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DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL E ARQUITECTURA

SECÇÃO DE HIDRÁULICA E DOS RECURSOS HÍDRICOS E AMBIENTAIS


LICENCIATURA EM ENGENHARIA CIVIL

PROJECTO DE SISTEMAS DE DRENAGEM DE


ÁGUAS PLUVIAIS

EDUARDO RIBEIRO DE SOUSA


JOSÉ SALDANHA MATOS
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ÍNDICE DO TEXTO

1. INTRODUÇÃO...............................................................................................................................................................1

2. ASPECTOS PARTICULARES DA CONCEPÇÃO DOS SISTEMAS............................................................................1

3. PRINCIPAIS COMPONENTES DOS SISTEMAS.........................................................................................................3

4. ESCOAMENTO DE SUPERFÍCIE.................................................................................................................................5

4.1 Considerações introdutórias.................................................................................................................................5


4.2 Capacidade de dispositivos interceptores............................................................................................................6

4.2.1 Capacidade de sarjetas de passeio. Exemplo de cálculo........................................................................6


4.2.2 Capacidade de sumidouros. Exemplos de cálculo.................................................................................12
4.2.3 Capacidade de grades localizadas em zonas baixas. Exemplo de cálculo...........................................17
4.2.4 Comparação entre a eficiência hidráulica de vários dispositivos interceptores.....................................18

5. DIMENSIONAMENTO HIDRÁULICO DE COLECTORES..........................................................................................20

5.1 Considerações introdutórias...............................................................................................................................20


5.2 Elementos de base.............................................................................................................................................21
5.3 Cálculo de caudais pluviais.................................................................................................................................22
5.4 Critérios de projecto e procedimentos de dimensionamento..............................................................................26
5.5 Exemplo de cálculo.............................................................................................................................................28

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................................................................................30

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1. INTRODUÇÃO

O objectivo principal deste Documento é apresentar os aspectos metodológicos e as práticas mais


importantes na concepção e dimensionamento de sistemas de drenagem de águas pluviais. São
discutidos, também, elementos referentes às bases de cálculo dos dispositivos interceptores de
águas superficiais pluviais mais correntes (sarjetas de passeio e sumidouros), dando-se ênfase
especial à sistematização dos procedimentos de dimensionamento e à apresentação de exemplos
de cálculo.

2. ASPECTOS PARTICULARES DA CONCEPÇÃO DOS SISTEMAS

O elevado custo dos investimentos afectos aos sistemas de drenagem de águas pluviais,
relativamente ao das outras infra-estruturas urbanas, nomeadamente em aglomerados
populacionais com uma população inferior a 5 000 habitantes, torna especialmente relevante a
necessidade de se implementarem soluções tecnicamente adequadas, mas também economica-
mente viáveis.

O princípio de dimensionar, em toda a extensão de um aglomerado urbano, uma rede de


colectores para drenar os caudais de ponta de cheia, provocadas por precipitações de curta
duração e de intensidade elevada, conduz, na maioria das vezes, a soluções economicamente
proibitivas. Assim, nos moldes actuais de concepção dos sistemas de drenagem de águas
pluviais, são de evidenciar os seguintes aspectos:

 redução da extensão das redes de colectores e dos respectivos diâmetros, maximizando-se


o percurso superficial das águas pluviais e favorecendo-se a integração no seio das áreas
impermeáveis, ou em torno destas, de áreas permeáveis, como zonas verdes, ou de áreas
semi-permeáveis, como pavimentos constituídos por materiais incoerentes;
 opção, em grande número de situações, por soluções de drenagem não convencionais,
constituídas por lagoas de amortecimento (também designadas, por vezes, por lagoas de
retenção) e por sistemas específicos de infiltração (designados, em terminologia inglesa, por
soakaway systems);

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 preocupação com a problemática relacionada com a qualidade da água, nomeadamente


tendo em conta os riscos de efeitos nocivos no meio receptor, circunstância esta que se
torna especialmente relevante devido à poluição veiculada pelos caudais pluviais após o
período estival.

Nos últimos anos, a concepção e as metodologias relativas à drenagem de águas pluviais têm
evoluído consideravelmente, ajustando-se, de um modo mais adequado, às formas diversificadas
de crescimento urbano e consequente ocupação do solo.

As regras urbanísticas mais adequadas a uma redução dos caudais de ponta pluviais são aquelas
que respeitam a integração de áreas permeáveis em áreas impermeáveis, através de soluções de
descontinuidade. Sempre que possível, deverá ser privilegiado o estabelecimento de linhas de
drenagem superficial através de espaços livres. Valetas e vales largos e pouco profundos são, de
um modo geral, adequados para esse efeito. O tipo de solução a escolher deve ter em conta o
cumprimento dos seguintes objectivos:

 aumentar o volume de águas pluviais infiltradas;


 aumentar o volume da águas pluviais retidas e interceptadas, nas depressões do solo e nas
árvores e arbustos;
 promover o armazenamento temporário da águas pluviais em locais pré-seleccionados;
 permitir que, durante a ocorrência de precipitações intensas, se criem condições controladas
de escoamento superficial ao longo das superfícies impermeabilizadas (passeios,
arruamentos, parques de estacionamento, etc.), por forma a que as características do
escoamento superficial, nessas condições, tenha em conta determinados critérios {9}, de
modo a minimizarem-se os incómodos para os utentes dessas vias e o desgaste das
superfícies impermeabilizadas.

Dada a interdependência entre os caudais pluviais, a bacia drenante e o tipo de ocupação do solo,
torna-se aconselhável conceber as infra-estruturas de drenagem logo na fase inicial do
planeamento urbanístico, o que nem sempre tem acontecido. Este aspecto é particularmente
importante quando as condições naturais são desfavoráveis do ponto de vista de disponibilidade
de energia potencial para se processar o escoamento (caso de zonas planas), quando se
prevêem alterações profundas nas condições topográficas iniciais, ou quando o aglomerado

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populacional se situa a jusante de uma bacia hidrográfica de dimensões relevantes. Quando,


nessas condições, as áreas extra-urbanas são consideravelmente importantes, e por isso também
importantes os caudais pluviais correspondentes, deve estudar-se o previsível comportamento do
terreno, face à ocorrência de precipitações intensas.

Aglomerados populacionais situados à beira de grandes cursos de água podem exigir o


bombagem ou a retenção de caudais pluviais afluentes a zonas baixas, durante o período em que
os níveis do curso de água não permitam o escoamento gravítico nos colectores. Redes de
drenagem de aglomerados populacionais situadas a cotas pouco superiores às dos níveis de
cheia do curso de água, ou de níveis de maré, deverão incluir, a jusante, colectores previstos para
funcionarem em carga, quando da ocorrência de precipitações em períodos coincidentes com a
ocorrência daqueles níveis.

