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Revista Critica de Ciéncias Sociais Ne@t Dezembro 2001 RUI MACHADO GOMES Faculdade de Ciéncias do Desporto e Educagiio Fisica da Universidade de Coimbra A globalizacaéo da escola de massas: Perspectivas institucionalistas e genealdgicas A anélise critica de algumas das aporias de dois influentés modelos explicativos da génese @ expansio da escola de massas — os modelos da formagao do Estado e da institu- clonalizacéio mundial da educagio — proporcicna o enquadramento con- ceptual para a construcdo da pers- pectiva_genealégica defendida pelo autor. Esta esta estribada em tres pilares: pressuposto da descontinui- dade; recusa da existéncia de um mandato educativo moral baseado em principios; carécter contingente das tecnologias politicas usadas pelos sis- temas educativos. A pesquisa associa- -se a perspectiva dos autores que tem procurado uma alternativa a partir da nogao de tecnologias politicas con- tingentes, como contraponto aos modelos tradicionais da relacao entre Estado e educacao 135 A tentativa de responder & questao relacionada com 1. A genealo- a génese e a expansao da escola de massas, encontramos gia da escola tipologias mais ou menos extensas que se distinguem pela de massa: maior ou menor desagregacao que fazem das correntes res- alguns pectivas (Craig, 1981; Rubinson, 1986; Fuller e Rubinson, pressupostos 1992; Morrow e Torres, 1995). No presente artigo limitamos a nossa discussao a duas dessas correntes, devido ao peso telativo que assumiram desde os anos 70 na literatura tedrica e, ainda, ao volume de estudos empiricos que originaram. Referimo-nos aos modelos da formacao do Estado e da insti- tucionalizagaéo mundial da educacao. Nao faremos aqui uma revisdo global e extensiva das restantes teorias, porque sobre elas existe uma extensa bibliografia. Analisaremos com mais detalhe os modelos da formaco do Estado e da institucio- nalizagao mundial da educacao, ja que estes fornecem um enquadramento conceptual pertinente para a construgao da nossa propria perspectiva genealdgica. Embora reconhecamos limites e impasses nestas teorias, sera a partir da analise cri- tica de algumas das suas aporias que a construgao de um modelo alternativo se tornard possivel. 136 Rui Machado Gomes As perspectivas genealdgicas fornecem-nos varias hipd- teses interessantes a respeito da construgao da escola de massas. Nao constituindo propriamente um corpo tedrico Unico e coerente, a analise genealégica da escola estriba-se em trés pilares: pressuposto da descontinuidade; recusa da existéncia de um mandato educativo moral baseado em prin- cipios; caracter contingente das tecnologias politicas usadas pelos sistemas educativos. O pressuposto da descontinuidade faz incidir a andlise genealogica num corte tranversal do presente na sua contin- géncia radical. Renuncia-se a procura da origem do discurso, da determinacéo do momento ou da razéo fundadora do ja-dito e do jé-feito, que conduz, numa circularidade obses- siva, a um ponto infinitamente recuado no tempo. Nao se trata de encontrar no passado as causas dos acontecimentos pre- sentes, mas de aplicar sistematicamente o conceito de des- continuidade, segundo o qual aconteceu assim mas tudo poderia ter sido de outro modo. A genealogia é a historia do presente feita a partir da identificagao das causas aparente- mente insignificantes; questionam-se as problematizagées a partir das praticas e das suas modificagdes. A aplicagao sistematica do conceito de descontinuidade encontra, porém, um certo nuimero de obstaculos travejados na metdfora biolégica ¢ evolucionista ¢ nas nogdes de pro- gresso, desenvolvimento, adaptagaio © evolugéio que permi- tem descrever os acontecimentos discretos dos sistemas educativos como sendo a manifestagao de um Unico prinei- pio organizador ou da evolugao para um certo estado normativo. Constituem, pois, obstaculos 4 compreensao das pequenas diferengas o das insignificantes flutuagdes que constituem o arquivo de possibilidades de aceao inscritos nas praticas e nos discursos actuais dos autores e destinatarios da escola. Recusa das posicées de principio: a analitica que propo- mos nao se compraz em fazer uma historia da escola de massas que tome a forma de uma sucessao de unidades ou prineipios subjacentes, optando antes por desemaranhar a naturalizagao da sua génese, tragando, para esse efeito, as multiplas, heterogéneas e contingentes condigdes que pre- tendem hoje responder aos seus problemas. Argumenta lan Hunter (1988, 1994), dentro desta linha de orientacdo, que os modernos sistemas educativos néo podem ser observa- dos como se fossem expressées historicas de qualquer prin- cipio politico democratico ou de desenvolvimento completo da pessoa humana. Para perceber a emergéncia do sistema escolar, nao se pode restringir a observagao a racionalidade do Estado, seja esta feita do lado dos principios da sobera- nia e legitimidade em que se bascia, seja do lado da repres- 80 e ilegitimidade que a rejeitam. Com efeito, a educagdo de massas antecipou os modelos de organizacao politica demo- cratica, surgindo da adaptagao pelos estados modernos das instituigdes de disciplina pastoral, para efeitos de formacao da populagdo e construgao do préprio Estado. Tratou-se de uma improvisacao histérica realizada a partir das tecnologias morais, intelectuais e praticas disponiveis, na tentativa de reunir solugdes pragmaticas para exigéncias especificas e problemas limitados. Associamo-nos, assim, aos autores que tém procurado uma alternativa a partir da nogao de tecnologias politicas con- tingentes. Esta proposta @ sustentada por Hunter (1994) e Rose e Miller (1992) como um contraponto aos modelos tra- dicionais da relagao entre Estado e educacao, que assentam na hipdtese de o Estado ser a origem do modelo e do governo da escola de massas. Pée-se assim em realce que o Estado é apenas uma forma particular de governo, a qual que nao esgota 0 campo de calculos e de intervengdes que cons- tituiram a escola de massas. Em oposicao a uma visao teleologica da historia e da escola, preferimos a alternativa que nao conjectura uma episteme escolar sustentada no desenvolvimento geral da razao, do Estado ou da economia. A escola nao emerge de interesses econdémicos, capacida- des intelectuais, principios morais ou estratégias estatais pré-definidas. Parece-se mais com uma tecnologia improvi- sada, um habitus que acolhe os escassos recursos que a cul- tura tem ao dispor para imaginar e orientar a educagao. Deste modo, sofre sucessivas deslocagdes devidas & complexa relagdo de factores que geram a oferta e a procura de edu- cacao. Nao existe uma transcendéncia, uma razao-clara ou auto-evidente nos acontecimentos historicos. Como refere Furet, «o postulado segundo o qual o que “realmente acon- teceu” o fez por necessidade 6 uma ilusdo retrospectiva clas- sica da consciéncia histérica, que vé 0 passado como um campo de possibilidades no qual 0 que realmente acontecou se apresenta ex post facto como 0 Unico futuro para aquele passado» (1981: 19). Esta conceptualizagao tom consequéncias evidentes no modo de analisar o fonémeno da globalizagao do modelo oci- dental da escola de massas. Teorizado por Meyer e colabora- A globalizagéo da escola de massas 137 138 Rui Machado: Gomes 2. Estado e Sistema Mundial: a perspectiva instituc! nalista dores, desde os anos 70, como a demonstragao da expansdo mundial isomorfa da cultura educacional, a analise desse fendmeno tem sido contrastada por alternativas que, embora diferentes em alguns dos seus pressupostos, se associam no argumento comum segundo o qual nao ha determinismos uni- versais, porque as historias sao demasiado complexas e inde- pendentes umas das outras. Contrariamente a |égica integrada da historia da educag&o mundial, sublinha-se 0 caracter con- tingente dos processos de globalizacao. Embora o presente artigo nao se adentre na perspectiva comparada, esta discus- sao mostrar-se-a imprescindivel a andlise de um pais semi- periférico como Portugal. De entre as teses que, no dominio da educagao, tém levado mais longe esta hipotese de crise do universalismo que é, simultaneamente, uma faléncia das grandes teorias, havemos de introduzir a da simultaneidade dos processos de integracao supranacional e dos processos de diversificagao intranacional (Schriewer, 1998), da simulta- neidade da difusdo do modelos educacionais estandardizados e da diversidade dos processos da sua recepgao (Schriewer, 1998), dos efeitos diferenciados dos varios mecanismos de influéncia externa nas politicas nacionais (Dale, 1998). «Perdemos tudo mas resta-nos a educagéo», proclama Fichte, recuperando um orgulho patridtico perdido, no res- caldo da derrota prussiana as maos do exército napolednico. A declarag&o encerra uma promessa destituida de qualquer desespero, jd que esta se concretizaria poucos anos depois numa administragao estatal da educagao na Prissia. A criagéo de um sistema educativo estatal era a oportunidade de con- cretizar um esforgo mais unificado de construgao da nagao desafiada por circunstancias adversas. O episddio revela bem como a educacao 6 um meio simbolicamente eficaz de rege- neragao nacional quando se quer reconquistar ou consolidar influéncia e prestigio no sistema interestatal (Rowlinson, 1974; Green, 1990). A crenga na educacao enquanto meio de (re)construgao de uma identidade imaginada