Você está na página 1de 181

GESTÃO DE POLÍTICAS

PÚBLICAS

Autoria: Daniel Neto Francisco

1ª Edição
Indaial - 2021

UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:


Carlos Fabiano Fistarol
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Jóice Gadotti Consatti
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Marcelo Bucci
Jairo Martins
Marcio Kisner

Revisão Gramatical: Equipe Produção de Materiais

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Copyright © UNIASSELVI 2021


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.

F819g

Francisco, Daniel Neto

Gestão de políticas públicas. / Daniel Neto Francisco. – Indaial:


UNIASSELVI, 2021.

181 p.; il.

ISBN 978-65-5646-323-0
ISBN Digital 978-65-5646-322-3
1. Políticas públicas. – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da
Vinci.

CDD 352
Impresso por:
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................5

CAPÍTULO 1
CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE
POLÍTICAS PÚBLICAS.....................................................................7

CAPÍTULO 2
CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E
DIMENSÕES DA GESTÃO.............................................................51

CAPÍTULO 3
INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS........97
APRESENTAÇÃO
Caro estudante, neste livro, caminharemos juntos por uma jornada no campo
das políticas públicas. O termo “políticas públicas” tem estado, cada dia mais,
nas rodas de conversa, nas notícias e nas mídias, e nas produções de análises
acadêmicas, como um campo específico da ciência.

A transformação, que vem nos deixando cada vez mais próximos das políticas
públicas, pode ser compreendida como um fenômeno positivo, uma vez que a
discussão do termo tem ganhado espaço, cada vez mais sólido, na sociedade
brasileira. Contudo, o evento deve ser melhor compreendido, analisado, e, nos
termos técnicos e práticos, aprimorado, isso porque grande parte da sociedade e
dos nossos gestores públicos (de políticas públicas) ainda não domina dimensões
importantes do fenômeno.

No Capítulo 1, abordaremos os modelos teóricos que subsidiam, ao campo


das políticas públicas, uma consolidação a partir de diferentes métodos de análise,
instrumentos de planejamento e avaliação, promovendo diferentes oportunidades
para que gestores, estudantes e sociedade, em geral, possam analisar de
forma mais técnica. Dizemos que são diferentes oportunidades porque, como
você mesmo poderá perceber ao longo do Capítulo 1, cada modelo analítico
das políticas públicas possui um olhar específico sobre uma característica ou
fenômeno. Dessa forma, o panorama aberto, neste livro, buscará promover um
passeio pelos principais modelos teóricos, apresentando as oportunidades e
as debilidades, longe de caracterizar ou apontar um caminho único e perene,
diante de uma esfera analítica tão complexa, como são as políticas públicas e os
processos técnico-burocráticos.

No Capítulo 2, abarcaremos as fases do Ciclo de Políticas Públicas (CPP),


a partir da definição explicitada por Secchi (2015). Você poderá analisar os
diferentes processos e fenômenos existentes no âmbito da gestão de políticas
públicas. No entanto, frisar-se-á, a partir das análises expostas neste capítulo, a
desconstrução da noção de que o CPP reflete, com totalidade, a complexidade
inerente aos processos que envolvem os agentes públicos, a definição e a
construção de agendas, a implementação da agenda pública, a tomada de
decisões e os processos que permeiam critérios de indicadores e de avaliação.
Não obstante, a análise crítica dos pressupostos teóricos do Capítulo 2 envolverá,
ainda, a distinção teórica entre avaliação e monitoramento, um ponto importante
para que se estabeleça a construção de análises apropriadas para cada um dos
momentos. Outro assunto importante, e, desde já, apontado como um elemento
de centralidade das análises contemporâneas, é a reestruturação dos arranjos
institucionais e da produção de políticas públicas, em especial, daqueles que
envolvem processos de governança não hierarquizados e descentralizados. Teria,
o Estado, um novo papel diante das novas configurações das políticas públicas? E
o gestor público, qual é o papel dele nesse cenário de ações intergovernamentais?
Cabe, assim, a análise desse cenário, a partir do expoente dos referenciais da
gestão social e da busca teórico-prática de novas estruturas organizacionais, que
sejam capazes de promover, à esfera pública e à esfera governamental, novos
caminhos, objetivos e definições práticas.

Por fim, o Capítulo 3 será desenvolvido a partir do estabelecimento de um


objeto teórico de fundamental importância para as análises de avaliação no
campo das políticas públicas: os indicadores. Os indicadores ganham espaço na
constituição de análises e na definição teórica de estudos em diversos campos
do conhecimento científico. No caso especial da área das políticas públicas, vêm
sendo debatidos desde a gênese, mas, sempre, a partir de diferentes paradigmas
estruturais. Dessa forma, no Capítulo 3, abordaremos as transformações do
referencial, a partir das diferentes abordagens históricas que orientam os
principais modelos e as práticas avaliativas da gestão das políticas públicas.

Bons estudos!
C APÍTULO 1
CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS
DE POLÍTICAS PÚBLICAS

A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Definir o que é uma política pública e a gênese desta como um campo científico.
• Conhecer e identificar as principais dimensões teóricas e metodológicas de
análise que compõem a ação no campo das políticas públicas.
• Diferenciar os termos “análise política” e “análise de políticas públicas”.
• Analisar na prática os diferentes segmentos, modelos e tipologias existentes no
campo das políticas públicas.
• Examinar e esquematizar as políticas públicas, de acordo com diferentes
tipologias, que produzem uma síntese das principais formas, funções e
finalidades.
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

8
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Iniciamos, aqui, o nosso percurso de conhecimento e de reflexão em torno
das políticas públicas, por isso, desejamos que a aproximação com o tema e
os diversos conceitos possam ser agradáveis e significativos. Para isso, ao
longo deste e dos demais capítulos, serão disponibilizados alguns materiais
complementares que, além de buscarem uma reflexão crítica e profunda do tema,
também servirão para que você possa aproveitar, ao máximo, os conhecimentos
relativos à gestão de políticas públicas, sem que se torne uma disciplina,
essencialmente, de apropriação de termos.

Nosso mergulho pelo vasto campo das políticas públicas tem, como ponto
de partida, a busca das principais dimensões conceituais e dos modelos teóricos
mais estudados e aplicados na gestão de políticas públicas, e que estruturam o
campo científico.

Refletiremos a respeito do conceito de políticas públicas, partindo da


principal definição: a existência de uma ação que busca resolver um determinado
problema público. Desse conceito fundamental, e eminentemente aceito pelos
mais diferentes espectros teóricos (DYE, 1992; QUEIROZ, 2011; SECCHI, 2015;
ARAÚJO; RODRIGUES, 2017), você poderá conhecer, ainda, as divergências
conceituais em torno desse tão amplo e complexo tema. De tal forma, passaremos
pelas principais abordagens teóricas, refletindo, de forma crítica e construtiva,
acerca das conceituações de políticas públicas.

Buscar-se-á promover um breve resgate histórico a respeito da formação


do campo das políticas públicas desde as primeiras contribuições de autores
clássicos, com forte conexão com os estudos da área da Ciência Política.
Caminharemos até os cenários mais atuais das políticas públicas, com a
apresentação de um contexto múltiplo e diversificado do tema. A respeito dessa
concepção mais diversificada e múltipla da área, encaminharemos uma análise
mais aprofundada apenas no terceiro capítulo, mas, desde já, faremos alguns
apontamentos para essa nova roupagem das análises das políticas públicas, que
envolve, por exemplo, a reformulação da área sob uma gama de conhecimentos
multidisciplinares, como o denominado “Campo de Públicas”.

A respeito dos modelos teóricos do campo, nossa análise tratará das


principais vertentes que contribuem para diferentes modelos e segmentos
reflexivos das políticas, dos processos, das instituições, dos meios, dos sistemas
de ação política e dos agentes envolvidos no amplo espectro de fenômenos
sociais.

9
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Por fim, mas não menos importante, será posto, em debate, o ferramental
metodológico das tipologias das políticas públicas. Dessa forma, serão
apresentadas as principais tipologias: de Lowi, de Wilson, de Gormley, de
Gustafsson etc. Tal exercício buscará aprofundar os conhecimentos do leitor e
torná-lo mais próximo dos principais teóricos que deixaram contribuições a esse
campo de estudos. Cabe, no entanto, frisar que a análise explicitada das tipologias
guarda, em si, possibilidades, mas, também, limitações teórico-metodológicas,
tendo, as políticas públicas, uma grande complexidade de cenários, de fenômenos
e de ações em interseção, assim, deve-se evitar o reducionismo de um “caminho
único”. Por isso, buscaremos, a partir deste primeiro capítulo, formular um
espectro amplo de dimensões reflexivas, conceituais e instrumentais.

A respeito dos conceitos trazidos, notem que alguns nos acompanharam


nesta jornada de conhecimento, e serão fundamentais para a exploração de
novos temas. Por isso, fique atento aos referenciais e aos conceitos iniciais, como
politcs, policies, ou, até mesmo, “policy networks” e “policy issue”.

2 CONCEITUANDO AS POLÍTICAS
PÚBLICAS
Você já deve ter ouvido o termo política pública em diversos contextos,
e, em muitos deles, até mesmo, pode ter se perguntado, alguma vez, por que
determinado fenômeno seria uma “política pública”. Pois bem, nesta seção,
trataremos das principais abordagens teóricas que buscam dar uma explicação
conceitual do que são as políticas públicas.

Antes de iniciarmos a conceituação desse termo tão divulgado nas mídias,


nas redes sociais, nas conversas e nos espaços de gestão pública, cabe
definirmos de onde vem, qual é a origem. Notavelmente, as políticas públicas vêm
se estabelecendo como um campo autônomo do conhecimento e de aplicação
de técnicas, instrumentos e modelos avaliativos, no entanto, a origem histórica
retoma a construção teórica do campo da ciência política. É, justamente, o termo
“política”, que deve consolidar a dimensão de caráter eminentemente ligado às
atividades e aos processos voltados para o exercício do poder. Como destaca
Boullosa (2013), os primeiros passos de consolidação da área, no âmbito da
ciência política, assumem os papéis de orientar e de promover caminhos, com
base na racionalidade, para melhorar as ações dos governos e aperfeiçoar os
modelos de regulação social (BOULLOSA, 2013).

Para a melhor apropriação dos conceitos da área de políticas públicas,


inclusive, de alguns que estão diretamente ligados à língua inglesa, é importante

10
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

destacarmos que, no português, a palavra política guarda dois sentidos que, na


língua inglesa, são definidos por dois vocábulos distintos: “politics” e “policy”.

Politics é definida como a esfera “processual”, ou seja, são as


ações e as relações inerentes ao processo político para a determi-
nação das ações governamentais ou institucionais (FREY, 2009).
Logo, politics podem ser compreendidos como os processos, as
ações e as mediações em torno das esferas e das instituições que
exercem o poder sobre a sociedade como um todo. Já o termo “Poli-
cy” é definido como a esfera “material”, ou seja, a materialização das
decisões políticas orientadas em ações concretas de programas, pro-
jetos e políticas públicas (FREY, 2009).

Podem ser clarificados como os modelos e os parâmetros de ação efetiva,


como a política de compras de uma organização, e, até mesmo, as diretrizes
políticas de um partido (SECCHI, 2015). As “policies”, então, estão relacionadas
com a materialidade de um resultado.

Com relação ao termo a ser melhor desvendado neste capítulo, as políticas


públicas estão diretamente ligadas ao conceito e à definição de policy, uma
vez que são a efetivação dos processos políticos das mais variadas estruturas
e formas processuais, como veremos mais à frente. Não há um único conceito
que defina a totalidade das políticas públicas, mas, no Brasil, grande parte dos
teóricos se enquadra no consenso de tratá-las como um conjunto de dimensões
concretas e simbólicas, que deriva das decisões políticas.

O que deve ser enfatizado, neste momento, é que as políticas


públicas (public policies) “tratam do conteúdo concreto e do conteúdo
simbólico de decisões políticas, e do processo de construção e
atuação dessas decisões” (SECCHI, 2015, p. 1).

11
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

É inerente, ao estudo das políticas públicas, compreender as ações concretas


e as não concretas, e, no caso das ações concretas, como se efetivam (e se,
realmente, efetivam-se). Ainda, abarca as práticas relacionais dos processos
políticos. Deve-se ressaltar que, apesar de ser possível uma análise separada das
esferas das políticas, não se pode perder de vista que, na prática, elas funcionam
de forma simbiótica e uma influencia diretamente nos resultados da outra.

Agora que já compreendemos os conceitos basilares que distinguem as


esferas inerentes à política (como politics e policy), aprofundar-nos-emos no
conceito do nosso objeto de estudos principal: as políticas públicas. Não existe
um conceito único e abacado, que ofereça uma resposta às divergências
apresentadas nas múltiplas visões e nos fenômenos das políticas públicas. Não
obstante, é importante demarcarmos, mais a fundo, as dimensões do nosso objeto
de estudo neste livro, por isso, esta primeira seção deve abranger alguns pontos
teóricos imprescindíveis para que se compreendam as diferentes concepções
teóricas a respeito do que é uma política pública.

É necessário abordar um ponto de coesão teórica, que ajuda a compreender


o elemento fundamental para a identificação e a definição do que são as políticas
públicas (policies) referindo-se ao entendimento de que toda política pública
busca oferecer resposta a um problema público. Isso porque deve haver
uma resposta, seja pela ação ou inação (falaremos disso daqui a pouco) de um
problema identificado na sociedade. Logo, uma ampla gama de autores destaca
que, se um problema não é publicamente reconhecido, não possui interação com
o campo das policies. No entanto, existem pontos teóricos que não possuem
consenso na conceituação do que é uma política pública. Você poderá conhecê-
los agora, também denominados, por Secchi (2015), como nós conceituais:

Ponto teórico Ponto teórico 1 – O primeiro ponto teórico se refere a uma


1 – O primeiro intencionalidade de ação: uma corrente teórica defende que toda
ponto teórico ação ou falta de ação apresenta uma intencionalidade, mas, de acordo
se refere a uma com outra corrente de teóricos, como Rua (1998), as políticas públicas
intencionalidade de
são frutos (resultados) da atividade política. Já Souza (2006) define o
ação.
próprio campo de análise das políticas públicas como aquele que busca
estimular as ações do governo, e, ao mesmo tempo, analisar essas ações. Logo,
tais definições cobrem apenas as policies, que remetem a um processo de ação,
de transformação e intervenção ativa.

Outra corrente teórica (DYE, 1992) denota que toda política pública
guarda, em si, intenção de ação (ou de inação – não ação). No entanto, mesmo
nas situações nas quais existe uma falta de ação, não se deixa de haver uma
intencionalidade que oriente a situação.

12
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Dye (1992) aponta, como um atributo fundamental das políticas públicas,


a ação, e, também, a falta de ação sobre determinadas situações que geram
contextos sociais diversos, que podem afetar determinados grupos sociais
positivamente ou negativamente. Como menciona Secchi (2015), essa concepção
teórica passa a compreender situações de omissão estatal e de negligência,
como políticas públicas. Como exemplos claros, nesse sentido, podemos citar
os acidentes provocados por falta de reparos em vias públicas, viadutos e áreas
públicas, uma vez que, ao não tomar determinada medida de segurança ou
de manutenção preventiva, o governo oferece a possibilidade para que dado
fenômeno ocorra.

Ponto teórico 2 – diz respeito à abordagem de ação das políticas públicas.


Em outras palavras, busca-se definir, a partir de diferentes posicionamentos,
que atores são responsáveis pela produção de políticas públicas. Aqui,
derivam-se duas vertentes principais: a “Abordagem Estadista” e a “Abordagem
Multicêntrica”. Para um segmento de teóricos, a ação e os processos, em torno
das políticas públicas, são fenômenos estatais, e que devem ser compreendidos
a partir de uma observação centrada na esfera governamental (campo no qual
se produzem as polícies). Para outra vertente, a noção clássica de políticas
públicas, como sinônimo de políticas estatais, é um erro, pois não permite admitir
uma diversidade de ações e de situações nas quais problemas eminentemente
públicos são tratados por agentes não estatais (comunidades, organizações
não governamentais (ONGs), empresas, consórcios públicos e privados etc.). A
respeito dessas concepções, falaremos, mais detalhadamente, a seguir.

Quanto a esse ponto, há uma série de vertentes e de


discussões teóricas que busca explicar e conceituar os modelos de
ação das políticas públicas. As principais concepções teóricas são: a
“Abordagem Estadista” e a “Abordagem Multicêntrica”.

A “Abordagem Estadista ou Estadocêntrica” é a abordagem teórica de políticas


públicas que as conceitua como um objeto de caráter estatal. De acordo com essa
compreensão, o que, de fato, define uma política pública, é a personalidade jurídica
do ator protagonista. Queiroz (2011, p. 97) propõe que as políticas públicas “são,
no estado democrático de direito, os meios que a administração pública dispõe
para a defesa e a concretização dos direitos de liberdade e dos direitos sociais dos
cidadãos, estabelecidos em uma Constituição Nacional”.

13
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Diante tal perspectiva, o Estado é o agente principal, e atua para executar


ações que propiciem o cumprimento das Cartas Constitucionais. No entanto, o
exercício do papel estatal, como agente provedor de ações, é mais denso, pois,
também faz parte, do processo de deliberação política, a definição das próprias
diretrizes constitucionais, além das ações de priorização de quais diretrizes
precisam ser atendidas.

Como indica Secchi (2015, p. 2), “a exclusividade estatal, no fazer policies,


é derivada da superioridade objetiva do Estado de fazer leis, e fazer com que a
sociedade cumpra as leis”. Tal reflexão nos propicia outro debate relevante quanto
ao papel de eminência do agente estatal na produção de políticas públicas.

Os arcabouços teóricos mais clássicos de Dye (1992) e de Heclo (1972),


por exemplo, promovem uma compreensão do campo das políticas públicas
como um setor de ação unicamente estatal. A proposição prescritiva-normativa
produz uma competência vinculante da ação pública, como as competências
direcionadas pelas Cartas Constitucionais, que, legalmente, conduzem, ao
Estado e a agências, a responsabilidade de ofertarem serviços, como saúde,
educação, assistência social, segurança nacional e outras matérias. Entretanto,
tal visão é limitada diante dos processos de transformação, não apenas da esfera
estatal, mas de toda a sociedade e das instituições, uma vez que os processos
de resolução dos problemas públicos têm sido, eminentemente, abarcados pelos
mais diferentes segmentos da sociedade civil e das instituições, fora dos limites
da área governamental. Como exemplos, podemos citar a área da Assistência
Social e a atuação ativa de ONGs, de organizações e de movimentos sociais
na construção de ações públicas, como o Sistema Único de Assistência Social
(SUAS).

Veja mais a configuração do SUAS e quais são as atribuições,


de acordo com o Governo Federal: https://www.gov.br/cidadania/pt-
br/acoes-e-programas/assistencia-social/gestao-do-suas.

A Abordagem Multicêntrica busca tratar do processo de mudanças sociais,


por isso, considera a atuação combinada entre entes estatais e organizações da
sociedade civil e multilaterais, as redes de políticas públicas (policy networks –
termo que veremos mais à frente, neste capítulo), e outros arranjos institucionais
que buscam promover solução a determinados problemas públicos.

14
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Os teóricos da Abordagem Multicêntrica (também denominada de


Policêntrica) “atribuem o adjetivo “pública” a uma política quando o problema
que se tenta enfrentar é público” (SECCHI, 2015, p. 3). Dessa forma, abre-se,
para o campo da análise e da gestão de políticas públicas, um leque de atores
e de instituições que participa, ativamente, como engrenagens constitutivas dos
processos de resolução dos problemas públicos (BOULLOSA, 2013; AGUM;
RISCADO; MENEZES, 2015).

Veremos, a seguir, a abordagem da corrente citada, mais ampla e complexa


(no sentido de tratar melhor da complexidade das experiências sociais) das
políticas públicas, pelos mesmos motivos elencados por Secchi (2015):

• A Abordagem Multicêntrica promove um olhar mais interpretativo, e que


busca se afastar um pouco da dinâmica positivista (enquadrar todos os
fenômenos sociais em um único sistema). Logo, não é apenas o teórico
ou o estudioso de políticas públicas quem define o que ou o que não é
uma política pública, mas toda a ampla gama de agentes sociais e de
instituições que está envolvida no fenômeno.
• Escapa do reducionismo de uma “pré-análise de personalidade jurídica”
(SECCHI, 2015, p. 4). Afinal de contas, existe uma série de organizações
que, mesmo públicas, possuem capital (financeiro privado), além de
outras infinidades de organizações privadas e do terceiro setor que
recebem recursos financeiros para promover ações específicas com
interesse público.
• Permite, ao campo das políticas públicas, a possibilidade de promover
transformações sociais, analíticas e conceituais em diferentes segmentos
para além daqueles de natureza estatal.
• O papel do Estado varia de país para país, e, até mesmo, dentro do Brasil,
a concepção dos ditos “deveres do Estados” vem se transformando. Faz-
se necessária uma reflexão profunda acerca das transformações.
• As ações de coerção e de promoção de leis são ferramentas
exclusivamente estatais, mas não são as únicas formas de promoção de
ações públicas, ao contrário, deve-se abrir um leque de possibilidades
de ação que são instrumentos políticos compartilhados entre os
segmentos estatais e não estatais, como campanhas, parcerias público-
privadas, atividades de conscientização e de sensibilização, e outras
possibilidades.

Obviamente que você pode estar aí se perguntando: qual é o papel do Estado


nesse processo todo? Esse é um ponto interessante e fundamental, pois não há
uma resposta única e estática. Em alguns casos, faz sentido e é necessário que
o Estado seja o ator condutor das ações, para promover seguridade ao processo,
para estimular o empenho de demais segmentos da sociedade, e, até mesmo,

15
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

para cobrir as falhas naturais de mercado existentes, como a promoção de bens


públicos indivisíveis e não excludentes, caso da segurança nacional.

Afinal de contas, deve, o Estado, ser o agente principal de


todas as ações de políticas públicas? Deve ser um Estado indutor?
Deve apenas regular as atividades sociais e deixar que os agentes
promovam as ações, de acordo com os interesses próprios? Algumas
dessas indagações podem ser refletidas no filme Ensaio Sobre a
Cegueira, de 2008.
Para alguns teóricos, como Melo (1999), a eminência do Estado
deve se fazer ativa, exercendo um papel de correção de problemas
que o mercado e a sociedade civil não são capazes de corrigir. Para
outros, a dimensão estatal não deve ser superlativada, uma vez que
a sociedade civil e os demais arranjos sociais e institucionais derivam
desta. É importante, conduto, frisar que não há certo ou errado
quanto a essa questão, uma vez que, em algumas circunstâncias,
pode-se experimentar modelos de ação pública que possuam
agentes governamentais como eixo principal. Entretanto, existem,
também, as experiências, a partir das quais os atores da sociedade
civil promovem respostas próprias às demandas postas na agenda
pública, fomentando novos modelos de ação e de produção de bens
públicos (OSTORM, 2009). O Estado não é o eixo fundamental, além
das práticas coletivas baseadas na solidariedade, como a economia
solidária e os modelos alternativos de produção (FARIA, 2017).
É claro que todas essas questões e, até mesmo, outras, que
você possa estar refletindo aí, não serão respondidas a cabo,
e, talvez, surjam outras mais, no entanto, é importante sempre
refletirmos acerca da ação estatal e da sua importância para
determinadas situações e grupos sociais.

O olhar mais aprofundado da concepção multicêntrica ajuda a corrigir


distorções históricas, como a de confundirmos (muitas vezes, propositalmente) as
políticas públicas com as políticas governamentais.

16
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Atente-se para outra distinção conceitual importante entre


política de governo e política de Estado. Comumente, utilizam-
se esses dois termos como sinônimos, contudo, é importante
apresentarmos as diferenças teóricas e práticas. Pode-se conceituar
a política de governo como aquele grupo de políticas planejadas e
estabelecidas por agentes do executivo, atendendo às demandas
e interesses do governo. Tal grupo de políticas (de governo),
normalmente, possui menor capacidade de sobreviver aos processos
de alternância e de sucessão política, por não representar interesses
nacionais. Já as políticas de Estado possuem uma capilaridade maior,
e, normalmente, envolvem o executivo e a esfera legislativa, gerando
ações que remetem a um maior tempo de ação e de durabilidade
política, partindo, inclusive, de interesses nacionais menos instáveis,
como segurança nacional (DIAS, 2010; OLIVEIRA, 2011).

Segue uma ilustração da relação entre as políticas governamentais e as


políticas públicas:

FIGURA 1 – POLÍTICAS PÚBLICAS E POLÍTICAS GOVERNAMENTAIS

FONTE: Adaptada de Secchi (2015)

As outras dimensões das políticas públicas (que estão fora dos limites das
políticas governamentais) ainda carecem de melhores compreensões teórica e
analítica, além da própria reflexão das dimensões de efetividade para a sociedade
na qual estão inseridas.

17
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Ponto teórico 3 – Diz respeito à dimensão estrutural das políticas


Ponto teórico
públicas. Para uma corrente de autores, pode-se definir, como políticas
3 – Diz respeito
à dimensão públicas, apenas as “macrodiretrizes estratégicas” (SECCHI, 2015, p.
estrutural das 7), não contemplando os conjuntos de programas. De acordo com essa
políticas públicas. contribuição, as policies são um elemento estruturante, por natureza.

Nessa perspectiva, dimensões políticas, como os planos, os programas


e os projetos públicos, devem ser classificadas apenas como elementos
operativos, assim, instrumentos para a materialização das políticas públicas,
determinadas pelas macrodiretrizes. No entanto, essa vertente teórica sofre
críticas quanto à delimitação, como ilustra Secchi (2015), dado que, sob tal
delimitação, são excluídas, por exemplo, as políticas públicas operacionalizadas
nos níveis municipais, regionais e estaduais, inclusive, as políticas de cunho
intraorganizacional das esferas, que também buscam promover respostas a
determinados problemas públicos.

Outra corrente teórica mais abrangente contempla, na definição de políticas


públicas, as “diretrizes estruturantes” (de nível estratégico) e as “de nível
intermediário e operacional” (SECCHI, 2015). Sob essa dimensão analítica,
pode-se dizer que os programas, os planos e as outras ações, derivadas para a
execução, completam um sistema interligado de atividades inerentes ao campo
das políticas públicas. Observe um sistema por meio da experiência do “Cabo de
Aço como Metáfora de Política Pública”.

FIGURA 2 – CABO DE AÇO COMO METÁFORA DE POLÍTICA PÚBLICA

FONTE: Adaptada de Secchi (2015)

18
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Outra dimensão, defendida nesse contexto, é que as políticas públicas


podem ser efetivadas, na sociedade, de forma complementar, como as pernas,
que formam o cabo de aço da figura anterior. Ao mesmo tempo, essas pernas
também seriam compostas de um conjunto de ações internas que subsidiaria as
bases de ação/implementação. Os arames funcionariam como os projetos e as
ações que integram o corpo de execução da política.

Como destaca Secchi (2015), a figura do arame denota um cenário em que


as políticas públicas se encaixam de forma muito uniforme e padronizada, sendo
bem alinhadas e complementares. No entanto, é preciso desmistificar tal noção,
uma vez que, nem sempre, esse será o cenário real encontrado na análise de
políticas públicas, como veremos nos próximos capítulos deste livro. Por isso,
Secchi (2015) propõe que uma metáfora mais adequada para essa análise seja
a de uma árvore, sendo, esta, a macropolítica (e as macrodiretrizes). Ainda, a
raiz, o tronco e os galhos como as políticas que integram o sistema. Já as folhas
e os frutos seriam a ilustração dos processos e da ação, que operacionalizam as
determinações estratégicas.

Agora que já avançamos com as especificidades teóricas das correntes que


abordam o conceito de políticas públicas, seguiremos a nossa jornada tendo,
como base, outros dois elementos, que são imprescindíveis para que a gente
possa ter uma visão crítica, plural e aberta quanto aos processos, análises e
formulações de políticas.

Não obstante, abriremos duas dimensões ao debate de consolidação


das análises do campo das políticas públicas. A primeira está ligada à não
neutralidade dos modelos, das tipologias e das análises políticas. O campo de
estudos das políticas públicas não possui neutralidade, e deve ser compreendido
com a ampla gama de instrumentos analíticos a partir da compreensão/formação
do policymaker (BOULLOSA, 2013).

A segunda dimensão importante é que quase todas as definições de políticas


públicas são arbitrárias (prescritivas) em si (SECCHI, 2015), isso porque não
há uma forma única de delinear o conceito, e, ao determinar características ou
ferramentas de análise de um objeto que envolve outros agentes, o gestor acaba
por tomar uma posição arbitrária.

2.1 O SURGIMENTO DAS POLÍTICAS


PÚBLICAS COMO CAMPO TEÓRICO
As políticas públicas eram, até meados da década de 1950, objeto do campo
científico da ciência política. Lasswell é um dos pensadores que contribui com o
19
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

estabelecimento de uma ciência que contempla a formulação e a concretização


das políticas (LASSWELL, 1970; ARAÚJO; RODRIGUES, 2017). Era necessário
fomentar a promoção de um mapa cognitivo para auxiliar os processos de análise
das políticas que visassem solucionar problemas públicos, nos mais diferentes
segmentos sociais e em diferentes contextos (LASSWELL, 1970).

Você pode perceber uma primeira noção desse novo campo como tendo
um caráter multidisciplinar por natureza, uma vez que os problemas públicos
não se restringem a uma área do saber científico. Boullosa (2013) indica que as
contribuições teóricas, ao campo das políticas públicas, advindas da economia,
da sociologia, da administração, da geografia e de outras áreas da ciência,
promovem um potencial de não se limitar a um único olhar teórico. Tais inovações
produzem, como resultado, o que Secchi (2015) denomina de policy sciences,
com a produção de um corpo teórico particular, uma série de ferramentais e
de vocabulários analíticos distintos, estes que buscam analisar a dinâmica dos
fenômenos político-administrativos.

Na década de 1980, as políticas públicas ganharam visões e contribuições


acerca da ótica do comportamento dos denominados grupos de interesses
(MARQUES, 2019). Em tais análises, foi marcante o papel das estruturas
institucionais preexistentes, dos modelos e das posições relativas dos agentes,
também, por causa dos recursos disponíveis para a efetivação de ações
(MARQUES, 2019).

Nas últimas duas décadas, houve uma reestruturação do campo das


políticas públicas no Brasil (VENDRAMINI; FEUERSCHÜTTE, 2017). Em
grande parte, essa institucionalização das ferramentas das políticas públicas
acompanhou a expansão de cursos do ensino superior na área de Administração
Pública; a promoção de concursos públicos para cargos estratégicos no governo;
o fortalecimento de novos atores e de instituições na resolução de questões
públicas; e, também, a busca pela consolidação do denominado “campo de
públicas”, composto por uma série de cursos de Administração Pública, Gestão
Social e Gestão de Políticas Públicas (VENDRAMINI; FEUERSCHÜTTE, 2017;
FARAH, 2018). Farah (2018) destaca que uma característica fundamental do
campo das políticas públicas é a multidisciplinariedade.

Para você, que deseja conhecer mais a respeito do Campo de


Públicas, e ler algumas publicações acadêmicas da área, acesse
https://campodepublicas.wordpress.com/.

20
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Para Arretche (2003), a expansão das análises em torno das políticas


públicas brasileiras, nas últimas décadas, está diretamente ligada aos fenômenos
de transformação, nos quais se enquadram a sociedade e o Estado brasileiro.
Nesse sentido, transformações promovidas na esfera de poder de autonomia
dos entes locais, e as reformas estatais, redefinem o campo de ação do Estado,
principalmente, com a deleção de diversas ações para organizações do terceiro
setor (ARRETCHE, 2003). São estabelecidos novos arranjos institucionais de
planejamento e de promoção das políticas públicas. Pode-se considerar que o
processo de redemocratização do sistema político, com a Constituição Federal
de 1988, e a expansão das arenas públicas de discussões temáticas, com os
Conselhos Municipais de Saúde, instituídos por lei, provocam uma oxigenação
institucional ao criar novos canais para a discussão das ações e do poder público
e as demandas sociais nas esferas municipais.

Você se lembra de que falamos, anteriormente, que a dimensão das políticas


públicas vivencia uma ampliação dos atores que as planejam, executam e
avaliam? Pois bem, a promoção de espaços deliberativos, de participação e de
controle social, como os conselhos gestores de políticas públicas, é um exemplo
prático da materialização de arranjos institucionais que vão além da antiga
concepção de políticas públicas como um elemento unicamente estatal.

A inclusão de ferramentas e de ações promotoras de inovação, nas


agendas e nos programas de governo, fomenta o interesse pela avaliação e pela
compreensão dos passos de formulação e de implementação de ações na esfera
pública (ARRETCHE, 2003).

Analisa-se a expansão de políticas fundamentadas em arranjos institucionais


diversificados no cenário brasileiro, principalmente, a partir dos anos 2000. De
modo conciso, muitos desses arranjos se efetivam a partir de uma agenda de
territorialidade, elemento que pode ser notado não apenas nas políticas territoriais
rurais, como na Política dos Territórios da Cidadania, criada em 2008, mas,
também, nas políticas que não se voltam, apenas, para as áreas rurais ou urbanas.
Essencialmente, o que se evidencia é uma transposição das categorias, buscando
o estabelecimento de uma sistematização das ações voltadas, sobretudo, para
a ótica territorial. Assim, destacam-se alguns dos arranjos se caracterizam pela:
(i) articulação de temáticas intersetoriais; (ii) construção de modelos de gestão
de políticas com coordenação entre os entes federativos e a sociedade civil; (iii)
busca de enraizamento nos contextos locais de implementação das políticas. Dito
de outra forma, trata-se de uma tentativa de promover uma integração horizontal
(entre setores de políticas públicas) e vertical (entre entes federativos) e de
absorver, de forma substantiva, a dimensão territorial.

21
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

A respeito dos novos modelos e dos arranjos de políticas públicas, falaremos


mais à frente, no Capítulo 2, no qual serão abordadas as configurações horizontais
e verticais de políticas públicas, além do modelo conceitual, que aborda meios
para o exercício da gestão de políticas públicas compartilhada, por meio de
iniciativas das Parcerias Público-Privadas (PPPs) ou de ações coletivas não
empreendidas pelo Estado. Discutiremos, mais a fundo, a respeito desses novos
arranjos e modelos de ação pública, no Capítulo 3.

Queiroz (2011) sistematiza as políticas públicas como elementos que


congregam conteúdos, instrumentos e aspectos institucionais. A partir do esquema
a seguir, poderemos observar como esses elementos integram e interagem em si
na concepção de ações que se orientam em torno de demandas públicas.

FIGURA 3 – ESQUEMA DOS ELEMENTOS QUE INTEGRAM AS POLÍTICAS PÚBLICAS

FONTE: Adaptada de Queiroz (2011)

A partir da definição de Queiroz (2011), pode-se identificar que os três


elementos constituintes das políticas públicas conduzem os atributos formais
e informais, em outras palavras, os conteúdos, os instrumentos e os aspectos
institucionais que envolvem determinadas policies produzem um tipo de “sistema
operacional”, que direciona a ação e a definição práticas. Tais dimensões auxiliam,
também, na definição de critérios investigativos para a promoção da análise de
políticas públicas.

22
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

É importante fazermos a distinção de dois termos muito utilizados


cotidianamente: análise política e análise de políticas públicas. Análise política
é o processo que busca promover um conhecimento de determinado sistema
de interações, deliberações, articulações e processos técnico-burocráticos que
efetivam o exercício do poder político. Não obstante, a análise está muito ligada
aos processos governamentais, nas esferas administrativa, legislativa e judicial.

A análise de políticas públicas busca empreender um panorama analítico


sobre determinada matéria (ou resultado), constituído pelo sistema político, ou que,
de alguma forma, interage com este e com as pré-definições de competências, de
atribuições de poderes e de execução de ações.

1 - Tendo, como base, os conceitos adquiridos em relação às políticas


públicas até aqui, assinale (V) para as proposições verdadeiras e
(F) para as proposições falsas:

( ) Uma política pública pode envolver, além dos agentes públicos,


agentes privados e do terceiro setor.
( ) Uma política pública não pode envolver agentes do setor privado
na execução.
( ) As políticas públicas podem existir sem a definição de um
problema público.
( ) As políticas públicas, não necessariamente, são políticas de
governo.
( ) As políticas públicas podem tratar de conteúdos simbólicos e não
simbólicos.
( ) As políticas públicas não dizem respeito a atividades o governo
deixa de fazer.

3 DIMENSÕES E MODELOS DE
ANÁLISE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
O campo das políticas públicas também possui modelos analíticos bem
delimitados, a partir de diferentes correntes teóricas que embasam a reflexão,
a promoção e a avaliação das diferentes práticas. Dye (1992) apresenta uma
construção teórica em busca de modelos, e ilustra que estes são representações
que tentam simplificar determinados aspectos do mundo real.
23
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

3.1 MODELO RACIONALISTA


Muitos teóricos racionalistas das políticas públicas passam a se enquadrar no
denominado campo da Análise Racional das Políticas Públicas (ARPP) (Rational
Policy Analysis), que tem, como eixo basilar, a racionalização como meio para melhor
organizar a sociedade (BOULLOSA, 2013). Na sua premissa teórica fundamental,
o racionalismo busca atingir ganhos sociais máximos. Em outras palavras, os
ganhos sociais seriam aqueles que “excedam os custos incorridos na produção
da política” (SANTOS, 2012, p. 63). O conceito de custos em voga não é apenas
econômico, mas, também, são levados em consideração os custos sociais e
políticos, por exemplo.

O modelo racional tem, como pressuposto, que todos os policymakers são os


agentes responsáveis pelos processos de tomada de decisões públicas, também
denominados de tomadores de decisões públicas.

• Possuem conhecimento total das preferências e dos valores da


sociedade, além da importância destes.
• Possuem conhecimento total dos caminhos, das alternativas políticas
possíveis, e das consequências que estes podem gerar à sociedade.
• Possuem capacidade de calcular entre os custos, entre os valores
alcançados e os custos de realização.
• São capazes de buscar, sempre, o caminho político mais eficiente.

A política racional segue os ditames da teoria econômica da concorrência


perfeita. O mercado apresenta, como característica, uma série de especificidades
práticas que contribui para a formação de um cenário tido como “[...] completamente
livre, sem barreiras e totalmente transparente” (VASCONCELLOS, 2009, p. 139).
Nesse sentido, o modelo racionalista das políticas públicas advoga em torno de
um panorama que pode ser equiparado com um modelo de hipóteses “ideais”,
ou, como definido por Marx Weber, “tipos ideais”, que são dimensões abstratas
que servem para a comparação, a tipificação e a análise de diferentes objetos e
fenômenos sociais, como definem Quintaneiro, Barbosa e Oliveira (2003).

O modelo racionalista advém do campo das ciências econômicas clássicas,


que traz a fundamentação de conceitos fundamentais que orientam decisões,
segundo a análise racional (VASCONCELLOS, 2009):

• Hipótese da Racionalidade Ilimitada: os tomadores de decisão sempre


buscam maximizar, da melhor forma possível, os recursos públicos
existentes (princípio da racionalidade do Homo Economicus).
• Inexistência de Externalidades: os tomadores de decisão nunca
são pegos de surpresa por um fenômeno ou evento não planejado, o
24
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

que, na vida prática, é quase impossível, levando em consideração


possibilidades diversas, como eventos e catástrofes naturais; cenários
de crises externas que afetam os cenários locais/nacionais, dentre outros
tantos fatores.

Essas dimensões são tomadas como pontos a serem criticados por teóricos
que compreendem a racionalidade como uma dimensão limitada. Miles e Snow
(1978) advogam que as tomadas de decisões, nas organizações, baseiam-se,
muitas vezes, em percepções imperfeitas, desmistificando a noção de que as
tomadas de decisões e os processos de gestão sempre se alinham em ações
exclusivamente ótimas.

O modelo racionalista pode apresentar uma série de debilidades e


inconsistências. A primeira é a incapacidade de o gestor (operador de políticas
públicas) possuir total conhecimento de todas as preferências, valores da
sociedade e importâncias, além das próprias debilidades de conhecimento total
das ferramentas e das alternativas políticas possíveis para mapear determinadas
ações públicas.

Tranquilamente, você deve imaginar que é muito difícil o segmento político


abdicar dos processos de discussão política, dos jogos de interesse dos
partidos, dos segmentos representados, das articulações de grupos de pressão,
financiadores, lobistas, ativistas e setores da opinião pública, que fazem parte
dos processos de interlocução, construção, execução e avaliação de políticas
públicas.

Ao mesmo tempo, a segunda questão levantada é que, por mais que


possam ser promovidos modelos matemáticos e estatísticos, que busquem
predizer os melhores caminhos para determinada escolha, o campo das políticas
públicas possui uma gama muito ampla de variáveis (econômicas, sociais,
políticas, ambientais, institucionais, tecnológicas etc.), além dos fenômenos que
podem afetar (positivamente e negativamente) os processos de elaboração, de
implementação, de avaliação e de monitoramento.

Você pode se debruçar em outras críticas realizadas ao Modelo


Racionalista de políticas públicas. Uma boa indicação de leitura é o
livro Teorias da Administração Pública, de Robert Denhardt.

25
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

3.2 MODELO INSTITUCIONALISTA


O modelo institucionalista tem, como foco de análise, os processos e os
fenômenos produzidos pelas instituições. Compreendem as políticas públicas
como resultado das duas dimensões, a partir das instituições políticas. Como
destaca Frey (2009), a dimensão institucional está embasada em todas as
estruturas do sistema político, delimitada (e delineada) pelo sistema jurídico, além
de toda a configuração do sistema político-administrativo.

Para grande parte da literatura de abordagem institucionalista de políticas


públicas, as dimensões de análise estão assentadas na observação e na
compreensão do funcionamento de instituições governamentais. De acordo com
Santos (2012), tais estudos buscam a compreensão das instituições em:

• Estruturas.
• Organizações.
• Deveres e funções.

Como estrutura, vale apontar que a vertente institucional traça um forte


caminho ao se consolidar como uma vertente que se debruça sobre as estruturas
políticas, tendo, como foco específico, objetos, como os paradigmas, presentes
nos arranjos, que compõem a unidade de um dado sistema político; e as regras
(formais – leis, regimentos administrativos; e informais – cultura, normas morais);
que subsidiam o funcionamento das instituições políticas.

Outra vertente institucional são as organizações em si, abrindo-se um prisma


de análise mais específico: busca-se um olhar sobre os modelos organizacionais e
como se dão os respectivos funcionamentos. Um destes é a definição do sistema
organizacional, como ele é posto em funcionamento. Você já deve ter ouvido
falar das organizações burocráticas ou desburocratizadas, das organizações
inovadoras ou atrasadas. Outro ponto é a própria finalidade das organizações, e se
o funcionamento atende, efetivamente, ao fim proposto. No caso das instituições
políticas, muitas análises caminham para compreender se determinado órgão
executa ações, de acordo com finalidades institucionais. A terceira dimensão é a
dos deveres e das funções das instituições políticas. Está diretamente relacionada
aos marcos legais, aos sistemas de normas e de condutas institucionais. Ainda,
funcionalidades, presentes em cada tipo de estrutura organizacional, como se
manifestam, operam, e qual o papel dos gestores em cada uma delas (SECCHI,
2015).

26
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Observe a análise de Hood (1986), que pode ser definida como


uma tipologia que apresenta o tipo de organização das ferramentas
governamentais. Uma abordagem interessante, que insere a
perspectiva organizacional no campo da análise de políticas públicas
e promove uma síntese (tipologia) a partir de quatro modelos de
ação. A tipologia de Hood (1986) passa a ser conhecida, então, como
“NATO”, referindo-se às iniciais dos modelos de recursos básicos
utilizados pelos agentes governamentais, a partir das características
exploradas pelo autor.

TIPOS DE ORGANIZAÇÕES GOVERNAMENTAIS PARA HOOD

FONTE: Adaptado de Hood (1986)

A nodalidade (nodality) está relacionada à competência de um


governo de atuar como um nó (um verdadeiro elo) entre os agentes
sociais de uma rede de informações. Um exemplo notório de recursos
informacionais são as propagandas do governo contra a violência
doméstica. Já o recurso “Tesouro” se refere às transferências do
governo (de grande penalidade ou bônus), buscando-se promover
ou cercear determinadas ações dos demais agentes (empresas,
famílias, instituições etc.). Exemplos: subsídios do governo para
produtores rurais, ou taxação de indústrias poluentes. O elemento

27
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

“Autoridade” está ligado ao poder fundamental (legal) de existir.


Exemplo: atividade de comitês diplomáticos; o exercício do poder de
polícia. Por fim, a “Organização”, instrumento de política que define
como o governo se planeja, estrutura-se e define os próprios meios
de ação. As ações do governo podem ser realizadas por empresas,
comunidades, empresas públicas, organizações sociais etc.

Para ter acesso ao primeiro capítulo do livro de Hood


(1986), basta clicar em http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/
download?doi=10.1.1.678.2664&rep=rep1&type=pdf.

Uma lacuna dessa vertente de estudos institucionais é a pouca sistematização


a respeito dos impactos das formas institucionais sobre os resultados finais das
políticas (policies), de forma que, apesar do papel importante dado à estrutura das
instituições, falta uma conexão mais densa entre as formas institucionais (como
cada instituição política se organiza e opera) e o conteúdo resultante, em políticas.

