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A PERSONAGEMNO TEATRO

As semeJhanças entre o Íomancee a peça de tea-


tro são óbvias: ambos,em suasforrnashabituais,nar-
ram uma histôria, contam alguma coisa que suposta-
mente aconteceuem algum lugar, em algum tempo,
a um certo número de pessoas. A partir dessenúcleo,
muitasvezesproporcionadopela vida real, pela história
ou pelalegenda,é possívelimaginaralguémque escreva
indife.rentementeurn romance ou uma peça, conformé
a sua formação ou a sua inclinaçãopessoal.Não é
raro, aüás,ver adaptações do romanceao palco; e se
a recíprocanão é verdadeira, deve-seisso, provavel-
mente, antesde mais nada a motivos de ordem prática.

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Mas o que nos interessano mornentosão as dife_ lha ao romance) csln a tragédia: "Efetivamente,com
renças - e a personagem,de certa maneira, vai ser os mesmos rneios pode um poeta imitar os mesmos
o guia que nos permitirá distingúr os dois gêneroslite_ objetos, quer na forma narrativa (assumindoa perso-
rários. No romance, a peÍsonagemé um elementoen_ nalidade dte outros, como faz Homero, ou na própria
tre vários outros, ainda que seja o principal. Rornan_ pessoa,sem mudar nunca), quer rnediante todas as
ces há que têm nomlesde cidades (Roma, de Zola) ou pessoas imitadas, operando e agindo elas mesmas.
que prete.ndemapanharum segmentoda vida social de (. . . ) Donde vem o sustentaremalgunsque tais com-
um país (E.U.A., de John Dos passos) ou mesm,ode posiçõesse denorninamdramas, pelo fato de imitarem
uma zona geogràficamentedelimitada (São lorge de agentes"1. Outra traduçãoem portuguêsé ainda mais
Ilhéus, de Jorge Amado), não querendo,ao menos em explícita quanto ao último parágrafo: "Daí vem que al-
princípio, centralizar ou restringir o seu interessesobre gunschamama essasobras dramas,po[que fazemapa-
os indivíduos. No üeatro,ao contrário, as personagens recer e agir as próprias personagens"2.
constituernpraticamente a totalidade da obra: nada A personagemteatral, portanto, para dirigir-se ao
existe a não ser através delas. O proprio cenário se público, dispensaa mediaçãodo narrador. A história
apresentanão poucas vezespor seu intermédio, como não nos é contadamas mostradacomo se fossede fato
aconteciano teatro isabelino, onde a evocaçãodos lu_ a própria realidade.Essaé, de resto, a vantagemespe-
garesda ação era feita menospelos elementosmateriais cífica do teatro, tornando-o particularmentepersuasivo
do palco do que pelo diálogo, por essasluxuriantesdes- às pessoassem imaginaçãosuficientepara transforÍnar,
criçõesque Shakespear€ tanto apreciava.E issotraz ime_ idealmcnte, a narração em ação: frente ao palco, em
diatamente à memória a frase de um espectadorem confronto direto com a personagem,elas são por assim
face do palco quasevazio de uma das famosasencena- dizer obrigádasa acreditarnessetipo de ficção que lhes
ções de JacquesCopeau: como não havia nada que entra pelos olhos e pelos ouvidos. Saberndisso os peda-
ver, viam-seas palavras.Com efeito, há toda uma cor_ gogos,que tanta importância atribüem ao teatro infan-
rente estéticarnoderna,baseadaem ilustresprecedentbs til, como o sabiam igualmente qs nossocjesuítas, ao
históricos, que procura reduzir o cenário quase à neu- lançar mão do palco para a catequesedo gentio.
tralidade para que a soberaniada personagemse afirme Há muitos rnodos de concebero narrador no rG
ainda com maior pureza. Em suma, tanto o romance mance. Enumeramosalguns,não para esgotaro assun-
como o teatro falam do homem - mas o teatro o faz to, mas somentepara estabelec€ras basesde uma com-
através do próprio homem, da presençaviva e carnal paração ainda mais estreita entÍe romance e teatro. O
do ator. narrador, por excelência,talvez seja o dominante no
Poderíamosdtzera mesmacoisa de outra maneira, romance do séculoXIX, o narrad,orimpessoal,pleten-
jâ agorucomeçandoa aprofundar um pouco mais essa samenteobjetivo, que se comporta como um verdadeiro
visão sintética inicial, notando que teatro é ação e Deus, não só por haver tirado as peÍsonagensdo nada
romance narração. Aristóteles, em sua poética, foi .1. Aristóteles, Poética, tÍa.drtçáo direta do grego, com introdução_-o
quennprimeiro colocou a questão nesses termos, ao índices, poÍ Eudoio de Sousa, Guimarães e Cia. EditoÍa, Lisboa, p.^ 70.