acompanha a formagao e con- solidagéo dos Estados-nagao europeus nos séculos XVIII e XIX. A escolarizago de massas torna-se numa tecnologia central na criagao de lacos simbélicos entre os individuos e © Estado (que a si proprio se define como de todos e de cada um), garantindo assim um governo do territério e da popu- lagao. Individuagao e totalizagao sao termos inseparaveis da génese da escola: uma racionalidade que assegura 0 desen- volvimento individual através da orientagao pessoal da con- duta, a razao do individuo; e o funcionamento da economia global da sociedade que garante a conduta da conduta, a razao de Estado. Esta estrutura social duplicada sobre si mesma, com uma ordem ptiblica e uma ordem privada, serve para caracterizar sumariamente as primeiras formas da escola enquanto instrumento da governamentalidade (Foucault, 1991). Firma-se uma alianga hist6rica entre o modelo de governo das almas, remanescéncia da tradigao pastoral da igreja, com o modelo burocratico de governo da nagao, assente numa visao secular do progresso e de glori- ficagaéo do homem-projecto. O individuo é a unidade social fundamental, a medida de todas as coisas, a partir da qual as comunidades séo feitas; enquanto o Estado se torna a uni- dade institucional e referéncia para a construcao da identi- dade social. A descoberta da infancia e 0 desenvolvimento das teorias da socializacao, enquanto formas deliberadas de os repre- sentantes da sociedade orientarem as criancas, separando-as dos grupos naturais, articulam-se num movimento de insti- tucionalizagao da escola. A tecnologia disciplinar (Foucault, 1975) inscrita na escola torna-a capaz de utilizar a plastici- dade da crianga na produgao de cidadaos adultos bons, leais € produtivos. O século XIX é o século da crianga numa época de nacionalismos. Com efeito, 0 aparecimento das culturas de protecgéio e domesticagao das criangas é contemporaneo do nacionalismo europeu (Bauman, 1987), decorrendo este da alianga entre Estado e cultura. A par do monopolio da violéncia legitima que institui a uni- dade politica soberana e maximiza a lealdade, 0 monopdlio da certificagao das qualificagées estabelece o padrao de cul- tura codificada para a comunicagao entre os homens da nago. A incorporagao militar obrigatéria e a educagao obri- gatoria fazem parte do mesmo projecto que visa conferir uma identidade nacional particular cuja base institucional é o Estado. Um governo de cada um e de todos com o propésito de garantir a seguranga e a prosperidade da nagao é a fina- lidade da educag&o que deste modo formaria cidadaos. No final do século XVIII portugués, a nagéo era ainda um pro- jecto inacabado devido as limitagdes da cultura letrada de base escolar. O monopdlio da violéncia legitima estava ainda ameagado pelas resisténcias ao recrutamento militar dos plebeus (Costa, 1995). Tal resisténcia, que expunha o Estado A globalizagao da escola de massas 139 140 Rui Machado Gomes & fragmentacgio das pertengas locais e de vizinhanga, tinha na educagao elementar a instituig&io capaz de precocemente transmitir a cultura nacional, glorificar os simbolos nacionais e assim criar uma uniformidade superadora dos grupos e cordens do Antigo Regime. Esta apreciagao da génese da escola de massas aceita alguns dos pressupostos da tese da escola-produtora-de- -cidadaos (Ramirez e Boli, 1987), que pode ser resumida a partir de trés eixos fundamentais: 0 seu papel é decisivo na construgao do Estado-nag4o; 0 seu papel na mobiliza- ao nacional antecipa o advento da industrializagao; a sua expansao mundial da-se segundo a mesma forma institu- cional. A construgao do Estado-nagao como projecto soberano unificado. Os Estados-nagao europeus adoptaram o modelo dos sistemas educativos estatais como estratégia de institu- cionalizagao de um conjunto de mitos que, no seu conjunto, definem 0 universo simbdlico da sociedade nacional: a nac&éo enquanto agrega¢ao de individuos; 0 progresso individual e nacional como visao linear do ciclo de vida dos individuos e de criagdo de riqueza das nacées; 0 Estado garante da seguranga da nacao. A batalha em torno do controlo da socializagao das criangas constitui um dos elementos mais importantes do processo de reforgo da jurisdigao do Estado. Durante dois séculos, 0 Estado moderno minimizou o papel da familia, da igreja e das comunidades locais na socializagao das criangas, no intuito de reforgar as ligagdes destas a uma autoridade central. A génese do campo burocratico estatal 6 © culminar de um processo de concentragao de diferentes formas de capital, do monopdlio da forga fisica ao monopdlio do capital simbdlico que, desse modo, definem um campo de poder e uma gramatica imanente a todos os sujeitos da nacao. Tal enquadramento das praticas pelo Estado inculca uma doxa perceptiva e disposic¢des do corpo comuns que asse- guram a integragao nacional. Integragao territorial, por inter- médio da centralizagao geografica - 0 aparecimento da capi- tal - e da representagao cartografica da unidade territorial; integragao econdémica, em virtude da criagao de um espaco econdmico nacional suportado pelos imposios; integragao lin- guistica, através da definigéo de um padrao escolar comum e a consequente redugao dos dialectos; integragao juridica, por forga da submissao do direito particular ao primado da lei e desta ao cédigo; integrago social, em virtude da abo- ligdo ou atenuagao dos privilégios de nascimento. A escola de massas 6 um dos principais suportes da criagao do dis- positivos de pertenga nacional e de ligagao simbdlica entre os individuos e o Estado. Simultaneamente, o reconheci- mento dos Estados-nagées no sistema inter-estatal mundial tem na expansao isomorfa da escola de massas uma fonte legitimadora imprescindivel (Meyer et a/., 1992a). Segundo estes autores, os atrasos e os fracassos nacionais resul- tam frequentemente em movimentos reformistas, nos quais as reformas educativas desempenham um papel fulcral Qualquer Estado que pretendesse entrar e ser reconhe- cido no sistema inter-estatal competitivo ocidental deveria adoptar os modelos sociais, econédmicos e culturais domi- nantes, ainda que na forma de politicas abstractas. Segundo este argumento, é a integragao do Estado-nacao no sistema mundial @ nos seus modelos de legitimacao da organizacao politica que explica as extraordinarias similitudes da expan- sao da escolaridade de massas e nao qualquer variabilidade nacional. Cruzam-se nesta argumentagdo duas tradigées tedricas A primeira, filiada no modelo da formacao do Estado moderno, sublinha a sincronia e o isomorfismo dos processos de for- magao do Estado e de construgado da escola de massas; a segunda, filiada nos modelos do sistema mundial, enfatiza a imposigao de modelos culturais transnacionais na propria for- magao dos Estados modernos. De qualquer modo, os dois modelos encontram-se de acordo quanto ao reconhecimento que fazem de uma ontologia da modernidade sustentada numa escola que garante a incorporacao da populacdo nos novos Estados-nagdes. Andy Green (1990), no seu estudo com- parativo dos sistemas estatais de ensino em Franca, Esta- dos Unidos, Inglaterra e Alemanha, conclui que os mesmos fendmenos que contribuem para a formagao dos estados modernos est&o na origem do desenvolvimento dos siste- mas escolares. Ameagas militares externas, necessidades de reconstrugdo nacional e programas de reforma contra o atraso econdémico teriam determinado a emergéncia de um Estado moderno, com o respectivo monopdlio da violéncia e dos impostos. Pelo seu lado, a escola estabeleceu o padrao de cultura nacional legitima, por intermédio do qual o Estado assimilou as culturas imigrantes, encorajou os valores patrié- ticos, generalizou as formas racionais de pensar e engendrou a identidade nacional. Em sintese, Green considera que 6 a natureza do Estado e dos seus processos de formagao que determina a cronologia e a forma de desenvolvimento dos A globalizagao da escola de massas 141 142 Rui Machado Gomes sistemas educativos, em especial o seu cardcter centralizado ou descentralizado. Em qualquer caso, o Estado pretendeu construir cada pessoa enquanto sujeito universal, mas {é-lo de forma diferenciada segundo a classe e 0 sexo: formou o cidadao responsavel, o trabalhador diligente, 0 contribuinte complacente, 0 jurado fidvel, o pai consciencioso, a esposa fiel, 0 soldado patriota e 0 votante escrupuloso ou submisso (Green, 1994: 10). Para os tedricos do sistema mundial, esta diferenciagaéo no explica a construgdo © expansdo homogénea da edu- cagao de massas. E a exposigao a uma integragao cres- cente dos paises no sistema mundial, em especial a partir do final do século XIX, por intermédio do comércio, dos tra- tados, da representagao diplomatica e das organizagées inter- nacionais, que est4 na origem do desenvolvimento isomorfo da escola de massas no ambito mundial. O que nao signi- fica que nao existam formas particulares de génese. Boli, Ramirez e Meyer (1985) identificam em especial dois mode- los escolares: aquilo que designam como 0 modelo de criagao de membros societais e 0 modelo de criagdo de membros do Estado-nagao. No primeiro caso, enquadram-se Os pafses que, tal como os Estados Unidos da América, tém uma estrutura de autoridade central relativamente débil, em favor de estruturas sociais menos centrais. No segundo caso, enquadra-se a maioria dos paises em que a escola se tornou