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Ríos 2015 Séptimo Simposio Regional sobre Hidráulica de Ríos

MATRIZ DPSIR APLICADA À AVALIAÇÃO DE SERVIÇOS FLUVIAIS EM


RESTAURAÇÃO DE CURSOS DE ÁGUA
Janaina A. Evangelista , Sylvie Barraud2, Priscilla M. Moura3 Márcio B. Baptista4
1

1, 3, 4 - Universidade Federal de Minas Gerais - Av. Antônio Carlos, 6.627 Bloco 1- (31) 3409-1870
2 – Institut National des Sciences Appliquées - INSA de Lyon, 20 avenue Albert Einstein, Villeurbanne, France
janainaae@ig.com.br; sylvie.barraud@insa-lyon.fr; priscilla.moura@ehr.ufmg.br; marcio.baptista@ehr.ufmg.br

RESUMO

As avaliações de cursos de água no planejamento de intervenções fluviais requerem a compreensão da interação


entre os sistemas social e ecológico na bacia. Os diversos interesses envolvidos e a relação complexa entre
serviços fluviais e impactos demandam sistematização dessa interação e discussão entre os atores. A matriz
DPSIR permite a sistematização desse tipo de problema, com evidenciação dos serviços impactados, origem das
ações impactantes e possíveis correções. O presente estudo visa estabelecer uma matriz DPSIR de serviços
fluviais para o planejamento da restauração de cursos de água. A consulta à literatura e à especialistas permitiu
estabelecer uma matriz referencial para orientar as discussões dos serviços ou valores desejados com a
restauração e a proposição dos indicadores para a priorização dos trechos de cursos de água.

ABSTRACT

The streams evaluations in the planning of river restoration require understanding the interaction between social
and ecological systems in the watershed. The several interests involved and the complex relationship between
river services and impacts require the systematization of this interaction and discussion between the actors. The
DPSIR matrix allows the systematization of this problem pointing impacted services, origin of impactful actions
and possible responses. This study aims to establish a DPSIR matrix river services for planning the river
restoration. The literature analysis and experts consultation allowed establishing a reference matrix to guide the
discussions of desired services or values with the restoration and establishment of indicators for prioritization of
streams.

INTRODUÇÃO

A gestão de cursos de água tem evoluído de uma gestão hidráulica, preocupada somente com
controle de inundações e sua exploração econômica, para uma gestão mais global,
incorporando a componente ecológica com vistas a proteção do curso de água de forma a
garantir os recursos hídricos e seus serviços ecossistêmicos (Carré et. al., 2011). Assim, as
ações de restauração de cursos de água vêm ganhando cada vez mais espaço nas discussões de
políticas de meio ambiente e recursos hídricos.
O planejamento de ações de restauração de cursos de água requer avaliação dos sistemas
fluvial e social, pois os cursos de água cumprem múltiplas funções – ecológicas, biológicas e
sócioeconômicas. Muitas dessas funções estão interrelacionadas de maneira que a ação sobre
uma induz mudanças em outras e, em alguns casos, um uso limita, ou mesmo inviabiliza,
outro.
Neste estudo será utilizada a matriz DPSIR para avaliação dos impactos antrópicos sobre as
funções fluviais de cursos de água. O objetivo é sintetizar as relações de impacto entre estado
e funções fluviais, de maneira a auxiliar o planejamento de intervenções em cursos de água,
em especial para ações de restauração.

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MATRIZ DPSIR

Com vistas a orientar a formulação de políticas públicas a UNEP (2009) propôs a utilização
da matriz DPSIR, Figura 1, para avaliação da interação entre o desenvolvimento urbano e
meio ambiente. DPSIR deriva das inicias dos termos em inglês: Driving forces – forças
motrizes, Pressure – pressão, State – estado, Impacts – impactos, Responses – respostas.

Figura 1.- Matriz DPSIR (adaptado de UNEP, 2005)

No modelo proposto são estabelecidas as relações de causalidade entre as atividades


econômicas e humanas (forças motrizes), que geram desmatamento, lançamento de efluentes,
etc. (pressões), que por sua vez conduzem a alterações de estado do ambiente, que geram
impactos em ecossistemas, saúde pública e outras funções. As respostas, correspondentes às
ações individuais ou coletivas, são os instrumentos para mitigar ou prevenir esses impactos.
Entre os instrumentos utilizados para fornecer essas respostas estão incluídas as políticas
públicas, atos administrativos e econômicos, como regulação e incentivos fiscais, e as
intervenções físicas.
O modelo DPSIR consiste, portanto, em uma simplificação de uma estrutura complexa de
interelações dos sistemas ecológico e social, das quais algumas ainda não são bem
compreendidas. Entretanto, tem se mostrado uma ferramenta útil para visualizar essas
interações na avaliação e proposição de políticas públicas.
Esse modelo tem sido utilizado para orientação de políticas públicas de diversas áreas do meio
ambiente, sendo destacadas a seguir exemplos de estudos para a restauração de rios e gestão
de recursos hídricos baseados na avaliação pela matriz DPSIR.
Mattas et al. (2014) empregaram a matriz DPSIR para avaliar causas e origem das pressões
sobre o Rio Gallikos na Grécia. O objetivo foi a otimização de ações em favor da
sustentabilidade da gestão dos recursos hídricos. Foi a forma escolhida de fazer a ligação
entre forças socioeconômicas às pressões e respostas.
O estudo de Song e Frostell (2012) estabeleceu a ligação relação entre restauração de rios e
setores socioeconômicos de maneira a exercer uma pressão que direcionasse o monitoramento
da qualidade da água. Devido à verificação pelos pesquisadores de que a maior parte dos
indicadores de qualidade são de estado/impacto, os autores focaram na avaliação das pressões
para o monitoramento, de maneira complementar ao planejamento e tomada de decisões
quanto a restauração e a gestão de recursos hídricos.

