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O pensamento em ciências do desporto partindo de uma abordagem filosófica

A sociedade contemporânea vive influenciada pelos “ventos” de mudanças nas variadas áreas, o que
leva a que se adopte um tempo definido pela busca e experimentação de actividades novas que se
expressam em diferentes domínios de nossa vida e que geram um nível alto de possibilidades de ações e
sensações. Estes tempos que nos referimos são tempos de: sentir, experimentar, explorar; viver as
enormes possibilidades, auto-realizantes, divertidas, enriquecedoras e saudáveis que invadem todos os
domínios da nossa vida, tais como, a escola, o lazer, o desporto, as festas populares, etc. Vivemos num
período em que a sociedade mundial caracteriza-se pelo pluralismo de idéias, pela complexidade das
práticas e dos saberes.

Mas o que vem a ser complexidade? Para MORIN & LE MOIGNE (2000), a complexidade é uma
palavra-problema e não uma palavra- solução; a complexidade desafia, não dá respostas. A dificuldade
em conceber este pensamento complexo está no facto de que ele (pensamento complexo) deve enfrentar
o emaranhado, a contradição e, porque não dizer, a solidariedade dos fenômenos entre eles.
Independentemente das definições propostas a respeito da
complexidade, ela surpreende pela sua irrealidade, isto é, pela irreversibilidade de seu conteúdo, por
sua dificuldade de entendimento, por não possuir um sentido concreto. Com efeito, difere da
complicação, com a qual ela é confundida, por preguiça intelectual ou por galanteria retórica, que se
caracteriza facilmente por sua visibilidade. A complexidade está para a complicação do mesmo modo
que a entropia está para a energia: uma espécie de avaliação do 'valor de mercadoria', definida pelo
observador, de um lingote de mistura metálica, com determinado peso e imposto a este observador. O
'muito complicado' pode não ser 'muito complexo' e o muito simples (o grão da matéria!) pode ser
dado como muito complexo (MORIN; LE MOIGNE, 2000).

Quando pensamos no desporto para crianças e jovens não há como dissociá-lo das idéias acima
expostas, tendo em vista que o desporto em si é permeado de unidades, de relações entre estas unidades,
de significados, de incertezas, não podendo, portanto, ser resumido a uma idéia simples ou a uma lei.
Isto nos remete ao sistema desportivo centrado nos quadros competitivos, em que a pedagogia do
desporto fortemente influenciada pelo paradigma reducionista, busca e elege o tipo ideal de atleta,
promovendo a fragmentação, a exclusão e a seleção desportiva como forma de se chegar às seleções
futuras (SANTANA, 2005). É preciso, pois, pensar num desporto para todos e não num desporto que
seja privilégio apenas dos mais dotados.

HOMEM (2003) salienta que o grande problema está na crença errônea de muitos profissionais de
educação física de que o desporto é somente para quem tem talento. Tal facto, segundo Santana (2005),
nos remete a pensar no número de crianças e adolescentes que se submetem a este tipo de pedagogia;
uma pedagogia que elege o rendimento, as vitórias e a competição como o maior objectivo. A este
respeito o autor assevera que:

... uma pedagogia reducionista .., se faz quando ignora o todo em detrimento das partes; que ignora,
por exemplo, que a criança que se interessa por desporto é a mesma que se relaciona com os amigos,
com a família, com a escola, que tem necessidades de brincar despretensiosamente, de se divertir, de
ser aceita, de transpor limites, que imagina ser esse ou aquele craque, que tem desejo de jogar, que
precisa aprender a conviver, a cooperar e a construir autonomia. Portanto, a criança que faz desporto
não é apenas o atleta em potencial que alguns procuram, pois acalenta em si e fora de si uma
sociedade de factores [imprevisibilidade] que nem sempre atenderam os desejos unilaterais de um
pensamento simplista (SANTANA, 2005: 8).

O pensamento complexo configura-se numa nova visão de mundo, que aceita e procura compreender as
mudanças constantes do real e não pretende negar a multiplicidade, a aleatoriedade e a incerteza dos
fenômenos, mas sim, conviver com elas. Este pensamento tem-se revelado contextual - uma vez que,
procura explicar os fenômenos considerando o seu contexto, a sua totalidade e a sua interactividade -,
sendo utilizado por teóricos de diferentes áreas do conhecimento (professores, cientistas sociais,
pedagogos do desporto, técnicos,
psicólogos, etc.) que buscam dar conta de uma complexidade teórico- científica sempre crescente
(FLORENTINO, 2006a).