o veiculo por exceléncia da criagao de vinculos de lealdade ao Estado, produzindo cidaddos cuja identidade primeira 6 a de aceitar as obrigacdes de votar, guerrear e pagar impostos. Daqui resulta uma conclusao matizada em torno ora da expansao do sistema escolar ora da expansao da retorica legal e institucional: a massificagao da escola deu-se mais tarde onde a consirucao estatal prevaleceu, em especial nos paises, como Portugal, em que dominou a cons- trugao retorica da escola de massas, caracterizada por uma proclamagao precoce do seu cardcter universal e por uma concretizagao real tardia. A mobilizagao nacional antecipa a industrializagao. A arti- culagéio da construgao dos estados e das escolas foi coeta- nea de um processo global que integra transformagdes mais vastas, nomeadamente o impacto da Reforma e da Contra- -Reforma, 0 estabelecimento de um sistema inter-estatal euro- peu © 0 triunfo da economia de mercado. Em conjunto, estas alteragdes combinaram-se num movimento que legitimou formas organizacionais, modos de acgao e discursos isomor- fos em toda a Europa do século XIX, instituindo a escola esta- tal como meio preferentemente escolhido de mobilizagao nacional. Em consequéncia, a expansdo da escola primaria de massas antecede e nao se correlaciona com os niveis de industrializagao e de urbanizacdo (Craig, 1981; Furet e Ozouf, 1976; Kaestle e Vinovskis, 1980; Ramirez e Boli, 1987): na maioria dos paises europeus e também nos Estados Unidos, existe mesmo uma associacao consistentemente negativa entre Os niveis de industrializagao e urbanizagao e as taxas de escolarizacao (Boli et al., 1985). Margaret Archer (1979) também milita a favor desta tese quando justifica o cresci- mento da oferta escolar na Franga dos estados a partir do pro- cesso competitivo entre eles e da auséncia de hegemonia de qualquer das instituigdes que os representavam, incluindo um Estado débil ainda em construcao. Embora exista uma quan- tidade apreciavel de estudos que demonstram como a esco- larizagao primaria e a escrita se encontravam em expansao mesmo antes de a revolucao industrial ter inicio, as mudangas tecnoldgicas e a acumulacao de capital teriam tido efeitos sig- nificativos na expansao da escola secundaria nos Estados Unidos pré-industriais. Neste caso, a escola e o mercado de trabalho parecem articular-se de modo funcional. Porém, a expansdo mantém-se independentemente das mudancas tecnoldgicas e das suas repercussGes na produtividade. Com efeito, a escolarizagéo secundaria cresce persistentemente, seja ela funcional ou nao para o desenvolvimento capitalista, por forga da légica prdpria das credenciais e do valor simbé- lico estatutério que estas prenunciam (Rubinson e Ralph, 1984), Expansao mundial isomorfa. A institucionalizagao da cida- dania na Europa difundiu-se no sistema mundial através da expansdo isomorfa de um modelo institucional unico e de uma cultura partilhada, independentemente das caracteristicas contraditérias dos sistemas politicos, do nivel desigual de desenvolvimento econémico ou das prioridades de politica social nos respectivos paises. Dai a expansao maciga da frequéncia dos sistemas escolares estatais desde o final da Segunda Guerra Mundial e a generalizagao da sua obrigato- riedade no primeiro grau. O isomorfismo seria o resultado de uma cultura transnacional de base escolar com o seguinte padr&o (Meyer, 1977): metas de desenvolvimento econémico nacional comuns; educagao para a cidadania entendida como mérito e responsabilidade; crenga no melhorismo dos indivi- duos e dos paises. A escola de massas é parte integrante A globalizagéo da escola de massas 143 144 Rui Machado Gomes deste projecto de exclusividade e indivisibilidade do poder do Estado por intermédio de uma aculturagao uniforme. A decla- racao dos principios de obrigatoriedade e universalidade da escola primaria, no primeiro quartel do século XIX, é, simultaneamente, acompanhada pela estabilizagao das suas principais garantias simbdlicas. Na transigao do século consolidam-se em definitivo as estruturas cognitivas que garantem o reconhecimento, legitimag&o e confianga na escola: alunos agrupados em classes de composigaio gra- duada e homogénea; espagos escolares exclusivos e sepa- rados que privilegiam a intervengao pedagdgica centrada na sala de aula; ritmos escolares didrios, semanais e anuais que permitem a regulagdio social do tempo; divisdo ¢ organizagao disciplinar do conhecimento, enquanto controlo estatal do tra- balho pedagégico; professores credenciados pelo Estado para, em nome do bem comum, serem mandatdrios do pro- jecto social politico da modernidade. Nesta perspectiva, poderia falar-se de uma escola de massas Unica, univer- sal, que 6 tanto mais imitada na sua forma quanto menos centrais © menos poderosos sao os respectivos paises no sis- tema mundial. Como ilustragao desta tese, tem sido argumen- tado quo a formagdo de novos estados africanos tem vindo a preceder a expansao da escola de massas nesses paises. Sendo ainda frageis e dependentes, os novos estados veem na escola a forma mais expedita de construirem as suas iden- tidades imaginadas, procurando, simultaneamente, legitimar- -se no sistema inter-estatal regional ou no sistema mundial. A escola representa, assim, 0 sistema mais visivel e reconhe- civel da modernidade e do progresso (Fuller, 1991). Porém, este processo nao é uniforme, apresentando combinacOes de adaptacao e resisténcia ao modelo escolar ocidental, moti- vada esta por fenodmenos religiosos, politicos e linguisticos, mormente os que sao determinados pelo conflito entre a Igreja e as elites seculares. Surgem assim sistemas educa- tivos duais, cindidos na prépria arquitectura institucional, que ora privilegiam o formato organizacional de tipo ocidental, ora preferem o formato recitativo-tutorial islamico (Morgan e Armer, 1992). A perspectiva genealdgica afasta-se deste modelo em trés pontos essenciais: na apreciagao que faz do papel do Estado; na apreciagao que faz das diferentes fases de desenvolvi- mento dos sistemas educativos, designadamente das fases de consolidagao e crise; na apreciagao da forma como as icas nacionais filtram as influéncias externas. A primeira divergéncia diz respeito ao foco de observagaio. Para compreender a emergéncia do modelo escolar, nao é apenas para o Estado que devemos dirigir a atengao analitica como fazem os defensores da hipétese do sistema mundial. O Estado deve também ser analisado, mas enquanto elemento integrante de uma montagem de tecnologias intelectuais e administrativas improvisadas para responder a desafios con- tingentes. A escola nao é a concretizagéo conseguida ou falhada de principios morais ou de um projecto fatalmente determinado por certas circunstancias histéricas, mas antes um arranjo justaposto, permanentemente actualizado, de dis- cursos, tecnologias ¢ principios disponiveis em cada momento que assim definem um jogo de dependéncias entre 0 que se faz @ 0 que se pode fazer ¢ delimitam o que se diz e o que se pode dizer. Afastamo-nos, pois, do historicismo que encon- tra na pratica politica do Estado um papel taumaturgico capaz de reduzir insignificancia 0 campo discursivo © de praticas em que opera. Apresentada como uma alternativa analitica a visao funcionalista de uma escola que tenta corresponder as necessidades de um especifico regime de acumulagao capitalista ao integrar as disrupgdes provocadas pela urbanizacao e pela industrializagao, substitui-a por uma visao hiper-funcionalista que a compreende enquanto cons- trugao social que reflecte a logica de o Estado-nacao produzir cidad&os e o sistema mundial criar subjectividades seme- lhantemente reconheciveis. A regularidade de um processo. nao implica necessariamente que ele esteja assente em prin- cipios ldgicos. A perspectiva genealogica que propomos far-se-a a partir da linnhagem analitica aberta pela governamentalidade. 4 governamentalidade (Foucault, 1991) provocou um movimento. em duas direcgdes. Por um lado, baniu os principios morais absolutos da esfera do governo, elaborando para tanto a dou- trina da razéo de Estado: a seguranca e a prosperidade do Estado passavam a ser fins em si mesmos. Por outro lado, definiu a esfera da consciéncia individual como esfera de governo: cada sujeito devia escolher livremente as suas pre- feréncias, por intermédio de um exame racional de principios morais concorrentes. Estes dois movimentos articularam-se na forma que hoje conhecemos como escola de massas. O desenvolvimento de uma nova racionalidade de govemo da escola esté ancorado na alianga de duas tecnologias poli- ticas e intelectuais com origem histérica diversa e aparente- mente contraditérias: a tecnologia pastoral cristé de governo A globalizagao da escola de massas 3. Para além do Estado: a emergéncia de uma socie- dade governa- mentalizada 145 146 Rui Machado Gomes das almas e a tecnologia burocratica do Estado de governo da populagao (Hunter, 1994). A primeira, inspirada nas dis- ciplinas espirituais de governo do eu, especialmente a con- fissAo, tem expresso na relacao pastoral do professor com 0 aluno, na sua particular mistura de vigilancia e auto-exame, exemplaridade e auto-desvelamento, obediéncia e auto-refle- xo, controlo e auto-vigilancia. Na tradicao das disciplinas espirituais, a relagao pedagdgica contemporanea da origem a problematizacao ética individual e a auto-responsabilizacao. O