2.'Âristóteles, Árte Retórica e Arte Poética, tradução de Antônio
cotejar o poema épico (que sob esteasplectose asseme- Pinto de Carvalho, Clássicos Garni€Í da Difusão EuÍopéia do LiYÍo,
São Paulo, p. U2,

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se individuali'
como pela onisciênciade que é dotado. Ele está em personagensiriam crescer <ie numero e
o coÍ-
todos os lugares ao mesmo tempo, abarca com o seu ..o, que iarnais o palco ateniensecoÍtasso
"ur, suas origens' Assim
olhar a totalidade dos acontecimentos,o passadocomo dão umbilical que o piendia às
que' se por
o presente,é ele quem descrcveo ambiente, a paisa- devemoscompreendero coro da tragédia
por outro desem-
gem, quem estabeleceas relações de causa e efeito. um lado era pura expressãolírica'
às do nar-
quem analisaas personagens(revelando-noscoisasque penhava funções sensivelmentesen'elhantes
ele analisare cri'
às vezeselasrnesmodescoúecem), é elequem discorre rador do Íomance moderno: cabia a
ampüar' dar
sobre os mais variados assuntos (lembremonos das ticar as personagens'comentar a ação'
que por si
intermináveis consideraçõesmarginais de Tolstoi em ressonânciamoral e religiosa a incidentes
e do parti-
A Guena e a Pa7), carregandoo romance de maj66a não ultrapassariamu t'f*t do indiúdual
é do coro a palavra
extra-estética,dando-lhe o seu sentido social, peicolô cular s. ôuando Antígone morre'
deve ofender' Aos
gico, moral, religioso ou filosófico. Dessa concepção final. "Nunca aos deusesninguém
olímpica do narrador, pode-se descer até versõesbem orgulhososos duros golpes, com que pagam suas orgu-
-utìnitt a'
mais delimitadas e modestas,-como o narrador-tesüe- hãsas palavras, o" ensinam a ser sábios"
refletindo
munha (Carmen, de Merimee) ou o narrador-persona- A conciusão, evidentemente,é de Sófocles'
pode ser igualmente
gem (l la Recherche du Temps Perdu, do proust), a essênciado seu pensamento,mas
popular, aos cidadãosde Tebas'
subentendendo-se nestescasos qu€ o narrador não é atribuída à sabedoria
exatamenüeo autor mas, ele também, já um elemento testemunhasdodrarna,tomadosemconjunto.Autote
modo' também
de ficção. Há narradores que se apagaÍn diante da ptttooug.a - pois que o coro' a seu
ponto que somente
supostarealidade (Hemingway, por exemplo), como ã p.rroíug.m - fundem-sea tal
poderia dissociá-los'
há os que timbram em permanecerno primeiro plano urna análise um tanto artificial
Daí o caráter ambíguo do coro e a tendênciado teatro
(o das Memórias Póstumasde Brás Cubas,aproveitan-
não obstante
do-setalvez da circunstânciade ser um .,defuntoautor", a eliminá-lo'como a um corpo estranho'
que a narrâ-
é dosmaispetulantese impertirlentes que seconhecem). a sua comodidadepara o autor, à medida
e o autor cedia passo às
Já se vê, por essasrápidas indicações,que o narrador õa" t" tó"uertia óm ação
personagens.
é uma das armas, uma das riquezasdo romance, pos-
de completara
sibilitando ao autor dizer com maior clareza, se assim O teatro realistamodernoacabou
manifesta'vez
o desejar,aquilo que a própria trama dos acontecimen- operação. Mas em seu próprio bojo se
relaçãoao coro'
tos não for capazde exprimir. ou outra, uma longínquanostalgiaem
do nar-
qo" ,.upur.ce disiarçadamente'sob formaa-
Tanto o ditirambo quanto o comos, pontos tle da Ponte' de Ar-
partida respectivamenteda tragédia e da comédia oci- àAor+estemunhade PanoramaVisto
À Margem da
thur Miller, do narrador-personagende
dental, eran narraçõesorais e coletivas,dreorigem reli-
dâs-funçõcsìo-coro,fíï5lutÜ;'*?llli
resumo.
3. vcr um exce-lente
giosa. Mas o teatro propriamentedito só nasceuao se ""JfrÏ";;;i;;;;'"dapeça'
estabelecero diálogo, quando o primeiro embrião da
I

,.: X:1,ì:',,Hì';1,.ê",xy#z:!,ríLÍiíjii'ïf
0". Antiga--comédia e o Prólogo

personagem- o corifeu - se destacou do quadro


narrativo e passou a ter vida própria. Mais taide as
I
Dodcríamosl.to,^'
:rïá-:itr
;:ri{*"
"'tol"i'ïãi"u"tJ

s:.,;.fi+;$**';1ru
$[iq;*it'
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feita t"*t--l:
Vifu, de TennesseeWilliams, ou mesmo do narrador sua imponderabiüdade,a sua atmosfera
que ternos o cur-
puÍo e simples, que se aceita e se apÍesenta como tal, fatos dì que de sugestões,de coisas
a nós mesmos;
de Nossc Cidadc, de Thornton Wilder, peça que por dado de nao O.tit it com clareza oem
apesar de
abranger a vida de toda uma comunidadedurante al- Não se conclua, porém, que o teatro'
criar no passado
guns decênios difrcilmente poderia ser escrita a não ser iais restrições,não t"o-hu "on"'goido
com maior ou
lançando-semão de recursoÍrnarrativos. algunsinstrumentos capazesde executar'
Como caracterizar,em teatro, a penonagem?Os menordelicadeza,essetrabalhodeprospecçãointerior'
com que foram uti-
manuais de playwriting indicam três vias principais: o Três, pelo Íilenos, pela freqüência
um ligeiro comentá-
que a personagsm revela sobre si mesma, o que faz, riruo* durante séculos,*"ì."".