Você pode perceber que o olhar desse modelo é muito restritivo, cobrindo
apenas o âmbito das próprias instituições. Assim, podem ser apontados outros
fatores limitantes do modelo institucionalista:

• Relações externas às instituições: o foco institucionalista é o âmbito


interno de uma instituição política, além do funcionamento. Contudo, o
olhar deixa passar despercebidas as diversas variáveis e os fenômenos
externos a essas instituições, mas que possuem papel fundamental
na compreensão de como surge uma dada política pública. Ex.: Não é
apenas observando os fatores organizacionais da polícia militar que você
pode compreender por que determinados indicadores de criminalidade
aumentam ou diminuem em uma cidade. Fatores, como renda,
vulnerabilidade social e sistema jurídico, podem ser predominantes para
a compreensão do cenário.
• Quem participa dos processos institucionais: outra dimensão pouco
abordada no institucionalismo político se refere a que grupos de poder
interagem em determinada instituição para que uma política seja
produzida (ou não produzida).
• Como os agentes participam dos processos institucionais: é válido
ressaltar que, para além de quem participa, deve-se ter uma compreensão
de como se dá a participação desses atores nos processos institucionais.
Algumas políticas surgem como fruto de pressão popular, como a Lei da
Ficha Limpa.

28
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Apesar das latentes brechas do modelo institucionalista de políticas públicas,


são inegáveis os avanços e as contribuições que os estudos práticos e teóricos
trazem para o campo, inclusive, no que diz respeito ao olhar mais aprofundado
para as formas e os modelos organizacionais das instituições políticas.

3.3 MODELO SISTÊMICO


O modelo sistêmico de Easton (1953) é baseado na Teoria dos Sistemas.
É um dos modelos analítico-teóricos com maior abrangência na literatura de
políticas públicas, pois têm, como centralidade, a análise dos processos de
planejamento, de construção, de avaliação etc. Um dos avanços do modelo de
análise sistêmica é a configuração mais dinâmica, capaz de abranger variáveis e
fenômenos externos que influem uma dada política pública analisada. Ao mesmo
tempo, o modelo também pontua que uma determinada política pública pode
afetar (positiva ou negativamente) outros conjuntos de policies, incorrendo na
configuração de um modelo de análise aberto, e que replica a complexidade dos
fenômenos sociais contidos nas políticas públicas, que não são implementadas
como elementos isolados e sem correlação diante das transformações sociais.

Atente-se ao funcionamento do sistema político a partir da compreensão


sistêmica:

FIGURA 4 – SISTEMA POLÍTICO NA ABORDAGEM SISTÊMICA

FONTE: Adaptada de Santos (2012)

29
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Observe que a abordagem sistêmica possui, como elementos fundamentais


de análise das políticas públicas, dois fatores: os inputs (as entradas) e os outputs
(as saídas). As entradas de um sistema podem ser definidas como aqueles fatores
e recursos que subsidiam a ação em prol de uma demanda pública:

• Demandas populares (opinião pública): as demandas formadas pela


opinião pública, também denominadas de demandas populares, são
um elemento que pode interferir ativamente no processo de entradas
e de formulação de políticas públicas. O potencial que uma demanda
ganha, ao ser reconhecida como pública, acaba pressionando os
gestores públicos, para que olhem, de forma mais específica, para essa
causa (mesmo quando estes não possuem o interesse de acolhê-la).
Isso se dá pelo alto poder de legitimação de causas da opinião pública
na conformação da agenda pública (veremos casos mais efetivos no
próximo capítulo).
• Grupos de pressão específicos: são, no geral, grupos de pressão que
reivindicam causas mais especializadas, e que, geralmente, possuem
pouca aderência da população. No entanto, alguns desses grupos
possuem forte capital social, o que ajuda a promover ações de pressão
sobre os tomadores de decisões e a agenda pública. Em alguns casos, os
grupos de pressão específicos possuem alto conhecimento das causas
e das demandas, tornando-se as fontes para a produção de políticas
públicas nas áreas de influência. Ex.: Conselho Federal de Medicina.
• Lobby: apesar de não ser institucionalizado no Brasil, o lobby pode ser
percebido, efetivamente, como um processo de entrada e de pressão
por políticas públicas. É uma atividade de influência que busca interferir
diretamente nas decisões de agentes estatais em prol de vantagens
diante um determinado cenário. Ex.: empresas agroexportadoras que
buscam apoio do governo e redução de burocracias para exportar
produtos.
• Apoio de atores não estatais: apoios e posicionamentos de outros
agentes, não necessariamente, estatais, mas que afetam o cenário de
determinadas discussões e agendas públicas.

Já as saídas do sistema podem ser definidas como os resultados obtidos


a partir do processo de execução da atividade política (politics), do exercício do
poder sobre o homem. Como exemplos, podemos lembrar de vários produtos
obtidos no cotidiano pela vida política, que vão desde os mais tangíveis e palpáveis
até os mais intangíveis e mais difíceis de serem valorados e qualificados:

• Deliberações.
• Políticas públicas efetivas (saúde, educação, segurança pública).
• Regulamentos e normas administrativas.

30
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

O sistema político (withinputs), assim como no modelo institucionalista,


também se faz presente na análise sistêmica, como você pôde perceber na figura
anterior. Importante destacar que os withinputs são, de acordo com a abordagem
de sistemas, todos os instrumentos, processos e fenômenos que compõem o
funcionamento do sistema político, este que formula, orienta, executa e avalia as
políticas públicas. Estão na centralidade da abordagem, pois, a partir da interação
entre o sistema político e as entradas, produzem-se as decisões políticas e as
ações (que podem ser efetivas ou não). Um exemplo de como funciona a política
pública, de acordo com a abordagem sistêmica, é apresentado por Rua (1997):
reclamações e exigências de cidadãos, por bens e serviços, como saúde (as
entradas), promovem o insumo, para que o sistema político produza respostas a
tais reivindicações por meio de políticas públicas voltadas para a saúde.

O “resultado”, entre as entradas e os processos inerentes ao sistema político,


não é, de acordo com a abordagem sistêmica, um fim, por si só, do fenômeno
dos processos de gestão de policies, isso porque muitas políticas públicas que
conhecemos são resultados evidentes do feedback de ações anteriormente já
realizadas, e que foram aprimoradas ou reformuladas pelo sistema político. Um
exemplo é o Programa Bolsa Família (PBF), uma política federal de transferência
de renda e combate à pobreza e desigualdade, criada em 2003. Em 2004, a Lei
Federal nº 10.836, de 4 de janeiro, que unificou e reestruturou um conjunto de
políticas federais já existente, como o Programa Nacional de Renda Mínima,
vinculado à educação (Bolsa Escola); o Programa Nacional de Renda Mínima,
vinculado à saúde (Bolsa Alimentação); e o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação (Fome Zero) (SOARES; SÁTYRO, 2009; BRASIL, 2021).

Em outros casos, o feedback de uma política pública demonstra que, na


prática, a existência é inviável, ou que a execução se apresenta totalmente fora
de contexto. Daí, você pode perceber a importância de mais esse elemento no
ciclo de gestão de políticas públicas.

O feedback, no modelo sistêmico, nada mais é que o retorno


gerado a partir dos resultados produzidos pela política pública. Logo,
retroalimenta o sistema político com informações, visões e análises
que subsidiam a produção de novas entradas, ou seja, o subsídio
para outros processos de ação política.

31
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Os feedbacks são influenciáveis e produzidos a partir do contexto em que


cada sistema político se encontra. Da mesma forma, a definição pode variar,
substancialmente, de política pública para política pública, a depender de uma
série de fatores ambientais que ajuda a direcionar o debate público e o processo:

• Interesse governamental.
• Interesse da população.
• Opinião pública e grupos de pressão.
• Recursos financeiros.

A análise do ambiente e das variáveis, que afetam o sistema político, é um


exercício importante para ampliar a compreensão, de qualquer gestor de políticas
públicas, a respeito de como proceder a partir das dinâmicas existentes no
contexto de ação.

O gestor público deve romper com toda a noção prescritiva e


determinista, que busca reduzir a gestão de políticas públicas aos
padrões e aos paradigmas postos como respostas prontas e que
sempre geram bons instrumentos de gestão. Outra crítica, realizada
por parte da literatura, aos modelos clássicos de políticas públicas, é
a da racionalização extrema dos processos analíticos e da aplicação
dos conceitos.

Outro ponto importante, para que você compreenda o funcionamento do


modelo sistêmico, é a sua relação com as escalas, isso porque as entradas
do sistema político (inputs) não estão presas a nível nacional, mas podem
ser produzidas na esfera internacional (SANTOS, 2012), por meio da ação/
intervenção de agentes, como outros Estados, organismos internacionais,
empresas multinacionais ou transnacionais, organizações não governamentais
internacionais etc.

Cabe apontar a complexidade da análise sistêmica ao propor um referencial


que analisa as políticas públicas, incluindo, como partes da análise do sistema
político, as dimensões da elaboração de políticas públicas em diferentes etapas,
podendo, cada uma, ser analisada de forma especifica, com as suas configurações
(HAM; HILL, 1993). Há, ainda, a retroalimentação do sistema político a partir das
“saídas” geradas nessas etapas (ESTEVÃO; FERREIRA, 2018). Como denota
Santos (2012), o arcabouço sistêmico denota uma série de relações de escalas e

32
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

de sistemas, uma vez que o sistema global/internacional é formado pelos sistemas


nacionais dos Estados-nação, e, estes, compostos pelos seguintes subsistemas:

• Subsistema econômico (formado pelas relações de produção,


investimentos, troca e circulação de bens e de serviços).
• Subsistema social (composto pelas relações dos grupos sociais, classe,
gênero, etnia, gerações etc.).
• Subsistema cultural (dotado de variadas manifestações artísticas,
religiosas etc.).
• Subsistema político, constituído pelo conjunto das instituições do
Executivo, do Legislativo, do Judiciário, além das instituições de
representação de interesses, da administração pública e das forças de
segurança pública.

Nesse último subsistema (o político), os inputs de demanda e de apoio


de entrada se estruturam e se dinamizam, produzindo as variadas formas de
sistemas políticos (withinputs) e os resultados destes.

Apesar de apresentar uma dinâmica complexa de sistemas, fenômenos e


conceitos, o modelo sistêmico também sofre algumas críticas quanto a debilidades.
A primeira delas, que podemos enumerar, é a forte tendência reducionista, a partir
da qual o modelo apresenta processos complexos e que envolvem uma série
de atores. Nem sempre esses processos seguem caminhos lineares. A segunda
debilidade é exposta por Santos (2012), sendo a fragilidade crítica de alguns
conceitos da teoria sistêmica. Um exemplo é o conceito de “entradas” (inputs).
Não se reconhece uma ampla gama de fenômenos existentes no processo de
elaboração de políticas públicas, como “manipulação de linguagem, criação de
crises, imposição de agendas para autoridades ou, até mesmo, simulação de
políticas” (SANTOS, 2012, p. 71).

Outra questão se refere ao fato de a análise sistêmica enfatizar os processos


de conversão de “entradas” em “saídas” no âmbito do sistema político (ou seja, os
processos de tomada de decisões). Contudo, na prática, a vertente pautada nos
sistemas acaba ofertando pouca atenção, ao comparar as dinâmicas da esfera
política com as entradas (demandas e apoios externos) (HAM; HILL, 1993). Tal
noção passa a impressão de que o sistema político, em si, não produz as próprias
demandas e os apoios externos, o que, na prática, não é verdade. O modelo de
análise das políticas públicas, a partir do sistema no qual se insere, possui, como
fator positivo, o olhar mais amplo sobre o cenário em que determinado campo
de forças se delineia. Em outras palavras, o modelo sistêmico adquire um olhar
mais abrangente, contemplando as dimensões externas, que envolvem e afetam
o cenário analisado das políticas públicas, o que, na prática, traz uma análise
mais ampla e realista do complexo cenário de interlocuções e de interações de
formulação das policies.
33
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

3.4 MODELO GESTÃO DE


PROCESSOS
A Gestão de Políticas Públicas por Processos tende a perceber todas as
atividades voltadas para a intervenção de problemas públicos, como processos.
Deve-se ter em mente que o ponto principal desse modelo teórico é i conjunto de
passos que determina uma dada política pública.

Importante ressaltar que a vertente de políticas públicas, que adota uma visão
processual, guarda dois elementos comuns: a noção de ações coordenadas entre
si, a partir da relação de diferentes tipos de atores e de instituições; e estes, que
podem estabelecer redes (formais ou não formais), a depender dos contextos
em que se inserem os processos em questão (ALMEIDA; GOMES, 2018), ou
seja, as ações processuais seguem forma “determinada” para o comprimento
de uma política, e, sobre essas etapas do processo, busca-se compreender,
analisar, inferir melhorias. Dessa forma, o modelo processual de políticas
públicas assume a construção das policies por meio de etapas interligadas, a
partir de aprimoramentos e de práticas em escala contínua, nos procedimentos
organizacionais (DA PAZ; BERMEJO; SILVA, 2020). Logo, independentemente de
qual política estamos tratando, sempre serão interligadas, por constituírem parte
de um mesmo continuum: a formulação de uma política pública.

A estrutura de processos mais adotada, nos estudos e na promoção prática


de políticas públicas, será sintetizada a seguir:

FIGURA 5 – ESQUEMA DE ATIVIDADES DO MODELO DE GESTÃO DE PROCESSOS

FONTE: Adaptada de Santos (2012)

34
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

“Identificação dos problemas”: é a fase na qual se determina um dado


fenômeno como objeto de ação e intervenção públicas. A partir do olhar
processual, é necessário frisar que, a partir da identificação, todos os demais
passos processuais são balizados, uma vez que a definição, por exemplo, de
um problema público, como emergencial, pode gerar um processo que deve
receber atenção e discussão no âmbito da sociedade, atingindo possibilidade de
legitimação (ou não) e rapidez na execução. Em síntese, Dunn (2015) explica que
a maneira como um problema público é determinado molda toda a maneira de se
buscarem propostas de soluções.

“Formulação de Propostas, ou da Agenda de Proposta”: é a fase em que


se determinam quais são os caminhos a serem traçados pelos policymakers
para a resolução do problema definido anteriormente. Note que esse processo é
inteiramente ligado ao anterior, e a definição passa pela compreensão de como
determinado problema público atinge ou não a sociedade.

“Legitimação da Política”: momento em que, a partir da construção coletiva


(participação) ou da determinação tecnicista, uma determinada política é traçada
como caminho. Muitas vezes, esses elementos se misturam em uma mesma
política pública, tendo, esta, elementos legitimados pela formulação coletiva
de propostas, contendo outros elementos de caráter estritamente tecnicista ou
burocrático.

“Implementação da Política”: como o próprio nome sugere, é a fase na qual


se executam, de fato, as ações anteriormente discutidas e planejadas, a respeito
do problema previamente definido. Esse processo pode ocorrer de diferentes
formas, e nós as veremos, de forma mais detalhada, no Capítulo 2.

A “Avaliação” é a fase em que os tomadores de decisões públicas devem


averiguar os resultados obtidos com a implementação da política. A avaliação,
como parte processual, deve considerar as dimensões positivas e negativas da
ação/intervenção, e propor possíveis soluções e melhorias a partir dos passos
formulados (agenda proposta).

Tais etapas podem ser associadas ao Ciclo de Políticas Públicas (CPP), que
veremos mais à frente, no próximo capítulo. Na verdade, o CPP é um exemplo
(se não, o mais famoso e discutido) do arcabouço teórico produzido com base
em uma visão processual do campo das análises de políticas públicas (policies
analysis).

A principal limitação do modelo processual é o direcionamento para as etapas


e as atividades que fazem parte da construção de uma política pública, o que
nos permite conhecer, mais a fundo, as dimensões que delineiam a formulação, a

35
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

implementação e a avaliação. Contudo, deixa-se de considerar outras dimensões,


como o próprio conteúdo da política (DYE, 1992; SANTOS, 2012).

3.5 MODELO DA TEORIA DE GRUPO


O modelo baseado na “Teoria de Grupo” apresenta o conceito de política
como se esta fosse um “[...] processo de obtenção de equilíbrio entre os interesses
de diferentes grupos” (SANTOS, 2012, p. 62). Logo, a principal chave analítica
desse modelo é a forma como determinados grupos sociais se relacionam, além
dos resultados das interações, que se manifestam em políticas públicas.

Grupos são organizações de interesses afins, que pressionam os governos


para o atendimento a várias demandas.

As principais dimensões da abordagem da Teoria de Grupo são as interações


políticas, como elas ocorrem e entre quais atores sociais. Um conceito importante
a ser definido, nesse sentido, é que tais relações ocorrem em um espaço
determinado: na arena pública. Essa arena pública, ou “policy arena” (conceito
em inglês), não deve ser confundida apenas com o espaço de reuniões públicas,
onde as políticas públicas são debatidas ou votadas. A “policy arena” é um
conceito trazido por Lowi (1985), e se refere ao processo de interação entre os
grupos sociais diante determinada política e os respectivos interesses. A “policy
arena” “[...] se refere, portanto, aos processos de conflito e de consenso dentro
das diversas áreas de política“ (FREY, 2009, p. 223). Assim, a Teoria de Grupos
está diretamente ligada à tipologia, que será apresentada na próxima seção:
as políticas distributivas, redistributivas, regulatórias e constitutivas. Em cada
um desses modelos de políticas, os grupos sociais possuem uma dinâmica de
interação, a depender, principalmente, de dois fatores: 1) os custos que cada
grupo adquire com determinada política; e 2) os lucros que determinada política
oferecem para cada grupo.

A respeito do funcionamento específico de cada um desses segmentos de


políticas, trataremos, mais à frente, ao abordarmos a Tipologia de Lowi (1964).
Por hora, torna-se mais importante ressaltarmos outro elemento que fundamenta
o modelo de análise da Teoria dos Grupos nas políticas públicas: o “policy
networks”.

Entendem-se, como “policy networks”, os processos de diferentes relações


e diálogos que envolvem as instituições do Estado (Judiciário, Legislativo,
Executivo) e as da sociedade civil (organizações sociais, movimentos sociais e
grupos de pressão) nos processos de formulação e de execução das políticas

36
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

públicas (FREY, 2009). A formalização desses grupos está ligada ao processo


de articulação entre setores sociais, estes que buscam materializar interesses e
demandas em ações acolhidas pelos entes governamentais (CAPELLA; BRASIL,
2015).

Outros processos em grupos menores e com ação mais focalizada são


conceituados como “issue networks” (FREY, 2009). Os “issue networks”
são, também, denominados, na literatura brasileira, como redes temáticas.
A permanência dos agentes é mais significativa e instável do que nos “policy
networks”, tendo, como forma relacional, uma ampla gama de níveis de
comprometimento e de interdependência.

Se você tiver interesse em conhecer mais os conceitos de


“policy networks” e de “issue networks”, além de outros relacionados,
como “triângulo de ferro” e “policy communities”, recomendamos
um ótimo artigo a respeito do tema: Análise de Políticas Públicas:
Uma Revisão da Literatura Sobre o Papel dos Subsistemas,
Comunidades e Redes, escrito por Ana Cláudia N. Capella e Felipe
Gonçalves Brasil. Está disponível em https://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0101-33002015000100057.

3.6 MODELO DA TEORIA DOS JOGOS


A Teoria dos Jogos surge como um campo de análise dos problemas de
interação entre diferentes agentes econômicos. A decisão de cada agente
(governo, firma ou indivíduo) acaba afetando e é afetada pelas decisões dos
demais agentes envolvidos no processo (VASCONCELLOS, 2009). O modelo da
Teoria dos Jogos foca, então, nas situações em que as escolhas dos indivíduos e
os resultados destas são interdependentes (SANTOS, 2012). Na análise prática,
é como se fosse um “jogo”, no qual os participantes, com interesses variados,
são modelados pelas regras estabelecidas em cada contexto. Nesse sentido, o
resultado de cada jogador depende das escolhas realizadas por cada um. Logo,
em cada situação, o modelo da Teoria dos Jogos, para a análise de políticas
públicas, é constituído das seguintes dimensões: 1) agentes, que determinam
as próprias escolhas; 2) conjunto de ações disponível para cada agente; 3)
informações, que podem subsidiar as escolhas e os interesses das ações
de cada agente; e, 4) resultados finais das escolhas de cada agente (payoffs)
(VASCONCELLOS, 2009).
37
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Os resultados, também denominados de payoffs, são um dos pontos


primordiais da análise de jogos para a política pública, pois determinam os efeitos
e as repercussões oriundos da escolha de determinado jogador. Afinal de contas,
a partir de uma gama de possibilidades, de ações, qual é o possível resultado
efetivo de cada uma dessas possibilidades? Retornaremos a essa questão logo
mais, mas, antes de nos aprofundarmos um pouco na análise do modelo aplicado
à gestão de policies, torna-se relevante apresentar a matriz de possibilidades
clássica da Teoria dos Jogos, também denominada de “Dilema dos Prisioneiros”:

QUADRO 1 – MATRIZ A DETERMINANTE DE RESULTADOS


DO “DILEMA DOS PRISIONEIROS”
Prisioneiro A
Alternativa A1 Alternativa A2
Alternativa B1 Resultado A1B1 Resultado A2B1
Prisioneiro B
Alternativa B2 Resultado A1B2 Resultado A2B2
FONTE: O autor

Considere uma situação na qual dois prisioneiros cometem determinados


crimes juntos, e, para obter a confissão de cada um deles, o policial separa os
dois, interrogando um por vez, de forma separada, estando, estes, incomunicáveis.
Logo, algumas alternativas básicas, para cada um dos prisioneiros, são: um
confessar o crime e, o outro, não; os dois confessarem; ou, então, nenhum dos
dois confessar os crimes.

As regras de punição, diante de tais delitos, são: se um confessar o crime, e,


o outro, não, o que confessa ganha liberdade imediata, e o outro pega 10 anos de
prisão. Já para o prisioneiro que não confessa o crime, ganha um ano de prisão,
uma vez que, não existindo provas suficientes, logo, deve ser solto. Caso ambos
confessem o crime, são condenados a três anos de prisão. Diante das regras
estabelecidas, a matriz determinante de resultados dos prisioneiros ficaria da
seguinte forma:

QUADRO 2 – MATRIZ B DETERMINANTE DE RESULTADOS


DO “DILEMA DOS PRISIONEIROS”
Prisioneiro A
Confessa Não Confessa
Confessa ( - 3; - 3) ( - 10; 0)
Prisioneiro B
Não Confessa ( 0; - 10) ( - 1; - 1)
FONTE: Adaptado de Vasconcellos (2009)

38
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Os números entre parênteses são os valores referentes aos números de anos


de prisão, de acordo com a alternativa de cada prisioneiro. Os sinais negativos
representam as penalidades possíveis.

A partir do quadro anterior, pôde-se evidenciar que a estratégia “não confessa/


não confessa” seria a melhor para ambos os prisioneiros, mas, notando que os
prisioneiros estão isolados e sem a possibilidade de comunicação, é razoável
supormos que o prisioneiro A possa pensar no seguinte: caso o prisioneiro B
confesse, a melhor estratégia para o prisioneiro A é confessar também, fugindo
da pena de 10 anos de prisão, com direito a três. No entanto, caso o prisioneiro B
não confesse a participação, a melhor possibilidade de ação, para A, é confessar.
Assim, A fica livre de pegar prisão. Logo, pode-se concluir que a melhor estratégia
do jogador A é confessar, dadas as regras impostas no cenário em questão e as
possíveis estratégias de B.

A chave da reflexão de alternativas em questão vale para o prisioneiro A e para


o B. Então, podemos resumir que a melhor estratégia do jogador B é, igualmente,
confessar. Resumindo a questão: confessar é a estratégia dominante, pois é
a melhor saída para ambos. Chegamos, então, ao desfecho do jogo, no qual
ambos confessam. O resultado não se apresenta tão interessante para ambos
os prisioneiros, pois ambos ganham três anos de penalidade. Trata-se, aí, de
um resultado centrado na denominada estratégia ótima, dada a estratégia
adotada pelo outro jogador. Como destaca Vasconcellos (2009), esse resultado
é denominado, na economia, de “Equilíbrio de Nash”.

John Nash foi ganhador do Prêmio Nobel de Economia, em


1994. Matemático de formação, tornou-se referência na “Teoria dos
Jogos”, com o “Equilíbrio de Nash”. Apesar de não ter o interesse
direto de auxiliar, é possível que a busca individual de alguns
agentes, pela melhor solução, possa promover uma situação de jogo
na qual os próprios agentes formulam uma condição de estabilidade,
a partir da qual se busca a segurança de reduzir grandes riscos para
si, evitando quaisquer comportamentos que alterem, drasticamente,
o cenário de estabilidade.

39
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Um dos conceitos guardados para a opção de adotar a estratégia máxima é


a capacidade de os indivíduos buscarem “maximizar a probabilidade de perda
mínima”. Termo que também pode ser compreendido como maximim (SANTOS,
2012). A dimensão posta em questão é a possibilidade que cada prisioneiro tem
de reduzir as próprias chances de ser condenado aos 10 anos de prisão, dessa
forma, mesmo havendo a possibilidade de comunicação entre os prisioneiros,
ainda, há o medo de um dos lados trair o outro.

Agora, voltando para o campo da gestão de políticas públicas, o modelo da


Teoria dos Jogos auxilia na compreensão das possibilidades de ação dos agentes
envolvidos em uma determinada situação. O caso anterior é um exemplo clássico
de jogo estático, e não comporta toda a dinâmica do processo de escolha das
decisões políticas, como observam Almeida (2003) e Vasconcellos (2009). Outras
modelagens da Teoria dos Jogos podem servir para situações mais dinâmicas,
como a partir de cenários de informação imperfeita e de compreensão das relações
de poder entre agentes que atuam sob diferentes cenários. A teoria do sociólogo
alemão Nobert Elias (2005) avança, nesse sentido, ao influir a dimensão do poder
nos processos, que, inevitavelmente, está presente nas relações dos agentes
e nas tomadas de decisão. Ao mesmo tempo, há a agregação de interesses
individuais, que corrobora para a manifestação de novas tomadas de decisão, e,
consequentemente, de poder.

Dependemos dos outros; os outros dependem de nós. Na


medida em que somos mais dependentes dos outros do que
eles são de nós, em que somos mais dirigidos pelos outros
do que eles são por nós, estes têm poder sobre nós, quer
nos tenhamos tornado dependentes deles pela utilização
que fizeram da força bruta ou pela necessidade de dinheiro,
de cura, de estatuto, de uma carreira ou, simplesmente, de
estímulo (ELIAS, 2005, p. 101).

Elias (2005) inova, ao desmistificar a maneira rígida e estratificada de se


compreender o arcabouço teórico dos jogos. Ao mesmo tempo, contribui para uma
aproximação entre o campo e as ciências sociais, ao relacionar os processos de
tomadas de decisão como dinâmicas complexas e que dependem, efetivamente,
de especificidades, causadas pela própria dinâmica da vida social. Um cidadão,
apesar de possuir uma gama de escolhas e de liberdades, também é dependente
de uma série de escolhas tomadas, de decisões de gabinetes, de interesses
projetados em policies planificadas e executadas a partir de interesses de outrem.

Outra dimensão própria da contribuição de Elias (2005) é o refinamento crítico


quanto à possibilidade de os indivíduos sociais se apresentarem no cenário de
decisões públicas, de acordo com parâmetros da racionalidade estruturada pela
teoria clássica dos jogos. Conforme "[...] cresce o número de jogadores, o jogador

40
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

individual não só começa a achar o jogo cada vez mais opaco e incontrolável,
como, também, torna-se consciente das impossibilidades de compreendê-lo e de
controlá-lo” (ELIAS, 2005, p. 92).

Fica evidente a dificuldade de materialização de todas as possibilidades


de ação dos indivíduos e dos grupos sociais, além das relações destes com as
dimensões de gestão de políticas públicas e dos processos decisórios produzidos
pelo sistema político. A racionalização das relações humanas e dos próprios
modelos de interação das instituições é uma crítica latente ao modelo da Teoria
dos Jogos. Ainda, há a impossibilidade de os gestores e os tomadores de decisões
públicas sempre deterem um sistema completo de informações suficientes para a
promoção de uma avaliação racional das chances de perdas, de ganhos e de
estruturar, racionalmente, um “maximim”, maximizando as probabilidades de
perda mínima.

3.7 OUTROS MODELOS RELEVANTES


O campo das políticas públicas possui outros modelos de grande relevância,
por trazerem contribuições teóricas e analíticas para a área. Um desses modelos
é o da “Teoria das Elites” (também denominado de Modelo Elitista). De acordo
com essa vertente, as políticas públicas são “[...] o resultado de preferências e de
valores de elites governamentais” (SANTOS, 2012, p. 62).

Não existem outros fatores preponderantes, na cena política, que


materializem, significativamente, os interesses das camadas governadas. Sejam
grupos de pressão, partidos políticos, ou, até mesmo, veículos midiáticos, todos
esses atores seriam, de acordo com esse modelo, controlados pelos interesses das
elites. Tal definição deriva da reflexão teórica de Pareto, Mosca e Michels: a “Teoria
das Elites” defende a existência do controle das instituições e das organizações
sociais por um pequeno grupo bem definido e ajustado em objetivos. Controlam os
sistemas político, jurídico e econômico, dessa forma, as contribuições promovidas
pelo campo político (polity). Assim, “[...] não ocorreriam mudanças e inovações
muito significativas nas políticas públicas, mas apenas ajustes marginais e
incrementais, decorrentes de mudanças operadas nas próprias elites, as quais
seriam, por sua vez, conservadoras” (SANTOS, 2012, p. 62-63). Um ponto crítico
a esse modelo é que a base teórica não dá conta de explicar os períodos e as
situações em que ocorrem conflitos entre grupos de interesses da própria elite, iso
porque, apesar de ser classificado como um grupo homogêneo, bem definido e
ajustado, a elite possui, por vezes, grupos de interesse antagônicos. Um exemplo
bem claro é quanto a disputas de empresas multinacionais por liderança e poder
nos seus respectivos mercados. Outro elemento de inconsistência, talvez, mais

41
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

evidente, é que, por vezes, os grupos da elite se opõem quanto a normas e ao


funcionamento do sistema político democrático, tendo, os partidos políticos, os
grupos de pressão e os veículos de comunicação, importantes papéis de mediar
tais embates e de promover conformidades sociais.

Outro modelo de políticas públicas que segue um linear parecido ao da Teoria


das Elites é o “Modelo Incremental”, que defende a concepção de que todas as
políticas nunca possuem – e nem devem possuir – a capacidade de promover
alterações substanciais no status quo do sistema político (SANTOS, 2012). Outro
elemento relevante é que, de acordo com os teóricos incrementais, o modelo
racional apresenta uma série de variáveis incontroláveis e fatídicas às incertezas.

As contribuições sugerem que os gestores de políticas públicas possam


promover ações que sejam, de fato, cautelosas com as prescrições e os
receituários, estes que buscam promover transformações sociais profundas.
Ao mesmo tempo, sugerem, aos policymakers, um caminho de promoção de
ações que busque resultados mais módicos, e que sirvam de base para políticas
que sejam igualmente módicas, sem produzir rupturas ou fortes processos de
discussão entre diferentes grupos sociais. Nesse sentido, o modelo apresenta um
caminho agradável para o tipo de gestor que não deseja se comprometer com
impasses e embates de grupos de interesses, como aqueles promovidos por
políticas redistributivas, por exemplo.

Uma crítica ao modelo incremental é que, nem sempre, é possível, ao


gestor de políticas públicas, manter-se no caminho de parcimônia, afastando-se
dos processos de diálogo, de conflito e de disputa entre grupos de interesses
com demandas distintas (e, por vezes, antagônicas). Algumas políticas públicas
simples e corriqueiras acabam promovendo interesses em detrimento de outros,
fator que, por si só, pode promover conflitos e rupturas. Um exemplo é a Taxa
Selic, conforme explicitado a seguir:

42
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

FIGURA 6 – O GOVERNO E A TAXA SELIC

FONTE: O autor

O exemplo anterior, da taxa básica de juros, é bem propício para demonstrar


que alguns tipos de política pública sempre influirão em processos de divergência,
uma vez que a pluralidade da sociedade releva grupos distintos de interesse.
Considerando uma situação qualquer de estabilidade econômica, pode-se
considerar que os consumidores (em geral) têm grande interesse na redução da
Taxa Selic, o que amplia a capacidade de crédito e, ao mesmo tempo, reduz o
custo de empréstimos. Já os bancos e as outras instituições financeiras possuem
interesse no aumento da Taxa Selic, pois se eleva o custo de empréstimos e de
financiamentos, logo, esses agentes se beneficiam.

Se você tiver interesse em conhecer mais a respeito da Taxa


Selic e da produção de políticas monetárias de juros no Brasil, dados
históricos e outras informações, acesse o link do Banco Central:
https://www.bcb.gov.br/controleinflacao/taxaselic.

43
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Agora que já conhecemos as principais abordagens teóricas do campo


das políticas públicas, passaremos para outro assunto de grande relevância
investigativa e de gestão: as tipologias de políticas públicas.

1 - Apresente como é definido o modelo sistêmico de políticas


públicas, e explique o que são inputs, outputs e withinputs

4 TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS
PÚBLICAS
Antes de aprofundarmos a nossa análise das políticas públicas em si, e das
definições teóricas mais recorrentes, dirigiremos os nossos olhares para a reflexão
das “tipologias” de políticas públicas. Afinal, você sabe o que são tipologias? Uma
resposta simples e bem objetiva: são os estudos realizados a partir dos atributos-
característicos que definem determinado conjunto de dados ou fenômenos. O
ponto fundamental de qualquer tipologia é a determinação de quais atributos ou
características devem ser o ponto focal de determinação das variáveis, para que,
assim, possam ser produzidas as classificações do objeto estudado, tendo, como
premissa, a alocação em tipos ou em grupos.

As tipologias de políticas públicas podem ser compreendidas como formas


de classificar as políticas públicas, sendo, estas, o centro do processo analítico.
Deve-se ter em mente que podem existir diversas maneiras ou olhares distintos
na produção de tipologias de políticas públicas a partir das características que se
buscam compreender em um sistema de fenômenos (DIAS, 2010). As tipologias
podem ser formuladas, tendo, como base, “a essência, a intencionalidade, a
estrutura de indução de comportamento e os resultados esperados da política
pública” (SECCHI, 2015, p. 25). Não obstante, deve-se levar em conta que outras
formas tipológicas de políticas públicas podem ser criadas a partir do interesse do
policymaker ou do pesquisador, que se debruça na investigação de determinadas
categorias analíticas. Alguns exemplos de categorias analíticas de políticas
públicas são:

• Quanto ao impacto social.


• Quanto ao custo/benefício.
• Quanto ao conteúdo tecnicista ou político.
• Quanto à intencionalidade (proposital ou não intencional).
44
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

A seguir, abordaremos, mais a fundo, na experiência teórica, algumas


tipologias presentes na literatura de políticas públicas. Dois pontos devem ser
ressaltados quanto ao método de produção das tipologias: 1) a dimensão teórica
guarda, em si, um recorte analítico proposto pelo investigador; e 2) as tipologias
são quadros resumidos de uma realidade mais ampla e complexa.

4.1 TIPOLOGIA DE LOWI


O cientista político Theodore J. Lowi produziu, em 1964, um modelo
analítico que buscava sintetizar as políticas públicas a partir dos impactos
sociais, melhor definido e estruturado com o decorrer do tempo. Lowi (1964)
define, como categorias de políticas públicas, elementos que não devem ser
confundidos com meros artifícios de simplificação, mas como distintas áreas das
atividades governamental e política. Constituem-se como arenas de poder com
características, estruturas, grupos relacionais e processos políticos próprios. A
denominada Tipologia de Lowi se baseia em quatro tipos de políticas públicas:

a) Políticas Regulatórias: aquelas que orientam e determinam padrões


comportamentais, de estabelecimento de serviços, produtos e atividades
em geral. Como exemplos, podemos citar as leis de trânsito, as normas
de produção e de comercialização de bens alimentícios, os produtos
hospitalares, as leis e as normas de conduta que regem toda uma
coletividade (casamento civil, aborto, eutanásia).
b) Políticas Distributivas: visam gerar benefícios concentrados para
um segmento da sociedade, e, ao mesmo tempo, produzir, como
contrapartida, custos difusos para toda a sociedade. Como exemplos,
podemos indicar as políticas de subsídios à produção de determinados
bens e serviços, os incentivos fiscais ou creditícios; e a gratuidade de
serviços para segmentos sociais distintos (a gratuidade nos ônibus para
idosos e estudante). De acordo com Secchi (2015), o grande desafio
desse tipo de política pública é a delimitação do público beneficiário, ou
seja, do grupo a se destina a política.
c) Políticas Redistributivas: enquadram-se como políticas redistributivas
aquelas que propiciam benefícios concentrados para determinados
segmentos sociais a partir da produção de custos concentrados sobre
outros segmentos sociais. Por essa relação direta entre os grupos de
beneficiários e contribuintes, as políticas se apresentam como mais
conflituosas e produzem grandes repercussões e debates sociais
(LOWI, 1985), pois há ganhadores e perdedores identificáveis. Ex.: o
Programa Bolsa Família (já citado anteriormente) e outros programas
governamentais de redistribuição de renda.

45
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

d) Políticas Constitutivas: podem ser sintetizadas como “as regras do jogo”,


ou, como define Lowi (1985), “são as regras sobre as regras”. Orientam
a organização do sistema político, as competências do poder jurídico e,
até mesmo, as regras das disputas políticas (SECCHI, 2015, p. 26). Para
exemplificar melhor esse modelo de políticas, lembremos das nossas
leis eleitorais, das regras e das normas da condução dos trabalhos
parlamentares, ainda, das próprias leis que definem o papel (e os limites)
da administração pública sob a sociedade.

Essa tipologia se firmou como um marco dos estudos das políticas públicas,
pois cobre, de forma sintética, grande parte dos processos relacionais promovidos
por estas, a partir dos impactos na sociedade.

4.2 TIPOLOGIA DE WILSON


A tipologia de James Q. Wilson tem, como foco analítico, a distribuição de
custos e de benefícios sociais gerados por determinada política pública. Esse
modelo busca compreender duas dimensões fundamentais para o planejamento
e a implementação das policies, uma vez que toda ação pública busca promover
benefícios para grupos restritos (política para jovens) e para toda a população
(segurança nacional). Para além disso, a outra dimensão tem a ver com os custos
(não apenas financeiros) que determinada ação produz, e como esses custos são
diluídos na sociedade. Algumas políticas públicas possuem custos que podem ser
diluídos entre contribuintes pagantes e não pagantes.

Importante que você não confunda a dimensão dos custos da tipologia de


Wilson com os meros custos financeiros, isso porque, na verdade, quando se
fala dos custos, neste caso, também estamos falando dos custos materiais, de
transação e institucionais.

QUADRO 3 – TIPOLOGIA DE WILSON


Custos
Dimensões/Variáveis
Distribuídos Concentrados
Distribuídos Política Majoritária Política Empreendedora

Concentrados Política Clientelista Política de Grupos de Interesses


Benefícios
FONTE: Adaptado de Secchi (2015)

46
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

As políticas majoritárias são definidas como aquelas com os custos e os


benefícios diluídos por toda a sociedade. Esse é o modelo mais comum das
políticas públicas, no qual menos existem embates dos denominados “grupos de
pressão”, ponto que veremos mais à frente, no próximo capítulo. Algumas policies
são, por natureza, indivisíveis, como a segurança pública, já citada anteriormente,
mas existem outros exemplos de políticas públicas majoritárias, com benefícios
e custos de execução repartidos pelos cidadãos de determinado país, como os
sistemas judiciário e prisional e a educação e a saúde públicas.

Alguns erros comuns na definição de políticas majoritárias:

• Nem sempre todos pagam igualmente: nas políticas, com custos


diluídos, não significa, necessariamente, que todos os cidadãos pagam
igualmente, mas que todos contribuem para a manutenção.
• Algumas políticas majoritárias são indivisíveis: logo, não se pode
escolher quem se beneficia delas, como a iluminação pública, que não
atende, apenas, contribuintes que pagam as taxas de iluminação pública.

Já as políticas empreendedoras são definidas por trazerem benefícios


coletivos e custos concentrados sob determinadas categorias sociais. Secchi
(2015) destaca que esse tipo específico de policies não foi definido na tipologia
de Lowi. Uma característica apresenta a dimensão conflituosa entre interesses
coletivos difusos e de grupos específicos. Ex.: leis e regulação de setores
específicos de produção; reformas administrativas que extinguem determinado
órgão público.

As políticas clientelistas possuem benefícios concentrados e custos difusos


por toda a sociedade. São, justamente, o oposto das políticas empreendedoras,
e podem ser equiparadas com as políticas distributivas da tipologia de Lowi. Ex.:
políticas de transmissão de renda.

Por fim, as políticas de grupos de interesse têm, como característica, gerar


benefícios e custos concentrados em segmentos da sociedade. Por possuírem
relação mais direta entre os grupos beneficiários e os que devem custear as
ações, essa é a dimensão mais conflituosa da tipologia de Wilson. Pode ser
equiparada com as políticas redistributivas da tipologia de Lowi. Ex.: políticas de
cotas em concursos públicos.

4.3 TIPOLOGIA DE GORMLEY


A tipologia de Gormley se baseia em duas dimensões analíticas para
enquadrar as políticas públicas: a saliência – capacidade de impactar e/ou chamar

47
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

atenção da sociedade em geral – e o nível de complexidade – necessidade de


especialização e de aplicação de conhecimentos técnicos para formulação e
execução (SECCHI, 2015).

QUADRO 4 – TIPOLOGIA DE GORMLEY


Complexidade
Dimensões/Variáveis
Alta Baixa
Alta Política de Sala Operatória Política de Audiência
Saliência Baixa Política de Sala de Reuniões Política de Baixo Escalão
FONTE: Adaptado de Secchi (2015)

A definição de “Políticas de Sala Operatória”, promovida por Gormley,


enquadra o conjunto de políticas públicas que, ao mesmo tempo, exigem uma alta
capacidade técnico/especializada e possuem um caráter de mobilização social.

É importante destacar que os temas que possuem saliência (peso e


importância na opinião pública) nem sempre são os mesmos. Com o passar do
tempo, as prioridades sociais podem ser alteradas, de acordo com a importância
dada pela sociedade para uma determinada pauta. Alguns elementos podem
influenciar diretamente essa capacidade de saliência das políticas públicas, e
um deles é a denominada “agenda pública”, como a mídia, nos diversos meios
de comunicação (rádio, televisão, internet, jornais etc.). No próximo capítulo,
abordaremos alguns exemplos mais claros e explícitos de como diferentes
agentes sociais podem interagir e afetar os panoramas da opinião e da agenda
pública, interferindo, consequentemente, nos modelos de políticas públicas
promovidas nos contextos.

4.4 TIPOLOGIA DE GUSTAFSSON


A tipologia apresentada por Gustafsson busca classificar as políticas públicas,
segundo as intenções e o conhecimento utilizado para a implementação. Como
denota Secchi (2015), essa abordagem tem, como alinhamento, as “intenções do
policymaker”. Observe as dimensões e as variáveis utilizadas por Gustafsson:

48
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

QUADRO 5 – TIPOLOGIA DE GUSTAFSSON


Intenção de implementar a política pública
Dimensões/Variáveis
Sim Não
Conhecimento para a elabora- Disponível Política Real Política Simbólica
ção e a implementação Indisponível Pseudopolítica Política sem sentido
FONTE: Adaptado de Secchi (2015)

As “políticas reais” podem ser definidas como aquelas que somam


intencionalidade explícita e conhecimento técnico para as implementações. Na sua
intencionalidade, evidencia-se o objetivo de resolver um determinado problema
público, modelo clássico de construção das políticas públicas, uma vez que se
determinam ações planejadas e direcionadas com uma intenção apropriada para
a resolução de um dado problema ou disfunção, anteriormente identificado pelos
operadores das políticas.

As “políticas simbólicas” são aquelas em que os gestores de políticas públicas


possuem conhecimentos e condições de elaborá-las, no entanto, não possuem
grande intenção de promovê-las, efetivamente, na prática. São, de acordo com
Secchi (2015, p. 29), “políticas para inglês ver”. Políticas simbólicas, muitas vezes,
surgem com o simples objetivo de um gestor ou de um governo dizer que está
fazendo, sendo que, na prática, o ponto não é tornar a política executável, apesar
de existirem recursos técnicos suficientes para a elaboração e a implementação.

As “pseudopolíticas” são definidas como aquelas nas quais o policymaker


possui o interesse de promover uma determinada política, contudo, não possui o
preparo ou o conhecimento técnico para executá-la, de fato.

Nas “políticas sem sentido”, os operadores de políticas públicas não


possuem a intencionalidade de produzir um efeito resolutivo, e, ao mesmo tempo,
não possuem conhecimento técnico acerca do problema gerido. A produção
nem sempre é explicitamente planejada, e pode ser resultado de um processo
de busca de soluções de outros problemas presentes na agenda pública. Uma
questão inerente ao processo de planejamento e implementação de muitas
políticas públicas está atrelada ao complexo cenário de formulação e de gestão
das demandas públicas (QUEIROZ, 2011). O gestor, muitas vezes, promove
ações não consolidadas (tecnicamente) e sem nenhum interesse de efetivá-las
em soluções públicas.