conceito de praticas éticas distingue-se aqui do dominio da moral que define sistemas universais de obrigacao e inter- dicdo. A ética refere-se a tipos especificos de prdticas que fazem de cada um 0 sujeito proprio de atengao e solicitude. Entre outras tecnologias, o exercicio escolar estabelece um novo contexto para o desenvolvimento das técnicas corpo- rais, por intermédio de regimes moleculares que regem o movimento no tempo e no espago. O exercicio escolar filia-se na tradigao das disciplinas ascéticas monasticas e nao se funda em principios, mas em praticas de disciplina cujo objec- tivo é criar pessoas capazes de orientar-se por principios. Os exercicios da vida ascética constituiam tarefas de complexi- dade crescente que permitiriam a aquisigao progressiva do saber e da boa conduta no caminho da perfeigao. A imagem da técnica espiritual, 0 exercicio escolar permite uma regu- lag&o permanente do individuo por si proprio e pelos outros As tarefas repetitivas, mas de complexidade crescente, des- tinam-se a produzir atitudes individualmente caracterizadas mas de utilidade colectiva. Embora Foucault (1975) enfatize no exercicio escolar a orientagao do mestre exemplar, que desse modo impde um aperfeigoamento autoritario do aluno, parece imprescindivel ver também o lado de auto-reflexdo © de auto-regulagdo que este permite. Philippe Ariés (1973) situa-nos claramente nesse outro lado quando se refere a0 papel da leitura silenciosa na consolidagao das praticas de reflexao solitaria. Com a Segunda Reforma, iniciada pelo piotismo, a relago individual com a Biblia 6 uma exigéncia nos paises de tradigao protestante, tornada universal quando os Estados passam a ter a exclusividade dos programas esco- lares. Por outro lado, as tecnologias de calculo e governo da populagao respondem a necessidade de governar um sistema de educagao de massas, por intermédio da problematizacao das capacidades das geracdes mais novas da populacao. A nog&o de economia descentrou-se da familia para revelar as regularidades da populacao: as estatisticas dos mortos, das doengas ou dos ciclos de escassez revelavam os efeitos agre- gados da populagao e a sua irredutibilidade a familia. O exame constitui a tecnologia disciplinar que, no contexto escolar, estabelece a arte de governar a populagao e, simul- taneamente, estabelece as estruturas cognitivas que tornam aceitavel e necessdrio pessoas calculaveis (Hacking, 1986). Segundo Foucault (1975), o exame 6 introduzido na escola do século XVIII, com profundas repercussdes no modo como a mente ocidental organiza e trata o conhecimento. O exame estabelece um novo contexto para o desenvolvimento das téc- nicas intelectuais da leitura, escrita, memoria e cdlculo. Apesar de o exame ja existir anteriormente em instituigdes univer- sitérias medievais, na forma oral e nao graduada (Hoskin, 1979), 6 no século XVIII que se desenvolve na sua forma modema de exame escrito graduado, O exame moderno mani- festa um novo poder da escrita. Em primeiro lugar, porque converte 0 aluno num campo onde 0 conhecimento deve sor vazado e difundido; em segundo lugar, porque torna possivel a constituigdio de um arquivo escrito sobre a performance indi- vidual do examinado e a sua posigao relativa numa populagao de examinados; em terceiro lugar, porque estabelece a norma da populagao escolar e respectivos desvios. A consolidagao desta tecnologia permite que a aprendizagem se faga hoje sob um regime de escrita, exame e graduagao e a sociedade se organize segundo um regime de produtividade e perfor matividade. Um novo complexo de saber-poder se constituiu com a possibilidade de estabelecer, pela primeira vez na his- toria, uma medida objectiva do valor humano. Durante muito tempo, 0s comportamentos individuais estiveram ao abrigo da descrigéo. Gonhecer 0 valor de cada um, por intermédio da sua historia de vida, estava reservado a um restrito grupo social. Em todo 0 caso, as narrativas de vida visavam cons- tituir uma memédria-monumento. Doravante, n&o se tratava mais de constituir um «monumento para uma memoria futura, mas um documento para uma utilizagao eventual» (Foucault, 1975: 193). O homem memoravel da lugar ao homem cal- culavel. A argumentagao sobre a génese dos sistemas estatais de massas nos séculos XVIII e XIX 6 convincente. Porém, a uti- lizag&o do mesmo esquema de analise para a fase de conso- lidagaio e crise da escola parece empobrecedora e incapaz de captar tanto as diferencas que abalam a sua legitimidade A globalizagao da escola de massas 4. Génese, expansao e crise da escola de massas 147 Rui Machado Gomes @ hegemonia como as diversas respostas institucionais nacio- nais. Como sugere lan Hunter: A uniformidade relativa da escola modema é determinada por um facto decisivo diferente, embora relacionado: 0 facto de que as tecnologias administrativas e espirituais com que as sociedades curopeias podiam contar para desenvolver a escola como instru- mento de governo eram bastante escassas e, por conseguinte, igualmente invariantes. (Hunter, 1994: XVII) Nesta perspectiva, vale a pena notar que a manutengao do isomorfismo relativo da escola nao se deve a sua parti- cular eficdcia ou ao seu valor préprio, mas antes ao facto de nao poder ser substituido sem o recurso a outros elementos externos constitutivos que poriam em causa os consensos entretanto obtidos (Tyack e Tobin, 1994). A constituigao de uma instituigdo 6 sempre baseada em convengdes que excluem algo e assim estabelecem uma hierarquia entre os polos resultantes. A naturalizagao social da escola, que a tornou racional ¢ razoavel, foi a expresso da sedimentagao de um conjunto de praticas e de discursos cujo caracter con- flitual foi anulado. Muitos dos padré6es comummente aceites @ institucionalizados foram de facto criagdes que responde- ram a tensées sociais complexas e que sdo presentificadas como parte da realidade social de todos os dias, pressupos- tos nao questionados da sua linguagem, que orientam a cons- ciéncia pratica. Perspectiva diferente é a dos autores que se situam na visao estatista da escola. Ao descreverem os mitos que estao na origem desta, incorporam-lhe um significado cogni- tivo silencioso que se autopreserva e cristaliza numa origem perpétua. Assim, os discursos da virtude civica republicana, dos direitos individuais da jurisprudéncia liberal, dos inte- resses e dos ajustamentos estratégicos da economia liberal, ou, ainda, das técnicas diplomaticas e militares das relagdes internacionais, poderiam ser sempre interpretados a luz de uma relagao causal entre indicadores institucionais cons- truidos pelo préprio Estado. A atengcao selectiva que estes autores dedicam aos aspectos quantitativos da expansao da escola, ignorando assim a sua elaboracao qualitativa, for- nece-nos a teoria implicita subjacente; como o processo € universal, as diferengas sistémicas séo apenas remanescen- tes. Por outras palavras, o determinismo global do modelo cultural do Estado-nagao concede pouco espago as contin- géncias locais. Ora, no espago publico da luta politica, cada discurso pode coexistir, resistir ou desaparecer na sua relagéo com outros, desenvolvendo para tanto metadiscursos que no sao captaveis por intermédio de regimes de enunciagao unicos e codificados. O conceito de regime de enunciagao (Foucault, 1969) permite identificar enunciados dispersos e hetero- géneos, embora relacionados por uma pratica discursiva semelhante. A distancia de enunciagao no interior de um conjunto de discursos nao autoriza formas codificadas de 0 fazer, seja através da correlagdo ou da relagao causal, porque estas tomam as categorias construidas como repre- sentando uma realidade discursiva é institucional petrificada, quando a flutuagao é a sua principal caracteristica. Este conceito parece particularmente adequado a critica de uma visdo excessivamente cognitivista do modelo escolar, cen- trada nos mitos da cultura ocidental. Na verdade, a abor- dagem dos institucionalistas esta ancorada no seguinte pressuposto culturalista: as politicas nacionais, incluindo as politicas educativas, longe de serem estabelecidas com autonomia no nivel nacional, sao, na esséncia, versées de narrativas conformes e legitimadas pelos valores, culturas e ideologias-mundo. Dentre as narrativas culturais mais mar- cantes da cultura-mundo encontram-se as da racionalidade, do progresso, da igualdade, do individualismo e da justiga. A extensao e 0 folego de tais narrativas tendem a subsumir no seu interior as clivagens que as atravessam, deixando pouco ou nenhum espaco para 0 conflito entre valores. Con- flito que da origem a regimes de enunciacao dispersos e heterogéneos. Isso mesmo parece ser implicitamente reco- nhecido pelos autores que, em diferentes ocasides, sublinham a débil relagdo entre o vinculo formal aos valores e as prati- cas e politicas reais: Existe apenas uma relacao debil entre as formas organizacionais e as necessidades praticas € os objectivos que operam nas situagées locais. Neste sentido, as estruturas organizacionais oci- dentais devem ser entendidas mais como promulgagées rituais de prescrig6es culturais globais do que como respostas a pro- blemas conoretos. (Meyer et al., 1987: 32) Mas, enquanto estes autores véem na desarticulagéo referida uma promulgagao ritual de prescrigdes culturais abs- tractas sem um centro, nés entendemos que ela é resultado dos processos de