impugnado.
Pode ser uma destruição total ou parcial dos efeitos.

CPA: 197º/1 e 4 Os poderes de intervenção do superior estão limitados nos casos de


competência exclusiva do subalterno. Contudo existe sempre a possibilidade de recorrer
ao poder de direção para indicar qual a conduta a tomar.

Qual é o prazo para a decisão?

CPA:198º Oscila entre os 30 e os 90 dias consoante decisão expressa ou tácita.

É possível a impugnação da decisão de recurso?


Exemplo: O órgão A emana a decisão 1 e o particular interpõem recurso ao órgão B que
emana a decisão 2. Pode a decisão 2 ser objeto de impugnação administrativa?

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 123


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CPA: 191º/2 Regra Geral é que não cabe reclamação da decisão de recurso.
Exceção 1: É possível reclamação da decisão proveniente do
recurso em caso de omissão de pronuncia.
Exemplo: Fundamentei que o ato era ilegal e inconveniente e o superior apenas diz que
não é inconveniente, nada diz sobre a ilegalidade.
Exceção 2: É possível utilizar a reclamação se há contradição entre
dois casos semelhantes devido à violação do princípio da igualdade e
imparcialidade e ainda do precedente.

Procedimento da execução dos atos administrativos


CPA: 175º a 183º

Administração define o direito no caso concreto e faz com que o particular esteja obrigado
a cumprir a decisão, pelo que se o particular não cumprir voluntariamente a
Administração pode usar a força para obrigar o particular a cumprir.

A regra geral é que autotutela administrativa é um modelo tradicional com âmbito de


aplicação CPA: 175º quer em relação a obrigações pecuniárias CPA: 179º, como à
entrega coisa certa CPA: 180º e CPA: 181º

CPA: 176º O princípio geral é que a administração só pode impor coercivamente nos
casos e nos modos expressamente previstos na lei.
Exceção: situações de urgente necessidade publica
CPA: 183º Nos casos que não estejam previstos na lei a execução não poder ser feita pela
administração, esta necessita de recorrer aos tribunais para obter um título executivo.

CPA: 177º Necessita de existir um ato que define o direito no caso concreto CPA: 177º/2
passível de execução.

CPA: 177º/3 e 4 O particular deve ser notificado que tem de executar de forma
espontânea fixando-se um CPA: 182º prazo razoável para a execução

Se o particular acatar está tudo bem, mas caso contrário poderá a administração proceder
à execução coerciva? Tradicionalmente sim, após 2015 CPA: 183º a administração não
pode recorrer a força, deve primeiro ir a um Tribunal para obter um título executivo,
reforçando-se a ideia de uma Administração Pública paritária aos particulares.
A existência de título executivo judicial habilita a administração a executar o ato.
Limitação a tudo isto: Lei nº4/2015 7 Janeiro: 8º/2 Este novo regime do CPA está
dependente de entrada em vigor de uma lei que o legislador deve fazer no prazo de 60
dias após a entrada em vigor do código de 2015. O que nunca aconteceu. Ao não surgir
essa lei o regime novo não entrou em vigor, pelo que se aplica o CPA: 149º/2 de 1991
devido ao regime transitório Lei nº4/2015 7 Janeiro: 6º.
Contudo a solução transitória que manda aplicar o regime antigo não tem cobertura na lei
de autorização legislativa para o decreto lei que aprovou o novo código, ou seja,
determina a inconstitucionalidade da manutenção em vigo do Código de 1991. O regime
transitório é inconstitucional mas o atual é inaplicável por falta da lei.
Não há interesse na publicação da lei porque administração perde e tribunal fica entupido,
contudo atualmente a execução é nula, devido à usurpação de poderes, deixando de haver
dever de obediência e sim o direito de resistência.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 124


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

INVALIDADE6

A ilegalidade do ato administrativo

Nestes casos ao dizermos que um ato é contrário à lei referimo-nos a um sentido muito
amplo de lei, englobando a Constituição, lei ordinária, regulamentos, contratos
administrativos (nas clausulas de caracter normativo), atos constitutivos de direitos etc.
As ilegalidades do ato administrativo podem ter natureza orgânica, formal ou material.

o Vícios do ato administrativo

Os vícios são as formas específicas que a ilegalidade do ato administrativo pode revestir.
A tendências de os tipificar começou em França mas estendeu-se aos demais país pela
conveniência e necessidade prática. Esta tipificação podia-se encontrar na Lei Orgânica
do Supremo Tribunal Administrativo: 15º/1 e mantêm-se até aos dias de hoje.

Usurpação de Poderes
Ilegalidade Orgânica
Incompetência

Ilegalidade Formal Vício de Forma

Violação de Lei
Ilegalidade Material
Desvio de Poder

Existe divergência doutrina sobre se é ou não exigível por lei que os particulares ao
recorrem ao contencioso discriminem qual o vício concreto enferma o ato.
Diogo Freitas do Amaral considera que esta especificação é útil para efeitos de economia,
clareza e celeridade processual.

• Usurpação de Poderes

Consiste na prática por um órgão administrativo de um ato incluído nas atribuições do


poder legislativo, moderador ou judicial, excluindo as atribuições do poder executivo.
CRP: 111º/2 Corresponde portanto a uma violação da separação de poderes.
Podemos considerar que este vício corresponde a uma incompetência agravada pelo que
não se justificaria a sua autonomização, contudo este surgiu com a Revolução Francesa
garantindo tanto que o poder judicial não interferia no administrativo como vice-versa.
Contudo com o passar do tempo e a estabilidade da sua autonomização não se justificava
não o estender aos demais poderes. Diogo Freitas do Amaral considera que existem três:
§ Usurpação do poder legislativo
Exemplo: criação de um imposto por ato administrativo CRP: 165º/1 i)
§ Usurpação do poder moderador (presidencial)
Exemplo: despacho do Primeiro-Ministro a demitir um funcionário da Presidência
§ Usurpação do poder judicial
Exemplo: deliberação de uma câmara municipal que declare a nulidade de um contrato

6
Livro freitas

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 125


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

• Incompetência

Consiste na prática por um órgão administrativo de um ato incluído nas atribuições ou na


competência de outro órgão administrativo.

Usurpação de poderes: poder Incompetência: órgão administrativo invada a


executivo invada a esfera de esfera própria de outra autoridade administrativa
outro poder do Estado. mas sempre no âmbito do poder administrativo

§ Incompetência Absoluta
Verifica-se quando um órgão administrativo pratica um ato fora das atribuições da pessoa
coletiva ou ministério a que pertence.

§ Incompetência Relativa
Verifica-se quando um órgão administrativo pratica um ato que está fora da sua
competência, mas que pertence à competência de outro órgão da mesma pessoa coletiva.

§ Incompetência em razão de matéria


Quando um órgão administrativo invalidade os poderes conferidos a outro órgão
administrativo em função da natureza dos assuntos (quando a lei distribui as competências
em tipo de competência a tratar)

§ Incompetência em razão da hierarquia


Quando se invalidem os poderes conferidos a outro órgão em função do grau hierárquico
(quando o subalterno invade a competência do superior)

§ Incompetência em razão do lugar


Quando um órgão invade os poderes conferido a outro órgão em função do território.

§ Incompetência em razão do tempo


Quando um órgão exerce os seus poderes legais praticando um ato administrativo antes
ou depois do momento ou período de tempo em que estava habilitado.

• Vício de forma

Consiste na preterição de formalidade essenciais (vício procedimental) ou na carência de


forma legal (vício de forma em sentido estrito).

§ Preterição de formalidade anteriores à prática do ato


Exemplo: falta de audiência prévia dos interessados

§ Preterição de formalidade relativas à pártica do ato


Exemplo: regras sobre votação em órgãos colegiais

§ Carência de forma legal


Exemplo: prática por despacho de atos em relação aos quais a lei exige a forma de portaria

A validade do ato afere-se no momento em que el é praticado, daí não ser relevante a falta
de formalidades posteriores ao ato.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 126


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

• Desvio de Poder

Consiste no exercício de um poder discricionário por um motivo principalmente


determinante que não condigna com o fim que a lei visou ao conferir tal poder. Sendo
que apenas se verifica no âmbito dos poderes discricionários da Administração.

O desvio de poder pressupõe a discrepância entre o fim legal e o fim real, ou seja, para se
determinar a existência de desvio de poder é preciso proceder a três operações:
1. Apurar qual o fim visado pela lei ao conferir a certo órgão administrativo um
determinado poder discricionário (fim legal)
2. Averiguar qual o motivo determinante da prática do ato em causa (fim real)
3. Determinar se condizem

Nota: não importa se o desvio de poder ocorreu por má interpretação (erro de direito) ou
se por vontade do agente (má fé).

§ Desvio de poder para fins públicos


Quando o órgão administrativo visa alcançar um fim distinto do que a lei impõe mas o
interesse perseguido continua a ser público.
Exemplo: pagamento de multa não para garantir a segurança mas para aumentar receitas

§ Desvio de poder para fins privados


Quando o órgão administrativo visa alcançar um fim distinto do que a lei impõem mas o
interesse perseguido é privado (parentesco, amizade etc).