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METODOLOGIA

Para a determinação dos serviços, estado, forças motrizes, pressões e respostas, partiu-se de
um referencial teórico obtido da revisão da literatura. Esse referencial foi validado e
complementado com pesquisa qualitativa por meio de entrevistas com especialistas. Essas
entrevistas foram realizadas com 31 atores em outubro de 2014. O grupo de entrevistados
comtemplou profissionais de empresas de consultoria em projetos de drenagem, controle de
inundações e restauração de rios, professores universitários com atuação e pesquisa em
ambientes fluviais, mestrandos e doutorandos em recursos hídricos e meio ambiente,
membros de comitês de bacias hidrográficas e agência de bacia, líderes de comunidades
mobilizados em favor da restauração e preservação de cursos de água, técnicos de órgãos
gestores de recursos hídricos, licenciamento ambiental e gerenciamento de obras de
intervenções em cursos de água. As entrevistas semiestruturadas demandavam dentre outras
questões dos entrevistados que apontassem quais critérios deveriam ser considerados no
planejamento e priorização de intervenções em cursos de água. Após a indicação pelo
entrevistado, era solicitado que considerassem o rol de critérios obtidos da literatura e
apontassem a sua pertinência ou não.
Entre os entrevistados estão profissionais de empresas de consultoria em projetos de
drenagem e restauração de rios, professores universitários com atuação e pesquisa em
ambientes fluviais, mestrandos e doutorandos em recursos hídricos e meio ambiente,
membros de comitês de bacias hidrográficas e agência de bacia, líderes de comunidades
mobilizados em favor da restauração e preservação de cursos de água, técnicos de órgãos
gestores de recursos hídricos, licenciamento ambiental e gerenciamento de obras de
intervenções em cursos de água. Esses profissionais e atores têm atuação principalmente no
município de Belo Horizonte e no estado de Minas Gerais, sendo que Minas é um dos estados
em que o modelo de gestão de recursos hídricos estabelecido na Lei Federal 9.433 de 1997
encontra-se em estágio mais avançado de implementação.

MATRIZ DPSIR PARA PLANEJAMENTO DA RESTAURAÇÃO DE CURSOS DE ÁGUA

Para representar a interação entre o desenvolvimento urbano, os impactos sobre curso de água
e as ações resposta por meio da matriz DPSIR, considera-se que as forças motrizes sociais e
econômicas exercem uma pressão sobre o curso de água, produzindo alterações no estado do
meio e impacto na saúde humana e do ecossistema. As ações no sentido de combater esses
impactos podem se dar sobre as forças motrizes, as pressões, o estado ou sobre os impactos
(Ronchi et al. 2002).
As respostas podem ser ações do poder público ou da sociedade, em intervenções fisicas no
curso de água ou na bacia, regulamentação e educação ambiental e saitária, as quais deveriam
estar sempe inseridas em uma política pública orientada pela análise dessas interrelações ntr
sistema ecológico e social.
As relações de causalidade entre forças motrizes, pressões, estado do curso de água, impactos
sobre os serviços fluviais, permitem definir indicadores para o planejamento de ações e
estabelecimento de políticas públicas. Na Figura 2, a matriz DPSIR construída para cursos de
água apresenta em forma de colunas forças motrizes, pressões, estado, funções fluviais
impactadas e as ações possíveis. O objetivo dessa matriz é identificar os indicadores de
impacto sobre os serviços fluviais. Para a obtenção desses indicadores são utilizados
subindicadores de estado, segunda coluna da Figura 2.