Contudo, é importante dizermos que não se trata, de acordo com MORIN (2005), de retomar a ambição
do pensamento reducionista que é a de controlar e dominar o real. A intenção do pensamento complexo
não é a de controlar o çãos aparente dos fenômenos, mas sim, trata-se de exercer um pensamento capaz
de lidar com o real. Para tanto, deve-se ter em mente que a complexidade não vem em substituição da
simplicidade, a complexidade surge onde o pensamento simplificador é ineficiente, ou seja, na
explicação de fenômenos complexos.

Cada vez mais, as pessoas procuram uma prática desportiva que não se resuma ao modelo tradicional de
desporto. Actualmente, as pessoas buscam uma modalidade desportiva que lhes proporcionem o contato
com a natureza, o espírito de aventura, o prazer, enriquecendo, por assim dizer, a vida quotidiana
(FLORENTINO, 2007b). A maioria dos estudos sobre o desporto já vem apontando para um sensível
aumento da sua importância em termos qualitativos nas sociedades pós- modernas, mostrando que o
desporto vem se desenvolvendo como um sistema flexível, informal e não-formal, correspondente
àquilo que poderíamos considerar ser o desporto como um direito de todo o cidadão (HOMEM, 2003).

Dessa forma, cabe aos professores de educação física criar condições para que o desporto seja assumido
como um valor de referência na formação de crianças e jovens. Em particular, devemos enquanto
professores e pedagogos em desporto lutar contra uma pedagogia que está mais preocupada em cumprir
metas e etapas de treinamento, estabelecendo um tipo idealizado de modelo de atleta que deve ser
seguido milimetricamente. Em face, acreditamos ser importante visualizarmos e implementarmos uma
pedagogia mais complexa que respeite a vontade e os hábitos desportivos de cada criança para, assim,
irmos ao encontro de um "novo desporto", mais educativo e responsável.

Não obstante, para alterarmos o quadro descrito no item anterior, é preciso entendermos que qualquer
que seja a modalidade desportiva que o cidadão venha a optar, como factor de saúde, de prazer ou
mesmo na busca de resultados, este deve merecer uma atenção redobrada de profissionais formados e,
ao mesmo tempo, de uma "formação de profissionais que desenvolvam conhecimento e pesquisas no
sentido de propiciar a esse sujeito os benefícios que ele espera da prática desportiva" (MOREIRA et al.,
2006: 188).

Adentrando na questão da formação profissional em desporto, acreditamos serem importantes algumas


considerações de cunho teórico-epistemológico quando o que está em jogo é a formação e o
desenvolvimento de nossas crianças. Com relação ao trabalho interdisciplinar, MOREIRA et al. (2006)
salientam que a base epistemológica pode ser conseguida por meio da teoria da complexidade, pois para
os autores o profissional em desporto deve ser um educador na sua relação com os seus alunos e um
pesquisador
dos elementos que, por assim dizer, constituem a complexidade do fenômeno desportivo. Nas palavras
dos autores:

Esse complexo universo da formação profissional em desporto deve contemplar elementos, numa teia
de integrações, que estão presentes nos sentidos de ensino, pesquisa e extensão a partir do fenômeno
ser humano que pretende desenvolver conhecimento e prática em desporto, como: Filosofia,
Antropologia, Psicologia, História, Administração, Pedagogia, Medicina, Fisiologia, Biomecânica,
Anatomia, Testes e Procedimentos Estatísticos, Formas de Avaliação. Com esse suporte, por exemplo,
deverão aparecer pesquisas que, nas áreas das humanidades, questionam os valores éticos da prática
desportiva, investiguem as razões, o porquê de determinadas comunidades serem afetas a
determinados desportos... (MOREIRA et al., 2006: 188).
Pensamento em Ciências do Desporto (, estética

A palavra estética é originária do grego, “aisthesis”, significando percepção ou sensação. Segundo


HEGEL, só em meados do século XVIII, através de A. BAUMGARTEN (1714-1762), é que esta
palavra entrou no vocabulário moderno, querendo significar a “ciência das sensações” (p.7). Aqui, neste
Unidade, estética será entendida como a reflexão filosófica sobre a beleza e a arte, e como um
significativo valor humano.