recep¢ao cultural, especificos a cada pais, dependentes entre outros aspectos da posigao relativa de um A globalizagao da escola de massas 149 150 Rui Machado Gomes 5. Modelo transnacional unico? dado Estado no espacgo mundial. Sugere-se, assim, que os sistemas educativos sao regulados por um conjunto de formas institucionais que através de normas, valores e formagées culturais especificas asseguram a difusao hibrida do modelo da escola de massas. Roger Dale (1999) é um dos autores que tem vindo a desenvolver esta perspectiva, apresentando seis formas institucionais basicas de as politicas nacionais filtrarem as influéncias externas: 0 mecanismo da aprendi- zagem, 0 mecanismo da harmonizacao, a disseminagao, a estandardizagao, a imposi¢ao e a interdependéncia. Desen- volveremos em seco prépria esta proposta analitica. terceiro tema de discordancia diz respeito ao tipo de andlise que é feito do sistema mundial. Partilhamos da ideia segundo a qual os Estados-nagéio apenas em parte sao enti- dades auténomas operando, no restante, num quadro de grande isomorfismo cultural. A economia capitalista mundial constituiu centros e periferias envolvidos na divisdo internacio- nal do trabalho e na concorréncia econémica e militar. Nosse processo, institucionalizaram-se mitos universalistas que sao © seu principal sustentaculo numa realidade de muitos parti- cularismos que s&o 0 seu inevitavel obstaculo. Estudos com- parados dos sistemas politicos europeus realizadas nos ulti- mos anos propdem uma visdo bem mais matizada desta pro- blematica. A Europa das identidades regionais (Scardigli et al. 1993) e das micro-ideologias (Todd, 1990) constitu fre- quentemente um contraponto da integracéo supra-estatal, pondo a nu a descoincidéncia entre a integragao promovida pelo enquadramento juridico e institucional e a fragmentacao infranacional dos territ6rios, das culturas e das linguas (Char- pentier e Engel, 1992). Em qualquer caso, a ideia de causa- lidade complexa e de desvio em relagdo 4 dependéncia estrutural do sistema mundial sai reforcada. Como € pos- sivel articular teoricamente a Optica do sistema-mundo feito de homologias, com o comparatismo que reconhece grande variedade social e organizacional entre diferentes Estados- -nagao? Essas diferengas sao verificaveis na distancia rela- tiva da escola a regulacdo estatal e as organizagdes econd- micas (Archer, 1979); no grau em que cada um dos termos do binémio ordem social-liberdade individual sao salientados na formacao da identidade nacional (Tyack, 1966); na exis- téncia de sistemas de educacao unificados ou dualistas que oferecem fileiras de prestigios e certificados desiguais (Torres et al., 1993); na articulagao entre o grau de centralizacao dos sistemas educativos, a estrutura de classes e os regimes politicos (Archer, 1979; Collins, 1979); no desenvolvimento desigual da expansao das taxas de escolarizagao; no modo como as minorias étnicas sao separadas ou assimiladas pelos sistemas educativos estatais. Diante de tantas diferengas, parece excessivo continuar a argumentar com base nas homologias que, embora exterio- res ao sistema nacional, nao deixam de exercer um papel fun- cional no esquema tedrico proposto. Com efeito, se, por um lado, o argumento das necessidades de ordem social ou de reprodugao das classes, geradas por processos endégenos aos Estados-nacao, é ultrapassado, por outro lado, o avango para o nivel de andlise transnacional consagra uma dptica predominantemente ontolégica que 4 partida se pretendia superar. A mao invisivel da economia da lugar @ mao invisivel do sistema mundial capaz de fazer aderir os novos Estados- -nagdo a ideologia do progresso e a racionalidade cientifica por intermédio da escola de massas, 0 que nos conduz para um modelo global-integrador que anuncia o fim da histéria. Trata-se de uma forma de pensar a escola apenas a partir da oferta, dentro do discurso e dos mitos do Estado e do sistema interestatal, com os seus instrumentos e conceitos, tendo dificuldade em captar todos os niveis do jogo, em par- ticular os do lado da procura de educagao. No conjunto de estudos que vimos analisando, os auto- res correlacionam as taxas de expansao da escola primaria, secundaria e tercidria de massas com a representacao poli- tica formal; a participagao politica; a modernizagao politica; a centralizagao estatal; 0 tamanho da burocracia estatal; a data de independéncia; e a fragmentagao etnolinguistica (Meyer et al., 1992a). Nestes estudos 0 significado da expan- 880 da escola é reificado na sua prépria historia social, por meio de um dispositivo que trata acontecimentos contingentes como esséncias que podem ser retiradas do seu contexto e apresentadas como um padrao estatistico. Dai resulta um efeito de agregacao estrutural que passa a restringir ou a ampliar os acontecimentos singulares dentro de uma légica de circularidade teérica. Esta forma de enunciar o problema 6 inapropriadamente funcionalista para estudos que preten- dam verificar variancias e nao confirmar invariantes. E isto porque estudam tacitamente a escola do lado dos que tém O poder de, através da estrutura, definirem as condicdes formais de um determinado programa de accgao — centrali- A globalizagao da escola de massas 151 152 Rui Machado Gomes zaco estatal; autoridade educativa; legislagdo sobre edu- cago obrigatoria, etc. — e, ao fazé-lo, tomarem a estrutura de dominacao, para efeitos de investigacao, como um dado duradouro, uma variavel independente que nao esta sujeita a conflitos e lutas que redefinam o préprio campo estrutu- ral. Um dos aspectos mais expressivos deste funcionalismo. consiste na utilizagao da varidvel fragmentagao linguistica enquanto variavel independente, quando se sabe que a glo- balizacaéo e aprofundamento de certas comunidades linguis- ticas, a par da correspondente restrigao de outras, foi um dos aspectos em que a escola estatal mais se envolveu, contri- buindo assim para a reprodugao, expansao e contracgdo de populagées e zonas linguisticas durante o processo de cons- trugao dos Estados-nacao. Apesar dos importantes contributos analiticos desta cor- rente para a compreensao da heterogeneidade de elemen- tos que fundam a escola de massas, pressente-se a procura da causa global, dos fundamentos ultimos que explicam a esséncia do fendmeno, contraria & nossa démarche analitica centrada na busca das condigdes de possibilidade de certas praticas e dos discursos que tém um efeito positivo na cons- trugao da escola. No final desta busca da esséncia, encon- tram estes autores a universalizagao do modelo escolar e o monopdlio do Estado como lugar de universalidade ao servigo do interesse geral (Ramirez e Rubinson, 1979: 79). Quando as ciéncias sociais subestimam as profundas assimetrias e dualismos que coabitam nos sistemas educativos mundiais, especialmente na periferia e semiperiferia, correm o risco de contribuir para 0 esforgo de construgao da representago uni- versalizante do Estado. Os trés exemplos seguintes ilustram a presenca das representagdes homogeneizantes do Estado e do sistema-mundo nos estudos destes autores. A utilizagao das taxas de inscrigao como medida da expan- so dos sistemas educativos produz um enviesamento aditivo, por que se sabe que as taxas de frequéncia real dos presen- tes, as taxas de finalizagao do ciclo escolar e as taxas de aban- dono fornecem uma aproximagao mais valida dos desnivela- mentos sociais de acesso & educacao. Vai no mesmo sentido a agregacao das taxas de inscrigao no ensino secundario, apesar da evidéncia generalizada de que muitos paises ofe- recem fileiras de prestigio e certificado desiguais para grupos sociais diferentemente colocados na hierarquia social. A nao utilizagao das caracteristicas sociais dos alunos que frequen- tam cada uma das fileiras invalida a conclusao dos autores segundo a qual a classe social néo afecta a expansdo da escola de massas. O uso agregado dos dados referentes a grandes regides ou continentes nao parece adequado a uma andlise matizada do sistema mundial, visto que no seu campo tedrico se reco- nhecem as assimotrias entro paises dentro da mesma rogiao ou continente (Wallerstein, 1982, 1991) ¢ as préprias agéncias internacionais tém desenvolvido uma pletora de novos con- ceitos e sub-categorias estatisticas (Novos paises industria- lizados, Paises subdesenvolvidos, Paises em transigao, etc.) que consagram a sua hierarquia crescente. As séries tem- porais de efectivos escolares nao sao directamente utiliza- veis no estudo da expansdo da escola, senao na presenca de invariancia da correspondéncia entre formas de escolariza- a0 e categorias estatisticas. Um exame superficial destas mostra que tal s6 pode acontecer a custa de processos de agregacao e manipulagao completamente arbitrarios (Briand et al., 1979) A utilizagéo das categorias curriculares nominais como base da comparacao internacional também parece desa- dequada quando se pretende verificar 0 que realmente se ensina em cada sistema educativo. Num dos seus mais recentes trabalhos, Meyer e colaboradores (1992b) levaram a cabo um interessante projecto que visava comparar os modelos e as categorias curriculares no ambito mundial no. século XX. Para tanto, procederam & recolha de dados refe- rentes a composicao curricular e as cargas hordrias respec- tivas, concluindo que existe um grau surpreendente de homo- geneidade curricular em todos