e o que os outros diãem a seu respeito. Vamos exami- rio: o confidents, o aparte e o monólogo'
herói' a alter
nar sucintamente c?da caso, pÍocurando sempre ïsolar O confidentee o desdobramentodo
o qual
o elemento específico ao teatro. ego,o empregadoou o amigo perfeito PeÍante
dcixamoscairasnossasdefesas,confessandoinclusive
A primeira solução só oferece algum interesse, de amor e de
o ,inconfessável. Phèdre, desfalecente
alguma dificuldade de ordem técnica, quando se trata paixão culpada
vergonha, apóia-seem Oenone em sua
de trazeÍ à tona esse mundo sem,i-submersode senti- Jean-Louis Barrault'
poi rrippoty,". Como escreveu
mentos e reflexões mal formuladas que não chegam6n ;'en t ugédi", le personnageest à son confident co que
a exibir aos olhos alheios ou do qual nem cheganos a (' ' ') Oenone est le
l'homme est à son "double"'
ter plena consciência.No romance é pocsível apanhar dénron; sa valeur
mauvais génie de Phédre; c'est son
esse "fluxo da consciência", que alguns críticos apon-
noire" 8.
tam como o "aspecto mais característico da ficção do convençao'
No aparte o confidentesomosnós: por
século vinte" õ, quase em sua fonte de origem, naquele alta de Yago
só o público ouve zrsmaquinaçõesem voz
estado bruto, incoerente, fragmentário, descrito pelos ridículo hoie ert
ou de Scapin. Daí o deu aspectoalgo
psiólogos: foi, como so sabe, a pÍoeza realizada por outros hábitos de
aia, qoanào o reaüsmo introduziu
James Joyce no último e famoso capítulo de U/ysses. contrário às
pensar, outras convenções, e em sentido
'anteriores:
No teatro, todavia, torna-se necessário,não só traduzür pela teoria da "quarta parede" dos natura-
em palawas, tornaÍ cronscienteo que deveria perrnane- devem pro'
listas, tanto o drarnaturgo como os atores
ceÍ em semiconsciência,mas ainda comunicálo de se não houvesse público' De
ceder exatameo,"
algum modo através do diálogq já que o espectador, "oto de glande trans-
resto, o aparte jamais exerceufunções
ao contrário do leito,r do romance, não tem acessodi- favorito da farsa e do melodrama'
cendência: Íecurso
reto à çonsciênciamoral ou psicológica da prsonagem. analisar as Persona-
o seu fim, via de tegÍa, eÍL menos
Compreende-se,pols, que o t€atro não seja o meio mais gens do que prevenir o público quanto ao anda^mpnto
apropriado para investigar as zonas obscrtras do ser: ação, não o deixando equivo'
[r"rror" ãu iuturo da
é difícil imaginar, por exemplq um romance como cena' O que
.ur-ru com referência ao sentido real da
um uso
Quírrcas Borba transposto paÍa o palco sem perder a não impediu que Eugene ONeill fizessedele
-_
5._-Iro! Í3drcloThe Moürn Ptychologtcal Note!, Grovc &csr lac., sclncct comnentaiÍca dc Jcan'
Now Yort, p. 9. Na p. 17, o autor comcnte os solilócúos dc Shakes- ;:
peerg c, ac p. 5?, à DEçr Stra8c Intcrludc, -r",Í; iiïlJl"fiïrik'ií'rH:i
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altamenterevelador,reintegrando-oem sua caúegoria
de convençãotão útil - ; tao arbitrária _ quanto neios solitárim de Willy'I-oman sao o sintoma mais gra-
qualqueroutra, desdeque o escritor teúa ve de sua incipiente desagregaçãomental. Mas não era
a assim, levidentenrente,que o interpretavam os autores
d3 o impor ao púbüco, apresentando-o "oi"gm
sem subterfú-
gros, Em StrangeInterluite as pe$otragens dos sécúos XVII e XVIII, período em que o monó-
exprimem_ logo alcançou o $eu ponto de maior prestígio' O teatro
-sesempreem dois planos,completandoo diflõgo com
o mondqgo interior, qrre é falado em aparte, clássico francês, tão apegado a supostasverossimilhan-
seja em ças, aceitou-o sem restrições.As estrofesem
que Cid
outÍo tom, seja atravésde nnicrofoae,sãgundo
a fór_ desfia as mzóespró e contra a sua possível ação contra
mula adotadapela êncenagão.O intuito é senelhante
ao de Alysses,soEÊnteque com uma inclinação D. Diègue nada têm da incoerênciada divagaçãopes-
deci- soal e tudo de ump exposição oratória sabiamente do-
dida para o lado d'apsicanálise,que acabando
enhar sada. Já bem mais próximos da marcha real do pen-
na moda(o romanceê de 1922,a peçade 192g),
nras samento,com as suasvaeilaçõese incertezas'mas sem