Enquadramento

Num entendimento tradicional, perspectivar o desporto do ponto de vista estético conduz-nos


imediatamente a pensar na beleza de diversas modalidades desportivas. Na verdade, ao falar-se em
estética do desporto, rapidamente se evoca a beleza de movimentos desportivos característicos da
ginástica rítmica desportiva, da patinagem artística, da natação sincronizada ou da ginástica artística.
TAKÁCS (1989) afirma que a perspectiva do senso comum tende a demarcar os desportos belos, atrás
referidos, dos desportos "feios" como o boxe, o râguebi, a luta ou as corridas de longa distância.
Para PATRÍCIO (1993, p.117) “a estética é a disciplina que tem como objecto formal a reflexão sobre a
beleza”, sendo que esta ocupa hoje um lugar cimeiro no quadro axiológico da sociedade onde nos
inserimos, de tal forma que DELFIM SANTOS considere que “o belo não é um conceito nem uma
idéia: é um valor e, portanto, residente na esfera emocional do homem” (SANTOS, 1982, p.14). É,
talvez, repousado nesta afirmação de belo como valor, que vários autores consideram que uma moral
humanista se deve pautar pelo Bom e pelo Belo (FERNANDES, 1999; PATRÍCIO, 1993), pelo que a
busca da excelência humana deve também orientar-se por estes importantes valores.

As palavras belo, beleza e estética, quando percebidas através desta visão humanista, não mais poderão
ser consideradas como elementos simbólicos da futilidade ou da frivolidade dos nossos tempos, mas
encaradas como valores existenciais, pelo que deverão ocupar o seu devido lugar no processo educativo,
não podendo a Escola alhear-se destes valores em nenhum dos seus ciclos ou níveis de ensino.
Acreditamos na educação em valores, pelo que estes terão que ser considerados na sua plenitude.

PLATÃO (428-347 a.C.), na sua extraordinária obra República, um dos documentos mais
impressionantes que conhecemos, alude à necessidade da harmonia entre a alma e o corpo – o seu
aspecto externo - enfatizando a beleza corporal, sendo que o belo e o bom, no século V a.C., traduziam
o ideal de perfeição física e moral. A grandeza humana tinha assim um suporte físico pleno de harmonia
estética, como, aliás, a estatuária grega evidencia com todo o seu esplendor. É de salientar que o nu
artístico grego, ainda hoje referência estética, foi inspirado pelos corpos dos atletas de então (PEREIRA,
1988).

LEONARDO DA VINCI não se cansava de aludir à beleza da natureza, quer na sua proporção quer na
sua essência, embora tenhamos a consciência que Hegel não considerava a natureza na perspectiva
estética. Para ele, estética é a transcendência da natureza, isto é, a obra humana situada para lá do
natural.

TOURAINE (1994), na sua análise à modernidade, entende a evolução do pensamento como uma
passagem da razão de Deus para a razão do estado, e desta para uma razão estética, assumindo esta
última um papel no pensamento contemporâneo. A este respeito, LIPOVETSKY (1994) não hesita em
considerar o imperativo narcísico como glorificado pela nossa cultura, nem TOURAINE (1994) em
elevar os deuses do prazer ao altar-mor do panteão do nosso tempo.
A estética, em especial a corporal, aparece como um valor de extrema importância nesta nossa
sociedade, considerada por MARC AUGÉ (1994) como sendo da imagem. Entendemos legítima a
abordagem pela estética do corpo humano, mesmo na linha da transcendência da matéria enunciada por
Hegel, para quem as obras de arte “não são produtos NATURAIS, mas produtos humanos” em virtude
de considerarmos o corpo humano como uma verdadeira construção cultural, sendo comparável a um
pedaço de madeira que cada um esculpe de acordo com a sua própria vontade e satisfazendo os mais
variados projetos individuais.

A idéia da “morfogênese cultural” do corpo humano, já apresentada por GARCIA (1998), mostra-nos
que cada vez mais a própria forma corporal está umbilicalmente submetida à cultura, sendo, por isso, em
grande parte um produto do espírito e não simplesmente o resultado da natureza. GUARDINI (1999),
nas suas famosas Lições de Ética na Universidade de Munique, alude que uma obra de arte é uma
criação cultural, na qual o ser humano supera a própria natureza, acrescentando-lhe algo, sendo que essa
realização pressupõe liberdade, a partir da qual se situa perante o mundo em que actua.

