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A opinião no jornalismo brasileiro

MELO, José Marques de. Petrópolis: Vozes, 1994


Págin Conteúdo Comentári
a o
23 “A distinção entre news e comment que se esboça no Cap 3
jornalismo britânico acabaria por se impor como uma
bipolarização do espaço ocupado pela informação de
atualidade nos veículos de difusão coletiva. O equilíbrio
entre ambas as categorias ou a predominância de uma sobre
AA outra permanece como uma peculiaridade de cada
processo jornalístico.”
26 “Se historicamente predominam essas duas categorias no Cap 3
jornalismo – o informativo e o opinativo –
contemporaneamente elas convivem com categorias novas
que correspondem às mutações experimentadas pelos
processos jornalísticos. Pelo menos essa é a tendência
corrente nos países capitalistas, onde o jornalismo torna-se
cada dia mais um negócio poderoso e suas formas de
expressão buscam adequar-se aos desejos dos consumidores
ou equiparar-se aos padrões das mensagens não-jornlísticas
que fluem através dos mass media.
28 a) A instituição jornalística assume o papel de Cap 3
observadora atenta da realidade, cabendo ao
jornalista proceder como “vigia”, registrando os
fatos, os acontecimentos e informando-os à
sociedade. Essa função corresponde ao jornalismo
informativo.
b) Além disso, reage diante das notícias, difundindo
opiniões, seja as opiniões próprias, seja as que lê,
ouve ou vê. Nesse sentido assemelha-se à instituição
do Forum na Grécia antiga, atuando como
conselheira, como formadora de opinião. Essa função
corresponde ao jornalismo opinativo.
65 “A distinção entre a nota, a notícia e a reportagem está Cap 3
exatamente na progressão dos acontecimentos, sua captação
pela instituição jornalística e a acessibilidade de que goza o
público. A nota corresponde ao relato de acontecimentos que
estão em processo de configuração e por isso é mais
frequente no rádio e na televisão. A notícia é o relato
integral de um fato que já eclodiu no organismo social. A
reportagem é o relato ampliado de um acontecimento que já
repercutiu no organismo social e produziu alterações que são
percebidas pela instituição jornalística. Por sua vez, a
entrevista é um relato que privilegia um ou mais
protagonistas do acontecer, possibilitando-lhes um contato
direto com a coletividade.”
65 “O comentário, o artigo e a resenha pressupõem autoria
definida e explicitada, pois este é o indicador que orienta a
sintonização do receptor.
92 “A manifestação de opinião no jornalismo contemporâneo Cap 2
não é um fenômeno monolítico. Por mais que a instituição
jornalística tenha uma orientação definida (posição
ideológica ou linha política), em torno da qual pretende que
as suas mensagens sejam estruturadas, subsiste sempre uma
diferenciação opinativa (no sentido de atribuição de valor
aos acontecimentos). As condições de produção do
jornalismo atual exigem a participação de equipes
numerosas, donde a impossibilidade de controle total do que
se vai divulgar.
O monolitismo opinativo caracterizou a vida dos primeiros
jornais e revistas, que eram obra de uma só pessoa.”
93 “Desde o momento em que a imprensa deixou de ser
empreendimento individual e se tornou instituição,
assumindo o caráter de organização complexa, que conta
com equipes de assalariados e colaboradores, a expressão de
opinião fragmentou-se seguindo tendências diversas e até
mesmo conflitantes.”
94 “A opinião da empresa, ademais de se manifestar no Cap 2
conjunto da orientação editorial (seleção, destaque,
titulação), aparece oficialmente no editorial. A opinião do
jornalista, entendido como profissional regularmente
assalariado e pertencente aos quadros da empresa, apresenta-
se sob a forma de comentário, resenha, coluna, crônica,
caricatura, e eventualmente artigo. A opinião do
colaborador, geralmente personalidades representativas da
sociedade civil que buscam os espaços jornalísticos para
participar da vida política e cultural, expressa-se sob a forma
de artigos. A opinião do leitor encontra a expressão
permanente através da carta.”
105 “O comentarista é geralmente um jornalista com grande
experiência e tirocínio, que acompanha os fatos não apenas
na sua aparência, mas possui dados sempre disponíveis ao
cidadão comum. Trata-se de um observador privilegiado,
que tem condições para descobrir certas tramas que
envolvem os acontecimentos e oferecê-las à compreensão do
público.”
106 “O comentarista não é um julgador partidário, alguém que Cap 2
faz proselitismo ou doutrinação. É um analista que aprecia
os fatos, estabelece conexões, sugere desdobramentos, mas
procura manter, até onde é possível, um distanciamento das
ocorrências. Isso não quer dizer que seja neutro. Ao
contrário, trata-se de um profissional participante, que possui
opinião própria, mas atua como agente da notícia e não
procura exercer sua função para extrair vantagens
posteriores (cargos públicos/ ascensão política). Em síntese,
assume-se como juiz da coisa pública. Orienta sem impor.
Opina sem paixão. Conduz sem se alinhar.”
106 “O comentário surgiu como tentativa de quebrar o Cap 2
monopólio opinativo do editorial. Esse monopólio era
consequência da unidade ideológica que possui o jornalismo