Em alguns destes casos, em que se pretendem minimizar os possíveis efeitos da inundação de


áreas adjacentes, devem ser projectadas bacias de retenção, as quais vão permitir o
armazenamento de volumes consideráveis contribuindo para um melhor funcionamento global do
sistema. Aglomerados populacionais, cuja localização é adjacente a cursos de água torrenciais,
devem dispor de espaços livres non edificandi, nas margens inundáveis (leito maior). Quando
situados em encosta montanhosa, deve estudar-se o comportamento mecânico do terreno face às
precipitações prolongadas e à necessidade de se considerarem obras de protecção, incluindo
pequenos açudes, etc.

A rejeição de caudais pluviais em pequenas linhas de água pode ocasionar, pelo aumento
substancial dos caudais de ponta de cheia, prejuízos e inconvenientes aos utentes a jusante. Este
aspecto não pode ser desprezado e a solução pode ser encarada na perspectiva da criação de
dispositivos ou estruturas de armazenamento (bacias de retenção), para a eliminação ou redução
daqueles inconvenientes.

3. PRINCIPAIS COMPONENTES DOS SISTEMAS

Os sistemas de drenagem de águas pluviais de aglomerados populacionais são constituídos,


essencialmente, por redes de colectores e órgãos acessórios, podendo dispor de órgãos especiais
e instalações complementares.

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A rede de colectores é o conjunto das canalizações que assegura o transporte dos caudais
pluviais afluentes, desde os dispositivos de entrada até um ponto de lançamento ou destino final.
Ela é constituída, em geral, por colectores de betão de secção circular.

Os órgãos acessórios são os seguintes:

 dispositivos de entrada (sarjetas de passeio ou sumidouros) - as sarjetas de passeio são


dispositivos sempre associados a um lancil do passeio, com entrada lateral de caudal; neste
Documento são considerados os sumidouros, dispositivos que podem estar associados a
um lancil ou a uma valeta, cuja entrada de caudal é feita superiormente; as fases do
dimensionamento hidráulico e exemplos de cálculo deste tipo de órgãos são apresentados
no Capítulo 4 deste Documento;
 câmaras ou caixas de visita - destinadas a facilitar o acesso aos colectores, para
observação e operações de limpeza e de manutenção; os aspectos relativos à sua
implantação e constituição são apresentadas nos Documentos - Concepção de Sistemas de
Drenagem de Águas Residuais e Órgãos Gerais dos Sistemas de Drenagem.

No que respeita aos órgãos especiais e instalações complementares, cuja utilização, implantação
e descrição se apresentam noutros documentos, há que realçar os seguintes:

 desarenadores - instalações complementares destinadas a provocar a deposição de


materiais incoerentes transportados nas águas pluviais;
 bacias de retenção - bacias destinadas a regularizar os caudais pluviais afluentes,
restituindo, a jusante, caudais compatíveis com a capacidade de transporte da rede de
drenagem ou curso de água;
 câmaras drenantes - dispositivos específicos destinados à retenção e infiltração das águas
pluviais, podendo ser associados ou não a sistemas de drenagem pluviais convencionais
constituídos por colectores enterrados {10};
 instalações elevatórias - a evitar, sempre que possível, tendo em conta a variabilidade dos
caudais afluentes e a dificuldade de se manterem, devido a isso, as condições satisfatórias
de funcionamento dos grupos electrobomba e da conduta de impulsão; a concepção e o
dimensionamento da câmara de aspiração devem efectuar-se de modo a que não se
verifiquem deposições exageradas de sólidos sedimentáveis, nomeadamente partículas

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arenosas, e o volume útil deve ser compatível com os caudais máximos afluentes, aspecto
que por vezes é difícil de garantir, dadas as elevadas dimensões exigidas.

4. ESCOAMENTO DE SUPERFÍCIE

4.1 Considerações introdutórias

Os dispositivos interceptores das águas pluviais que se escoam superficialmente, sejam sarjetas
de passeio, sumidouros ou sistemas conjuntos sarjeta-sumidouro, podem ser divididos em dois
grandes grupos. Os dispositivos de cabeceira, que, tal como o nome indica, são implantados no
extremo de montante dos troços das redes de drenagem de águas pluviais, e os dispositivos de
percurso, que são implantados em bacias interiores e que estão ligados a troços intermédios ou
finais da rede de drenagem subterrânea.

O correcto dimensionamento e implantação dos colectores duma rede de drenagem de águas


pluviais depende do adequado dimensionamento dos dispositivos que captam a água que se
escoa superficialmente. Tais dispositivos devem ser concebidos e localizados de modo a que o
sistema de drenagem seja o mais económico possível, salvaguardando-se, no entanto, o
cumprimento de critérios estabelecidos para o escoamento superficial. Esses critérios são, em
regra, os seguintes:

 critério de não transbordamento - consiste em considerar uma altura máxima para o


escoamento das águas pluviais sobre as superfícies impermeabilizadas, nomeadamente os
arruamentos;
 critério de limitação de velocidade - consiste em limitar a velocidade média do escoamento
das águas pluviais, nas superfícies impermeabilizadas, a valores que não provoquem
desgastes significativos nos pavimentos, nem incómodos exagerados aos peões e
condutores de velocípedes e motociclos.

A este propósito, o Decreto Regulamentar nº 23/95, estipula, no seu artigo 165.º, que:

“1 - A eficiência hidráulica das sarjetas e sumidouros varia com a inclinação longitudinal e


transversal do arruamento e a geometria da superfície de entrada.
2 - No dimensionamento das sarjetas e sumidouros deve atender-se aos valores dos

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caudais superficiais a drenar, à capacidade de vazão dos colectores onde esses caudais
afluem e ainda a outros factores tais como os entupimentos, a segurança e a comodidade
do trânsito.
3 - No escoamento das águas pluviais nas valetas devem ser ponderados,
cumulativamente, para períodos de retorno de 2 a 10 anos, os critérios seguintes:
a) Critério de não transbordamento;
b) Critério de limitacão da velocidade;
c) Critério de limitação da largura máxima da lâmina de água na valeta junto ao lancil.
4 - No primeiro critério impõe-se que a altura máxima da lâmina de água junto ao passeio
seja a da altura do lancil deduzida de 2 cm para folga.
5 - No segundo critério deve limitar-se a velocidade de escoamento superficial a 3 m/s para
evitar o desgaste do pavimento.
6 - No terceiro critério deve reduzir-se a 1 m a largura máxima de lâmina de água nas
valetas junto dos lancis dos passeios.
7 - Para colectores calculados para períodos de retorno superiores a 10 anos, deve prever-
se a implantação de sumidouros de reforço.”