• Violação de lei

Consiste na discrepância entre o conteúdo ou objeto do ato e as normas jurídicas que lhe
são aplicáveis.
Não concordância entre a situação abstrata delineada na norma e os pressupostos de facto
e de direito que integram a situação concreta.

Geralmente ocorre quando em áreas de poderes vinculados a administração decide coisa


diversa da que é estipulada por lei.
Na área de poderes discricionários a doutrina mais recente tem considerado que também
pode correr, quando sejam infringidos princípios gerais que condicionam a
discricionariedade: imparcialidade, igualdade, justiça, proporcionalidade e boa fé.

Falta de base legal


Erro de direito
Incerteza

• Cumulação de Vícios

Um ato administrativo pode estar ferido simultaneamente de várias ilegalidades: os vícios


são cumuláveis e pode ainda ocorrer cumulação de mais de um vício do mesmo tipo.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 127


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

o Outras formas de invalidade

• Ilicitude do ato administrativo

O ato ilícito é sempre ilegal, contudo Freitas do Amaral considera que pode um ato ser
ilícito sem ser ilegal em quatro situações:
§ Atos administrativo sem violar a lei ofenda um direito subjetivo ou um
interesse legítimo de um particular
§ Ato administrativo viole um contrato não administrativo
§ Ato administrativo ofenda a ordem pública ou os bons costumes
§ Ato administrativo contenha uma forma de usura

• Vícios da vontade no ato administrativo


Nos casos de erro pode ser complexo de entender, mas no dolo ou coação é evidente que
a ofensa da lei não é cometida pela Administração contudo não se pode deixar vigorar.

o Formas de invalidade CPA: 161º a 163º

Iremos agora tratar quais as sanções que a ordem jurídica atribui aos atos administrativos
ilegais, ilícitos ou viciados na vontade.

• Nulidade

• Anulabilidade

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 128


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Quadro Síntese dos Vícios do Ato Administrativo

Vício Definição Modalidades Desvalor


Usurpação de Pratica de ato incluído nas atribuições do Usurpação do poder Nulidade
poderes poder legislativo, moderador ou judicial legislativo
Corresponde portanto a uma violação da Usurpação do poder
separação de poderes. moderador
(presidencial)
Usurpação do poder
judicial
Incompetência Pratica de ato incluído nas atribuições ou na Incompetência Nulidade
competência de outro órgão administrativo. Absoluta (falta de
atribuições) Anulabilidade
Incompetência
Relativa (falta de
competências)
Vício de forma Preterição de formalidade essenciais (vício Carência Absoluta Nulidade
procedimental) ou na carência de forma forma legal
legal (vício de forma em sentido estrito) Preterição total do
procedimento legal
Deliberações tomadas
tumulosamente
Deliberações tomadas
sem quórum
Deliberações tomadas
sem ser pela maioria
exigida por lei
Outro vicio Anulabilidade
Violação de lei Não concordância entre a situação abstrata 161º/2 Nulidade
delineada na norma e os pressupostos de outros Anulabilidade
facto e de direito que integram a situação
concreta.
áreas de poderes vinculados a
administração decide coisa diversa da que
é estipulada por lei.
área de poderes discricionários
quando sejam infringidos princípios gerais
que condicionam a discricionariedade:
imparcialidade, igualdade, justiça,
proporcionalidade e boa fé
Desvio de poder discricionário por um motivo Desvio de poder para Anulabilidade
poder principalmente determinante que não fins públicos
condigna com o fim que a lei visou ao Desvio de poder para Nulidade
conferir tal poder fins privados
proceder a três operações:
Apurar qual o fim visado pela lei ao conferir
a certo órgão administrativo um
determinado poder discricionário (fim
legal)
Averiguar qual o motivo determinante da
prática do ato em causa (fim real)
Determinar se condizem

Nota: não importa se o desvio de poder


ocorreu por má interpretação (erro de
direito) ou se por vontade do agente (má fé).

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PROCEDIMENTO CONTRATUAL

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Substantivamente regulados por direito


privado, mas o procedimento que conduz à
celebração do contrato é regulado pelo CCP

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FORMAÇÃO DO CONTRATO ADMINISTRATIVO

Princípio da Parametrização Reguladora Multinível

Há uma parametrização, há normas que regulam a contratação púbica que tem diversos
níveis, ou seja, nem todas resultam do Código dos Contratos Públicos existe legislação
especial que complementa o regime.

o Instrumentos que permitem regular a formação do contrato

CCP: 1º/ a) Determina três níveis de legalidade: interno, internacional e europeu

CCP: 251º a 259º É admissível que se celebrem contratos que visem regular a formação
de outros contratos, os designados acordos quadro.

Peças no procedimento são atos praticados pela Administração com o propósito e


disciplinar em concreto um determinado procedimento contratual.
CCP: 130º, 131º, 157º, 167º, 208º, 218º- A/2 Anúncio
CCP: 41º O programa determina que o é regulamento e tem com o fim definir os termos
a que obedece a fase da formação do contrato até à sua celebração, quais as regras que
pautam a formação e atos subsequentes até à celebração do contrato.
CCP: 42º O caderno de encargos tem como conteúdo as clausula que posteriormente
irão ser incluídas no contrato que vai ser celebrado. Exemplo: quais as clausulas do
contrato se ganhar o concurso publico
CCP: 115º, 189º Convite à apresentação de propostas

Qual a natureza destas peças?

Teoria 1: As peças são um ato unilateral da administração. Solução do legislador para o


ato unilateral. Mas compete-lhe determinar esta natureza?

Teoria 2: A definição é unilateral como última palavra ou se define em termos unilaterais


mas sendo uma mera proposta contratual preliminar. Quando um particular manifesta
vontade em participar num procedimento contratual, implicitamente concorda com os
termos, as clausula, concorda com as peças.
Quando implícita ou expressamente concordo não há um contrato sobre as regras que vão
pautar o procedimento contratual? Se assim for não é mera concordância mas sim uma
manifestação de vontade que forma um contrato preliminar.

Estas peças obedecem ao princípio de estabilidade, a administração não pode, em regra


geral, durante a formação do contrato começar a alterar as regras, garantindo a
imparcialidade e tutela de confiança.
Exceções: CCP: 50º AP pode proceder a esclarecimentos, ratificações de erros

Podem ocorrer situações de contradição entre as peças do procedimento que serão


resolvidas pelos critérios CCP: 40º/4 e 5, 41º, 50º/9, 51º

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 134


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Princípio da não Plenitude da Subordinação dos Contratos ao regime do CCP

Nem todos os contratos estão sujeitos ao regime do Código, CCP: 4º a 6º - B são os


contratos que está previsto estarem excluídos, tendo um regime especial CCP: 5º - B
Podem estar afastados outros contratos com base em legislação especial que degorrem o
âmbito de aplicação do CCP.

Princípio pluralidade de procedimentos de escolha do cocontratante

CCP: 16º/1 A administração tem de escolher com quem quer contratar, existindo uma
pluralidade de vias e procedimento.

Tipos de procedimento para escola do cocontratante


• Ajuste direto CCP: 112º/2 + 113º a 129º
• Consulta prévia CCP: 112º/1 + 113º a 129º
• Concurso público: funções e sentido CCP: 130º a 161º
• Concurso limitado por prévia qualificação CCP: 162º a 192º
• Procedimento de negociação CCP: 193º a 203º
• Diálogo concorrencial CCP: 204º a 218º
• Parceria para a inovação CCP: 218º-A a 218º-D
Destas 7 os mais importantes são o concurso público (maior transparência e igualdade) e
o ajuste direito (mais eficiências mas menos transparência), sendo estes opostos.

Como administração opta entre estes tipos de procedimento?

Adequação do procedimento ao contrato em causa tendo por base critérios:


• Valor do contrato CCP: 17º a 22º
• Matérias sobre o que incide o contrato CCP: 23º a 30º-A
• Tipo contratual CCP: 31º
• Entidade adjudicante CCP: 33º

No fundo tudo tem na base um dilema que pautam a ideia de coadministração: devemos
procurar ter maior eficiência na escolha do cocontratante ou maior transparência?

Paulo Otero prefere a adoção do concurso público com a adoção de uma flexibilidade
procedimental. Mesmo quando é flexível o Governo tem sempre a hipótese de decretar
um decreto lei (especial) que degorra o CCP, tem acontecido muito atualmente.