os resultadosnão coincidem:pela necessidade
de se perder com isso a sua beleza retórica, estão os monó-
fazerentenderde imediatopeto prnUücqgemos v4gar€xl
e a atençãodispensadaà leitura, O,Neill foi obrigado logos dle Shakdspeare,um dos quais, "To be or not to
a dar muito maior coerêncialógica ao discurso be", gÍavou-se mesmo na imaginação popular como o
inter- exemplo mais perfeito da reflexão poética sobre o
Dor poüco diferenciando-odo exüernoa não ser pelo
conteúdog lror uma certa indeterminaçãoda homem. O monólogo, em tais momentosprivilegiados,
forma ?. ultrapassa de muito o quadro psicológico que lble deu
A erperiênc{aé interessante,ao tentar pela primeira
origem, sabendo os autores clássicos,sem que ninguém
vez na,históriado úeatropôr à mosna sisiematicamente
o tivesse estabelecido,9üe o verdadeiro interlocutor no
tace oculta da personagem,mas não foi além
l dos teatÍo é o público.
limites de um achadopessoal Íe[tz, ao contrário
do Todos essesmecaniómosde revelaçãointerior, não
que sucedeuno tomance, onde a técnica
do .luxo
da crnsciência',incorporou-seem definitivo aos outros obstante o papel que representaÍam e ocasionaknente
recuÍs<xl expressivos,
como coroameDto ainda representam' paÍecem ter qualquer coisa de arti-
natural de uma
tendênciaintrospectivaque já viúa de longe. ficial, dJ estranho à norma do teatro' O contrário di-
ríamos da segundamaneira de caracterizar a persona-
Quanto ao monólogq ao solilóquiopropriamente gem: pelo que ela faz. A ação é não só o meio mais
ditq separtirmosdo princípio,comofaz o reatismo
m(F poderoso e constante do teatro através dós tempos'
detno, de que a personageüe.stáeletivamentosozinh4
como'o único que o realismo considera legítimo'
em conversaconsigomesma,de acordocoúr a etimo-
Drama, em grego' significa etimologicamenteação: se
logia da palavra, não há dúvida de que só podemos
quisermosdelinear dramàticamentea personagemdeve-
admiti-lo etn casosespeciais,como é i a" e Morte
b mos ater-nos, pois, à esfera do comportam'ento' à p6i-
Caixeiro-ViaiotÍe,de Arthur Miller, no qual os deva_
cologia extrospectiva e não introspectiva. Não importa'

p;rtffiffi,E,ï'l'+xlild,,#,ruffi
í$,ffiif
* por exemplo, que o ator sinta dentro de si, viva, a pai-
xão que lhe cabe interpretar; é preciso que a interprete
de fatq isto é, que a exteriotizn, pelas inflexões' por
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um certo timbne de voz, pela maneira de andar e de
gereris,levando Alexandre Dumas Filho a obsenrar que
olhar, pela exprcssão corporal etc. Do mesmo modo, penseur' comme
"IJn homme sansauculÌe valeur comnÌê
o autor tem de exibir a personagemao público, trans_ peut
moraliste, comme philosophe, comme écrivain'
formando em atos os seus estadoade espírito. Alguns auteur
donc être un homrne de premier ordre comme
teóricoschegaminclusivea definir o teatro como a aÍte oeuvre des
dramatique, Cest à diro comme metteur en
do conflito 8 porque somente o choque entre dois tern- de I'homme" 0'
mouvementspurement extérieurs
peramentos,duas ambições,duas concepçõesde vida, à ação é
Outro fator a considerarcom Íeferência
empenhandoa fundo a sensibilidadee o caráter, obri_ o
o tempo, A P"çu de teatro completa habitualmente
garia todas as personalidadessubmetidas ao confronto ou três horas'
.ro de existência çm apenas duas
a se deterrrinarem totalmente. Esta seria a função do "üo do palco mantém-sesempreacelerado:paixões
O ritmo
antagonista,bem como das personagenschamadasde travam-se
surgem à primeira vista, odiosidadescresce'm'
contraste,colocadasao lado do protagonistapara dar- reinados' cometem-
batalhas, perdem-se ou ganham-se
Jhe relêvo mediante o jogo de luz e sombra: Antígone .se assassíìúos,tudo em alguns poucos minutos pejados
não seria ela mesma, ou não apareceriacomo.tal, se de acontecimentose emoção'Este tempo característico
não üvesse de se rrÍedir contra a prepotência de Creon confor-
do teatro não poderia deixar de inÍluir sobre a
e a passividadede Ismene. Ação, entretanto, não se mação psicológica da personagem, esquematizando-a'
confunde com movimento, atividado física: o silêncio, de