Os dois critérios apresentados são válidos, para o escoamento tanto em bacias de cabeceira,
como em bacias interiores. A aplicação destes critérios permite de superfície definir a localização
dos dispositivos interceptores, nada adiantando, no entanto, quanto à caracterização dos
mesmos.

A escolha do tipo e das dimensões do dispositivo interceptar deve ser efectuada de modo a que
seja eficiente, em termos de recolha das águas pluviais. Em {9} é proposto que tais dispositivos
sejam dimensionados de modo a que a razão, entre os caudais captados e afluentes (denominada
eficiência hidráulica), seja superior a um valor mínimo, compreendido entre 0,75 e 0,85.

4.2 Capacidade de dispositivos interceptores

4.2.1 Capacidade de sarjetas de passeio. Exemplo de cálculo

Entende-se por sarjeta de passeio, o dispositivo cuja caixa de recolha está situada sob o passeio,
processando-se a entrada de água por uma abertura lateral, localizada na face vertical do lancil,
tal como se ilustra na Figura 1.

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Figura 1 - Representação esquemática de uma sarjeta de passeio sem depressão

Em Portugal, os tipos, as características e as condições de emprego das sarjetas estão


normalizados (NP-676). As sarjetas de lancil (ou de passeio) designam-se, também, do tipo L (ver
Documento Órgãos Gerais dos Sistemas de Drenagem).

O volume de água que um dispositivo deste tipo pode interceptar varia com as características
geométricas da valeta a montante. Por outro lado, o facto do declive transversal da valeta na zona
adjacente à sarjeta de passeio ser constante ou variável (caso haja depressão localizada) tem
influência importante no seu comportamento hidráulico.

Segundo {8}, a capacidade de sarjetas de passeio sem depressão pode ser calculada pela
seguinte expressão:

[1]

sendo

Q - caudal captado pela sarjeta (m3/s);


L - comprimento da boca da sarjeta (m);
y0 - altura uniforme do escoamento, a montante da sarjeta (m);

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g - aceleração da gravidade (m/s2);


K - constante empírica, função da inclinação transversal do arruamento, cujo valor é 0,23
ou 0,20, consoante aquela inclinação é de 8% ou de 2 a 4%, respectivamente.

Caso haja depressão, tal como se ilustra na Figura 2, a expressão [1] deve ser corrigida, de modo
a que se possa ter em linha de conta o efeito do incremento da carga hidráulica na capacidade de
vazão do dispositivo.

Figura 2 - Representação esquemática de urna sarjeta de passeio com depressão

Neste caso, admitindo que os comprimentos dos troços a montante e a jusante da depressão,
respectivamente L1 e L2, se relacionam com o valor da depressão a pelas seguintes expressões
L1  10 a e L2 = 4 a , obtém-se a expressão de cálculo:

[2]

sendo

[3]
[4]

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[5]

 - ângulo que o plano do pavimento forma, na depressão, com o plano vertical do lancil do
passeio (graus);
y - altura do escoamento na extremidade de montante da sarjeta de passeio, junto ao lancil
(m);
V - velocidade média do escoamento na secção correspondente à altura de escoamento,
y (m/s);
L, y0, g e K - são parâmetros com o significado anteriormente definido.

Os valores da altura, y, e da velocidade média do escoamento, V, podem ser determinados


aplicando o teorema de Bernoulli generalizado entre as secções que se situam, respectivamente,
a montante da depressão e da sarjeta, sendo corrente admitir-se, nesse troço, uma perda de
carga unitária igual à do regime uniforme a montante.

Nestas condições, a altura de escoamento, y, pode ser obtida resolvendo iterativamente a


seguinte expressão:

[6]

sendo

A0, A - secções de escoamento correspondentes, respectivamente, às alturas do regime


uniforme y0 e y (m2);
Q - caudal de projecto (m3/s).

No caso de L2  4a ou a  b, admite-se que o valor do parâmetro C, que figura na expressão [2],


seja obtido a partir da expressão:

[7]

sendo N = LF/a' tg  e a' = (b - J L2) / (1 - 4J).

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Com objectivos ilustrativos, apresenta-se, seguidamente, um exemplo de cálculo da capacidade


de escoamento de uma sarjeta de passeio com depressão, precedendo-o, porém, da dedução da
expressão que conduz à determinação da altura de escoamento uniforme em valetas (Figura 3).

Considerando:
 a expressão de Manning-Strickier - Q = (1/n) A R2/3 J1/2;
 a área molhada - y02 tg 0/2;
 o raio hidráulico - A/P ~ ( y02 tg 0) / (2 y0 tg 0) = y0/2, admitindo que o perímetro molhado
pode ser aproximado à largura superficial do escoamento;

determina-se a altura de escoamento uniforme y0:

Figura 3 - Altura de escoamento uniforme em valetas

EXEMPLO DE CÁLCULO

Enunciado

Determinar a capacidade de escoamento de uma sarjeta de passeio instalada em depressão


(a = b = 0,06 m, L1 = 0,60 m e L2 = 0,24 m), com 0,60 m de boca, quando se escoa um caudal de

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10 L/s. A depressão desenvolve-se numa largura B1 de 0,60 m. O arruamento onde está instalada
a sarjeta de passeio tem um declive longitudinal de 1% e uma tg 0 igual a 48 (declive transversal
aproximadamente igual a 2%). Admite-se um coeficiente de rugosidade de Manning-Strickler do
pavimento do arruamento de 0,015 m-1/3 s.

Cálculos

a) Cálculo de y0 e V0

b) Cálculo de y, V e Q

Com base na expressão [6]é possível escrever:

Nestas condições, resolvendo iterativamente esta expressão, obtêm-se os seguintes valores:

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A tangente do ângulo  (ângulo que o plano do pavimento forma, na depressão, com o plano
vertical do lancil do passeio – Figura 2) foi calculada por intermédio da seguinte expressão:

4.2.2 Capacidade de sumidouros. Exemplos de cálculo

Designa-se por sumidouro um dispositivo cuja caixa de recolha de águas pluviais está situada sob
uma ou mais grades, por onde se processa a entrada de água captada, tal como se ilustra na
Figura 4.

Figura 4 - Representação esquemática de um sumidouro sem depressão

Neste dispositivo, os motivos de se não captar todo o caudal podem ser os seguintes:

 escoamento entre a primeira abertura da grade e o passeio (q1);


 escoamento exterior à grade, pelo arruamento (q2);
 escoamento sobre a própria grade, e que prossegue para jusante (q3).

É usual dimensionarem-se os sumidouros de modo a que a parcela q 3, de caudal não captado,


seja próxima de zero. Se tal não acontecer, o comportamento do dispositivo torna-se muito
ineficiente {7}.

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O comprimento de grade necessário para captar todo o caudal que sobre ela se escoa, e assim
anular a parcela q3, é função da velocidade, V0, da altura de escoamento uniforme, y 0, da largura
das barras, C1, da distância entre barras, C2, e da aceleração da gravidade, g.