os paises analisados. A expli- cago encontrada pelos institucionalistas para este fendmeno de estandardiza¢ao centra-se, antes de mais, nos processos de legitimagao. Estes parecem ser autogerados, como é sugerido em diversos textos: A escolarizagao aconteceu na Suécia porque aconteceu na civi- lizago ocidental. © mesmo pode ser dito de outro qualquer pais euro-americano neste periodo: a escolarizagao aconteceu ali porque acontecera jé em outro qualquer lugar. (Boli, 1987: 73) O processo de legitimagao seria do tipo recursivo: os Esta- dos adoptariam politicas semelhantes, tais como as catego- rias curriculares, na procura de legitimago externa e, por sua vez, aquelas obteriam a sua propria legitimidade a partir da autoridade dos cientistas e dos especialistas que represen- tam e incorporam os valores da modernidade ocidental — A globalizacéo da escola de massas 153 154 Rui Machado Gomes sendo certo que esta autoridade resulta menos da influéncia dos cientistas como grupo do que da Ciéncia enquanto ver- dade universal. As condigdes da difusao mundial de um modelo cultural Unico assentariam, portanto, em dois pilares: nas organizagées internacionais, mormente nas que tém uma participaco universal potencial (McNeely, 1995) e nas comunidades cientificas. Numa interessante andlise critica desta teoria da circulacao legitimatoria, que nos leva sempre do mesmo ao mesmo, Roger Dale (1998) sugere que, nos seus pressupostos, a legitimagao parece ser um processo espontaneo que prescinde de explicagoes e actua por osmose. Na verdade, tanto o pilar das relagdes internacio- nais quanto o pilar da racionalidade cientifica sao tratados em termos estritamente cognitivos: a andlise dos modelos contraditorios e das relagoes assimétricas nas diversas organizag6es internacionais 6 desprezada, bem como o papel das condi¢ées politicas internas na conversao de uma certa racionalidade cientifica em tecnologias de governo. Daaui resulta um apagamento dos processos historicos sub- jacentes, em especial os que dizem respeito as estraté- gias de pressao, de imposicao e de ajuda orientada que algumas agéncias internacionais, designadamente a Unesco e o Banco Mundial, usam como formas de difuséo das suas politicas. Sao os proprios autores que introduzem, justa- mente, alguma prudéncia metodolégica, quando sublinham, no prefacio ao livro School Knowledge for the Masses, a seguinte ressalva: Os nossos dados so forgados e limitados ou superficiais. Sabe- mos se um dado pais incluiu ou nao uma certa categoria c ricular, bem como o grau de importancia que the atribuiu. Nao sabemos 0 que a categoria significa nesse pais [...], nao sabe- mos como e se a categoria tem diferentes significados ou formas de concretizagaéo quanto a criangas de diferentes classes, etnicidades ou sexos. (Meyer ef al., 1992: XI-XII) Todavia, esta prudéncia nao tem consequéncias eviden- tes nos pressupostos tedricos dos institucionalistas. Na ver- dade, os autores reforgam sempre as condigées do difusao iniciais, desprezando 0 modo como os diferentes formatos orga- nizacionais reconfiguram as mensagens que Ihes chegam, 0 que é particularmente intrigante para quem, como os institu- cionalistas, sublinha nas suas hipéteses tedricas 0 importante papel mediador daqueles na filtragem e institucionalizagao das politicas (Dale, 1998) Com 0 modelo explicativo da institucionalizacao da escola no sistema mundial, tem-se a impressao de um processo har- monioso que conduz todas as sociedades para uma maior complexidade ¢ capacidade adaptativa. A difusdo 6 0 pro- cesso dominante: valores circulam dos paises mais desen- volvidos para os menos desenvolvidos; as pressdes e incom- patibilidades entre varios subsistemas no seio do sistema mundial obrigam os novos estados a integrarem-se na logica do sistema interestatal. As contratendéncias sao conside- radas menores e nao impeditivas do desenvolvimento do fendémeno. A apreciagao que os autores fazem sobre a expansao da escola no ambito mundial fundamenta-se na difusao do nacionalismo e do individualismo como pilares dos estados modernos. Ambos teriam propriedades essenciais e substan- tivas que fariam deles universalia da modernidade. Esta linha geral de interpretagao propde uma dptica que é fundamental contrastar: 0 nacionalismo vale menos pela orientacao progra- matica, substantiva, que estabelece do que pelo efeito prag- matico que resulta da construcéo de comunidades imagina- das (Anderson, 1983). Conforme é evidenciado pelos préprios autores (Ramirez e Boli, 1987), sem que dai retirem as ilagoes necessatias, a nagéo é uma construgao plastica que objec- tiva a relagdo singular, pragmatica, com a religiao, os costu- mes, a tradig&o e 0 ancestralismo. O nacionalismo enquanto fendmeno historicamente transversal 6 menos uma proprie- dade substantiva do que, preferentemente, um principio de orga- nizagao social que usa vérias feigdes da diferenga humana para criar fronteiras entre comunidades. Pressupor que a maior ou menor énfase nos grupos sociais intermédios ou o grau de fragmentagdo etnolinguistico sao indicadores de naciona- lismo é postular a existéncia de um quantum, definido pelo padrdo ocidental, necessdrio ao sou estabelecimento. As perspectivas institucionalistas nao est&o isentas de obstdculos e armadilhas. Desde logo obstaculos epistemols- gicos: existe uma ortodoxia de pensamento inculcada nas diividas, polémicas e verdades do tempo do préprio investi- gador. Armadilhas metodolégicas, também, decorrentes do fendémeno de auto-referencialidade dos sistemas politicos nacionais e mundiais: as matrizes mentais a partir das quais estes se descrevem, explicam e justificam, validando-se, fazem elas proprias parte do sistema. Deste modo, existem sempre, no minimo, dois niveis de leitura dos fendémenos sécio-histéricos que derivam da analise do momento des- A globalizagao da escola de massas 155 156 Rui Machado Gomes critivo-legitimador do sistema e do seu momento constitutivo- -reflexivo. Os factos estdo polvilhados de palavras e de proce- dimentos magicos que parecem dispensar a prova ulterior, porque inscritos nos limites de consciéncia dos actores pre- sentes e, neste sentido, sao simultaneamente fonte e quase- -produgao sociografica. Importa, pois, ter cautelas metodol gicas daqui decorrentes, a primeira das quais consiste em nao tomar os discursos enquanto simples descritores da realidade, Porque sao eles prdprios que constituem as categorias da rea- lidade de que falam. Uma sociologia dos factos educativos apenas pode ser pensada na medida em que sejamos capa- zes de pensar a propria linguagem que os evoca. A utilizacao acritica das estatisticas e das categorias insti- tucionais constitui uma forma tipica de armadilha metodold- gica. Plasmada na enumeracao e nas estatisticas das pessoas e dos seus comportamentos, emerge a representacao social de pessoas calculaveis num contexto de indeterminagao. A administragao dos Estados-Nagées classifica e inscreve em tabelas e estatisticas, tanto mais, quanto maior é a indeter- minagao da situagao. A avalanche de numeros e de estatis ticas corporiza novas classificagdes de fendmenos sociais numa linguagem e num vocabulario que capacitam um novo tipo de intervengao das tecnologias administrativas do Estado. As técnicas de inscrig&o e acumulagaéo de factos sobre a populagao, a economia nacional, a doenga ou a pobreza nao se limitam a descrever a realidade mas constituem espagos imaginados, delimitados por uma grelha de normas onde a administragao pode intervir. Pasquale Pasquino (1978) no seu trabalho sobre a genealogia do capital enumera as tarefas de policia apresentadas por Obrecht e Von Justi nos tratados de governo alemaes dos séculos XVII/XVIII: informagao fixada em quadros estatisticos sobre o estado das populagdes e do territdrio, nomeadamente no que diz respeito ao numero de pessoas, de nascimentos e de mortes, crimes, actividades econdmicas e outros recursos; um Conjunto de medidas que permitisse o aumento da riqueza da populagao e o aumento dos recursos financeiros do Estado; finalmente, a felicidade da populacao. Obrecht resumia estas fungdes na formula latina census e censura, que significava 0 dever de cada um pagar as suas taxas e de os poderes publicos cuidarem da vida de todos e de cada um. Para ser exercido, o poder precisa de saber. Em contraste com a antiga sociedade de ordens, a populagao demarca um territrio com novas divisdes sustentadas em racios de mortes, nascimentos e idades. Ao separar os individuos em unidades especificas, ainda que abstractas, que podem ser calculadas, organizadas e problematizadas, as praticas de governo, sustentadas pelo conhecimento das ciéncias sociais, articulam o Estado com a consciéncia individual. Como subli- nha Foucault (1994: 29): Uma das grandes novidades nas técnicas de poder, no século XVII, foi 0 aparecimento, como prablema econémico e politico, da “populacao”: a populacao-riqueza, a populacéio-mao-de-obra ou capacidade de trabalho, a populagéo em equilibrio entre o seu crescimento préprio € os recursos de que dispde. Os governos apercebem-se de que nao estdo apenas diante de subditos, nem sequer de um povo, mas de uma “populacao”, com os seus fend- menos especificos e as suas varidveis proprias: natalidade, mor- bilidade, duracao da vida, fecundidade, estado de sade, frequén- cia das doengas, forma de alimentagao © de habitat. (Foucault, 