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Figura2.- Matriz DPSIR - Impactos antrópicos sobre serviços fluviais de um curso de água

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Cada estado indicado pode influenciar de maneira diferente mais de um indicador de impacto.
Por exemplo a existência de riqueza de biodiversidade impacta positivamente a manutenção
de processs ecológicos, geomorfológicos e o abastecimeto de água, mas limita o uso do curso
de água para diluição de efluentes.
As funções fluviais estão relacionadas ao habitat, às propriedades físicas, biológicas e
processos ecossistêmicos dos cursos de água, como por exemplo, vazões, carga orgânica e de
sólidos (Costanza et al., 1997). Já os serviços ecossistêmicos podem ser definidos como
benefícios que as pessoas adquirem dos ecossistemas a partir dessas funções, como serviços
de produção, de regulação, de suporte, e culturais, cujos produtos abrangem alimentos e
combustíveis, serviços de regulação do clima e controle de doenças, e benefícios não
materiais espirituais ou estéticos (Costanza et al., 1997, Millenium, 2010).
Os serviços fluviais de um curso de água variam de acordo com suas características físicas,
biológicas e químicas, bem como com a estrutura socioeconômica, cultural e política da
sociedade do seu entorno. Pode-se estabelecer os principais serviços de um curso de água
como indicado na primeira coluna da matriz da Figura 2. Esses serviços fluviais estão
atreladas aos usos humanos daquele recorte territorial e funções fluviais característicos de um
curso de água.
A Lei 9.433/1997 (Brasil, 1997) determinou o enquadramento dos cursos de água em classes
de acordo com os usos ou serviços fluviais existentes ou pretendidos, denominados valores
fluviais (Costanza et al., 1997, Millenium, 2010). Para a garantia da adequada prestação
desses serviços, para cada classe (Especial, I, II, III e IV) foram definidos parâmetros mínimos
de qualidade, na Resolução no. 357 do CONAMA (Brasil, 2005).
A lesgislação citada tratou de parâmetros físicoquímicos de padrão de qualidade das águas
para garantir os serviços fluviais. Entretanto são necessários ainda critérios de estado que
incorporem também aspectos sociais e físicos para a calha e planície de inundação como
indicado na segunda coluna. Esses critérios foram definidos com base na literatura e nas
entrevistas realizadas com trinta e um atores retrocitados.
A definição das forças motrizes se insere em uma avaliação de cenários de desenvolvimento.
Ao mesmo tempo em que o desenvolvimento ecônomico e a expansão urbana geram pressões
no sentido de diminuir a qualidade ambiental, o avanço da regulamentação, da
conscientização ambiental e do controle social geram pressões no sentido da presevação e
restauração do cursos de água. O uso do cenário atual permite considerações sobre o estado
atual e os impactos já sofridos pelos serviços fluviais, entretanto, é importante avaliar quais
trechos ou cursos de água estão mais vulneráveis considerando-se também um cenário futuro
provável. O curso de água que esteja em uma estado menos crítico no momento da avaliação,
pode passar uma condição crítica frente a pressões do desenvolvimento econômico previsto, e
ter seus serviços fortemente impactados o que requer ações preventivas. Portanto recomenda-
se uma avaliação de impactos, nos cenários atual e futuro.
As respostas ou ações para minimizar ou prevenir os impactos antrópicos sobre os serviços
estão inseridas em políticas públicas que compreendem regulamentação, intervenções físicas e
educação ambiental. Essas ações podem ser direcionadas aos impactos, ao estado, às pressões,
às forças motrizes, possivelmente e preferencialmente de forma complementar.
As ações sobre forças motrizes estão geralmente associadas à regulamentação de atividades
econômicas e urbanização. A zoneamento e restrição de uso e ocupação do solo, presentes nas
leis de uso e ocupação do solo e planos diretores municípais são exemplos clássicos de
atuação da municipalidade com esse intuito. O enquadramento dos cursos de água é outro
instrumento regulamentar que permite limitar os impactos e vislumbrar um curso de água com
qualidade que permita novos usos.

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As intervenções físicas atuam geralmente sobre o estado e pressões, como a restauração de


rios ou utilização de estações de tratamento de águas, desocupação das margens, ou mesmo
intervenções como obras de canalização.

CONCLUSÕES

A mariz obtida permite visualizar as interações entre ações antrópicas e o impacto sobre os
serviços fluviais. Assim é possível orientar a discussão entre os atores e estabelecer os
serviços pretendidos, ou seja, os valores fluviais para aquele recorte territorial em estudo. Para
cada caso concreto pode ser feita a adaptação da matriz com exclusão, inclusão ou
desmembramento de serviços e de pressões.
Para efetuar o planejamento de intervenções em cursos de água é preciso trabalhar com o
cenário atual e pelo menos um cenário provável. Para a avaliação dos impactos sobre os
serviços fluviais pode-se trabalhar com subindicadores de estado. Esses subindicadores
contribuem para a avaliação de mais de um serviço fluvial, podendo ter influência positiva em
um serviço e negativa em outro.
A continuidade da pesquisa compreende o estabelecimento de parâmetros e escala de
mensuração para os subindicadores de estado, com definição dos pesos para cada serviço
fluvial, o que permitirá a agregação de todos os indicadores e obtenção dos indicadores de
serviço. Os pesos serão definidos, a princípio, por meio de consulta a especialistas pelo
Método DELPHI.

Agradecimento. À CAPES, à FAPEMIG e ao CNPq e aos pesquisadores do Institut National des Sciences
Appliquées - INSA de Lyon que colaboraram com esta pesquisa.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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