Princípio da Complexidade intraprocedimental da adjudicação

Há uma pluralidade de procedimentos pré-contratuais:


• Tramitação procedimental específica CCP: 112º a 218º-D
• Instrumentos procedimentais especiais CCP: 219º-A a 266º-C

Há uma pluralidade de intervenientes no procedimento:


• Administração

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 135


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§ Entidade adjudicante CCP: 2º + 7º e seu agrupamento CCP: 39º


§ decisor CCP: 36, 38º, 67º/1, 79º, 109º
§ Júri do procedimento CCP: 67º a 69º
§ Contraente público

Proveninete da Administração eletrónica entram as


• Entidades gestoras de plataformas eletrónicas – Lei das Plataformas Eletrónicas

• Interessados
§ Candidatos CCP: 52º
§ Concorrente CCP: 53º
§ Seus agrupamentos CCP: 54º
Candidatos diferenciam-se dos concorrentes, os primeiros são os que participam na fase
de qualificação de um concurso sendo os concorrentes os que apresentaram uma proposta.

• Entidades consultadas preliminarmente CCP: 35º-A


• Os destinatários de convite a apresentar propostas CCP: 112º ou a participar no
concurso CCP: 167º, c)

Limites CCP: 55º E 55º - A

O mesmo interveniente pode ter um papel diferente em momentos diferentes do


procedimento.

Há diversas fases no procedimento administrativo


• Fase anterior à abertura do procedimento de formação CCP: 34º a 35º - A
Fase interna onde a administração preparar as peças procedimentais através de estudos,
intervenções técnicas que justificam a elaboração das peças
Dentro desta fase há decisões a tomar:
§ Decisão de contratar CCP: 36º
§ Autorização da despesa
§ Escolha do procedimento CCP: 38º
§ Escolha das peças do procedimento

• Anúncio do procedimento: Publicação CCP: 130º, 131º, 157º, 167º/1 e 2, 197º,


208º e Envio CCP: 113º/1
Materialização das decisões tomada na pré-fase conferindo-lhe um interesse externo
através da publicação.

• Esclarecimentos, erros, omissões e retificações CCP: 50º


Podem ser dirigidos à Administração, tendo ela de tomar uma destas condutas

• Intervenção dos candidatos pode levar à sua qualificação ou exclusão


CCP: 164º/1, n), 168º a 178º, 183º a 188º
Os candidatos excluídos não passam a concorrentes
Entrega de propostas CCP: 56º a 66º, 135º a 138º, 158º, 189º a 192º

• Análise e avaliação das propostas CCP: 70º a 72º, 139º


Verificam se as propostas são conformes à legalidade e às peças procedimentais e fazer
ainda um juízo de mérito.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 136


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§ Relatório preliminar da legalidade e das peças do procedimento CCP:


122º e 146º sujeito à audiência prévia dos concorrentes CCP: 123º e 147º
Os concorrentes tem interesse em valorizar a sua e desvalorizaras outras propostas

• Relatório final CCP: 148º


Com base nas observações que os concorrentes fazem o jurí prepara um relatório final
após um processo de ponderação e estabelecimento de hierarquia entre as propostas

• Adjudicação CCP: 73º a 80º, 81º a 93º, 124º/4, 148º/4


Ato pelo qual a administração escolhe com quem vai contratar tendo como fundamento
o próprio relatório final

• Celebração do contrato CCP: 94º a 106º


§ Obedece a regras de eficácia CCP: 127º e 287º
Dentro destas regras à a destacar a fiscalização prévia pelo Tribunal de Contas LOPTC:
44º e 45º

Princípio sancionamento da violação da juridicidade

Sempre que há uma violação da legalidade essa vem acompanhada de um desvalor


jurídico, de uma sanção.
A invalidade do procedimento comunica-se ao próprio contrato, assim todos os vícios
que ocorram a montante
CCP: 455º a 463º Pode existir responsabilidade contraordenacional
CCP: 464º Responsabilidade criminal

Princípio da tutela garantistica dos interessados

Mecanismo que permitem um defesa dos interesses dos particulares


• Audiência prévia CCP: 147º e 161º
• Impugnações Administrativas CCP: 267º a 274º
• Tutela Judicial
§ Impugnação das peças do procedimento CPTA: 103º
§ Ação de impugnação dos atos CPTA 100º e 180º/3
§ Ação de condenação à prática de atos: CPTA, 100º
§ Efeito suspensivo automático CPTA, 103º-A e medidas provisórias CPTA,
103º-B

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 137


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EXECUÇÃO DO CONTRATO ADMINISTRATIVO

Princípio do cumprimento das vinculações contratuais e legais

Expressa a ideia de que o contrato deve ser cumprido quer nos termos expressos pelo
contrato quer nos termos que resultam da lei.

CCP: 279º Tem subjacente o princípio de que o contrato é a lei entre as partes.
CCP: 310º Acordos endocontratuais podem ser elaborados de forma a substituir o acordo
anterior, como podem celebrar acordos que substituem atos administrativos, situações em
que o contraente público poderia definir unilateralmente uma posição jurídica.

CCP: 286º Vinculação bilateral de ambas as partes devido ao princípio da boa fé e do


interesse público
CCP: 289º Princípio da colaboração mútua
CCP: 288º Dever de execução exata e pontual das prestações pelo cocontrante
CCP: 464º - A Há sancionamento do incumprimento desse dever de executar
CCP: 290º Deveres de informação, sigilo, proteção e segurança
CCP: 291º, 290º - A e 302º O contraente público deve acompanhar a execução do
contrato. Pode ocorrer que o contraente público cria a função do gestor do contrato que
tem as funções do CCP: 290º - A
CCP: 454º - A a 454º- C Auditoria e fiscalização

Princípio da estabilidade contratual

CCP: 286º Uma consequência da segurança, da proteção e da transparência e


imparcialidade.

CCP: 288º Tem uma tripla incidência quanto ao regime, às prestações e partes. Não é
possível estar sempre a ser alterado, deve haver estabilidade da manutenção.

As situações de alteração quer de prestação quer de regime assumem uma natureza


excecional ao longo da execução, mas existem:
• CCP: 311º e 315º Modificação do objeto
§ Alteração das circunstâncias
§ CCP: 312º Razões de interesse público
• CCP: 312º c) Modificações unilaterais
Limites: CCP: 297º + 298º Estabilidade e suspensão da execução das prestações
CCP: 302º f) + 316º a 324º A cessão de posição contratual

Princípio do equilíbrio financeiro

CCP: 282º Quando se contrata ou quando os cocorrentes apresentam uma proposta tem
no fundo uma ideia de equiparação entre uma prestação que os particulares estão
obrigados caso o contrato com eles seja celebrado. Para essa prestação há uma previsão
de uma contrapartida se em troca de vir a receber aquilo.
Eu dou mais do que recebo ou recebo menos do que aquilo que dou existe um
desequilíbrio que pode ter no fundo muitas razões:

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 138


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• CCP: 313º1 e) 314º Modificações objetivas, como incremento das prestações.


• Rotura por alteração das circunstâncias ou imprevisão
Exemplo: No confinamento baixou os condutores nas autoestradas havendo uma quedas
nas receitas das confecionarias
Será fundamento para um reequilibro financeiro? É um direito?
• Modificação unilateral da administração
Exemplo: Iluminação pública que passa a ser a eletricidade e não a gás a substituição
aumento custos e houve modificação do conteúdo financeiro inicial do contrato e a
Administração Pública deve garantir o reequilíbrio financeiro.

CCP: 282º/6 Limites ao reequilíbrio financeiro


• Proibição do enriquecimento sem causa
com a modificação continuo a ter lucro mas coma ambição de aumentar o lucro mudo a
prestação a requerimento de reequilíbrio financeiro.
• Perdas já existentes do equilíbrio
Se já tinha uma situação de prejuízo porque me enganei nas contas (achava que estava
em lucro mas não) não pode haver reequilíbrio, não se tivesse enganado
• Risco contratual
Em vez de se ter enganado, não teve a antevisão suficiente, como não tomar em
consideração certas variáveis, não prever alterações possíveis. Assim se as perdas estão
dentro da margem de risco do contrato que eu assumi corro esse risco.

CCP: 341º Parcerias público-privadas: partilha de benefícios a favor do contraente


público e estão direcionados a favor desse contraente

Princípio da intervenção exorbitante do contraente público

CCP: 302º Em nome da ideia do interesse público concebe-se ao contraente publico


poderes normalmente não concebidos aos contraentes particulares.
Há poderes exorbitantes unilaterais:
• Poder de direção da execução das prestações CCP: 303º + 304º
Definir como é que quer que as prestações sejam executadas pelo privado
• Poder de fiscalizar a execução do contrato CCP: 303º + 305º
Tem de saber se efetivamente se aquilo se direcionou é acatado e realizado nos modos
utilizados.
• Poder de modificar unilateralmente a prestação respeitando os limites
• Poder sancionatório CCP: 329º
Poder de aplicar sanções consoante os termos em que a outra parte está a executar ou não
executar o contrato.
§ Multas CCP: 329º
Situação menos grave pois há incumprimento pontal, tipo de prazos, sancionam e
impedem a continuação de situação de mora
§ Resolução do contrato CCP: 329º + 333º
§ Cessão de posição contratual CCP: 318º-A
• Poder de resolução unilateral
Com dois fundamentos distintos e que se repercutem na responsabilidade civil
§ Sancionatório CCP: 333º
Pode haver possibilidade do particular indemnizar o erário publico pela violação do
contrato que gera danos que levam a cessação

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 139


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§ Razões de interesse público CCP: 334º


Particular não tem responsabilidade nenhuma e de um momento para o outro a sua
posição contratual cessa confere ao particular uma indeminização que tem na base a ideia
de que a resolução é uma lesão de um direito de conteúdo de patrimoniais privado
• Poder de ordenar a cessão da posição contratual
Dizer tu particular deves cessar a tua posição, desaparecendo de cena e sendo substituído
por outro particular.
• Poder de substituir a execução das prestações omitidas pelo cocontrate em mora
CCP: 325º/2 e 3

Princípio da relativização dos poderes de iums imperii do contraente público

Os poderes exorbitantes são de algum modo relativizados em certos domínios


CCP: 307º/1 O domínio de excelência é a interpretação, validade e execução do contrato
e para haver uma relativização de poderes não são atos administrativos, não tem a
autotutela declarativa, são meras declarações negociais, assim a sua eficácia depende do
cometimento e concordância do destinatário.
Se a Administração quiser impor um juízo interpretativo ou de validade tem de ir a
tribunal para ser válido.
CCP: 307º/2 Há casos em que goza de autotutela declarativa pelo que a intervenção é ato
administrativo
CCP: 309º Casos em que os atos da administração são eles próprios títulos executivos.