reaiçanaì-the 06 üaços' favorecendoantesos efeitos
motivo
a omissão,a recusaa agtr, apredentadosdentro de um força que os de delicadeza- e neln por outro
certo contexto,postos em situação (como diria Sartre) exagero iá
a palavra teatral passou a ter o sentido de
também funcionam dramaticamente. O essencialé en- palco, como observou Victor
prãximo da caricatura. O
contrar os episodios sipificativos, os incidentes caÍacL que congÍ€ga e
Hugo, é um espelho de concentração
terísticos, que fixem objetivamente a psicologia da per- une
aoodaoroos raios luminosos,fazendo "d'une lueur
sonagem.Explica-se, asslm, a importância que o enredo 10' Há' bem en-
lumière, d'une lumière une flamme"
assun€ em teatrq certamento muito maior do que no pelas
tendido, autores que primam pelo subentendido'
romance; como se explica igualmente por que alguns a im-
meias-tintas,mas dão selnpre' como Tchekov'
romancistasque amaÍam e cortejaram o teatro (Balzac, pressão de haverem triunfado sobre as ümitações do
que
Zola, }Ienry James são excelentes exemplos) jamais próprio teatro, não sabemos por intermédio de
conseguiramobter êxito de palco: mestresda narrativa" sortilégio.
não souberam à
à lingrrage,mda ação. por ou- À necessidadede não perder tempo' somada
tro lado, esta mesma exigência da dramaticidade faz inérciadoatoreaodesejodeentraremcomunicação
com que a vocação dranatúrgica se apresente quase üo teatro
instantânea com o público, deseirvolveram
sempre como um talento pecúar, padroniza-
"ma habilidadc .rzi uma predileção particular pelas Personagens
é uma ten-
.t.. Em: -BarÍgtt H, Clar},_Enrcpcan Thcorlct ol thc Dmna, Ctotn das. iqao há dúvida de que o lugar-comum
PubllúcÍs,
üúcÍs, Ncw yor_t, 19fi, foa.grõ gconpanlar tal-vezhaia
do coÍrflito',,
99._"gl,Tlg'1,-
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con-flito",_dcsdc Brurctièic-
dc (,"rh-c,Law
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O" orúa;,-b:-{o.) ;ü tação peÍmanente em todas as artes' ' Mas
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no teatro alguma coisa a mab, uma tendência para
grau de consciênciacrítica que em circunstânciasdiver-
se cristalizar em torno de fórmulas, uma propensãoao
formalismo: compare-se,por exemplo,z rigidezdo tea_ sas elas não teriam ou não precisariamter.
tro clássico, cpm os seus preceitos imuti4veis_ a dis- O problema começou a se colocar corn agudeza
tinção de gêneros, a lei das três unidades, a divisão no século dezenove,dado que as épocasanterioresnão
em cinco atos - com a ftuidez, a liberdade, a ausência fechavam por completo o caminho à exposição das
de regras que semprevigoraram no Íomance. Isso nos idéias do autor: se Ésquilo e Sófocles valiam-se do
ajudaria a compreenderfenômenostão euriosos corno coro, como vimos, um Shakespeareou um Corneille
a Farsa Atelana 9 a !,Qsmnedia Dell'Arte,', nas quais não hesitavamem caÍïegar as peÍsonagenscom as suas
as personagens,entendidascomo individuaüdades,fo_ próprias meditações,enriquecendoas, elevando-asde
ram inteiramente substituídas, durante séculos, poÍ nível 12. O realismo modèrno, ao contrário, condena
máscar.s, arquétipos cômicos tradicionais. Seriam pìo_ a peÍsonagema ser unicamenteela mesma,expulsando
dutos extremosdessaestranhapropriedadeque o palco o autor de cena, relegando-oaos bastidores,onde deve
sempreteve de engendraruma biotipologia humana es- permanecerinvisível e em silêncio. Baixa em conse-
qüência o totuts humano do texto: iâ nío se trata de
pecial. Assim é que no Brasil do século passadouma
repÍ€sentaÍ heróis, seres excepcionais, e sim pobres-
companhia que dispusessede um certo número de
não merecemàs vezesa simpatia nem se-
emplois- o galã, a ingênuq o pai nobre, a dam4 galã, -diabos que
quer do autor. A reaçãoveio com a peça de tese, que
a dama central, o cômico, a dama caricata, o tirano
,riottodotio sub'repticiamente o autor sob as vestesdo
(ou o cínico), a lacaiarl - rgsf4yxem condições
de raisowvur, pessoa incumbida de ter sempre razão ou
interpretar qualquer peÍsonagem: todas as variantes
de explicar as raóes da peça, criação essencialmente
reduziam:se,em última análise,a essesmodelos ideais.
