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Verbena Córdula
A reflexão apresentada até agora foi para questionar o sistema democrático tal como o
conhecemos em nosso país, que exclui milhões de pessoas de acesso a direitos básicos.
Entre estes, está incluído o direito à informação, também considerado um direito humano
básico, mas que, infelizmente, tem sido vilipendiado cada dia mais, e gerado enormes
prejuízos à maioria da sociedade.
Como bem está enfatizado no documento da UNESCO, redigido pelo irlandês Sean
MacBide e publicado em 1980, cujo objetivo era analisar questões da comunicação nas
sociedades (chamado de Relatório MacBride), a liberdade das pessoas para ter acesso à
comunicação, como receptoras ou como emissoras, não pode ser comparada com a de
investidores para obter benefícios em uma empresa.
Ainda de acordo com esse Relatório, a liberdade de comunicar é um dos bens mais
preciosos existentes nas sociedades democráticas e, por isso, a presença ou não de
liberdade de expressão se configura como “o indicador mais confiável de outras
liberdades dentro de uma nação”.
Dois princípios desconsiderados
Há 42 anos que Sean MacBride advertia acerca do que ele chamou de violação da
liberdade de expressão, que, segundo afirma no Relatório, se dá através da censura
burocrática ou comercial, da intimidação ou perseguição, ou através da “uniformidade
imposta”. E é exatamente acerca dessa “uniformidade imposta” descrita por MacBride que
quero me referir quando afirmo que, ao restringir majoritariamente o debate eleitoral às
candidaturas com representação no Congresso, a mídia hegemônica nacional viola a
liberdade de expressão.
Aqui, quero retornar ao filósofo francês Michel Foucault. Para ele, os discursos não se
configuram como aquilo que traduz as lutas ou os mecanismos de dominação, mas são o
o poder do qual nos queremos apropriar. Ainda de acordo com ele, a estrutura social que
mantém esses valores possui rituais específicos de validação e de circulação dos
discursos que tornam um pronunciamento aceito.
A Rede Bandeirantes, por exemplo, deixa isso explícito, tanto em suas coberturas
majoritárias, como principalmente nos debates que promove através da emissora de
televisão nacional. As coberturas são limitadas, quase exclusivamente, à discussão dos
programas de governo e das questões que giram em torno das duas principais
candidaturas: Lula e o atual Presidente que quer se reeleger. Deixa de fora, por sua vez,
candidaturas de partidos menores, tais como as de Sofia Manzano e Vera Lúcia, por
exemplo.
Mas esse modus operandi não se restringe somente ao Grupo Bandeirantes. Quando
observamos as coberturas jornalísticas de empresas midiáticas como Organizações
Globo e suas afiliadas, os grupos Folha e Civita, assim como todos os demais meios de
comunicação hegemônicos, vemos a mesma operacionalização. Não há equidade nas
coberturas das diversas candidaturas. Isso ocorre não somente em relação ao tempo
destinado a cada cobertura, como também referente a outros aspectos, como espaço
para falar, o espaço para a exposição da imagem do(a) candidato(a), o tipo de imagem
exposta (a alguns/algumas sempre lhes colocam sorrindo, descontraído(a)s, enquanto
outro(a)s são colocado(a) com aparência cansada, exausta, quando não raivosa (como é
o caso das candidaturas de esquerda).
A CNN Brasil, por exemplo, demonstrou essa parcialidade recentemente, quando “cobriu”
as convenções partidárias. Citarei apenas dois exemplos. Ao candidato Ciro Gomes do
PDT, a emissora dedicou uma cobertura de 2 minutos e 25 segundos. Na mesma ed ição,
quando se tratou do mesmo evento realizado pela candidata Sofia Manzano (PCB), o
canal de TV dedicou apenas 1 minuto e 55 segundos.
Mas a diferença não se restringiu somente a esse quesito. A jornalista responsável pela
cobertura da Convenção de Ciro Gomes esteve apareceu do do lado de fora do local
onde estava sendo realizado o evento e, durante sua fala sobre o que o corria do lado de
dentro, a tela foi bipartida, e, simultaneamente, apareciam várias imagens do candidato
em tamanho gigante.