Princípio da responsabilidade civil do contratante privado

Pode ser chamado a responder por perdas e danos que causa ao contratante público.

Princípio da salvaguarda da posição do cocontratante

Até agora estudamos princípios que reforçam o interesse pública, mas durante a execução
do contrato também há a salvaguarda de posições do contratante privado.
Os mecanismos de proteção da posição deste:
• Ausência de autotutela declarativa em matéria de interpretação, validade e
execução CCP: 307º/1
A proteção resultado do facto da administração não poder unilateralmente impor o seu
juízo de direito se quiser impor tem de ir a tribunal tal como os particulares.
• Reposição do equilíbrio financeiro CCP: 282º
Pode exigir que seja reposto o reequilibro e aqui a administração não pode por via de lei
excluir o equilíbrio. Tem de haver uma compensação para um prejuízo que tenhamos em
nome do interesse público.
• Responsabilidade por mora do contraente público CCP: 326º e 334º/3
• Exceção do não cumprimento CCP: 327º
• Direito de retenção CCP: 328º
• Resolução do contrato CCP: 332º
• Direito a uma justa indemnização CCP: 334º/2, + 335º/2
• Tutela judicial CCP: 307º/1; 332º/3; CPTA: 476º

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 140


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EXTINÇÃO DOS CONTRATOS

3.1. Acordo das partes: revogação – 331o

3.2. Caducidade: 330o, alínea a)


(i) Cumprimento integral das prestações
(ii) Verificação de termo final ou condição resolutiva
(iii) Impossibilidade superveniente absoluta: o caso de força maior – “an act of God”

3.3. Resolução por iniciativa do contraente público:


a) Resolução sancionatória: 325o, no 2 e 333o, no 1;
b) Resolução por razões de interesse público: 334o - ato análogo à “expropriação”
c) Resolução por alteração anormal e imprevisível das circunstâncias: 335o, no 1

3.4. Resolução por iniciativa do cocontratante: 332o, no 1

3.5. Anulação judicial ou arbitral

3.6. Intervenção do legislador: fait du prince – artigo 335o, no 2 3.7. Regimes especiais
a) Contratos sobre o exercício de poderes públicos: 336o e 337o
b) Contrato de empreitada de obras públicas: 405o e 406o
c) Concessões de obras públicas e de serviços públicos: 421o a 423o e 436o
d) Contrato de locação de bens móveis: 448o e 449o

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 141


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CASO-PRÁTICO 1

A) Determina a norma x que “Aos alunos da Faculdade de Medicina com graves


carências económicas, pode o Diretor da Faculdade atribuir uma bolsa de montante
adequado”.

Aspetos vinculados:
Competência: Direito da faculdade
Fim: ajudar as dificuldades económicas dos alunos
Alunos da faculdade de medicina

Aspetos indeterminados/conceções valorativas:


Carências económicas
Pode
Montante (pecuniário) adequado da bolsa

Previsão: alunos da faculdade de medicina


Temos abertura na estatuição da norma
Estatuição 1: não dar bolsa
Estatuição 2: dar 5
Estatuição 3: dar 100

Como se escolhe entre as estatuições?


Ir buscar os interesses criando diversas previsões, devido aos interesses relativos ao caso
concreto guiada a recolha dos interesses pelo princípio da imparcialidade.
P1 (aluno de direito com média 12) leva a estatuição 1
P2 (aluno de direito com média de 15) leva a E2
ETC

Violação o princípio da imparcialidade quando a AP tem estes interesses, ou segundos


dados, e tomam uma decisão tendo em conta a existência de abertura apenas na estatuição,
ou seja, não tendo em conta os demais fatores.

1) O pedido de A é indeferido pela antipatia pessoal que o Diretor nutre por ele; de todo
o modo, A nunca poderia ser considerado um aluno com graves carências económicas;

Violação do princípio da imparcialidade na sua vertente negativa, pois não pode ter em
consideração interesse que não são relevantes para a decisão gerando o vicio de violação
de lei.
Verifica-se ainda o vício de desvio de poder quando a motivação do ato não coincide com
o pretendido tendo como desvalor a nulidade do ato por ter no fundo interesses privados.
Sempre que há desvio de poder há violação do princípio da imparcialidade, porque a
motivação não é o fim legal, contudo ao contrário não tem de ser sempre

Caso se considera-se que tinha graves carências económicas o ato seria nulo. Mas olhando
para a norma vemos que a AP tem 1 solução legalmente possível, dizendo que ele não é
aluno com carência económica, pelo que neste caso não existe discricionariedade devido
à redução das possibilidades a 0.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 142


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Acerta na decisão, mas as motivações são inválidas. Há duas soluções:


Se diz que nos atos vinculados (pela redução a 0) e que o ato obedeça vinculação, devido
ao erro ou desvio de poder, há nulidade.
O que a lei diz é que o ato tem de sair x e saiu x, a partir dai é irrelevante se as motivações
têm erro ou não.
Ou seja, temos que fazer prevalecer as motivações ou a conformidade da decisão final
com a lei.

2) O pedido de A é deferido, lendo-se na fundamentação do ato que “apesar de A não


apresentar graves carências económicas, é um aluno de reconhecido mérito”;

Tem em consideração o mérito do aluno, o que não corresponde a um interesse relevante


para o fim da norma, pelo que há violação do princípio da imparcialidade na vertente
negativa.
Há ainda desvio de poder (vicio), pois a motivação é premiar um aluno com boas notas,
contudo neste caso o desvio de poder pretende prosseguir interesse público o que leva à
anulabilidade (desvalor).

Podemos considerar que há falta de competência, pois a competência que lhe é atribuída
pela lei é atribuir bolsas a alunos com carências económicas. As competências têm de
estar estipuladas na lei, devido ao princípio da legalidade.

3) O pedido de A é deferido, apesar de A ser aluno da Faculdade de Direito;

Há aqui igualmente incompetência lato sensu, pois a lei não dá esta competência ao
Diretor para atribuir bolsas aos estudantes de direito. Contudo o vicio não é
incompetência ou violação do princípio da incompetência mas sim violação de lei.

4) A, sem rendimentos, vê o seu pedido ser indeferido;

Não temos a fundamentação do ato.


Caso a fundamentação for considerar que não houve graves carências económicas, não
há violação do princípio da imparcialidade, apenas se usou a discricionariedade na
margem de livre decisão possibilitada por uma expressão valorativa. Houve ponderação
dos interesses relevantes, ou seja, teve em conta os rendimentos do aluno, contudo houve
apenas um juízo incorreto, houve uma avaliação incorreta dos interesses relevantes.
Há violação do princípio da proporcionalidade na sua vertente de adequação

5) A, cujo agregado familiar tem de rendimento mensal 10.000€, vê o seu pedido ser
deferido;

Violação do princípio da proporcionalidade, princípio de adequação violado, há erro


manifesto de apreciação, deve haver indeferimento vinculado

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 143


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

6) A vê o seu pedido ser indeferido, sem que o Diretor tenha atendido às despesas fixas
com os menores a seu cargo;

Não foram tomadas em consideração parte das despesas, violação do princípio da


imparcialidade na vertente positiva por não terem sido tidos em conta todos os interesses
Neste caso, esses interesses são as despesas de A.

Sub-hipótese: A recebe o indeferimento, apercebe-se pela fundamentação que não foram


tomados em consideração todos os interesses e vai para tribunal, pedindo a condenação
da Administração, dizendo que o ato é inválido porque não foram considerados todos os
interesses e, além disso, diz que tem carências económicas e que deve receber uma bolsa
não inferior a 200 euros. O tribunal condena a Administração a praticar um novo ato,
tomando em consideração as despesas que o A tem. CPA: 71º/2 O tribunal não vai
condenar a uma conduta determinada mas deve explicitar as vinculações: dizer que viola
proporcionalidade na vertente de adequação, explicando o que isso é; pode ir mais longe
e dizer que a baixo de x não é adequado; condena a pratica de um novo ato.