híbrida, inautêntica, porque' inculcando-seoonro p€r-
E era tão forte o apêgoà tradição que as platéiaspro- sonagemindividualizada (coisa que o coro nunca pre-
testavam$e por acasoo ülão do melodramanão entra_ tendeuser), não passavaem verdadede um servil emis-
va em cena como de costume, pisando na ponta dos sário do autor. Ibsen solucionou o impasse permitindo
pés e erguendocom o braço esquerdoa capasobre os simplesmentegue as personagenscompreendesseme
olhos. O ritual tinha a sua utilidade porque marcava discutissemcom luoidez os próprios problemas' Creio
de iníciq simbolicamente,a significaçãopsicológica e que foi Chesterton quem disse, com espírito, que a
moral da penionagem. grandenovidadedo drama ibsenianofoi encerrara peça
Resta-nosanalisaro terceiro modo de oonhecimen_ não quando a arçío tertnina, como era hábito, mas
to da personagem- pelo que os outros dizem a seu com uma conversafinal que faz o balanço dos aconte-
respeito. Nada há de relevanüea observar, exceto que cimentos.Nora e Hellmer, na última cena de Casa de
gobre
o autor teatral, na medida em que se exprime através Boneca, confrontam as suas respectivasversões
das personagens,não pode deixar de lhes atribuir um o que suoedera, comentam-se úutuamente, e é desso
12. Conta AndÍé MauÍoi! quc Paul Vaféry !!e dissc, 'un dla, que
. ll._Esga ctassificação corresponde aoE tÍtulos dos capítulos de Shakcsocare sc tornou ilustÍc ÍroÍ tcr tido a idéia' na aparència tcmc'
das acçõe-s.
do üvro Gàteia T heànat,. -ã-õ"riã"õirãs, -ãeuma
-jãl rária. ïe fazcr rccitar Dor atórcs, no momcnto mak trágico dos 6cgs
autoÍ'que i'cútiui"
assina _rJtõçõl
eï'jãããriú -jóieãri".
nio
dramas, páginas inteiras dc Montaigne. Acontcccu,-diz Valé-ry' quc equèlc
tillh,ltt"n;"!"jil núblico Ëoítava dos discuÍsog morais". (André Maurois, Mágicos c Ló-
iicor, traiuzidó por Heitor Moniz' Editora Guanabara, Rio, p. 99.)

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eonfronto que nós, espectadores,acabamospor tirar as capital da dramaturgia moderna. O seu intúto era o
nossas conclusões. Estava criada a peça de idéias, de instituir um teatro político, atuante, que não per-
porta larga por onde passaÍam e continuam a passÍtÍ manecesseneutro p€rante uma realidade econôÍnica e
inúmeros autores, desde Bernard Shaw até Jean-paul social que se deve transformar e não descrever. Um
Sartre. Muito pouco há drecomum entre êles, na nraio- teatro qu,e incite à ação e não à contemplação. Mas
da das vezes,além da generosidadecom que empres-
Brecht evita com muita inteligência o escolho habitual
tam o brilho da própria inteligência às personagens.
do teatro de tese, não identificando o seu ponto de
Por outro lado, o realismodo tipo norte-americanofoi-
vista com o da personagem' A presençado autor em
-se confinandocada vez mais ao estudomreramente psi- seusespetáculos(já que as suasteorias não se referem
cológico da personagem,única saída diante da impos-
apenasao texto) faz-se sentir clara mas indiretamente'
sibilidade de discutir em cena idéias morú e políticas
atravésdo espetáculopropositadamenteteatral, dos ce-
sem trair os fundamentos teóricos da escola. Ainda
nários não realistas,ilustrados com dísticosexplicativos
recentementeArthur Miller, reexaminando The Cru-
sobre a peça, das cançõesque desfazema ilusão cênica
cible (As Feiticeiras de Salém), queixava-sede que o
e põem o autor em comunicaçãoimediata com o pú-
público anglo-saxãonão "acredita na realidadede per-
sonagensque vivam dreacordo com princípios, conhe- blico. Ainda assim Brecht não diz sem rodEios o que
cendo-sea si mesmase as situaçõesque enfrentam, e pema. O seu método lembra o de Sócrates1r: é pela
capazes de dizer o que .sabem. (. . . ) Olhando em ironia que ele busca despertar o espírito crítico dô
retrospecto,creio que deveria ter dado às personagens espectador,obrigando.o a reagir, a procurar por si a
de As Feiüceiras de SaIém maior autoconsciência, e verdade. A p"çu não dá respostam.asfaz perguntas,
não, como insinuaram os críticos, mergulhá-las ainda esclarecendo-astanto quanto possível, encamiúando a
mais no subjetivismo.Mas nessecaso a forma e o êstilo solução correta.