Segundo {7}, esse valor pode ser calculado pela seguinte expressão:

[8]

sendo

L0 - comprimento útil do sumidouro (m);


m - constante empírica, cujo valor deve ser considerado igual a 4, se a grade do sumidouro
não contiver barras transversais, e igual a 8, no caso de ter três daquelas barras.

Os restantes símbolos têm o significado já anteriormente apresentado.

No caso de sumidouros instalados em arruamentos onde o declive transversal não é constante, tal
como se ilustra na Figura 5, a secção de escoamento pode não ser triangular. Nessas
circunstâncias, a altura e a velocidade média do escoamento correspondentes ao regime
uniforme, a montante do dispositivo, podem ser calculadas iterativamente, sendo, ainda, aplicável
a expressão (8) anterior.

O caudal, q1 (m3/s), que se escoa entre a primeira abertura da grade e o lancil do passeio, é
função da altura da água, y0 (m); da velocidade média, V0 (m/s); do comprimento, L (m), do
sumidouro; da distância, d (m), entre o lancil e a primeira abertura da grade e da aceleração da
gravidade, g (m/s2).

Segundo {7}, é válida a seguinte expressão:

[9]

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Nas condições usuais de escoamento, o caudal, q1, é desprezável, tomando valores inferiores a
1 L/s.

Para que o caudal, q2, proveniente de escoamento exterior à grade sobre o arruamento, se anule,
é necessário que o sumidouro tenha um comprimento superior a um valor crítico. Este
comprimento crítico, L' (m), pode ser dado em função dos valores de y 0 (m), V0 (m/s), 0 (graus),
g (m/s2) e da largura da grade B (m), de acordo com a seguinte expressão:

[10]

sendo y' = y0 - (B / tg 0).

Figura 5 - Representação esquemática de um sumidouro com valeta rebaixada

Se a secção transversal do arruamento não tiver a forma de um triângulo rectângulo, ou seja,


quando houver depressão junto ao lancil do passeio, a expressão [10] toma a seguinte forma:

[11]

sendo y' = y - (B /tg ).

Se o comprimento do sumidouro for inferior ao valor crítico, L', o caudal, q 2 (m3/s), não é nulo,
podendo ser dado pela seguinte expressão:

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[12]

As expressões [10] a [12] foram deduzidas, experimentalmente, para valores do número de


Froude do escoamento [V02 / (g y0)] superiores a 1 e inferiores a 9 {7} e {8}.

Com o fim de ilustrar a aplicação das expressões apresentadas, desenvolvem-se, em seguida,


dois exemplos, relativos ao cálculo da capacidade hidráulica de sumidouros.

EXEMPLO DE CALCULO 1

Enunciado

Calcular a capacidade de vazão de um sumidouro, constituído apenas por uma grade com barra
transversal, com as dimensões de 0,28 m x 0,56 m, instalado sem depressão, quando se escoa
um caudal de 30 L/s, num arruamento com um declive longitudinal de 1% e uma tg 0 de 48
(declive transversal ~ 2%). Admitir que o coeficiente de rugosidade de Manning-Strickler da
superfície do arruamento é de 0,015 m -1/3s e que a distância entre o lancil do passeio e a primeira
abertura da grade é de 0,03 m.

Cálculos

a) Cálculo de y0, V0 e L0

No cálculo de L0 considerou-se um valor de constante empírica igual a 5, por o sumidouro ter uma
barra transversal. Por outro lado, como L0 < L, então q3 = 0.

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b) Cálculo de y', L' e q

Nestas condições, o caudal captado, Q, é cerca de 2/3 do caudal afluente, podendo considerar-se
a capacidade de escoamento do sumidouro bastante insatisfatória.

EXEMPLO DE CÁLCULO 2

Enunciado

Calcular a capacidade de escoamento de um sumidouro simples de uma grade, nas condições do


exemplo anterior, instalado numa valeta rebaixada, com uma depressão de 1 cm.

Cálculos

Neste caso, a secção de escoamento não é triangular; no entanto, a altura e a velocidade média
do escoamento uniforme, junto do sumidouro, podem ser obtidas, por um processo iterativo, com
base na seguinte expressão, tendo em conta a geometria da secção em estudo.

em que (Figura 5)

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Nestas condições, obtêm-se:

Dado que L0 < L, é admissível considerar q3 = 0.

O caudal captado, Q, representa cerca de 95% do caudal afluente, podendo considerar-se que o
sumidouro é bastante eficiente.

Os exemplos apresentados ilustram bem a importância da depressão no comportamento


hidráulico dos sumidouros, em particular dos de tipo simples de uma grade.

4.2.3 Capacidade de grades localizadas em zonas baixas. Exemplo de cálculo

Ensaios realizados pelo Arms Corps of Engineers of the United States of America indicam que a
capacidade hidráulica de grades (sumidouros) localizadas, em zonas baixas, depende da carga
hidráulica sobre as grades, apresentando-se, em {14}, as seguintes expressões:

para h ≤ 0,12 m Q = 0,83 P h3/2 [13]

para h ≥ 0,42 m Q = 1,45 A h1/2 [14]

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sendo

Q - caudal captado (m3/s);


P - perímetro útil exterior da grade, não incluindo o espaço ocupado pelas barras
transversais (m);
h - carga hidráulica sobre a grade (m);
A - área útil da grade (m2).

Nas expressões [13] e [14] anteriores, considera-se um factor de segurança igual a dois, uma vez
que têm grande probabilidade de ocorrer obstruções parciais das grades.

Quando a carga hidráulica sobre a grade está compreendida entre 0,12 e 0,42 m, o
comportamento hidráulico desta é indefinido. Nestas condições, deve admitir-se que o valor do
caudal captado está entre os valores limites obtidos por aplicação das expressões [13]e [14].

EXEMPLO DE CALCULO

Enunciado

Determinar a capacidade de escoamento máxima de uma grade quadrada, com 0,50 m de


largura, implantada na zona baixa de um arruamento. A largura das barras é igual à abertura entre
elas, sendo permitida uma carga hidráulica de 0,10 m. As barras estão colocadas apenas numa
direcção.

Cálculo

Nestas condições, dado que h ≤ 0,1 2 m, obtém-se

4.2.4 Comparação entre a eficiência hidráulica de vários dispositivos interceptores

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A eficiência hidráulica dos dispositivos interceptores depende de vários factores, entre os quais se
incluem as características do pavimento onde o dispositivo está implantado (declives longitudinal e
transversal, rugosidade, existência, ou não, de depressão, etc.), a magnitude do caudal afluente e
a configuração geométrica do dispositivo.