Sendo o corpo humano, como já indicamos, uma construção, é justo referenciá-lo como uma verdadeira
obra de arte, como uma imagem produzida pela cultura, como algo mobilizável pelos diferentes
ambientes socioculturais e não como um simples produto da biologia ou da natureza.

A imagem que o nosso tempo “elegeu” como a ideal, aproxima -se bastante daquela evidenciada pelos
jovens, de onde resulta o imperativo ético de “mantêm-te jovem o mais tempo possível” (MEINBERG,
1990). No entanto, este imperativo não perspectiva a totalidade dos valores associados à juventude, mas
apenas aqueles referentes ao aspecto exterior, à imagem que se projeta para a sociedade. Mais
importante que as virtudes/defeitos da juventude, são as impressões corporais transmitidas para o
exterior, onde o ser é nitidamente subjugado ao parecer. Não se é jovem, mas tenta-se parecer jovem.

A imagem, ou se quisermos ser mais rigorosos, os contornos corporais postos em evidência pela
imagem tornam-se preponderantes nesta nossa sociedade contemporânea, nomeadamente nos meios
urbanos ocidentalizados, onde se institucionalizou toda uma cultura, mesmo um negócio, em torno deste
relevante valor.

O homem tem a consciência que é ser finito e essa consciência cada vez mais énos proporcionado pelo
corpo. Com efeito, o tempo somatiza-se (GARCIA, 1999), modificando de tal forma os nossos corpos
que basta a imagem destes para que consigamos perceber a idade do outro. Na busca da eternidade, o
homem moderno tudo faz
para que o corpo não evidencie as indeléveis marcas do tempo, tentando assim iludir aquilo que é
inexorável e, até hoje, invencível.

Cresce o número daquelas pessoas que não querem ser vistas com determinado invólucro exterior,
reflexo do tempo, mas com um outro, mesmo que o interior seja completamente diferente. Querem
ser vistas sem o tempo, cristalizados num momento efêmero mas socialmente confortável, ou seja,
querem permanecer jovens. O corpo associado a estas idades é aquele onde tudo parece ser
harmonia, onde a beleza se irradia com mais evidência, onde se atinge melhor a ilusão da idéia de
perfeição humana. É ainda o corpo com que muitos de nós gostaríamos de perpetuar para a
eternidade.

Para que tal aconteça é necessário construir uma imagem estéticamente agradável, valendo tudo,
mesmo o desporto, assumindo este um importante papel para a consecução deste processo de
simulação.

Como trabalhar com manifestações artísticas em nossas aulas de desporto? A primeira coisa a ter em
mente é que o desporto não precisa ser somente trabalhado no campo. Obviamente que não devemos
negar que o campo é o local por excelência para trabalharmos com a prática desportiva, mas também
há possibilidades de trabalhar em outros espaços ou utilizando outras estratégias que não os
elementos técnicos e tácticos do jogo.

Podemos utilizar as manifestações artísticas de forma multifacetada. Um das possibilidades é seu


uso para discutir algo ligado à prática desportiva em si: torcida, violência, regras, entre outros. Outra
possibilidade é o uso para discutir algo ampliado, ligado por exemplo ao contexto político nacional.
Chamaremos a primeira possibilidade de utilização da arte para discutir a prática desportiva em si e
a segunda de utilização da arte para uma discussão ampliada a partir do desporto. Ambas tratam-se
de uma educação pelo desporto a partir da arte.

Existe ainda outra possibilidade de grande importância, relacionada à perspectiva de educação


estética: a utilização da arte, a partir do desporto, para uma educação para a arte. Já que estamos
utilizando a arte para discutir algo ligado ao desporto, aproveitamos para trabalhar com nossos
alunos os elementos da arte em si: as suas características, o movimento em que se insere, a
característica do artista. É importante que não utilizemos a arte somente como um meio de educação,
mas também como um fim. Ela pode sim ser um veículo para discussão de muitos elementos e
temáticas, mas também é em si um conteúdo. Estas dimensões devem ser trabalhadas de forma
articuladas.

CONCUSAO
A Ética Desportiva surge como uma estrutura moral que define alguns limites para o comportamento
dos desportistas, de forma a preservar um sistema desportivo civilizado. É possível competir respeitando
o adversário, reconhecendo o seu valor e competência, vendo-o como um oponente indispensável, sem
o qual não existe competição. As regras da Ética Desportiva exigem que, além de respeitar o adversário,
se saiba reconhecer o mérito do vencedor, guardando para si os sentimentos de tristeza e
desapontamento

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