Muitas vezes, essas respostas despreparadas e desarticuladas surgem


apenas para diminuir pressões e manifestações de determinados grupos
sociais, servindo como uma política que agrega “incompetência com cinismo dos
policymakers” (SECCHI, 2015, p. 30).

49
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Notavelmente, existe uma dificuldade quanto à análise prática de políticas


públicas no que tange à intencionalidade do gestor que as promove, nesse sentido,
cabe, àquele que opera uma análise, a partir da tipologia de Gustafsson, ter
cautela e buscar compreender como, de fato, tais fenômenos foram promovidos.

4.5 OUTRAS TIPOLOGIAS


Outras contribuições teóricas constituíram tipologias para a análise de
políticas públicas, e podem ser citadas como exemplos de categorização e
formas de distinguir estruturas a partir das próprias características. Mintz e Wayne
(2016), por exemplo, traçam uma análise tipológica sob os processos de tomada
de decisão de grupo (decision making-group) nas políticas públicas, a partir de
duas categorias analíticas: os “polythinks” e os “groupthinks”.

Os groupthinks são definidos como os grupos com grande


Os polythinks são
homogeneidade e conformidade; que tendem a promover tomadas de
grupos plurais e
menos coesos, decisões menos conflituosas. Em contrapartida, as decisões são, em
logo, possuem, geral, “abaixo do ideal”, por buscarem, antes de tudo, uniformidade e
como característica, pouca dissidência ou conflito. Os polythinks são grupos plurais e menos
a prescrição de coesos, logo, possuem, como característica, a prescrição de políticas
políticas diferentes. diferentes. Podem gerar conflitos internos, processos de tomada de
decisões desarticulados, paralisia na tomada de decisões, e ações
desarticuladas entre os membros (MINTZ, WAYNE; 2016). Observe o linear
apresentado por Mintz e Wayne (2016), na proposição de modelos de tomadas de
decisões de grupo para as políticas públicas:

FIGURA 7 – MODELOS DE TOMADAS DE DECISÕES DE GRUPO

FONTE: Adaptada de Mintz e Wayne (2016)

É importante ressaltar que a tipologia dos “groupthink” e dos “polythink” não


delimita todas as políticas públicas como elementos de um dos dois modelos,
reduzindo toda uma pluralidade de contextos da tomada de decisões. Ao contrário,
os conceitos expressos apenas ilustram uma maneira de classificar os processos
de tomadas de decisão. O recomendável é que “[...] as "boas" dinâmicas de

50
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

tomada de decisão, normalmente, fiquem no meio” (MINTZ, WAYNER, 2016, p. 4)


do linear entre os dois conceitos, como políticas equilibradas (balanced).

Outra proposta de análise das políticas públicas, que utiliza um eixo linear
para a classificação dos conceitos abordados, é a Tipologia de Bozeman e Pandey
(2004), que definem duas categorias fundamentais para a análise: a) conteúdos
técnicos; e b) conteúdos políticos. Nesse sentido, a propositiva dos autores busca
ilustrar que as políticas públicas podem ser um elemento híbrido que abarca
interesses e ações políticas, além de dimensões e conhecimentos técnicos.

FIGURA 8 – TIPOLOGIA DE BOZEMAN E PANDEY

FONTE: Adaptada de Bozeman e Pandey (2004)

O campo das políticas públicas guarda, em si, a possibilidade de definir, de


diferentes formas, as policies e os processos de planejamento, implementação,
avaliação e monitoramento. Dessa forma, pode-se buscar o desenvolvimento
de novas ferramentas analíticas que ajudem a consolidar meios responsáveis e
efetivos para a área das políticas públicas. A promoção dessas novas ferramentas
gera novas possibilidades de:

• Orientar caminhos para novos estudos teóricos.


• Ampliar os instrumentos e as ferramentas de análise das políticas
públicas.
• Construir quadros analíticos sintetizados, que auxiliam no aprendizado.
• Formular e replicar análises comparadas de políticas públicas em
diferentes contextos.

O policymakers, ou o estudante de políticas públicas, tem duas possibilidades


de ação: 1) dedutiva – utilizar tipologias já construídas e apresentadas na
literatura; 2) indutiva – construir uma tipologia própria e adaptada à aplicabilidade.

Cabe apontarmos outros aspectos das tipologias e das definições, as


limitações prático-teóricas, isso porque a proposta das tipologias não deve ser
confundida com um receituário único, e que conclui, em si, todas as complexidades
presentes nos processos políticos (do fazer política) e a formulação de policies
que atendam, efetivamente, a demandas sociais. Pode-se elencar, como algumas
das limitações das tipologias de políticas públicas:
51
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

• São quadros que resumem uma dada realidade (reducionismo).


• São produzidas por meio de variáveis qualitativas, e que podem
desconsiderar as especificidades.
• São limitantes em abranger categorias analíticas mutualmente exclusivas
e coletivamente exaustivas.

No entanto, apesar das limitações metodológicas, e, muitas vezes, práticas,


no que diz respeito à promoção do desenvolvimento de planos e de ações em
cenários complexos, as tipologias apresentam pontos positivos visíveis. Ao
longo do tempo de consolidação do campo das políticas públicas, ganharam
espaço, constituindo um amplo espectro de ferramentas com aplicabilidades
variadas (LOWI, 1985; HOOD, 1986), capazes de promover a aproximação ou
o distanciamento de determinadas características e fenômenos, conforme o
interesse do policymaker (BRASIL; CAPELLA, 2018).

1 - Defina o que é uma tipologia de políticas públicas. Aponte os


pontos críticos e positivos, a partir do material estudado.

1 - Considere que você seja o gestor público responsável pela


análise e pela promoção de melhorias das políticas públicas de
segurança do seu município. Dessa forma, a partir do arcabouço
teórico das tipologias, elenque, pelo menos, 4 (quatro) formas
possíveis de se produzir uma tipologia de segurança pública, de
forma indutiva.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Vamos fechando o Capítulo 1 e o nosso percurso por alguns conceitos que
vão nos acompanhar ao longo da nossa jornada nos próximos capítulos e análises
do campo das políticas públicas.

Esperamos que você já possa ter percebido a ampla gama de correntes


teóricas, modelos e instrumentos de planejamento e de análise pertencentes

52
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

ao campo das políticas públicas. Isso se dá não apenas pelas transformações


histórica e social vivenciadas pela área desde os primeiros estudos, na década
de 1950, até os estudos das últimas décadas (apesar de ser um fator importante).
Outra dimensão do objeto das policies, igualmente relevante, é o caráter, por
natureza, complexo, multidisciplinar e situacional, fator que impede a promoção
permanente de prescrições perenes e replicáveis para quaisquer contextos
específicos. Outra dimensão de grande monta é a própria amplitude (o escopo)
do campo das políticas públicas, que vem se desdobrando nas diversas áreas da
ação estatal (e não estatal – como veremos mais à frente, no Capítulo 3).

A partir do conjunto de dinâmicas e de complexidades inerentes ao campo


formativo das políticas públicas, buscou-se apresentar os principais modelos
teóricos que proporcionam um amplo espectro de dimensões conceituais em
torno dos fenômenos políticos e dos respectivos processos, agentes e interações,
resultados e dimensões de retroalimentação. Dessa forma, percorremos, de
forma bem rápida, porém, cuidadosa, pelos principais modelos teóricos que
conformam reflexões e fazem parte da história do campo das políticas públicas:
modelo racionalista, modelo institucional, modelo sistêmico, modelo de gestão de
processos, modelo de teoria dos grupos, modelo da Teoria dos Jogos, e outras
abordagens, como o modelo incremental.

Outro panorama aberto, neste primeiro capítulo, foi a abordagem acerca


das tipologias de políticas públicas, como um importante instrumental técnico do
campo das policies. Assim, planejou-se apresentar as tipologias mais famosas da
área, com possibilidades e limitações, como um ferramental analítico, que pode
servir para gestores públicos (policymakers) e para estudantes e pesquisadores
que possuem, como objeto, as políticas públicas.

Por fim, discutimos as dimensões importantes para o desenvolvimento


das atividades dos estudantes e dos gestores de políticas públicas, como a
diferenciação de conceitos, como política governamental e política pública, análise
política e análise de políticas públicas. Ainda, a exploração de termos técnicos da
área, utilizados em abordagens teóricas específicas, como os inputs, os outputs e
os withinputs.

REFERÊNCIAS
AGUM, R.; RISCADO, P.; MENEZES, M. Políticas públicas: conceitos e análise
em revisão. Agenda Política, v. 3, n. 2, p. 1, 2015.

ALMEIDA, F. P. L. A teoria dos jogos: uma fundamentação teórica dos métodos


de resolução de disputa. 2003.

53
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

ALMEIDA, L. de A.; GOMES, R. C. Processo das políticas públicas: revisão de


literatura, reflexões teóricas e apontamentos para futuras pesquisas. Cadernos
EBAPE, v. 16, n. 3, p. 1, 2018.

ARAÚJO, L.; RODRIGUES, M. de L. Modelos de análise das políticas


públicas. Sociologia, Problemas e Práticas, v. 1, n. 83, p. 11-35, 2017.

ARRETCHE, M. T. S. Dossiê agenda de pesquisas em políticas públicas. Revista


Brasileira de Ciências Sociais, v. 18, n. 51, p. 1, 2003.

BOULLOSA, R. de F. Mirando ao revés nas políticas públicas: notas sobre um


percurso de pesquisa. Pensamento & Realidade, v. 28, n. 3, p. 1, 2013.

BOZEMAN, B.; PANDEY, S. K. Tomada de decisão na gestão pública: efeitos do


conteúdo da decisão. Revisão da Administração Pública, v. 64, n. 5, p. 553-
565, 2004.

BRASIL. MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL (MDS). O que é. 2021.


Disponível em: http://mds.gov.br/assuntos/bolsa-familia/o-que-e. Acesso em: 11
fev. 2021.

BRASIL, F. G.; CAPELLA, A. C. N. Ferramentas e instrumentos na formulação


dos Conselhos Municipais de Saúde no Brasil. In: ALMEIDA, L. de S. B.;
LAISNER, R. C. Políticas públicas e participação social. Natal: EDUFRN,
2018.

CAPELLA, A. C. N.; BRASIL, F. G. Análise de políticas públicas: uma revisão da


literatura sobre o papel dos subsistemas, comunidades e redes. Novos Estudos
CEBRAP, v. 1, n. 101, p. 57-76, 2015.

DA PAZ, B. C.; BERMEJO, P. H. de S.; SILVA, S. de A. M. Gestão de processos


como ferramenta para o aprimoramento da gestão pública. 2020. Disponível
em: http://www.enajus.org.br/anais/assets/papers/2020/sessao-06/2-gesta-o-
de-processos-como-ferramenta-para-o-aprimoramento-da-gesta-o-pu-blica.pdf.
Acesso em: 11 abr. 2021.

DIAS, R. Ciência política. São Paulo: Atlas, 2010.

DUNN, W. N. Public policy analysis. USA: Routledge, 2015.

DYE, T. R. Understanding public policy. New Jersey: Prentice-Hall, 1992.

EASTON, D. The political system. Nova York: The Free Press, 1953.

54
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

ELIAS, N. Introdução à sociologia. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

ESTEVÃO, R. B.; FERREIRA, M. D. M. Análise de políticas públicas: uma breve


revisão de aspectos metodológicos para formulação de políticas. HOLOS, v. 34,
n. 3, p. 168-185, 2018.

FARAH, M. F. S. Abordagens teóricas no campo de política pública no Brasil e


no exterior: do fato à complexidade. Revista do Serviço Público, v. 69, n. 1, p.
53-84, 2018.

FARIA, J. H. de. Autogestão, economia solidária e organização coletivista de


produção associada: em direção ao rigor conceitual. Cadernos EBAPE, v. 15, n.
3, p. 629-650, 2017.

FREY, K. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à


prática da análise de políticas públicas no Brasil. 2009.

HAM, C.; HILL, M. O processo de elaboração de políticas no Estado


capitalista moderno. Campinas: Unicamp. 1993

HECLO, H. Polity analysis. British Journal of Political Science, v. 2, n. 1, p. 1,


1972.

HOOD, C. The tools of government. Estados Unidos: Chatham House


Publisher, 1986.

LASSWELL, H. D. The emerging conception of the policy sciences, public


policy. 1970.

LASSWELL, H. D. Politics: who gets what, when, how. New York: P. Smith, 1950.

LOWI, T. The State in politics: the relations between policy and administration. In:
NOLL, R. G. Regulatory policy and the social sciences. Berkeley: University of
California Press, 1985.

LOWI, T. J. American business, public policy, case-studies, and political theory. World
Politics, v. 16, n. 4, p. 677-715, 1964. Disponível em: www.jstor.org/stable/2009452.
Acesso em: 15 jan. 2021.

MARQUES, E. C. L. Notas sobre redes, Estado e políticas públicas. Cadernos


de Saúde Pública, v. 35, n. 1, p. 1-11, 2019.

55
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

MELO, M. A. Estado, governo e políticas públicas. In: MICELU, S. O que ler


na ciência social brasileira (1970-1995): ciência política. São Paulo: Sumaré,
1999.

MILES, R. H.; SNOW, C. C. Organization strategy, structure and process.


Nova York: McGraw-Hill, 1978.

MINTZ, A.; WAYNE, C. The polythink syndrome and elite group decision-
making. Political Psychology, v. 37, n. 1, p. 3-21, 2016. Disponível em: www.jstor.
org/stable/43783903. Acesso em: 15 jan. 2021.

OLIVEIRA, D. A. Das políticas de governo à política de estado: reflexões sobre a


atual agenda educacional brasileira. Educação & Sociedade, v. 32, n. 115, p. 1,
2011.

OSTORM, E. Governing the commons: the evolution of institutions for


collective action. Bayreuth: Seminar on Political Ecology, 2009.

QUEIROZ, R. B. Formação e gestão de políticas públicas. 3. ed. Curitiba:


Ibpex, 2011.

QUINTANEIRO, T.; BARBOSA, M. L. de O.; OLIVEIRA, M. G. M. de. Um toque


de clássicos: Marx, Durkeim, Weber. Belo Horizonte: UFMG, 2003.

RUA, M. G. Análise de políticas públicas: conceitos básicos. Brasília: Paralelo


15, 1998.

RUA, M. G. Análise de políticas públicas: conceitos básicos. Brasília: ENAP/


Ministério do Planejamento, 1997.

SANTOS, M. P. G. dos. Políticas públicas e sociedade. 2. ed. Florianópolis:


UFSC, 2012.

SECCHI, L. Políticas públicas: conceitos, esquemas de análise, casos práticos.


2. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2015.

SOARES, S.; SÁTYRO, N. O Programa Bolsa Família: desenho institucional,


impactos e possibilidades futuras. 2009.

SOUZA, C. Políticas públicas: uma revisão de literatura. Sociologias, Porto


Alegre, v. 8, n. 16, p. 1, 2006.

56
Capítulo 1 CONCEITOS, DIMENSÕES E TIPOLOGIAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

VASCONCELLOS, M. A. S. Economia: micro e macro: teoria e exercícios. 4. ed.


São Paulo: Atlas, 2009.

VENDRAMINI, P.; FEUERSCHÜTTE, S. As competências do administrador


público na gestão governamental: análise e perspectivas da formação segundo
a percepção de egressos da ESAG-UDESC. In: LIMA, L. L.; RODRIGUES, M.
I. A. Campo de públicas em ação: coletânea em teoria e gestão de políticas
públicas. Porto Alegre: UFRGS/CEGOV, 2017.

57
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

58
C APÍTULO 2
CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
E DIMENSÕES DA GESTÃO

A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Definir as fases do ciclo de políticas públicas e localizar as possibilidades e os


pontos críticos de cada etapa.
• Descrever os sistemas de políticas regulatórias e de políticas gerenciais, e
saber diferenciá-los.
• Explicar como a gestão estratégica e a gestão social podem auxiliar os
processos de tomada de decisões de gestores públicos, e daqueles que
operacionalizam políticas públicas.
• Interpretar as variadas formas de políticas públicas, que envolvem ações por
meio de redes de agentes não governamentais (ONGs), coalizões da sociedade
civil e arranjos institucionais híbridos.
• Planejar ações futuras ou em desenvolvimento, com base nas fases do ciclo de
políticas públicas e nos instrumentos.
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

60
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Caro estudante, agora que já abordamos um retrospecto da consolidação
do campo das políticas públicas, as principais abordagens que constituem os
debates dessa área de estudos, alguns conceitos primordiais, como o que pode
ser definido como uma política pública e quais são as principais características
desta, podemos seguir a nossa jornada!

Neste capítulo, abordaremos o Ciclo de Políticas Públicas, discutindo o tema


proposto a partir da definição de fases/etapas da gestão de políticas públicas
adotadas por Secchi (2015). Não obstante, nossa análise promoverá um debate
em torno do modelo de CPP adotado por Secchi (2015), mas perfazendo um
diálogo com as diferentes concepções teóricas que dialogam com a construção
das diferentes fases, desde a formulação do problema público até a fase de
extinção da política pública (RUA, 2009; FARAH, 2018; LINDBLOM, 1959).

Você poderá se aprofundar nas conceituações de monitoramento e avaliação,


distinguindo cada um desses elementos a partir das inserções no âmbito do Ciclo
de Políticas Públicas. Dessa forma, a análise mais específica, no que tange a
dimensões e especificidades de cada modelo de avaliação, será realizada no
Capítulo 3.

Outro par de conceitos que será abordado neste capítulo será a distinção
teórica entre políticas regulatórias e políticas gerenciais. Ainda, serão
apresentados dois modelos orientadores da gestão de políticas públicas: a gestão
estratégica e a gestão social. Esses modelos, que podem ser compreendidos
como balizadores de ações, a partir das distintas estruturas e orientações, definem
diferentes formas de comportamento, de interação e de produção das políticas
públicas. É importante que, desde já, você compreenda a gestão estratégica como
um modelo de ação importado da área da administração de empresas, voltado
para o aumento da eficiência e a redução dos custos organizacionais, modelo
que ganhou notoriedade na agenda pública brasileira durante o fim da década de
1980 e o início dos anos 90, com as premissas de desburocratizar e de tornar a
gestão pública mais eficiente. Em contraponto, o modelo da gestão de políticas
públicas, delineado pela gestão social, busca, antes de tudo, estabelecer canais
e ações que permitam a promoção de políticas participativas, além da abertura
das distintas etapas de elaboração e da avaliação de policies para a promoção do
bem-comum.

Por fim, este capítulo buscará perfazer o debate em torno das experiências
de políticas públicas que vão além das simples relações entre Estado x sociedade
civil. Tendência da dicotomia estabelecida, principalmente, até a década de

61
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

1980. Nesse sentido, desejamos que você, caro estudante, possa conhecer
experiências, como as práticas de governança territorial e de gestão de políticas
públicas em redes, que consolidam caminhos de múltiplos agentes na elaboração,
na implementação e na avaliação de políticas. Assim como os fenômenos das
redes, busca-se trazer uma caracterização das principais definições de redes a
partir dos estudos de políticas públicas, e como estas se encaixam como novos
arranjos institucionais, como os Arranjos Produtivos Locais, também denominados
de APLs; e ações de coprodução de bens públicos, que estabelecem redes
interinstitucionais de organizações não governamentais (ONGs), entidades
filantrópicas, organizações e movimentos da sociedade civil, órgãos estatais e
órgãos de classe que, juntos, produzem e efetivam políticas públicas.

2 FASES DO CICLO DE POLÍTICAS


PÚBLICAS
Prezado estudante, agora, a nossa jornada pelo campo das políticas
públicas se volta para um dos instrumentos teóricos mais aplicados e revisados
na literatura da área: o Ciclo de Políticas Públicas (CPP). É importante que
você tenha a compreensão de que o ciclo de políticas públicas é uma definição
teórica de cunho processual, ou seja, é definido, por teóricos da área, como
uma estrutura representativa que constrói as políticas públicas a partir de fases
(etapas processuais). Essas etapas do CPP são, de acordo com Secchi (2015),
sequenciais e interdependentes entre si.

Você se lembra de que, no capítulo anterior, abordamos o modelo de análise


das políticas públicas baseado na gestão de processos? Pois bem, esse é o
principal e mais famoso esquema teórico apresentado por essa corrente, e que
vislumbra o processo de construção das policies. Por isso, o seu nome, em inglês,
é “policy-making process”.

É relevante destacar que cada uma das fases inerentes ao processo do Ciclo
de Políticas Públicas envolve uma gama diferente de atores e de instituições
(públicas, privadas e do terceiro setor), desde o momento em que se identifica um
problema público, até a fase da extinção deste, passando pela implementação,
por exemplo, de diversos atores e instituições que inserem os interesses próprios
(ESTEVÃO; FERREIRA, 2018). Nesse sentido, Boneti (2007) destaca que os
diferentes contextos sociais promovem jogos de forças a partir da ação, da visão e
dos interesses políticos desses atores e instituições sobre determinado problema
público.

62
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

Os processos de negociação e de diálogo são inerentes aos gestores de


políticas públicas e à execução dos trabalhos políticos. Nas etapas definidas
pelo Ciclo de Políticas Públicas, esses processos ficam inertes. Ao contrário,
as fases do CPP estão envoltas de processos de articulação de interesses e
de negociações entre as partes que produzem e recebem determinada política
(também, de agentes, que possuem interesse ou não). Além disso, é importante
que você tenha em mente que os gestores de políticas públicas são agentes
imbuídos de interesses, visões e conhecimentos preestabelecidos (FARAH,
2018), além de serem aqueles que escolhem os problemas a serem resolvidos
(MARQUES, 2013).

Antes de analisarmos, de forma mais específica, cada uma das fases que
constitui o Ciclo de Políticas Públicas, é importante que você tenha uma visão
geral das partes constituintes. Dessa forma, ilustrar-se-ão as etapas do CPP, de
acordo com a concepção de Secchi (2015):

FIGURA 1 – CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

FONTE: Secchi (2015, p. 43)

Daqui a pouco, abordaremos as dimensões particulares de cada uma


das etapas propostas pelo modelo processual exposto. Contudo, antes de
prosseguirmos, torna-se fundamental ressaltar três pontos no que diz respeito à
teoria e à análise do Ciclo de Políticas Públicas. O primeiro se refere ao caráter
didático de expressar um processo que envolve uma complexidade de fenômenos,
atores e dinâmicas sociopolíticas. Isso significa dizer que o CPP, apesar de se
apresentar como uma referência investigativa, não dá conta de responder a
toda a complexidade encontrada na realidade dos processos de construção

63
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

de políticas públicas. O segundo ponto é o papel difusor de temas, conceitos


e debates em torno das distintas fases das políticas públicas, que se tornam,
a partir do CPP, partes “separáveis” e passíveis de uma análise específica nas
dimensões isoladas. Na prática, raramente, o Ciclo de Políticas Públicas reflete os
passos reais vividos dos processos de tomada de decisão e de gestão de políticas
públicas, mas permite a visão atomizada dos processos, fenômenos e conceitos
presentes na complexa gestão das policies.

A respeito das diferentes realidades de elaboração das policies, Jenkins-Smith


e Sabatier (1993) analisam que a definição das etapas não descreve o processo
na sua totalidade de casos. Farah (2018) expõe a crítica de Lindblom (1959), que,
no seu artigo seminal, questiona a racionalidade imposta pela determinação prévia
de uma sequência lógica de etapas para a resolução de problemas públicos, isso
porque os valores pessoais também influenciam na determinação de alternativas
e na formulação de políticas, por exemplo (LINDBLOM, 1959; FARAH, 2018).

Outro perigo exposto pelos autores é que a visão processual das políticas
públicas assume um caráter “legalista” e que negligencia os fatores “descritivo-
explicativos”, que promovem a dinâmica dos processos de tomada de decisões
(JENKINS-SMITH; SABATIER, 1993, p. 44).

Um terceiro ponto que deve ser frisado, tendo em vista as características do


modelo teórico do CPP, é que a definição das etapas (ou fases processuais) não
é única, ou seja, a partir da abordagem de outros teóricos, você pode encontrar
os ciclos de políticas públicas com diferentes composições de etapas. Para Rua
(2009), por exemplo, o CPP é composto pelas seguintes fases: 1) Formação
de Agenda; 2) Definição do Problema; 3) Análise do Problema; 4) Formação
de Alternativas; 5) Tomada de Decisão: Adoção da Política; 6) Implementação;
7) Monitoramento; 8) Avaliação; e 9) Ajuste. Outra definição das fases do ciclo
de políticas públicas, mais sucinta, é trazida por Howllet, Ramesh e Perl (2013):
1) Montagem da Agenda; 2) Formulação da Política; 3) Tomada de Decisão; 4)
Implementação da Política; e 5) Avaliação da Política.

Diante do exposto, o CPP possui um caráter prescritivo-normativo, que é


formulado a partir da percepção e da definição do agente, que delimita e nomeia
cada etapa do ciclo, estabelecendo as respectivas atribuições no processo.
No entanto, apesar das limitações expostas anteriormente, o Ciclo de Políticas
Públicas se destaca pelas importâncias didática e instrucional, para clarear
conceitos em torno da gestão das políticas públicas, e torna propícias algumas
discussões do tema, como clarifica Raeder (2014). Araújo e Rodrigues (2017),
inclusive, apontam que pode se estabelecer uma correlação entre a forte
disseminação do Ciclo de Políticas Públicas para tantas áreas, contextos e
aplicações de políticas e a capacidade de se reproduzir, de forma racional, como

64
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

um instrumento de análise racional e facilmente aplicável a diferentes cenários.

Agora que já vimos as principais características teóricas do CPP, vamos


nos aprofundar nas fases e nas características elencadas em cada uma destas.
Antes disso, faz-se necessário apontar que a nossa abordagem de CPP segue a
definida por Secchi (2015), pela profundidade diante das fases do ciclo de políticas
públicas, que, por exemplo, separa a fase da extinção de políticas, oferecendo um
espaço de reflexão aprofundado. Outra fase que ganha relevância na abordagem
de Secchi (2015) é a da identificação do problema. O autor promove um resgate
das contribuições teóricas de Sjöblom (1984), acerca dos elementos que
envolvem a identificação de problemas públicos. Um segundo fator que justifica
a escolha da abordagem de Secchi (2015) é a revisão atualizada de pesquisas,
contribuições teóricas e debates importantes das fases do CPP já retratados,
principalmente, entre as décadas de 1960 e 1980 (PRESSMAN; WILDAVSKY,
1973; SJÖBLOM, 1984; WILSON, 1987; SUBIRATS, 1989). Isso tudo se alinha a
outras contribuições de destaque no cenário brasileiro, acerca das investigações
das políticas públicas (BOULLOSA, 2013; LOTTA, 2017; LOTTA; FAVARETO,
2016; FARAH, 2018) e da literatura internacional (HOWLETT; RAMESH; PERL,
2013; LE GALÈS, 2014; ARAÚJO; RODRIGUES, 2017).

2.1 IDENTIFICAÇÃO DO PROBLEMA


A primeira fase do Ciclo de Políticas Públicas da qual trataremos será
a “Identificação do problema”. De acordo com a definição de Secchi (2015), o
problema é a diferença entre o status quo e uma situação desejada e possível. Já
o problema público seria a “diferença entre o que é e aquilo que se gostaria que
fosse a realidade pública” (SECCHI, 2015, p. 44).

Você já parou para pensar como surge um problema público? Ou, até mesmo,
como um determinado problema passa a ser público e ganha espaço na agenda
de ações do governo? Essas são indagações que nos remetem à importância
de determinados fenômenos sociais frente a outras questões, que, apesar de
existirem, e serem identificáveis, acabam não ganhando espaço de ação dos
governos ou políticas públicas que busquem remediá-las.

No outro extremo, por vezes, situações que não são percebidas pela
sociedade, como um problema prioritário, acabam sendo tomadas, pelos gestores
públicos, como problemas cruciais, devendo ter atenção do Estado. Um exemplo
é a dívida pública dos entes federados (União, Estados e municípios), um tema
que, apesar de ganhar notório espaço na mídia e nas discussões políticas, não
se reflete da mesma forma no âmbito da sociedade civil. Vamos retomar essa
questão mais à frente, quando abordarmos os modelos da tomada de decisões.

65
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Pensando nas diferentes formas de identificação dos problemas públicos,


pode-se perceber, facilmente, que nem todo o problema público surge da mesma
forma. Alguns problemas são definidos como públicos após um desastre natural
ou após um evento inesperado, por exemplo, enchentes ou deslizamentos de
grandes proporções que destroem bairros. Já alguns surgem desapercebidos,
e vão crescendo com o passar do tempo, como congestionamentos, que vão
surgindo com o aumento populacional de uma determinada região. Por fim, o
aumento de enchentes ou deslizamentos causados pelo inchaço populacional e a
falta de políticas habitacionais e de planejamento urbano.

Como você pode perceber, não há uma receita de bolo para a definição
de alguns problemas. O caso das enchentes e dos deslizamentos, em áreas
urbanas, é um exemplo tácito. Muitas vezes, o gestor deve ter um olhar apurado
para compreender a causa que determina a existência do problema público.

De acordo com Sjöblom (1984), o processo de identificação do problema


público possuí três esferas fundamentais: a) a percepção do problema; b) a
definição e a delimitação do problema; e 3) a avaliação da (s) possibilidade (s) de
resolução. Atente-se a algumas das possibilidades de ação dos gestores públicos
em cada uma das esferas do processo de identificação de problemas coletivos:

QUADRO 1 – ESFERAS DA IDENTIFICAÇÃO DOS PROBLEMAS PÚBLICOS


Esferas Sistemas de Ação
Percebido, mas inexistente
Percepção do Problema
Percebido e existente
Definição e delimitação coerente
Definição e delimitação incoerente
Definição e Delimitação
Definição e delimitação inacabada
Possíveis soluções
Avaliação da (s) Possibilidade Possíveis mitigações
(s) de Resolução Não possui soluções
FONTE: Adaptado de Sjöblom (1984)

O quadro anterior buscou trazer um panorama resumido acerca dos principais


modelos de ação que envolvem as esferas da fase da identificação do problema
público, tendo, como base, as definições de Sjöblom (1984).

Isso não quer dizer que a ação dos policymakers está limitada a essas
categorias de ação, uma vez que o cenário das políticas públicas é múltiplo e
dinâmico. Logo, um gestor (e a sociedade) pode iniciar a identificação do problema
público, tendo total conhecimento desse dado fenômeno, além de alta capacidade

66
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

de defini-lo (nas suas causas, fenômenos associados, e resultados que


determinado problema produz à coletividade). Contudo, com o passar do tempo,
esse problema pode ganhar outras proporções, causas e relações com outras
dinâmicas sociais, tornando a definição e a delimitação iniciais pouco coesas com
a realidade. Daí, o problema passa de uma definição e delimitação coerentes para
uma definição e delimitação incoerentes. Já a definição e delimitação inacabada
é aquela em que os atores sociais envolvidos não conseguem formalizar toda a
problemática (conjunto de causa, fatores externos etc.) desde o início, promovendo
distorções na ótica da própria definição do problema público.

A definição inacabada de problemas públicos é muito comum quando um


partido político, por exemplo, toma, para si, uma pauta pública, distorcendo a
complexidade do fenômeno a partir da única compreensão dele.

Outra questão importante é que alguns problemas públicos, apesar de serem


latentes e legitimados por grupos políticos e agentes institucionais, nem sempre
ganham atenção, porque parte da sociedade passa a vê-los com normalidades,
como a favelização em grandes metrópoles brasileiras, o que a torna um
fenômeno casual.

Os problemas sociais, por vezes, são retratados, de forma


aprofundada, em filmes brasileiros, que ganharam relevância
nacional e destaque no espaço da crítica internacional. Falando de
identificar problemas sociais, vem-nos à mente o cenário de Bacurau
(2019), filme que contou com as importantes interpretações de
Bárbara Colen, Sônia Braga, Udo Kier e Thomás Aquino. Ganhou
prêmios de destaque importantes, como os seguintes festivais: de
Cannes (2019), de Munique (2019) e de Sydney (2019). O filme
retrata um pequeno povoado do sertão que passa a identificar “um
problema público”: o vilarejo não está mais no mapa, e, além disso,
passa a ser alvo de ataques de “estrangeiros”. A comunidade, então,
busca identificar qual é e de onde vem esse problema percebido
coletivamente. Mobiliza-se para promover uma solução, igualmente
conjunta. A violência (presente em algumas cenas) é percebida, por
muitos, como o ponto focal do filme, mas, talvez, a percepção de
problema e a ação coletiva sejam os pontos altos da obra para nós.

67
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

2.2 FORMAÇÃO DA AGENDA


A fase de formação da agenda é imprescindível na construção de uma
política pública. Também denominada de “Formulação da Agenda” (ou, em inglês,
agenda-setting). Nesta etapa, um determinado problema, definido como público,
passa a denotar, exigir ou exprimir ação pública (seja do Estado ou de outros
entes que promovem políticas públicas, ou, quem sabe, de ambos).

É importante conceituarmos o termo “agenda” como “um conjunto


É importante
conceituarmos o de problemas ou temas entendidos como relevantes (SECCHI, 2015).
termo “agenda” Essa agenda pode ganhar materialidade de diferentes maneiras: como
como “um conjunto um programa de governo, uma legislação, um regimento partidário, uma
de problemas ou pauta de jornais e de redes de comunicação, ou, uma política isolada
temas entendidos de governo. Um exemplo de agenda pública que se tornou política
como relevantes
pública a partir da consolidação da temática nos âmbitos da sociedade
(SECCHI, 2015).
e do governo brasileiro foi a erradicação da fome. Um tema que ganhou
atenção de atores sociais, ONGs, pesquisadores e instituições públicas durante
a década de 1990. O sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, foi um dos atores
que protagonizou a luta pela erradicação da fome, da miséria e pela consolidação
da cidadania no país. O tema se tornou latente até se institucionalizar, com a
criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA), em 1993,
durante o governo de Itamar Franco. Veio a desaguar em uma série de políticas
de erradicação da fome nos anos posteriores, como o Programa Fome Zero,
instituído em 2003, por Luiz Inácio Lula da Silva.

Secchi (2015) define três tipos distintos de agenda, mas que se correlacionam
entre si, a saber:

• Agenda Política: pode ser definida como a agenda sistêmica, ou seja,


aquela que congrega um conjunto de temáticas ou problemas que a
esfera política percebe como pontos que merecem atenção e intervenção
pública.
• Agenda Formal: pode ser definida como a agenda institucional, ou seja,
aquela em que são elencadas as temáticas ou problemas que o poder
público já decidiu enfrentar.
• Agenda da Mídia: pode ser definida como a lista de temas e de
problemas coletivos que recebe atenção e ganha espaço de discussão
nos meios de comunicação. Pode se estabelecer como um elemento
prioritário de discussão, ou não.

Os problemas entram e saem das agendas sociais, a partir da própria


dinâmica da sociedade e dos interesses e das prioridades que esta dá para

68
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

determinados assuntos, problemas e fenômenos sociais. Secchi (2015) observa


que a agenda da mídia tem grandes poderes de persuasão e de intervenção
sobre as agendas política e institucional, isso porque a agenda dos meios de
comunicação promove grande reflexo sobre a opinião pública – aquilo que as
pessoas pensam ou deixam de pensar a respeito de determinados assuntos.

Prezado estudante, você pode se aprofundar em outros estudos


que buscam compreender os poderes de persuasão e de intervenção
da mídia sobre as agendas pública e política. Um dos caminhos
teóricos possíveis é a denominada Teoria Hipodérmica: https://
medium.com/teorias-comunicacao/tamb%C3%A9m-conhecida-
por-teoria-da-bala-m%C3%A1gica-a-teoria-hipod%C3%A9rmica-
%C3%A9-assim-definida-por-basear-se-c3960c24857.

Você sabe que é impossível o Estado e a própria sociedade resolverem


todos os seus problemas. Muitas limitações, e não apenas financeiras, deixam
clara essa evidência. Um ponto importante para compreendermos essa questão
são as “políticas de grupos de interesses”. Afinal de contas, em muitos casos, a
ação pública, em prol de um grupo, acaba promovendo externalidades negativas
(e descontentamento) de outro grupo.

Como indicam Subirats (1989) e Reader (2014), vários fatores provocam a


saída, a permanência e a entrada de problemas na agenda pública:

• Temporalidade da ação: refere-se ao tempo que deve ser gasto para que
determinado problema público seja resolvido ou atenuado.
• Recursos (financeiros, materiais, de pessoal etc.): são os elementos de
entrada na visão do modelo sistêmico das políticas públicas. Afetam,
diretamente, a capacidade estatal de resolução dos problemas públicos,
além da capacidade, por parte dos demais agentes e das instituições
sociais, de resolução de demandas.
• Ações de grupos de pressão: podem se materializar aberta ou
sigilosamente, a partir dos interesses dos integrantes na consolidação
dos problemas na agenda pública.
• Interesses partidários: podem representar um amplo espectro de
interesses sociais, desde as camadas sociais mais amplas, como os
trabalhadores e o cidadão de baixa e renda média, até grupos sociais mais

69
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

específicos e delimitados, incluindo banqueiros e donos de empresas


de transporte. Não obstante, nem sempre interesses partidários estão
alinhados aos interesses de apenas uma classe ou segmento social.
• Interesse do gestor que efetiva a política: alguns problemas públicos
possuem o interesse, da parte do gestor, em resolvê-los, porém, em
outras vezes, não. Na grande maioria das vezes, o interesse do gestor
está nos impactos que determinada ação (ou inação) traz para ele e para
a imagem pública.
• Institucionalização do problema (normas legais): alguns problemas
públicos ganham ressalvas jurídicas, como a fixação de mínimos de
gastos com saúde ou educação (garantidos pela Constituição Federal), o
que proporciona uma grande permanência de determinadas políticas.

Esses fatores são influenciados, direta e indiretamente, pela ação dos


diferentes segmentos da sociedade, o que altera, a partir das ações, a composição
da agenda pública e a prioridade de determinados problemas públicos no âmbito
dessa agenda.

As pesquisas que envolvem a área da formulação da agenda possuem


um histórico embasado em dois aportes teóricos, que orientam a formação
das investigações em torno dos processos constitutivos de formulação e de
reformulação da agenda pública (MARENCO, 2020).

QUADRO 2 – APORTES TEÓRICOS DA FORMULAÇÃO DA AGENDA


Aportes Teóricos Objetivo Principal
Centrada em responder por que determinadas
Mobilização de/por preconceito temáticas e problemáticas ganham magnitude
“Mobilization of bias” em alguns contextos, além da preocupação em
compreender os elementos que promovem a
atenção de determinados grupos sociais.
Centrados em responder por que determinadas
Estudos da área de comunicação - temáticas, problemas e soluções ganham ou
Análises de “issues” perdem proeminência da atenção pública.
FONTE: Adaptado de Marenco (2020)

Em ambos os aportes teóricos apresentados, a formulação das agendas


públicas sofre a ação direta do que Raeder (2014) define como atores visíveis
e invisíveis, que buscam, de diferentes formas e intensidades, a resolução de
problemas públicos. Os atores visíveis são os diferentes segmentos da mídia, os
partidos e as correntes políticas, os grupos de pressão. Já os atores invisíveis são
os pesquisadores e os acadêmicos, os burocratas e os técnicos que promovem
apoio técnico na construção de políticas (RAEDER, 2014).

70
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

Atenção, caro estudante! Não confunda a definição e a delimitação do


problema (a estruturação do que é um problema público em si com a definição da
agenda). A definição da agenda busca promover a escolha de quais problemas
públicos são prioritários, e quais não.

Um limitante dessa orientação teórica é que, nas duas dimensões, não se


promove uma reflexão, mais adiante, do que diz respeito à definição dos fatores
que determinam a escolha de algumas políticas em detrimento de outras
(HACKER; PIERSON, 2014; MARENCO, 2020). Fica, então, aberta uma lacuna,
diante da escolha política de determinadas políticas (às vezes, menos desejadas
pela população) frente a outras, que possuem alto capital e interesse das classes
de gestores públicos e dos atores que definem a agenda política.

2.3 FORMULAÇÃO DE ALTERNATIVAS


Caro estudante, agora, abordaremos a fase da formulação de alternativas. A
partir de um pensamento linear acerca do processo de construção das políticas
públicas, depois de definida a agenda, deve-se estabelecer (ainda que idealmente)
a construção de alternativas e de estratégias que possam dar resposta aos
respectivos problemas públicos.

Nessa fase, os
A formulação de alternativas “[...] se desenvolve por meio de atores envolvidos
escrutínios formais ou informais das consequências do problema, e dos no processo de
potenciais custos e benefícios de cada alternativa disponível” (SECCHI, construção da política
2015, p. 48). Logo, nessa fase, os atores envolvidos no processo de pública determinam o
construção da política pública determinam o que é esperado como que é esperado como
resultado.
resultado.

A fase é crucial para o andamento da política diante da sociedade e do


próprio Estado (ou diante dos demais agentes que a implementam e a avaliam). A
importância se dá, justamente, pela decisão de implicações e do desdobramento da
política pública na sociedade. De igual maneira, aqui, os atores sociais envolvidos
na construção estabelecem (ou não) um determinado comprometimento social
diante da ação. Assim, segue um breve resumo de dois modelos de ação distintos
na fase de formulação de alternativas:

71
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

QUADRO 3 – MODELOS DE AÇÃO NA FORMULAÇÃO DE ALTERNATIVAS


Modelo de Ação Exemplo Características Fundamentais
Ação com finalidade não deli-
mitada.
Formulação de Objetivos Melhorar a saúde do muni- Menor capacidade de controle
“Abertos” cípio. dos resultados.
Orientada ao processo.
Melhorar a saúde do municí- Ação com finalidade delimitada.
Formulação de Objetivos
pio, reduzindo, em 20%, os Maior capacidade de controle.
“Fechados”
óbitos neonatais. Orientada à eficácia.
FONTE: O autor

Você deve considerar os modelos de ação, citados no quadro anterior,


como “tipos ideais”, uma vez que, na realidade, podem se fazer presentes em
processos híbridos e em uma mesma formulação de alternativas públicas, através
de interesses políticos, técnicos e burocráticos (segmentos especializados, órgão
de classe etc.), mobilizações, ações de grupos de pressão (sindicatos, ONGs
etc.), ou, até mesmo, interações promovidas pela agenda da mídia.

Como elucida Secchi (2015), a definição de metas e de objetivos mais


delimitados também pode ser “politicamente indesejável”, principalmente, em
possíveis casos nos quais o gestor se sente ameaçado por baixas probabilidades
de sucesso na efetivação do objetivo. Ao não alcançar as referidas metas, possui
alto risco de danos administrativos e políticos.

Um exemplo pode ser a definição dos eixos da política de segurança pública


de um município com altos índices de homicídio e violência com arma de fogo.
A prefeitura pode, a partir desse problema público, estabelecer objetivos claros
para: a) a redução dos crimes de homicídio; e b) a redução do uso de armas de
fogo na cidade. No entanto, o prefeito pode perceber que estabelecer uma luta
pública contra organizações criminosas e outros agentes que vêm estabelecendo
o cenário de violência no município pode ser algo perigoso para a sua manutenção
no poder, dessa forma, é possível optar por não delinear políticas com metas claras
e tão objetivas, atuando, de forma genérica, diante da situação. Outro cenário que
pode levar o gestor a essa decisão é quando ele percebe que o estabelecimento
de metas e de políticas mais assertivas consegue gerar uma grande expectativa
da sociedade, e, caso as suas chances de atingir tal meta não sejam tão grandes,
prefere não se comprometer, publicamente, dessa forma, conservando o seu
capital político e atuando em outras políticas mais fáceis de serem alcançadas.

72
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

O Plano Nacional de Segurança Pública e Defesa Social,


lançado em 2018, pelo Governo Federal, define algumas diretrizes
de problemas públicos referentes à área de segurança pública,
além de objetivos (alternativas resolutivas) a serem alcançados.
Leia os objetivos do Plano e verifique, a partir do que aprendemos
anteriormente, quais são as dimensões que norteiam as diretrizes
do problema público, o modelo de ação contido na formulação de
objetivos e as metas: file:///C:/Users/User/Downloads/copy_of_
PlanoePolticaNacionaldeSeguranaPblicaeDefesaSocial.pdf.

A fase de formulação de alternativas é reconhecida, por outros teóricos e


abordagens de políticas públicas, como “a fase do planejamento” (QUEIROZ,
2011). A palavra planejamento é amplamente utilizada na área da gestão de
políticas públicas, pois, comumente, volta-se para a aplicação de métodos e de
procedimentos com as finalidades de construir e de utilizar cenários antecipados,
esquematizados e hierarquizados que auxiliem na gestão (QUEIROZ, 2011).

De acordo com Zimmerman (2014), o planejamento guarda, em si, algumas


características fundamentais: a primeira delas é a identidade de processo
sistêmico voltado para a tomada de decisões; a segunda é a capacidade de
tornar diferentes ações inter-relacionadas e interdependentes; a terceira é que o
processo do planejamento é mais importante do que o resultado que ele gera (o
plano), isso porque se o ato de planejar não é bem-sucedido, de nada adianta o
produto, pelo contrário, planos destorcidos da realidade podem gerar problemas
irreparáveis no percurso de gestão de uma política pública.