Em condições médias de funcionamento (quando o declive longitudinal do arruamento é inferior a


10%, o declive transversal é da ordem de 2% e o coeficiente de rugosidade de Manning-Strickler
do pavimento da ordem de 0,015 m-1/3s), salvaguardando-se aspectos particulares relacionados
com a existência de obstruções, julgam-se pertinentes os comentários que se seguem.

 As sarjetas de passeio têm reduzida capacidade de vazão, o que não torna a sua utilização
recomendável, a não ser que sejam implantadas em zonas rebaixadas (com depressões
acentuadas), onde afluam caudais pluviais pouco significativos (inferiores a 20 L/s).

 A capacidade de escoamento dos sumidouros simples (isto é, constituídos apenas por uma
grade) é, em regra, superior à das sarjetas de passeio. Considera-se, no entanto, de grande
conveniência que esses dispositivos sejam implantados em valetas pelo menos levemente
rebaixadas (a > 1 cm). O comportamento destes dispositivos, desde que tenham dimensões
superiores a 0,56 x 0,28 m2, é bastante eficiente, até caudais afluentes da ordem de 50 L/s,
mesmo quando implantados em valetas de elevado declive. No caso de se acentuar a
profundidade da valeta (a > 1 cm), o que pode trazer inconvenientes sérios, nomeadamente
para a segurança da circulação do tráfego, aumenta, em regra, a eficiência do sumidouro.

 Os sumidouros duplos são constituídos por dois sumidouros simples dispostos em série, um
imediatamente a seguir ao outro, sendo, também, altamente recomendável a sua
implantação em valetas levemente rebaixadas (a = 1 cm). O comportamento destes
dispositivos é eficiente até caudais da ordem de 100 L/s, mesmo quando implantados em
valetas com elevado declive, desde que cada grade tenha dimensões superiores a
0,28 x 0,56 m2.

 Os sistemas conjuntos sarjeta-sumidouro são constituídos por um sumidouro duplo disposto


em paralelo com uma sarjeta de passeio, cuja abertura lateral tem o mesmo
desenvolvimento que o sumidouro. Este sistema deve ser escolhido, nomeadamente,

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quando se preveja que as grades do sumidouro possam vir a ser significativamente


obstruídas. A eficiência destes sistemas não difere substancialmente da dos sumidouros
duplos.
 No caso de bacias de cabeceira de grande extensão, em que o caudal de ponta de águas
pluviais possa já ser relativamente elevado, ou no caso de bacias interiores de dimensão
média, mas de elevado declive, pode justificar-se a implantação de sumidouros duplos,
concebidos e construídos de modo que só contenham uma barra transversal. Nessas
condições, e desde que os dispositivos sejam implantados em valetas levemente
rebaixadas, é de prever que possam captar caudais afluentes bastante superiores a 100 L/s.

5. DIMENSIONAMENTO HIDRÁULICO DE COLECTORES

5.1 Considerações introdutórias

O dimensionamento hidráulico de colectores é o conjunto de procedimentos, ou etapas de cálculo,


cuja finalidade é a determinação dos diâmetros e declives de cada um dos colectores que
constituem a rede, por forma a assegurar o transporte dos caudais de cálculo previstos, de acordo
com determinados critérios hidráulicos pré-estabelecidos.

Em hidrologia urbana, os fenómenos intrínsecos à transformação da precipitação em escoamento,


no percurso que vai desde o início do evento pluviométrico até ao escoamento na secção final da
bacia urbana (parte do cicio hidrológico que interessa à problemática da drenagem pluvial), são
por natureza complexos.

A primeira abordagem científica do processo de transformação da precipitação em escoamento


tem hoje cerca de um século de existência. Depois das fórmulas propostas por MULVANEY e
BURKLI-ZIEGLER, citados em {11}, KUICHLING, engenheiro municipal de Rochester (Nova Yorque),
publica pela primeira vez a conhecida fórmula racional.

Esta e outras fórmulas empíricas que se lhe seguiram constituíam uma abordagem global
simplificada da realidade dos fenómenos. O seu principal objectivo visava a determinação de
caudais de ponta, com a finalidade de dimensionar obras de drenagem. Caracterizavam-se pela
lógica dos conceitos, simplicidade e facilidade de compreensão. Posteriormente, em todo o
mundo, muitos trabalhos científicos tomaram como ponto de partida a fórmula racional americana,

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modificando-a através da explicitação dos seus parâmetros de base e da introdução de novos


parâmetros, dando origem a um grande número de formulações do tipo racional. Em {11} são
descritas algumas dessas formulações.
No dimensionamento de uma rede de drenagem de águas pluviais podem considerar-se três
etapas fundamentais:

 definição dos elementos de base;


 cálculo dos caudais pluviais de projecto;
 dimensionamento hidráulico dos colectores.

Estas etapas são abordadas nas secções 5.2. a 5.4. deste Documento.

5.2 Elementos de base

O estabelecimento dos elementos de base para o dimensionamento de uma rede de drenagem de


águas pluviais inclui os aspectos principais que a seguir se apresentam.

 definição correcta dos limites da bacia hidrográfica e das sub-bacias afectas a cada troço da
rede (decomposição da bacia total em sub-bacias elementares, mais ou menos
homogéneas, em termos de ocupação).

 definição do período de retorno (neste contexto, o período de retorno corresponde ao


intervalo de tempo médio associado à ocorrência de precipitação de intensidade média
superior a um dado valor), para o qual se pretende dimensionar a rede de drenagem; na
prática, em pequenos e médios aglomerados urbanos, o período de retorno a considerar
para efeito de dimensionamento de colectores de drenagem pluvial varia, em regra, entre
dois e dez anos; em certos casos, pode justificar-se a escolha do período de retorno
recorrendo, explicitamente, a uma análise de custos-benefícios, dependente dos
investimentos necessários e dos prejuízos decorrentes das possíveis inundações.

 Conhecimento do regime pluviométrico local (curvas de intensidade-duração-frequência).

 definição dos coeficientes de escoamento afectos a cada sub-bacia elementar; os


coeficientes de escoamento definem-se como a razão entre o volume de água que dá

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origem a escoamento e o volume de água efectivamente precipitado sobre a área em


estudo; estes factores dependem, entre outros, do tipo e ocupação do solo (na secção 5.3.
deste Documento, a propósito da aplicação do método racional, volta-se a abordar este
assunto);

 definição dos tempos de concentração iniciais (tempos dispendidos no percurso da água


precipitada, desde o ponto hidraulicamente mais afastado da bacia até à secção em estudo),
ou seja, dos tempos de concentração referentes às bacias de cabeceira.

 definição dos condicionalismos, principalmente de natureza hidráulica, associados à


descarga final das águas pluviais no meio receptor.