1994: 29) Uma vez que 0 governo 6 concebido nos termos da gestao 6ptima de um territrio e da sua populagdo, a sua intervencao 6 multiplicada por uma infinidade de dominios, da seguranca a satde © a disciplina moral, cada um dos quais é crescen- temente controlado pelo seu proprio pessoal especializado. Um dos aspectos deste problema econémico e politico da populago 6 a educagAo escolar. E preciso saber o numero de inscritos e a sua idade, o ntimero de escolas e a sua loca- lizagao, 0 tipo de escolas e os métodos utilizados, o numero de professores e a sua qualificagao. Através das estatisticas escolares forma-se um sistema normalizado e periddico de recolha de informagoes sobre a situagdo da rede escolar. Nestes termos, a administragao estatal deve ser entendida como a tentativa de optimizar os varios dominios de governo, por intermédio de conhecimentos especializados, e nao como 0 exercicio de um mandato moral ou legal. O estado actual da investigacéo comparada nao auto- fiza a conclusao segundo a qual a convergéncia do sistema mundial se dirige para um modelo universal e muito menos que esse modelo significa a sua ocidentalizagao (Schriewer, 1998). Na sua revisao de literatura, Schriewer serve-se da mesma estratégia sugerida pelos trabalhos do Eisenstadt (1992) na pesquisa comparativa sobre a modemizagao. Uti- lizando as conclusdes acumuladas polos estudos de politica comparada e de sociologia das organizagdes comparada, ele A globalizagao da escola de massas 6. Estruturas nacionais variantes 157 158 Rui Machado Gomes apresenta trés campos em que se observa variabilidade inter- nacional suficiente para contrastar a suposta racionalidade universal, quer da educagao, quer do industrialismo: (a) arti- culagao entre as politicas de emprego e as politicas educa- tivas e sociais; (b) conexdes entre a educacao vocacional, as estruturas de qualificagao do emprego e os modos de orga- niza¢gao do trabalho; (c) conexGes entre educacao, moderni: zagao e desenvolvimento.' Quanto as relacées entre as politicas educativas e as politicas de emprego, Schriewer apresenta um conjunto de estudos que contrariam os pressupostos das teorias macro-economicas. Segundo estes, a exposicéo a um envolvimento econdmico global resulta em principios de racionalidade econémica idénticos, enquanto alguns estudos comparativos demonstram que, embora a pressao para o incremento da produtividade seja global, as estra- tégias de inovagao industrial e de regulagao do mercado de trabalho sao claramente divergentes (Sabel et a/., 1987). No interior desta mesma orientagéo comparativa foram des- critas variagdes significativas dos modos de organizagdo econdémica, mesmo entre os paises mais desenvolvidos (Goldthorpe, 1984; Kumon e Rosovsky, 1992). Variabili- dade que tem repercussées evidentes sobre os diferentes caminhos seguidos pelos sistemas educativos e de for- magao (Turner e Auer, 1992). Conclusées similares foram descritas quanto as articu- lagdes entre educacao, qualificagdes dos empregos e modos de organizagao do trabalho. Contrariamente aos pressupos- tos da teoria do capital humano que, em larga medida, sus- tentam a equagao escolar da modernizagéo — inovagéo tecnoldégica + desenvolvimento econémico = mudanga das estruturas de formagao —, uma extensa bibliografia compa- rativa tem revelado como os sistemas educativos apresen- tam variantes devidas a factores societais e culturais (Iribame, 1989), a padrées diferenciados de organizagao do trabalho (Sorge e Warner, 1987) ou, ainda, a cultura empresarial nacional (Hofstede, 1986) * Estas referéncias assumem particular importancia na andlise das articula- ‘G6es discursivas entre educacao, mercado de trabalho e desenvolvimento, em Portugel, durante toda a década de 80. Realizada em tomo do lugar-comum da modemizagao, essa analise apresenta convergéncia formal com os padroes dos paises centrais, mas revela perfis nacionais muito diversos em face da dinamica econdmica ¢ dos modelos de especializagao e organizagao econd- mica nacionais, Finalmente, as relagdes entre educacao, modernizagao e desenvolvimento revelam uma maior disponibilidade para a variagao nacional do que as andlises orientadas pelo modelo do sistema mundial fazem crer (Chabbott, 1997). Na verdade, em cada uma das dimensées relevantes para a legitimagao das politicas nacionais no sistema interestatal das organiza- Ges internacionais* — todas elas ancoradas numa cultura mundial que enfatiza o progresso e a justig¢a —, as conexdes sao débeis, problematicas e disfuncionais, embora se reco- nhega que as anomalias tendem a ser justificadas nos termos dos principios culturais mais globais. E isso que explica o paradoxo de, nao obstante a incapacidade de a investigacao estabelecer um nexo de causalidade entre educacao e desen- volvimento, os projectos de educacao para o desenvolvimento continuarem a marcar a agenda das organizagdes interna- cionais e das suas declaragGes de intengdes. Todos os dis- Positivos de isomorfismo educativo, sejam eles a coergao, a imitagdo ou a normatividade, se orientam no sentido de supe- rar OS particularismos nacionais e a variagao das condigées intranacionais que nao permitem uma aplicagao linear dos seus principios (Fagerlind e Saha, 1985). A utilizagao de grandes narrativas explicativas dos fend- menos mundiais tem resultado invariavelmente em um de dois efeitos: ora na redu¢do das variantes nacionais a simples fendémenos de inércia residual, ora na impossibilidade de estes se deslocarem do exotismo empirico para o campo da elaboracao tedrica. O dominio das ciéncias sociais compa- rativas por parte das grandes organizagées internacionais e das comunidades académicas dos paises do centro, que assim estabelecem um sistema internacional de comuni- cacao, financiamento da investigagao e publicag&o (Altbach, 1994) sao um aspecto particular da legitimagao universalista dos sistemas educativos que se reproduz também por meio da auto-representagao cosmopolita que estas comunidades estabelecem para si préprias, de tal sorte que amplificam a validade dos sistemas conceptuais, 0 poder de descricao das classificagdes estatisticas e a difusdo dos padrées de quali- dade usuais nas organizagoes internacionais. Deste modo, 2 No que a educacao diz respeito, podemos identificar as sequintes fontes de legitimagao no sistema interestatal das organizagGes intornacionais: desen- volvimento econémico, produtividade individual, crescimento econdmico nacio- nal, desenvolvimento cultural, democracia politica, modernizagao das atitudes € dos valores, desenvolvimento do conhecimento ¢ do curriculo, democratizagaio politica e integragao nacional A globalizagao da escola de massas 159 160 Rui Machado Gomes estabelece-se uma pressdo de adaptacao referenciada a um padrdo de investigacado e de reforma da educacao a nivel mundial, tanto mais eficaz quanto nao é percebida como tal (Hifner et al., 1987). Neste contexto de alianga entre o sis- tema cientifico hierarquizado, a infra-estrutura internacional de publicagdes e a programatica da educacao a nivel mundial (Schriewer, 1998), precisamos de mais estudos comparati- vos através do método do contraste, desenhando pesquisas em que o fenémeno a ser explicado e as hipdteses causais sejam testados em casos em que ambos estejam ausentes, embora sejam tao similares quanto possivel nos restantes fac- tores. A tipologia que Roger Dale (1999) apresenta para estu- dar os mecanismos através dos quais os efeitos externos se fazem sentir nas politicas nacionais parece ser particular- mente adequada a este objectivo. O autor compartilha da tose segundo a qual so factores globais que afectam as politi- cas nacionais. Contudo, recusando a mao invisivel da globa- lizagéo, considera que esta actua de formas muito variadas e enuncia a natureza e a extensao de tal influéncia. A princi- pal tese que subjaz & tipologia 6 a de que 6 a forma tomada pelo mecanismo de influéncia que define a natureza do efeito, quer dizer, a forma como a mensagem 6 enviada tem auto- nomia propria no contetido da mensagem. Os mecanismos de influéncia apresentados sao sete: imitagéio, aprendizagem, harmonizagao, disseminacao, estandardizagao, interdepen- déncia e imposig&o. Os ultimos cinco sao considerados como especiticos do efeito de globalizacao. Cada um destes meca- nismos 6 descrito e comparado a partir de cito dimensoes que, segundo o autor, introduzem variabilidade nas politicas nacionais. A primeira dimensao diz respeito a natureza da relacao entre politicas do espago mundial e dos espacos nacionais e varia segundo o grau de imposigao ou de adesao volun- taria das politicas educativas no pais destinatario: a adesao voluntaria, a adesdo formalmente voluntaria e a compulsao dao conta de diferentes modos de integrar nas politicas nacio- nais as polfticas educativas globais. Contrariamente ao ponto de vista dos autores que se situam no world-system approach, nao se limita a identificar os efeitos de mimetismo volunta- rio, tentando descrever também os formatos de relagao desi- gual no sistema mundial que estao na origem da imposicao e do isomorfismo formal que assumem, por exemplo, as poli ticas curriculares. Contudo, nao resvala também para a assi- milagao pura e simples dos efeitos da globalizagao ao impe- rialismo, reconhecendo que aqueles podem resultar de poli- ticas construidas no Ambito supranacional, enquanto as Ultimas