7) A, cujo agregado familiar tem de rendimento mensal pouco mais do que o salário
mínimo nacional, vê o seu pedido ser indeferido;

Princípio da proporcionalidade, atuação pouco razoável, violação de lei passível de


controlo judicial (carmona considera que está dentro da margem de livre decisão da
administração, não considera um caso de erro de manifesto de apreciação)

8) Considerando que A é um aluno com graves carências económicas, o Diretor atribui-


lhe uma bolsa mensal de 1€;

Violação do princípio da proporcionalidade na vertente da adequação pois os meios não


servem para atingir o fim

9) Considerando que A é um aluno com graves carências económicas, o Diretor atribui-


lhe uma bolsa mensal de 2.500€;

Violação princípio proporcionalidade na vertente do princípio da necessidade na questão


da proibição do excesso.

10) Considerando que A é um aluno com graves carências económicas, o Diretor atribui-
lhe uma bolsa mensal de 35€;

Está dentro da margem de livre decisão da administração pública

B) Nos termos do artigo 33.º, n.º 1, alínea w da Lei n.º 75/2013, compete à Câmara
Municipal “ordenar, precedendo vistoria, a demolição total ou parcial ou a

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 144


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

beneficiação de construções que ameacem ruína ou constituam perigo para a saúde


ou segurança das pessoas”.

Aspetos vinculados:
Competência: Câmara Municipal
Fim: garantir segurança e saúde das pessoas no que toca a construções
“Precedendo vistoria”: passo obrigatório do procedimento, ocorrendo, quando não seja
realizada um vicio de forma, violação do princípio do inquisitório (não recolheu todos os
interesses) e violação do princípio da imparcialidade (não teve em conta todos os
interesses, pois nem recolheu todos)

Aspetos indeterminados/conceções valorativas:


“Construções que ameacem ruína”: isto é discricionariedade técnica, ou seja, são
situações de incerteza mas que são resolvidas por juízos técnico e não juízos valorativos
próprios da função administrativa.
“Constituam perigo a saúde ou segurança”: Aqui poderá existir já um espaço de
valoração administrativa

1) O vereador A, inimigo de longa data de B, aproveita a praga de rastejantes que


invadiu a casa de B para ordenar a sua demolição;

Desde logo há vicio de forma devido a não ter havido vistoria, que é uma formalidade da
fase instrutória do procedimento. No silencia admitimos que não foi feita.

Tende a ser colocado nos casos por omissão a violação da audição dos interessados,
de uma falta de formalidade ou de fundamentação.

Violação do princípio da imparcialidade na sua vertente negativa, pois não pode ter em
consideração interesse que não são relevantes para a decisão gerando o vicio de violação
de lei, ou seja, não podia ter em conta a sua inimizade.

Verifica-se ainda o vício de desvio de poder porque a motivação do ato não coincide com
o pretendido, a motivação principalmente determinante foi a inimizade tendo como
desvalor a nulidade do ato por ter no fundo interesses privados.

Se não se considerar que houve desvio de poder e que o fim que está a ser perseguido é o
fim da norma existia uma violação do princípio da proporcionalidade, pois apesar de
intervir para garantir a segurança, sendo a demolição adequada, houve violação na sua
vertente da necessidade, pois não se precisa de demolir para resolver.

2) A casa de A insere-se numa rua histórica da capital; porém, destoa bastante em


termos arquitetónicos, o que não é bom para o turismo. A CM ordena a demolição da
casa “para que se possa tornar a Rua x um foco de atração turística”;

Desde logo há vicio de forma devido a não ter havido vistoria, que é uma formalidade da
fase instrutória do procedimento. No silencia admitimos que não foi feita.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 145


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Violação do princípio da imparcialidade na sua vertente negativa, pois não pode ter em
consideração interesse que não são relevantes para a decisão gerando o vicio de violação
de lei, ou seja, não podia ter em conta a arquitetónica da casa para efeitos de turismo.

Verifica-se ainda o vício de desvio de poder porque a motivação do ato não coincide com
o pretendido tendo como desvalor anulabilidade do ato por ter no fundo interesses
públicos.

É um caso de incompetência, pois não está prevista na lei uma competência para demolir
imoveis que prejudiquem o turismo? Está sempre em causa uma violação da lei, mas em
todos os vícios existe ainda uma violação da competência, o nome completo é princípio
da legalidade da competência, ou seja, a violação é sempre da lei que atribui competência.

3) A casa de A encontra-se em avançado estado de degradação e, após vistoria, a CM


ordena a sua demolição. I considera que a CM devia antes ter ordenado a sua
beneficiação, visto o seu imóvel ter características arquitetónicas únicas. A CM diz que
são únicas, sim, destacando-se pela sua fealdade;

Não é suposto os titulares de órgãos decidirem consoante juízos de valores

4) Visto a casa de A ser um local habitualmente frequentado por toxicodependentes que


aí se encontram para consumir substâncias ilícitas, a CM ordena a sua demolição;

Referimo-nos a um edifício abandonado e não uma casa de um deles, que dá festas.

Aqui a questão que se coloca é se o facto de ser uma casa de chuto entra numa situação
de perigo para a saúde ou segurança. Mas sendo uma cada abandonada poderá sempre
existir a possibilidade da casa estar a ruir.

No juízo de adequação não é comparação entre meios é apenas relação do meio ao fim,
ou seja, não se verifica se é o meio mais correto, apenas se é um meio correto para o fim.
A comparação de meios, caso haja mais que um meio adequado, ocorre na necessidade,
mas a comparação não prende com saber qual é o mais eficaz, mas sim qual o sacrifico
que impõem, escolhendo-se o menos gravoso para o interesse contraposto.
Saber se um meio é mais adequado que outro não entra em nenhum dos juízos do princípio
da proporcionalidade.

Considerando que a atividade causa perigo para a segurança das pessoas, a demolição do
edifício será um meio adequado pois irá extinguir o perigo.

5) Na vistoria à casa de A, os técnicos da CM concluíram que o edifício apresentava


sinais notórios de degradação nas paredes interiores e nos pavimentos e emitiram
parecer no sentido da sua demolição. A considera, porém, que a estrutura do edifício se
encontra em bom estado e que isso deveria ter sido considerado pelos técnicos;

Houve uma vistoria, pelo que não houve vicio de forma.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 146


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Admitindo que o A tem razão e que o edifício está em bom estado, os técnicos ao
proporem a demolição fazem um juízo errado, pois não verificaram a estrutura que se
encontram bem. Temos técnicos que foram ao local, que não viram tudo o que deviam ter
visto e declararam a demolição quando não era necessário.

O que verificamos é que houve um erro na discricionariedade técnica da administração.


Não tem haver com erro manifesto de apreciação pois este está reservado para a
apreciação valorativa da administração. Aqui não estamos no âmbito de formação de
vontade própria da decisão, pelo que os princípios não necessitam de limitar a
discricionariedade.

Assim nestes casos pode existir sempre controlo por parte dos tribunais, pois não irá
ocorrer violação da separação dos poderes.

6) A é notificado de uma ordem de demolição da sua casa. Consultando o processo


administrativo, verifica que, apesar de o ato final identificar a sua habitação, a vistoria
foi efetuada ao prédio do lado;

Erro, violação de lei, anulabilidade

7) Na ordem de demolição da casa de A, lê-se que o telhado já desabara


parcialmente. A diz que apenas caíram 3 telhas e após uma noite de tempestade;

A representação da realidade que a Administração faz é que metade do telhado caiu e a


realidade de facto é que só caíram 3 telhadas, pelo que há um erro de facto.

8) A impugnou nos tribunais administrativos a ordem de demolição da sua casa; o


Tribunal condenou a Administração a ordenar antes obras de remodelação, por entender
que a beleza do edifício assim o justificava.

Violação do princípio da separação de poderes, podo tribunal substitui-se à


Administração no juízo de ponderação e não apenas de apreciação da legalidade.

9) A é vizinho de B, cuja casa apresenta sinais de degradação e com quem tem uma
relação de inimizade declarada. A pede à CM que proceda à demolição da casa de B,
invocando que se encontra em estado de ruína. O vereador C ordena a demolição dois
dias depois. B não acata a ordem e diz aos amigos que nada vai fazer, visto a ordem ser
obviamente ilegal.

A não é titular pelo que é irrelevante que não goste de B. O vereado ordena a demolição
dois dias depois, o que indicia que não houve vistoria, nem audiência dos interessados
nem requisitos de formalidades. Tem de se requerer uma providência cautelar de
suspensão da demolição, pois o ato administrativo ilegal mas apenas anulável pelo que
produz efeitos e se o particular não se manifestar a tempo a decisão consolida-se na
ordem jurídica, sendo a demolição iniciada pela Administração mas ao encargo do
particular.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 147


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CASO-PRÁTICO 2

A) Nos termos da lei X, os interessados têm até ao dia 10 de abril de 2020 para pedir
o subsídio especial de apoio à investigação de medicinas alternativas, a conceder pela
Administração Regional de Saúde da área respetiva.