Outro apontamento importante de Queiroz (2011) é que o planejamento


não é um instrumento que substitui os processos decisórios, mas, ao contrário,
busca auxiliar esses processos. Além do caráter eminentemente instrumental,
é importante que você perceba que o ato de planejar não é neutro em si, mas
possui valores, ideais e interesses políticos intrínsecos. Da mesma maneira, o
planejamento também é reflexo das circunstâncias históricas a partir das quais é
produzido.

Essas reflexões revelam que não há uma forma única de planejamento.


Uma das formas mais usuais de planejamento é por meio do Planejamento
Estratégico (ZIMMERMAN, 2014). A estrutura teórica advém dos estudos de
gestão estratégica, do campo das organizações privadas, e possui, como principal

73
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

eixo norteador, o estabelecimento da racionalidade na tomada de decisão. Nas


últimas três décadas, a gestão brasileira vem incorporando o planejamento
participativo como modelo fundamental de ação. Tal perspectiva ganha destaque,
por exemplo, com a consolidação dos Conselhos Municipais de Políticas Públicas
(principalmente, os de caráter deliberativo, que possuem os poderes de alterar e
de redefinir o desenho e a orientação das políticas públicas).

A respeito dos planejamentos participativos, deve-se ter em mente que estes


alteram o papel de proeminência do gestor, pois, nos modelos tradicionais de
planejamento (mais normativos), possui um papel centralizador, como tomador de
decisão. Nesses novos modelos, passa a desempenhar uma função de articulador
do processo, coordenando a participação e promovendo a inclusão dos atores e
dos próprios agentes estatais. Note que esse é um papel mais complexo e que
exige, dos gestores, as capacidades de diálogo e de interlocução com diferentes
tipos de atores e segmentos sociais. De acordo com Secchi (2015), o gestor
de política pública possui “quatro mecanismos genéricos”, para estimular os
comportamentos sociais:

1. Premiação: promover um tipo de comportamento social a partir de


estímulos positivos.
2. Coerção: promover um tipo de comportamento social a partir de
estímulos negativos.
3. Conscientização: promover um determinado comportamento social,
tendo, como bases, a construção e o apelo ao senso de um dever moral,
socialmente aceitável.
4. Soluções técnicas: buscar uma alteração de comportamento, sem afetá-
lo diretamente. Promover canais e soluções práticas que influenciem, de
forma indireta, determinado comportamento social.

A seguir, serão apresentados alguns exemplos de alternativas para o


enfrentamento de um problema público, de acordo com a análise de Secchi
(2015). Os quatro mecanismos apresentados anteriormente serão postos em
prática, de formas distintas:

74
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

FIGURA 2 – ALTERNATIVAS PARA O ENFRENTAMENTO DE UM PROBLEMA PÚBLICO

FONTE: Secchi (2015, p. 49)

Observe que a preferência por um ou outro mecanismo de ação, que orienta


a formulação de alternativas públicas, também afeta, diretamente, os custos de
transação envolvidos na elaboração de determinada policies.

2.4 TOMADA DE DECISÕES


Outra fase inerente ao Ciclo das Políticas Públicas é a da “tomada de
decisões”. Fase que ganha proeminência, em grande parte da literatura, como um
estudo do momento em que as atenções se voltam para os processos de escolhas
daqueles que geram as políticas públicas. Logo, grande parte da literatura se
atenta para ações de analistas, gestores e fazedores de policies (ESTEVÃO;
FERREIRA, 2018).

Inserimos essa fase com a palavra “decisões”, no plural, porque, de maneira


geral, apresenta-se, aos gestores de políticas públicas, como o momento de
determinar caminhos, alternativas, além de promover concessões e delinear
as ações futuras de implementação da política. Por esse fato, na sua aplicação

75
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

real, a fase de tomada de decisões, dificilmente, é concluída com apenas uma


“tomada de decisão”. Ex.: leis que são aprovadas na Câmara de Vereadores de
um município, e, depois, seguem para a sansão do prefeito. No caso, há duas
decisões acerca do mesmo tema público.

Estabelecem-se dois pontos prioritários na análise das tomadas de decisões:


1) o grau de objetividade e racionalidade adotado nos processos de decisões
públicas; e 2) as estratégias e os modelos de distribuição dos poderes de escolha
diante das questões públicas (ESTEVÃO; FERREIRA, 2018).

Os primeiros estudos da área tomam a fase da tomada de decisões como


uma etapa que deveria ganhar instrumentos e métodos capazes de ampliar os
conhecimentos dos gestores (policymakers) e gerar racionalidade no processo
(ARAÚJO; RODRIGUES, 2017). Por isso, obras, como a de Lasswell (1950),
ainda no início da década de 50, buscaram estabelecer métodos, normas e regras
para viabilizar o caminho rumo à racionalização dos processos de tomada de
decisões.

Só no final da década de 1950, com as contribuições de Simon, passou-


se a adotar uma visão mais ampla das tomadas de decisões, tendo em vista a
impossibilidade de se obter uma “racionalidade absoluta”. Nesse sentido, a nova
concepção da teoria do campo começou a enxergar a racionalidade e as dinâmicas
de escolhas dos gestores como uma “racionalidade limitada” (bounded rationality)
(SIMON, 1983), uma vez que as escolhas são afetadas por influências diretas e
indiretas e outros fatores, como “[...] a natureza, necessariamente fragmentada
e incompleta do conhecimento e da informação [...]” (ARAÚJO; RODRIGUES,
2017, p. 14), além das possíveis mudanças imprevisíveis de cenários e do tempo
limitado para uma análise detalhada dos contextos institucionais, políticos e
sociais (ARAÚJO; RODRIGUES, 2017).

Lindblom (1959) demarca uma crítica à construção teórica da racionalidade


limitada de Simon, ao defender que o processo de tomada de decisões possui,
como características (ARAÚJO; RODRIGUES, 2017):

• Construído passo a passo, através de mudanças incrementais, com base


em políticas preexistentes.
• Envolve ajustamentos mútuos e negociação.
• Não é uma solução final para os problemas, é apenas um passo que,
quando bem-sucedido, pode ser seguido por outros.

A abordagem de Lindblom (1959) ficou conhecida, na literatura, como


“método incrementalista”, passando a considerar as dimensões dos interesses
e das adaptações próprias da prática política (SECCHI, 2015; ESTEVÃO;

76
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

FERREIRA, 2018). O critério de decisão se baseia no acordo mútuo entre os


agentes envolvidos na tomada de decisão (SECCHI, 2015).

Você se lembra de que, no capítulo anterior, tratamos do modelo sistêmico


de análise das políticas públicas? Cabe destacarmos, aqui, que diversos teóricos
adotam a abordagem sistêmica como caminho de análise e gestão para as
políticas públicas, e definem a forte correlação com a fase da tomada de decisões
(EASTON, 1953; SANTOS, 2012; ARAÚJO; RODRIGUES, 2017).

Araújo e Rodrigues (2017) explicam que a contribuição teórica de Easton


(1953) promove uma aproximação entre a abordagem sistêmica e a tomada de
decisões. De acordo com os autores, as políticas públicas são os outputs (saídas)
do sistema político. O sistema político funciona, nessa concepção, por meio de
agentes e de instituições que interagem

[...] enquadrados por um conjunto de normas, símbolos e


valores, cujo comportamento é condicionado por mecanismos
de suporte da envolvente social (inputs) ou por pressões
internas ao sistema (withinputs), que, além de influenciarem o
comportamento do sistema, também o alimentam e o mantêm
ativo, através da apresentação de exigências, necessidades e
problemas, por intermédio dos input channels (partidos, média,
grupos de interesses) (ARAÚJO; RODRIGUES, 2017, p. 16).

A abordagem sistêmica de tomada de decisões tem, como elemento


relevante, as relações de poder, tanto as que operam internamente, no sistema
político, quanto as que operam externamente, como exigências, pressões
políticas, barganhas e outros processos políticos que se firmam como ações que
formalizam os problemas públicos.

Outra forma de se compreender o panorama da tomada de decisões é o


modelo no qual os gestores públicos estabelecem uma determinada solução,
para, depois, buscar um dito problema a ser solucionado (SECCHI, 2015). Esse
é o denominado “Modelo dos Fluxos Múltiplos”, também chamado de “Modelo da
Lata de Lixo”.

O Modelo da Lata de Lixo inverte o quadro de nascimento de uma política


pública, normalmente, compreendida como uma resposta a um determinado
problema público. Por isso, a ação é norteada a partir da identificação de possíveis
soluções e de cenários políticos favoráveis (SECCHI, 2015). Vale ressaltar que o
fluxo de soluções a ser estabelecido depende de uma série de variáveis que o
policymaker deve ser capaz de gerenciar. A primeira delas é o fluxo das políticas
(policies), que varia, de acordo com uma série de eventos, como (re)eleições,
aprovação de orçamentos, refinanciamentos de programas públicos (SECCHI,
2015).

77
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

A janela de oportunidades de ação não está na análise de possíveis


alternativas, como se faz nos modelos anteriores, mas na congruência de: 1)
um cenário político (condição); 2) um problema; e 3) uma solução já existente
(SECCHI, 2015; FARAH, 2018).

Veja as principais características inerentes aos modelos de tomada de


decisões, segundo as linhas teóricas da racionalidade absoluta, da racionalidade
limitada, do modelo incremental, e do Modelo da Lata de Lixo (Modelo de Fluxos
Múltiplos):

QUADRO 4 – SÍNTESE DOS MODELOS DE TOMADA DE DECISÃO


Condições Análise das Modalidade de Critério de
Modelos
Cognitivas Alternativas Escolha Decisão
Análise completa
Racionalidade
e cálculo de
Absoluta Certeza Cálculo Otimização
consequências
Comparação das
Racionalidade Pesquisa sequen-
alternativas com
Limitada Incerteza cial Satisfação
as expectativas
Modelo Incre- Parcialidade Comparações su- Ajuste mútuo de
mental (interesses) cessivas limitadas interesses Acordo
Modelo da Lata Encontro de
de Lixo/Fluxos soluções e de
Ambiguidade Nenhuma Casual
Múltiplos problemas
FONTE: Secchi (2015, p. 55)

Você deve notar que o Modelo da Lata de Lixo é o único, dentre os


apresentados, que inverte a lógica de identificar um problema e, depois,
estabelecer alternativas para ele. A proposta, ao contrário, vai de encontro à
construção de ações, diante um cenário de capacidades estatais limitadas, no que
diz respeito à absorção das demandas da sociedade e da própria capacidade de
produzir respostas adequadas (FARAH, 2018).

Resumidamente, o Modelo da Lata de Lixo busca convergir um cenário de


oportunidades (janela de oportunidades) para que os policymakers emplaquem
uma ação já preexistente.

78
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

2.5 IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA


PÚBLICA
A fase de implementação da política pública não foi aprofundada nas
primeiras duas décadas de análise da ciência das políticas públicas, ficando de
fora das principais temáticas de pesquisa entre a década de 1950 e a década de
1970 (MOTA, 2020). Em grande parte da literatura do período, os processos de
implementação de políticas públicas eram denotados como de execução técnica,
sendo vistos como quase naturais (SPINK; BURGOS, 2019).

O termo “implementação”, segundo Spink e Burgos (2019), deriva da definição


de implemento, que está associado a um instrumento utilizável para a obtenção
de algum resultado. No entanto, a compreensão da implementação, na seara das
políticas públicas, deve ser ainda mais compreendida nas diferentes estruturas
históricas e culturais. Você poderá observar, nesta parte, que a construção de
pesquisas de implementação de políticas públicas é, historicamente, ligada à
percepção do papel da implementação como fase constitutiva na promoção de
ações públicas. Logo, o conceito a respeito do que é a implementação de políticas
públicas vem se transformando, ganhando novos contornos e olhares teóricos e
práticos.

Definimos, conceitualmente, a implementação de políticas públicas como a


etapa em que normas, rotinas e processos sociais saem do campo das intenções
e se transformam em ações (SECCHI, 2015). Esse é, em si, um campo rico de
fenômenos, reflexões e interesses sociopolíticos, e deve ser compreendido nas
suas dimensões mais amplas, estas que abrangem uma diversidade de agentes
que compõem, operam e recebem as políticas públicas, além de uma série de
elementos técnicos e administrativos relativos à própria condução do processo de
se “implementar” algo.

A noção da fase de implementação, como aquela etapa em que se executam


ações que são planejadas, deve ser revisitada e repensada. Raeder (2014)
cita que é o momento de se retirar o planejado do papel. No entanto, pode-se
considerar a implementação como algo mais complexo, que envolve, também,
o estabelecimento de novas diretrizes de ação, conforme se executa um
planejamento (PRESSMAN; WILDAVSKY, 1973).

Não obstante, Spink e Burgos (2019) observam que uma compreensão ainda
mais ampla e profunda, das políticas públicas, é traçada com a conceituação
de Barrett e Fudge (1981), que defendem a possibilidade de conceituá-las nos
programas partidários, nas atividades administrativas e na condução de regras e

79
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

de normas, proporcionando a reconfiguração das diretrizes e das ações planejadas


em policies, que podem ser continuamente transcritas, relidas, reescritas, ou, no
mesmo termo utilizado pelos autores, “[...] sucessivamente refinadas e traduzidas”
(BARRETT; FUDGE, 1981, p. 11).

A propositiva teórica de Barret e Fudge (1981) amplia a dimensão da


implementação das políticas públicas, como sendo a execução do que já foi
planejado anteriormente. Reflete a respeito das diferentes formas e configurações
de implementação, que envolvem a adaptação aos problemas processuais,
e da tradução de questões e de situações engendradas pela própria ação de
implementar algo. Nesse sentido, a reflexão de Spink e Burgos (2019) sintetiza
a proposta como implementação invertida. “Podem existir ideais, princípios,
propostas, até políticas, mas o papel é ser agregado às ações que se iniciam
em lugares, transladadas para fortalecer, e não para produzir ações” (SPINK;
BURGOS, 2019, p. 122).

Diante de tal perspectiva, a implementação passa a ser compreendida


como um passo que fortalece ações constituídas nas fases de identificação de
problemas públicos, de formação da agenda, de formulação de alternativas, e, até
mesmo, nos processos de deliberação política e intervenção de cenários.

Mazzei e Farah (2020) observam que as primeiras definições de


implementação de políticas públicas têm, como dimensão comum, a abordagem
top-down. As autoras definem que, nessa abordagem, a implementação se
inicia a partir da tomada de decisões oficiais de uma política pública, orientada e
definida por um governo central.

Outra dimensão com a característica do modelo top-down é a forte separação


entre os momentos de tomada de decisões e implementação (SECCHI, 2015),
reflexo histórico da construção do conceito de implementação, que, até então,
vislumbrava-se em uma nítida ruptura classificatória entre o que seriam ações
políticas e o que seriam ações administrativas (WILSON, 1987; SECCHI, 2015).
Observe o modelo de Wilson a partir da distinção entre a esfera política e a esfera
da administração:

80
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

FIGURA 3 – MODELO DE WILSON

FONTE: Adaptada de Wilson (1987)

Na prática, as esferas não se mantêm estáticas e separadas. Ao contrário do


exposto por Wilson (1987), as esferas da tomada de decisões e de implementação
são fortemente interdependentes. Abordaremos, mais adiante, como essas duas
esferas se associam e promovem transformações mútuas na configuração uma
da outra, a partir de um olhar mais crítico sobre os processos de implementação
de políticas públicas.

Cabe, ainda, refinarmos, aqui, algumas definições importantes acerca do


conceito da abordagem top-down. Lima e D’Ascenzi (2013) observam que essa
abordagem analítica tem um olhar voltado aos processos entre as fases do CPP,
descortinando as dimensões como distintas entre si, além de serem tidas como
partes que possuem lógicas e estruturas processuais diferentes. Tal concepção
está ligada ao modelo de análise de Wilson (1987), já citado anteriormente, mas
também faz parte das propostas teóricas de distinguir o processo de formulação
das políticas (político) e o processo de execução destas (SILVA; MELO, 2000).

Um perigo da abordagem é o pouco interesse no processo de implementação,


como analisam Lima e D’Ascenzi (2013):

Se a implementação é uma consequência, a explicação para


a trajetória está no processo que lhe deu origem. Com isso,
o foco se direciona para o processo de formulação. A análise
é centrada nas normas que estruturam a política pública e as
lacunas. As lacunas correspondem a mudanças que ocorrem
na política durante a execução (LIMA; D’ASCENZI, 2013, p.
123).

De acordo com essa visão de Lima e D’Ascenzi (2013), os problemas


identificados na etapa da implementação podem ser classificados, facilmente,
como problemas dos formuladores de políticas públicas, o que deixa aberta uma
série de questões relativas aos entraves e aos processos de implementação em
si. Por isso, de acordo com Lima e D’Ascenzi (2013), as teorias top-down ganham
um caráter normativo-prescritivo para elaborar caminhos, determinações e regras
para o estabelecimento de padrões de implementação de políticas.

81
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Secchi (2015) aponta que a abordagem também promove uma estratégia de


culpabilização por parte da classe política (tomadores de decisões), que defende
ter estruturado políticas públicas bem definidas e planejadas, e que se estas não
efetivam o problema que estava na esfera da implementação. Logo, de acordo
com essa compreensão limitada do processo, o problema de efetivação de todas
as políticas públicas seria daqueles que as operam na ponta, como policiais,
professores, agentes de segurança, assistentes sociais etc.

Vastas críticas são feitas a esse modelo pela pouca interação com os agentes
que operacionalizam a política, de fato (AGUM; RISCADO; MENEZES, 2015), e
com as comunidades que recebem determinada política (beneficiários). Ainda,
deve ser exposta, como limitante prático, a noção de que formuladores de políticas
possuem o controle dos agentes organizacionais, políticos e tecnológicos, além
de como estes procedem na fase de implementação (SILVA; MELO, 2000; LIMA;
D’ASCENZI, 2013).

Segue a orientação “de cima para baixo”, que define o fluxo de gestão da
abordagem “top-down”:

FIGURA 4 – MODELO TOP-DOWN

FONTE: Secchi (2015, p. 60)

O modelo top-down de implementação tem origem embasada nas visões


funcionalista e tecnicista, que compreendem que as políticas públicas devem
ser elaboradas por atores da esfera política (SECCHI, 2015), além de serem
direcionadas pela exacerbação dos processos burocráticos e pela falta de
instrumentos de ação discricionais dos agentes nas pontas (SUBIRATS, 2006).

O modelo bottom-up surgiu no final da década de 1970, sendo estruturado


como uma crítica ao modelo top-down de implementação de políticas públicas
(MOTA, 2020). Essa concepção, do modo de implementar as policies, deve dar

82
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

notoriedade para as dimensões e as especificidades encontradas nas localidades


e nos processos intrínsecos à execução das ações anteriormente planejadas
(SUBIRATS, 2006; MOTA, 2020).

Segundo Secchi (2015), o modelo é marcado pela maior liberdade


dos burocratas e das redes que operacionalizam a ação pública, o que
possibilita promover uma auto-organização e a (re)definição dos processos de
implementação da política. Segue a orientação “de baixo para cima”, que define o
fluxo de gestão da abordagem bottom-up:

FIGURA 5 – MODELO BOTTOM-UP

FONTE: Secchi (2015, p. 61)

O modelo bottom-up tem, como característica, uma valoração dos


procedimentos e das rotinas administrativas, que são compreendidos, para os
teóricos dessa vertente, como instrumentos “utilizados para lidar com situações
de incerteza” (ARAÚJO; RODRIGUES, 2017, p. 28). As dimensões burocráticas
se materializam no debate da implementação de políticas públicas sob um
esforço de formalização de meios e de métodos que promovam alta eficiência na
execução dos serviços e das políticas públicas (SUBIRATS, 2006).

Conforme expõe Subirats (2006), as administrações públicas estão inseridas


em contextos nos quais a ação de implementação está envolta aos:

• Objetivos que se apresentam inconsistentes e de forma difusa.


• Recursos disponíveis, que são sempre insuficientes.
• Controles que são realizados de forma muito superficial e formalista.

Todo o cenário amplia, ainda mais, as necessidades de pensar e de repensar


em estratégias e caminhos mais eficazes para produzir a ação pública. Não
obstante, para Subirats (2006), os burocratas vivenciam uma dicotomia nesse
cenário de incertezas, grandes desafios e necessidade de ação prática:

83
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

A administração e os reformadores devem, portanto, manter a


tensão entre a construção de parâmetros gerais, que servem
como diretriz para todos os servidores públicos, e, ao mesmo
tempo, distinguir, precisamente, aqueles serviços que exigem
a manutenção de um certo grau de flexibilidade e liberdade
de ação. Em muitos casos, isso parece necessário, então,
imagine certas diretrizes de controle específicas para cada
caso, evitando a tendência de aumentar o procedimentalismo
desnecessário (SUBIRATS, 2006, p. 123).

A reflexão em torno de uma prática que se modela a partir das situações em


vista é o caminho traçado pelo autor, para que os policymakers possam escapar
das armadilhas da incerteza, e, ao mesmo tempo, não recair sobre demasiado
tecnicismo burocrático. Esse é, em suma, um ponto-chave no modelo bottom-up:
reconhecer as limitações das decisões tecnológicas (SECCHI, 2015).

Ganha eminência o poder decisório do próprio implementador da política,


que possui um elevado grau de participação na análise do problema que se
encontra sobre a sua responsabilidade e na prospecção de alternativas que
gerem respostas positivas frente aos problemas e incertezas que surgem durante
a implementação. Assim, pode-se dizer que a discricionariedade do gestor de
políticas públicas, no modelo bottom-up, é maior (SUBIRATS, 2006; SECCHI,
2015).

Apesar dos avanços para promover um olhar mais específico sobre


os passos da execução de ações pública, o modelo bottom-up apresenta
limitações, principalmente, no que se refere ao direcionamento de se basear,
fundamentalmente, como um modelo orientado a partir das visões dos
participantes (agentes que estão na ponta da política). Isso não permite que o
modelo avance na consolidação de um arcabouço teórico mais robusto, uma vez
que as “vozes” e os direcionamentos da operacionalização se tornam, sempre,
dos participantes, e não consegue determinar quais são os fatores que influenciam
os comportamentos destes (MOTA, 2020).

Se você tem interesse em conhecer outras experiências


e inovações que aplicam o modelo bottom-up como forma de
implementar políticas públicas na sociedade, leia o artigo acadêmico
disponível a seguir, com a experiência do Museu de Favela (MUF):
https://doaj.org/article/71c2487f78324e37887da92268c440af.

84
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

Nas investigações mais recentes, desde a década de 1990, essa fase tem
suscitado grande interesse de pesquisadores (FARAH, 2018); pois, aqui, pode-
se produzir uma métrica de como determinada política se comporta de forma
efetiva. A definição dos planos e dos projetos de políticas públicas sai do papel,
e, na fase da implementação, é possível observar, a partir de diferentes conjuntos
analíticos, os primeiros resultados da política diante da sociedade. Como exemplo,
as experiências dos orçamentos participativos, instrumentos de inserção da
sociedade civil nos processos de tomada de decisões públicas.

Farah (2018) revela que grande parte da literatura brasileira, que aborda a
fase da implementação de políticas públicas, foi produzida depois dos anos 2000,
o que demonstra como é um campo novo, e que vem sendo discutido a partir
de um cenário onde se ampliaram os novos arranjos institucionais de políticas
públicas. Por conseguinte, grande parte dessa produção se estabelece na análise
de casos práticos de políticas implementadas ou de implementação, nas mais
diferentes esferas federativas, e com diferentes configurações e características
práticas.

2.6 AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO


Vamos nos aprofundar em duas outras dimensões importantes do CPP que,
apesar de estarem definidas como uma única fase, não devem ser confundidas
como sinônimos ou como um mesmo elemento prático ou teórico. Ao contrário,
a avaliação e o monitoramento guardam, em si, características e composições
diferentes, e que devem ser destacadas.

Comecemos falando da avaliação. A avaliação é, comumente, definida


como o método pelo qual se determina o valor de algo. Você já deve ter ouvido
o termo avaliação de diferentes formas, e aplicado em uma série de contextos
bem variados, como avaliação de pessoas, avaliação escolar, avaliação financeira
etc. No entanto, para abordar o campo da avaliação, especificamente, para as
políticas públicas no CPP, é preciso tomar a definição de Howlett, Ramesh e Perl
(2013, p. 199). A avaliação é considerada como a etapa “[...] do processo em que
se determina como uma política, de fato, está funcionando na prática”.

Como destaca Tejadas (2020), a avaliação de políticas públicas ganhou


espaço no Brasil, sobretudo, a partir da década de 1980, com a promoção de
exigências e de regras para a execução de diversas atividades do setor público.
Torna-se importante ressaltarmos, aqui, o cenário da gestão pública do período,
que passou a dar ênfase aos processos de eficácia e de eficiência, impulsionados
pelo Modelo Gerencial e pela construção da denominada Reforma Gerencial
Brasileira, que se materializou na pauta pública no início da década de 1990.

85
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Um dos nomes que se transformou no símbolo da Reforma


Gerencial Brasileira foi o de Luiz Bresser-Pereira, antigo Ministro
da Administração e Reforma do Estado (MARE). O seu papel foi
fundamental na condução da reforma gerencial.
Você pode ler e conhecer mais a respeito a partir do artigo
Reflexões sobre a Reforma Gerencial Brasileira de 1995 (BRESSER-
PEREIRA, 1999). Acesse https://revista.enap.gov.br/index.php/RSP/
article/view/354.

Quanto aos diferentes momentos nos quais se insere o processo avaliativo,


é importante que você perceba a avaliação como uma etapa que pode, e, muitas
vezes, deve estar presente em todas as fases do Ciclo de Políticas Públicas,
desde a identificação do problema até a extinção, assumindo, obviamente,
diferentes papéis e objetivos. Secchi (2015) define três momentos diferentes da
aplicação avaliativa: 1) avaliação ex ante; 2) avaliação in itinere (monitoramento);
e 3) avaliação ex post. Referem-se, respectivamente, a avaliações que antecedem
uma ação, que ocorrem durante a implementação de determinada ação e que
sucedem.

Estudos da área da educação apresentam tipologias de avaliação quanto à


finalidade avaliativa (PASSOS, 2014), que podem ser reportados para o campo
das políticas públicas, expondo possíveis formas aplicáveis de mensuração dos
processos de formulação, de constituição da agenda pública, de implementação,
de avaliação e de monitoramento.

Acompanhe uma síntese dos três modelos de avaliação a partir dos tempos
de inserção: antes, durante e depois do processo:

86
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

FIGURA 6 – TIPOS E MOMENTOS DA AVALIAÇÃO

FONTE: Adaptada de Passos (2014)

As ações avaliativas realizadas antes do processo podem, no geral, ser


definidas como ações de diagnóstico, de prognóstico e de previsão, pois buscam
estabelecer um panorama ou um quadro resumido do cenário em avaliação para
que se possa definir um modelo de ação mais adequado (PASSOS, 2014; DA
CUNHA, 2018). Já as avaliações realizadas durante o processo possuem um
caráter de acompanhamento da implementação, orientação e regulação dos atos
em curso. Diante da perspectiva de forte interação com a fase da implementação
de políticas públicas, definições e abordagens, por vezes, são conceituadas, por
alguns teóricos, como parte integrante da fase de implementação (evaluation
research – pesquisa avaliativa) (SECCHI, 2015).

As avaliações que ocorrem no “pós-implementação”, e possuem um caráter


mais retroativo sobre determinada ação, são modelos avaliativos de cunho
somativo, integradores e/ou acreditadores, pois exercem um papel de conformar
dados a partir dos resultados apresentados pela execução da ação, podendo,
ainda, estabelecer a necessidade de ações corretivas ou não (COTTA, 1998;
COHEN; FRANCO, 2004; DA CUNHA, 2018).

Segue uma síntese de diferentes modelos e variáveis de avaliação,


apresentada por Da Cunha (2018), que estabelece uma análise específica de
quatro tipos distintos de modelos de avaliação para o campo das políticas públicas:

87
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

QUADRO 5 – MODELOS DE AVALIAÇÃO, SEGUNDO DA CUNHA (2018)


Modelos de
Variáveis Características
Avaliação
Realizada por pessoas de fora da instituição responsável pelo pro-
grama, em geral, com experiência nesse tipo de atividade. Dentre as
vantagens desse tipo de avaliação, podem ser citadas a isenção e
a objetividade dos avaliadores externos, que não estão diretamen-
te implicados com o processo, além da possibilidade de compara-
ção dos resultados obtidos com os de outros programas similares
já analisados. Por outro lado, o acesso aos dados necessários se
Avaliação torna mais difícil, e os agentes que têm o trabalho avaliado podem
Externa se colocar em posição defensiva, fornecendo informações parciais e
minimizando o efeito de melhoria dos programas. Alega-se, também,
que o conhecimento da metodologia de avaliação pode não substituir
o conhecimento das especificidades do programa, e que não existe
uma única metodologia aplicável.
Realizada dentro da instituição responsável, com colaboração das
pessoas que participam do programa. Citam-se, como vantagens,
Segundo o a eliminação da resistência natural a um avaliador externo, a possi-
agente que bilidade de reflexão, a aprendizagem e a compreensão da atividade
a realiza (de realizada dentro da instituição. Contudo, nesse tipo de avaliação,
acordo com pode-se perder muito de objetividade, já que os que julgam estão,
Avaliação
Cohen e também, envolvidos, tendo formulado e executado o programa. Se,
Interna
Franco, 2004; na tentativa de diminuir a subjetividade, a avaliação for realizada in-
Cotta, 1998). ternamente à instituição, mas por pessoas que não participam do
programa, a situação se torna análoga à do avaliador externo.
Procura combinar os tipos de avaliação anteriores, fazendo com que
os avaliadores externos tenham contato estreito com os participantes
Avaliação
do programa a ser avaliado, na tentativa de manter as vantagens e
Mista
superar as desvantagens das avaliações apresentadas.
Usada, principalmente, para pequenos projetos, prevê a participação
Avaliação
dos beneficiários das ações no planejamento, na programação, na
Participativa
execução e na avaliação.
Relacionadas à formação do programa. Adotadas durante a imple-
mentação, são voltadas para a análise e a produção de informação
das etapas de implementação. Geram informações para os que es-
Avaliações tão diretamente envolvidos com o programa, com o objetivo de for-
Quanto à
Formativas necer elementos para a realização de correções de procedimentos
natureza (de
para melhorar o programa.
acordo com
Relacionadas à análise e à produção de informações das etapas
Da Cunha,
posteriores. São realizadas quando o programa está sendo imple-
2018). Avaliações
mentado há algum tempo ou após a implementação, para verificar a
Somativas
efetividade e fazer o julgamento do valor geral.

88
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

Realizada no começo de um programa, com o fito de dar suporte à


decisão de implementar ou não a proposta. Ordenar os vários proje-
tos, segundo a eficiência, para alcançar os objetivos determinados. O
elemento central da avaliação ex-ante é o diagnóstico, que auxilia
na alocação dos recursos disponíveis, de acordo com os objetivos
Ex-ante
propostos. Para essa avaliação, podem ser utilizadas as técnicas de
Quanto ao Análise Custo-Benefício e Análise Custo-Efetividade, mais afeita aos
momento da programas sociais.
avaliação Realizada durante a execução de um programa ou no fim, quando
(de acordo as decisões são baseadas nos resultados alcançados. Nesse tipo de
com Cohen e avaliação, julga-se se um programa em execução deve continuar ou
Franco, 2004; não, com base nos resultados obtidos até o momento. Se a resposta
Cotta, 1998). for positiva, julga-se manter a formulação original ou sofrer modifi-
Ex-post
cações. Por sua vez, quando o programa já for concluído, julga-se a
pertinência do uso futuro da experiência, ou seja, se o mesmo tipo de
programa deve ser implementado novamente ou não.
Realizada durante a implementação do programa, diz respeito à di-
mensão de gestão. É uma avaliação periódica que procura detectar
Avaliação
as dificuldades que ocorrem durante o processo, para efetuar corre-
de proces-
ções ou adequações. Serve de suporte para melhorar a eficiência
sos
De acordo operativa.
com os tipos Tem objetivos mais ambiciosos, respondendo se o programa funcio-
de problemas na ou não. Procura verificar em que medida o programa alcança os
ou pergun- objetivos e quais são os efeitos, indagando se ocorrem modificações
tas a que na situação-problema que origina a formulação do programa, após
respondem a implementação. Serve de suporte para a decisão política, como
(de acordo continuação do programa e/ou formulação de outros. É a avaliação
Avaliação
com Cohen e mais complexa, pois envolve o julgamento de hipóteses, como: (i)
de impac-
Franco, 2004; Uma solução se aplica a outras realidades ou apenas a determinado
tos/resulta-
Cotta, 1998). contexto? (ii) As mudanças observadas na situação-problema se de-
dos
vem à intervenção ou a outros fatores? (iii) As mudanças são perma-
nentes ou temporárias, cessando com a interrupção do programa?
FONTE: Adaptado de da Cunha (2018)

Como pode ser percebido, as atividades de avaliação podem ser definidas


a partir de diferentes critérios, que, em suma, representam a inserção do agente
que as realiza, o momento em que se inserem diante de determinada ação, a
natureza, e a finalidade do processo avaliativo (por que é realizado?).

Não obstante, alguns desses tipos de avaliação são mais comuns e utilizados
do que outros, enquanto outros são mais específicos e aplicados em certas
abordagens e situações na resolução de problemas públicos. As avaliações

89
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

ex-post, por exemplo, são as mais difundidas, inclusive, pelo ato falho de se
compreender a fase da avaliação como um momento que deve existir apenas no
fim do ciclo de política pública (DA CUNHA, 2018).

Outras formas avaliativas são menos usuais e menos abordadas na literatura


de políticas públicas, como as avaliações formativas. Possuem um papel marcante
no estabelecimento de ações corretivas e conformativas em prol de policies em
implementação. Abordaremos os modelos, e, de forma mais aprofundada, a
respeito dos tipos de avaliação, no próximo capítulo.

Você deve estar atento para a percepção de que o ato de avaliar políticas
públicas não é neutro (TEJADAS, 2020). Abriga, em si, o estabelecimento de
critérios do que se deseja avaliar, além de julgamentos valorativos (SILVA, 2001;
TEJADAS, 2020).

De acordo com Secchi (2015), os critérios mais utilizados para a avaliação de


políticas públicas são:

• Economicidade: refere-se ao nível de utilização de recursos (inputs).


• Produtividade: refere-se ao nível de saídas de um processo produtivo
(outputs).
• Eficiência econômica: trata da relação entre outputs (produtividade) e
inputs (recursos utilizados).
• Eficiência administrativa: trata do seguimento de prescrições, ou seja, do
nível de conformação da execução a métodos estabelecidos.
• Eficácia: corresponde ao nível de alcance de metas ou objetivos
estabelecidos.
• Equidade: trata da homogeneidade de distribuição de benefícios (ou
punições) entre os destinatários de uma política pública.

Todos esses critérios podem servir como métricas para aferir a execução de
uma política pública. Daí, chegamos a um ponto importante, que é a construção
de indicadores sólidos e confiáveis para a promoção de uma análise avaliativa
sensível à realidade que se deseja medir. Falaremos desse assunto, mais
profundamente, no próximo capítulo, no qual abordaremos a relevância dos
indicadores como instrumentos para os processos de avaliação de políticas
públicas.

Agora, retornaremos a alguns passos para as discussões em torno da


fase de avaliação das políticas públicas, debate que, inevitavelmente, leva-
nos aos questionamentos propostos por Silva (2001), quanto aos processos
avaliativos: afinal de contas, por que avaliar? Essa é uma pergunta que deve
ser feita no desenho de qualquer ação, pois ressalta o papel da avaliação como

90
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

um instrumento para atingir um determinado fim, e que possui um elo com as


motivações de segmentos políticos, grupos da sociedade civil e organizações
de segmentos que interagem com o campo da política analisada. Até mesmo,
com a própria construção do planejamento do processo avaliativo (SILVA, 2001;
TEJADAS, 2020).

Outras questões inerentes à etapa da avaliação de políticas públicas é


incluída por Downs (1999), que destaca a existência de um custo de transação
presente nos processos avaliativos, ponto que não pode ser negligenciado,
pois, para que qualquer avaliação possa ser realizada, envolve tempo, recursos
financeiros, recursos técnicos e esforços (políticos e institucionais) (DOWNS,
1999).

A respeito das dimensões da avaliação, é importante frisar que o acabou


jurídico institucional, estabelecido a partir da Constituição Federal, e as demais
leis que regem a administração pública, também são diretrizes que devem ser
norteadoras da ação dos gestores públicos. Nesse sentido, são diretrizes
estabelecidas, por exemplo, pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que
condiciona como os policymakers podem (ou não) operacionalizar os gastos
públicos a partir de diferentes operações de crédito. Para a fiscalização dos
atos, existem os Tribunais de Contas, destinados a servir como braços técnicos
dos poderes legislativos. As experiências de avaliação de políticas públicas,
executadas no âmbito do Ministério Público (MP), também são exemplos tácitos
regidos pelos ditames e princípios normativos do direito, como elucida Tejadas
(2020).

Vamos falar de monitoramento? O monitoramento também pode ser


denominado como acompanhamento. É conceituado, por Da Cunha (2018, p.
36), como “[...] uma atividade gerencial interna, realizada durante o período de
execução e operação”.

É importante que você possa distinguir avaliação e


monitoramento como fenômenos distintos da gestão de políticas
públicas, ou seja, a avaliação pode ser realizada antes, durante ou
depois do processo de implementação, enquanto o monitoramento
é uma ação específica de ação durante o processo (DA CUNHA,
2018).

91
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

O monitoramento é um processo contínuo, que busca examinar produtos,


bens e/ou serviços. Dessa forma, o monitoramento público é a fase que materializa
um exame, podendo corrigir, imediatamente, desvios ou imprevistos identificados.
Como elucida Boullosa (2013), monitoramento e avaliação comungam da
característica de serem exemplos de pesquisa aplicada, além de buscarem
oferecer respostas de um dado objeto.

Devido ao caráter de acompanhamento de determinado fenômeno, o agente


que executa o monitoramento pode estabelecer “padrões de comportamento
de dados” (BOULLOSA, 2013, p. 29), o que nos permite verificar oscilações
inesperadas em determinado processo, que tem determinados padrões
estabelecidos como aceitáveis ou inaceitáveis. Dessa forma, pode-se considerar
que avaliação e monitoramento são instrumentos complementares, e que,
segundo Boullosa (2013):

• Permitem estabelecer perguntas específicas do comportamento do


objeto analisado.
• Fazem o conhecimento avaliativo das características reais de um dado
fenômeno oferecer a oportunidade de promoção de um monitoramento
mais próximo da realidade do fenômeno e dos comportamentos.
• Ajudam uma avaliação bem delimitada a estruturar os propósitos de
construção do monitoramento.

É importante frisar que o monitoramento se situa, no Ciclo de Políticas


Públicas, como uma ação inerente à fase de implementação da política, tendo,
como finalidade, produzir ajustes imediatos, ainda, na fase de execução da ação
monitorada (SECCHI, 2015).

A Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação (SAGI),


subordinada ao Ministério da Cidadania, possui um acervo de
publicações referentes a estudos elaborados pelo Departamento
de Monitoramento de Políticas Públicas do governo federal. Você
pode acessar em https://www.gov.br/cidadania/pt-br/servicos/sagi/
relatorios.

No Capítulo 3, retornaremos ao tema do monitoramento de políticas públicas


e das dimensões do processo avaliativo a partir de diferentes modelos de ação,

92
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

teorias e tipologias. Agora, finalizaremos o nosso percurso pelo Ciclo de Políticas


Públicas (CPP), abordando a fase da extinção e/ou da redefinição da política
pública.

2.7 EXTINÇÃO E/OU REDEFINIÇÃO


DA POLÍTICA PÚBLICA
A fase da extinção e/ou da redefinição de uma política pública pode ser
compreendida como o fim do CPP, mas, não necessariamente, da política
pública. Na verdade, esta pode ser, nesta fase, reformulada (adaptada a partir da
resolução de imperfeições, da ampliação do escopo ou da redução deste).

Os estudos que abordam a extinção ou o término das políticas públicas


ganharam proeminência durante a década de 1970, nos países desenvolvidos
(SECCHI, 2015). O questionamento que alavancou foi o porquê de as políticas de
cunho social do Estado de Bem-Estar Social (Welfare State) serem colocadas em
xeque com as redefinições das funções estatais do período.

Com base nesses questionamentos, seguem, como causas da extinção de


uma política pública:

1. Quando o problema público, que deu origem à política, é resolvido (ou


apenas notado como).
2. Quando as políticas públicas, executadas para a resolução de
determinado problema, são tidas como ineficazes.
3. Quando o problema, apesar de não ter sido resolvido, passa a não figurar
mais com destaque na agenda pública e na agenda política.

As transformações na agenda política e na agenda pública são um ponto


que gera grandes transformações na produção de políticas públicas, uma vez que
determinado assunto, já não sendo mais visto como prioritário, pela classe política,
pela capacidade de ganhar recursos e espaço institucional, torna-se bem menor.
De forma próxima, quando dada população não toma mais determinado assunto
como prioritário, normalmente, este perde espaço na agenda institucional das
policies. Como exemplo, podemos citar a pandemia da COVID-19, que provoca
uma transformação abrupta na estrutura das contas públicas em diversos países
do mundo, diante do cenário de calamidade pública

93
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

O Welfare State tem, como pressuposto, a promoção de políticas


de cunho social, promovendo uma gama de políticas assistenciais,
principalmente, em países europeus, como Inglaterra, França e
Alemanha. No entanto, a agenda do bem-estar social perde espaço,
na agenda de países de grande peso da cena internacional, durante
as décadas de 1970, e, principalmente, 1980. Para você conhecer
um pouco mais das políticas de bem-estar social em países europeus
que mantiveram, apesar das redefinições sistêmicas, as agendas
sociais e de promoção do bem-estar público, como Finlândia e
Suécia, vale a leitura do livro organizado por Mauricio G. Delgado e
Lorena V. Porto: Welfare State: Os Grandes Desafios do Estado de
Bem-Estar Social (2019).

1 - O que é o Ciclo de Políticas Públicas? Explique, traçando os


pontos positivos e as limitações.

3 ESTILOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS:


REGULATÓRIAS OU GERENCIAIS
As políticas públicas também podem ser classificadas como regulatórias
ou gerenciais. Nesta seção, você poderá observar a conceituação de cada um
desses grupos, e identificar as diferenças a partir do estabelecimento de ações
dos policymakers diante de determinado problema público.

O modelo de políticas públicas regulatórias se fundamenta no estabelecimento


de regras, confiando que a promoção de normas e de leis, ou a promoção destas
(tornando-as mais explícitas), torna, mais eficaz, o controle, e produz melhores
efeitos de controle sobre as ações. Já o modelo gerencial tem, como preferência,
a utilização de recompensas para bons exemplos, ou a promoção da punição
de maus exemplos, regulando as consequências das ações (SECCHI, 2015).
Como exemplo de política regulatória, pode-se citar a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação (LDB), que foi criada para normatizar e regular o ensino (público e
privado) do Brasil.
94
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

Secchi (2015) define que o modelo gerencial tem, como foco, os resultados
e a capacidade de alcançar metas. Não obstante, os processos (os caminhos),
usados para se chegar a determinados resultados e metas, não são um ponto
focal desse grupo de políticas. Como define Bresser-Pereira (1996), a estrutura de
controles se volta para a fase final (medição de resultados), ex-ante, uma vez que
os processos avaliativos, aqui, são compreendidos com os controles de eficácia e
de eficiência (BRESSER-PEREIRA, 1996; SECCHI, 2009).

O modelo de políticas regulatórias tem, como foco principal, as ações, em


torno da atividade legislativa e da constituição de regras, normas e ditames
que orientam a ação das demais esferas do governo (Executivo e Judiciário).
Tal modelo se embasa na racionalidade de regras explícitas e previamente
estabelecidas.

4 GESTÃO ESTRATÉGICA OU
GESTÃO SOCIAL: COMO PRODUZIR
POLÍTICAS PÚBLICAS?
Caro estudante, como você bem sabe, a nossa disciplina se propõe a oferecer
uma discussão em torno dos modelos de gestão de políticas públicas. Dessa
forma, chegamos ao momento de adentrar nesse debate, que vem ganhando
mais espaço nos debates práticos e teóricos do campo, consolidando-se a partir
de diferentes construções teóricas, inovações institucionais e experiências de
gestão pública.

Você deve se lembrar de que, no Capítulo 1, discutimos os principais modelos


de análise das políticas públicas. Agora, abordaremos duas vertentes de ação
que orientam práticas, normas e instituições no âmbito da gestão de policies.
A primeira está alinhada ao processo de consolidação da Nova Administração
Pública (New Public Administration).

Em resposta às crises dos choques do Petróleo, vividas na década de


1970 e por vários Estados-nação, foi adotada uma série de agendas, princípios
e lógicas, de cunho empresarial, por parte dos agentes estatais (DENHARDT,
2011). Inglaterra e Estados Unidos são os pioneiros na adoção desse receituário
orientado pela ótica gerencial, de reequilíbrio das contas públicas em detrimento
das políticas de bem-estar social (MONTAÑO, 2002). Esse receituário se propõe
a adotar princípios mercadológicos para o controle das contas públicas, a busca
pela eficiência e a desburocratização das instituições do Estado (ANDION, 2012;
DENHARDT, 2011).
95
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

A partir do cenário exposto, formalizam-se, como instrumentos norteadores


da ação estatal, os ditames da gestão estratégica, adotada pelas organizações
empresariais e difundida como modelo ótimo de gestão, para ambos os segmentos
(público e privado).