realistasda peça estariamcondenados".Linha*adiante, A personagemnão perde, portanto, a sua inde-
'acrescenta:"É inevitável que o trábalho de Bertolt pendência,não abdica de suas característicaspessoais;
Brecht seja mencionacio.Eúbora não possa concor-
mas quando canta, quando vem à ribalta e encara coÍa-
dar com o seu conceito da situaçãohumana, a solüção josamente a platéia, admitindo que está no palco, que
que propõe paxa o problema da tomada de consciência
se trata de uma representaçãoteatral, passa por assim
da personagemé admiravelmente honesta e teatralmen-
dizer a outro modo de existênsia: se não é propria-
te poderosa.Não se pode assistir a uma de suas pro-
mente o autor, também já não é ela mesma. É que
duções sem perceber que êle está trabalhando, não na
esta concepção do teatrq que Brecht chamou de épica
periferia do problema dramático contemporâneo,mas
por oposição à dramática tal como fora definida por
diretamente em seu centro - que é, tornamos a Í€pe-
Aristóteles (épico enr tal contexto equivale praticamen'
tir, o problema da tomada de consciência"18.
te a narrativo), modifica também a relação ator-perso-
Brecht, com efeito, reformulou a relaçáo autor_
nagem. O intérprete não deve encaÍnaÍ a peÍsonagem'
-personagem.em termos originais, tornando_a a questão
14, A aproximação tâlvez seja menos fortuita do que parece: Só-
},llret' collected Plaw, The viking Press, New York, crates é de tàto o hérói de uma das Histórias de Almanaque de Brecht
,rrr*;o.o#.Ë. (8. BÍechet, HistoiÌes d'Almanach, L'Arúe, Paris, 1961, p' 105).

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no sentido de se anular, de desaparecerdentro dela tõ. do Cromwell, considerando-onão como uma obrigação
Deve, por um lado, configurá-la,e, por outro, criticá-la, de ser poético, tnas como uma disciplina do estilo, uma
pondo em evidênciaos seusdefeitose qualidades(que, 'a
defesaiontra flacidezda prosa de todos os dias: "Il
dentro da óptica marxista que é a de Brecht, devem 17' Está-
rend plus solide et plus fin le tissu du style"
ser menosdos indivíduos do que da classesocial a qu.e vamos em pleno fervor romântico, mas a causa já se
êlespertencem).Temos, assim,personagensautônomos, achava perdida: os próprios companheirgsde geração
ou reústas, dentro de um quadro teatral não realista; do autor de Hernani escreveram geralmente teatÍo em
e entre uma coisa e outra insinua-se com facilidade o prosa. O realismo nãroÍez mais do que lançar a derra-
pensamentodo autor. ãeira pá de cal.sobre a questão,não obstante alguns
A perspectivacrítica do ator sobre a personagem pronunciamentose algumas interessantestentativas mo-
não é inteiramentenova: o expressionismo, por exem_ ãrrou, em contrário, e pela simples razáo de sobrepoÍ
plo, já a ,empregavaconscientemente,como a empre- em definitivo a linguagernda personagemà do autor'
gam intuitivamente, em pequenasdoses,todos os bons "Deux chetrins - escreveu Jean-Richard Bloch -
atores, alongando, tornando exemplaresa avarczade s'offrent donc au poète dramatique. Fidèle à un idéal
Harpagon e a hipocrisia de Tartufo. O que Brecht fez réaliste, voudra-t-il suivre au plus près les désordres,
a esserespeito,a exemplodo que jâ fizna com o texto, reproduire ou réinventerles sublimesplatitudesde l'être
foi explorar em profundidadeuma das vertentespossí- humain en proie aux égarementsde la passion? Nous
veis do teatro, codificando,erigindo em sistemaas ex_ aurons alors les hoquets, les cris, les onomatopées,Ies
periênciasdo teatro alemão esquerdistada década ds frénésieslaborieusesdu drame moderne. Ou bien, con-
1920, quando vanguardismopolítico e vanguardismo venant de I'inanité de cette tentative, le poète méditera
estéticoainda se'confundiam16. des leçons plus ancienneset cherchera une traduction,
Deveríamos ainda abordar um úlürno tópico: o une stylisationde ce bégaiementaffreux' Il désireramet-
estilo. Não vamos fazêJo com minúcia, todaúa, por- tre fonomatopée en forme. Il ordonnerale cri et en ti-
que, do ponto de vista desteensaio,não passade um rera un discours"18.
aspectoda relação mais vasta autor-personagem.O O primeiro caminho, que correspondeà verdade
verso, sabemostodos nós, foi o invólucro que preservou da personagem,tem sido preferentementeo do teatro
durante séculoso estilo trágico, impedindo-ode cair no norte-americano.Para saber dialogar' em teatro, não é
informalismo e na banblidade,assegurandoao autor o necessáriodominar atêcnicada linguagemeÁcrita:basta
direito de se exprimir em alto nível literário. Era ainda ter bom ouvido, apanhar e reproduzir com exatidão a
essaa função que lhe atribuía Victor Hugo no prefácio língua - e às vezesquase o dialeto - falado nas ntas'
15. ïambém DideÍot no ..paÍadoxc du Cornédien', susrcnra quc a
Oonde essa proliferação de cursos de playwriting, às
cncar,n_ação do .rtor nunca é.total: mas trata-se de uma impossibilidadc
psicológica, não de um ato deliberado de natureza crítiiã-iomó cm ÉrccÍt.