1) A 5 de abril, João dirige o seguinte requerimento ao Presidente da Junta de Freguesia


do Lumiar: “Solicito, nos termos da lei, que me seja concedido o subsídio especial de
apoio à investigação de medicinas alternativas”. Passou um ano e João ainda não obteve
resposta.

A atribuição dos atos corresponde a um ato administrativa, pois é uma conduta com
destinatários concretos, ao contrário dos regulamentos que tem carater geral e abstrato.

CPA: 102º/1 Formalidades que deve ser respeitada aquando a realização do


requerimento, não tendo sido preenchidos diversos, como o órgão a que se dirige os os
factos que baseiam o pedido. Contudo CPA: 108º deveriam ter dado a oportunidade ao
João para corrigir as formalidades e o Presidente da Junta deveria ainda tentar superar as
irregularidades de modo a não prejudicar o João, nomeadamente CPA: 109º/2 – 41º
enviando o requerimento ao órgão titular da competência, nomeadamente à
Administração Regional de Saúde, avisando o particular. Estamos perante uma violação
de lei, ilegalidade. Apenas após o João ter a possibilidade de corrigir as formalidades e
não o fazer é que pelo CPA: 163º/1 o requerimento seria anulável.

O princípio da decisão é consagrado na CRP: 286º/6 como Direito Fundamental.


CPA: 13º/1 Toda a pretensão formulada pelo particular à Administração Pública tem de
obter uma resposta, a Administração não pode perante um pedido ignorar e não decidir.

O dever de decisão tem que realizar-se sempre com referência a um prazo razoável de
decisão, sendo que um atraso injustificado equivale a uma recusa de decisão.
A exigência de que as decisões administrativas sejam dimanadas num prazo razoável é
hoje, pelo Carta de Direitos Fundamentais da UE: 41º/1, um Direito Fundamental.
CPA: 86º/1 Prazo de 10 dias para que a Administração se pronuncie, contudo não se
aplica aos casos da decisão, pelo que não consideramos que se aplique.
CPA: 128º/1 Prazo que se aplica á decisão, que não foi cumprido, pelo que CPA: 129º
existe um incumprimento do dever de decisão permitindo ao particular utilizar os meios
de tutela administrativa e jurisdicional adequados.

A reclamação vem prevista no CPA: 191º


CPA: 184º/1 b) Permitia ao João reagir contra a omissão, tanto do Presidente da Junta
na violação do 41º, como da ausência de decisão.

2) E se o requerimento de João tivesse sido dirigido à Administração Regional de Saúde


de Lisboa e Vale do Tejo, mas a 10 de maio?

CPA: 103º/1 Neste caso não se colocaria a questão do João se ter dirigido ao órgão errado,
mas sim o problema de não ter respeitado o prazo previsto para pedir o subsídio, o que
prejudica o normal procedimento CPA: 109º/1 b)
Devido à extinção do direito, torna-se impossível, pelo que se extingue CPA: 95º

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 148


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B) Nos termos da lei Y, a competência para licenciar estabelecimentos de prestação


de cuidados de saúde pertence à Ministra da Saúde. Tendo dado entrada um pedido
de “L. S.A.” para licenciar uma clínica,

1) A Ministra da Saúde não delega a direção do procedimento por “entender que não é
conveniente”

CPA: 55º/2 Existe um dever de delegar, é possível não delegar alegando e


fundamentando a existência de razões ponderosas, contudo não consideramos que o
“entender que não é conveniente” seja suficiente.

2) A Ministra da Saúde delega a direção do procedimento no imediato inferior


hierárquico mas ordena-lhe que proceda à investigação das boas práticas de “L.S.A.”
na comercialização de medicamentos.

A delegação congela a hierarquia pelo que não era possível emanar a ordem.
não percebi, mas pus isto55º/1, 55º/2, 49º/1, a delegação congela a hierarquia, não pode
dar ordens. Isto é para garantir a imparcialidade, se calhar nem instruções pode dar.

C) Maria dirige um pedido à Câmara Municipal de Lisboa a 3 de janeiro e ainda


não obteve resposta a 1 de junho, sendo que:

CPA: 68º/1 A Maria tem legitimidade

1) a CM invoca que, por ter sido o requerimento entregue nos serviços da Junta de
Freguesia, só o recebeu a 1 de fevereiro;

CPA: 109º/2
CPA: 41º/2 Para efeitos de tempestividade conta esta data
CPA: 128º/3 Para o prazo de decisão
CPA: 129º
CPA: 87º

2) ainda não decidiu porque aguarda a emissão de parecer pelo Instituto x, que solicitou
a 10 de março;

O prazo só começa a contar após a conclusão das formalidades, como é o CPA: 92º/2
parecer, tendo nos termos do CPA: 92º/3 20 dias uteis, começando-se a contra no dia
seguinte o CPA: 128º/3 prazo de 60 dias para decisão.
CPA: 92º/5 e 6 o procedimento pode prosseguir caso não se tenha emitido o parecer em
tempo útil.

91º e ss.
92º/3, têm 20 dias, já passou.
∙ Facultativo, pode-se seguir em frente logo que ultrapassados os 20 dias.
∙ No caso do parecer obrigatório e não vinculativo, pode prosseguir sem ser emitido
apos 20 dias, 92º/5 CPA. Há prazo para pedir o parecer?

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 149


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∙ No caso do parecer obrigatório e vinculativo, o procedimento pode prosseguir,


92º/6 e a Câmara tinha um prazo de 10 dias para pedir o parecer.

4) só pode decidir depois de receber o parecer do Instituto x, que ainda não solicitou;

Problema: o prazo para o órgão competente para a decisão final so começa a correr depois
das formalidades:
Se foi pedido mas não emitido: 92.º;
Se a AP nunca chega a pedir o parecer, nunca chega a correr o tempo para decidir;
A solução é dizer que a AP tem 10 dias para pedir o parecer (86º/2) em seguida contamos
o prazo de emissão do parecer (92.º) e depois começa o prazo para a decisão final.

5) a CM nada diz porque é a segunda vez que Maria formula idêntico pedido, com
idênticos fundamentos, e a CM já antes indeferiu o pedido.

Se tal ocorreu há menos de dois anos, então nesse caso não há o dever de decisão nos
termos do artigo 13.º/2. Mas não pode não dizer nada, tem de avisar que não vai deferir

Se foi à mais de dois anos há o dever de decidir.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 150


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CASO-PRÁTICO 3

1) “Indefiro o pedido de António porque não gosto dele desde a escola primária”

CPA: 152º Administração tem dever de fundamentação dos atos administrativos que
imponham deveres ou neguem pretensões. Ele fundamentou, o dever como mera
formalidade está cumprido. Para haver uma violação do dever de fundamentação tem de
não se compreender o porque da tomada de decisão, contudo neste caso percebe-se o que
levou a Administração Pública a tomar a decisão.

CPA: 9º + CRP: 266º/2 O principio da imparcialidade impõe que a Administração se


comporte de forma isenta e equidistante em relação a todos os particulares, assegurando
a igualdade de tratamento dos interesses dos cidadãos, através de um critério uniforme de
prossecução do interesse público, não tendo campo de aplicação no domínio da
ponderação de interesses públicos e privados conflituantes.
Verificamos uma violação do princípio da imparcialidade na sua vertente negativa, pois
não pode ter em consideração interesses que não são relevantes para a decisão.
CPA: 73º/ d) O decisor administrativo devia pedir escusa

Esta violação gera o vicio de violação de lei que se reconduz a anulabilidade mas ainda
desvio de poder por motivos de interesse privado, CPA: 161º/2 e) o que leva à nulidade.

2) “Indefiro o pedido de Bento pois este tem rendimentos mensais superiores ao salário
mínimo”; Bento demonstrou que tem apenas 150€ de rendimentos mensais

CPA: 152º Administração tem dever de fundamentação dos atos administrativos que
imponham deveres ou neguem pretensões. Ele fundamentou, o dever como mera
formalidade está cumprido.

A representação da realidade que a Administração faz é que o Bento tem rendimentos


mensais superiores ao salário mínimo e a realidade de facto é que o Bento tem um
rendimento mensal de 150€, pelo que há um erro nos pressupostos de facto.

CC: 252º O ato da Administração é inválido, pois há um erro nos pressupostos de facto
“vício de violação de lei e consiste na discrepância entre os pressupostos factuais que se
revelarem determinantes para a decisão e aqueles que efetivamente se verificam”.
CPA: 168º/1 Isto leva à sua anulabilidade.