5.3 Cálculo de caudais pluviais

De entre os métodos de cálculo de caudais de ponta de cheia de pequenas bacias, o mais antigo
e de maior divulgação é, sem dúvida, o método racional. Este método pode ser traduzido
matematicamente pela seguinte expressão:

Qp = C I A [15]

sendo

Qp - caudal de ponta (L/s);


C - coeficiente do método racional (adimensional);
I - intensidade de precipitação [l/(s.ha)];
A - área da bacia de drenagem (ha).

As hipóteses de base do método racional residem no conceito de tempo de concentração, t c, e na


linearidade da relação entre a precipitação útil, (C x l), e o caudal de ponta, (Q p). Da hipótese de
linearidade resulta que a ocorrência do caudal de ponta coincide com o instante em que a
totalidade da bacia está a contribuir para o escoamento, ou seja, ao fim de um intervalo de tempo
igual ao tempo de concentração, tc.

O valor da intensidade de precipitação a considerar é, assim, o valor da intensidade média

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máxima para uma duração igual ao tempo de concentração. Como este valor está sempre
associado a uma frequência de ocorrência (ou período de retorno T), ao valor do caudal máximo
está implicitamente associada a mesma frequência.

O coeficiente C é o único parâmetro representativo da transformação precipitação-escoamento.

Embora não haja unanimidade referente ao campo de aplicação do método racional, pode citar-
-se, como referência, que a sua utilização se deve restringir a bacias com áreas inferiores a
1 300 ha. Em {4} e {5} apresenta-se uma generalização do método racional, admitindo-se a sua
aplicação para bacias até 4 000 ha, com ocupação muito diversificada.

Na expressão [15], o coeficiente C engloba vários factores, não só a relação entre o volume de
água escoada e a precipitação (ou seja, o coeficiente de escoamento propriamente dito), mas
também efeitos, mais ou menos importantes, de retenção, regolfo e atraso do escoamento
superficial ao longo do terreno, linhas de água naturais e colectores.

Todos estes efeitos dependem, não só das características físicas e de ocupação da bacia, mas,
também, da precipitação, ou seja, do estado de humidade do solo e da duração e distribuição da
precipitação. No Quadro 5, apresentam-se os valores médios do coeficiente C, para utilização do
método racional.

A intensidade média de precipitação, l, deve ser avaliada para condições críticas, ou seja, deve
admitir-se que toda a área da bacia contribui para o caudal avaliado na secção de interesse, o
que, por definição, acontece a partir do momento em que a duração da chuvada iguala o tempo de
concentração na bacia.

Para durações inferiores ao tempo de concentração, nem toda a bacia contribui para o caudal de
ponta máximo. Para durações superiores, é menor a intensidade média de precipitação e,
portanto, menor o caudal correspondente.

A intensidade média da precipitação, para determinada duração e período de retorno, pode ser
obtida tendo em conta a curva apropriada de intensidade-duração-frequência (I-D-F). Na Figura 6,

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em anexo, são apresentados elementos referentes aos parâmetros das curvas de I-D-F para
Portugal Continental.

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QUADRO 5 - VALORES MÉDIOS DO COEFICIENTE C DO MÉTODO RACIONAL


(ASCE, MANUAL Nº 37)

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Relativamente a bacias urbanas, em que o sistema de drenagem é constituído essencialmente por


uma rede de colectores, o tempo de concentração, t c, é calculado através do somatório de duas
parcelas - o tempo de entrada, te, correspondente ao percurso superficial das águas pluviais até
ao primeiro dispositivo de entrada (sarjeta ou sumidouro) nos troços de cabeceira, e o tempo de
percurso, tp, entre este ponto e a secção de jusante do troço.

Em bacias tipicamente urbanas, em que as áreas de drenagem dos colectores de cabeceira são
bastante impermeabilizadas, o tempo de entrada é , em geral, fixado entre certos limites que
podem, no entanto, variar significativamente em função do tipo de solo, da tipologia de ocupação
urbanística e do declive superficial.

Assim, são tomados como referência valores de 2 a 4 minutos na Grã-Bretanha e Suécia, de 5 a


30 minutos nos E.U.A. e de 5 a 10 minutos no Canadá. COSTA em {6} recomenda, para Portugal,
valores de 5 minutos em áreas de declive superior a 8%, 7,5 a 10 minutos em áreas de declive
compreendido entre 1,5 a 8% e de 10 a 15 minutos em áreas de declive inferior a 1,5%.

O tempo de percurso, tp, na rede de colectores é calculado, em geral, a partir das expressões de
cálculo hidráulico do escoamento em regime permanente (por exemplo, expressão de Manning-
-Strickler).

A situação mais simplificada corresponde a admitir o regime permanente e uniforme e a


considerar as velocidades de escoamento a secção cheia (hipótese que subestima os valores de
tp, sobrestimando os caudais de projecto) ou, em alternativa, as velocidades reais do escoamento
nos colectores (sendo exigido, neste caso, um processo de cálculo iterativo).

Normalmente, o último procedimento é o utilizado em algoritmos de computador, pela facilidade e


rapidez de execução; o primeiro procedimento é, por vezes, utilizado no cálculo tradicional.

Outros métodos simplificados de cálculo de caudais pluviais de ponta, como o método de Caquot
ou o método italiano, são apresentados em {11}. Em determinados casos especiais, e, mesmo no
âmbito dos pequenos aglomerados populacionais, pode justificar-se o refinamento dos processos
de cálculo, recorrendo, nomeadamente, a métodos de simulação compatíveis com a tomada de
decisões ao nível do planeamento e exploração dos sistemas {2}, {11} e {13}.

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Normalmente, estes métodos requerem a utilização de modelos computacionais.

5.4 Critérios de projecto e procedimentos de dimensionamento

Os critérios de projecto de redes de drenagem de águas pluviais, no domínio de aplicação do


presente Manual, são idênticos aos descritos nos Documentos Concepção de Sistemas de
Drenagem de Águas Residuais Comunitárias e Pluviais e Projecto de Sistemas de Drenagem de
Águas Residuais Comunitárias, nomeadamente no que se refere aos aspectos associados ao
escoamento hidráulico (fórmulas do escoamento, condições de auto-limpeza, altura de
escoamento e velocidade máxima) e ao traçado em planta e em perfil longitudinal.

No entanto, na quantificação de alguns desses critérios para o dimensionamento de redes de


drenagem de águas pluviais, há que distinguir o seguinte:

 a velocidade de escoamento máxima admissível é de 5 m/s, dado que se considera que o


caudal máximo de dimensionamento ocorre com pouca frequência;
 a altura máxima de escoamento deve ser igual ao diâmetro do colector (escoamento a
secção cheia);
 o poder de transporte mínimo deve situar-se entre 3 a 4 N/m 2, para a secção cheia (aspecto
não definido regulamentarmente).