centenÍN,e de peças,aos milhares, fabricadas com maior
. _16., A..posição de Brecht apareceaqui, por questõesde cspaço,um ou menor engenhosidadepor pessoasque não podem
tanto simptiÍicada: não aludimo-sao usô ita fauüra, oõ coro,'àè- mãl_
9"juÌ:.,ll""lll9l.
quc peÌ,mitem de um modo ou de 'outro a iítervençáo ser consideradasescritoresno sentido exato do terrro'
1o,.L.1],.:,9lrtto, às i(léias--estéticas
de Brecht, ver: John Willett, irre
rnearre ot Bertotd Brccht, Methuen and Co, Ltd., London, 1959;quanto
ao teatÌo alemão de esquerda_ 17. Victor Hugo, oD. cir., P' 38.
anrerior ao nazisiro,-üm ã"p-olilen'to-àã
granrle_vivacidadcé o rrè Erwin--piscaioi, fàãlì6"rbiiiào, 18' fean-Richard Bloch, Destin ìIu Thêatre, Líbturie Gallimard'
Éãiiõ-iiãi-ru:
turo, S. R. .L., Buenos AiÍcs, 1957. Paris, 1930, pp. 102-103.

98 99
Em contraposiçãq os verdadeiros dramaturgos,
os só começaa viver, só adquire existênciaartlstica, quan-
nomes que re4lrnente@ntam, mostram.sesenpre
ca- do se liberta de qualquer tutela, quando toma em mãos
pazes do elaborar um estilo pessoal e aÍístico p"rti, as rédeasdo seu próprio destino: o espantosode toda
das sugestõesoferecidas pela palawa faladq àpiovei_
"
criação dramática - em oposiçãoà lírica - é que o
tando não somente a #q as incorreções saborosas
da autêntico criador não se reconhecena personagema
linguagem popula,r, rnas também a sua vitalidadc quasc
que deu origem. Em tal direção o teatro vai ainda mais
física, a sua üvacidadg a sua irreverência o
a sua longe do que o Íomance Í)orque, no palco, a persona-
acidez, as suas metáforas cheias de invenção poéticaro.
gem está só, tendo oortado de vez o fio narrativo que
O segundo camiúq se quisermos pennanocer no a deveria prender ao autor. O dramaturgo não está
terreno das generalizações,é por excelênciao do
teaho longe de-seassemelharao Deus concebidopor Newton:
francês, tribuúrio muito nais, em questfts
de forma, o seu papel se extinguiria para todos os efeitos no ato
de uma lqnga tradição clássica do que de uma
brevís_ da criação. Qualquer interferência sua posterior sobre
sima experiência realista. As persooagensde
Anouilh as personagensseria em princípio um escândalotão
e Salacrou- para não nos referirmos extremoc, grandequanto o é o milagre em relação às treisda natu-
a um Claudel.e a um Giraudoux _ jamais" ""ro,
perdem de rcza. Mas poucocautoresse contentamcom senelhante
vista as quúdades de concisão,de õlareza,-de graça,
exclusão: o próprio impulso que os levou a escrever
docorreçãq de elegância, que distinguem o estilo
lite_ a peça, leva-os também a expor e a defender os ôeus
rário. A modernidade é dada principalmc,ntepelo
corte pontos de vista. Daí essaluta surda entre autor e per-
d9 diálogq por um certo aÍ de improvisação, pelo
sonagem, cada qual procurando ganhar terreno a ex-
ritmo menos narrativo c mais oral das frases,
sJ as pensas do outro. Não há em teatro nenhum problenra
comparannos ao formalismo estrito da tragédia
clássica. mais antigo e mais atual do que ess€: a história da
V.emos,pois, que as diferençasentre uma e outra relação autor-personagemseria, em larga medida, a
posição, marcantes em teoria, se atenuam própria história da evolução do teatro ocidental, das
na prática
teatral: em ambosoc casoschega-sea um compÍornirro, diferentesformas por ele assumidasdesdea Grécia até
pendente mais para um lado ou para outro, os nossosdias.
entre a
autonomia lingüística da porsonageme o desejo
do autor
de impor as suas exigênciasaústicas.
Podemos agora concluir. A obra literária
- é um
prolongamento do autor, uma objetivação
do que ele
sentepossuir de mais íntimo e pessoal. A personagem
constitui, portanto, um paradoxo, porque essa
criatura
nascida da imaginação do romanciri" oo do
dramaturgo
19. Qualidades não só do_tcetro.mas__t_ambém
do cincma c do Ío-
jiffi'"""_Éirfi
maúoê norte-amcricano. Coml
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