pré-industrial. Mas, quando as instituições jornalísticas
tomam caráter mercantil, seus dirigentes deparam-se com a
inevitabilidade das concessões sociais. (...) Por isso tornou-
se incômodo manter o monopólio opinativo que expressava,
através do editorial, o ponto de vista das forças diretamente
responsáveis pelo funcionamento da empresa jornalística.”
107 “O surgimento do comentário no jornalismo brasileiro Cap 2
afigura-se como espaço propício para a expressão opinativa
dos seus profissionais. As oportunidades para a manifestação
de opinião em nossos veículos jornalísticos sempre
estiveram acessíveis aos grandes intelectuais ou aos
repórteres destacados. Nunca aos redatores que mostravam
potencialidade de análise e de previsão dos acontecimentos.
109 “Na verdade o comentário tem sua própria especificidade Cap 3
enquanto estrutura narrativa do cotidiano. Trata-se de um
gênero que mantém vinculação estreita com a atualidade,
sendo produzido em cima dos fatos que estão ocorrendo.
Vem junto com a própria notícia. Por isso é difícil de ser
realizado, exigindo muita argúcia no sentido de evitar
prognósticos não confirmáveis.”
109 “O comentário explica as notícias, seu alcance, suas Cap 3
circunstâncias, suas consequências. Seu julgamento é
percebido pelo raciocínio que utiliza, pelos rumos da sua
argumentação.”
111 “Raramente o comentário é conclusivo, arriscar uma Cap 2
conclusão é perigoso, já que se torna exíguo o tempo que Cap 3
tem o comentarista entre a ocorrência e a apreciação. As
conclusões vão emergindo naturalmente como consequência
dos julgamentos anteriores.
Por sua própria natureza, o comentário exige especialização.
Não há comentarista de assuntos gerais. Cada jornalista
acumula experiência e conhecimento num setor (política,
economia, esportes) e se dedica a discernir a evolução do
que acontece. Comentar é uma tarefa que pressupõe
ancoragem informativa e perspectiva histórica. Sem dispor
de dados concretos e de referencial analítico, o comentário
corre o perigo de cair no vazio e fraudar o receptor. Afinal
de contas, quem recorre ao comentário quer dispor de uma
bússola para entender a contemporaneidade.”
111 “O comentário ainda não teve o seu diagnóstico feito com Cap 2
precisão no jornalismo brasileiro. Historicamente ele surge
na década de 50, principalmente com a expansão da
televisão, e atinge um período de fulgor na primeira metade
da década de 60. Mas como comentar é uma atividade
jornalística que não pode prescindir de liberdade, no duplo
cenário os acontecimentos, observa-se um declínio após o
golpe de 1964. Além da censura que se estabelece nos
processos de difusão, com maior ou menor intensidade,
verifica-se também o fechamento das fontes de informação.
Um dos traços dos governos militares foi a circunscrição das
decisões políticas aos reservados gabinetes das figuras de
projeção e o certo ar de mistério que cercou o palco da
notícia. Muitas medidas de grande repercussão no campo
político ou econômico passaram a ser anunciadas de
surpresa, pegando a opinião pública desprevenida.”
112 “É natural portanto que os comentaristas tenham encontrado
inibição para o exercício do seu trabalho. Alguns
importantes jornalistas, que se dedicaram ao comentário na
cadeia Última Hora e também em outros jornais,
praticamente desapareceram da vida nacional, cassados,
acuados ou amedrontados. Outros tiveram seu espaço de
atuação restringido pelas próprias empresas jornalísticas,
temerosas de desagradar os novos donos do poder.”
112 “São os tempos da distensão ou da abertura que fazem
renascer o comentário. (...) O campo que se afigura para o
comentário é o dos esportes, não apenas pela coincidência da
valorização do futebol como válvula de escape nacional, mas
pela liberdade de atuação de que gozam os jornalistas
esportivos para emitir conceitos e sugerir julgamentos.”
114 “É porém no rádio que o comentário está encontrando sua
maior expressão no jornalismo brasileiro contemporâneo.
Durante muito tempo, ele se fez por personagens como
Vicente Leporace que realizam cotidianamente no programa
O Trabuco (Rádio Bandeirantes) uma análise informal do
noticiário publicado nos jornais da manhã. Era o comentário
das ocorrências que ganhavam as manchetes, numa
linguagem direta, coloquial, mas sem dúvida presa à
construção verbal mais elaborada. As frases de Leporace,
por exemplo, fluíam no velho estilo discursivo, retórico,
impostado, apesar da força emotiva que muitas vezes
imprimia.”
115 “O segredo do comentário radiofônico tem sido o de ampliar
o seu universo temático, não restringindo-se à política,
economia e esportes, como ainda ocorre nos jornais, revistas
e televisão, mas captando aquelas facetas da vida social que
expressam as vicissitudes do cidadão comum: o custo de
vida, os problemas de transporte e habitação, as questões
ligadas à educação e à saúde, sem perder de perspectiva a
sua inserção no conjunto da vida nacional.
Observa-se porém que o comentário radiofônico ainda
mantém uma dependência em relação ao jornal diário, que
serve como fonte de referencia para a seleção do fatos a
merecerem análise, elucidação e julgamento.”

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