3) “Indeferido. O requerente não demonstrou os requisitos exigidos pela lei”

CPA: 102º Foi elaborado um requerimento inicial

Se o requerimento não demonstrou os requisitos do CPA: 102º/1 a Administração não


deve indeferir mas sim CPA: 108º convidar o requerente a suprir as deficiências
existentes
CPA: 108º/3 Apenas podem rejeitar os requerimentos ininteligíveis ou não identificáveis.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 151


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CPA: 153º/2 No caso em concreto parece ser uma fundamentação insuficiente que
equivale à falta de fundamentação o que gera anulabilidade.

4) Apesar da oposição de António, a CM deferiu o pedido de Bento, seu vizinho, o que


deixou António estupefacto

CPA: 68º Caso António for interessado tem a legitimidade de se constituir como tal
CPA: 65º/2 Tem de cumprir as formalidades
CPA: 121º/1 António sendo interessado, a Administração devia ter realizado uma
audiência prévia.

CPA: 127º A Administração pode decidir, CPA: 152º/1 c), desde que seja fundamentada.
Se estiver em causa um procedimento de aplicação de sanções ou lesivo da propriedade
ou liberdade, a falta de fundamentação atinge um núcleo essencial do direito fundamental
do procedimento equitativo pelo que gera nulidade.
Se não estivermos nestas áreas, a falta de fundamentação gera o vício de forma, cujo
desvalor é a CPA: 163º/1 anulabilidade.

5) A CM ordenou a António que procedesse à demolição do seu imóvel, coisa que António
já tinha feito no mês anterior

CPA: 148º Esta ordem constitui um ato administrativo


CPA: 161º/2 c) Sendo o objeto impossível o ato praticado é nulo.

6) O Secretário Regional da Economia praticou um ato da competência do Secretário


Regional da Saúde

Os Ministérios em Portugal têm cada um as suas atribuições, pelo que os secretários ao


serem subordinados a Ministérios diferentes incorrem em incompetência absoluta cujo
desvalor é CPA: 161º/2 b) nulidade. Aplicação analógica do artigo aos Secretários.

7) O Ministro da Economia atribuiu a Bento a concessão dos recursos mineiros da Lua

Este ato tem um objeto impossível uma vez que a Lua não faz parte do comércio jurídico
por ser insuscetível de apropriação individual, pelo que ato é nulo CPA: 161º/2 c)

8) Apesar dos vários protestos e desacatos verificados na última reunião da CM, a CM


aprovou o licenciamento de um edifício de 35 andares no centro histórico

CPA: 161º/2, h) As decisões tomadas tumultuosamente são nulas.

9) Apesar de nunca ter frequentado o curso de Direito, Bento conseguiu obter um


certificado de licenciatura; apresentou-o no processo de recrutamento de pessoal e foi
contratado; tendo-se descoberto que, afinal, Bento não era licenciado, a AP diz que, em

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 152


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

todo o caso, sempre o teria contratado, por não ser a licenciatura em Direito um requisito
necessário

O ato de atribuição do certificado é nulo por CPA: 161º/2 j) não ser verdadeiro.

A vontade da Administração Pública estava viciada de erro nos pressupostos de facto o


que leva a uma violação de lei devido à discrepância entre os pressupostos factuais que
se são determinantes para a decisão. CPA: 168º/1 Gera anulabilidade
CPA: 163º/5 c) Contudo no caso concreto, face às circunstâncias consideramos haver
uma irregularidade, pois o efeito anulatório não se produz quando se comprova que o ato
teria sido praticado com o mesmo conteúdo, mesmo que não existisse o vício, o que neste
caso se verifica visto que a AP o teria contratado na mesma.

10) António foi nomeado para um cargo por “ter um excelente currículo académico,
vasta experiência profissional e, ainda, por ter participado em diversas ações de
voluntariado”; na melhor das hipóteses, a única ação de voluntariado em que se pode
dizer que António participou foi a venda de rifas na quermesse da Igreja em 1992

A vontade da Administração Pública estava viciada de erro nos pressupostos de facto o


que leva a uma violação de lei devido à discrepância entre os pressupostos factuais que
se são determinantes para a decisão.
Não há essencialidade por isso não há anulabilidade pelo CC: 252º

11) Bento, aluno com média de 12, solicitou uma bolsa reservada a alunos com média
igual ou superior a 15; no dia seguinte, recebeu um lacónico “indeferido”

CPA: 152º/1 c) O dever de fundamentação é uma formalidade, em que a AP tem de


explicar as razões de facto e de direito que levam à prática do ato.
A falta de fundamentação gera vício de forma, que leva à CPA: 163º/1 anulabilidade.

Além disso, não parece possível que a Administração possa ter resolvido todo o
procedimento em apenas 1 dia, pelo que não parece que estejam cumpridos os prazos
necessários e previstos para o procedimento administrativo

12) A CM concedeu o licenciamento requerido por Bento, exigindo, porém, que Bento se
comprometesse ao pagamento mensal de 25€ nos próximos dez anos; Bento não quer
pagar mas também não quer desistir do licenciamento

CPA: 149º Estamos perante uma cláusula acessória, uma condição que é inválida por não
ter uma relação direta com o conteúdo principal e por ser ilegal

CPA: 15º O procedimento administrativo é tendencialmente gratuito


CPA: 161º/2 k) O ato é nulo pois prevê obrigações pecuniárias não previstas na lei.
CPA: 162º/2 A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado.

CPA: 164º/4 Podíamos proceder à reforma

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 153


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CASO-PRÁTICO 4

A) António recebeu em maio uma licença para venda ambulante de bolas de Berlim
na praia; porém, em junho, o órgão administrativo revogou a licença de António.

A licença é um ato primário (decide pela primeira vez determinada questão) permissivo
(habilita uma determinada conduta), neste caso, permite ao destinatário exercer uma
atividade que antes da licença seria ilícita.

A revogação é um ato constitutivo (introduz alterações na ordem jurídica), secundário


(incide sobre anterior relação jurídica) e traduz a cessão de efeitos de um ato
administrativo anterior com fundamento em razões de mérito, de conveniência e de
oportunidade que justificam a cessação de efeitos, CPA: 171º/1 por regra não retroativa.

1) António pode exercer a atividade de venda ambulante?

Não, se a atividade de venda ambulante está sujeita à concessão de uma licença, então é
porque essa atividade é proibida sem a mesma.

CPA: 165º/1 Revogação é feita por razões de mérito, conveniência ou oportunidade.


Não temos a fundamentação da revogação o que gera anulabilidade CPA: 163º/1.

A regra é que os atos válidos são livremente revogáveis com fundamento em questões de
mérito, podendo sempre ser revogados, contudo há exceções:
CPA: 167º/1 Os atos que resultam de vinculação legal; Atos que criam obrigações legais
ou direitos irrenunciáveis para administração e os atos constitutivos de direitos.
CPA:167º/3 Um ato constitutivo de direito pode o ser em três cenários: quando atribui
uma posição jurídica favorável, quando atribui uma situação jurídica de vantagem,
quando exonera o particular de uma obrigação ou quando amplia uma situação jurídica.
Este ato administrativo é um ato constitutivo de direitos, pois atribui uma situação jurídica
de vantagem. Sendo assim, este ato só pode ser revoado por um dos motivos presentes no

CPA: 167º/2 Não foram utilizados nenhum dos fundamentos por isso a revogação é
proibida e nula devido ao princípio geral da proibição da revogação.
Sendo assim, o António poderá exercer a atividade de venda ambulante.

2) E se a licença tiver sido revogada para que Bento, amigo de longa data do titular do
órgão, pudesse ter o exclusivo?

CPA: 167º/2 Não foram utilizados nenhum dos fundamentos. Por isso, a revogação é
ilegal, sendo assim, o António poderá exercer a atividade de venda ambulante.

Ocorre ainda uma violação do princípio da imparcialidade, na vertente negativa, pois a


Administração não pode tomar em consideração aspetos que são irrelevantes, o que gera
vício de violação de lei. Há vício de desvio de poder por motivos de interesse privado, o
que gera CPA: 161º/2 e) a nulidade do ato de revogação, pelo que a licença vence.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 154


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B) Em 1975, foi autorizada a atividade de uma fábrica, já então se sabendo da


poluição que causava.

A autorização é um ato primário (decide pela primeira vez determinada questão)


permissivo (habilita uma determinada conduta), neste caso, permite o seu destinatário
exercer um direito ou poderes legais que já anteriormente era titular.

1) Em 2020, a autorização é revogada por se ter descoberto que as emissões x e y eram


cancerígenas.

CPA: 167º/2 c) Revogação com fundamento na superveniência de conhecimentos


técnicos e científicos ou em alteração objetiva das circunstâncias de facto.

CPA: 167º/4 Revogação deve ser feita no prazo de um ano a contar do conhecimento da
superveniência ou da alteração das circunstâncias.

CPA: 167º/5, 2ª parte A afetação do direito elimina o conteúdo essencial desse direito,
por isso, a fábrica deve ser indemnizada num valor correspondente ao valor económico
do direito eliminado.