Para efeitos do dimensionamento hidráulico tradicional de uma rede de drenagem de águas


pluviais, é vantajoso apresentar os valores calculados sob a forma de um quadro. Sugere-se a
utilização de um quadro-tipo como o apresentado no Quadro 2 (em anexo), ou outro idêntico, mas
que seja claro.

Relativamente a este quadro-tipo, podem considerar-se três grandes blocos: o primeiro relativo
aos caudais de projecto ou de dimensionamento [colunas (1) a (16)], o segundo corresponde ao
cálculo hidráulico propriamente dito [colunas (17) a (21)] e, finalmente, o terceiro bloco respeitante
aos elementos do perfil longitudinal [colunas (22) a (25)].

Para o preenchimento deste quadro-tipo, devem ser seguidos, nas suas linhas gerais, os
procedimentos descritos nas observações e no Capítulo 4 do Documento Projecto de Sistemas de
Drenagem de Águas Residuais Comunitárias, naquilo em que forem aplicáveis. Note-se que,

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neste caso, os colectores são dimensionados para a secção cheia, aspecto que simplifica os
procedimentos dos cálculos hidráulicos a efectuar.

Apesar da semelhança no dimensionamento dos dois tipos de redes (águas residuais


comunitárias e pluviais) sistematizam-se, em seguida, a sequência articulada de procedimentos
ou passos de cálculo.

1º Análise da área de projecto (incluindo o reconhecimento local e eventual levantamento


topográfico) e traçado da rede em planta.

2º Fixação do período de retorno, T, para o qual se pretende dimensionar a rede.

3º Escolha da curva de I-D-F aplicável à zona em estudo, para o período de retorno escolhido.

4º Definição das áreas drenantes em cada secção de cálculo.

5º Determinação do coeficiente médio, C, ponderado para a área drenante total, em cada


secção de cálculo:
C = ∑i Ci Ai / ∑i Ai

6º Determinação do tempo de concentração, tc, tendo em conta, nomeadamente, o referido na


secção 5.3. deste Documento.

7º Determinação da intensidade média de precipitação para uma duração igual ao tempo de


concentração (a partir das curvas de I-D-F).

8º Cálculo do caudal de projecto, por intermédio da seguinte expressão (método racional):


Qp = C I A
Em determinadas circunstâncias, pode justificar-se adicionar a este valor o caudal
estimado devido a infiltrações de água subterrânea.

9º Fixação do diâmetro e inclinação do colector, tendo em conta o conjunto de orientações


definidas no Documento Projecto de Sistemas de Drenagem de Águas Residuais
Comunitárias, nomeadamente minimização de custos, condicionalismos técnicos e
regulamentares de implantação do colector (profundidade de assentamento mínima), e

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satisfação dos critérios hidráulicos (capacidade de escoamento, velocidade máxima e poder


de transporte). É usual admitir-se o escoamento em regime permanente e uniforme e a
aplicação da expressão de Manning-Strickler.

10º Determinação do tempo de percurso, tp, ao longo do troço de colector considerado no


passo 9º, o que requer o conhecimento da extensão do colector e da velocidade média do
escoamento, para o caudal de dimensionamento.

11º Adição do tempo de percurso, tp, calculado no passo anterior, ao tempo de concentração,
tc, calculado no passo 6º.

12º Repetição de todos os passos de cálculo, de montante para jusante, a partir do passo 5º,
para as sucessivas secções de cálculo.

Como se pode inferir da descrição sequencial dos passos de cálculo, no método racional cada
colector é dimensionado individual e independentemente (excepto no que respeita ao cálculo do
tempo de concentração) e o correspondente valor da intensidade de precipitação de projecto é
recalculado, em cada secção de cálculo, para a área total drenada.

Dado que o dimensionamento se processa de montante para jusante, as áreas drenantes são
crescentes nas sucessivas secções de cálculo, bem como os respectivos tempos de
concentração. As correspondentes intensidades de precipitação são decrescentes, sendo estes
valores aplicados às áreas drenantes acumuladas em cada secção de cálculo.

5.5 Exemplo de cálculo

Apresenta-se, a título ilustrativo, um exemplo de cálculo do dimensionamento de um colector de


drenagem de águas pluviais com um comprimento total de 185,0 m, compreendendo quatro troços
e cinco caixas de visita.

Os elementos de base e os critérios hidráulicos, para efeitos de dimensionamento, são os que a


seguir se indicam:

 a numeração das caixas de visita, o respectivo comprimento entre elas e as


correspondentes cotas do terreno, as áreas drenadas por cada troço e os respectivos

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coeficientes C (método racional) são os que se apresentam nos Quadros 3 ou 4, em anexo;


 a altura de escoamento máxima admissível e o coeficiente de Manning-Strickler são de 1,0
(y/D) e 0,013 m-1/3 s, respectivamente;
 a inclinação mínima, por razões construtivas, é de 0,5%;
 para a verificação das condições de auto-limpeza não é imposto qualquer valor limite;
 a velocidade máxima admissível é de 5 m/s;
 a profundidade mínima de assentamento dos colectores, medida sobre o extradorso, é de
1,40 m, igual em toda a sua extensão;
 a bacia de drenagem situa-se numa zona litoral de Portugal Continental, admitindo-se um
período de retorno T = 5 anos; nestas condições, é utilizada a seguinte curva I-D-F (Figura
6, em anexo):

l (mm/h) = 259,26 t -0,562 (t em minutos).

Muito embora o exemplo apresentado corresponda a um sistema de drenagem com um reduzido


número de troços, pretende-se com ele salientar um conjunto significativo de situações possíveis,
em termos do traçado final do perfil longitudinal do colector (inclinação mínima, velocidade
máxima, etc.). Por outro lado, o exemplo apresentado é desenvolvido seguindo um procedimento
de cálculo tradicional e, simultaneamente, utilizando um algoritmo de cálculo automático.

Os resultados obtidos, para um e outro procedimento, são apresentados, respectivamente, nos


Quadros 3 e 4, em anexo; estes quadros resumem toda a informação de base e os resultados
obtidos.

Da análise dos dois quadros, salientam-se os seguintes aspectos principais:

 a troço mais a montante da rede (5-4) apresenta um traçado, em perfil, paralelo ao terreno,
enquanto que os dois troços mais a jusante (2-1; 3-2) têm uma inclinação igual à mínima
admissível (0,5%); o troço 4-3 tem uma inclinação inferior à do terreno, devido ao critério
hidráulico da velocidade máxima de 5 m/s;

 a diferença de inclinação do troço 4-3 (13,36% no procedimento tradicional, contra 10,52%


no cálculo automático) deve-se à diferença de métodos de cálculo hidráulico utilizados;

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assim, no primeiro caso os cálculos são feitos sempre para a secção cheia, enquanto que
no segundo o algoritmo pesquisa a inclinação necessária para que a velocidade máxima
não seja ultrapassada, para a real altura de escoamento correspondente ao caudal afluente;
refira-se que a velocidade máxima de escoamento, para uma dada inclinação do colector,
não corresponde à secção cheia (ver Figura 3 do Documento Projecto de Sistemas de
Drenagem de Águas Residuais Comunitárias).