Porter (1986) define a gestão estratégica como aquele processo que dá


origem a uma posição exclusiva. Já Mintzberg (1987) conceitua a estratégia
a partir de diferentes abordagens, como plano, manobra, padrão, posição e
perspectiva. Desses quatro eixos, surgem as diversas abordagens existentes, que
contemplam o conceito de estratégia. Não há um conceito único e definitivo, mas
se pode estabelecer um conceito que aglutina as concepções teóricas. Oliveira
(2001) defende que a estratégia é um caminho, uma maneira, ou, até mesmo,
um modelo de ação estabelecido e adequado para alcançar os interesses da
empresa.

Note que a concepção de estratégia oferecida por Porter (1986) e Oliveira


(2001) traça um caminho para alcançar um imperativo previamente estabelecido
por um único agente, o que traça o caráter, essencialmente, unidirecional da ação
estratégica, que normatiza um “plano de ação” para um dado objetivo.

A gestão estratégica e a dinâmica “teórico-prática” se enquadram dentro


do modelo de orientação instrumental, promovido, principalmente, pelo que
Tenório (1998, p. 4) chama de “racionalização das relações entre os homens”. Os
valores quantitativos passam a ser elementos predominantes sobre os valores
qualitativos.

O sociólogo brasileiro Guerreiro Ramos (1970) elucida o papel do Estado e


do gestor público de promover o desenvolvimento social para além do simples
crescimento econômico ou do Produto Interno Bruto (PIB), mas, para que tal
função possa ser cumprida com êxito, é necessário que a visão do sistema político,
dos burocratas e dos formuladores de políticas públicas deixe de se pautar por
uma visão utilitarista, tecnicista e, unicamente, pela esfera econômica, a partir
do aumento da eficiência dos recursos e da maximização do lucro. Esse modelo
de ação é denominado, por Ramos (1984), de racionalidade instrumental, um
elemento basilar da ação estratégica que se refina a partir da análise conjuntural
em prol do utilitarismo e do formalismo e em busca de melhores desempenhos
organizacionais. Um modus operandi muito próximo das grandes corporações,
e que ganha espaço nas organizações públicas, deixando, em segundo plano,
pontos fundamentais, quando se pensa em políticas públicas: qual é a efetividade
destas? Como impactam a vida das pessoas?

96
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

Já a gestão social pode ser compreendida como um campo em construção, e


que envolve diversas formas de aprendizagem (SCHOMMER; BOULLOSA, 2010),
sendo estruturas institucionais em que estão contidas “muitas formas de gestão”
(SCHOMMER; BOULLOSA, 2010, p. 6). Perceba que a concepção que traça a
ação da gestão social abre uma ampla gama de possibilidades de ação, sendo,
todas estas, voltadas para uma gestão que visa ao interesse bem-compreendido
(CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013), à solidariedade e à concordância
(TENÓRIO, 2016). Dessa forma, a gestão social pode ser compreendida como
“a tomada de decisões coletivas, sem coerção, baseada na inteligibilidade
da linguagem, na dialogicidade e no entendimento esclarecido” (CANÇADO;
TENÓRIO; PEREIRA, 2011, p. 697). Logo, a concepção teórica se volta para o
exercício da prática participativa e da deliberação em torno de como os agentes
enxergam determinados problemas públicos (e as possíveis soluções).

A gestão social está intimamente ligada aos processos deliberativos de


problemas públicos, como as políticas públicas. As abordagens de implementação
de políticas públicas, que buscam orientar práticas mais dialógicas, de interação
e de adaptação às especificidades locais, como o modelo bottom-up, possuem
íntima conexão com a práxis de um modelo de ação flexível e participativo
(SUBIRATS, 2006), capaz de incluir as demandas sociais no próprio processo
de implementação. Um exemplo prático de gestão de políticas públicas, nesse
modelo, são os Orçamentos Participativos (OPs). O Orçamento Participativo é um
instrumento de participação social que promove a inclusão da sociedade civil no
processo de planejamento e a definição das prioridades orçamentárias do poder
público para a resolução de problemas públicos.

Cabe apontarmos que o Orçamento Participativo é uma


experiência que se iniciou na década de 1970, durante o período
militar. As primeiras cidades nas quais a experiência foi registrada
foram Lages e Joinville (SC), Boa Esperança (ES) e Osasco (SP)
(CARLOS, 2015). Nesse contexto, é claro, o orçamento não seguia
os ditames da descentralização administrativa, incentivados pela
Constituição Federal de 1988 (os municípios passavam a ter
grande poder de definição e controle dos orçamentos). Ainda, não
se promovia uma participação autônoma, a partir da qual a própria
sociedade civil pudesse apontar, por exemplo, quais eixos (e políticas
públicas) seriam levados à discussão e à votação, para serem
promovidos pelo poder público local.
Já a experiência participativa da cidade de Porto Alegre (RS)
promoveu o OP como símbolo de autonomia e inclusão da sociedade

97
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

civil nos processos de decisão e de definição orçamentários. Para


que você possa conhecer mais o Orçamento Participativo (OP) em
experiências brasileiras, acesse o livro Controle Social e Política
Redistributiva no Orçamento Participativo, em http://repositorio.
ufes.br/bitstream/10/1264/6/Livro%20Edufes%20Controle%20
Social%20e%20pol%C3%ADtica%20redistributiva%20no%20
or%C3%A7amento%20participativo.pdf.

No que diz respeito à participação dos cidadãos nos processos de


planejamento, implementação e avaliação de políticas públicas, torna-se relevante
indicar que envolve, de acordo com Fung (2006), três variáveis distintas:

1. Quem pode participar, ou seja, o acesso e a acessibilidade dos espaços


de discussão das políticas públicas.
2. Comunicabilidade, em outras palavras, como são estabelecidas e
compartilhadas as informações e como se consolidam os processos de
tomadas de decisões.
3. Efetividade das discussões, o que, de fato, torna-se decisão, a partir das
discussões realizadas.

Na primeira variável, estão intrínsecos diversos debates em torno da


participação no âmbito das políticas públicas, inclusive, sob a ótica de serem
estabelecidos, em espaços de construção de políticas, como as Conferências e os
Conselhos Gestores, espaços de fala abertos para toda a sociedade e simétricos
(FUNG, 2006; DA SILVA et al., 2013). Contudo, não podemos deixar de notar a
complexidade da sociedade e dos agentes sociais que a compõem, inclusive, as
assimetrias sociais e históricas presentes, mesmo nos processos participativos e
no acesso às instâncias de participação. Logo, é possível perceber que, a partir
das desigualdades sociais de acesso à educação, por exemplo, podem surgir,
também, as assimetrias do acesso à participação. Como expõem Giannella,
Araújo e Neta (2011), pensar na oralidade como única forma de participação,
sem pensar nas exclusões existentes quanto ao acesso à educação formal e às
diferenças culturais, já impõe, por si só, exclusão e assimetrias para o acesso aos
espaços participativos.

Observe uma análise comparativa entre a gestão estratégica e a gestão


social a partir de Cançado, Sausen e Villela (2013):

98
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

QUADRO 6 – ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE GESTÃO


ESTRATÉGICA E GESTÃO SOCIAL
Dimensão Gestão Estratégica Gestão Social
Ponto de Partida Melhoria do Desempenho Participação/Bem-viver
Utilitária/Formal/
Racionalidade Comunicativa/Dialógica
Instrumental/Monológica
Baseada em planejamento e
Tomada de decisão coletiva,
em um sistema de alinhamento
balizada pelo interesse bem
Tomada de Decisão organizacional a partir dos
compreendido (bem-comum)
objetivos da organização
Informações constantes nos Informações disponíveis,
relatórios técnicos e nas avalia- baseadas na intersubjetividade,
Transparência ções sistemáticas com acesso tornando possível a dialogici-
limitado dade
Espaço Esfera privada Esfera pública
Minimização de custos e
Interesse bem-compreendido/
maximização de resultados
Finalidade da Gestão Bem comum
(Minimax)
Método Positivismo lógico Teoria Crítica
Concepção de Estrutu-
ra Organizacional Hierarquia Heterarquia
Premissas Teóricas Individualismo metodológico Socialização
Modus Operandi Competitividade Cooperação
Lucros e resultados empresa-
Benefícios Melhoria da qualidade de vida
riais
Preferencialmente, curto prazo;
médio e longo prazos basea- Sustentabilidade – longo prazo
Dimensão Temporal
dos em planejamento
Preocupação apenas com o Preocupação geral com o
Amplitude da Ação
que lhe é concernente contexto
Complexidade/Intersubjetivi-
Visão Linear/Objetiva
dade
Foco Mercadocêntrico Sociocêntrico
FONTE: Adaptado de Cançado, Sausen e Villela (2013)

O modelo de ação estratégica possui uma visão linear, que se materializa


a partir de processos de competição, um ponto que, em si, limita a aplicação do
modelo como único norteador no tocante à gestão de políticas públicas. Em suma,
evidenciam a necessidade de prover espaços e arranjos institucionais cada vez
mais voltados para a cooperação dos agentes sociais e das instituições.

A orientação traçada da gestão estratégica, para a melhoria de desempenhos,


também é outro fator limitante quando aplicada ao campo das policies, haja vista

99
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

que o pensar políticas públicas está além das dimensões de gerir orçamento e
recursos técnicos. As pessoas são partes fundamentais dos sistemas políticos, e
devem ser percebidas, como tal, com as suas complexidades. Por isso, Tenório
(2016) propõe a ação dialógica (fundamentada na participação) na escuta e
na inclusão do outro como um ponto essencial para a produção de resultados
efetivos, que possam trazer, à sociedade, políticas públicas adequadas para as
especificidades sociais.

Outra dimensão, apresentada no quadro anterior, e que merece destaque nas


nossas análises, é a da transparência. O modelo da ação estratégica tem, como
pilar, a transparência, por meio de relatórios e de outros instrumentos, muitas
vezes, tecnicistas, e que não possuem, em suma, a finalidade de dialogar a respeito
de uma informação passada. O próprio ato de “transparecer”, de disponibilizar
os atos públicos, em suma, é completo em si, de acordo com esse modelo. No
entanto, o modelo pautado pela gestão social vai além, ao frisar a importância da
inteligibilidade e da capacidade de comunicação entre os indivíduos que recebem
(e são capazes de interagir) a informação disponibilizada – esse ato dialógico
é a intersubjetividade, um elemento importante, inclusive, para pensarmos nos
modelos contemporâneos de accountability e de transparência, que devem ser
inteligíveis, para que a população possa compreendê-los e interagir com muitos
dados (ZUCCOLOTTO; TEIXEIRA; RICCIO, 2015).

Como premissa teórica, a gestão social se embasa na prática e na lógica


do individualismo metodológico, que é delineado pelo cálculo operacional dos
indivíduos acerca de quais elementos concedem vantagens e quais concedem
desvantagens.

O foco da racionalidade estratégica se dá na maximização do lucro, na


rentabilidade, e, consequentemente, desagua no que Ramos (1984) denomina
de um foco mercadocêntrico. As ações das organizações possuem, como fiel da
balança, a capacidade de haver lucro. Tal primazia (centralidade do mercado)
acaba deixando, em segundo plano, as dimensões sociais, ambientais e político-
institucionais. Em contrapartida, o foco da gestão social está voltado para uma
amplitude maior dos problemas sociais, estabelecendo, como norte da ação,
a construção sociocêntrica, a partir da busca pela resolução dos problemas
e das percepções das pessoas envolvidas nos processos (e não apenas das
visões de gabinetes - burocratas) (CANÇADO; SAUSEN; VILLELA, 2013). A
gestão social busca estabelecer uma ação comunicativa, que envolva os atores
e as preocupações com determinado contexto, expressando uma amplitude de
ação mais aberta do que a do modelo estratégico, que lança objetivos e busca
a resolução de problemas a partir dos olhares dos atores (TENÓRIO, 1998;
CANÇADO; SAUSEN; VILLELA, 2013).

100
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

Ainda, acerca do quadro anterior, repare que a gestão estratégica tem, como
espaço de primazia, o da esfera privada, por isso, a concepção de estrutura
organizacional segue os padrões das empresas, pensadas de forma hierarquizadas
e balizadas pela heterogestão, existindo uma unidade de comando que contempla
os modelos das políticas top down (de cima para baixo) e dando eminência aos
papéis dos tomadores de decisões públicas, como dos detentores do poder de
planejamento, formulação e avaliação das políticas. Na outra ponta, o modelo
da gestão social tem a esfera pública, que, na sua perspectiva habermasiana,
é o espaço de diálogo em torno de problemas e demandas públicos, visando
solucioná-los (TENÓRIO, 1998). A estrutura organizacional da gestão social
se baseia na heterarquia, o que promove a igualdade entre os agentes que se
inserem nos processos de discussão de problemas públicos. Nessa perspectiva,
o caminho da ação é orientado por processos que concedem, aos mais diferentes
atores sociais, o mesmo peso na tomada de decisões (TENÓRIO, 2012; 2016;
CANÇADO; SAUSEN; VILLELA, 2013).

Assim como nos apontamentos de Cançado, Sausen e Villela (2013), é de


fundamental importância que o debate em torno dos modelos de ações estratégica
e social não deva ser imbuído de juízo de valor ao indicar um único caminho
possível, nem mesmo de sobrepujar as qualidades de um campo de ação em
detrimento do outro, estabelecendo um bom e um mal. Ao contrário, o objetivo
dessa discussão é que você, caro estudante, possa identificar cada modelo de
gestão, e, de forma crítica, estabelecer o melhor caminho, a partir de cada cenário,
para a melhor tomada de decisões possível. Cabe apontar os caminhos da gestão
estratégica para tornar recursos mais eficientes. São, em suma, importantes, em
uma gestão que leve em conta a necessidade de parcimônia das contas públicas,
por exemplo. Complementando, deve-se somar, a isso, a ideia de que apenas
tornar eficiente não é o bastante. Logo, fazem-se necessárias a discussão e a
construção de caminhos que tornem as ações públicas mais efetivas, o que gera
bem-estar, emancipação e a necessidade de pensarmos no longo prazo e nas
dimensões da sustentabilidade (ambiental, cultural, social etc.).

5 POLÍTICAS PÚBLICAS: PARA ALÉM


DAS RELAÇÕES ENTRE ESTADO X
SOCIEDADE
As propositivas e as experiências de novos modelos de gestão das políticas
públicas trazem à tona outro assunto que é importante para a nossa reflexão em
torno do modo de constituição e de consolidação de iniciativas que busquem
resolver problemas públicos.

101
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Para que se possa compreender os arranjos de políticas públicas que vão


além da ação e da esfera estatal, deve-se fazer um resgate histórico do processo
de redefinição da agenda estatal vivido no Brasil e no cenário internacional,
durante a década de 1980. Como indicam Sicsú, Paula e Michel (2007), o
contexto de crise, vivido pelos Estados, na década de 1980, e a ascensão das
agendas neoliberais, promoveram uma retirada da ação estatal de diversos
segmentos. Nesse contexto, uma das agendas que ganhou espaço na gestão
pública brasileira foi a da reforma administrativa, intitulada, pelo então presidente
Fernando Collor de Melo, do então Partido da Reconstrução Nacional (PRN),
como “caça aos marajás”, em uma forte alusão aos servidores públicos de
carreira, como detentores de regalias. Daí, estabeleceu-se, como um dos pilares
da reforma administrativa brasileira, a privatização de empresas públicas, além do
enxugamento da máquina pública e das funções do Estado.

Ainda, nesse cenário de formalização de políticas neoliberais, muitas políticas


de seguridade social foram alvo da desresponsabilização e da descentralização
de políticas públicas, até então empreendidas apenas pela esfera do Estado
(SICSÚ; PAULA; MICHEL, 2007; MARQUES, 2019). Dessa forma, a governança
se estabeleceu por meio de modelos substitutivos da ação, antes, eminentemente,
estatal, passando a ganhar novos contornos com a promoção de políticas por
parte de organizações do terceiro setor e segmentos da sociedade civil organizada
(MONTAÑO, 2002).

A literatura parte da constatação geral de que políticas são


cada vez mais produzidas sob a influência de conjuntos mais
amplos de atores e de instituições em diversos novos formatos
de provisão – convênios, parcerias, contratos, concessões,
esferas participativas, contratos de gestão etc. [...] (MARQUES,
2019, p. 6).

Esses novos formatos de provisão de políticas públicas se formalizaram,


também, com a Carta Magna, de 1988, e a institucionalização da descentralização
federativa, instrumento que buscou orientar uma ampla agenda de implementação
de políticas e de ações na escala local. No bojo da transformação, novos desafios
da gestão de policies ganharam a cena, desde a inclusão de novas formas
institucionais, sistemas de coordenação em diferentes níveis de governo, até um
amplo debate em torno de eficiência e controle das dimensões estatais (FARAH,
2018).

Outro fator importante que dinamiza a interação entre as esferas estatais


e não estatais é o próprio processo de redemocratização brasileiro, que
redimensiona a própria noção de controle do Estado, abrangendo as dimensões
da participação social e da consolidação de instrumentos de controle social das
políticas públicas (MARTINS, 1989). Acerca desse cenário, Grisa et al. (2017, p.
15) observam que
102
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

[...] emergiram a partir dos processos de redemocratização


e de descentralização políticas dos anos 1980 (reforçados
na Constituição Federal de 1988), os quais permitiram a
conformação de arranjos institucionais que ampliaram a
interação entre o governo, a burocracia estatal e a sociedade
civil organizada (GRISA et al., 2017, p. 15).

Um exemplo do processo de institucionalização de canais de diálogo e de


participação entre o governo e as demais esferas da sociedade são os Conselhos
Gestores de Políticas Públicas, instrumentalizados na Constituição de 88, por
meio dos Arts. 198, 204 e 206.

Se você tiver interesse em conhecer mais a trajetória institucional


de formalização dos Conselhos Gestores de Políticas Públicas
no Brasil, recomendamos a leitura do livro Conselhos Gestores e
Participação Sociopolítica (2016). Maria da Glória Gohn apresenta,
por meio de um resgate histórico, o processo de formalização dos
espaços de participação e de gestão de políticas públicas, além
de discutir, de forma profunda, a respeito das possibilidades e das
limitações.

Mota (2020), por exemplo, observa que os estudos das políticas públicas, em
Portugal, apontam para uma forte fragilidade dos processos de implementação das
policies, principalmente, no âmbito de ações intraorganizacionais e promovidas
em processos de governança entre Estado, agentes privados e organizações e
setores da sociedade civil.

No contexto, abre-se um leque de possibilidades (de governança), mas,


também, de problemas advindos pela própria gestão desses processos (de
participação, de coprodução, de gestão territorial e governança local, de ações em
coalizões de setores não institucionalizados). Não obstante, a literatura, que tem,
como ponto-chave, esses processos, não para de crescer (DALLABRIDA, 2015;
2016; GOMIDE; PIRES, 2014; MACHADO; ZIBECHI, 2017), além dos estudos
que surgem, buscando compreender quais são as capacidades estatais diante
dos novos cenários e arranjos institucionais (BARENBLITT, 2002; SILVA, 2014).

Antes de nos aprofundarmos nas duas dimensões propositivas de análises,


faz-se necessário conceituarmos o que é governança e governança territorial.

103
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

O termo governança tem origem na definição de ações voltadas para a esfera


empresarial e as atividades dos agentes (gestores) das organizações. Rodrigues
e Malo (2006) apontam que a área da administração de empresas adota o
termo governança como um elemento que envolve o controle das organizações,
atrelando o papel aos agentes de conselhos diretivos, envolvidos nos processos
decisórios.

O termo governança, adotado aqui, possui outra dimensão, voltada para os


fenômenos de partilha do poder e de tomada de decisões, sendo mais específico
aos processos de ação coletiva em organizações de natureza cooperativa e
associativa, e sob égides democráticas (RODRIGUES; MALO, 2006). Por vezes,
é assimilado, pela literatura, como “governança pública” (LE GALÈS, 2014),
termo que explicitaremos, por se conectar muito ao conceito de políticas públicas
(oferecer resposta a um problema público).

Le Galès (2014, p. 301) conceitua a governança pública como o processo que


busca promover a coordenação “[...] de atores, de grupos sociais e de instituições,
com o propósito de alcançar objetivos definidos e discutidos coletivamente”. No
entanto, a concepção propõe, na visão de Kooiman (1993), uma preponderância
do papel do Estado como agente do processo de governança pública.

Por outro lado, a governança territorial é definida, por Dallabrida (2015, p.


325), como um processo que envolve o planejamento e a gestão “[...] de dinâmicas
territoriais, que dá prioridade a uma ótica inovadora, partilhada e colaborativa, por
meio de relações horizontais”. Não se estabelece, previamente, a preponderância
de um agente, seja este o Estado, o mercado, ou a sociedade civil. De tal forma,
não há um agente-chave para a promoção de ações nas escalas locais, mas se
deve compreender as relações interorganizacionais promovidas, e como estas se
efetivam (DALLABRIDA, 2016).

O conceito que precisa ser adotado na condução das próximas análises é o


da “governança territorial”, apesar de necessitar de delimitações mais precisas e
de um estabelecimento teórico mais adequado, no que tange aos comportamentos
dos agentes na construção dos processos territoriais, isso porque o termo nos
propicia refletir a respeito dos processos políticos imbuídos na governança de
ações compartilhadas entre diferentes atores e segmentos institucionais (PIRES
et al., 2017).

A consolidação de experiências e de práticas interorganizacionais, que


sejam, de fato, não hierarquizadas, passa, evidentemente, pela desconstrução da
cena normativo-prescritiva, que, historicamente, envolveu o campo das políticas
públicas (BOULLOSA, 2013; FARAH, 2018), assim como as diretrizes de ação

104
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

dos policymakers como agentes com racionalidades limitadas, e que devem levar
em consideração uma série de fatores, como a interação com grupos de pressão
e de interesses, as relações de poder e o tecnicismo (LINDBLOM, 1959; ARAÚJO;
RODRIGUES, 2017). Dessa forma, os processos de ação/intervenção, em prol de
problemas públicos, não devem ser pautados apenas pela ótica tecnicista e pouco
participativa, envolta nas dimensões burocratizadas e que seguem o modelo top
down, como vimos anteriormente.

Grisa et al. (2017) exemplificam a partir da implementação das políticas de


cunho territorial no Brasil, um arcabouço de policies que foi institucionalizado pelo
extinto Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), desde 2003. Esse conjunto
de políticas se propunha a ser não apenas “estatal”, por agregar segmentos que
não se limitavam ao governo nas diferentes esferas (federal, estadual e distrital,
ou municipal). Além disso, as próprias dimensões da participação social e os
arranjos institucionais dos órgãos colegiados, como meios para a promoção de
ações locais, são exemplificações claras que os arranjos propõem pensar na
resolução dos problemas rurais a partir da visão dos agentes que os vivenciam.

Essa interação, associada ao estabelecimento de um governo


de centro-esquerda, a partir dos anos 2000, permitiu a criação
de um ambiente político-institucional propício à conformação
de um corpo político e de uma burocracia que colocaram a
agricultura familiar e o desenvolvimento rural na agenda política
do país e estabeleceram capacidades estatais [...] (GRISA et
al., 2017, p. 15).

Um exemplo prático da redefinição da agenda de políticas rurais, em torno


da temática da agricultura familiar, foi a construção dos colegiados territoriais
no âmbito do Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios
Rurais (PRONAT), o qual instrumentaliza os colegiados como espaços de
participação e de deliberação pública entre os agentes e as instituições que
buscam solucionar problemas.

Se você gostaria de conhecer mais a respeito da ótica de


funcionamento, das possibilidades e das limitações existentes na
configuração dos Colegiados Territoriais, poderá encontrar alguns
estudos que traçarão um panorama de diferentes instituições
em territórios de todo o Brasil, como https://sucupira.capes.
gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/trabalhoConclusao/
viewTrabalhoConclusao.jsf?popup=true&id_trabalho=8171986.

105
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Ostrom (2009) promove uma síntese do conceito de “governing the


commons”, ou seja, dos processos inerentes à governança da produção de
bens comuns. Na sua concepção teórica, há a coprodução de bens públicos,
com diferentes agentes que compartilham a produção de determinado bem ou
serviço para um determinado público. Nessas experiências, são estabelecidas
redes interinstitucionais, conectando agentes externos e internos da esfera
estatal, e que orientam o planejamento, a implementação e/ou a avaliação de
serviços públicos (AGE; SCHOMMER, 2017). Essas experiências de políticas
públicas são entregues, pensando na participação efetiva do cidadão e de setores
sociais, com forte interseção com a ação estatal, em questão, ainda bem nova
no Brasil (AGE; SCHOMMER, 2017). Por isso, apresenta-se uma ruptura cultural
ao serem promovidos segmentos sociais como partes ativas (BOVAIRD, 2007),
desmistificando a imagem histórica destes como atores receptores (passivos)
(BOULLOSA, 2013; SECCHI, 2015).

Você se lembra de que, no Capítulo 1, falamos da abordagem multicêntrica


das políticas públicas? Uma linha teórica que compreende, como política pública,
ações empreendidas não apenas pela esfera estatal (BOULLOSA, 2013). Um
caminho teórico-metodológico indicado para promover uma consolidação dessa
perspectiva para a gestão de políticas públicas é a abordagem da “Mirada ao
Revés”, que busca compreender os processos de ação e de produção coletivas,
orientados pela promoção de relações dos próprios agentes sociais que
configuram (e reconfiguram) esferas públicas de ação (BOULLOSA, 2013).

Metodologicamente, é preciso reconhecer que a verdade que


emerge de tal construção é sempre artificial, parcial, subjetiva,
incerta e interdependente de outras verdades. A reconstrução
proposta pela mirada ao revés vem sendo desenvolvida a partir
da assunção de alguns pressupostos que orientam o desenho
dos instrumentos de pesquisa, sobretudo, os qualitativos
(BOULLOSA, 2013, p. 81).

A dinâmica da Mirada ao Revés propõe um método analítico orientado pela


compreensão do objeto das políticas públicas como um “constructo social” amplo,
dinâmico, e que pode ser assumido de diferentes formas, a partir das visões
de mundo de diferentes agentes sociais. Desse modo, a pesquisa qualitativa
exerce grande relevância no sentido de empreender passos metodológicos para
uma melhor análise do panorama dinâmico e complexo das políticas públicas,
de acordo com a posição social, e não apenas a partir do olhar do investigador,
como uma visão de mundo única, unilateral e preponderante sobre as demais.
Assim, observe, a seguir, uma síntese das vertentes basilares presentes no
estabelecimento dos processos teóricos e práticos a partir da concepção da
“Mirada ao Revés” de políticas públicas:

106
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

FIGURA 7 – SÍNTESE RESULTANTE DAS PRINCIPAIS IMPLICAÇÕES PARA


O ESTUDO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PELA MIRADA AO REVÉS

FONTE: Boullosa (2013, p. 81)

A percepção de problemas e de bens públicos, como constructos sociais,


é, sem dúvidas, um pilar que fundamenta tal abordagem, e que rompe com as
concepções normativa e prescritiva das políticas públicas clássicas, isso porque
a orientação promove a ampliação do debate em torno das configurações das
ações sociais, que, até então, estava fixada apenas na dimensão governamental.
Assim, outro elemento que vale ser destacado é a dimensão dos “fluxos de ação”.
Estes são “multiatoriais” e configuram arenas (BOULLOSA, 2013).

A coprodução de bens públicos pode ser compreendida a partir


de experiências de políticas públicas executas em outros países,
como no contexto da União Europeia (UE). Você pode acessar
notícias, dados e documentos oficiais do Fundo Social Europeu
(FSE), que reúne, no site oficial, diversas políticas promovidas, de
forma interligada, entre setores sociais, órgãos estatais e instituições
técnicas: https://ec.europa.eu/esf/home.jsp?langId=pt.

Um exemplo nacional que demonstra a formalização e a consolidação de


ações mais sólidas de coprodução de bens públicos é o Programa Anual de
Fiscalização (PAF), empreendido, em 2019, pelo Tribunal de Contas do Estado

107
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

do Paraná (TCE-PR). O programa buscou inserir a população do estado


na fiscalização das políticas públicas em seis eixos: educação, habitação,
saneamento básico, saúde, transporte e urbanismo (TCE-PR, 2021).

Se você tem interesse em conhecer mais e se aprofundar


na temática que diz respeito à coprodução de bens públicos e de
experiências de redes interinstitucionais, que produzem políticas
públicas, no caso brasileiro, indicamos o artigo acadêmico escrito
por Vladmir Santana e Joaquim R. Fontes Filho (2010), intitulado
de Elementos de Gestão Local: A Perspectiva de Elionor Ostrom
Aplicada ao Parque Estadual da Ilha do Cardoso: http://www.anpad.
org.br/admin/pdf/enapg353.pdf.

Lotta (2017) denota que a literatura das políticas públicas vislumbra a


coprodução de bens públicos, como um caminho para ampliar a efetividade
destas:

• Melhor compreensão das demandas da população a respeito de


determinados temas, que, muitas vezes, tornam-se distorcidos a partir
das visões dos grupos burocráticos, ou, que primam apenas pelas
dimensões técnicas do assunto.
• Melhor qualidade na provisão de bens e de serviços públicos, a partir do
estabelecimento de canais de comunicação mais adequados (em mão
dupla) entre produtores e usuários dos serviços.
• Ampliação do acesso e do uso de ativos (conhecimentos, relacionamentos
etc.) dos usuários dos bens e dos serviços.
• Inovação na cocriação de novas formatações de bens e de serviços
específicos, envolvendo diferentes redes de ação.

O estabelecimento das novas configurações de políticas públicas segue a


concepção de criar e fomentar canais participativos ativos, e que não se findem
com a simples promoção de “espaços de escuta”, onde os agentes participantes,
realmente, tenham um papel efetivo na consolidação dos bens e/ou dos serviços
produzidos.

Um instrumento importante no estabelecimento da articulação dos atores


na coprodução de políticas públicas são as “policy arenas”, com temáticas em

108
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

voga debatidas, visitadas e revisitadas, tendo, como base, os interesses dos


participantes (OSTROM, 2009). Como destaca Bovaird (2007), nesse contexto
polivalente e com vários atores envolvidos entre si, torna-se possível estabelecer
reformas nos serviços públicos.

Caro estudante, você pode conhecer mais acerca das políticas


públicas produzidas em coprodução no Brasil a partir do livro Redes
e Parcerias em Políticas Sociais: Novos Arranjos Institucionais de
Coprodução de Serviços nos Municípios Brasileiros (2017). Reúne
um trabalho de resgate teórico da coprodução de serviços públicos,
e apresenta alguns exemplos de políticas nacionais empreendidas
a partir desse formato. A obra está disponível no site da Escola
Nacional de Administração Pública (ENAP), e pode ser acessada
em https://repositorio.enap.gov.br/bitstream/1/2884/1/Cadernos_51_
Redes_parcerias_miolo_digital.pdf.

Agora, conceituaremos o que são as “redes de políticas públicas”, um


tema que abrange diversas percepções com base nos diferentes desenhos e
experiências observados nas práticas. Dessa forma, é importante que você
perceba que não há uma definição única e fechada acerca do que são as redes
de políticas públicas. Para Börzel (2008), são formadas por uma conjunção de
relações estáveis, não hierarquizadas e independentes, produzindo a conexão
entre atores que compartilham interesses e recursos, e que buscam, por meio da
cooperação, um caminho para alcançar os objetivos. Contudo, outras definições
de redes de políticas públicas podem ser destacadas pela forte amplitude em
discussões do tema, a partir de critérios e de olhares distintos.

Inojosa (1999) define as redes de políticas públicas a partir das dinâmicas


como entes autônomos. Podem ser classificadas como:

• Redes autônomas ou orgânicas: são constituídas de entes autônomos,


mas que possuem objetivos específicos próprios e que passam a se
articular em torno de um propósito coletivo, preservando as identidades
originais. Ex.: redes de caráter mais informal, como as sociais;
mobilizações de ONGs da área da saúde, reivindicando mais atenção do
poder público para as atuações.
• Redes tuteladas: surgem na esfera dos entes que possuem uma

109
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

autonomia relativa, e se articulam sob o amparo de uma organização que


os mobiliza e modela os objetivos. Ex.: muito comuns redes que surgem
da coordenação de um ente que fomenta as ações, com campanhas
de saúde estimuladas por órgãos públicos, que direcionam as ações
em rede com a participação de ONGs, entidades profissionais do setor,
universidades, centros de pesquisa etc.
• Redes subordinadas: são constituídas por entes que são parte de uma
organização ou de um sistema específico, e que partilham objetivos de
forma interdependente entre si. Ex.: redes institucionais (e de cunho
mais formal) que surgem com o fomento de secretarias ou de órgãos
estatais, como campanhas de saúde dirigidas pelo Ministério da Saúde
com a participação das Secretarias Estaduais de Saúde.

Note que essa concepção abrange redes da esfera pública, também ligadas
à produção de serviços e de políticas, a partir do estabelecimento de ações
conjuntas de instituições da própria esfera estatal, não se limitando, apenas, a
redes estabelecidas entre entes estatais e não estatais.

Outro exemplo que endossa o olhar para as diferentes configurações de


redes que produzem políticas públicas é o de Muller e Surel (1998). Definem
quatro tipos diferentes de redes a partir das características de articulação entre os
grupos sociais e o Estado:

• Redes Temáticas: estabelecem-se a partir de agrupamentos de atores


em torno de um problema e/ou reivindicação específicos. Ex.: instituições
e órgãos públicos que fomentam uma campanha, visando diminuir a
violência contra as mulheres.
• Redes de “Produtores”: estabelecem-se a partir de agrupamentos de
atores com um objetivo econômico específico. Ex.: Arranjos Produtivos
Locais (APLs), que agregam atores empresariais e governamentais.
• Redes Intergovernamentais: constituem-se com o agrupamento
de instituições e de agentes locais ou territoriais, de forma horizontal,
para a promoção de uma ou de mais ações conjuntas. Ex.: Consórcios
Municipais de Saúde e Consórcios Municipais de Segurança Pública.
• Redes Profissionais: estabelecem-se a partir da articulação de
instituições e de agentes profissionais em torno de um determinado saber
específico. Ex.: ações do Conselho Nacional de Segurança Pública, que
reúnem órgãos de classe das polícias civil e militar, bombeiros, defesa
civil etc.

Note que, em todos esses modelos apresentados por Muller e Surel (1998),
participam atores governamentais e não governamentais. São redes híbridas, que
congregam participantes dos segmentos estatais e não estatais. Outro ponto que

110
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

deve ser destacado é a definição de “redes temáticas”. No capítulo anterior, nós


falamos dos issues networks. São grupos de ação mais focalizada no âmbito das
políticas públicas, e que se estabelecem, de forma mais significativa e informal,
em torno de uma determinada questão comum (FREY, 2009). Lembre-se de que
os conceitos de “issues networks” e de “redes temáticas” se aplicam aos mesmos
contextos de redes de políticas públicas.

Secchi (2015) aponta que as redes de políticas públicas possuem, como


principais características:

• Capacidades de auto-organização e de autonomia.


• Capacidade de interdependência dentre os agentes que as compõem.
• Liberdade na entrada e na saída dos componentes.
• Sistema de controle descentralizado, além dos saberes e dos
conhecimentos, de maneira dispersa.
• Interações não formais e não hierarquizadas.
• Procura por interesses externos aos membros que integram as redes.

Você pode perceber que as políticas públicas, em configurações de redes e


de sistemas de arranjos institucionais, para além da esfera estatal, vêm ganhando
notoriedade não apenas no que diz respeito a experiências recentes de políticas
públicas, mas, também, a concepções teóricas, que buscam definir o que os
novos contornos vêm promovendo na cena das policies.

1 - Apresente um exemplo diferente, dos trazidos anteriormente,


de cada um dos tipos de redes a seguir: a) Redes Tuteladas; b)
Redes de Produtores; c) Redes Intergovernamentais; e d) Redes
Profissionais.

1 - Disserte a respeito da diferença conceitual entre avaliação e


monitoramento.

111
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
No presente capítulo, acompanhamos a abordagem do Ciclo de Políticas
Públicas (CPP), umas das mais utilizadas ferramentas de gestão de políticas
públicas. A partir deste, percorremos as etapas, ou fases (como preferir), em busca
de compreender as definições, as características e os elementos conceituais
abordados na literatura da área.

Buscou-se um olhar com base nas fases definidas por Secchi (2015): 1)
Identificação do problema; 2) Formação da agenda; 3) Formulação de alternativas;
4) Tomada de decisões; 5) Implementação; 6) Avaliação; e 7) Extinção.

Outra análise proposta foi a dimensão do modo operacional da gestão das


políticas públicas. Em outras palavras, como ela se manifesta e se materializa
em ações que visam solucionar determinados problemas públicos. Nesse sentido,
foram apresentados os conceitos de gestão estratégica e de gestão social,
analisados os limites teóricos e práticos da ação estratégica como modelo de
gestão de questões coletivas, como as policies. Em contrapartida, apresentou-se
o conceito de gestão social como uma perspectiva mais ampla, e que traçar não
apenas uma forma de ação, mas várias, tendo, como pressupostos balizadores, a
participação social, a dialogicidade (interação por meio do diálogo) e o interesse
no bem-comum.

Foram ainda trabalhados conceitos, como governança, governança pública


e governança territorial, para tratar das experiências recentes de promoção de
políticas públicas sob uma ampla gama de estruturas multicêntricas, experiências
estas que já não se limitam à esfera estatal ou à regência do Estado como o
único agente indutor. Tais concepções ainda precisam, é claro, clarificar o papel
dos agentes estatais em diversos contextos e demonstrar formas que efetivem
a participação social, consolidando ações práticas por meio da interação entre
Estado, sociedade civil e mercado. Assim, os questionamentos de Kooiman
(1993) ainda se fazem relevantes, final de contas, é dever do Estado ser o indutor
(o agente principal) das ações.

Por fim, foram analisadas algumas vias práticas e experiências de ações


que abarcam desenhos institucionais multiescalares, ou, nas próprias palavras
de Bovaird (2007, p. 1), contextos de ações fomentadas por “redes polivalentes”
e com a inserção de “multistakeholders”. Assim, apresentou-se o conceito de
coprodução de bens e de serviços públicos, com um diálogo em experiências
nacionais e internacionais. Por fim, construção teórica de alguns modelos de
caracterização das redes de políticas públicas, com base em autores, como
Inojosa (1999) e Muller e Surel (1998).

112
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

Tais debates revelam o amadurecimento de temas inerentes à consolidação


de um modelo de gestão de políticas públicas que está além das limitantes visões
tecnicistas e estadistas. Burocratas e cartilhas prescritivas ditam as tendências
“corretas” e as “coordenadas” de implementação das boas policies. Na verdade, o
que a prática das experiências multicêntricas expõe são as novas possibilidades
de se promover a gestão de problemas públicos, tendo, como eixo central de
ação, a inclusão do outro e das suas percepções de determinado problema, o que,
por si só, pode produzir novos bens e/ou serviços e redesenhos de processos,
práticas e instituições.

REFERÊNCIAS
AGE, L. M.; SCHOMMER, P. C. Coprodução de serviço de vigilância sanitária:
certificação e classificação de restaurantes. Revista de Administração
Contemporânea, v. 21, n. 3, p. 415-434, 2017.

AGUM, R.; RISCADO, P.; MENEZES, M. Políticas públicas: conceitos e análise


em revisão. Agenda Política, v. 3, n. 2, p. 1, 2015.

ANDION, C. Por uma nova interpretação das mudanças de paradigma na


administração pública. Cadernos Ebape.br, v. 10, n. 1, p. 1-19, 2012.

ARAÚJO, L.; RODRIGUES, M. de L. Modelos de análise das políticas


públicas. Sociologia, Problemas e Práticas, v. 1, n. 83, p. 11-35, 2017.

BARENBLITT, G. F. Compêndio de análise institucional e outras correntes:


teoria e prática. 5. ed. Belo Horizonte: Instituto Félix Guattari, 2002.

BARRETT, S.; FUDGE, C. Policy and action: essays on the implementation of


public policy. London; New York: Methuen, 1981.

BONETI, L. W. Políticas públicas por dentro. Ijuí: Unijuí, 2007.

BÖRZEL, T. Organizando babel: redes de políticas públicas. In: DUARTE, F.;


QUANDT, C.; SOUZA, Q. O tempo das redes. São Paulo: Perspectiva, 2008.

BOULLOSA, R. de F. Mirando ao revés nas políticas públicas: notas sobre um


percurso de pesquisa. Pensamento & Realidade, v. 28, n. 3, p. 1, 2013.

BOVAIRD, T. Beyond engagement and participation: user and community


coproduction of public services. Public Administration Review, v. 67, n. 5, p. 1,
2007.

113
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

BRESSER-PEREIRA, L. C. Da administração burocrática à gerencial. Revista do


Serviço Público, v. 47, n. 1, p. 1, 1996.

CANÇADO, A. C.; PEREIRA, J. R.; TENÓRIO, F. G. Gestão social:


epistemologia de um paradigma. 1. ed. Curitiba: CRV, 2013.

CANÇADO, A. C.; SAUSEN, J. O.; VILLELA, L. E. Gestão social versus


gestão estratégica. In: TENÓRIO, F. G. Gestão social e gestão estratégica:
experiências em desenvolvimento territorial. Rio de Janeiro: FGV, 2013.

CANÇADO, A. C.; TENÓRIO, F. G.; PEREIRA, J. R. Gestão social: reflexões


teóricas e conceituais. Cadernos Ebape.br, v. 9, n. 3, p. 681-703, 2011.

CARLOS, E. Controle social e política redistributiva no orçamento


participativo. Vitória: EDUFES, 2015.

COHEN, E.; FRANCO, R. Avaliação de projetos sociais. Petrópolis: Vozes,


2004.

COTTA, T. C. Metodologias de avaliação de programas e projetos sociais: análise


de resultados e de impacto. Revista do Serviço Público, Brasília, v. 49, n. 2, p.
1, 1998.

DA CUNHA, C. G. S. Avaliação de políticas públicas e programas


governamentais: tendências recentes e experiências no Brasil. Revista Estudos
de Planejamento, v. 1, n. 12, p. 1, 2018.

DA SILVA, V. C.; KRAEMER, C. F. B.; ABREU, J. C. A. de; FRANCISCO, D.


N. Perspectiva de contribuição do projeto “Formação Política e Cidadania:
os Conselhos Municipais como Referência” em Volta Redonda, RJ: análises
preliminares. NAU Social, v. 4, n. 7, p. 1, 2013.

DALLABRIDA, V. R. Território, governança e desenvolvimento territorial:


indicativos teórico-metodológicos, tendo a indicação geográfica como referência.
LiberArts: São Paulo, 2016.

DALLABRIDA, V. R. Governança territorial: do debate teórico à avaliação da sua


prática. Análise Social, v. 1, n. 215, p. 304-328, 2015.

DENHARDT, R. B. Teorias da administração pública. São Paulo: Cengage


Learning, 2011.

114
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

DOWNS, A. Uma teoria econômica da democracia. São Paulo: EDUSP, 1999.

EASTON, D. The political system. Nova York: The Free Press, 1953.

ESTEVÃO, R. B.; FERREIRA, M. D. M. Análise de políticas públicas: uma breve


revisão de aspectos metodológicos para formulação de políticas. HOLOS, v. 34,
n. 3, p. 168-185, 2018.

FARAH, M. F. S. Abordagens teóricas no campo de política pública no Brasil e


no exterior: do fato à complexidade. Revista do Serviço Público, v. 69, n. 1, p.
53-84, 2018.

FRANCISCO, D. N. Controle social e políticas de desenvolvimento:


um olhar sobre o município de Itaguaí (RJ) e a sua territorialidade face aos
megaempreendimentos. Rio de Janeiro: PPGDT/UFRRJ, 2016.

FREY, K. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática


da análise de políticas públicas no Brasil. Planejamento e Políticas Públicas, v.
1, n. 21, p. 1, 2009.

FUNG, A. Varieties of participation in complex governance. Public


Administration Review, v. 1, n. 1, p. 1, 2006.

GIANNELLA, V.; ARAÚJO, E. T.; NETA, V. M. de O. As metodologias integrativas


como caminho na ampliação da esfera pública. In: SCHOMMER, P. C.;
BOULLOSA, R. de F. Gestão social como caminho para a redefinição da
esfera pública. Florianópolis: UDESC, 2011.

GOMIDE, A.; PIRES, R. C. Capacidades estatais e democracia: a abordagem


dos arranjos institucionais para análise de políticas públicas. In: GOMIDE, A.;
PIRES, R. C. Capacidades estatais e democracia: arranjos institucionais de
políticas públicas. Brasília: IPEA, 2014.

GRISA, K. et al. Capacidades estatais para o desenvolvimento rural no Brasil:


análise das políticas públicas para a agricultura familiar. Revista Sociedade e
Cultura, v. 20, n. 1, p. 15-38, 2017.