Questionável:
CPA: 167º/6 A fábrica será beneficiária de boa fé se, à data da prática do ato revogado,
desconhecia sem culpa a existência dos fundamentos que determinaram a revogação.
Mafalda Carmona considera que lá porque tem autorização isso não exonera a fábrica de
fazer testes às emissões e avaliar a poluição da atividade e eles não foram autorizados
àquele tipo de poluição cancerígena, sendo um excesso dar indeminização.

2) Em 2020, a autorização é revogada porque “apesar de sempre ter sido poluente, e até
ter vindo a diminuir as emissões nos últimos anos, as pessoas hoje queixam-se mais”

CPA: 165º/1 Revogação por razões de conveniência, devido a uma nova valoração do
que já se conhecia.

CPA: 167º/2 Não foram utilizados nenhum dos fundamentos, por isso, a revogação é
proibida e não produz efeitos (princípio geral da proibição da revogação).
Sendo assim, a fábrica poderá continuar a sua atividade.

C) Em setembro de 2020, a CM concedeu autorização à “Só Barulho, Lda” para


realizar espetáculos de música ao ar livre num parque da cidade durante os meses
de junho e julho (de 2021). Dois meses depois, em novembro, os moradores da zona,
irados por não terem sido ouvidos, pedem a anulação da autorização, o que a CM
faz a 1 de junho. Mas, a 1 de julho, a CM anula o ato de 1 de junho.

A autorização é um ato primário (decide pela primeira vez determinada questão)


permissivo (habilita uma determinada conduta), neste caso, permite o seu destinatário
exercer um direito ou poderes legais que já anteriormente era titular.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 155


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

A anulação é um ato constitutivo (introduz alterações na ordem jurídica), secundário


(incide sobre anterior relação jurídica) trata dos casos com fundamento de ilegalidade,
sendo tendencialmente retroativa.

Setembro 2020 Novembro 2020 1 Junho 1 Julho

Autorização Requerimento Anulação da Anulação da


dos moradores Autorização anulação da
Autorização

Caso os moradores da zona sejam interessados no procedimento, eles terão legitimidade


para se constituir como interessados, nos termos do artigo 68º CPA, devendo cumprir a
formalidade do artigo 65º/2 CPA.

Segundo o artigo 152º/1, c) CPA, a Administração pode deferir o pedido da “Só Barulho,
Lda”, mas tem o dever de fundamentar a sua decisão quando essa vai em sentido contrário
de pretensão ou oposição formulada pelos interessados, como é o caso.

Sendo este o caso, os moradores da zona têm o direito de ser ouvido no procedimento
antes de ser tomada a decisão final, segundo o artigo 121º/1 CPA. Porém, segundo o
artigo 124º/1, d) CPA, pode haver dispensa da audiência quando o número de interessados
a ouvir seja demasiado elevado e torna impraticável a audiência, como neste caso, em que
teriam de ser ouvidos os moradores da zona. Sendo assim, deve proceder-se a consulta
pública, prevista no artigo 101º CPA.

A ausência da consulta pública gera apenas vício de forma e, portanto, anulabilidade, pelo
artigo 163º/1 CPA. Não há aqui a violação do núcleo essencial de um direito fundamental.

Anulação é anulável e produz efeitos até ter sido anulada

1) Pode a SB, Lda realizar espetáculos em junho?

Artigo 169º/1 CPA: o ato administrativo pode ser objeto de anulação a pedido dos
interessados, mediante reclamação ou recurso administrativo.

Artigo 168º/1 CPA: a anulação administrativa deve ser feita no prazo de 6 meses, aqui no
caso só foi feita ao fim de 7 meses, pelo que não foi cumprido o prazo. O ato de anulação
da CM é anulável, pelo artigo 163º/1 CPA.

Artigo 168º/5 CPA: como o ato já não pode ser impugnado por via jurisdicional, deve
haver uma anulação administrativa oficiosa, ou seja, é a própria CM que deve ter a
iniciativa de anular o ato, artigo 169º/1 CPA.
Como o ato de anulação da anulação da autorização é anulável, ele produz efeitos até ser
anulado. Ou seja, a autorização continua anulada, pelo que não pode haver espetáculos.

2) E em julho?

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 156


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

Em julho, há o ato C, que vem anular o ato de anulação da autorização (ato B). Como o
ato B já não produz efeitos, a autorização já não está anulada, pelo que pode haver
espetáculos em julho.

Ana: O ato C pode anular o ato B, uma vez que o ato B não é uma anulação contenciosa
(166º/1/b).

D) Em maio, a CM aprovou o ato x, apesar dos tumultos que se verificaram durante


a reunião. Por causa desses tumultos, a CM, em junho, anulou o ato x, por entender
que não fora adotado nas melhores condições. Em julho, ouvido o departamento
jurídico, a CM decidiu anular o ato de junho, uma vez que os atos nulos não podem
ser anulados.

IDENTIFICAR ATOS

Ato x é nulo, segundo o artigo 161º/2, h) CPA.

Não se pode anular um ato nulo, segundo o artigo 166º/1, b) CPA. Esse ato é nulo pelo
161º/2, c) CPA, por ter um objeto impossível.

O ato de julho tem o mesmo problema, pois está a tentar anular um ato nulo, o que não
pode acontecer pelo artigo 166º/1, b) CPA. Esse ato é nulo pelo 161º/2, c) CPA, por ter
um objeto impossível.

Artigo 168º/1 CPA: os prazos foram respeitados.

E) Em setembro de 2019, A, aluno da Faculdade, requereu a concessão de uma bolsa


de mérito, a qual, nos termos da lei, deveria ser atribuída a todos os alunos que
tivessem tido média de 14 ou superior no ano letivo anterior. Apesar de A ter tido
média de 15, o Diretor indeferiu o pedido, invocando que não preenchia os requisitos
legais. A reclamou e, em setembro de 2020, o Diretor anulou o indeferimento,
reconhecendo a sua ilegalidade; porém, recusa-se a atribuir a bolsa por, entretanto,
a lei ter passado a exigir média de 17 valores para as novas bolsas a conceder.

IDENTIFICAR ATOS

Concessão: ato primário permissivo que concede a um sujeito novas posições jurídicas
ativas.

A representação da realidade que a Administração faz é que o aluno A tem uma média
inferior a 14 valores e a realidade de facto é que o Bento tem um rendimento mensal de
150€, pelo que há um erro nos pressupostos de facto.
O ato da Administração é inválido, pois há um erro nos pressupostos de facto - “vício de
violação de lei e consiste na discrepância entre os pressupostos factuais que se revelarem
determinantes para a decisão e aqueles que efetivamente se verificam”. Artigo 252º CC.
Isto leva à sua anulabilidade, segundo o artigo 168º/1 CPA.

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 157


Direito Administrativo II |Regente Paulo Otero

O que gera a anulabilidade, de acordo com o artigo 252º CC; só está previsto no CPA, no
artigo 168º/1.

Artigo 184º/1, a) e nº2: o aluno A pode reclamar.

Artigo 168º/2: ato constitutivo de direitos tem o prazo de um ano para ser anulado, aqui
o prazo foi respeitado (setembro de 2019 e Diretor anulou em setembro de 2020).

Artigo 172º/1 e 2: a Administração tem de dar cumprimento aos deveres que não cumpriu,
por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter
atuado. Por isso, a Administração fica constituída no dever de praticar atos dotados de
eficácia retroativa.

O Diretor teria de atribuir a bolsa ao aluno A, sendo que os efeitos retroagiam a setembro
de 2019.

F) Em junho, a CM concede uma licença de construção a A. Em agosto, verifica que


a construção contrariava uma disposição legal. Em maio, a CM anula a licença de
construção.

IDENTIFICAR ATOS

A licença é um ato primário (decide pela primeira vez determinada questão) permissivo
(habilita uma determinada conduta), neste caso, permite ao destinatário exercer uma
atividade que é relativamente proibida.

Se a licença contrariava uma disposição legal, então esta era anulável, pelo artigo 165º/1
CPA.

A licença é um ato que constitui um direito, logo, pelo artigo 168º/2, tem o prazo de 1
ano para anular o ato, o que se cumpre (de junho a maio).

G) Seis anos depois de se ter licenciado, A verifica que, na soma das cotações de um
seu exame, não tinha sido contabilizada uma resposta; se assim tivesse sido, a nota
final da disciplina teria sido superior, bem como a sua média final de curso. A pede
então ao Diretor que anule o ato final de classificação do curso e que lhe seja
atribuída a nota final superior devida.

Certificado final de classificação do curso é um ato de verificação, que não são


estruturalmente atos constitutivos de direitos, pois limitam-se a verificar uma
determinada situação. Porém, seguem o regime dos atos constitutivos de direitos.

Artigo 168º/2 CPA: os atos constitutivos de direitos só podem ser objeto de anulação
administrativa dentro do prazo de 1 ano a contar da data da respetiva emissão. Porém,
como já passaram mais de 5 anos desde a emissão do ato, não se pode fazer a anulação.

Sendo assim, caducou o direito do aluno A 174º contudo pode se pedir uma ratificação

Sofia Cunha FDUL 2020/2021 158

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