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os sistemas de drenagem de águas pluviais são infra-estruturas destinadas a servir uma estrutura
principal (edificações, parques urbanos, vias de circulação), devendo adequar-se ao aglomerado
populacional que pretendem servir. Por outro lado, em novas urbanizações, as regras urbanísticas
devem ser delineadas no sentido de se adequarem a uma maior facilidade de construção e
economia das redes de drenagem.

No caso das bacias de drenagem que não são de cabeceira, o caudal afluente às respectivas
secções de jusante não é, em regra, igual ao caudal originado nas próprias bacias, dado o facto
dos dispositivos interceptores da águas pluviais, implantados a montante, não recolherem, em
geral, a totalidade dos caudais afluentes.

A prática de localização e consequente dimensionamento dos dispositivos interceptores de águas


pluviais de cabeceira deve diferir da prática respeitante à localização dos dispositivos de percurso.
No primeiro caso interessa, sobretudo, maximizar o trajecto percorrido pela água superficial, ou
seja, as dimensões das bacias de cabeceira. Tal preocupação tem o duplo objectivo de diminuir a
extensão da rede de drenagem enterrada e contribuir, simultaneamente, para um incremento do
tempo de concentração inicial na bacia, que se reflecte directamente numa diminuição dos
caudais de projecto e, consequentemente, do diâmetro e custo dos colectores que se
desenvolvem a jusante

Pelo contrário, no caso dos dispositivos Interceptores de percurso, não se põe com tanta acuidade
a preocupação de maximizar o percurso da água escoada superficialmente, dado o facto da
extensão da rede de drenagem enterrada já estar definida. Interessa, sobretudo, e com especial
importância, minimizar os custos sociais e económicos associados à ocorrência de inundações e
condições de escoamento não compatíveis com os critérios apresentados no Capítulo 4 deste

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Documento.

Estes critérios podem e devem ser complementados com disposições específicas. Por exemplo,
antes dos cruzamentos de arruamentos devem ser implantados, nas bermas dos pavimentos,
dispositivos interceptores de águas pluviais convenientemente dimensionados (que recolham 80 a
100% do caudal afluente).

Por sua vez, em zonas dos núcleos urbanos onde se preveja tráfego intenso, faz sentido ser mais
exigente na definição do período de retorno dos caudais de dimensionamento dos dispositivos
interceptores.

As sarjetas de passeio e os sumidouros, sejam dispositivos de percurso ou de cabeceira, devem


ser ligados a câmaras de visita. A cada caixa podem ser ligados dois ou mais dispositivos. A
capacidade de transporte, a secção cheia, dos ramais que promovem essas ligações, deve ser
verificada. Por outro lado, tais ramais devem ser implantados com declives que garantam auto-
-limpeza em períodos chuvosos, mas suficientemente suaves para evitar a ocorrência de erosão e
desgastes significativos da superfície interna dos colectores. Sugere-se que, para o caudal de
projecto, a velocidade máxima do escoamento não exceda 5 m/s e o poder de transporte não seja
inferior a 4 N/m2 .

A problemática da redução de caudais de ponta de cheia e volumes de escoamento afluentes à


rede de drenagem deve estar sempre presente no espírito do projectista. Soluções com recurso a
escoamento a céu aberto (com valas revestidas ou não), lagoas de retenção e câmaras drenantes
podem, em inúmeros casos, ser aconselháveis, do ponto de vista económico e mesmo do ponto
de vista estético e social.

No Documento Órgãos Especiais dos Sistemas de Drenagem, são apresentadas as bases de


dimensionamento e exemplos de cálculo de lagoas de retenção e de câmaras drenantes.

Em determinadas situações especialmente complexas, envolvendo colectores à maré, transições


de secção e descargas em linhas de água com condicionalismos de jusante, pode ser
recomendado o recurso a modelos hidrológicos e hidráulicos mais ou menos sofisticados, tal
como os referenciados em {11} e {13}.

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QUADRO 2 - QUADRO-TIPO PARA O DIMENSIONAMENTO HIDRÁULICO DE UMA REDE DE DRENAGEM DE ÁGUAS PLUVIAIS

Observações: Coluna (1) : de acordo com o traçado da rede em planta Colunas (10) e (11) : coeficiente C (método racional) do troço e ponderado das sub-bacias
Colunas (2) e (3) : idem da anterior drenantes [C = ∑- Ci Ai / ∑- Ai]
Coluna (4) : distância horizontal entre os centros das caixas de visita, a Colunas (12) e (13) : ver descrição no texto (secção 5.3.) e exemplo de cálculo
montante e a jusante do troço Coluna (1 4) : curvas I-D-F para o período de retorno escolhido, para uma duração igual
Colunas (5) e (6) : cotas, actuais ou futuras, do pavimento nas caixas de visita, a a (12)
montante e a jusante do troço Coluna (15) : [Q/A] [m3 / (ha.dia)] = 240 C I [l(mm/h)] ou [Q/A] [l/(s.ha)] =
Coluna (7) : [(5) - (6)] / (4) × 100% = 240 C I / 86,4 [l (mm/h)]
Colunas (8) e (9) : área drenada em cada troço e acumulada de montante, Coluna (16) : [(15) × (9)]
respectivamente Colunas (17) a (25) : ver descrição no texto do Documento Projecto de Sistemas de Drenagem
de Águas Residuais Comunitárias, no que for pertinente, e de cálculo deste
Documento

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QUADRO 3 - QUADRO PARA CÁLCULO DO COLECTOR DE ÁGUAS PLUVIAIS DO EXEMPLO. CÁLCULO CONVENCIONAL

Observações:
Coluna (13) : (4) / [20 × 60]
Coluna (14) : l = a tb (a = 259,26; b = -0,562; para T = 5 anos, com l (mm/h) e t (min) (Figura 6), em anexo
Coluna (15) : 240 / 86,4 × (11) × (14)
Colunas (19) a (21) : expressões (2), (2a) e (6) do Documento - Projecto de Sistemas de Drenagem de Águas Residuais Comunitárias

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QUADRO 4 - QUADRO PARA CÁLCULO DO COLECTOR DE ÁGUAS PLUVIAIS DO EXEMPLO. CÁLCULO AUTOMÁTICO

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Figura 6 - Curvas de intensidade - duração - frequência aplicáveis a Portugal Continental


[Anexo IX do Decreto Regulamentar nº 23/95, de 23 de Agosto]

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