HACKER, J. S.; PIERSON, P. After the "Master Theory": Downs, Schattschneider,


and the Rebirth of policy-focused analysis. Perspectives on Politics, v. 1, n. 1, p.
643-662, 2014.

HOWLETT, M.; RAMESH, M.; PERL, A. Políticas públicas: seus ciclos e


subsistemas: uma abordagem integradora. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

115
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

INOJOSA, R. M. Redes de compromisso social. Revista de Administração


Pública. Rio de Janeiro: FGV, 1999.

JANNUZZI, P. de M. Indicadores sociais no Brasil. Campinas: Alínea, 2012.

JENKINS-SMITH, H. C.; SABATIER, P. A. The study of public policyprocesses.


In: JENKINS-SMITH, H. C.; SABATIER, P. A. Policy change and learning: an
advocacy coalition approach. Boulder: Westview Press, 1993.

KOOIMAN, J. Governance and governability. Using complexity, dynamics and


diversity. In: KOOIMAN, J. Modern governance: new government-society
interactions. Londres: Sage, 1993.

LE GALÈS, P. Gouvernance. In: BOUSSAGUET, L.; JACQUOT, S.; RAVINET, P.


Dictionnaire des politiques publiques. 4. ed. Paris: Sciences Po Les Presses,
2014.

LIMA, L. L.; D'ASCENZI, L. Implementação de políticas públicas: perspectivas


analíticas. Revista de Sociologia e Política, v. 21, n. 48, p. 101-110, 2013.

LINDBLOM, C. E. The science of ‘muddling through’. Public Administration


Review, v. 19, n. 2, p. 1, 1959.

LOTTA, G. S. Redes e parcerias em políticas sociais: novos arranjos


institucionais de coprodução de serviços nos municípios brasileiros. Brasília:
ENAP, 2017.

LOTTA, G. S.; FAVARETO, A. Desafios da integração nos novos arranjos


institucionais de políticas públicas no Brasil. Revista de Sociologia e Política, v.
24, n. 57, p. 49-65, 2016.

MACHADO, D.; ZIBECHI, R. Os limites do progressismo: sobre a


impossibilidade de mudar o mundo de cima pra baixo. 2017.

MARENCO, A. Teoria para quem precisa de teoria: ainda conhecemos pouco


sobre os mecanismos causais de escolha, mudança e continuidade de políticas
públicas. In: LIMA, L. L.; SCHABBACH, L. Políticas públicas: questões teórico-
metodológicas emergentes. Porto Alegre: Editora UFRGS/CEGOV, 2020.

MARQUES, E. As políticas públicas na Ciência Política. In: MARQUES, E.;


FARIA, C. A. P. de. A política pública como campo multidisciplinar. São
Paulo: Unesp; Rio de Janeiro: Fiocruz, 2013.

116
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

MARQUES, E. C. L. Notas sobre redes, Estado e políticas públicas. Cadernos


de Saúde Pública, v. 35, n. 1, p. 1, 2019.

MARTINS, C. Governabilidade e controles. Revista de Administração Pública.


Rio de Janeiro: FGV, 1989.

MAZZEI, B. B.; FARAH, M. F. S. O processo de implementação de uma política


pública – um instrumento de análise. In: LIMA, L. L.; SCHABBACH, L. Políticas
públicas: questões teórico-metodológicas emergentes. Porto Alegre: Editora
UFRGS/CEGOV, 2020.

MINTZBERG, H. The strategy concept I: Five Ps for strategy. California


Management Review, v. 30, n. 1, p. 11-24, 1987.

MONTAÑO, C. E. O projeto neoliberal de resposta à “questão social” e a


funcionalidade do “terceiro setor”. Lutas Sociais, v. 1, n. 8, p. 53-64, 2002.

MOTA, L. F. Estudos de implementação de políticas públicas: uma revisão de


literatura. Sociologia, Problemas e Práticas, v. 1, n. 92, p. 133-150, 2020.

MULLER, P.; SUREL, Y. L'analyse des politiques publiques. Montchrestien,


1998.

OLIVEIRA, D. P. R. Planejamento estratégico: conceitos, metodologia e


práticas. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2001.

OSTROM, E. Governing the commons: the evolution of institutions for collective


action. Bayreuth: Seminar on Political Ecology, 2009.

PASSOS, M. L. S. Avaliação da aprendizagem na educação a distância: um


modelo conceitual de avaliação formativa para a pós-graduação em informática
na educação. Assunção: Universidad del Norte, 2014.

PIRES, E. L. S.; FUINI, L. L.; FIGUEIREDO FILHO, W. B.; MENDES, E. L. A


governança territorial revisitada: dispositivos institucionais, noções intermediárias
e níveis de regulação. GEOgraphia, v. 19, n. 41, p. 24-3, 2017.

PORTER, M. Estratégia competitiva: técnicas para análise de indústrias e da


concorrência. Rio de Janeiro: Campus, 1986.

117
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

PRESSMAN, J. L.; WILDAVSKY, A. B. Implementation: how great expectations


in Washington are dashed in Oakland or, why it’s amazing that federal programs
work at all, this being a saga of the Economic Development. Administration as told
by two sympathetic observers who seek to build morals on a foundation of ruined
hopes. Berkeley: University of California Press, 1973.

QUEIROZ, R. B. Formação e gestão de políticas públicas. 3. ed. Curitiba:


Ibpex, 2011.

RAEDER, S. T. O. Ciclo de políticas: uma abordagem integradora dos modelos


para análise de políticas públicas. Perspectivas em Políticas Públicas, v. 7, n.
13, p. 121-146, 2014.

RAMOS, A. G. Modelos de homem e teoria administrativa. Revista de


Administração Pública, v. 18, n. 32, p. 1, 1984.

RAMOS, A. G. A nova ignorância e o futuro da administração pública na América


Latina. Revista de Administração Pública (RAP), v. 2, n. 1, p. 1, 1970.

RODRIGUES, A. L.; MALO, M. C. Estruturas de governança e


empreendedorismo coletivo: o caso dos doutores da alegria. Revista de
Administração Contemporânea, v. 10, n. 3, p. 29-50, 2006.

RUA, M. das G. Políticas públicas. Florianópolis: Departamento de Ciências da


Administração/UFSC; Brasília: CAPES: UAB, 2009.

SANTOS, M. P. G. dos. Políticas públicas e sociedade. 2. ed. Florianópolis:


UFSC, 2012.

SCHOMMER, P. C.; BOULLOSA, R. F. Com quantas andorinhas se faz um


verão? Práticas, relações e fronteiras de aprendizagem. In: SCHOMMER, P.
C.; SANTOS, I. G. Aprender se aprende aprendendo: construção de saberes
na relação entre universidade e sociedade. Salvador: CIAGS/UFBA, FAPESB;
SECTI; CNPQ, 2010.

SECCHI, L. Políticas públicas: conceitos, esquemas de análise, casos práticos.


2. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2015.

SECCHI, L. Modelos organizacionais e reformas da administração pública.


Revista de Administração Pública, v. 43, n. 2, p. 1, 2009.

SICSÚ, J.; PAULA, L. F. de; MICHEL, R. Por que novo-


desenvolvimentismo. Revista de Economia Política, v. 27, n. 4, p. 507-524,
2007.
118
Capítulo 2 CICLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E DIMENSÕES DA GESTÃO

SILVA, J. R. D. A vulnerabilidade social como desafio inclusivo da


democracia participativa: um estudo sobre o orçamento participativo de Porto
Alegre. UFRGS: Porto Alegre, 2014.

SILVA, M. O. da S. Avaliação de políticas e programas sociais: teoria e


prática. São Paulo: Veras, 2001.

SILVA, P. L. B.; MELO, M. A. B. O processo de implementação de políticas


públicas no Brasil: características e determinantes da avaliação de programas e
projetos. NEPP/UNICAMP, Campinas, v. 1, n. 48, p. 1-16. 2000.

SIMON, H. On the behavioural and rational foundation of economic theory.


1983.

SJÖBLOM, G. Problemi e soluzioni in politica. Revista Italiana di Scienza


Politica, v. 14, n. 1, p. 41-85, 1984.

SPINK, P. K.; BURGOS, F. Os limites da abordagem de implementação:


vulnerabilidade urbana a partir do outro lado da rua. In: LOTTA, G. Teoria e
análises sobre implantação de políticas públicas no Brasil. Brasília: Enap,
2019.

SUBIRATS, J. El papel de la burocracia em el proceso de determinación e


implementación de las políticas publicas. In: SARAVIA, E.; FERRAREZI, E.
Políticas públicas: coletânea. Brasília: ENAP, 2006.

SUBIRATS, J. Análisis de políticas públicas y eficacia de la administración.


Madri: Inap, 1989.

TCE-PR. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DO PARANÁ. Fiscalização


do TCE-PR em 2019 dará prioridade a 6 áreas da gestão pública. 2021.
Disponível em: A https://www1.tce.pr.gov.br/noticias/fiscalizacao-do-tce-pr-em-
2019-dara-prioridade-a-6-areas-da-gestao-publica/6525/N. Acesso em: 24 abr.
2021.

TEJADAS, S. da S. Avaliação de políticas públicas e garantia de direitos.


São Paulo: Cortez, 2020.

TENÓRIO, F. G. Gestão social: conceito. In: TENÓRIO, F. G.;


KRONEMBERGER, T. S. Gestão social e conselhos gestores. Rio de Janeiro:
FGV, 2016.

119
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

TENÓRIO, F. G. Escopo teórico. In: TENÓRIO, F. G. Cidadania e


desenvolvimento local: critérios de análise. Rio de Janeiro: FGV, 2012.

TENÓRIO, F. G. Gestão social: uma perspectiva conceitual. Brazilian Journal of


Public Administration, v. 5, n. 32, p. 1, 1998.

WILSON, W. The study of administration. Political Science Quarterly, v. 2, n. 2,


p. 197-222, 1987.

ZIMMERMAN, F. Planejamento e gestão governamental. 2014. Disponível


em: https://repositorio.enap.gov.br/bitstream/1/2261/1/1.%20Apostila%20-%20
M%C3%B3dulo%202%20-%20Planejamento%20e%20Gest%C3%A3o%20
Organizacional.pdf. Acesso em: 30 maio 2021.

ZUCCOLOTTO, R.; TEIXEIRA, M. A. C.; RICCIO, E. L. Transparência:


reposicionando o debate. Revista Contemporânea de Contabilidade, v. 12, n.
25, p. 137-158, 2015.

120
C APÍTULO 3
INDICADORES E AVALIAÇÕES DE
POLÍTICAS PÚBLICAS

A partir da perspectiva do saber-fazer, são apresentados os seguintes


objetivos de aprendizagem:

• Definir os conceitos de política, programa, projeto e plano.


• Descrever as principais abordagens teóricas e práticas de avaliação das
políticas públicas.
• Apresentar o conceito de monitoramento como um método presente em todo o
ciclo de políticas públicas.
• Diferenciar o que são índices, taxas e indicadores.
• Manipular dados já apresentados por órgãos públicos para produzir análises
voltadas para as especificidades das políticas públicas locais.
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

122
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
Caro estudante, agora, iniciaremos a nossa caminhada pelo terceiro capítulo,
no qual abordaremos questões importantes do debate em torno dos instrumentos
de avaliação e de análise de políticas públicas. Para isso, será primordial uma
discussão reflexiva em torno do conceito de indicadores, além de como estes
se diferenciam dos dados e das informações não tratadas. Seguindo por essa
vertente analítica, busca-se trazer, a você, a diferenciação entre indicadores,
índices e taxas, contextualizando o uso de cada um dos elementos no campo de
avaliação das políticas públicas.

A avaliação é uma área da gestão de políticas públicas que possui uma


grande amplitude teórica e instrumentos metodológicos, o que permite um diálogo
muito próximo com as ferramentas do Ciclo de Políticas Públicas (e as distintas
fases, sobretudo, a avaliação e o monitoramento, obviamente) e com outras áreas
práticas da gestão pública, como os instrumentos de avaliação em contextos
sociojurídicos (TEJADAS, 2020) e em cenários multidisciplinares (CANO, 2006;
JANNUZZI, 2005; 2012).

Neste capítulo, também retornaremos ao campo da avaliação para termos


uma perspectiva dos modelos mais utilizados nas diferentes formas avaliativas
dos processos de gestão das políticas públicas: É importante que você perceba
como determinado modelo de avaliação gera diferentes construções sociais, que
estabelecem papéis distintos para os avaliadores e para os demais agentes que
se encontram no cenário. Isso produz, ainda, diferentes modos e instrumentos
ao conduzir a ação avaliativa e na consecução dos resultados desejados. Logo,
você deve perceber que diferentes modelos e instrumentos de avaliação geram
diferentes resultados de avaliação. Assim, a partir dessa dimensão basilar,
percorreremos os diferentes caminhos que envolvem as abordagens da avaliação:
1) Positivista-Experimental; 2) Pragmatismo por Qualidade; 3) Construtivista; 4)
Métodos Plurais de Avaliação; e 5) Outros Modelos de Avaliação.

Agora que você já conhece as principais temáticas a serem abordadas neste


capítulo, iniciaremos a nossa jornada!

2 INDICADORES DE POLÍTICAS
PÚBLICAS
Os indicadores estão presentes nos mais diversos campos e fenômenos
sociais da vida atual, por meio dos indicadores produzidos para a gestão de

123
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

empresas, bancos e de instituições que operam no mercado financeiro, até


mesmo, nos mais diferentes momentos da nossa vida. Escolas e universidades
utilizam indicadores de ensino, e, ao mesmo tempo, são avaliadas, através
das atividades, pelo governo. Nas áreas da saúde, da assistência social e da
segurança pública, também podemos identificar uma série de indicadores, desde
aqueles estruturados pelas organizações, de forma independente, até aqueles
que possuem um caráter de verificação externa, como as análises de organismos
internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização
das Nações Unidas (ONU), e as organizações não governamentais, como a
Transparência Internacional e o Greenpeace.

Um fato inegável é que nunca foram produzidas tantas informações, além


de dados (CASTELLS, 2012; GASQUE, 2013). Ao mesmo tempo, a nossa vida
nunca esteve tão interligada a estes. Por isso, cresce, também, a necessidade de
organizações públicas e privadas ampliarem as capacidades técnicas de produzir,
compilar, analisar e disseminar dados confiáveis (JANNUZZI, 2012).

Antes de nos aprofundarmos mais no debate acerca dos indicadores, é


importante conceituarmos o que são:

[...] O indicador é uma unidade que permite medir o alcance


de um objetivo específico. Deve-se distinguir entre indicadores
diretos e indiretos. Os primeiros traduzem a obtenção do
objetivo específico em uma relação de implicação lógica. Se
diminuir a taxa de repetência, é um objetivo educacional, a
definição já determina o indicador, que mostra as variações
percentuais que ocorrem na repetência dentro da população-
objetivo. [...] Os indicadores indiretos devem ser construídos.
Se um projeto tem, como objetivo, aumentar a participação
comunitária, as metas e os indicadores delas surgem das
formas pelas quais a participação se expressa (COHEN;
FRANCO, 2004, p. 152-153).

O indicador é, em outras palavras, uma métrica, ou, nas palavras de Jannuzzi


(2012, p. 21), uma medida, possuidora de um significado. É utilizado para “[...]
substituir, quantificar ou operacionalizar um conceito social abstrato”. Nesse
sentido, Kayano e Lima Caldas (2001) observam que os indicadores exercem
o papel de sintetizar informações, possibilitando, dessa forma, quantificar e
mensurar determinados acontecimentos e fatos entre si.

Rua (2009) classifica os indicadores a partir de três categorias distintas:

• Indicadores Estratégicos: são aqueles que buscam orientar as visões e


os objetivos estratégicos de uma determinada organização. Um exemplo
são os indicadores de governo utilizados de forma ampla, solidificando as

124
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

visões e os objetivos preestabelecidos, como os indicadores de recursos


utilizados ou recursos previstos no Plano Plurianual de um município etc.
• Indicadores de Processos: são aqueles que buscam promover subsídios
para o acompanhamento e a avaliação de determinado evento
em andamento ou já finalizado. Podem ser de 1) produtividade ou
efetividade: buscam expressar a relação entre a quantidade de recursos
utilizados e os recursos ou serviços produzidos nesse processo; de
2) qualidade ou eficiência: buscam expressar o nível de satisfação de
usuários de determinado produto ou serviço, ou o grau de atendimento
aos pré-requisitos estabelecidos; e 3) de capacidade: buscam medir a
capacidade de resposta de um processo, considerando os resultados em
determinado espaço de tempo.
• Indicadores de Projetos: são aqueles que buscam estabelecer meios
para monitorar e avaliar a execução e/ou os resultados de determinado
projeto (ação com tempo determinado e estabelecida para a obtenção de
determinado resultado ou produto).

Outras taxonomias de indicadores são utilizadas, na literatura, com base


em diferentes perspectivas teóricas. Jannuzzi (2005) classifica os indicadores de
políticas públicas a partir da área temática de cada política. Ex.: saúde, educação,
assistência social, segurança, planejamento urbano, demografia, justiça etc.
Lembre-se de que essas políticas estão estabelecidas no Art. 6, da Constituição
Federal de 1988.

Jannuzzi (2012) também aponta outra forma de classificação dos indicadores,


tendo, como base de definição, a natureza do fenômeno a ser mensurado. Podem
ser definidos como 1) Indicador Insumo (mensurando recursos); 2) Indicador
Processo (mensurando os processos em si); e 3) Indicador Produto (mensurando
resultados).

Você deve se lembrar de que, no Capítulo 1, vimos a abordagem sistêmica


das políticas públicas, certo?! Fundamenta as análises das policies, tendo,
como base, as relações políticas e de formulação, implementação e avaliação a
partir de processos, que recebem “entradas” e geram “saídas” (EASTON, 1953;
HOWLETT; RAMESH; PERL, 2013).

125
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

FIGURA 1 – INDICADORES SOCIAIS DEFINIDOS,


SEGUNDO A NATUREZA DO FENÔMENO

FONTE: Adaptada de Jannuzzi (2012)

Os indicadores-insumos (inputs indicators) estão associados às entradas do


sistema, como recursos financeiros, técnicos e de pessoal, além dos materiais,
que podem (ou não) estar disponíveis para a execução de uma dada política
pública (HENRY, 2001; JANNUZZI, 2006; 2012).

Os indicadores-processo (throughputs indicators) podem ser denominados


de indicadores de fluxos, e estão associados à execução, em si, de determinada
ação, projeto ou processo das políticas públicas. São identificados, por Jannuzzi
(2012), como indicadores intermediários, pois buscam traduzir, quantitativamente,
determinados esforços operacionais de alocação de recursos em eventos que
buscam estabelecer melhorias efetivas. Ex.: número de crianças atendidas em um
posto de saúde – indicador que se refere ao número de atendimentos primários
voltados para o público infantil em um dado posto de saúde.

De forma mais prática, a construção e a consolidação de um sistema de


indicadores-produto passam, necessariamente, pelo estabelecimento de objetivos
claros do que se deseja alterar em uma dada realidade social.

No site do Ministério da Saúde (MS), você pode conhecer um


pouco mais da Portaria 3.222, que dispõe sobre a definição de
indicadores para o estabelecimento de um modelo de pagamento/
financiamento a partir do desempenho dos profissionais que atuam
no âmbito das Equipes de Atenção Primária (EAP) e das Equipes de
Saúde da Família (ESF). A Secretaria de Atenção Primária à Saúde
(SAPS), do Ministério da Saúde, é a responsável pela implementação
desse modelo de pagamento, que faz parte de um novo modelo de
gestão dos repasses dos recursos de saúde pública para a escala
dos municípios. Note que esse modelo se orienta a partir de “objetos”,
ou seja, indicadores previamente definidos a partir dos anos. Acesse
http://aps.saude.gov.br/noticia/6594.

126
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Os indicadores-produto (outputs indicators) estão associados aos resultados


que determinado fenômeno provoca na sociedade (HENRY, 2001). Jannuzzi
(2012) denota que estes se relacionam diretamente com as dimensões empíricas,
resultantes dos complexos cenários e dos processos políticos e sociais em torno
das políticas públicas. Ex.: número de crianças que saiu da desnutrição a partir
dos atendimentos primários no posto do exemplo anterior.

Como você pode perceber, os indicadores-produto se voltam para a


efetividade de determinada ação pública, e o que essa produz como transformação
de determinada realidade social (JANNUZZI, 2002), enquanto os indicadores
de insumo e de processo se alinham à dimensão da eficiência. Observe uma
exemplificação do uso de indicadores nas áreas da saúde e da educação:

FIGURA 2 – MODELO RELACIONAL ENTRE INDICADORES E AVALIAÇÃO

FONTE: Jannuzi (2002, p. 61)

A literatura de políticas públicas, ainda, apresenta a nomenclatura dos


referidos “indicadores de performance ou fluxo”, relacionados à mensuração de
possíveis transformações no fenômeno observado a partir de dois momentos

127
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

distintos (JANNUZZI, 2012). Essa categoria de indicadores pode estar diretamente


relacionada aos processos de monitoramento e de acompanhamento da execução
de determinadas políticas públicas, sob observações contínuas ou periódicas. A
respeito dessa dimensão aplicada ao monitoramento de policies, retornaremos
em breve, ainda neste capítulo.

Dessa forma, você Por hora, é importante que você compreenda que os indicadores
deve sempre se de performance nem sempre estão atrelados aos processos (meios
lembrar de que um da política), e podem estar diretamente correlacionados com a
dado bruto, sem uma finalidade desta, por isso, não devem ser traduzidos como sinônimos
contextualização
de indicadores de processos. Um exemplo pode ser a avaliação anual
adequada (teorização
ou finalidade do número de estudantes reprovados, estabelecendo uma avaliação
pragmática), não é contínua da quantidade de estudantes aprovados e estudantes
um indicador, mas reprovados (performance atrelada ao resultado). Outro exemplo, agora,
um número ou dado de um indicador de performance atrelado ao processo: mensuração
estatístico. mensal dos valores gastos com merenda escolar.

Faz-se necessário, aqui, abrir um parêntese, para observarmos a dimensão


técnica dos indicadores, que são dotados de “conteúdo informacional”,
assim, operam para ilustrar um elemento contextual (JANNUZZI, 2012, p. 23).
Dessa forma, você deve sempre se lembrar de que um dado bruto, sem uma
contextualização adequada (teorização ou finalidade pragmática), não é um
indicador, mas um número ou dado estatístico (KAYANO; LIMA CALDAS, 2001;
JANNUZZI, 2006; 2012).

Os indicadores podem

[...] se referir à totalidade da população ou a grupos


sociodemográficos específicos, dependendo do interesse
substantivo inicialmente idealizado. Eles são expressos como
taxas, proporções, médias, índices, distribuição por classes e,
também, por cifras absolutas (JANNUZZI, 2012, p. 23).

Logo, você deve entender que uma mesma política pública pode ter
diferentes formas de ser avaliada, ou, mais especificamente, pode-se dizer que
pode ser analisada a partir de diferentes indicadores, como a política de saúde
da família em determinado município. Pode ser estudada a partir de diferentes
objetos, resultados, processos e dinâmicas sociais e organizacionais. Ex.: 1)
Número de famílias assistidas; 2) Número de famílias assistidas por Unidade
Básica de Saúde da Família (UBSF); 3) Número de atendimentos e procedimentos
realizados em cada Unidade Básica de Saúde da Família (UBSF); 4) Taxa de
médicos do programa Saúde da Família por população de cada bairro; 5) Taxa de
atendimento do programa Saúde da Família por faixa etária; dentre tantas outras
possibilidades de análise.

128
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Cano (2006), ao analisar os processos avaliativos de programas sociais,


considera que um norte fundamental, ao gestor que executa determinada
avaliação, é considerar as demandas gerais da população.

Uma intervenção pode atingir as metas propostas e, ao mesmo


tempo, não contribuir, significativamente, para satisfazer
necessidades da população-alvo. Portanto, a avaliação de
necessidades seria um pré-requisito para a avaliação do
programa. Uma questão importante é determinar para quem
é feita a avaliação e, indiretamente, quem tem direito a ser
informado e a influenciar os objetivos da avaliação. [...] Aqui,
é fundamental a noção de setores interessados (stakeholders),
isto é, todas as pessoas e grupos envolvidos ou afetados pela
avaliação, além daqueles nela interessados [...] (CANO, 2006,
p. 104).

A percepção dos beneficiários, da política pública ou de um programa social,


é um ponto importante para que o processo de avaliação não seja uma mera
etapa administrativa, descolada da realidade e das percepções sociais em torno
do cenário, isso porque, ao abordar, por exemplo, a eficiência (utilização de
recursos) em determinadas policies, o processo avaliativo pode acabar deixando
de fora a dimensão da efetividade (do impacto gerado pela ação).

2.1 A IMPORTÂNCIA DOS


INDICADORES
Os indicadores possuem um papel fundamental nos processos de gestão de
políticas, projetos e programas públicos (JANNUZZI, 2005; CANO, 2006). Podem
se fazer presentes nos processos de formulação da agenda pública e de definição
dos problemas e das prioridades públicas, por exemplo, situações nas quais o
gestor deve estabelecer quais ações são prioritárias e quais não. Um caminho
para auxiliar na tomada de decisões é o embasamento da escolha pública a partir
de indicadores (evidências), propiciando uma análise a partir da qual o gestor não
se fundamente apenas na sua opinião ou interesse político. Como denotam Costa
e Silva (2016), nem sempre os gestores públicos possuem um caminho claro, onde
seja fácil identificar os fatores e os fenômenos que podem promover as respostas
esperadas pela sociedade e pelos demais agentes envolvidos nos processos
públicos. Por isso, a gestão de políticas públicas, baseada em evidência, é um
arcabouço teórico e prático que ganha força, no sentido de reduzir os riscos do
policymaker, e, ao mesmo tempo, ampliar a capacidade da gestão pública.

129
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

A importância dos indicadores vai além, passando pelas próprias


necessidades de monitoramento e de avaliação das políticas públicas
(JANNUZZI, 2002; 2005; 2012), seja para justificar a promoção, a continuidade ou
a descontinuidade de uma política; seja para mensurar se determinadas políticas
públicas vêm produzindo resultados nos contextos sociais em que se inserem.

A construção de indicadores não é uma tarefa simples. Como veremos nas


próximas seções, para construirmos um indicador ou um sistema de indicadores,
faz-se necessário que pensemos, que sigamos alguns pontos fundamentais,
como o estabelecimento de características e definições desejáveis ao indicador,
o alinhamento a uma (ou mais) abordagem teórico-prática, e, logicamente, a
consolidação de um objeto bem definido a ser mensurado. Abordaremos esses
fatores, de forma mais aprofundada, nas próximas seções. Agora, falaremos a
respeito da importância dos indicadores na gestão de políticas públicas.

A importância dos indicadores está na capacidade de serem os ferramentais


de aproximação entre um certo contexto, no qual a política pública se insere e
os objetivos delineados por esta também (TEJADAS, 2020). A capacidade de
refletir uma dada realidade social é muito importante para a democratização dos
atos e dos fatos públicos, de como as ações de determinado governo vêm se
comportando na sociedade e cenários e fenômenos sociais se estabelecem com
o tempo. Além disso, os indicadores também se correlacionam com os processos
históricos de busca pela melhoria dos gastos públicos, da qualidade de gestão
das policies e da promoção do controle social (RAMOS; SCHABBACH, 2012; DA
CUNHA, 2018; PINHEIRO, 2020).

É necessário que você compreenda a diferença entre


indicadores e dados. Muitas vezes, esses dois termos aparecem em
jornais, em conversas informais, e, até mesmo, em situações mais
formais, como elementos iguais. No entanto, essa compreensão é
errônea e deve ser evitada. O indicador não é somente um dado. O
indicador é uma medida que promove a inferência de algum atributo,
característica ou fenômeno (JANNUZZI, 2012).

130
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

2.2 PROPRIEDADES DOS


INDICADORES
Como você já pôde notar a partir dos debates anteriores, os indicadores
podem ser ferramentais de grande relevância para a análise e a gestão de políticas
públicas, e para a gestão e a avaliação de projetos sociais, em geral (não limitados
à seara da esfera governamental). No entanto, para que um indicador possa ter
uma capacidade efetiva, é necessário que ele cumpra alguns requisitos teóricos
e práticos, e que consolidem a sua capacidade de aferir determinado fenômeno,
de quantificá-lo, ou, até mesmo, que seja capaz de estabelecer correlações (entre
fenômenos ou a partir do mesmo fenômeno no decorrer do tempo).

Abordaremos, nesta seção, as propriedades que os indicadores devem


possuir para que possam estabelecer, de forma adequada, a correlação (aferição)
com determinado fenômeno. Para isso, utilizaremos algumas referências da
literatura, produzidas por Rochet, Bout-Colonna e Keramidas (2005) e Jannuzzi
(2002; 2005; 2012).

Iniciemos apontando a relevância social do indicador, elemento fundamental


para que este tenha uma função pública. A relevância social de um indicador
de política pública é importante para que se possa justificar a formulação, e,
automaticamente, a utilização de recursos públicos no processo (JANNUZZI,
2012). Mesmo no caso de organizações não estatais, a justificativa social é um
fator de peso na escolha (ou não) de quais indicadores devem ser produzidos ou
importados.

Diferentes contextos políticos e institucionais conformam a promoção de


diferentes demandas sociais, e que se materializam, no caso das políticas
públicas, em diferentes necessidades de instrumentos analíticos que promovam
meios de gestão e tomada de decisões. A consolidação da agenda de políticas
nacionais, em prol da redução da pobreza, por exemplo, promove a consolidação
de um arcabouço técnico-institucional de indicadores e de metodologias avaliativas
de políticas. Um exemplo tácito é a consolidação dos dados do Programa Bolsa
Família, por meio do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). Esses dados
estão, desde 2019, sob a responsabilidade do Ministério da Cidadania (MC), em
função da extinção do MDS e da alocação dos programas para a então Secretaria
Especial do Desenvolvimento Social, submetida ao MC (BRASIL, 2021).

Ainda, acerca das propriedades, outra dimensão importante é a validade,


como um atributo essencial para qualquer indicador. Segundo Jannuzzi (2012, p.
33), pode ser compreendida como o nível de “proximidade entre o conceito e a

131
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

medida”, ou seja, a capacidade que um indicador possui de refletir acerca de uma


determinada situação, contexto social ou fenômeno (em processo ou já acabado).
No entanto, você deve observar que a validade de um indicador está diretamente
ligada à capacidade de correlação com o fato a ser medido (JANNUZZI, 2002;
2006). Aí está um problema corriqueiramente evidenciado em pesquisas de cunho
quantitativo, em diagnósticos e em outras ações avaliativas que exprimem, por
meio de indicadores fabricados, forças de correlação que, na prática, não se
evidenciam.

A validade de uma medida construída, por exemplo, para avaliar


as condições de saúde de uma população, a partir da oferta de
serviços ou de recursos humanos na área de saúde, estaria,
certamente, comprometida. Afinal, um maior coeficiente de
médicos por mil habitantes ou uma taxa maior de consultas por
habitante pode ser indicativo de que as condições de saúde
da população são tão graves que levam a um maior esforço
de alocação de recursos. Os indicadores seriam, pois, mais
apropriados para retratar as condições de oferta de serviços
de saúde. Para o primeiro conceito — condições de saúde
—, indicadores de “falta de saúde”, retratados pelas taxas
de morbidade, mortalidade infantil ou mortalidade por causas
específicas, seriam, certamente, mais válidos (JANNUZZI,
2002, p. 57).

É possível perceber que a validade busca evitar as distorções que podem


existir a partir da definição errônea de um determinado fenômeno a uma ou a um
grupo de causas, que, na realidade, não estão correlacionadas. Um exemplo disso
é percebido a partir da frágil correlação que se pode fazer (erroneamente) entre
o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e a melhoria do desenvolvimento
humano de determinado país, isso porque o campo do desenvolvimento humano é
bem mais amplo do que a esfera econômica, e, não necessariamente, um aumento
dos valores totais da produção nacional (PIB) indica, de fato, a existência de
fenômenos, como aumento da distribuição de renda ou da renda média para toda
a população. Além disso, o campo do desenvolvimento humano abrange áreas
distintas, como saúde, educação, segurança alimentar etc. Logo, estabelecer
uma relação direta entre os dois fenômenos, sem um aprofundamento cuidadoso
acerca de determinada realidade, leva os gestores à produção de distorções.

Agora, atente-se a outra característica importante dos indicadores: a


confiabilidade. Confiabilidade é a propriedade que busca relacionar um dado
indicador em questão à qualidade, na obtenção dos dados que o compõem.
Jannuzzi (2012) compara essa relação a uma balança, que, para ser confiável,
deve sempre apontar a mesma medida para um mesmo indivíduo, caso este
não tenha ganhado ou perdido peso. Para um indicador se apresentar confiável,
deve, necessariamente, embasar-se em fontes de dados confiáveis, evitando
disfunções, distorções e fraudes (propositais ou não).

132
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

A confiabilidade do indicador passa, essencialmente, pelo processo de


produção de dados. O método de coleta de dados, de produção e de análise
estatística, além da determinação dos meios para a obtenção dos referidos
dados, são pontos fundamentais para se formularem indicadores confiáveis.
Jannuzzi (2012) traz um exemplo de como a confiabilidade de um indicador pode
ser afetada pela forma através da qual é obtido:

Na avaliação do nível de violência em uma comunidade, por


exemplo, indicadores baseados nos registros de ocorrências
policiais, ou, mesmo, de mortalidade por causas violentas,
tendem a ser menos confiáveis – e menos válidos – do que
aqueles passíveis de serem obtidos a partir de pesquisas de
vitimização, questionando-se os indivíduos acerca de agravos
sofridos no seu meio em determinado período (JANNUZZI,
2012, p. 140).

É importante destacar que os registros de ocorrências policiais, muitas vezes,


podem omitir a realidade da violência de uma determinada região ou município,
e nem sempre ser fontes totalmente fidedignas a respeito do comportamento da
violência e dos crimes praticados. Vamos a um exemplo, para que fique mais
claro: A partir da existência de muitos casos de violência e da perpetuação de
uma situação de insegurança, na qual as vítimas passam a ter medo de denunciar
e não ter o problema resolvido. Até mesmo, podem se tornar vítimas de retaliação,
por registrar, oficialmente, as ocorrências. Nestes casos, os boletins de ocorrência
nem sempre representam, com fidelidade, a realidade da violência. Dessa forma,
outro caminho mais apropriado para a identificação da realidade é a inferência
de uma pesquisa com a população – a respeito da percepção de violência
e da segurança dessa população, ou da indicação das pessoas acerca dos
fenômenos que já vivenciaram (assaltos, furtos etc.). Atenção! É importante que
o gestor também fique atento às possíveis distorções que as pesquisas podem
proporcionar em determinados casos.

Ao se analisarem os casos de violência de uma comunidade dominada pelo


tráfico de drogas, grande parte da população pode se recusar a falar (e indicar os
eventos de violência da localidade). Pode, até mesmo, distorcer as informações,
propiciando indicadores falsos. Então, note que não há uma receita única para o
estabelecimento de um indicador confiável. O processo depende, essencialmente,
de cada caso, do fenômeno a ser abordado e da escala de abordagem deste.

Há a importância da coleta de dados por instituições externas daquelas


envolvidas no processo de implementação de um indicador. Tal distanciamento
pode auxiliar os gestores a reduzirem possíveis distorções no processo de
condução dos dados a serem tratados. Ramos e Schabbach (2012), inclusive,
observam o relevante papel técnico exercido por órgãos internacionais no

133
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

estabelecimento de métodos de construção de indicadores, que auxiliam na


reprodução de sistemas estatísticos e de consolidação de metodologias, como o
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Outra dimensão a ser abordada é a cobertura dos indicadores. Essa definição


deve estar bem pautada para que o gestor possa estabelecer um indicador
apropriado a partir da escala e da abrangência deste. Por isso, é necessário
buscar por indicadores “que sejam representativos da realidade empírica em
análise” (JANNUZZI, 2012, p. 35). Não necessariamente, um indicador nacional
é sempre a melhor escolha, pois tudo depende do que se deseja monitorar ou
avaliar. Se você deseja avaliar, por exemplo, o número de acidentes de trânsito
em um município e a causa destes, é importante delimitar o escopo do indicador
à escala municipal.

A cobertura é mais um elemento que merece atenção na construção


Note que a cobertura
(delimitação) dos de um bom indicador, inclusive, para que este seja adequado quanto
indicadores pode ser à mensuração daquilo que realmente se deseja analisar. Note que a
espacial (geográfica) cobertura (delimitação) dos indicadores pode ser espacial (geográfica)
ou populacional (por ou populacional (por grupos demográficos, como faixa etária, gênero
grupos demográficos, etc.). Em ambos os casos, é preciso haver uma adequação de escala
como faixa etária,
para o fenômeno que se deseja observar, evitando, por exemplo,
gênero etc.).
a ocultação de elementos importantes no objeto em questão. Um
exemplo é a análise da renda de um município, como o Rio de Janeiro, para o
planejamento de políticas de assistência social e inclusão de renda. Se o gestor
público buscar apenas por dados de renda média, analisando a escala das regiões
administrativas da cidade, como Zona Central, Zona Norte, Zona Oeste e Zona
Sul, a renda média da Zona Sul, por exemplo, esconde a existência de bolsões
de pobreza na região, o que induz, o gestor público, a um caminho errôneo, ao
não estabelecer ações localizadas em algumas comunidades e áreas com baixa
renda.

A cobertura populacional também pode relevar muitas questões importantes


aos gestores, a respeito das políticas públicas, e fontes de dados essenciais
segmentados. Nesse sentido, são os Censos e as Pesquisas Nacionais por
Amostra de Domicílios (PNADs), ambos executados pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) (JANNUZZI, 2012).

134
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

A definição da escala de um indicador deve ser uma ação


orientada a partir do objetivo que o gestor público possui, tendo,
como base, a especificidade de cada caso. O Brasil tem uma série
de instituições públicas, privadas e do terceiro setor que fornece
dados públicos que auxiliam na produção de indicadores sociais
e de políticas públicas. No entanto, sabe-se que, ainda, existem
lacunas técnicas e operacionais quando pensamos em indicadores
de políticas públicas para a esfera dos municípios (e para a escala
micro – bairros e conglomerados de municípios, por exemplo). Tendo
em vista essa demanda nacional, desde 2009, o governo federal
disponibilizou o Guia Referencial para a Medição de Desempenho
e Manual para Construção de Indicadores. Nele, o então Ministério
do Planejamento torna pública uma série de conteúdos que vão
desde os conceitos e referenciais do que são os indicadores, até a
orientação para a formulação de indicadores a partir do modelo de
desempenho. Veja mais em http://www.gespublica.gov.br/content/
guia-referencial-para-medi%C3%A7%C3%A3o-de-desempenho-e-
manual-para-constru%C3%A7%C3%A3o-de-indicadores.

É considerada, como uma característica importante dos indicadores de


políticas públicas, a estabilidade, fator importante no que diz respeito às fontes
de dados utilizadas para a construção de um indicador, que devem ser estáveis
ao longo do tempo, para que possibilitem comparações históricas.

A característica tem a ver com a definição exposta, por Jannuzzi (2002; 2012),
como temporalidade. A temporalidade pode ser conceituada como a capacidade
de um indicador propiciar análises apropriadas com o passar do tempo, inclusive,
possibilitando a comparação entre as diferentes fases temporais (comparações
históricas, também citadas, na literatura, como historicidade).

Outras características citadas dos indicadores, pela literatura, são: a


simplicidade (a formulação e o método de coleta de dados do indicador devem ser
de simples compreensão); a acessibilidade (os dados que compõem o indicador
devem ter um fácil acesso); a desagregabilidade (capacidade de representação
regionalizada do indicador); a especificidade (capacidade de refletir as alterações
estritamente ligadas a transformações relacionadas a uma dimensão mensurada);
a inteligibilidade (capacidade de transparência metodológica do indicador); a
sensibilidade (capacidade do indicador de espelhar transformações significativas

135
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

se as condições que afetam o objeto em questão se alteram); e a rastreabilidade


(capacidade que um indicador possui de ser verificado ou auditado por qualquer
pessoa) (ROCHET; BOUT-COLONNA; KERAMIDAS, 2005; JANNUZZI, 2002;
2012).

FIGURA 3 – PROPRIEDADES DESEJÁVEIS DOS INDICADORES

FONTE: Jannuzzi (2012, p. 35)

Notoriamente, algumas dimensões dos indicadores, como as capacidades de


validade, de confiabilidade e de estabilidade, são fundamentais, pois influenciam,
diretamente, na capacidade de o indicador ser efetivo ou não. Já outras
dimensões, como a simplicidade e a rastreabilidade, são buscadas na medida
do possível, ao passo que alguns indicadores com formulações mais complexas
podem ocorrer devido ao contexto em que se desejam mensurar. Exemplo:
indicadores que agregam muitas variáveis, como o Índice de Felicidade Bruta,
também denominado de “Índice Nacional Bruto de Felicidade” (Gross National
Happiness, em inglês) (CENTRE FOR BHUTAN STUDIES & GNH, 2021).

O Índice de Felicidade Bruta é um indicador formulado pela


Organização das Nações Unidas (ONU), e que vem ganhando espaço
nos debates metodológicos de indicadores de políticas públicas, na
medida em que inova na busca pela mensuração de um fenômeno
social com grandes capacidades de abstração e de subjetividade: a
felicidade. Nesse sentido, o indicador se apresenta bem complexo na
formulação, na medida que soma diferentes variáveis, como Produto

136
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Interno Bruto, Capacidade de Assistência Social, Expectativa de Vida


Saudável, Liberdade para fazer escolhas, Nível de generosidade, e
Nível de confiança. Você pode obter mais informações de como o
indicador é construído e das variáveis na página das Nações Unidas:
https://sustainabledevelopment.un.org/partnership/?p=2212.

Como você pode perceber, a partir do exposto e das análises colocadas, os


indicadores necessitam de um conjunto amplo de dimensões, estas que devem
ser bem compreendidas e geridas pelo policymaker ou pelo agente que promove
a avaliação e/ou o monitoramento de determinada política pública.

2.3 INDICADORES, ÍNDICES E TAXAS


Caro estudante, antes de continuarmos a nossa jornada de aprendizado
pelas características e dimensões existentes nos indicadores de políticas
públicas, torna-se fundamental que você possa identificar, distinguir o que são os
indicadores, os índices e as taxas. Em várias ocasiões informais, e, até mesmo,
em algumas situações formais, gestores, agentes de políticas públicas, veículos
da imprensa, e muitas pessoas comuns acabam utilizando esses termos sem
distingui-los, o que, por vezes, gera uma certa confusão e indistinção entre eles,
mas é importante que você saiba identificar as diferenças, então, vamos lá!

A taxa é um tipo de coeficiente que é multiplicado por alguma potência de


10. Essa estruturação matemática facilita a apresentação dos indicadores como
números sucintos. São exemplos: a taxa bruta de mortalidade, que é calculada
pelo número de mortos ao ano por 1.000 (mil) habitantes.

Os índices são uma classe especial de indicadores, podendo ser


denominados de “indicadores compostos”, isso porque congregam indicadores
distintos em um único dado quantificado. Um dos índices mais famosos, ao redor
do mundo, é o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), estabelecido para
promover uma quantificação referente ao nível de desenvolvimento dos países ao
redor do globo. No Brasil, o IDH ganhou uma reprodução para a escala municipal
desde 1998, por meio do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M).

137
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Caro aluno, você pode aprender mais a respeito do IDH-M e do


ranking do IDH nos municípios brasileiros no site do Programa das
Nações Unidas no Brasil (PNUD). Veja mais em https://www.br.undp.
org/content/brazil/pt/home/idh0/rankings/idhm-municipios-2010.html.

Jannuzzi (2012, p. 29) destaca que os índices compostos, costumeiramente,


são defendidos por produzir uma “suposta simplicidade e capacidade de síntese
em situações em que se precisa ter uma avaliação geral [...]”. Em outras palavras,
a capacidade de síntese seria capaz de promover uma grande capacidade de
gestão, orientando, de maneira mais objetiva, quais são os pontos que devem ser
priorizados em determinada situação-análise. No entanto, é um debate complexo,
e que não deve ser tomado como uma verdade única, pois, muitas vezes, ao
aglutinar vários indicadores, o índice acaba não dando uma visão específica dos
elementos que o compõem.

Conheceremos, um pouco mais a fundo, a construção do Índice


de Desenvolvimento Humano (IDH). As dimensões que envolvem a
construção do IDH são: a) educação, b) longevidade, e c) renda.

138
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

FONTE: Adaptada de PNUD (2021)

É importante destacarmos que o IDH é um índice que varia


entre 0,00 (índice mais baixo) e 1,00 (índice mais alto). Segue a
seguinte classificação, internacionalmente aceita por diversos países
do mundo: IDH entre 0 e 0,499 é considerado baixo – representando
um baixo desenvolvimento humano; IDH entre 0,500 e 0,799 é
considerado médio – representando um médio desenvolvimento
humano. Os IDHs que possuem, como resultados, entre 0,800
e 0,899, são classificados como alto IDH – representando altos
padrões de desenvolvimento humano. Já os IDHs acima de 0,900 são
considerados muito altos – representando os mais elevados padrões
de desenvolvimento humano, de acordo com o Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Não obstante, apesar da
densidade e da complexidade, envolvendo diversos elementos da
vida social, o IDH acaba sendo um instrumento muito amplo e que
não ilustra as distorções existentes em uma das dimensões.
Ex.: Um município que tenha um sistema de saúde excelente
e um sistema educacional precário. Como a métrica do IDH é uma
média entre essas dimensões, o gestor, apenas avaliando o índice
como um todo, acaba não conseguindo identificar, de fato, qual das
dimensões apresenta uma fragilidade. Por isso, também é importante
se atentar às dimensões específicas de cada um dos fenômenos do
Índice de Desenvolvimento.

