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FOLHA DE SÃO PAULO

20 July, 2022 | created using PDF Newspaper from FiveFilters.org

Preço e rótulo do vinho serviu um Bordeaux que engarrafou com dois rótulos distintos:
“grand cru” (vinho de excelência) e “vin de table” (vinho

podem enganar sommeliers, ordinário).

dizem estudos — 27/05/2011 Como esperado, os especialistas deram avaliações muito


diferentes a cada uma das amostras. O “grand cru” foi considerado

— Comida “agradável, amadeirado, complexo, balanceado e arredondado”,


enquanto o “vin de table” lhes pareceu “fraco, curto, leve e
achatado”.
A crítica de vinhos, com seu vocabulário pomposo e sofisticado
sistema de notas de zero a cem, não é, em termos objetivos, muito Quarenta dos especialistas julgaram que o vinho de rótulo
mais do que uma fraude. Essa pelo menos é a conclusão a que se pomposo valia o investimento; apenas 12 disseram o mesmo da
chega quando revisamos os testes científicos a que a indústria da bebida barata.
enofilia foi submetida nas últimas décadas.
Um vinho de US$ 10 melhora substancialmente quando é
Em 1963, Rose Marie Pangborn, uma das pioneiras nos estudos da etiquetado como uma garrafa de US$ 90.
percepção do gosto, mostrou que, quando se adicionava um pouco
de corante para que vinho branco ficasse rosado, especialistas Outro estudo seminal, de Gregg Salomon, de Harvard (EUA),
classificavam o falso rosé como mais doce do que a mesma bebida mostrou que, quando se oferecem a especialistas três taças de
sem a tintura. vinho, duas das quais são idênticas, eles são incapazes de apontar
a amostra diferente em um terço das tentativas.
Com esse experimento, ela abriu as porteiras para uma série de
testes que, se não destroem inteiramente a reputação da enologia, Em termos objetivos, o paladar humano só detecta cinco sabores:
chegam muito perto de fazê-lo. doce, salgado, azedo, amargo e umami.

Um clássico no gênero é o artigo “A Cor dos Odores”, de Gil É verdade que, no caso do vinho, as sensações gustativas são
Morrot, Fréderic Brochet e Denis Duburdieu. Eles recrutaram 54 enriquecidas por algo entre 600 e 800 compostos voláteis que
estudantes de enologia da Universidade de Bordeaux e os podem ser captados pelo olfato.
convidaram a provar e a comentar duas taças de vinho, que O problema é que, mesmo os narizes mais bem treinados não
pareciam ser um branco e um tinto. conseguem identificar mais do que quatro componentes na mesma
SXC mistura.

O cérebro não entrega os pontos e se fia em pistas externas como


cor, rótulo e preço para emitir seus pareceres enológicos. Não
fossem os cientistas desmancha-prazeres, ele provavelmente teria
sucesso e o logro não seria descoberto nem pelo “sommelier” que
prova as sensações como reais e objetivas.

As inconsistências na percepção dos sabores não estão restritas ao


ramo vinícola. Já foi demonstrado que podemos nos deleitar com
comida de cachorro como se fosse patê de “foie gras”.

OUTRO LADO

A Associação Brasileira de Sommeliers diz que as pesquisas são


irrefutáveis e que os especialistas em vinhos são mesmo
influenciados pelo rótulo e pela procedência. “Ninguém tem
coragem de falar mal de um vinho famoso. Somos induzidos, sim”,
diz o diretor Arthur Azevedo.
Pesquisas e degustações realizadas com “especialistas” denotou
falhas na diferenciação de vinhos; sommeliers admitem problemas

Na realidade, porém, ambos os copos continham o mesmíssimo


vinho branco, mas, num deles, havia sido adicionado antocianino,
um corante que não deixa gosto.

Como prognosticado pelos cientistas, os estudantes não


perceberam o truque e ainda descreveram com riqueza de
detalhes os aromas de cada uma das amostras com o vocabulário
específico para as uvas vermelhas e brancas.

Num outro experimento, Brochet resolveu ir ainda mais longe e

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