correspondiam a imposigéio da lei do mais forte. ‘A segunda dimensao pode ser caracterizada pelo grau de explicitagao dos processos de influéncia externos, que podem variar entre a influéncia explicita detectavel nas actividades técnicas que envolvem o trabalho técnico especializado da OCDE/CERI ¢ a influéncia implicita na adopgao de certos dis- cursos sobre as relagées entre educagaio, mercado de traba- |ho e desenvolvimento nacional. A terceira dimensao delimita 0 Ambito em que a reforma que circula na esfera da globa- lizag&o tem impacto nas politicas nacionais. Dale chama a ateng&o para a necessidade de verificar se o Ambito se limita aos programas ou se estende a sua influéncia & organizagao e as finalidades dos sistemas educativos. Neste particular, importa sublinhar o papel das teorias do sistema mundial na compreensao da difuso transnacional dos mitos inscritos no modelo escolar tais como 0 mito do individuo, do progresso e da nagao culturalmente homogénea e integrada. No seu con- junto, so em grande medida estes mitos, que, no passado, criaram algum isomorfismo mundial em torno da triade nagao- -soberania-cidadao, que continuam ainda hoje a legitimar as finalidades globais mais do que a sustentar programas e modelos de organizagao escolar homGlogos. A quarta dimensao tenta identificar 0 locus de variabili- dade dos diferentes mecanismos, quer dizer, qual a regio que acolhe o ponto de origem da variacao. Em geral, a tipologia prevé uma variacao superior a tradicional dicotomia nacional- -internacional, alargando-a aos diferentes locais onde as poli- ticas so elaboradas: organizagoes regionais, fora internacio- nais e organizagGes internacionais. A quinta dimensdo pro- p6e-se apreender a variabilidade pelo lado dos processos envolvidos na influéncia externa. Para além de processos ja descritos pelos institucionalistas, no Ambito das mudangas isomérficas, tais como a coergao, o mimetismo e a normativi- dade, que Dale utiliza para descrever a diferenga da influén- cia externa, sugerimos ainda que a variabilidade dos efeitos externos pode resultar de diferentes problemas de legitimi- dade interna e da mobilizagao desigual das respostas padrao desencadeadas pela incerteza. A sexta dimenséo comporta a génese das politicas educa- tivas e diz respeito a iniciagéio das reformas. Dale considera que a origem da reforma se encontrava, na era antegloba- A globalizacao da escola de massas 161 162 Rui Machado Gomes lizag&o, nos préprios destinatarios e nas comunidades politi- cas nacionais, deslocando-se agora, progressivamente, para as organizac6es internacionais, interestatais e nao-governa- mentais, e para as novas comunidades internacionais imagi- nadas. A sétima dimensao designa as formas de poder e introduz a tipologia de poder desenvolvida por Luke (1974): exercicio da superioridade de alguns estados nos fora inter- nacionais, por intermédio de processos de decisao claramente definidos; capacidade de impor os temas e o ritmo da agenda politica, bem como de retirar outros do processo de decisdo; capacidade de controlar as regras do jogo em que o poder é exercido. Finalmente, a oitava dimensao diz respeito ao modo como a mudanga externamente introduzida 6 mediada ao Quanro 1 Tipologia dos mecanismos dos efeitos externos nas politicas educativas nacionais ONE go #PRENDZAGEN tawonl. — DSSSEu | STANDER- | TERDE: | wrosiig cones Namal | Pareigraica | 24080 | NAQAO | DIZAQAO. | PENDENGIA NATUREZA | Vourtéia | Vobntiia | Formdmanie | Fermainente | Fomalorte | Fornamente | Volntirin | Conpusve DARELAGEO vluniéia_ | volndva | volnéia | voundra GRAU DE_ Expicita Vara Varia Explicita Explicta | Muite explcita Explicit Eqiicia EXPUCTAGIO [ AustTo. Precessos | Parémetos | Melas Peli Folticas Poitcas Motes Meas politoos recorhecidos: polices: diversas diversas. diversas: politica politcas: - fariculaves | paticulres Locus ‘Nacional Nacional ‘Externo Onganizagies Exemno. Foe Herarga ‘Organizacdes DE VARI. | regnas | ounacona | inemaconas | conud | itanasenas UDADE uanidade | PROCESSO mitagao «Aprende Ensino» ‘Atordo Persuasao Condgéo Persuasao_ Infuéndia | wan coecive doatisio RELAQGES | itera | Geter | Itomacicnas | Muiaconais | intemacionas | Multnacioras | Glbal | Mulinacenas ENTIRE | eintema- PARCEIROS | ciongis FONTE | Cesinatéo | Comunitade | Mole | Cdeciva | Oraics | Comuridede | Orgarizagtes | drgios DAINICAGHO pala | inemecanal sipanacinas| itanasina | séeapvema | swnasens raional_| eis DINENSKO | — Deciséo Devisto | Marcagio | Decisio | Mareago | Ragas Naracdo | [as tes diner- DEPODER | corscera | cuncerto | deagenda | concen | deapetda | ohjoyo _ daagnde | snc roordas EFEITOS Drerta: Varia. Varia =| Sector Directa Drecte hdrecta Indirect, NAEDUCAGIO | no sezorou imlicad> | sector | tegme =| regime | — regime saonniziga Diet - 0g ILUSTRAGAD | Unificagéo | Teovias do |Aumento dis en-| Programas Projecto | Declaragéo da | Projecto de | Enpréstinos ‘D0 CASO doensin, — capfal humane | cerges directes | ccmunitéros | PEB-OCDE | Unesoo: Ecuca-| avaliagao do ‘do Banco. PORTUGUES | 1976 | (décaca e080} oom edueagio| europeus dc para Todos ESUpsloSIDA | — Mundi (adaptado de Dale, 1989) nivel educativo. A principal cautela analitica introduzida pela tipologia dirige-nos para um olhar simultaneamente atento tanto as mediagdes explicitas no sector educativo e nas suas organizagées, quanto as mediagGes indirectas ou decorren- tes, tais como as que silenciosamente vao harmonizando as politicas curriculares europeias. O quadro anterior sintetiza e adapta a tipologia de Dale, apresentando ainda alguns exemplos ilustrativos dos diferentes mecanismos para 0 caso do sistema educativo portugués. conjunto de trabalhos de John Meyer e dos seus cola- boradores integram-se no que Skocpol e Somers (1980) carac- terizam como histéria comparativa analégica e histéria com- parada macro-analitica. No primeiro tipo de estudos, a justa- posigdo de casos histéricos destina-se a persuadir-nos de que as hipdteses derivadas de uma determinada teoria podem repetidamente mostrar a sua validade quando aplicadas a um conjunto de exemplos e situagées histdricas. As caracteristi- cas tipicas de cada caso sao evitadas ou consideradas meno- res. Inversamente, a comparagao contrastante utiliza as dife- rengas como teste rigoroso que pode afectar o suposto fun- cionamento de processos sociais globais. Quando se usam tipos ideais, estes constituem apenas 0 pano de fundo para pontuar as singularidades de cada caso. Nos estudos comparativos macro-analiticos as hipoteses explanatorias provenientes de uma teoria ou de teorias con- correntes sao testadas para especificar configuragées favo- raveis ou destavoraveis em relacao a variaveis dependentes explicativas. E 0 caso dos estudos de Ramirez e Boli (1987) e de Meyer, Ramirez, Rubinson e Boli (1979), ao procederem ao teste das hipoteses concorrentes provenientes das teorias funcionalistas e conflitualistas com as suas prdoprias teses. Estes autores procedem segundo um desenho comparativo que John Stuart Mill (apud Etzioni e Dubow, 1970) designou por método do acordo: um conjunto de casos que tém em comum o fendmeno a ser explicado também tém em comum os factores causais enunciados nas hipdteses (Boli et a/., 1985). A nossa opgao releva antes de uma estratégia compara- tiva contrastante porque mais adequada a captagao de niveis em profundidade da realidade social dificilmente mensura- veis. Nao ha nada de errado em seguir uma ou outra estra- tégia desde que fique explicito que cada uma delas analisa niveis diferentes dos sistemas educativos e que alguns desses A globalizagao da escola de massas Concluséo 163 164 Rui Machado Gomes Referéncias Bibliograficas Altbach, P. Anderson, Benedict Archer, Margaret Aris, Philippe Bauman, Zygmunt Boli, John. Boli, John et al. Briand, J.-P. et al. Chabot, Colette Charpentier, Jean; Engel, C. Collins, Randall niveis so deste modo negligenciados. A estratégia analégica dos estudos comparativos sofre de um viés centrocentrista que consiste em representar a esséncia dos sistemas edu- cativos dos paises ocidentais do centro derivando entao um conjunto de categorias em relagao as quais os outros siste- mas sao comparados. Deste modo se tende a definir a priori que os principios que explicam a dinamica de um estado tardio de expansdo da escola devem ser os mesmos do estado nas- cente. Semelhante viés se verifica quando se compara no mesmo sistema educativo 0 momento da sua génese com os periodos do seu desenvolvimento e maturacdo. Provavel- mente, cada um destes tempos da morfogénese da escola necessita de teorias e indicadores mais matizados para a sua andlise. . (1994) «International Knowledge Networks», in T. Husen; T. N. Pos- tlethwaite, The International Encyclopedia of Education, vol. 5. Oxford: Pergaman-Elsevier, 2993-2998 (1983) Imagined Communities. Reflections on the Origin and Spread of Nationalism. London / New York: Verso. (1979) Social Origins of Educational Systems. London / Beverly Hills: Sage. (1973) L’enfant et la vie familiale sous I'Ancien Régime. Paris: Seuil (1960). (1987) Legislators and Interpreters: Modemity, Post-Moderity and Intellectuals. Ithaca: Cornell UP. (1987) «World Polity Sources of Expanding State Authority and Organizations, 1870-1970», in G. Thomas et al., Institutional Structure. Beverly Hills: Sage, 71-91. 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