139
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Caso você tenha interesse em se aprofundar mais em questões


relativas ao IDH, à produção e à disponibilização dos dados
internacionalmente, é possível obter mais informações em https://
www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/idh0/conceitos/o-que-e-o-
idh.html.

2.4 ESTATÍSTICAS PÚBLICAS E


SISTEMAS DE INDICADORES
A produção da informação e do conhecimento é uma temática muito
abrangente e que contempla as mais vastas áreas da ciência, indo desde os
estudos teóricos da produção do conhecimento, da informação e das estruturas
ontológicas da ciência, até os mais aplicados, de como promover meios mais
eficazes de publicidade e de propagação da informação. No meio desse extenso
segmento de questão, está a produção de estatísticas públicas. O Brasil conta
com um arcabouço institucional de agências ligadas aos governos federal e
estadual, o denominado Sistema Estatístico Nacional (SEN). A respeito do SEN,
abordaremos, mais à frente, o seu papel e as instituições que desempenham
ações imprescindíveis para a atuação e a manutenção.

Você, com certeza, já deve ter tido acesso a dados, como taxa de
desemprego e taxa de inflação. Esses são bons exemplos de dados públicos
produzidos e publicizados por instituições que monitoram fenômenos sociais,
como o desemprego e a inflação, e que operacionalizam estudos técnicos que
geram a produção de indicadores, mas, afinal de contas, devemos esclarecer
uma questão que é de grande relevância: Por que são necessárias a construção e
a disseminação de estatísticas públicas?

Como analisam Jannuzzi (2012) e Dargent et al. (2018), as estatísticas


públicas são importantes, pois são um instrumental para a construção de projetos
e de políticas públicas, fundamentais para que possam ser produzidos processos
de avaliação e monitoramento.

Outro ponto importante, na publicidade de estatísticas e de dados públicos,


é a capacidade de estes propiciarem caminhos para a análise de cenários e de
transformações sociais, ponto que ganha grande relevância no âmbito acadêmico
e na multiplicação de centros de pesquisa em universidades e institutos de
pesquisa, principalmente, a partir da década de 1980, com questões, como

140
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

as desigualdades sociais, a pobreza, as políticas de mitigação, as ações e


redefinições das ações do Estado, e a própria crítica estabelecida na eficácia dos
agentes estatais e dos programas e políticas (DENHARDT; CATLAW, 2017).

Não obstante, no cenário de incerteza e de questionamentos quanto à


capacidade das políticas públicas como modelo de transformação, emergem
os debates que buscam propiciar Políticas Públicas Baseadas em Evidências
(PPBEs) (COSTA; SILVA, 2016; PINHEIRO, 2020). Pode-se considerar as PPBEs
como um paradigma que se estabelece durante a ascensão das teorias gerenciais
(CLOETE, 2009), além de uma corrente teórico-prática (BARBRY, 2016;
MARSTON; WATTS, 2003) e de uma maneira de governos prestarem contas
às populações (COSTA; SILVA, 2016). De certa forma, todas essas concepções
nos ajudam a compreender as PPBEs, que, na verdade, são, ao mesmo tempo,
um novo paradigma de construção e de tomada de decisões públicas e um
modelo teórico-prático, na medida em que sinalizam uma nova forma de produzir
políticas públicas com base em dados científicos e estatísticas que caracterizem
a realidade em questão. Ainda, buscam estabelecer uma resposta efetiva aos
questionamentos e às dúvidas frente à ação estatal e à ineficiência do Estado em
prover respostas e atenuar problemas sociais, como a desigualdade, a pobreza e
outros dilemas que ganham destaque no período.

A análise baseada em evidências busca construir um arcabouço de tomada


de decisões públicas que possa abranger, aos processos políticos, a visão de
especialistas do assunto, a verificação de dados empíricos do fenômeno, e os
resultados de investigações e de pesquisas científicas (COSTA; SILVA, 2016).
Tal cenário coaduna com o estabelecimento de um campo de atuação, no qual
o gestor de políticas públicas pode se tornar imparcial e isento, afastando-se dos
jogos de poder e de interesses inerentes ao campo das policies. Logo, a evidência
“[...] seria, assim, caracterizada como alguma coisa que forneceria provas para a
tomada de decisão [...]” (COSTA; SILVA, 2016, p. 125).

A concepção das Políticas Públicas Baseadas em Evidências não pode ser


compreendida como um caminho único, sendo totalmente neutro, a ponto de se
distanciar das esferas dos interesses e dos jogos de poder da esfera política,
principalmente, quando pensamos no papel específico do tomador de decisões
(policymaker) e na sua interação com os demais agentes (stakeholders), incluídos
ou não nos processos em torno da política pública. Nesse sentido, Pinheiro (2020)
denota que é imprecisa a compreensão das evidências de políticas públicas como
instrumentos “mais ou menos neutros” (PINHEIRO, 2020, p. 25). De tal forma, o
autor nota que essa concepção não pode ser isenta, e destaca que a tomada de
decisões baseada em evidências:

141
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

• gera um grande esforço de racionalização dos tomadores de decisões;


• exige um interesse justificatório por parte dos policymakers (pré-
disposição ao controle social);
• não possui a capacidade de isenção político-ideológica, uma vez que
utiliza os elementos para o estabelecimento dos referenciais de coleta de
dados e para os métodos de análise dos dados obtidos;
• sugere os modos de definição das evidências, e como estas são
utilizadas. São elementos indissociáveis da esfera social, além de
carregarem dimensões epistemológicas do contexto no qual são
produzidas;
• deve tomar cuidado para que a falsa noção de isenção ideológica das
políticas baseadas em evidências não se transforme em um instrumento
de manipulação das elites políticas, executada por meio do tecnicismo, o
que pode acabar desvalorizando as outras formas de conhecimento não
científico, como os saberes de comunidade tradicionais.

Deve-se levar em consideração que nem sempre há interesse dos


governantes em estabelecerem um sistema de produção e disseminação de
estatísticas públicas eficiente, isso porque a formulação do sistema robusto de
informações para a tomada de decisões pode produzir, também, um instrumental
para responsabilizar os governantes pelas ações (ou pela falta destas). Assim,
Dargent et al. (2018) consideram que o sistema de dados robusto pode reduzir
a discricionariedade do governo, tornando, inclusive, as ações mais fáceis de
serem avaliadas pela sociedade civil, empresas, instituições internacionais, e, até
mesmo, por outros países. Nesse sentido, é importante frisar que a consolidação
de dados e de subsídios é importante, pois nenhuma política pública é neutra por
si só, se levarmos em consideração o sentido político. Todas carregam interesses,
visões e culturas, conhecimentos (ou desconhecimentos) prévios, além de outros
elementos.

Boullosa et al. (2021, p. 2) destacam, como um “ponto de partida”, a


necessidade de reflexão e de questionamento acerca de como são produzidas tais
evidências. Ainda, desconsiderar os elementos como artigos neutros e apolíticos.
Esse exercício envolve, também, a posição dos avaliadores e da construção de
indicadores para os processos de avaliação, como veremos mais à frente.

142
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Há algumas análises que tratam do fenômeno da tomada de


decisões com base nas Políticas Públicas Baseadas em Evidências
(PPBEs).
O texto de Pinheiro (2020) explicita alguns elementos críticos
na análise baseada em evidências como um caminho único para o
bom desenvolvimento das políticas públicas. Para acessar, clique em
http://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/10373/1/bapi_24_art1.
pdf.

Agora que você já viu as principais características e críticas em relação às


políticas públicas baseadas em evidências, vamos nos aprofundar um pouco
mais no Sistema Nacional de Estatísticas Públicas, que possui, como principal
instituição, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável
por produzir, compilar e publicar uma série de dados primários, provenientes dos
Ministérios (em nível federal), das Secretarias (em níveis estadual e distrital), e
das prefeituras (em nível municipal) (JANNUZZI, 2012).

O primeiro projeto institucional do IBGE, como o conhecemos hoje, foi


traçado em 1934, sendo institucionalizado, em 1936, como “Instituto Nacional de
Estatísticas”. Dargent et al. (2018) notam que o IBGE exerceu, entre as décadas
de 40 e 70, um papel de sistematização de dados públicos imprescindível,
formalizando o próprio sistema estatístico nacional e organizando por meio da
sistematização burocrática, com a criação de unidades em todas as regiões do
país. O órgão executa, desde 1940, os censos demográficos nacionais, sendo,
estes, definidos por Jannuzzi (2012), como um tipo de pesquisa domiciliar que tem,
como objetivo, monitorar tendências demográficas, fenômenos e características
socioeconômicas da população, acompanhamento das tendências do mercado de
trabalho, análise dos setores industriais, agropecuários e de serviços, além da
sistematização de registros civis e dos Ministérios. Para além dessas funções,
executadas pelo IBGE, por meio dos censos e de outras pesquisas e publicações
setoriais, a instituição define, como as principais funções diante do SNE:

143
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

FIGURA 4 – PRINCIPAIS FUNÇÕES DO IBGE

FONTE: Adaptada de IBGE (2021)

Entre as décadas de 1970 e 1980, como analisam Dargent et al. (2018), o


IBGE consolidou o sistema estatístico nacional, juntando, inclusive, os sistemas
estatísticos e cartográficos. Tal modelo de produção de dados públicos ganhou
uma dimensão inovadora de inclusão de novas metodologias estatísticas e de
pesquisas intersetoriais. É importante observar que, naquele período, o instituto
também demarcou ações importantes no estabelecimento dos Planos Nacionais
de Desenvolvimento (PNDs) e na consolidação de dados voltados para o
planejamento nacional, eixos estruturantes dos governos militares no Brasil.

A terceira fase do IBGE, a partir da década de 1990, foi analisada, por


Dargent et al. (2018), como um período no qual o órgão se redefiniu com a
agenda nacional, por meio do processo de redemocratização, da consolidação da
Constituição Federal de 1988, e do processo de informatização, fatores que levam
o IBGE a uma redefinição dos sistemas estatísticos e cartográficos e à abertura
para ações mais próximas com outros órgãos públicos, como as universidades e
os centros de pesquisa, oferendo grande ênfase a escalas e estudos municipais.

144
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

O Sistema Nacional de Estatísticas (SNE) também conta com órgãos e


bancos de dados públicos segmentados para outras áreas das políticas públicas,
como o DATASUS, que abrange dados da saúde brasileira; e o Instituto Nacional
de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), que abarca dados
e pesquisas da educação brasileira. Existem, ainda, as instituições que produzem
dados públicos nacionais multisetoriais, como o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA), que, apesar do nome e de ter, como cargo-chefe, a consolidação
e a disseminação de dados econômicos, também vem ampliando o espectro de
pesquisas para áreas sociais, como a publicação do Índice de Vulnerabilidade
Social (IVS) e o Atlas da Violência.

Você pode ter acesso ao amplo acervo de dados do Instituto


de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) por meio do portal https://
www.ipea.gov.br/portal/. Poderá trabalhar com o Ipeadata, que é a
plataforma digital de dados consolidados do IPEA, sendo encontrados
dados econômicos, sociais, demográficos e regionais do Brasil.
Ainda, é possível visualizar outras bases de dados do IPEA,
como o Atlas de Vulnerabilidade Social, que busca analisar os
diferentes fatores que produzem a desigualdade e a vulnerabilidade
sociais: http://ivs.ipea.gov.br/index.php/pt/sobre; e o Atlas da
Violência, publicado em 2020, que marca um importante passo de
institucionalização de dados nacionais na área da segurança pública,
em categorias, como número de homicídios, violência por raça e
gênero, óbitos por armas de fogo, e dados da violência no trânsito:
https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/

O SNE também é constituído por uma série de instituições e de agências


estaduais que produzem, compilam e divulgam estatísticas públicas em nível
estadual, como a Fundação João Pinheiro (MG), o Centro Estadual de Estatísticas,
Pesquisas e Formação de Servidores do Rio de Janeiro (CEPERJ) (RJ), e a
Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE) (SP).

Jannuzzi (2012) observa que as instituições internacionais também


exercem um papel importante na orientação do SNE, como a Organização das
Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a Organização Internacional
do Trabalho (OIT), o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

145
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

(PNUD), o Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância


(UNICEF), o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI), e, ainda,
instituições de integração regional, como a União Europeia (UE) e o Mercado
Comum do Sul (MERCOSUL).

A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) foi criada


no fim da década de 1940, com o objetivo principal de promover a cooperação
entre os países da região. No bojo desse objetivo central, estavam a construção
e a consolidação de dados socioeconômicos mais sólidos para os Estados-
nação latino-americanos. A organização possui um departamento de estatísticas,
responsável pela produção de dados públicos a nível regional, capaz de produzir
quadros comparativos entre os países da região. De acordo com a CEPAL (2021),
as estatísticas públicas possuem uma ampla gama de funcionalidades:

• A promoção de melhores práticas e a difusão de sistemas e de


metodologias de comparação entre os países (nível internacional).
• A produção de assessoria e de cooperação técnica, visando ao
fortalecimento das capacidades técnicas e institucionais dos países-
membros no âmbito da produção de estatísticas, facilitando as trocas de
experiências e de cooperação horizontal.
• O estabelecimento de atividades de desenvolvimento e de aprimoramento
metodológicos de indicadores (propostas, adaptações, revisões etc.).

A produção de estatística pública em nível internacional propicia uma


comparação mais fácil entre os diferentes contextos e realidades sociais.
Esse arcabouço internacional vem ganhando densidade desde a proposta da
Organização das Nações Unidas (ONU), que estabeleceu os então denominados
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), aplicados no ano 2000, na
Cúpula do Milênio. Segundo Sanahuja e Vázquez (2017), a agenda dos ODM
envolvia três dimensões: 1) formulação de uma agenda de demandas mais robusta
por políticas sociais e garantia dos direitos humanos; 2) institucionalização de
políticas públicas para a égide do globalismo e do liberalismo; e 3) estabelecimento
de ações internacionais apoiadas na soberania nacional.

Os oito ODM traçavam, como objetivos internacionais a serem alcançados


até 2015: 1) Erradicar a pobreza extrema e a fome; 2) Alcançar o ensino
primário universal; 3) Promover a igualdade de gênero e empoderar as mulheres;
4) Reduzir a mortalidade infantil; 5) Melhorar a saúde materna; 6) Combater o HIV/
AIDS, a malária e outras doenças; 7) Garantir a sustentabilidade ambiental; e 8)
Desenvolver uma parceria global para o desenvolvimento (ONU, 2021).

146
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

A construção dos ODM sofre críticas no que tange à falta de um arcabouço


de indicadores e métricas mais bem definidos de acompanhamento e de avaliação
dos objetivos e do desenvolvimento propostos pela ONU, como elucidam Sanahuja
e Vázquez (2017). Outro elemento que é ponto de crítica na estruturação dos
ODM é a própria definição de desenvolvimento, até então, bem limitada (GIL,
2018). Note que (a definição de um fenômeno – objeto) é um passo essencial
para a construção de um sistema de indicadores, como veremos mais adiante.
Da mesma forma, o estabelecimento de métricas bem claras e bem delimitadas
também é fundamental, para que se possa promover um acompanhamento
adequado das políticas. Como você pode perceber, alguns objetivos possuem
metas muito abertas, como garantir a sustentabilidade ambiental, um tema
amplo, complexo, e que envolve uma série de elementos, como: qual é o padrão
de sustentabilidade aceitável? Quais sistemas ambientais devem alcançar esse
padrão de sustentabilidade?

Em 2015, a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu uma nova


agenda global, denominada de Agenda 2030, composta por 17 objetivos, também
denominados de Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). Destes 17
ODS, derivam 169 metas, que traçam um arcabouço mais refinado e definido
dos passos para a consolidação da nova agenda global de desenvolvimento. Um
ponto que nos cabe frisar, aqui, é a estruturação de dados públicos, indicadores
e sistemas de monitoramento e de avaliação, em nível internacional, de uma
ampla gama de temáticas, que vão desde as políticas de saúde e educação, até
as políticas ambientais, de gênero, de erradicação da pobreza e de promoção do
desenvolvimento. Como denota Gil (2018), a agenda é mais ambiciosa na medida
em que traça metas mais claras e propõe indicadores para o acompanhamento das
metas até o ano de 2030, tanto pelos Estados-nação, quanto pelas organizações
e instituições da sociedade civil (SANAHUJA; VÁZQUEZ, 2017; WHITACKER,
2017; GIL, 2018).

Se você tem interesse em conhecer mais a respeito das


estatísticas e dos dados públicos produzidos no âmbito da Comissão
Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), acesse:
https://www.cepal.org/pt-br/datos-y-estadisticas.

147
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

De acordo com Alessandro (2017), as capacidades estatísticas das


instituições dependem de cinco fatores:

• As instituições e o conjunto de agentes do sistema político que se


relacionam.
• O cenário da gestão pública e como esta percebe a necessidade (ou
não) de produzir dados e estatísticas públicos.
• A gestão burocrática do sistema estatístico, como se dão os processos
de definição de objetos, de instrumentalização de técnicas e de análise e
publicização dos dados obtidos.
• A capacidade de governança com agentes externos.
• As características dos atores individuais (técnicos, burocratas,
policymakers e políticos).

Esse conjunto de características e de elementos institucionais é importante,


pois demonstra como o estabelecimento de dados e de estatísticas públicos
depende de uma série de atores, instituições e interesses de diferentes grupos,
não sendo possível a consolidação de instituições sólidas, apenas partindo do
pressuposto de que há um interesse da sociedade, mas que não é correspondido
pelos atores individuais que operacionalizam os processos estatísticos e de
levantamento de dados, por exemplo. Até mesmo, em cenários nos quais existem
o interesse e o empenho dos técnicos e dos burocratas, mas não há interesse
político na institucionalização e na sistematização de dados públicos robustos.

Dargent et al. (2018) destacam o papel importante dos agentes internacionais,


principalmente, na consolidação de diretrizes e de agendas internacionais de
ação, além da promoção de debates técnicos, investigações e ações cooperadas
em prol do desenvolvimento de melhorias para o sistema de estatísticas públicas.
Outros dois pontos que também devem ser mencionados, entre as dimensões
que influenciam na consolidação de sistemas nacionais de estatísticas, são a
impressa e os organismos não governamentais (ONGs).

Apesar dos diferentes contextos institucionais, Taylor (2016) propõe três eixos
fundamentais para que se possa estabelecer um Sistema Nacional Estatístico
(SNE) robusto:

• Deve possuir as capacidades técnicas necessárias para o


desenvolvimento dos trabalhos de produção, consolidação e publicação
dos dados públicos de forma eficaz e eficiente.
• Deve possuir autonomias política e institucional, inclusive, orçamentária,
para designar, a partir de pressupostos técnicos, ações prioritárias para
a investigação das realidades nacionais, e não prioritárias. Da mesma
forma, a autonomia do SNE deve torná-lo capaz de publicar os dados

148
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

e as estatísticas encontrados sem haver interferência de políticos e


de grupos de interesses, como setores estratégicos do mercado (Ex.:
bancos, mercado financeiro etc.).
• Deve possuir recursos humanos e orçamentários para a execução
apropriada para produzir estatísticas e dados com a periodicidade e
a abrangência necessárias, gerando bons produtos finais (dados e
estatísticas adequados para a tomada de decisões).

Como você pode perceber, são engrenagens importantes, para o


desenvolvimento de um sólido SNE, as autonomias política e institucional dos
órgãos responsáveis pelas estatísticas públicas, além das capacidades técnica,
financeira e de recursos humanos apropriados para o desenvolvimento das
atividades de produção, organização e publicitação dos dados.

Agora, estudaremos, de forma mais específica, o que é um sistema de


indicadores, além dos principais passos para a produção de um sistema sólido e
que produza indicadores que dialoguem, satisfatoriamente, com a realidade a ser
mensurada.

A construção de um sistema de indicadores envolve, de acordo com Jannuzzi


(2012), um conjunto de elementos metodológicos, que podem ser classificados
em quatro etapas distintas:

1) Etapa da definição operacional do conceito ou da temática que o sistema


de indicadores deve abordar. Fase elaborada a partir de um determinado
interesse teórico (de investigação ou mensuração de dado fenômeno) ou
programático.
2) Etapa de especificação das dimensões a serem abordadas no sistema de
indicadores. Busca-se estabelecer as diferentes maneiras de interpretar
as dimensões, promovendo a construção de objetivos claros e bem
delimitados “do que se deseja medir (ou indicar)” de forma quantitativa.
3) Etapa da obtenção de estatísticas públicas pertinentes, que subsidiem a
consolidação das dimensões estabelecidas anteriormente, e, ao mesmo
tempo, confluam para a consolidação de dados pertinentes.
4) Etapa para combinar, de forma orientada, as estatísticas disponíveis,
estabelecendo o sistema de indicadores, que deve substanciar, da
maneira mais tangível possível, o conceito abstrato inicialmente
estabelecido.

Com base nessas etapas, pode-se promover os conceitos (objetivos) a serem


abordados, as prioridades estabelecidas a serem medidas com a construção dos
indicadores, e a busca pelos dados públicos capazes de nortear a solidificação
dos indicadores desejados. Tal esquema será apresentado por Jannuzzi (2005):

149
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

FIGURA 5 – CONSTRUÇÃO DO SISTEMA DE INDICADORES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

FONTE: Jannuzzi (2005, p. 139)

Note que estabelecer o objetivo geral do programa é o ponto inicial para a


construção do sistema de indicadores, inclusive, para delimitar a área da (ou das)
política (s) pública (s) a partir da (s) qual (quais) se deseja formular o indicador.
No segundo passo elencado por Jannuzzi (2005), indica-se a necessidade de o
gestor definir quais ações norteiam a construção do sistema de indicadores. Essas
ações, uma vez definidas, operacionalizam as áreas de abrangência do sistema
de indicadores em construção, por exemplo, se um gestor deseja monitorar a área
de segurança pública do seu município (objetivo do sistema de indicadores). O
segundo passo do gestor é elencar os fenômenos ou as áreas específicas da
segurança pública do seu município para os quais deseja formular indicadores.
É possível, por exemplo, estabelecer, como prioridades de ação: 1) mortes por
homicídios; 2) violência contra mulher; 3) crimes de furto, roubo ou latrocínio por
bairro etc.

Seguem, em outras palavras, a partir da conceituação de Jannuzzi (2012), os


passos da construção de um sistema de indicadores:

150
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

FIGURA 6 – CONSTRUÇÃO DE UM SISTEMA DE INDICADORES SOCIAIS

FONTE: Jannuzzi (2012, p. 251)

Como você mesmo pode reparar, a partir do esquema ilustrativo anterior,


a definição do conceito ou da área temática a ser quantificada é o primeiro
passo. Essa fase é de suma importância para que a construção do indicador
esteja alinhada ao fenômeno que se deseja observar, e para que o sistema de
indicadores não seja criado de forma distorcida ou com indicadores que não
subsidiem uma análise real do objeto a ser avaliado. Por fim, para que a junção
dos indicadores escolhidos possibilite, de fato, a consolidação de um sistema de
indicadores apropriado para avaliar o fenômeno anteriormente escolhido. O gestor
deve estar atento ao papel de cada estatística utilizada.

1 - Caro aluno, tendo, como base, o que estudamos até aqui, assinale
as alternativas a seguir com (V) para as verdadeiras e (F) para as
falsas:

( ) Um indicador pode ser definido como a medida de um resultado a


ser perseguido.
( ) Um índice pode ser uma boa medida de indicação ao propor uma
análise resumida de um objeto complexo que possui apenas
dimensões qualitativas.

151
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

( ) O IDH é um índice que sintetiza as dimensões da renda média,


da expectativa de vida e da qualidade da educação de um país
ou de um município.
( ) Os índices são conceituados como indicadores compostos, pois
agregam diferentes dimensões analíticas, o que gera um número.
( ) Os índices são conceituados como indicadores simples, pois
agregam diferentes dimensões analíticas, o que gera um número.

1 - Agora, tendo em vista as dimensões e as características dos


indicadores até aqui estudados, assinale a única alterativa
CORRETA:

a) A simplicidade de um indicador é a capacidade que tem de ser


replicado e reproduzido.
b) A sensibilidade de um indicador é a capacidade que tem de expor
mudanças se as condições que afetam a estrutura se modificam.
c) A rastreabilidade de um indicador é a capacidade que tem de
expor os dados para qualquer cidadão que deseja encontrá-los.
d) A periodicidade de um indicador é a capacidade que tem de
acompanhar a necessidade de adaptação histórica.

2.5 MONITORANDO INDICADORES


PARA POLÍTICAS PÚBLICAS
No capítulo anterior, discutimos alguns elementos conceituais em torno do
conceito de monitoramento no âmbito do Ciclo de Políticas Públicas (CPP). Você
deve se lembrar, também, de que o monitoramento não deve ser confundido com a
avaliação de políticas públicas, principalmente, pelo caráter de acompanhamento
inerente às ações de monitoramento. No entanto, abordaremos, aqui, outros
elementos importantes no que diz respeito à ação de monitorar indicadores.

Mokate (2002) aponta que o monitoramento é fundamental para prover


uma análise dos pontos fracos e dos pontos fortes existentes nos processos em
execução. Outra característica importante do monitoramento é a forte correlação

152
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

com a capacidade de ajuste e correção de falhas, ainda, na fase de implementação


das políticas, o que permite, à gestão, promover melhores resultados e poucos
danos em casos de falhas processuais (MOKATE, 2002; BOULLOSA, 2013; DA
CUNHA, 2018).

Como explicitam Ramos e Schabbach (2012), a boa execução do


monitoramento possui três grandes desafios:

• Identificar os objetivos que o programa ou a estratégia busca alcançar.


• Elaborar indicadores que possam monitorar o progresso em relação às
metas.
• Fixar metas quantitativas e temporais para cada indicador.

Pensar na identificação dos objetivos a serem monitorados e nas


possíveis estratégias para a obtenção destes deve ser o ponto de partida para
o planejamento de qualquer ação de monitoramento. O segundo elemento é a
própria construção dos indicadores, que são utilizados para a execução do
monitoramento. Nesta etapa, é importante que o gestor tenha atenção quanto à
delimitação da ação de acompanhamento, para que, no meio do caminho, não se
perca diante de possíveis fenômenos que surjam com o decorrer da execução da
política.

Os denominados “indicadores de performance”, como vimos na seção


anterior, podem ser um instrumento para a efetivação de um monitoramento
apropriado do progresso de determinada política, para isso, um elemento que
ajuda a consolidar a aplicação é a escolha de uma periodicidade, para que possa
se estabelecer a análise comparativa entre determinados períodos de uma política
em execução. Esses períodos podem ser bimestrais, trimestrais, semestrais
e anuais, a depender de cada caso em específico e da executabilidade destes
(RAMOS; SCHABBACH, 2012).

Como elucida Boullosa (2019, p. 29), o ato de monitorar envolve trabalhar


com “padrões de comportamento de dados, podendo ser associado a alertas
em caso de variações, para além do que foi previamente considerado como
aceitável”. Por isso, um ponto importante para a execução do monitoramento é
que não adianta o gestor propor prazos de monitoramento curtos e impossíveis
de serem aferidos, pois isso pode inviabilizar o monitoramento adequado da
política pública em questão, ou, ainda, forçar ou tendenciar dados e indicadores
distorcidos da realidade. O bom enquadramento, seja dos prazos a serem
estabelecidos ou dos resultados a serem aferidos, é a “hipótese de funcionamento
do objeto” (BOULLOSA, 2019, p. 29), o que deve ser previamente considerado
como aceitável para propiciar o ato de monitoramento.

153
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

3 ABORDAGENS DE AVALIAÇÃO
Caro estudante, nesta seção, retornaremos a discutir o conceito de
avaliação, mas, desta vez, teremos, como norte dos nossos estudos, as diferentes
abordagens teóricas que imprimem diferentes marcas conceituais, além de
distintos instrumentos práticos para a execução dos processos avaliativos de
políticas públicas.

É importante que você possa conhecer e identificar as características de


cada uma das abordagens mais usuais dos processos de avaliação: 1) Positivista-
experimental; 2) Pragmático por qualidade; 3) Construtivista; e 4) Modelos Plurais.
Tudo isso porque a escolha por uma (ou mais) abordagens, nos processos de
avaliação, conduz não apenas à execução por diferentes instrumentos, mas
denota diferentes formas de se compreender o próprio papel da avaliação para
as políticas públicas, promovendo resultados analíticos (MÈNY; THOENIG, 1989;
TINÔCO; SOUZA; OLIVEIRA, 2011; CRUZ, 2019; BOULLOSA et al., 2021).

No capítulo anterior, você observou o conceito de avaliação como uma


das fases do Ciclo de Políticas Públicas. Contudo, é importante destacar que a
avaliação de políticas públicas é um elemento bem mais abrangente, e que pode
ser abordado a partir de diferentes instrumentos técnicos, como veremos.

Agum, Riscado e Menezes (2015) destacam que o exercício avaliativo de


uma política pública não passa apenas pela escolha de elementos técnicos para a
mensuração dos resultados da política. Existem, ainda, os fatores e os interesses
políticos, que, muitas vezes, direcionam o interesse ou não pela continuidade da
política pública. Da mesma forma, os autores observam que a determinação da
“[...] política não pode ser avaliada por uma gama incalculável de determinantes,
assim, ela sofre efeitos multifatoriais que fogem ao entendimento do avaliador”
(AGUM; RISCADO; MENEZES, 2015, p. 31). Isso significa que não adianta o
gestor tentar promover um processo avaliativo abrangente demais, que busca
esclarecer todos os meandros da política pública em questão, mas, ao mesmo
tempo, deve abarcar os indicadores técnicos mais apropriados para cada tipo de
caso e para cada processo avaliativo (a depender daquilo que se deseja mensurar,
por exemplo).

O exercício auxilia na condução de processos avaliativos mais seguros, e


que evitem a formulação de “questionamentos capciosos” (AGUM; RISCADO;
MENEZES, 2015), inclusive, daqueles que podem derivar no próprio
questionamento da necessidade de avaliação. Por isso, é preciso ter em
mente que todas as avaliações podem ser alvo de questionamentos quanto às
capacidades de isenção e de objetividade, uma vez que o modelo de total isenção
não existe (SCHIMIDT, 2018).
154
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Um importante instrumento de ação do policymaker, diante do contexto


apresentado, é a sua capacidade de identificar o modelo avaliativo mais adequado
para cada situação-problema, desmitificando a compreensão errônea que vê a
avaliação como um processo linear, único e puramente tecnicista – quantitativista,
norteada apenas por instrumentos gerenciais. Como elucidam Boullosa et al.
(2021), os processos de avaliação devem ser capazes de desconstruir os termos
técnicos e os passos usuais utilizados como verdades absolutas. Em contraposição,
indica-se a necessidade de um exercício avaliativo mais reflexivo (com base na
autocrítica dos valores e dos interesses dos avaliadores e daquilo que se deseja
avaliar), levando em consideração as dimensões sociais dos atores que permeiam
o processo: avaliadores, financiadores, demandantes, público-alvo das políticas
avaliadas, grupos de interesses (pela manutenção ou não da política) etc.

A avaliação somativa é aquela que tem, como objetivo, produzir


resultados para a prestação de contas para uma audiência externa
(havendo uma separação bem definida entre a equipe avaliadora e os
integrantes do programa ou da política a ser avaliada). Já a avaliação
formativa é promovida para desenvolver o aperfeiçoamento de um
programa ou de uma política na operação. Nesse modelo (formativo),
os gestores ou os agentes que operacionalizam a ação podem,
também, integrar a equipe responsável pela avaliação (isso pode ser
promovido por equipes internas ou mistas).

FONTE: Adaptada de Vieira-da-Silva (2014)

155
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Apresentaremos, a seguir, outros caminhos possíveis, que orientarão


diferentes formas de avaliação das políticas públicas.

3.1 POSITIVISTA-EXPERIMENTAL
O modelo de avaliação positivista-experimental é, de acordo com Tinôco,
Souza e Oliveira (2011), a visão predominante entre as teorizações de políticas
públicas. Isso se dá, em grande parte, pelo caráter técnico, de estabelecimento
de normas e de pressupostos para a orientação dos gestores públicos. O
papel prescritivo do campo, desde a gênese (BOULLOSA, 2013), promove o
estabelecimento de receituários a serem seguidos antes do estabelecimento de
análises críticas mais densas acerca das construções teórico-metodológicas do
campo (BOULLOSA et al., 2021).

A definição clássica de avaliação de políticas públicas demarca a concepção


positivista ao incitar que os processos avaliativos podem ser normatizados e
aplicados em contextos diversos. Aparece, aqui, mais uma vez, a ideia de manual,
com passos e indicativos de como o gestor (avaliador) deve proceder em relação
ao processo de avaliação e aos avaliados. Outra dimensão inerente à avaliação
positivista-experimental é o foco nos resultados do processo.

O positivismo tem bases na organização cartesiana das estruturas sociais,


e, no caso do campo da avaliação de políticas públicas, isso não é diferente. A
estruturação se dá pela proposição de ferramentas e de instrumentos aplicados,
que são, para os teóricos positivistas, o caminho para que se possa efetivar uma
avaliação com resultados.

Os processos avaliativos de base positivista-experimental se consolidam


com a noção histórica de que os dados qualitativos devem, necessariamente, ser
o enfoque do avaliador, para que se possam produzir métodos de mensuração
claros. A construção das avaliações positivistas pode se concentrar em ações
descritivas e normativas, que, de maneira geral, debruçam-se a partir dos
processos, das relações organizacionais, das visões dos agentes envolvidos no
processo, das condições de avaliação e/ou da política a ser avaliada (DE TONI,
2014).

Cruz (2019) denota que grande parte da literatura e das iniciativas de


avaliação que se situam nos arcabouços teórico e investigativo das avaliações
positivistas busca estabelecer indicadores baseados nas esferas da eficiência, da
eficácia e da efetividade, ao mesmo tempo em que a agenda avaliativa se volta
para os interesses e os paradigmas postos pela agenda econômica neoliberal

156
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

(CRUZ, 2019), com foco no lucro, na esfera econômica e nos ditames da gestão
estratégica. A agenda também replica uma série de delineamentos de processos
avaliativos tecnicistas e que focam em um “teste de hipóteses, previamente
estabelecidas a partir de apanhados teóricos” (CRUZ, 2019, p. 162).

A avaliação positivista é amplamente difundida a partir do método


experimental, como estabelecido no parágrafo anterior. A hipótese, uma vez
definida, é testada (experimentada), a partir do estabelecimento de duas amostras
homogêneas de políticas públicas: uma é submetida à ação pública, e, a outra,
não. Dessa forma, busca-se comparar o que se passa em um dado contexto
público com um segundo contexto, no qual se analisa o que se passa se não
haver nenhuma intervenção pública (MÈNY; THOENIG, 1989).

Essa espécie de “amostra experimental” é, notoriamente, um padrão


estabelecido entre os passos metodológicos das ciências naturais. Contudo, ao se
pensar na problematização de fenômenos sociais complexos e multidisciplinares,
como a avaliação de políticas públicas, faz-se necessário ressaltar as fortes
limitações do modelo, primeiramente, porque ambas as amostras sociais não
se encontram em um laboratório, com dimensões totalmente controláveis pelo
avaliador. Ainda, porque a avaliação das consequências que levam à alteração
de um dado cenário social pode ter relações interdependentes com outros
fenômenos sociais. Como exemplo, podemos citar a avaliação de um cenário
de aumento exponencial de violência em um dado município. Nesse sentido, o
gestor estabelece um modelo de intervenção, pautado apenas no policiamento
ostensivo. Meses depois, os dados de violência no município são reduzidos
pela metade. A partir disso, o gestor avalia duas amostras: o novo cenário (pós-
intervenção) e um cenário fictício (onde não há intervenção alguma). A respeito
de uma avaliação comparativa ente os dois cenários, o gestor pode constatar
algumas possibilidades: 1) a política de aumento do policiamento ostensivo dá
certo, pois reduz os crimes; 2) a polícia possui um aparato capaz de reduzir a
violência; e 3) a intervenção é efetiva, pois reduz as estatísticas de violência.

Apesar de o exemplo clarificar uma possível associação entre o aumento


de patrulhamento ostensivo e a redução da violência, podemos elucidar, para
além dos cenários indicados, uma série de fatores externos, que podem afetar
o contexto, e que, não necessariamente, são perceptíveis a partir da análise
experimental entre os cenários, sem uma análise adequada das diversas variáveis
que compõem os fenômenos da violência e da segurança pública. Ex.: 1) apesar
do aumento do patrulhamento ostensivo, a redução da violência se dá porque
os criminosos de duas facções rivais do município estabelecem um acordo de
paz; 2) o patrulhamento ostensivo tem sido efetivo em parte, pois inibe a ação de
criminosos nas ruas, mas, ao mesmo tempo, parte das forças policiais tem sido
conivente com uma série de atos, sem registrá-los, oficialmente, nas estatísticas

157
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

do município; 3) os criminosos têm atuado em outros municípios, fugindo da ação


policial; e 4) na verdade, a violência continua nos mesmos níveis de antes, o
que muda é o comportamento dos cidadãos, que já não têm registrado queixas
oficialmente, pois percebem que nem mesmo com mais polícias nas ruas estão se
sentindo seguros.

Note que, apesar de o exemplo anterior ser bem restrito a algumas poucas
variáveis, o gestor pode perceber uma série de fenômenos sociais em torno da
segurança pública, que, não necessariamente, são percebidos apenas com a
análise dos registros de violência nos dois cenários. Isso ilustra, de forma simples,
como o modelo experimental de cenários é bem limitado, sem refletir, criticamente,
a respeito dos fatores sociais, ambientais, institucionais, econômicos etc. que
afetam determinado cenário de avaliação de políticas públicas.

De Toni (2014, p. 112) observa que os métodos experimentais de avaliação


são inexequíveis, na medida em que “[...] não se pode isolar beneficiários e não
beneficiários de medidas que têm um caráter universal e transversal [...]”, isso
porque alguns tipos de políticas públicas não permitem que o avaliador separe
os grupos sociais que recebem as políticas e aqueles que não as recebem.
Ainda, existem casos nos quais uma mesma política se desdobra de forma
diferente entre grupos sociais. Podemos pensar no exemplo anterior, do aumento
do patrulhamento ostensivo em um dado município. A melhora dos índices
de violência em um município, não necessariamente, significa que, em todos
os bairros, a política do patrulhamento ostensivo seja efetiva. A violência pode
reduzir, drasticamente, em alguns bairros, e, ao mesmo tempo, se manter igual
em outros. No entanto, ao observar apenas a média geral da violência municipal,
o gestor não é capaz de ver, com detalhamento, as especificidades do efeito da
política em cada bairro.

3.2 PRAGMATISMO POR QUALIDADE


O modelo de avaliação baseado na qualidade ganhou espaço nos debates e
nas análises da literatura de políticas públicas ainda na década de 1990. A grande
aderência de pesquisas em torno do conceito de qualidade, e o estabelecimento
da qualidade como um dos pontos a serem melhorados na gestão pública, ainda,
na década de 1980, foram fatores que auxiliaram na promoção e na disseminação
da abordagem baseada no estabelecimento da qualidade.

Faz-se necessário apontar que o conceito de qualidade é subjetivo, e não


existe uma definição única ou totalizante (SERAPIONI, 2009). Um dos conceitos
mais utilizados de qualidade é o proposto por Juran (1962), que a define como a

158
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

capacidade de adequação ao uso. A percepção dos atributos de um fenômeno


ou de um objeto está relacionada diretamente ao alinhamento deste diante da
funcionalidade proposta. Como exemplos simples, podemos citar as políticas de
saúde de qualidade, que devem promover a saúde da população. Da mesma
forma, pensando na adequação ao uso, políticas públicas de educação precisam
fornecer a formação e o conhecimento.

É importante frisarmos que essa simples correlação nem sempre pode


estabelecer parâmetros avaliativos que, realmente, mensurem a efetividade das
políticas públicas diante da complexidade social. Por isso, os estudos e as ações
avaliativos, que se orientam pela abordagem da qualidade, promovem um olhar
teórico e metodológico mais amplo e denso (DA CUNHA, 2018).

Um instrumento de gestão amplamente utilizado a partir do modelo


(pragmatismo por qualidade) é o “Ciclo PDCA”. O PDCA, traduzido para o
português, significa, respectivamente, planejar, fazer, verificar e agir (CARNEIRO,
2013). Não obstante, a partir dessa sequência lógica de ações, busca-se
sistematizar “[...] uma sequência de passos aplicados para atingir metas e oferecer
condições para uma gestão eficaz” (CARNEIRO, 2013, p. 20).

Simões e Ribeiro (2005) destacam que o CPDA é, também, conhecido como


“Ciclo de Deming”, e foi difundido como um instrumento de gestão no Japão,
depois da Segunda Guerra Mundial, buscando promover melhores níveis de
eficiência e de controle da qualidade.

FIGURA 7 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO CICLO PDCA

FONTE: Simões e Ribeiro (2005, p. 6)

159
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Na fase do planejamento (plan, em inglês), busca-se identificar as


alternativas para a resolução de um determinado problema estabelecido. Já a
fase da execução (do, em inglês) consiste na materialização do planejamento
realizado anteriormente. Depois disso, a terceira fase é da verificação (check,
em inglês) na qual o gestor avalia a situação atual e compara com a situação
inicial (na qual é identificado o problema). Essa ação evidencia se a intervenção
da última fase gera resultados positivos ou não. Por fim, a fase da ação (action,
em inglês), quando o gestor age com influência do resultado obtido. Nesse caso,
se o resultado identificado for negativo, inicia-se outro PDCA, intervindo em tal
problema. Se o resultado for positivo, busca-se elencar as ações que determinam
o novo padrão (solução), além de padronizar o sistema de ações em questões
para que o resultado permaneça.

Chirinéa e Brandão (2015) denotam que a década de 1990 demarcou um forte


movimento reformista da esfera governamental latino-americana. Somou-se, a
isso, a escalada da agenda liberal nos governos da região, além do fortalecimento
do receituário neoliberal em busca dos ditames da eficiência (que se baseia na
conexão entre os custos e os benefícios produzidos) e da eficácia (que se baseia
na conexão entre o alcance das metas estabelecidas e o tempo determinado)
(DA CUNHA, 2018; SCHMIDT, 2018). A eficiência foi o principal parâmetro de
análise estabelecido pela Nova Gestão Pública. Como indicam Denhardt e Catlaw
(2017), esse foco na eficiência produziu um ofuscamento de outras dimensões,
igualmente importantes, como a participação social e a capacidade de equidade.

Pode-se observar que a abordagem pela qualidade ganha um caráter


essencialmente gerencialista, importando instrumentos e ferramentas de análise
do campo da administração privada e corroborando para o paradigma de
redefinição das práticas públicas nas égides da eficiência e da eficácia, baseando-
se na busca de uma “gestão pública por resultados” (TROSA, 2001) e na
epistemologia construída pelo paradigma da gestão de empresas. Como apontam
Tinôco, Souza e Oliveira (2011), a abordagem da avaliação (pela qualidade) não
rompe com os pressupostos das abordagens clássicas da avaliação de cunho
positivista, na medida em que se orientam pelo tecnicismo, pelo estabelecimento
de métricas quantitativas rígidas e pelo foco em resultados. O modelo ganha
espaço, principalmente, nas agendas de políticas públicas reformistas do período,
com os discursos de modernização e de inovação da gestão pública brasileira
(TINÔCO; SOUZA; OLIVEIRA, 2011).

A dimensão prática da gestão avaliativa, baseada na qualidade, é evidente.


Parte das inovações e da modernização citadas está na incorporação de
ferramentas técnicas de avaliação, e o papel do gestor (avaliador) ganha
relevância, como aquele que aplica a técnica. Assim, a avaliação se mistura com
o papel de promoção de controle das ações públicas e dos funcionários públicos,

160
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

além da responsabilização destes (AFONSO, 2005). Como analisam Chirinéa e


Brandão (2015), a área da educação brasileira vivenciou uma forte consolidação
de instrumentos avaliativos a partir da década de 1990, principalmente, com a
inclusão de instrumentos de avaliação do sistema educacional, pautados pela
New Public Management (Nova Gestão Pública) (CHIRINÉA; BRANDÃO, 2018).

Como exemplos de instrumentos de avaliação voltados para a gestão das


políticas educacionais, os autores citam o estabelecimento do Sistema de Avaliação
da Educação Básica (SAEB) e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(IDEB). Ainda, a própria consolidação do Plano de Desenvolvimento da Educação
(PDE) e do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, que instituiu,
jurídica e administrativamente, os dois instrumentos citados anteriormente.

De maneira mais abrangente, os modelos de avaliação de políticas públicas


baseados na qualidade também integram a operacionalização de instrumentos
oriundos da administração privada, as denominadas “ferramentas para o controle
e melhoria da qualidade”. Como exemplos, há a estratificação (separação de um
fenômeno em diversos subgrupos, baseando-se nas características distintivas
entre eles). Essa ferramenta tem origem na análise de sistemas produtivos,
e possui, como categorizações de estratificação mais utilizadas, o turno de
produção, as condições climáticas, o operador, a matéria-prima e o local de
produção. As variáveis funcionam da seguinte forma:

• Turno de produção: os efeitos são diferentes se formos considerar os


diferentes turnos de produção?
• Condições climáticas: os efeitos dos distintos sob diferentes condições
climáticas? (Existe a ocorrência de problemas em algum específico?)
• Operador: diferentes operadores produzem diferentes resultados? Se
sim, por quê?
• Matéria-prima: o uso de diferentes matérias-primas, no processo
produtivo, gera diferentes resultados na produção?
• Local de produção: a produção estabelecida em diferentes locais gera
resultados diferentes para a produção?

É um modelo que pode ser facilmente adequado para a análise de processos


de implantação de políticas públicas regionalizadas, estabelecendo, a partir de
parâmetros de estratificação, um modelo de análise das políticas em diferentes
regiões, e possibilitando a comparação entre estas. Um exemplo pode ser o
estabelecimento de métricas para a análise da política do Programa Nacional
de Acesso ao Ensino Técnico (PRONATEC). O gestor consegue estabelecer
alguns indicadores de estratificação: 1) lugar de implementação (analisando os
resultados de formação, de evasão etc., a partir de cada unidade de formação); 2)
idade de formação (analisando os resultados de formação, de evasão etc., a partir

161
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

de cada faixa etária); e 3) curso profissionalizante (analisando os resultados de


formação, de evasão etc., a partir de cada curso integrante do programa).

Outro instrumento muito utilizado é a Folha de Verificação, usada como uma


ferramenta de controle dos procedimentos de coleta de dados. Nela, organizam-
se os dados que o gestor obtém com o tempo, excluindo a necessidade de uma
depuração (organização) ao fim do processo de coleta. A ferramenta também
tem origem na produção de dados de qualidade em empresas, tendo grande
aderência na avaliação de defeitos encontrados em processos produtivos, como
linhas de produção.

Para a formulação, o gestor deve, primeiramente, analisar as dimensões


a serem verificadas. Depois, estabelecer um método para o registro destas na
Folha de Verificação (se manualmente, se digitalmente etc.). Assim, ao produzir a
análise de determinado processo, o gestor pode identificar a quantidade de vezes
que cada dimensão é identificada.

FIGURA 8 – FOLHA DE VERIFICAÇÃO

FONTE: O autor

Como exemplo prático, cita-se a análise dos processos de registros das


atividades de uma Unidade Básica de Saúde da Família (UBSF): consultas,
vacinações, visitas domiciliares e encaminhamentos para especialistas e para
exames externos. O gestor responsável deve estabelecer a frequência de cada
dimensão com base na quantidade de ocorrência de cada um desses eventos.

162
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Uma dica é que ele consegue estabelecer, ainda, como dimensões “controle”,
aquelas relacionadas aos problemas encontrados nas seguintes dimensões:
consultas não realizadas (falta do médico), consultas não realizadas (faltas dos
usuários), falta de insumos para vacinação, visitas domiciliares não realizadas etc.

Para você que deseja se aprofundar na abordagem avaliativa


baseada na qualidade (e na busca desta), indicamos a leitura do
livro Gestão da Qualidade: Conceitos e Teorias, que apresenta, no
Capítulo 4, por exemplo, uma série de instrumentos utilizados para
auxiliar na mensuração de resultados, na avaliação de cenários
organizacionais e institucionais, e na promoção de análises voltadas
para a qualidade.

3.3 CONSTRUTIVISTA
O modelo de avaliação construtivista é definido, teoricamente, por Guba e
Lincoln (1989), no trabalho intitulado de Fourth Generation Evaluation (Quarta
Geração da Avaliação). Os autores traçam a consolidação de uma nova
epistemologia do processo avaliativo, que se norteia pela noção basilar de que
a realidade está fora da esfera do avaliador, construída pelas pessoas que
vivenciam tal realidade (GUBA; LINCOLN, 1989; AZEVEDO; VALVERDE, 1999).

Uma concepção importante desse modelo avaliativo é que, nele,


o investigador também deve assumir um papel claro de interpretação e
reinterpretação da realidade na qual se insere. A respeito de tal perspectiva, a
atuação não é meramente tecnicista, como apenas aquele que opera o processo
de avaliação, mas reitera a dimensão política como um agente que influencia o
processo de avaliação, as variáveis avaliativas, e a integração dos outros agentes
sociais no processo (AZEVEDO; VALVERDE, 1999).

Segundo o modelo construtivista,

[...] os resultados de uma avaliação não podem ser


considerados meras descrições de como “as coisas realmente
são”, mas representam construções que grupos de actores
formam para “fazer sentido” na situação em que se encontram.
Por outras palavras, os resultados não são “factos”, mas
“criações” de um processo interativo que inclui o avaliador e
os vários stakeholders (AZEVEDO; VALVERDE, 1999, p. 6-7).

163
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Note que, nesse modelo, a realidade é um constructo, não uma verdade


absoluta e imutável. Esse elemento é interessante, pois nem sempre um gestor
de políticas públicas obtém o mesmo resultado a partir da avaliação de um
mesmo objeto em diferentes contextos. Algumas variáveis fundamentais que
modificam e conformam a opinião pública, por exemplo, podem trazer distintos
resultados a uma avaliação de uma política pública. Por exemplo: um programa
social de alfabetização e de inclusão escolar faz muito sentido em um cenário no
qual a população possui altos índices de analfabetismo, de exclusão e de evasão
escolar. Contudo, se, depois de décadas promovendo tal inclusão, a redução do
analfabetismo, os índices alcançam números que beiram a zero, a população
pode passar a não ver tais iniciativas públicas como centrais e relevantes. Ao
contrário, pode começar a identificar outros problemas, como a falta de cursos
profissionalizantes, de inclusão no mercado de trabalho etc.

O cenário da avaliação construtivista nunca é isolado das percepções


e das interações sociais (variáveis que podem se alterar com o tempo). Logo,
você precisa ter em mente que outra dimensão fundamental desse modelo de
avaliação é a dependência dos contextos sociais, ambientais, psicológicos,
culturais, institucionais etc. Esses contextos apresentam os problemas públicos
(emergenciais ou não), e são o foco da ação construtivista, o espelho de
um cenário de situações, e não da simples busca racionalizada de soluções
(AZEVEDO; VALVERDE, 1999).

4 MÉTODOS PLURALISTAS DE
AVALIAÇÃO
Os métodos pluralistas (ou, simplesmente, métodos plurais) de avaliação
são cunhados como uma abordagem, de caráter mais amplo, dos processos
avaliativos, na medida em que buscam avaliar as políticas públicas, seguindo uma
dinâmica de inclusão dos demais agentes envolvidos como ativos, baseando-se
nas práticas dialógicas e democráticas (BOULLOSA et al., 2021).

Tinôco, Souza e Oliveira (2011, p. 309) consideram que os métodos pluralistas


são adequados para a análise de “[...] serviços e políticas mais transversais e
que contemplem atores diversificados”. O cenário de descentralização dos
serviços públicos e de redução das ações estatais, empreendidos entre os anos
80 e 90, fomentou a entrada de novos agentes, como produtores e avaliadores
de políticas públicas, incluindo ONGs, associações e organizações da sociedade
civil, órgãos de classe e grupos técnicos de especialistas. Como vimos no capítulo
anterior, essa gama de atores passa a ter, também, uma forte interação com as
esferas de deliberação pública e de desenho das policies, diante do contexto

164
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

de redemocratização e institucionalização de espaços de participação popular


(como os conselhos gestores de políticas públicas e os orçamentos participativos)
(MARTINS, 1989; GRISA et al., 2017).

Como resultado, a gama de atores e de instituições passa a promover


debates e processos ligados, ao mesmo tempo, à área da avaliação das políticas
formuladas, implementadas ou em implementação. Por isso, mas não apenas,
Boullosa et al. (2021) demarcam o terreno da avaliação de políticas públicas
como um campo (arena de exercício do poder) multifacetado e plural, no que diz
respeito aos agentes que demandam políticas, que as produzem e quanto aos
que exercem o papel de avaliadores. Mencionamos, anteriormente, que isso não é
apenas pela interação dos diferentes atores nas esferas de tomadas de decisões,
pois é imprescindível que você compreenda outras dimensões impressas nas
relações, como as subjetividades (culturais, históricas), os interesses políticos e
os jogos de poder exercidos nas arenas (KENIS; SCHNEIDER, 1991; BOULLOSA
et al., 2021).

Meldolesi (1996) observa que o modelo pluralista denota a política pública


como um resultado de ações plurais de uma rede de atores, não sendo, dessa
forma, um objeto unicamente operacionalizado pelos policymakers (como
compreendiam as visões tecnicistas-positivistas de avaliação), e, nem mesmo,
um objeto que paira apenas no âmbito da sociedade. Dessa forma, não há, de
acordo com essa abordagem, um modelo a ser seguido, replicado ou consagrado
como o modelo correto para a promoção da avaliação. Ao contrário, Meldolesi
(1996, p. 871) analisa que o papel da incerteza ganha centralidade na medida em
que “pode ser compreendida como componente que não pode ser eliminado da
ação, na definição de problemas e de soluções que se colocam sempre de uma
maneira nova”.

Nessa concepção, a avaliação de cunho plural não é apenas uma fase do


processo, mas se estabelece como uma resposta efetiva para os cenários de
crise estatal e de grande adensamento das relações entre as esferas pública,
governamental e privada. Como observa Meldolesi (1996), nesse contexto, o
Estado passa a ter que

[...] escolher bem os setores nos quais deve intervir, valorizar


os recursos humanos presentes entre os funcionários e os
colocar a serviço dos usuários, além de solicitar a participação
dos usuários e a responsabilização dos empregados com
o objetivo de usar o dinheiro público sem desperdícios
(MELDOLESI, 1996, p. 89).

Outra dimensão importante da abordagem pluralista é a abertura aos modelos


de avaliação baseados na participação social. A inclusão dos agentes sociais, não

165
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

como indivíduos para serem escutados, mas como agentes ativos nos processos
públicos, é, de fato, uma guinada da compreensão entre as relações Estado-
sociedade.

Não é necessária a “etiquetação” do agente A ou B como avaliador, ou como


aquele sobre o qual pesa a centralidade do processo de avaliar (BOULLOSA,
2019). Promove-se um avanço significativo quanto ao papel do avaliador, que
deve se despir dos paradigmas técnico-burocratas, operacionalizados por
manuais, que concebem os processos avaliativos como uma dinâmica estática,
pouco dialógica, e, muitas vezes, “top down”. Na contramão disso, cabe, aos
avaliadores, ressignificarem os seus papéis e os contextos avaliativos.

As avaliações devem se aproximar dos conhecimentos de


atores sociais, imersos na experiência concreta, nos contextos
socioeconômicos, políticos e territoriais, revelando processos
e dinâmicas políticas para além da racionalidade instrumental
e de métodos experimentais [...]. Trata-se de compreender um
campo que se pluraliza, ao se identificar, por meio daqueles
(as) que o avaliam, com as especificidades de realidades
locais e nacionais imersas nas contradições (BOULLOSA et
al., 2021, p. 5).

A abordagem pluralista de avaliação das políticas públicas possui um forte


enfoque no estabelecimento de caminhos para a interação e o diálogo horizontais
entre os agentes das diversas esferas (publica, privada, governamental),
distanciando-se dos enfoques finalísticos da abordagem positivista e da visão
do avaliador como um indivíduo neutro e desprovido de interesses sociais, que
carrega visões políticas e bagagens epistêmicas (TINÔCO; SOUZA; OLIVEIRA,
2011).

5 OUTROS MODELOS DE AVALIAÇÃO


É importante que você tenha em mente que não existem apenas os quatro
modelos de avaliação de políticas públicas que vimos anteriormente. Na verdade,
há outros modelos e referências teóricas e práticas que indicam caminhos para
a promoção. No início do século XXI, já existiam cerca de sessenta diferentes
modelos de avaliação na literatura de políticas públicas. Estes se situavam nos
mais diversos espectros teóricos, uns com um caráter mais rígido e voltado aos
resultados, e, outros, mais abertos, em direção ao processo de interação entre os
agentes envolvidos, além dos modelos de avaliação que superam a dicotomia,
empreendendo abordagens de caráter mais misto, calçando-se em diferentes
dimensões teórico-práticas.

166
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Como você pode perceber, com base na leitura das seções anteriores,
o campo da avaliação de políticas públicas é polissêmico (BOULLOSA et al.,
2021), e guarda, em si, uma série de vertentes e de diálogos teóricos que podem,
inclusive, dialogar em um mesmo processo avaliativo, dependendo da visão,
compreensão e atuação do avaliador e dos avaliados em cada contexto social e
histórico.

Uma abordagem da avaliação que busca promover um método de


mensuração sucinto das políticas públicas é a denominada Rapid Assessment
Approach (Abordagem da Avaliação Rápida). Para Fonseca (2005), esse modelo
interage com dados qualitativos e quantitativos, mas tendo um foco maior sobre
os aspectos quantitativos. A busca por um processo avaliativo mais célere acaba
focando na produção de indicadores que ofereçam feedbacks em tempo hábil.
No entanto, essa abordagem busca, sempre que possível, inserir elementos
qualitativos, com o intuito de ampliar a compreensão acerca do fenômeno
analisado.

Rodrigues e Castro (2008) apresentam o “Protocolo de Avaliação Rápida


de Rios” (PAR), voltado para a produção de uma análise ambiental, de cunho
qualitativo, e baseada em um protocolo estabelecido por parte dos avaliadores.
Os autores denotam que é um método avaliativo e de monitoramento muito
replicado na área ambiental, que se direciona para ações rápidas e adaptadas, de
acordo com o contexto socioambiental presente.

Se você tiver interesse em conhecer um pouco mais a


respeito do método de avaliação rápida, pode analisar o caso
apresentado a seguir, com base na experiência de monitoramento
hídrico, ao observar os aspectos positivos e negativos: https://
www.repositorio.ufop.br/bitstream/123456789/8285/1/ARTIGO_
ProtocolosAvalia%c3%a7%c3%a3oR%c3%a1pida.pdf.

Deve-se evidenciar, ainda, a existência da abordagem que promove o


estabelecimento de modelos mistos de avaliação. Segundo Moscoso (2017), a
pesquisa denominada de “pesquisa com métodos mistos” envolve a adoção de
procedimentos metodológicos qualitativos e quantitativos. Esse exercício gera a
construção de um arcabouço prático que seja capaz de responder a diferentes
variáveis e fenômenos sociais nas suas complexidades.

167
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

A abordagem mista de avaliação vai um pouco além, na medida em que,


além de misturar pressupostos metodológicos, também combina as próprias
visões epistêmicas (ou seja, as diferentes estruturas que trazem a concepção das
diferentes esferas da ciência e da consolidação) e instrumentais do conceito de
avaliação, que vão desde o caráter clássico, voltado para a mensuração avaliativa
de cunho quantitativo, até os procedimentos avaliativos de caráter qualitativo.

Bamberguer (2012) justifica a relevância dos métodos mistos de avaliações,


pois, dificilmente, um único método avaliativo seja capaz de empreender uma
análise completa das diversas esferas que compõem um mesmo objeto. Além
disso, o autor observa que é possível, por meio dessa perspectiva, promover uma
triangulação dos dados obtidos, evitando distorções impostas pela aplicação de
avaliações superficiais e promovendo uma complementariedade dos métodos e
da promoção de uma diversidade de resultados.

Não há um modelo rígido de produção dos métodos avaliativos mistos. Ao


contrário, tais iniciativas ganham diferentes desenhos prático-metodológicos.
Nesse sentido, Bamberguer (2012) aponta quatro passos para o planejamento
bem estruturado dos passos da avaliação mista:

1. Em qual etapa do processo avaliativo são utilizados os métodos mistos?


2. Os métodos qualitativos e quantitativos são promovidos de forma
concorrente ou sequencial?
3. Os métodos qualitativos e quantitativos têm os mesmos pesos, ou algum
tem predominância?
4. A avaliação é desenvolvida em um passo ou em vários? Como se
estabelecem os passos avaliativos?

Os passos auxiliam na orientação do policymaker para planejar um método


misto bem estruturado, e que possua uma definição consolidada dos processos e
dos interesses finalísticos.

O então Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão,


do Governo Federal, por meio da Secretaria de Gestão Pública,
produziu uma série de documentos desde o fim dos anos 2000.
Esses documentos orientam à promoção de um novo modelo de
avaliação da gestão e dos serviços públicos, sendo denominado
de Modelo de Excelência em Gestão Pública (MEGP). O MEGP
se fundamenta na avaliação de oito dimensões que se orientam

168
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

por uma visão sistêmica da política pública e da consolidação de


ações e de instituições públicas, por meio do estabelecimento de
redes, ações de governança, e pela gestão democrática. Os oito
eixos (dimensões) avaliativos do documento são: governança,
estratégia e planos, público-alvo, interesse público e cidadania,
informação e conhecimento, pessoas, processos, e resultados:
http://www.gespublica.gov.br/sites/default/files/documentos/
modelodeexcelenciaemgestaopublica2014.pdf.

1 - Disserte a respeito das principais características que definem as


abordagens positivista-experimental e pluralista de avaliação das
políticas públicas.

6 MERCADO, TERCEIRO SETOR E


OUTRAS FORMAS DE POLÍTICAS
PÚBLICICAS
Prezado estudante, como já estudamos anteriormente, as teorias e a
concepção da gestão pública são fortemente influenciadas pela perspectiva da
“Nova Gestão Pública” (NPG), que busca instrumentos e referências utilizadas na
esfera da administração de empresas, tendo, como ponto forte, a crítica à eficácia
dos governos e à capacidade de responsividade destes, o que gera, segundo
Denhardt e Catlaw (2017, p. 217), três efeitos distintos:

Primeiro, o governo precisa se tornar mais “produtivo” e usar


melhor recursos financeiros menores. Em segundo lugar,
as estruturas de incentivo no governo estão erradas, e elas
precisam ser alteradas para que os servidores públicos sejam
motivados a atuar e responsabilizados pelos resultados. Em
terceiro, o governo, especialmente, governos nacionais,
ultrapassam as barreiras. Em termos gerais, isso significa
diversas recomendações amplas para reformular (DENHARDT;
CATLAW, 2017, p. 217).

Dentre as diversas recomendações de reformulação (também denominadas


de Reformas do Setor Público), uma das mais evidenciadas é a que diz respeito
ao tamanho dos Estados e das funções e atividades diante da sociedade e das
169
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

demandas. Esse debate ganha uma ampla difusão nos governos de alinhamento
neoliberal nos países latino-americanos, a partir das diretrizes do Consenso de
Washington, como a privatização das empresas estatais, o enxugamento do
Estado e dos órgãos, e a redução das áreas de atuação estatal (MONTAÑO, 2002).
O Consenso de Washington é definido, por Carinhato (2008, p. 40), como uma
conferência “[...] sem caráter deliberativo, realizada em 1989, entre acadêmicos
e políticos norte-americanos e latino-americanos, para buscar soluções que
findassem com a estagnação reinante por mais de vinte anos na América Latina”.
No Brasil, o receituário de Washington é adotado como um conjunto de ações de
redução das esferas administrativas, buscando eficiência e redução dos gastos
públicos; forte direcionamento aos serviços; procura pela descentralização dos
serviços e ampliação dos meios (e instrumentos) de fiscalização e monitoramento
das políticas públicas; e estabelecimento de uma maior dependência do Estado
sobre a ação e os interesses de mercado (DENHARDT; CATLAW, 2017).

Cabe deslindarmos, aqui, algumas dimensões críticas a esse novo arranjo


estabelecido, que guarda, em si, a desresponsabilização do Estado de muitas
ações, sobretudo, na esfera das políticas sociais, e que, por conseguinte, vão sendo
ocupadas pelos setores mais organizados da sociedade civil, principalmente, a
partir de segmentos mais organizados desta, que surgiram, ainda, na década de
1970, em contraposição ao sistema político autoritário promovido pela ditadura e
que, já naquele período, buscavam-se melhores serviços e políticas públicas. Um
exemplo desse segmento que se institucionalizou e ganhou peso no Brasil foi a
Reforma Sanitária (FIORI, 1997; SOPHIA, 2012).

Tal congruência de ações, ou melhor, de inações, se pensarmos, a partir


da desresponsabilização do Estado, em uma ampla gama de atividades, como
assistência social, saúde, produção, fomento à economia e à renda, educação etc.,
promovem uma transformação de como se conduz e se define a “questão social”
(MONTAÑO, 2002; 2012). É importante resgatarmos três elementos basilares
da ação promovida pelo Estado neoliberal para ilustrar melhor a redefinição da
esfera social (MONTAÑO, 2012):

1. Um estímulo ao desenvolvimento das empresas e das instituições


capitalistas, com ações, tendo, como foco e objetivo, a promoção de
classes consumidoras, o que adota, ao cidadão, a visão de cliente.
Dessa forma, serviços sociais se tornam mercadorias rentabilizadas.
2. As políticas de Estado precarizadas, regionalizadas, e que se orientam a
partir da visão do cidadão, do usuário. Não se estabelece a dimensão da
cidadania e da participação social das parcelas sociais.
3. O Terceiro Setor, que busca atender a parcelas sociais desalentadas
pelas duas ações anteriores, e que se manifestam a partir da sociedade
civil na sua pluralidade, tendo, como meio de ação, a filantropia.

170
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Nesse sentido, a respeito desse terceiro elemento, vamos nos debruçar de


forma mais específica. A retirada, do Estado, de uma ampla gama de ações e de
políticas de cunho social, como a venda de empresas públicas, como a Companhia
Vale do Rio Doce (atual Vale), a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), e a
venda de bancos públicos, é um exemplo desse primeiro cenário de retirada do
Estado, que leva consigo uma série de políticas de assistência e de seguridade
social promovidas nas múltiplas instituições, e que passam a se restringir, cada
vez mais, a ações mercadológicas das empresas e das relações e à ruptura
com a política do Estado desenvolvimentista (IVO, 2001). O vazio formado pela
retirada das políticas de cunho desenvolvimentista é paulatinamente ocupado
por setores da sociedade civil nas múltiplas formas (instituições organizadas, não
organizadas, movimentos classistas, não classistas, de cunho filantrópico, de
interesse social e sem fins lucrativos etc.).

A multiplicidade de instituições pode ser compreendida como o Terceiro


Setor. Como aponta Albuquerque (2006), “Terceiro Setor” é um vocábulo traduzido
de “third sector”, que, nos Estados Unidos, é utilizado com outras expressões que
conhecemos aqui, no Brasil, como “organizações sem fins lucrativos” (nonprofit
organizations) ou “setor voluntário” (voluntary sector). No entanto, tal definição
ainda é imprecisa e não reflete a diversidade e a complexidade do segmento e da
ampla gama de instituições. Por isso, antes de estabelecer uma definição mais
precisa do chamado Terceiro Setor, é necessário indicar alguns elementos:

Fazem contraponto às ações de governo: os bens e serviços


públicos resultam da atuação do Estado e da multiplicação de
várias iniciativas particulares. Fazem contraponto às ações
do mercado: abrem o campo dos interesses coletivos para a
iniciativa individual. Dão maior dimensão aos elementos que
as compõem: realçam o valor tanto político quanto econômico
das ações voluntárias sem fins lucrativos. Projetam uma visão
integradora da vida pública: enfatizam a complementação entre
ações públicas e privadas (ALBUQUERQUE, 2006, p. 19).

No entanto, essa definição é suficientemente imprecisa, na medida em que as


organizações do terceiro setor se mostram, na prática, como elementos híbridos,
e, muitas vezes, transitórios, sendo necessária uma aproximação mais clara para
a definição. Um ponto de contrassenso, por exemplo, é explicitado a partir da
análise de Tenório (1999), que demonstra como a esfera do terceiro setor nem
sempre é unicamente voltada para a solução de problemas públicos, ou guarda,
sempre em si, as finalidades de resolução dos problemas públicos. Os interesses
mercadológicos, por vezes, apresentam-se como o objetivo principal de uma
parte do segmento de instituições, apesar de as finalidades institucionais serem
voltadas para a resolução de problemas públicos. Esse “espectro do mercado” e
da racionalização instrumental perpassa, e, em alguns casos, sobrepõe-se aos
interesses coletivos e aos modelos de gestão baseados na gestão coletiva, como
a gestão social (TENÓRIO, 1999).
171
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

A definição de Fernandes (1994), que estabelece o Terceiro Setor como


o conjunto de agentes privados organizados com objetivos públicos, pode não
retratar a complexidade das organizações no cenário atual. Um exemplo da
disfunção são as chamadas Organizações Sociais de Saúde (OSS). Como analisa
Travagin (2017), as OSS ganham espaço de gestão e de condução das políticas
de saúde com o forte contexto de retração neoliberal do Estado das atividades de
operação de políticas sociais e de saúde.

As OSS se constituem, estatutariamente, como organizações sem fins


lucrativos, no entanto, muitas vezes, direcionam-se como braços operacionais do
mercado, que se materializam na condução e na gestão de recursos públicos.
Nesse sentido, Travagin (2017) observa que as OSS abrem brechas jurídicas
e institucionais nos processos de gestão e de controle dos recursos públicos
aplicados na área da saúde. Um primeiro ponto a ser elencado, a esse respeito,
está ligado à autonomia das organizações e à dispensa de licitações. Outro é que
as contas não são submetidas, por lei, aos tribunais de contas públicas, como os
tribunais estaduais.

Morais et al. (2018) analisam a multiplicação das OSS e dos contratos


operados por estas como uma forma evidente de privatização da saúde e dos
recursos públicos do setor. Os autores apontam que, a partir de uma pesquisa
realizada entre 2009-2014, uma parte dessas organizações passou a aplicar os
excedentes financeiros no mercado de capitais, uma ação notoriamente clássica
de empresas de cunho privado. Outro apontamento é que a obtenção de aditivos
por parte das OSS vem se tornando uma atividade cada vez mais comum, e que
infla os valores dos serviços finais.

Crescem os escândalos de corrupção e os indícios de desvios de dinheiro


público realizados por OSS, inclusive, por meio da obtenção de privilégios,
superfaturamento e outras atividades de cunho ilícito apontadas pelo Tribunal
de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) e pelo Tribunal de Contas do
Município do Rio de Janeiro (TCM-RJ), como apontam Muniz e Brotto (2016).

172
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

FIGURA 9 – NOTÍCIA DE DESVIOS DE RECURSOS PÚBLICOS PELAS OSS

FONTE: O autor

Como denota Nobre (2004), a palavra “parceria” se estabeleceu, na década


de 1990, como o sinônimo do novo padrão de interação e de relacionamento entre
as esferas do governo, das empresas e da sociedade civil. No entanto, na prática,
muitas das “parcerias” constituídas para a promoção de políticas públicas (como
das OSS) acabam se manifestando apenas como meios de sobreposição das
esferas do mercado e dos setores privados sobre os recursos e a pública.

Evidencia-se a urgência de instrumentos de controle externo de recursos


públicos que se esvaem a partir do estabelecimento de ações mercantilizadas na
gestão de políticas públicas, como nos casos das OSS. Obviamente, podem ser
manifestadas nas mais diferentes searas e atividades que, hoje, são terceirizadas,
privatizadas, e, consequentemente, muitas delas, suboperacionalizadas pela
racionalidade de mercado e pelos interesses privados que se sobrepõem aos
interesses sociais.

173
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

Para que você possa se aprofundar um pouco mais nas


temáticas que dizem respeito à Reforma Sanitária e à Construção
do Sistema Único de Saúde (SUS), no Brasil, leia o artigo
acadêmico a seguir: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-
59702014000100015&script=sci_arttext.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Prezado estudante, estamos chegando ao fim do Capítulo 3, e é
imprescindível finalizarmos a nossa jornada pelos indicadores e pelas abordagens
de avaliação de políticas públicas, fazendo um breve retrospecto acerca dos
elementos teóricos vistos até aqui.

Ao longo deste capítulo, perpassamos por temas relevantes, como pela


definição conceitual dos indicadores, dos índices e das taxas. Em seguida,
buscamos apresentar a relevância dos indicadores e das diferentes concepções
conceituais, dos indicadores de processo, de projetos etc. Ainda, foi feito um
resgate do debate acerca da definição das estatísticas públicas e da importância
dos sistemas nacionais de indicadores, com a construção dos arcabouços como
ferramentas práticas de publicidade, controle e avaliação dos dados públicos.

Não obstante, foi aprofundada a análise acerca do conceito de monitoramento


das políticas públicas a partir da distinção deste em comparação ao conceito
de avaliação, com o qual é, muitas vezes, confundido. Em seguida, você pôde
percorrer as diferentes concepções teóricas e metodológicas de avaliação das
políticas públicas. Notoriamente, não deve se esquecer de que os modelos
avaliativos de políticas públicas possuem origens e fundamentos teóricos-
metodológicos. Alguns possuem, na sua concepção, um caráter mais pragmático
e positivista, fundamentando-se na essência dos estudos clássicos da área
de avaliação de políticas públicas. Modelos e abordagens teóricos de caráter
prescritivo, direcionando-se para o estabelecimento de normas, guias-práticos e
manuais para a orientação de policymakers e de avaliadores de políticas públicas.
Outros modelos e abordagens se situam no outro extremo do linear, sendo
orientados pela construção avaliativa, baseada em dimensões que rompem a
ênfase quantitativa, com o objetivo final de produzir um resultado (um produto
avaliativo). Tais dimensões, como a construtivista, apostam no estabelecimento
de caminhos que tomam, como matéria-prima do processo de avaliação, outros

174
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

elementos, não necessariamente, numéricos: as percepções, as impressões dos


participantes, os interesses, as visões, as noções históricas etc.

Foram estabelecidos, como meios de ação avaliativos, os modelos que


imprimem um papel dualista, absorvendo dimensões positivas e construtivistas,
qualitativas e quantitativas, baseados nos fins, nos processos e nas entradas.
No entanto, é importante frisarmos, mais uma vez, que não há um modelo
único de se avaliar, nem mesmo, existe um padrão possível a ser executado
nas ações dos avaliadores, isso porque, assim como cada processo avaliativo
depende, essencialmente, do que se deseja avaliar, também é importante que os
avaliadores estejam abertos para identificar as especificidades e as necessidades
embutidas em cada cenário.

Outro ponto abordado ao longo deste capítulo final foram as políticas públicas
promovidas pelo terceiro setor, além da íntima relação entre os processos
de privatização e de desresponsabilização das atividades estatais frente aos
contextos de mercantilização dos recursos e das políticas públicas.

Bom, agora a nossa jornada vai chegando ao fim, e destacamos, aqui, mais
uma vez, a importância da consolidação de caminhos sólidos, democráticos e
voltados para os interesses sociais nos mais distintos processos de gestão das
políticas públicas, além de não estabelecermos, de forma alguma, um receituário
pré-determinístico diante das complexidades e das diferentes situações possíveis
na seara do planejamento, da implementação, do monitoramento, da avaliação
das políticas públicas.

REFERÊNCIAS
AFONSO, A. J. Avaliação educacional: regulação e emancipação: para uma
sociologia das políticas contemporâneas. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2005.

AGUM, R.; RISCADO, P.; MENEZES, M. Políticas públicas: conceitos e análise


em revisão. Agenda Política, v. 3, n. 2, p. 1, 2015.

ALBUQUERQUE, A. C. C. Terceiro setor: história e gestão de organizações.


São Paulo: Summus Editorial, 2006.

ALESSANDRO, M. La economía política de la capacidad estadística: una


aproximación práctica. Washington: BID, 2017.

AZEVEDO, J.; VALVERDE, C. A perspectiva construtivista na avaliação de


processos de intervenção e de formação. 1999.

175
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

BAMBERGER, M. Introdução aos métodos mistos de avaliação de


impacto. 2012. Disponível em: https://www.dmeforpeace.org/wp-content/
uploads/2017/06/320-20Mixed20Methods20in20Impact20Evaluation20SPANISH.
pdf. Acesso em: 24 abr. 2021.

BARBRY, C. Qu’est-ce que lu courant ‘evidence-based’ dans les politiques


publiques? Paris, 2016.

BOULLOSA, R. de F. Mirando ao revés as políticas públicas: o desenvolvimento


de uma abordagem crítica e reflexiva para o estudo das políticas públicas.
Publicações da Escola da AGU, v. 11, n. 4, p. 89-105, 2019.

BOULLOSA, R. de F. Mirando ao revés nas políticas públicas: notas sobre um


percurso de pesquisa. Pensamento & Realidade, v. 28, n. 3, p. 1, 2013.

BOULLOSA, R. de F.; OLIVEIRA, B. R. de; DE ARAÚJO, E. T.; GUSSI, A. F.


Por um antimanual de avaliação de políticas públicas. Revista Brasileira de
Avaliação, v. 10, n. 1, p. 1, 2021.

BRASIL. Secretaria Especial do Desenvolvimento Social. O que é. 2021.


Disponível em: http://mds.gov.br/assuntos/bolsa-familia/o-que-e/bolsa-familia.
Acesso em: 24 abr. 2021.

CANO, I. Introdução à avaliação de programas sociais. 3. ed. Rio de Janeiro:


FGV, 2006.

CARINHATO, P. H. Neoliberalismo, reforma do Estado e políticas sociais nas


últimas décadas do século XX no Brasil. Revista Aurora, v. 2, n. 1, p. 1, 2008.

CARNEIRO, T. M. O PDCA como ferramenta para gestão de custos. 2013.


Disponível em: http://repositorio.utfpr.edu.br/jspui/handle/1/21487. Acesso em: 24
abr. 2021.

CASTELLS, M. A sociedade em rede. 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2012.

CENTRE FOR BHUTAN STUDIES & GNH. Felicidade nacional bruta e


desenvolvimento. 2021. Disponível em: https://www.grossnationalhappiness.
com/books/gross-national-happiness-and-development/. Acesso em: 24 abr.
2021.

CEPAL. COMISSÃO ECONÔMICA PARA A AMÉRICA LATINA E O CARIBE.


Estatísticas. 2021. Disponível em: https://www.cepal.org/pt-br/areas-de-trabalho/
estatisticas. Acesso em: 24 abr. 2021.

176
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

CHIRINÉA, A. M.; BRANDÃO, C. da F. O IDEB como política de regulação do


Estado e legitimação da qualidade: em busca de significados. Ensaio: Avaliação
e Políticas Públicas em Educação, v. 23, n. 87, p. 461-484, 2015.

CLOETE, F. Evidence-based policy analysis in South Africa: critical assessment


of the emerging government-wide monitoring and evaluation system. Journal of
Public Administration, v. 44, n. 2, p. 293-311, 2009.

COHEN, E.; FRANCO, R. Avaliação de projetos sociais. Petrópolis: Vozes,


2004.

COSTA, C. G. F.; SILVA, E. V. da. O que realmente importa no processo


de tomada de decisão considerando políticas públicas baseadas em
evidência. Revista Administração em Diálogo-RAD, v. 18, n. 2, p. 124-143,
2016.

CRUZ, D. M. Enfoques contra-hegemônicos e pesquisa qualitativa: desafios da


avaliação em profundidade em políticas públicas. Revista Aval, v. 1, n. 15, p. 1,
2019.

DA CUNHA, C. G. S. Avaliação de políticas públicas e programas


governamentais: tendências recentes e experiências no Brasil. Revista Estudos
de Planejamento, v. 1, n. 12, p. 1, 2018.

DARGENT, E. Determinantes internacionales de la capacidad de las agencias


estatales. Apuntes, v. 41, n. 74, p. 9-40, 2014.

DARGENT, E.; LOTTA, G.; MEJÍA, J. A.; MONCADA, G. A quem importa


saber?: a economia política da capacidade estatística na América Latina. 2018.
Disponível em: https://publications.iadb.org/publications/portuguese/document/A-
quem-importa-saber-A-economia-politica-da-capacidade-estatistica-na-America-
Latina.pdf. Acesso em: 24 abr. 2021.

DE TONI, J. O monitoramento e a avaliação da política industrial brasileira:


desafios e perspectivas. Revista Avaliação de Políticas Públicas, v. 2, n. 14, p.
1, 2014.

DENHARDT, R. B.; CATLAW, T. J. Teorias da administração pública. São


Paulo: Cengage, 2017.

EASTON, D. The political system. Nova York: The Free Press, 1953.

FERNANDES, R. C. Privado, porém público: o terceiro setor na América Latina.


Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1994.
177
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

FIORI, J. L. Globalização, hegemonia e império. In: TAVARES, M. C.; FIORI, J. L.


Poder e dinheiro, uma economia política da globalização. Petrópolis: Vozes,
1997.

FONSECA, A. Avaliação de políticas sociais. O desafio de fazer, analisar e


corrigir simultaneamente. Santiago: RLCFAO, 2005.

GASQUE, K. C. G. D. Competência em informação: conceitos, características e


desafios. AtoZ: Novas Práticas em Informação e Conhecimento, v. 2, n. 1, p.
5-9, 2013.

GIL, C. G. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): uma revisão


crítica. Papéis das Relações Ecossociais e Mudança Global, v. 140, n. 1,
p. 107-118, 2018.

GRISA, K. et. al. Capacidades estatais para o desenvolvimento rural no Brasil:


análise das políticas públicas para a agricultura familiar. Revista Sociedade e
Cultura, v. 20, n. 1, p. 14-38, 2017.

GUBA, E. G.; LINCOLN, Y. S. Fourth generation evaluation. London: Sage


Publications, 1989.

HENRY, G. T. How modern democracies are shaping evaluation and the emerging
challenges for evaluation. American Journal of Evaluation, v. 22, n. 3, p. 419-
429, 2001.

HOWLETT, M.; RAMESH, M.; PERL, A. Políticas públicas: seus ciclos e


subsistemas: uma abordagem integradora. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.

IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. O IBGE.


2021. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/institucional/o-ibge.html. Acesso
em: 24 abr. 2021.

IVO, A. B. L. A destituição do "social": Estado, governo e políticas


sociais. Caderno CRH, v. 14, n. 35, p. 1, 2001.

JANNUZZI, P. de M. Indicadores sociais no Brasil. Campinas: Alínea, 2012.

JANNUZZI, P. de M. Indicadores sociais no Brasil: conceitos, fontes de dados


e aplicações. Campinas: Alínea, 2006.
JANNUZZI, P. de M. Indicadores para diagnóstico, monitoramento e avaliação de
programas sociais no Brasil. Revista do Serviço Público, v. 56, n. 2, p. 1, 2005.

178
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

JANNUZZI, P. de M. Considerações sobre o uso, mau uso e abuso dos


indicadores sociais na formulação e avaliação de políticas públicas
municipais. Revista de Administração Pública, v. 36, n. 1, p. 51-72, 2002.

JURAN, J. M. Quality control handbook. 1962.

KAYANO, J.; LIMA CALDAS, E. de. Indicadores para o diálogo. Guarujá:


Instituto Pólis, 2001.

KENIS, P.; SCHNEIDER, V. Redes de políticas: evidências empíricas e


considerações teóricas. Frankfurt: Campus Verlag, 1991.

MARSTON, G.; WATTS, R. Tampering with evidence: a critical appraisal of


evidence-based policy-making. The Drawing Board: An Australian Review of
Public Affairs, v. 3, n. 3, p. 143-163, 2003.

MARTINS, C. Governabilidade e controles. Revista de Administração Pública,


Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, p. 5-20, 1989.

MELDOLESI, N. S. Avaliação das políticas públicas na França. Revista do


Serviço Público, v. 47, n. 1, p. 83-112, 1996.

MÉNY, Y.; THOENIG, J. C. Politiques publiques. Paris: Presses Universitaires


de France, 1989.

MOKATE, K. M. Converter-se ou "monstro" em aliado: endossar como ferramenta


de gestão social. Revista do Serviço Público, v. 53, n. 1, p. 89-134, 2002.

MONTAÑO, C. Pobreza, "questão social" e seu enfrentamento. Serviço Social &


Sociedade, v. 1, n. 110, p. 270-287, 2012.

MONTAÑO, C. Terceiro setor e questão social: crítica ao padrão emergente de


intervenção social. Cortez: São Paulo, 2002.

MORAIS, H. M. M. de et al. Organizações sociais da saúde: uma expressão


fenomênica da privatização da saúde no Brasil. Cadernos de Saúde Pública, v.
34, n. 1, p. 1, 2018.

MOSCOSO, J. N. Los métodos mixtos en la investigación en educación: hacia un


uso reflexivo. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 47, n. 164, p. 632-649, 2017.

179
GESTÃo DE PoLÍTiCAS PÚBLiCAS

MUNIZ, M. A. do N.; BROTTO, M. E. Política de saúde e organizações


sociais: limites para a consolidação da universalização da saúde no Rio de
Janeiro. Revista de Políticas Públicas, v. 20, n. 1, p. 153-170, 2016.

NOBRE, S. L. C. Terceiro setor: os recursos da solidariedade. Rio de Janeiro:


Qualitymark, 2004.

ONU. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Gross National Happiness


Index. 2021. Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/
partnership/?p=2212. Acesso em: 29 abr. 2021.

PINHEIRO, M. M. S. Políticas públicas baseadas em evidências:


uma avaliação crítica. 2020. Disponível em: http://repositorio.ipea.gov.br/
bitstream/11058/10373/1/bapi_24_art1.pdf. Acesso em: 6 abr. 2021.

PNUD. PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO.


O que é o IDH. 2021. Disponível em: https://www.br.undp.org/content/brazil/pt/
home/idh0/conceitos/o-que-e-o-idh.html Acesso em: 6 abr. 2021.

RAMOS, M. P.; SCHABBACH, L. M. O estado da arte da avaliação de políticas


públicas: conceituação e exemplos de avaliação no Brasil. Revista de
Administração Pública, v. 46, n. 5, p. 1271-1294, 2012.

ROCHET, C.; BOUT-COLONNA, L.; KERAMIDAS, O. The risck of efficiency


indicators in the monitoring of public policies. Suíça: University of Bern, 2005.

RODRIGUES, A. S. de L.; CASTRO, P. de T. A. Protocolos de avaliação


rápida: instrumentos complementares no monitoramento dos recursos
hídricos. 2008. Disponível em: https://www.abrh.org.br/SGCv3/index.
php?PUB=1&ID=15&SUMARIO=188. Acesso em: 24 abr. 2021.

RUA, M. das G. Políticas públicas. Florianópolis: Departamento de Ciências da


Administração/UFSC; Brasília: CAPES: UAB, 2009.

SANAHUJA, J. A.; VÁZQUEZ, S. T. Del milenio a la sostenibilidad: retos y


perspectivas de la Agenda 2030 para el desarrollo sostenible. Revista Política y
Sociedad, v. 2, n. 54, p. 533-555, 2017.

SCHMIDT, J. P. Para estudar políticas públicas: aspectos conceituais,


metodológicos e abordagens teóricas. Revista do Direito, v. 3, n. 56, p. 119-149,
2018.

180
Capítulo 3 INDICADORES E AVALIAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS

SERAPIONI, M. Avaliação da qualidade em saúde. Reflexões teórico-


metodológicas para uma abordagem multidimensional. Revista Crítica de
Ciências Sociais, v. 1, n. 85, p. 65-82, 2009.

SILVA, M. O. da S. Avaliação de políticas e programas sociais: teoria e


prática. São Paulo: Veras, 2001.

SIMÕES, L.; RIBEIRO, R. de C. O Ciclo PDCA como ferramenta da qualidade


total. Lins: Unisalesiano de Lins, 2005.

SOPHIA, D. C. Notas de participação do Cebes na organização da 8a


Conferência Nacional de Saúde: o papel da revista Saúde em Debate. Saúde em
Debate, Rio de Janeiro, v. 36, n. 95, p. 554-561, 2012.

TAYLOR, M. The political economy of statistical capacity: a theoretical


approach. Washington: BID, 2016.

TEJADAS, S. da S. Avaliação de políticas públicas e garantia de direitos.


São Paulo: Cortez, 2020.

TENÓRIO, F. G. Um espectro ronda o terceiro setor: o espectro do


mercado. Brazilian Journal of Public Administration, v. 33, n. 5, p. 85-102,
1999.

TINÔCO, D. dos S.; SOUZA, L. M. de; OLIVEIRA, A. B. de. Avaliação de políticas


públicas: modelos tradicional e pluralista. Revista de Políticas Públicas, v. 15,
n. 2, p. 305-313, 2011.

TRAVAGIN, L. B. O avanço do capital na saúde: um olhar crítico às Organizações


Sociais de Saúde. Saúde em Debate, v. 41, n. 1, p. 995-1006, 2017.

TROSA, S. Gestão pública por resultados: quando o Estado se compromete.


Rio de Janeiro: Revan; Brasília: ENAP, 2001.

VIEIRA-DA-SILVA, L. M. Avaliação de políticas e programas de saúde. Rio de


Janeiro: SciELO- FIOCRUZ, 2014.

WHITACKER, G. M. Desenvolvimento sustentável: decifra-me ou te devoro.


Análise sobre o desenvolvimento sustentável no modo de produção capitalista.
Presidente Prudente: UNESP, 2017.

WORTHEN, B.; SANDERS, J.; FITZPATRICK, J. Avaliação de programas:


concepções e práticas. São Paulo: Editora Gente, 2004.

181

Você também pode gostar